Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07799/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/13/2014
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO; AUTORIA; CULPA; PROVA; PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO
Sumário:i) Do art. 2.º, n.º 2, do RGIT que dispõe que “Constitui infracção tributária todo o facto típico, ilícito e culposo declarado punível por lei tributária anterior “, extraem-se como pressupostos do ilícito contra-ordenacional ser este: a) um facto voluntário; b) cometido por acção ou omissão; c) que preencha um tipo de ilícito previsto na lei; d) declarado passível de coima por lei anterior ao momento da sua prática e; e) que o facto seja censurável.

ii)Toda a sanção penal ou contra-ordenacional tem como suporte uma culpa concreta, apesar da não intervenção nas contra-ordenações de uma censura de tipo ético-pessoal.

iii)Tal como no conceito de crime, exige-se para o preenchimento do tipo contra-ordenacional que exista uma acção ou uma omissão relevante. A conduta, o comportamento humano, ou seja a acção em sentido lato, é o ponto de partida de toda a elaboração do direito penal.

iv)Não ficando provado que a Arguida tenha introduzido gasóleo colorido nas máquinas e viaturas que se destinavam, como ficou provado, a serem vendidas, nem tão-pouco ficando provado que aquela teve a intenção de usar as suas máquinas e viaturas com o GCM, não se logra preencher o tipo contra-ordenacional previsto no art. 109.º, n.º 2, b), do RGIT (pelo qual havia sido condenada), o que, necessariamente, leva à sua absolvição.

v) Constituindo o princípio in dubio pro reo uma das vertentes do princípio constitucional da presunção de inocência (art. 32.º, n.º 2, 1.ª parte, da CRP), o mesmo impõe uma orientação vinculativa dirigida ao juiz no caso da persistência de uma dúvida sobre os factos: em tal situação, o tribunal sempre terá que decidir pro reo.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

O Representante da Fazenda Pública (Recorrente) interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou procedente o recurso interposto por A……….., Lda (Recorrida), da decisão de aplicação da coima no montante de EUR 4.500,00, acrescida de EUR 76,50 de custas, proferida pelo Director da Alfândega de Peniche, no âmbito do processo de contra-ordenação nº 284/2013, pela prática de infracção fiscal aduaneira p. e p. pela alínea b) do n.º 2 do art. 109.º do RGIT (Introdução irregular no consumo), absolvendo a arguida da coima e respectivas custas.

A Recorrente terminou as suas alegações do presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões:

A) A Douta Sentença, quanto ao facto provado enunciado em III - Fundamentação, 3.1 Dos Factos, letra L), baseada na Certidão Permanente do Registo Comercial, considera o objeto social da Sociedade "Comércio por Grosso não especificado" como fazendo parte das atividades desenvolvidas, à data da Auto de Notícia em 07/01/2013, mas tal atividade apenas foi inscrita no objeto da sociedade em 10/01/2014.

B) À data do Auto de Notícia a Sociedade desenvolvia as atividades de Suinicultura (principal), Produção e Comercialização de Energias Renováveis, Reciclagem e Fabricação de Produtos em Plástico (secundárias), de acordo com a Certidão Permanente do Registo Comercial e Registo no Cadastro da Autoridade Tributária e Aduaneira, e são estas as atividades que deveriam ter sido consideradas na Sentença.

C) Tendo em conta que a Sociedade não desenvolvia a atividade de "Comércio por grosso não especificado", à data do levantamento do Auto de Noticia, fica definitivamente comprometido todo o percurso cognitivo efetuado na Sentença porque neste se associa a compra dos equipamentos à sua posterior revenda e não à sua utilização nas actividades que a Sociedade efetivamente desenvolvia, conduzindo-nos erradamente para a Decisão de Absolvição.

D) A existência de GCM nos depósitos dos equipamentos, não pode ser imputada aos anteriores proprietários, conforme é efectuado na Douta Sentença, isto porque, apenas está identificado um anterior proprietário e somente para 3 equipamentos, desconhecendo-se a proveniência dos restantes 6 equipamentos.

E) Para tal imputação seria necessário a identificação dos restantes ex-proprietários e igualmente, averiguar, para todos eles, se eram beneficiários da utilização de GCM, para os equipamentos descritos atento o acesso condicionado ao produto, para se concluir que o GCM encontrado nos equipamentos, tem origem anterior à aquisição pela Sociedade.

F) Assim, inexiste sustentabilidade fáctica para tal imputação e a única conclusão a retirar é a de que o GCM contido nos reservatórios dos equipamentos ai se encontra porque foi colocado por quem deles pode dispor, ou seja, a proprietária dos mesmos à data do Auto de Noticia - a Sociedade A……….., Lda.

G) A motivação para as baterias não se encontrarem instaladas nos equipamentos, tem a ver com o facto do local onde estão parqueados ser Isolado e dessa forma poderem ser facilmente furtadas (com interesse, nomeadamente no cobre de que são compostas) e não porque os equipamentos não sejam utilizados.

H) De resto de e para que se verifique uma utilização indevida de GCM em equipamentos, não é necessário que estes se encontrem em funcionamento: "(…) pois há que apelar aos juízos de normalidade e da experiência comum que nos dizem que as máquinas são abastecidas com combustível única e exclusivamente com vista à utilização e consumo do mesmo, que é imprescindível ao seu funcionamento. De outro modo, e com a tese da recorrente teríamos que conceber que as máquinas e veículos são utilizados como reservatórios de combustível, o que é manifestamente inverosímil” (Acórdão n.º 5446/01 de 11/06/2002 do Tribunal Central Administrativo do Sul, disponível em www.dgsi.pt ).

I) A descrição do elemento subjetivo é feita na Decisão de aplicação de coima, nomeadamente pela prova da existência de GCM nos depósitos de equipamentos de que a Sociedade era proprietária (sem que estivesse autorizada a sua utilização) à data do Auto de Noticia (artigos 1, 2 e 3 da Decisão de Aplicação de Colma) e para as atividades que desenvolvia (artigo 11 e 15 da Decisão de Aplicação de Coima).

J) A Sentença com todo o respeito, revela ambiguidade no seguinte segmento: “Refere-se, mais uma vez, a fraca investigação efectuada pelas entidades com competência para tal, o que implicou que tenha chegado ao Tribunal um processo com várias lacunas e, acabou afinal por nos demonstrar, com um altíssimo grau de probabilidade, a veracidade da tese da Arguida. E ainda se assim não fosse, sempre o Tribunal recorria ao «in dubio pró reo» como fundamento da absolvição.”(a folhas 15 da Sentença) - sublinhado nosso.

L) Se assim fosse, a Sociedade seria sempre absolvida, independentemente dos factos que constassem nos Autos, o que contraria o necessário exame crítico das provas que serve para formar a convicção do Tribunal (n.º 2 do art. 374.º do Código do Processo Penal).

Termos em que deve ser julgado procedente o presente Recurso revogando-se a Sentença recorrida e em consequência se mantenha a Decisão do senhor Diretor da Alfândega de Peniche de 23/04/2013 proferida no Processo de Contra ordenação n.º ……/2013, de condenação da A…………., Lda., ao pagamento de coima no valor de €4.500 e custas de €76,50. Com o que se fará como sempre, Justiça.

A Anexordem, Lda. apresentou resposta às alegações da Fazenda, concluindo do seguinte modo:

1. Na douta sentença, foi julgado, e bem, PROCEDENTE o recurso interposto pela A……………., tendo sido absolvida da coima que lhe foi aplicada pelo Diretor da Alfândega e respetivas custas.

2. Reitera-se a posição assumida pelo Ministério Público na sua resposta entregue a 20/5/2013.

3. De fato não ficou provado a utilização de qualquer gasóleo agrícola por parte da A……………..

4. As viaturas e máquinas foram adquiridas pela A………. com a finalidade de serem vendidas (venda de produtos por grosso) e não para serem usadas no âmbito das suas outras atividades comerciais.

5. De fato, face à prova documental e testemunhal, existe um altíssimo grau de probabilidade quanto à veracidade da tese da A……………., nem que sejam nos termos do princípio in dubio pro reo.

6. Jamais a conclusão A) das conclusões da ALFANDEGA podem conduzir a decisão diversa da tomada, pois a prova documental e testemunhal (os fatos) são esclarecedores da absolvição da A…………...

7. Deve a douta sentença manter-se por estar corretamente motivada.



A Digna Magistrada do Ministério Publico apresentou a resposta de fls. 324-325, concluindo pela improcedência do recurso e pela manutenção da decisão recorrida, considerando, em síntese, que não foi feita prova relativamente à autoria ou ordem relativamente à mesma no que concerne à presença de gasóleo colorido nas máquinas, pelo que a decisão a proferir não poderia ser diversa.


Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.


I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar se o Tribunal a quo errou no julgamento de facto e de direito ao ter considerado que a conduta da Arguida não preenchia nem o tipo objectivo, nem o tipo subjectivo da contra-ordenação pela qual foi condenada.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria:

A) Foi emitida em 30/12/2011, pela “L………. II – Máquinas …………, Lda.”, a factura n.º 81/2011 em nome da Arguida, na qual consta a “Escavadora Volvo ………… – LNC”, n/Série ………, a “Pá Carregadora Caterpillar 950 G” e o “Dumper Volvo A 35C”, n/série V12808MB – cfr. fls. 235 dos Autos;

B) Em 7/01/2013, foi elaborado pela Unidade de Acção Fiscal da GNR, em nome da Arguida, o Auto de Notícia cujo teor se dá por integralmente reproduzido – cfr. fl. 23 e 24 dos Autos;

C) Em 22/01/2013, Acácio ……….. entregou no Destacamento de Acção Fiscal da GNR de Lisboa, o instrumento constante a fls. 50 dos Autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e na qual se lê, designadamente, o seguinte: « (…)

Assunto: Exposição de desacordo ao auto nº …………./13

Exmos. Senhores

Venho por este meio reiterar o meu desacordo, dado que o mesmo foi desde logo manifestado à data da assinatura deste auto e apreensão, no passado dia 7 de Janeiro do ano corrente, pelos seguintes factos:

- Não ter sido mencionado no respectivo auto, se encontravam 2 embalagens de 30 litros cada, no exterior do nosso parque, sendo que uma se encontrava vazia e outra continha gasóleo verde, facto este presenciado e referenciado antecipadamente antes de mais alguém o ter notado, pelo Guarda Principal - José ………….., com o nº …………... Não foram estes recipientes verificados, dados que os mesmos se encontravam fora do terreno sobre o qual pendia a busca, pelo que impedia a sua verificação. Conforme fotografias que anexamos.

- A rede de vedação do parque sob a qual incide esta acção encontrava-se cortada, daí o motivo de se encontrar uma pessoa no respectivo parque a proceder à reparação da respectiva vedação.

Pelo que se poderá constatar que a mesma ter sido vandalizada e o respectivo parque ter sido alvo de entrada de pessoas estranhas à empresa (facto este que facilmente poderão verificar, não ser primário, dado já se encontrarem queixas anteriormente apresentadas junto das entidades competentes, com acusações inclusive roubo).

Em consequência da permanência de terceiros no parque a proceder à reparação da vedação, conforme já referenciado, o portão da entrada do mesmo se encontrava aberto, possibilitando a entrada de qualquer pessoa.

- Não concordância com os valores atribuídos por V. Exas., aos bens apreendidos. Tendo em conta o seu estado, uso, idade e valor comercial, os valores atribuídos estão inflacionados.

- Nenhum dos bens apreendidos se encontravam com baterias, facto este que impedia o seu normal funcionamento, pelo que não poderá ficar provado que os mesmos se encontravam em laboração, inclusive tal situação foi facto impeditivo para a retirada do número de horas de trabalho dos contadores digitais, dos respectivos equipamentos.

Sem outro assunto de momento, aguardando as Vossas prezadas noticias, com os nossos melhores cumprimentos (…)»;

D) Em 22/02/2013, com base no Auto de Notícia referido em B), foi autuado na Alfândega de Peniche, em nome da Arguida, o processo contra-ordenacional n.º 284/2013 – cfr. fls. 81 dos Autos;

E) Em 13/03/2013,foi elaborado pelo Núcleo de Investigação de Crimes e de Contra-Ordenação da GNR, o instrumento constante a fls. 73 a 75 dos Autos, denominado de “Relatório” e cujos termos se dão por integralmente reproduzidos, referindo o seguinte: « (…)

ANALISADOS OS AUTOS, MOSTRA-SE:

1. Em 07 de Janeiro de 2013, pelas 14:30, elementos do Núcleo de Fiscalização do Destacamento de Acção Fiscal de Lisboa da Unidade de Acção Fiscal da GNR, fiscalizaram, no âmbito do Código dos Impostos Especiais de Consumo - CIEC (produtos petrolíferos e energéticos), a empresa A…………., LDA, NIF nº………………...

2. No decurso da fiscalização procedeu-se à recolha de amostras de combustível do depósito das viaturas/máquinas que se encontravam parqueadas na empresa acima referida para serem sujeitas a um teste de despistagem ao gasóleo colorido e marcado.

3. O combustível, ao ser misturado com o reagente previsto na lei reagiu positivamente, apresentando uma cor avermelhada, permitindo desta forma presumir que se tratava de gasóleo colorido e marcado.

4. Solicitado ao legal representante da firma, Sr. Acácio …………….., a ficha de candidatura de benefício fiscal referente ao presente ano, o mesmo não apresentou qualquer ficha de candidatura.

5. A utilização deste tipo de combustível só pode ser autorizado para os fins previstos no artigo 93° do CIEC, sendo a sua utilização em equipamentos não autorizados punível nos termos da a) nº2 do art. 109 do RGIT - Regime Geral das Infracções Tributárias.

6.Deste modo e, nos termos do artigo 73° do RGIT, procedeu-se à apreensão das viaturas/máquinas constantes no Auto de Notícia e Apreensão.

7. Ainda no decorrer da fiscalização foram recolhidas três amostras de gasóleo que posteriormente foram analisadas pela DGAIEC, sendo constituídas por 58% de gasóleo colorido e marcado no gerador Pramac, 25% de gasóleo colorido e marcado no veículo Volvo ……….., 57% de gasóleo colorido e marcado no veículo MAN TG 460 A, matricula …………, 55% de gasóleo colorido e marcado no compressor Atlas COPCO QA5 78, 60% de gasóleo colorido e marcado no gerador Gesan-GPML, 42% de gasóleo colorido e marcado no veículo New-Holland, 38% de gasóleo colorido e marcado no veículo Hanomag Henschel e 67% de gasóleo colorido e marcado no veículo Dumper A35 Volvo BM, fls. 10 a 19.

8. Solicitada informação à CNGA - Coordenação Nacional do Gasóleo Agrícola no sentido de apurar se a firma descrita nos autos possuía autorização para o uso de gasóleo colorido e marcado, estes, em resposta informaram que aquela firma não é beneficiária do gasóleo colorido e marcado nem apresentou qualquer pedido de candidatura em seu nome, fls. 37.

9. Acácio ………….., compareceu voluntariamente neste Núcleo no dia 13 de Fevereiro de 2013 a fim de prestar declarações, na qualidade de representante da empresa, sobre os factos que lhe são imputados.

10. O mesmo foi notificado nos termos do art. 70° do RGIT e ouvido em declarações, a fls. 38 e 39.

11. A firma, através de advogado, apresentou defesa escrita, apresentando em suma, os seguintes fundamentos:

11.1. Que adquiriu as viaturas/máquinas identificadas nos autos na Ilha da Madeira;

11.2. Não procedeu ao enchimento dos depósitos de combustível;

11.3. Que desenvolve a actividade de comércio de compra e venda de máquinas, viaturas e equipamentos em segunda mão;

11.4. Que os bens apreendidos se encontram no estado em que os recepcionou, não tendo efectuado nestes qualquer tipo de intervenção;

11.5. Que já por mais do que uma vez foi violada a entrada da firma por estranhos. Que foram retirados alguns tampões dos depósitos das máquinas, tendo sido encontrado abandonado um recipiente com vestígios de gasóleo;

11.6. Em suma, que não praticou qualquer facto que consubstancia a prática da infracção que lhe é imputada nos presentes autos.

CONCLUSÕES

A. Ficou provado que o gasóleo contido no depósito dos equipamentos, máquinas e viaturas referidas no Auto de Noticia e Apreensão continha uma percentagem de gasóleo colorido e marcado, conforme Boletim de Análise da DGAIEC.

B. Não foi apresentado qualquer documento que atestasse a aquisição das viaturas/máquinas apreendidas, por parte da empresa A………………, arguida nos autos.

C. Importa ainda referir que uma das máquinas tinha colado o logótipo de uma empresa sediada nas imediações da firma arguida (T……….). Na defesa escrita apresentada pela empresa, estes alegam que adquiriram as máquinas na ilha da Madeira e que as mesmas se destinavam à venda.

D. O arguido foi notificado nos termos do artigo 70° do RGIT, a fls. 28, pretendendo proceder ao pagamento antecipado da coima, nos termos do artigo 75° do RGIT.

E. Nos termos do n°. 2 do artigo 20°. do Regulamento das Custas dos Processos Tributários, por força do artigo 66°. do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei 15/2001, de 5 de Junho, são devidas custas no valor de 76,50 Euros.

F. Assim, nos termos e para os efeitos do artigo 52°., alínea a) do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei 15/2001, de 05 de Junho, remetem-se os autos à Alfândega de Peniche, para que se designem determinar o que tiverem por conveniente. (…)»;

F) Em 23/04/2013, foi proferido pelo Director da Alfândega de Peniche, o despacho da fixação da coima referente ao processo referido em D), no montante de 4.500,00€, acrescido de custas no montante de 76,50€, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e na qual se lê, designadamente, o seguinte: «(…)

DECISÃO

Concluída a instrução dos presentes autos ficou provado que:

1. O auto de notícia que deu origem ao presente processo de contra-ordenação, resultou de uma acção de fiscalização efectuada por elementos da Guarda Nacional Republicana (Destacamento de Acção Fiscal de Lisboa), em 7/01/2013 pelas 14.30h, no local denominado Estrada Nacional 109, Regueira de Pontes (Leiria), na qual se detectou uma situação irregular relativa aos seguintes equipamentos:

Veículo/Marca Modelo Chassis/descrição
Dumper Volvo ………….. S/ matrícula /61197 Km
Camião (tratar) MAN ………………. Matrícula ……….. / Tacóorafo diqital
Camião Hanomag ………- S/ matricula /1030998 Km
Henschel
Gerador Altas Cooco OAS78 801851 horas
Máquina Pá 950G 17300 horas
Carregadora CA T
Mini Retro New Holland 170 LS S/ matrícula
Máquina Giratória Volvo EC 240 BNLC S/ matrícula com 1202 horas
Gerador Pramac 276 horas
Gerador Gesan GPM 2 5745 horas

2. No decorrer dessa acção constatou-se, através de um teste de detecção rápida ao combustível contido nos depósitos dos equipamentos, que os mesmos apresentavam vestígios de utilização de gasóleo colorido e marcado (GCM)

3. A proprietária dos mesmos é a empresa A…………, Lda., NIF - …………., ora arguida.

4 A empresa não é titular de cartão electrónico para aquisição ou utilização de GCM, nem possui qualquer pedido de candidatura à sua utilização à data 5/02/2013 (informação da Direcção Geral da Agricultura e Desenvolvimento Rural).

5. De acordo com o disposto no n° 5 do artigo 93° do Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC), aprovado pelo Decreto-Lei n° 73/10, de 21 de Junho, o GCM só pode ser adquirido pelos titulares do cartão electrónico instituído para efeitos de controlo da sua afectação aos destinos referidos no seu n° 3.

6. Os equipamentos descritos no ponto 1 não se encontram autorizados à utilização de GCM, de acordo com o n.º 3 do artigo 93° do CIEC e Portaria 117-A/2008 de 6 de Fevereiro.

7. O n.º6 do artigo 93° do CIEC estipula que "A venda, a aquisição ou o consumo dos produtos referidos no n.º 1 com violação do disposto nos números 2 a 5 estão sujeitos às sanções previstas no Regime Geral das Infracções Tributárias e em legislação especial”.

8. Neste contexto, a arguida, foi notificada nos termos do artigo 70° do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n° 15/2001, de 5 de Junho, para querendo:

• Deduzir defesa dos factos que lhe são imputados no Auto de Notícia;

• Ou requerer o pagamento voluntário da coima;

9. A arguida apresentou defesa, que aqui se tem por integralmente reproduzida e a que cumpre responder

10. A arguida confirmou a propriedade dos equipamentos descritos no ponto 1.

11. Consultado o cadastro da Autoridade Tributária e Aduaneira a empresa tem atribuídos os CAE (classificação das actividades económicas) - principal 01460 (Suinicultura) e secundários números 35113 (Produção Electricidade origem Eólica, geotérmica, solar .. ), 38322 (valorização de resíduos não metálicos) e 22220 (fabricação de embalagens de plástico), não constando a actividade de aluguer e venda de máquinas em segunda mão ou actividade semelhante.

12. No local indicado como sede fiscal da empresa – E……………do R……… - Herdade da ………, C……….. (coincide com a da empresa S…………., Lda., NIF - ………,)- existe um depósito de abastecimento de GCM

13. O GCM é um produto de utilização condicionada:

- às actividades e equipamentos previstos nas alíneas c), h) e i) do n° 1 do artigo 89° e no n° 3 do artigo 93° do CIEC;

- à verificação, pela autoridade competente, do preenchimento dos pressupostos e do cumprimento das condições legais exigíveis no âmbito do benefício em causa - reconhecimento prévio (n° 2 do artigo 89º do CIEC conjugado como disposto na Portaria n.º 117 -A/2008 de 8 de Fevereiro e n° 11 da Portaria n.º 361-A/2008 de 12/05;

- à titularidade de um cartão electrónico para a aquisição do produto [n.? 5 (1.a parte), do artigo 93° do CIEC, n° 5 da Portaria n.º 117-A/2008 de 8/02 e n.º11 da Portaria n.º361-A/2008 de 12/05];

- à manutenção dos pressupostos e condições verificados à data do reconhecimento.

14. Os equipamentos previstos no n.º 3 do artigo 93° do CIEC, só podem ser abastecidos com GCM após verificação do preenchimento das condições legalmente exigíveis quer em relação ao beneficiário (condições subjectivas) quer em relação aos equipamentos (condições objectivas) de acordo com o previsto no n.º2 do artigo 89° conjugado com a Portaria n° 117-A/2008 de 08/02.

15. Qualquer utilização à revelia de qualquer uma das condições acima referidas consubstancia uma utilização indevida

16. Os termos da responsabilidade contra-ordenacional da arguida estão previstos no artigo 7.° do RGIT.

17. Não se considera necessária a audição de testemunhas nem a realização das diligências requeridas, nomeadamente nos parágrafos 31 e 33 da peça de defesa, face à prova já existente no Processo, recordando-se que a fase administrativa de um processo contra-ordenacional é uma fase inquisitória, tendo a entidade administrativa o poder de aferir da necessidade e conveniência da produção de provas que hajam sido requeridas pelo arguido (Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, Processo 401/073TBSREC2 de 11/06/2008).

18. A situação descrita, consubstancia a prática de uma infracção fiscal aduaneira prevista e punida pela alínea b) do n.º 2 do artigo 109.° conjugado com o n.º 4 do artigo 26° todos do RGIT com coima de €500,00 a €330000,00

19. Não existem nulidades processuais de que cumpra conhecer.

20. Não existem causas de exclusão da ilicitude ou da culpa.

21. Considerando os critérios de determinação da medida da coima, em aplicação do disposto no artigo 27.º do mesmo diploma, averiguou-se que:

• o agente terá agido negligentemente, o que diminui grau de culpa;

• relativamente à situação económica do agente é desconhecida;

• o agente terá retirado com a prática da contra-ordenação o benefício económico correspondente à diferença de preço entre o GCM e o gasóleo rodoviário

22. De acordo com o artigo 25.º do RGIT as sanções aplicadas às contra-ordenações em concurso são sempre objecto de cúmulo material.

23. Tendo em conta que se trata de 9 equipamentos em que foi detectada a presença de GCM, fixa-se uma coima no valor mínimo de € 500 por cada equipamento em que foi constatada a infração.

Nestes termos, atentas as circunstâncias determinantes dos autos, condeno o(a) arguido(a), ao pagamento de uma coima de €4500,00 (9 x €500), nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 109° do RGIT, a qual, beneficiando de uma redução de 25%, nos termos do artigo 78º do mesmo diploma, se fixará em €3375,00, acrescida de €76,50, a título de custas, nos termos do artigo 20.º do Regulamento das Custas dos Processos Tributários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 29/98, de 11 de Fevereiro, o que perfaz o montante total de €3.451,50.

Notifique-se o(a) arguido(a): a) do teor da presente decisão; b) de que, no prazo de 15 dias, o arguido(a) deve proceder ao pagamento da coima; c) de que esta se torna definitiva e exequível se não for judicialmente impugnada no prazo de 20 dias, nos termos do n.º 2 do artigo 79° do RGIT, sob pena de se proceder à sua cobrança coerciva; d) de que em caso de impugnação judicial, o Tribunal pode decidir mediante audiência, ou, caso o arguido e o Ministério Público não se oponham, mediante simples despacho; e) de que vigora o princípio da proibição da reforma tio in pejus, ou seja o Tribunal não poderá agravar a coima, salvo se a situação económica e financeira do arguido tiver entretanto melhorado de forma sensível; f) em caso de impossibilidade de pagamento tempestivo deve tal facto ser comunicado por escrito.

Alfândega de Peniche, 23 de Abril de 2013 »; - cfr. fls. 81 a 83 dos Autos;

G) A Arguida juntou aos autos, os documentos que aqui se dão por integralmente reproduzidos, que são cópias de facturas emitidas pela “A……………Transportes (Madeira) S.A.”, referentes a serviços executados à Arguida em 2012, relativamente a fretes - cfr. fls. 227 a 234 dos Autos;

H) Em 20/03/2014,foi subscrito pelo Comandante do Posto da GNR de Leiria, o instrumento constante a fls. 241 dos Autos, denominado “Certidão”, referente ao NUIPC ……../13.4 GCLRA, e cujos termos se dão por integralmente reproduzidos, referindo o seguinte: « (…)

Para efeitos de indemnização Civil se certifica que

Nome: Acácio ………………………..

Contribuinte ……………. Tel ……….

Morada: Estrada ………… 109, Km 162.3, ……….199 – ………..

Denunciou neste Posto o Furto do seguinte: Dano

1. Foi registado neste Posto dano em Firma, denominada “A…………, Lda.” sita na morada supracitada onde Desconhecidos, no período entre as 08h30 de 27/12/2012 e as 14h00 de 07/01/2013, introduziram-se na referida Firma, cortaram a rede de vedação e arrombaram o portão de armazém, da firma A…………., Lda., sita em Estrada ……….. 109, Km 162.3 nesta data nada foi furtado.

2. Que no dia 07/01/2013, verificou que algumas das máquinas de (geradores, pás carregadoras, retroescavadoras e dumpers) ali parqueadas, tinham no depósito de combustível, gasóleo agrícola (verde), verificou que alguns dos tampões dos depósitos de combustível encontravam-se forçados.

3. Que no parque encontrava-se alguns jarricans com restos de gasóleo agrícola, provavelmente ali deixados pelo autor/res do ilícito. (…)»

I) A Arguida tem como sócios Ana ……………, Simone ………. e a D………. – SGPS, S.A – cfr. fls. 123 dos Autos;

J) A sócia da Arguida, Simone ………., foi sócia da sociedade C………….., Lda. – cfr. fls. 143 dos Autos;

K) A sócia da Arguida, Simone ………., tem apresentado a declaração de rendimentos Mod. 3 conjuntamente com Rui ………., o qual é por sua vez administrador da T……………, S.A. – cfr. fls.129 dos Autos;

L) Encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial, a actividade de “Comércio por grosso não especificado” como objecto social da Arguida, para além de “Suinicultura, Produção e Comercialização de Energias Renováveis, Reciclagem e Fabricação de Produtos em Plástico”– cfr. certidão do registo comercial de fls. 258 a 261 dos Autos;

M) Só em algumas máquinas e viaturas que estavam parqueadas no recinto da Arguida é que foram encontrados vestígios de gasóleo colorido – cfr. depoimento da testemunha Carlos ………;

N) As máquinas e viaturas parqueadas no recinto da Arguida, não possuíam baterias – cfr. depoimento da testemunha Acácio ……………….;

O) Em 21/05/2013, a Arguida apresentou recurso da decisão referida em B) - cfr. fls. 7 dos autos.

3.2 Dos Factos Não Provados:

Com interesse para a decisão, resultaram não provados os seguintes factos:

1) Que os depósitos das máquinas e viaturas estavam praticamente vazios, tendo sido difícil retirar a quantidade de gasóleo suficiente para analisar;

2) Que no dia da inspecção, fora da vedação, estava um bidon com gasóleo colorido.

Foi a seguinte a fundamentação da decisão da matéria de facto:

Em primeiro lugar importa referir que a maioria dos factos essenciais dados como provados é incontroversa, pois são factos constantes na participação feita pela GNR e que a Arguida não alegou como sendo falsos na sua contestação – nomeadamente a existência de gasóleo colorido e marcado (GCM) no depósito de algumas máquinas e viaturas encontradas no recinto da Arguida.

Logo, não faria sentido perder mais tempo a fundamentar a decisão de dar como provados factos que a Arguida aceita como verdadeiros, e que estão cabalmente assentes em prova documental e testemunhal, limitar-nos-emos a remeter para essa prova documental indicada a cada um dos factos dados como assentes.

Dito isto, a convicção do Tribunal que permitiu dar como provados os restantes factos acima descritos assentou nos elementos probatórios carreados para os autos, analisados à luz das regras da experiência comum e segundo juízos lógico-dedutivos.

Em particular foi efectuada a análise ponderada e detalhada do teor da prova documental junta aos autos, designadamente aquela constante de fls. 23 e 24 dos Autos, correspondente ao auto de notícia elaborado pelo Destacamento de Acção Fiscal de Lisboa da GNR, bem como, o relatório de fls. 73 a 75 dos Autos, de onde se extraíram a generalidade dos factos provados, designadamente, o B) a E), cujo valor não foi abalado por qualquer outra prova junta pela Arguida.

Ainda, foi tido em conta a factura de fls. 235 dos Autos para prova do facto A) e a documentação cadastral da Administração Aduaneira constante a fls. 123 dos Autos para prova dos factos I), J), e K).

Para além desta prova foram, ainda, atendidos os seguintes depoimentos:

Carlos ………, Sargento-ajudante da GNR, a prestar funções no Destacamento de Acção Fiscal de Lisboa e autor da participação feita pela GNR.

Este depoimento foi totalmente credível, pela conjugação de vários factores: a forma como foi prestado (e aqui estamos a referir-nos à comunicação verbal e não verbal) com a conjugação do depoimento da 2ª testemunha.

Ao prestar o seu depoimento na audiência esclareceu que foi devido a uma denúncia anónima que a GNR foi às instalações de duas empresas (T………. e C………) uma vez que terão tido conhecimento da utilização de GCM nos equipamentos de perfuração destas empresas, porém após a acção de fiscalização não encontraram qualquer irregularidade; Referiu que no regresso um indivíduo terá abordado a patrulha da GNR tendo explicado que era no recinto da empresa Arguida que haveria as irregularidades; Explicou que só em algumas máquinas e viaturas que estavam parqueadas no recinto da Arguida é que foram detectados vestígios de GCM; Referiu que apenas 1 ou 2 geradores é que tinham um logotipo de uma outra sociedade; Disse que não fizeram nenhumas diligências para saber quem eram o antigo proprietário das mesmas; Referiu que não sabia se os veículos fiscalizados trabalhavam ou não, mas à primeira vista estavam em bom estado de comercialização; Explicou que não verificaram se as máquinas tinham ou não baterias; Esclareceu, por último, que tiveram algumas dificuldades em introduzir o tubo para extrair o gasóleo.

Outro depoimento importante foi o de Acácio …………., comissionista para várias empresas, inclusive para a empresa Arguida, sendo também responsável pelo parque de viaturas da Arguida; Disse que nenhuma das máquinas tinha a bateria instalada; Referiu que o local do parque das viaturas é isolado; Explicou que as máquinas foram adquiridas quer na Madeira quer no continente; Informou que fizeram várias participações à GNR de assaltos; Disse que no dia da inspecção, fora da vedação estava um bidon com gasóleo colorido marcado.

Posto isto, e neste percurso de fundamentação, chegou a altura de dar o passo seguinte, e chegamos a mais um momento da fundamentação em que entram em jogo as regras da experiência, o bom senso, e a livre apreciação do julgador.

A conclusão a que este Tribunal chegou, e que vamos procurar demonstrar de seguida, permitiu-nos tirar uma conclusão definitiva sobre a improcedência da acusação.

Para o efeito vamos regressar à denúncia referida pelo militar da GNR, o qual referiu que a GNR foi informada que determinadas empresas usavam GCM nas suas máquinas, e uma dessas empresas, de acordo com o probatório, terá sido a proprietária de algumas máquinas que estavam parqueadas no recinto da Arguida.

Por outro lado, no que diz respeito à utilização do GCM, de salientar o depoimento de Acácio ……., o qual referiu que nenhuma das máquinas estava pronta a ser usada, tendo esclarecido que nem sequer tinham baterias, o que é credível sendo o recinto da Arguida um local ermo.

De salientar que uma actuação mais diligente da GNR neste ponto, poderia ter demonstrado o contrário. E não tendo existido este cuidado, não é possível a este Tribunal concluir que a Arguida tenha utilizado o gasóleo colorido em equipamentos não autorizados, porquanto resultou dos Autos que as viaturas e máquinas foram adquiridas com a finalidade de serem vendidas e não para a Arguida as usar no âmbito das suas outras actividades comerciais.

Ou seja: Ficou provado que a Arguida comprou aquelas máquinas, e também está provado que a actividade comercial da empresa é a venda de produtos por grosso.

Assim, face ao exposto, o Tribunal considerou não provado que a Arguida tenha utilizado o GCM nas máquinas e viaturas que estavam parqueadas com a finalidade de serem vendidas.

Ainda, no que diz respeito aos factos não provados, e com relevância quanto ao apuramento do elemento subjectivo, foi relevante o depoimento da testemunha Acácio ………., que, para além de ter confirmado alguns dos factos vertidos no auto de notícia, esclareceu que aquele recinto era usado para os equipamentos serem expostos para venda.

E assim sendo, perante todo este cenário, que é pacífico, este Tribunal considera que há fortes indícios de as máquinas e equipamentos nos quais foram encontrados vestígios de gasóleo colorido, tenham vindo para a posse da Arguida já com o GCM nos seus depósitos.

Esta possibilidade, que aflora com grande consistência e solidez da prova produzida e analisada nesta audiência, vai ter importantes repercussões na análise dos restantes factos constantes no Auto de Notícia.

Recordemos o que foi dito pela 1ª testemunha sobre o estado das viaturas, o militar da GNR insuspeito, que confessou que não tinham confirmado se as viaturas estavam prontas a serem usadas. Ora, conjugado com o depoimento da 2ª testemunha, a qual disse que por ser um sítio isolado, nenhuma das máquinas possuía as baterias, demonstra que a Arguida não fazia utilização daqueles equipamentos.

Ao invés, estavam naquele recinto com a finalidade de serem vendidas.

Pelo exposto, existem indícios suficientes para abalar a convicção do Tribunal de que tenha sido a Arguida a introduzir o GSM naqueles equipamentos.

E terminamos assim a análise de toda a prova produzida.

Perante o cenário factual que a prova produzida nos apresentou, este Tribunal está em condições de concluir pela total improcedência da acusação.

Todos os factos que de acordo com a acusação pareciam indiciar que a Arguida tinha usado GCM nas suas máquinas sem qualquer justificação, são também compatíveis com uma outra leitura: A Arguida, no âmbito da actividade de venda de maquinaria, adquiriu, a outras empresas (ainda com sócios semelhantes), as referidas máquinas e viaturas que continham nos seus depósitos o GCM.

Refira-se, mais uma vez, a fraca investigação efectuada pelas entidades com competência para tal, o que implicou que tenha chegado ao Tribunal um processo com várias lacunas e, acabou afinal por nos demonstrar, com um altíssimo grau de probabilidade, a veracidade da tese da Arguida.

E ainda se assim não fosse, sempre o Tribunal recorria ao in dubio pro reo, como fundamento da absolvição.

Em suma: a GNR conseguiu apresentar provas que aquelas máquinas tinham gasóleo colorido nos seus depósitos, mas não conseguiu demonstrar que essa utilização partiu da vontade da Arguida.



Ao abrigo do disposto no artigo 662.º, al. a), do CPC, acorda-se em aditar a seguinte matéria de facto, a qual resulta dos documentos juntos aos autos:

P) A actividade de “Comércio por grosso não especificado” como integrante do objecto social da Arguida, para além de “Suinicultura, Produção e Comercialização de Energias Renováveis, Reciclagem e Fabricação de Produtos em Plástico”, a que se alude em L) supra, foi registada pela AP. 8/20140110 (cfr. certidão do registo comercial a fls. 258 a 261; fls. 260).




II.2. De direito

A Recorrente discorda da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria por considerar que dos elementos constantes dos autos só pode retirar-se a conclusão de que o GCM contido nos reservatórios dos equipamentos aí se encontra porque foi colocado por quem deles pode dispor, ou seja, a proprietária dos mesmos à data do Auto de Noticia: a Sociedade A……….., Lda.

Da leitura da primeira das conclusões do recurso resulta que a Recorrente entende que o Tribunal a quo errou na fixação do facto provado enunciado em III - Fundamentação, 3.1 Dos Factos, letra L), baseada na Certidão Permanente do Registo Comercial. Alega a Recorrente que a sentença errou porque considera o objecto social da Sociedade "Comércio por Grosso não especificado" como fazendo parte das actividades desenvolvidas à data da Auto de Notícia, em 07.01.2013, mas tal actividade apenas foi inscrita no objecto da sociedade em 10.01.2014 (conclusão A) do recurso).

Nessa sequência, conclui que fica definitivamente comprometido todo o percurso cognitivo efectuado na sentença recorrida porque nesta se associa a compra dos equipamentos à sua posterior revenda e não à sua utilização nas actividades que a Sociedade efectivamente desenvolvia (conclusão C) do recurso).

A ora Recorrente conclui ainda que o Tribunal a quo errou, considerando que vem demonstrado que é à A…………., Lda que deve ser feita a imputação da infracção. Sendo que, contrariamente ao que vem referido na sentença recorrida, a descrição do elemento subjectivo é feita na Decisão de aplicação de coima, nomeadamente pela prova da existência de GCM nos depósitos de equipamentos de que a sociedade era proprietária (sem que estivesse autorizada a sua utilização) à data do Auto de Noticia e para as actividades que desenvolvia.

Por fim alega a Recorrente que o tribunal a quo incorreu em erro de direito pela deficiente interpretação que fez do princípio in dubio pro reo (conclusões J) e L) do recurso).

Vejamos então, começando pelo imputado erro de julgamento sobre a matéria de facto, concretamente na fixação do referido facto L) do probatório.

E, neste ponto, pode já adiantar-se que não assiste razão à Recorrente.

Com efeito, o que consta do dito facto L) é que: “Encontra-se [a A……….., Lda] registada na Conservatória do Registo Comercial, a actividade de “Comércio por grosso não especificado” como objecto social da Arguida, para além de “Suinicultura, Produção e Comercialização de Energias Renováveis, Reciclagem e Fabricação de Produtos em Plástico – cfr. certidão do registo comercial de fls. 258 a 261 dos Autos” (sic). De resto, compulsada a referida certidão do registo comercial, o que se verifica é que desta consta: “Objecto: Suinicultura. Produção e comercialização de energias renováveis. Reciclagem e fabricação de produtos em plástico. Comércio por grosso não especificado.” Portanto, em total coincidência com o que ficou provado.

Não tem pois adesão à factualidade provada a afirmação efectuada de que nesta consta que à data do Auto de Notícia, em 07.01.2010 o objecto social da Sociedade A…………, Lda era “Comércio por Grosso não especificado”. Não é isso que é consignado nos factos provados pelo Tribunal a quo; e o que é dado como provado é efectivamente o que consta do elemento de prova de referência. Coisa distinta é a valoração que desse facto é feita pelo Tribunal a quo, mas tal não se confunde com o apontado erro de julgamento (análise que efectuaremos infra).

Continuando, vejamos agora se o Tribunal a quo errou, ao ter concluído que a conduta da Arguida A……………., LDA não preenchia nem o tipo objectivo (tipicidade em sentido estrito/acção típica), nem o tipo subjectivo (dolo/negligência) da contra-ordenação pela qual foi condenada.

Entendeu-se na sentença recorrida que não ficou provado que a arguida tivesse introduzido o gasóleo colorido nas máquinas e viaturas que se destinavam a serem vendidas, nem tão-pouco ficou provado que a arguida teve a intenção de usar as suas máquinas e viaturas com o GCM.

E o assim decidido é de manter. Vejamos porquê.

O n.º 2 do art. 2.° do RGIT dispõe que: “Constitui infracção tributária todo o facto típico, ilícito e culposo declarado punível por lei tributária anterior “.

Da citada norma legal, extraem-se como pressupostos do ilícito contra-ordenacional:

a) Um facto voluntário;

b) Cometido por acção ou omissão;

c) Que preencha um tipo de ilícito previsto na lei;

d) Declarado passível de coima por lei anterior ao momento da sua prática e;

e) Que o facto seja censurável.

Como referem Jorge Lopes de Sousa e Simas Santos (cfr. Regime Geral das Infracções Tributárias Anotado, 3.º ed., 2008, p. 31): “No n.º 1 deste consagra-se uma primeira vertente do princípio da legalidade ao estabelecer-se que a qualificação como infracção tributária depende do preenchimento por um facto de um tipo legal, punível por lei tributária anterior. Aproxima-se, assim, do conceito de crime (art. 1.º, n.º 1 do C. Penal) e de contra-ordenação (arts. 1.º e 2.º do RGCO), dele se distinguindo somente em função da natureza da lei que prevê e pune: a lei tributária. // Traduz o respectivo dispositivo a enunciação essencial do princípio da legalidade e da tipicidade que se impõe no domínio contra-ordenacional como no penal. [à semelhança do que se refere no C. Penal no n.º 1 do seu art. 1.º] // Significa isso que é necessário que o comportamento humano coincida formalmente com a descrição feita em norma que prevê a infracção para que como tal se possa considerar.

De igual modo, transcrevendo o ensinamento dos Autores citados (idem, p. 37):

Vale também aqui [no domínio contra-ordenacional] o princípio da culpabilidade (nulla poena sine culpa), segundo o qual toda a sanção penal ou contra-ordenacional tem como suporte uma culpa concreta, apesar da não intervenção nas contra-ordenações de uma censura de tipo ético-pessoal. Referências à culpa no domínio contra-ordenacional, encontram-se em várias disposições do RGCO (arts. 8.°-, n.º 2, 9.°-, n.°- 1, 16.°, n.°- 2, 18.°, n.º 1, 21 .°-, n.°- 1, 26.°-, al . a), e 51 .°), ultrapassada que foi o n.º 2 do art. 1.°- do RGCO, na redacção inicial, em que se previa a possibilidade de a lei prever casos de imputação de contraordenações «independentemente do carácter censurável do facto», hipótese esta que, no entanto, foi suprimida na revisão efectuada pelo DL n.4 244/95, de 14 de Setembro.

Para haver responsabilização jurídico-penal do agente não basta, pois, a realização por este de um tipo-de-ilícito (facto humano correspondente ao tipo legal e antijurídico), sendo ainda necessário que aquela realização lhe possa ser censurada em razão de culpa, o mesmo é dizer, que aquele comportamento preencha também um tipo-de-culpa.

Segundo o princípio da culpa, no direito penal, «não há pena sem culpa e a culpa decide da medida da pena» . Isto significa que a sanção só pode fundar-se na constatação de que deve reprovar--se o autor pela formação da vontade que o conduziu a decidir o facto.”

No presente caso, é precisamente no pressuposto da autoria que a sentença recorrida fez repousar o essencial do seu discurso fundamentador, afirmando-se aí que “se bem atentarmos ao elemento literal do preceito, resulta que a contra-ordenação aí prevista seja integrada por uma acção, um acto do agente infractor, um comportamento positivo no sentido do agente infractor usar o GCM em equipamentos não autorizados”. Tal como no conceito de crime, exige-se para o preenchimento do tipo contra-ordenacional que exista uma acção ou uma omissão relevante. A conduta, o comportamento humano, ou seja a acção em sentido lato, é o ponto de partida de toda a elaboração do direito penal.

No caso que nos ocupa, importa referir o art. 93.º do CIEC, o qual dispõe o seguinte:

1- São tributados com taxas reduzidas o gasóleo, o gasóleo de aquecimento e o petróleo coloridos e marcados com os aditivos definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças.

(…)

6 - A venda, a aquisição ou o consumo dos produtos referidos no n.º 1 com violação do disposto nos n.ºs 2 a 5 estão sujeitos às sanções previstas no Regime Geral das Infracções Tributárias e em legislação especial. (…).

Para além disso, estabelece o n.º 2 do art. 109.º do RGIT o seguinte:

1 - Os factos descritos no artigo 96.º, que não constituam crime em razão do valor da prestação tributária ou da mercadoria objecto da infracção, ou, independentemente destes valores, sempre que forem praticados a título de negligência, são puníveis com coima de (euro) 1500 a (euro) 165 000.

2 - São puníveis com coima de (euro) 250 a (euro) 165 000 os seguintes factos

a) Não apresentar os documentos de acompanhamento, as declarações de introdução no consumo ou documento equivalente e os resumos mensais de vendas, nos termos e prazos legalmente fixados;

b) Desviar os produtos tributáveis do fim pressuposto no regime fiscal que lhe é aplicável ou utilizá-los em equipamentos não autorizados;

(…).

Ora, de acordo com a sentença recorrida, após produção da pertinente prova, a factualidade apurada – cuja fundamentação se encontra, aliás, amplamente motivada como se constata da transcrição supra efectuada, sendo que o processo de formação da convicção do julgador quanto à apreciação da prova não vem atacado – não foi suficiente para considerar que a conduta da Arguida preenchia o tipo contra-ordenacional previsto no art. 109.º, n.º 2, b), do RGIT (pelo qual havia sido condenada), o que implicou a sua absolvição. Como sublinhou o Mmo. Juiz a quo: “Não ficou provado que a Arguida tenha introduzido o gasóleo colorido nas máquinas e viaturas que se destinavam a serem vendidas, nem tão-pouco ficou provado que a Arguida teve a intenção de usar as suas máquinas e viaturas com o GCM.

E perante a factualidade provada pela 1.ª Instância, a qual se encontra agora devidamente estabilizada, não se poderia – nem pode, entendemos nós – concluir de outra forma. Na verdade, não ficou minimamente demonstrado que a A………….., LDA tivesse utilizado gasóleo colorido. O que os autos permitem antes revelar, em tese que se aceita plenamente face ao que os autos demonstram, é que, tal como referido na sentença recorrida, que as máquinas e equipamentos nos quais foram encontrados vestígios de gasóleo colorido, tenham vindo para a posse da Arguida já com o GCM nos seus depósitos.

Ou seja, a procedência do recurso deu-se por não ter sido feita prova relativamente à autoria relativamente à presença de gasóleo colorido nas máquinas. Posição que, em face do conjunto da prova produzida e da análise crítica da mesma feita, é de corroborar, também como infra se demonstrará.

Atacando, nesta perspectiva, a questão das ilações efectuadas pelo julgador perante as provas produzidas no que ao objecto social da Arguida respeita e suas repercussões para a decisão da causa (as conclusões B) e C) do recurso), mesmo considerando a data de inscrição no registo comercial do averbamento da actividade de comércio por grosso, facto que foi por nós afinal aditado, tal não seria suficiente para conduzir a resultado diverso. Tal circunstância em nada alteraria a não verificação do pressuposto de imputação em causa, nada permitindo concluir, pois, quanto à autoria do facto típico.

É um facto que o Auto de Notícia é de 7.01.2013 e que a actividade de “comércio por grosso não especificado” apenas foi inscrita no objecto social da sociedade em 10.01.2014. E perante essa realidade poderíamos ser levados a concluir, apelando ainda a juízos de normalidade e da experiência comum, que não estando essa actividade registada então seria porque as máquinas estariam abastecidas com combustível única e exclusivamente com vista à utilização e consumo do mesmo pela Arguida na sua actividade comercial.

Sucede que a prova produzida em Juízo foi convincente no sentido de que as viaturas e máquinas foram adquiridas com a finalidade de serem vendidas, sendo que o depoimento da testemunha Acácio de Oliveira, tal como constante da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, foi peremptório quanto aquele recinto ser usado para os equipamentos serem expostos para venda. Por outro lado, também os documentos dados por reproduzidos em G) do probatório (facturas emitidas pela “A……………… Transportes (Madeira) SA”), as quais titulam diversos fretes da Ilha da Madeira para a A……………., LDA, efectuados no ano de 2012, anteriormente, portanto, à acção de fiscalização efectuada (em 7.01.2013), permitem suportar a tese da Arguida de que as máquinas foram compradas na Ilha da Madeira, tendo esta recepcionado as mesmas no estado em que vinham e lhe foram entregues, para uma posterior venda. Neste ponto afirmou-se, aliás, na sentença recorrida: “(…) perante todo este cenário, que é pacífico, este Tribunal considera que há fortes indícios de as máquinas e equipamentos nos quais foram encontrados vestígios de gasóleo colorido, tenham vindo para a posse da Arguida já com o GCM nos seus depósitos.//Esta possibilidade, que aflora com grande consistência e solidez da prova produzida (…).

Ou seja, apesar de à data da acção de fiscalização o objecto social da Sociedade arguida não identificar o "Comércio por Grosso não especificado" como fazendo parte das actividades desenvolvidas, uma vez que tal actividade apenas foi inscrita no objecto da sociedade em 10.01.2014, daí não se poderá retirar imediata e sem margem para dúvidas que as máquinas e viaturas em questão não tivessem sido efectivamente compradas com o intuito de serem posteriormente vendidas. Para além de que a prova produzida aponta, no seu conjunto, para que, por um lado, nenhuma das máquinas e viaturas estava pronta a ser usada e que, por outro, aquelas foram adquiridas com a finalidade de serem vendidas.

Distintamente se teria que concluir se não tivessem sido alegados factos e produzida prova suficiente para demonstrar isso mesmo: que nenhuma daquelas máquinas e viaturas estava pronta a ser usada e que aquelas tinham sido adquiridas com a finalidade de serem vendidas. Se isso não tivesse ficado demonstrado, a acusação mostrar-se-ia fundada e a decisão de aplicação da coima em causa haveria de ser mantida. Porém, a Arguida e ora Recorrida produziu contra-prova bastante relativamente à factualidade que lhe vinha imputada, como se vem de afirmar.

Donde, não se logrando preencher este pressuposto inicial, o da autoria, não se descortinando qualquer acção ou omissão relevante para o preenchimento do tipo em causa e que haja sido praticada pela A…………….., LDA, jamais se poderia concluir pelo preenchimento daquele tipo contra-ordenacional.

Alega também a ora Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de direito pela deficiente interpretação que fez do princípio in dubio pro reo. Também aqui sem qualquer razão.

O princípio in dubio pro reo assenta na consagração constitucional do princípio da presunção de inocência do art. 32.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa e o que o princípio nos diz é que não recai sobre quem é considerado inocente, a obrigação de ilidir a presunção dessa mesma inocência. E se a acusação – aqui entendida como a decisão de aplicação da coima – e em última instância o próprio juiz não conseguem reunir prova da culpabilidade do arguido (como foi afinal o caso, apontando-se na sentença a fraca investigação efectuada pelas entidades com competência), a ponto de o tribunal ficar numa situação de dúvida, então impor-se-á a absolvição.

Acresce que, em boa verdade, o que se constata é que o tribunal a quo não revelou dúvidas quanto à ausência de responsabilidade da A………………., LDA. A aplicação do princípio ora em discussão apenas foi colocada pelo Mmo. Juiz como reforço discursivo, como um argumento extra à fundamentação da sentença, não tendo servido de fundamento para o desfecho da acção. Ou seja, seguindo o processo decisório evidenciado através da motivação da convicção, não se chega à conclusão de que o tribunal tenha ficado num estado de dúvida; isto é, não foi considerada a existência de um non liquet a ser solucionado por esse princípio. O que o Tribunal a quo disse foi que: “ainda se assim não fosse, sempre o Tribunal recorria ao in dubio pro reo, como fundamento da absolvição” [sublinhado nosso]. Donde, como está bom de ver, não careceu de recorrer ao apontado princípio, porque entendeu como válida/aceitável a tese da Arguida. E, mesmo se assim não fosse, diremos também nós, cumprindo o princípio in dubio pro reo uma das vertentes do princípio constitucional da presunção de inocência (art. 32.º, n.º 2, 1.ª parte, da CRP), sempre este imporia uma orientação vinculativa dirigida ao juiz no caso da persistência de uma dúvida sobre os factos: em tal situação, o tribunal sempre teria que decidir pro reo.

Desse modo, a invocação de erro de julgamento a este propósito é destituída de sentido.

Razões pelas quais, tudo visto, tem o recurso que improceder.



III. Conclusões

Sumariando:

i) Do art. 2.º, n.º 2, do RGIT que dispõe que “Constitui infracção tributária todo o facto típico, ilícito e culposo declarado punível por lei tributária anterior “, extraem-se como pressupostos do ilícito contra-ordenacional ser este: a) um facto voluntário; b) cometido por acção ou omissão; c) que preencha um tipo de ilícito previsto na lei; d) declarado passível de coima por lei anterior ao momento da sua prática e; e) que o facto seja censurável.

ii) Toda a sanção penal ou contra-ordenacional tem como suporte uma culpa concreta, apesar da não intervenção nas contra-ordenações de uma censura de tipo ético-pessoal.

iii) Tal como no conceito de crime, exige-se para o preenchimento do tipo contra-ordenacional que exista uma acção ou uma omissão relevante. A conduta, o comportamento humano, ou seja a acção em sentido lato, é o ponto de partida de toda a elaboração do direito penal.

iv) Não ficando provado que a Arguida tenha introduzido gasóleo colorido nas máquinas e viaturas que se destinavam, como ficou provado, a serem vendidas, nem tão-pouco ficando provado que aquela teve a intenção de usar as suas máquinas e viaturas com o GCM, não se logra preencher o tipo contra-ordenacional previsto no art. 109.º, n.º 2, b), do RGIT (pelo qual havia sido condenada), o que, necessariamente, leva à sua absolvição.

v) Constituindo o princípio in dubio pro reo uma das vertentes do princípio constitucional da presunção de inocência (art. 32.º, n.º 2, 1.ª parte, da CRP), o mesmo impõe uma orientação vinculativa dirigida ao juiz no caso da persistência de uma dúvida sobre os factos: em tal situação, o tribunal sempre terá que decidir pro reo.




IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar, nos moldes acima descritos, a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 13 de Novembro de 2014
Pedro Marchão Marques
Pereira Gameiro
Anabela Russo