Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04230/10
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:10/12/2010
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:OPOSIÇÃO
FALTA DE NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO NO PRAZO DA CADUCIDADE (ARTº 204º Nº 1 AL. E) DO CPPT)
PRAZO DE CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO NO CASO DE UTILIZAÇÃO DE MÉTODOS INDIRECTOS NA DETERMINAÇÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL, ATRAVÉS DE "MARGENS MÉDIAS DO LUCRO LÍQUIDO”
Sumário:I) - A utilização de métodos indirectos na determinação da matéria colectável, através de "margens médias do lucro líquido", a que se refere o art. 90°, n.º 1, al. a) da LGT, não concretiza a aplicação dos "indicadores de actividade inferiores aos normais", prevista no art. 89° do mesmo compêndio legal o qual só será aplicável uma vez concretizada a via regulamentar necessária para o efeito, o que ainda não aconteceu.

II) -Consequentemente, nos casos previstos em 1 (primeira parte), o direito de liquidar os tributos caduca no prazo de quatro anos, que não no de três, aplicável à sua segunda parte - art. 45°, n.ºs 1 e 2 da LGT.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acorda-se, em conferência, nesta 2ª Secção do TCAS:

1. -A...CONSULTORES E ENGENHEIROS ASSOCIADOS, LDª., com os sinais identificadores dos autos, recorreu da sentença do M Juiz do TT 1ª Instância de Lisboa que julgou improcedente a presente oposição por si deduzida à execução fiscal contra si instaurada para cobrança coerciva de dívida proveniente de IRC do ano de 2001, concluindo as suas alegações como segue:
“A) A administração fiscal, para fixação do montante que pretende que a recorrente pague a título de IRC correspondente a 2001, recorreu a métodos indirectos mediante a aplicação à situação tributária do sujeito passivo de indicadores objectivos de actividade.
B) A correspondente liquidação (de imposto e juros) foi efectuada em 06.06.2005, tendo sido notificada à recorrente em 07.09.2005.
C) Ora, nos termos do art° 45°, n° 2, da LGT, o direito de liquidar os impostos em caso de utilização de métodos indirectos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de três anos -vd. também o art° 93° do CIRC.
D) Pelo que, a notificação da liquidação de tal imposto à recorrente teria que ocorrer, sob pena de caducidade do direito à liquidação, até ao dia 31.12.2004 -vd. os citados art°s 93° do CIRC e 45°, n° 2, da LGT.
E) Ora, como se notou supra, a liquidação em apreço veio apenas a ocorrer em 06.06.2005 e somente foi notificada em 09.07.2005.
F) A liquidação em apreço está, pois, ferida de caducidade.
G) Resultando daí, face ao disposto no art° 204°, n° 1, alínea e), do CPPT, a inexigibilidade da dívida exequenda, facto que implica a necessária extinção da execução.
H) Pretende, no entanto, a sentença recorrida não se ter verificado in casu caducidade já que, segundo refere, não foram aplicados os indicadores objectivos da actividade previstos no art. 45°, n ° 2 LGT (aliás inexistentes por ainda não publicados), pelo que o prazo de caducidade seria de quatro e não de três anos.
i) Ora, dúvidas não restam de que houve in casu uma avaliação indirecta e que a administração tributária usou de indicadores aleatórios de que dispunha, de cariz objectivo.
J) Não sendo aceitável que tais indicadores possam aproveitar à administração tributária, para, v.g., esta poder afastar a presunção legal prevista no n° 1 do artigo 75° da LGT e determinar, por avaliação indirecta, a matéria colectável,
L) E, já não possam aproveitar ao contribuinte quando este os invoca para defender os seus direitos.
M) A administração tributária recorreu, assim, a indicadores objectivos de actividade por os considerar previstos na lei, pelo que está preenchido o segundo requisito do n° 2 do artigo 45° da LGT.
N) Interpretação diferente conduz à iniquidade e coloca em crise o princípio da certeza e da segurança jurídica, tendo, ao fazê-lo, ainda a sentença recorrida violado os citados art°s 93° do CIRC e 45°, n° 2, da LGT.
TERMOS em que deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida e determinando-se, em consequência, a extinção da execução.”
Não houve contra -alegações.
A EPGA, em douto parecer emitido a fls. 118, pronunciou-se pelo improvimento do recurso.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
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2.- Na sentença recorrida fixou-se o seguinte probatório:
“1. Dos Factos
Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os factos infra indicados:
A) Em 29/10/2005 foi instaurado à oponente, no serviço de finanças de Alenquer, o processo de execução fiscal n.° 1465200501062590 para a cobrança coerciva do montante de €22.771,21 e acrescido no montante de € 3.758,08, referente à liquidação de IRC do exercício de 2001 com o n.° 2004 5004263189.
B) A liquidação de IRC resultou de uma acção de inspecção externa que apurou IRC adicional, relativa ao ano de 2001, com recurso a métodos indirectos.
C) A oponente foi citada para os termos da execução fiscal em 01/02/2007.
D) A liquidação de IRC foi levada ao conhecimento da oponente em 07/09/2005 (cfr. art.° 2.° da p.i e documento de fls 142 dos autos).
Adita-se o seguinte facto ao abrigo do artº 712º do CPC
E)- A AT procedeu às correcções em causa utilizando médias de margem de lucro (admitido por acordo)
Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos.
Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.
3. -Esquematizados os factos provados e delimitado objectivamente o recurso pelas conclusões da alegação da recorrente -artºs. 684º, nº 3 e 690º, nº 1, ambos do CPC - verifica-se que a questão a decidir consiste em saber se ocorre, ou não, a caducidade do direito à liquidação.
É esta, pois, a questão decidenda e, adiantando já o nosso entendimento sobre ela, afigura-se-nos não assistir razão à recorrente, o que o mesmo é dizer que se sufraga a fundamentação da sentença recorrida.
Para julgar improcedente a impugnação a Mª Juíza adoptou o seguinte discurso fundamentador, na parte recorrida:
“A questão a decidir nos presentes autos consiste em aferir da alegada caducidade do direito de liquidação, e das ilegalidades invocadas pela oponente, enquanto fundamentos de oposição previsto na alínea e), h) e i) do n.° l do art.° 204.° do CPPT.
A oponente invoca, desde logo, a falta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade, nos termos do disposto na alínea e) do n.° l do art.° 204.° do CPPT uma vez que a notificação não foi efectuada dentro do prazo de 3 anos nos termos do disposto no n.° 2 do art.° 45.° da LGT, sendo certo que a liquidação lhe foi notificada em 7/09/2005, conforme a própria oponente reconhece no art.° 2.° da p.i.
Dispõe a alínea e) do n.° l do art.° 204.° do CPPT que constitui fundamento de oposição "falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade".
Ora, o art.° 45.° n.° l da LGT estabelece o prazo de caducidade do direito de liquidação de 4 anos, quando a lei não fixar outro.
E, no n.° 2 da LGT estabelece-se o prazo caducidade de três anos do direito à liquidação "Nos casos de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo ou de utilização de métodos indirectos por motivo de aplicação à situação tributária do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade previstos na presente lei..."
A liquidação de IRC, subjacente à dívida exequenda, resultou de uma acção de inspecção externa que apurou IRC adicional, relativa ao ano de 2001, com recurso a métodos indirectos.
Sucede porém que os indicadores objectivos, que se encontram previstos na alínea c) do art.° 87.º da LGT e n.° 2 do art.° 89.° do mesmo diploma, não foram objecto de regulamentação.
Nesse sentido, veja-se o Ac. do STA de 24/02/2004, recurso n.° 01914: " l. A utilização de métodos indirectos na determinação da matéria colectável, através de "margens médias do lucro líquido", a que se refere o art.° 90°, n.°1, al a) da LGT, não concretiza a aplicação dos indicadores de actividade inferiores aos normais", prevista no art.° 89.° do mesmo compêndio legal, II. Este último normativo só será aplicável uma vez concretizada a via regulamentar necessária para o efeito, o que ainda não aconteceu".
Assim, o prazo de caducidade aplicável no caso sub judice é o de 4 anos previsto no n.° 1 do art.° 45.° da LGT.
Considerando que está em causa uma liquidação de IRC do exercício de 2001 a sua notificação ao contribuinte teria de ser efectivada até 31/12/2005 sob pena de caducidade do direito à liquidação (art.° 45.° n.° l da LGT), tendo sido notificada a 7/09/2005 não se verifica a invocada caducidade.
E, nestes termos, não se verifica o fundamento de oposição, invocado pela oponente, previsto na alínea e) do n.° l do art.° 204.° do CPPT.”

Por conseguinte, concluímos que não se verificam quaisquer dos fundamentos de oposição invocados pela oponente.”
A recorrente dissente do assim fundamentado e decidido ao sustentar que a administração tributária recorreu, a indicadores objectivos de actividade por os considerar previstos na lei, pelo que está preenchido o segundo requisito do n° 2 do artigo 45° da LGT.
Vejamos.
Há lugar à avaliação indirecta da matéria colectável do sujeito passivo quando esta se afastar, significativamente e sem razão justificada, da resultante "da aplicação dos indicadores objectivos da actividade de base técnico-científica" referidos no art. 87°, al. c) da LGT (redacção anterior à Lei nº 100/99).
Os ajuizados indicadores são definidos anualmente, nos termos da lei, pelo Ministro das Finanças, após audição das associações empresariais e profissionais, podendo consistir em margens de lucro ou rentabilidade, que, tendo em conta a localização e dimensão da actividade, sejam manifestamente inferiores às normais do exercício da actividade e possam, por isso, constituir factores distorsivos da concorrência.
Ora, como se salienta no Acórdão do S.T.A. de 24-03-2004, tirado no Processo nº01914/03, tal normativo não é aplicável, por não concretizada ainda a via regulamentar necessária para o efeito o que vale por dizer que, não existindo, não podiam tais indicadores ter obviamente sido aplicados.
Sendo assim, uma vez que foi demonstrada a incredibilidade da contabilidade da recorrente, a Administração determinou a matéria tributável socorrendo-se ou tendo em conta "as margens médias de lucro líquido", nos termos do art. 90°, n.º 1, al. a) da LGT.
Como se expende no citado aresto do STA, “…, tratando-se embora de um critério também de cariz objectivo, não concretiza os ditos indicadores que terão de ser abstracta e genericamente definidos regulamentarmente.
Aliás, aquela determinação da matéria colectável, nos termos da dita al. a), tem necessariamente de basear-se em "critérios objectivos" em obediência ao disposto no art. 84°, n.º 1 da mesma LGT como efectivamente acontece já que reportada ao cálculo e estatística que lhe subjaz, como se acentua na sentença recorrida.
Ora, nos termos do art. 45°, n.º 2 da mesma lei, o prazo de caducidade é de três anos, se tiverem sido utilizados os ditos "indicadores objectivos", o que, como se viu, não foi o caso pelo que o prazo é o geral de quatro anos - seu n.º 1 -, aplicável às demais hipóteses de avaliação indirecta previstas no art. 87°, nomeadamente, como nos autos, à "impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável" - al. b).
A razão de ser de tal encurtamento do prazo resulta, como acentua Lima Guerreiro, LGT Anotada, pág. 215, de que, na aplicação de tais indicadores objectivos, "a administração tributária, não precisa de recorrer a qualquer inspecção externa ou interna".
A AT actuou, como resulta do exposto, ao abrigo dos arts. 75°, n.º 2, al. a), 87°, al. h), 88°, al. a) e 90°, n.º 1, al. a), todos da LGT e, dado o preceituado naquele primeiro segmento normativo, ilidida fica a presunção de veracidade da escrita postulada no n.º 1 do mesmo art. 75°.
Conseguintemente, improcede o recurso, merecendo confirmação a sentença recorrida.
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3. Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
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Lisboa, 12 de Outubro de 2010
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Lucas Martins)