Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 07608/11 |
| Secção: | CA- 2º JUÍZO |
| Data do Acordão: | 06/01/2011 |
| Relator: | RUI PEREIRA |
| Descritores: | SUSPENSÃO DE EFICÁCIA – EXPULSÃO DO TERRITÓRIO NACIONAL – FACTO CONSUMADO |
| Sumário: | I – Se com a execução do acto cuja suspensão é requerida, o ora recorrente é expulso de Portugal para o seu país de origem [República de Cabo Verde], ficando-lhe ainda vedada a entrada no território nacional por um período de 5 anos, perdendo deste modo o seu emprego, esta situação não pode deixar de configurar-se como uma situação geradora de facto consumado, que não é afastada por uma eventual reposição da situação agora existente, se a acção principal vier a proceder. II – O critério de proporcionalidade estabelecido no nº 2 do artigo 120º funciona como limite no caso das citadas alíneas b) e c), obrigando a uma “ponderação de todos os interesses em jogo, de forma a fazer depender a própria decisão sobre a concessão ou não da providência cautelar dos interesses preponderantes no caso concreto, sempre que não seja evidente a procedência ou improcedência da pretensão formulada”. III – Alegando o recorrente que caso venha a ser executada a ordem de expulsão, será imediatamente repatriado para a República de Cabo Verde, perdendo o seu emprego, além de lhe ficar vedada a reentrada em território português durante 5 anos e se, por sua vez, o SEF nada invocou de relevante, sendo certo que o único fundamento que motivou a expulsão do recorrente do território nacional foi o facto de nele permanecer irregularmente, afigura-se que os prejuízos resultantes para o recorrente, consubstanciando uma situação de facto consumado de expulsão do território nacional, são superiores aos resultantes para a entidade recorrida ou mesmo para o interesse público, pelo que nada obsta à adopção da providência cautelar requerida. |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO João ………………….., com os sinais dos autos, interpôs no TAF do Funchal uma Providência Cautelar de Suspensão de Eficácia contra o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, pedindo a suspensão da eficácia do despacho do Director Nacional Adjunto do SEF, datado de 12-3-2010, que determinou a sua expulsão para a República de Cabo Verde, seu país de origem, pelo facto de permanecer irregularmente em Portugal. Por sentença datada de 28-1-2011, o TAF do Funchal julgou improcedente o pedido de suspensão de eficácia requerido [cfr. fls. 79/86 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido]. Inconformado, o requerente interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul, tendo concluído a sua alegação nos seguintes termos: “a) A douta sentença recorrida não fez um correcto enquadramento jurídico dos factos provados, o que, salvo o devido respeito, terá levado o douto Tribunal "a quo" a decidir mal. b) Efectivamente, a questão a analisar na presente providência cautelar, é aquela, a de se saber, considerando a argumentação que na mesma é invocada, "se se verificam os requisitos ínsitos nas normas das alíneas a) e b) do nº 1 e do nº 2 do artigo 120º do CPTA", para a sua procedência. c) Ora a esta questão, no nosso entender, deve-se responder de maneira afirmativa. d) Entendendo que sobre a decisão de que ora se recorre, pendem vícios que levam a sua nulidade. e) Em primeiro lugar, o tribunal «a quo» erra na consunção dos factos ao Direito, na medida em que utiliza factos que são alheios ao recorrente para fundamentar a sua decisão, e a este respeito veja-se os parágrafos quinto a fls. 82, e o sexto a fls. 84 da douta sentença. f) Decidindo de maneira generalizada, como de uma abstracção se tratasse, e não de uma situação factual e concreta. g) Nulidades que se invocam considerando os termos do artigo 668º, nº 1, alíneas b), c) e d) do Código de Processo Civil. h) Em nosso entender, ela contradiz-se, i) De maneira em que, num primeiro momento [o da análise da consunção do requisito da alínea a) do artigo 120º do CPTA], entende, que apesar dos argumentos aduzidos serem "pertinentes", e passando a citar "não se mostra evidente a procedência da pretensão formulada no processo principal designadamente por não estar em causa, em nosso entendimento, um acto manifestamente ilegal". j) Passa, para num segundo momento – postos a análise os critérios cumulativos da alínea b) do nº 1 do 120º do CPTA – reconhecer "que não é manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular nesse processo" [cfr. o segundo parágrafo a fls. 84 a douta sentença que ora se recorre]. k) Havendo, portanto, "a contrario sensu", viabilidade da sua pretensão no processo principal, pois que, não se pode entender doutra maneira. l) Mas que a mesma improcede, porque o recorrente não conseguiu lograr, um outro requisito cumulativo desta alínea, "os alegados prejuízos, sendo certo que tais alegações enunciam os interesses privados em presença e assumem relevância mormente para os efeitos da ponderação a que se refere o nº 2 do artigo 120º do CPTA que não para os da alínea b) do nº 1 do mesmo artigo 120º" [cfr. o parágrafo sétimo de fls. 84 da sentença]. m) Ora isso não é verdade, n) Dos prejuízos que o recorrente refere, o mais evidente, é o da sua expulsão, que a ser efectivada, terá como consequência o repatriamento do recorrente para o seu país de origem e a sua interdição em território português por um período de cinco anos, o) Lesando-o nos seus direitos, liberdades e garantias que por força da Constituição da República Portuguesa, nos seus artigos 15º, nº 1 e 20º, é-lhe reconhecido. p) Essa lesão, produz efectivamente prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal. q) Já que se for expulso para o seu país de origem veda-se assim o seu acesso ao direito [lato sensu], r) Violando-se o princípio constitucional consagrado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, na concretização do recorrente participar no seu acto. s) Essa concretização do prejuízo está ínsita no próprio acto de expulsão [saída forçada] do recorrente, t) Sendo, portanto, facto notório esse prejuízo [cfr. o artigo 514º, nº 1 do CPCivil]. u) Visando o processo principal impugnar e pedir a anulação do acto administrativo pelo qual foi ordenado a sua expulsão [cfr. o artigo 114º, nº 3, alínea e) do CPTA], tendo o mesmo já sido intentado e a correr os seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal sob o nº 108/10.4BEFUN. v) Por todo o exposto, é evidente os vícios que pendem sobre a douta sentença quando: w) Usa factos absortos ao ora recorrente para aplicar-lhe o Jus das providências cautelares, x) Decide de maneira abstracta e geral, o que revela nulidade processual, posto que o Direito deve ser aplicado aos casos concretos [cfr. o artigo 668º, nº 1, alíneas b), c) e d) do CPCivil]. y) Como ainda, quando faz uma desadequada aplicação dos fundamentos da improcedência da presente providência cautelar, z) Não restando, outra alternativa ao recorrente, a não ser a evidência das mesmas. aa) Andou mal o tribunal "a quo" no indeferimento da presente providência: pois que foi demonstrado o "periculum in mora" e o "non fumus malus" [?]. bb) Por todo o ora exposto, a douta sentença recorrida incorreu em erro, devendo ser revogada, considerando-se procedente os fundamentos ora invocados para a sua anulação e, em consequência, julgar-se procedente a presente providência cautelar.” [cfr. fls. 94/102 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido]. Contra-alegou o SEF, que para o efeito formulou as seguintes conclusões: “1ª – O acto administrativo cuja anulação é requerida nos presentes autos obedece ao previsto nas normas legais imperativas atinentes à entrada e permanência dos cidadãos estrangeiros em território nacional constantes da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho, não se encontrando inquinado de qualquer vício de direito ou de forma. 2ª – O conteúdo específico do interesse público em causa encontra completa e legítima identificação no procedimento prosseguido, que respeitou todas as garantias do ora recorrente. 3ª – Em suma, o pedido formulado pelo ora impugnante é de todo improcedente, uma vez que a validade do acto administrativo ora impugnado se configura como insindicável e o acto devido cuja condenação à prática se requer não pode ser objecto de um acto administrativo sob pena da Administração proferir um acto ilegal, em desrespeito das normas plasmadas naquele diploma legal.” [cfr. fls. 124/129 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido]. Neste TCA Sul o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer, no qual sustenta que o recurso não merece provimento [cfr. fls. 137 dos autos]. Sem vistos, vêm os autos à conferência para julgamento. II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A decisão recorrida considerou assente a seguinte factualidade: i. Com data de 12 de Março de 2010, o Director Nacional Adjunto da Direcção Regional da Madeira do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras do Ministério da Administração Interna tomou decisão do seguinte teor, designadamente: “Atento o teor do auto de primeiro interrogatório e correspondente despacho judicial, a fls. 28 a 31, assim como o teor do relatório final de fls. 48 a 51, do cidadão de nacionalidade cabo-verdiana João ………………., do sexo masculino, nascido aos 24-4-1969, considero provado que o mesmo permanece irregularmente em território nacional. O cidadão supra identificado foi detido e presente perante o Magistrado Judicial do 3º Juízo Criminal do Tribunal Judicial do Funchal que validou a detenção e aplicou a medida de coacção de TIR. Dispõe a alínea a) do artigo 134º da Lei nº 23/07, de 4 de Julho, que será expulso o cidadão estrangeiro que entre ou permaneça irregularmente em território nacional. Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, designadamente o disposto nos artigos 145º a 150º do já citado diploma, determino a expulsão do supracitado cidadão João Batista Correia Monteiro pelo facto de este permanecer irregularmente em Portugal. A expulsão será efectuada para a República de Cabo Verde, o seu país de origem, onde não se verifica o condicionalismo do artigo 143º da Lei nº 23/07, de 4 de Julho. Nos termos do disposto no artigo 144º do supra citado diploma, o citado João Batista Correia Monteiro fica interdito de entrar em território nacional por cinco (5) anos, contados a partir da execução da decisão de expulsão. [...]” – cfr. documento junto pelo requerente a fls. 72 e 73; ii. Essa decisão foi notificada ao ora requerente no dia 19 de Março de 2010, dando-se por reproduzido o teor dessa notificação – cfr. documento junto pelo requerente a fls. 72 e 73; iii. O requerente permaneceu em Portugal desde 6-8-2002 até 14-7-2007, com visto de autorização de permanência; iv. Nos anos de 2003, meses 4 e 12, 2006, meses 6 a 12, 2007, meses 1 a 4, e 2010, meses 1 e 10 a 12, o Sistema de Solidariedade e Segurança Social registou em nome do requerente remunerações de trabalho, de carácter permanente – cfr. doc. nº 3 junto com o r.i., cujo teor se dá por reproduzido; v. No dia 13-1-2009 o requerente foi internado no Serviço Regional de Saúde, EPE, Hospital Central do Funchal, com o seguinte diagnóstico, designadamente: “Utente foi internado no serviço de Cirurgia Plástica por fractura da mandíbula, tendo sido submetido a cirurgia: bloqueio intermaxilar […]”; Teve alta no dia 14-1-2009 e “foi encaminhado para a consulta de C. Plástica em 13-2-2009, às 8h” – cfr. doc. nº 8 junto com o r.i., cujo teor se dá por reproduzido; vi. O requerente celebrou denominado "contrato de trabalho a prazo" com “K………… – Caixilharia ……………, Unipessoal, Ldª”, "pelo praxo de três (3) meses, com início e efeitos a partir de 12-10-2009 e fim a 11-1-2010, podendo ser renovado até ao máximo de duas vezes por iguais e sucessivos períodos [...] com a categoria de ajudante de carpintaria [...]" – cfr. doc. nº 9 junto com o ri, cujo teor se dá por reproduzido; vii. O requerente celebrou denominado "contrato de trabalho a prazo" com “K………… – Caixilharia ……………., Unipessoal, Ldª”, "pelo prazo de três (3) meses, com início e efeitos a partir de 1-2-2010 e fim a 30-4-2010, podendo ser renovado até ao máximo de duas vezes por iguais e sucessivos períodos [...] com a categoria de ajudante de carpintaria [...]" – cfr. doc. nº 9 junto com o r.i., cujo teor se dá por reproduzido; viii. À data de 25-3-2010, o registo criminal do requerente no Arquivo Nacional de Identificação Civil e Criminal registava, designadamente: "Nada consta acerca do indivíduo acima identificado" – cfr. doc. nº 11 junto com o r.i., cujo teor se dá por reproduzido; ix. O requerente apresentou no serviço de finanças 01-2810 declaração de rendimento modelo 3 e anexo A relativo ao ano de 2009 – cfr. doc. nº 7 junto com o r.i., cujo teor se dá por reproduzido. III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Como se viu, a decisão recorrida indeferiu o pedido de suspensão de eficácia do despacho do Director Nacional Adjunto do SEF, datado de 12-3-2010, que determinou a expulsão do recorrente para a República de Cabo Verde, seu país de origem, com fundamento no facto daquele permanecer irregularmente em Portugal. Nas conclusões da sua alegação começa o recorrente por invocar a nulidade da sentença recorrida, ao abrigo do disposto no artigo 668º, nº 1, alíneas b), c) e d) do CPCivil, consubstanciada no facto do tribunal “a quo” ter errado na subsunção dos factos ao Direito, na medida em que utiliza factos que são alheios ao recorrente para fundamentar a sua decisão, sendo disso reflexo os parágrafos quinto a fls. 82, e o sexto a fls. 84 da douta sentença. Mas, manifestamente, não assiste razão ao recorrente. Com efeito, a sentença recorrida contém, nos parágrafos identificados pelo recorrente, trechos que lhe são manifestamente estranhos, dizendo respeito a outra ou outras providências cautelares. Porém, o Senhor Juiz “a quo”, face ao teor da alegação de recurso do recorrente, procurou de imediato corrigir os apontados lapsos, que de facto eram manifestos, invocando o disposto no artigo 667º do CPCivil, ordenando a respectiva supressão, por despacho constante de fls. 104/105. Deste modo, qualquer eventual contradição entre os fundamentos e a decisão, perderia relevância face à rectificação ordenada pelo despacho de fls. 104/105, pelo que não se verifica qualquer nulidade da sentença recorrida. Resta agora e apenas, apreciar se a sentença recorrida padece dos vícios que o recorrente lhe assaca. Como se viu, a providência requerida foi indeferida pelo facto do recorrente não ter logrado provar, no caso vertente, “que haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal”, abstendo-se o Sr. Juiz “a quo” de efectuar a ponderação segundo o critério previsto no nº 2 do artigo 120º do CPTA. Para chegar a esta conclusão na sentença recorrida o Sr. Juiz “a quo” considerou que o despacho em causa não era manifestamente ilegal, afastando desse modo a concessão da providência ao abrigo da alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA. E, quanto a nós, decidiu bem. Com efeito, dispõe o artigo 120º do CPTA, na parte agora relevante: “1. Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adoptadas: a) Quando seja evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal, designadamente por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal, de acto de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de acto idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou existente; […]”. A norma em causa permite que actualmente, ao invés do que sucedia face ao regime previsto na LPTA, possa ser decretada uma providência cautelar dando apenas como verificado o requisito do “fumus boni iuris”, desde que seja evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal, nos termos previstos na alínea a) do artigo 120º, supra transcrita. Em tais casos, não há necessidade de verificar a existência do segundo requisito, previsto nas restantes alíneas do citado preceito legal, ou seja, o “periculum in mora”. Contudo, como apontam a Doutrina e a Jurisprudência – seja deste TCA Sul, seja do TCA Norte, seja do STA –, essa evidência de procedência do processo principal deve, naturalmente, poder ser facilmente constatada pela simples leitura da petição, ou resultar, de forma inequívoca e, portanto, sem qualquer esforço exegético, de qualquer elemento documental junto ao processo, sugerindo os próprios exemplos que o legislador indicou no preceito que esta faculdade deve ser objecto duma aplicação restritiva [cfr., neste sentido, na doutrina, Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, na anotação 1. ao artigo 120º do CPTA, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 1ª edição, Almedina, 2005, a págs. 601/603, e Ana Gouveia Martins, in Tutela Cautelar no Contencioso Administrativo, Coimbra Editora, 2005, a págs. 507/508; e, na Jurisprudência, os acórdãos deste TCA Sul, de 15-5-2008, proferido no âmbito do processo nº 03514/08, da mesma data, proferido no âmbito do processo nº 03725/08, e de 14-6-2007, proferido no âmbito do processo nº 02604/07; do TCA Norte, de 23-10-2008, proferido no âmbito do processo nº 02591/06.3BEPRT, e de 25-9-2008, proferido no âmbito do processo nº 00977/07.5BECBR; e, do STA, de 22-10-2008, da 2ª Subsecção do CA, proferido no âmbito do processo nº 0396/08, só para citar os mais recentes]. No caso dos autos, não se vislumbra a ocorrência de qualquer vício de que pudesse padecer o despacho suspendendo – e muito menos, vício evidente –, susceptível de conduzir à conclusão de ser manifesta ou evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal. Consequentemente, jamais poderia ter-se por verificada a hipótese prevista no artigo 120º, nº 1, alínea a) do CPTA o que, só por si, impediria que fosse desde logo, e sem mais, concedida a providência requerida. Sustenta ainda o recorrente que a sentença recorrida errou na verificação dos pressupostos previstos na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA. Neste particular, a sentença recorrida limitou-se a constatar o seguinte: “[…] o requerente […] não identifica os interesses que visa assegurar no processo principal, embora se possa concluir, pelo alegado, que esses interesses passam pela anulação do acto suspendendo. Todavia, determinante é o facto de o requerente não carrear para a causa de pedir os factos que permitissem ponderar e concluir pelo fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que visa assegurar na causa principal. Pelo exposto, o requerente não logrou provar, no caso vertente, que haja fundado receio fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal”. O que está em causa no presente recurso é a verificação, ou não, do “periculum in mora”, um dos dois requisitos cumulativos exigidos na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA. E, em caso de se considerar tal requisito preenchido [contrariamente ao que entendeu a sentença recorrida], a ponderação de interesses prevista no nº 2 do referido artigo 120º [que a sentença se absteve de proceder, face à não verificação dos requisitos cumulativos da alínea b) do nº 1, como se viu]. O “periculum in mora” traduz-se no fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou na produção de prejuízos de difícil reparação [cfr. alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 120º do CPTA]. Como se decidiu no acórdão deste TCA Sul, de 27-1-2011, proferido no âmbito do processo nº 07060/10, “para o decretamento da tutela cautelar, tem o Tribunal de descortinar indícios de que essa intervenção preventiva é necessária para impedir a consumação de situações lesivas que, de outro modo, resultariam com a demora do processo principal. Esse juízo judicial terá que ser baseado na análise de factos concretos, que permitam a um terceiro imparcial concluir que a situação de risco é efectiva, e não uma mera conjectura”. Em nosso entender, e contrariamente ao que considerou a sentença recorrida, resulta da matéria de facto provada – nomeadamente da natureza do acto cuja suspensão de eficácia é requerida – e segundo um juízo de probabilidade e verosimilhança, que a execução do acto suspendendo se traduzirá, desde logo, numa situação de facto consumado. Efectivamente, com a execução do acto cuja suspensão é requerida, o ora recorrente é expulso de Portugal para o seu país de origem [República de Cabo Verde], ficando-lhe ainda vedada a entrada no território nacional por um período de 5 anos, perdendo deste modo o seu emprego. Assim, esta situação não pode deixar de configurar-se como uma situação geradora de facto consumado, que não é afastada por uma eventual reposição da situação agora existente, se a acção principal vier a proceder. Significa isto que, contrariamente, ao entendimento perfilhado na 1ª instância, se verificam os requisitos cumulativos da alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, cabendo, portanto, a este TCA Sul proceder à ponderação de interesses a que se refere o nº 2 do artigo 120º do CPTA. O critério de proporcionalidade estabelecido no nº 2 do artigo 120º funciona como limite no caso das citadas alíneas b) e c), obrigando a uma “ponderação de todos os interesses em jogo, de forma a fazer depender a própria decisão sobre a concessão ou não da providência cautelar dos interesses preponderantes no caso concreto, sempre que não seja evidente a procedência ou improcedência da pretensão formulada” [cfr. Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, Lições, 4ª edição, Almedina, 2003, pág. 301 e segs.]. Alega o recorrente que caso venha a ser executada a ordem de expulsão, será imediatamente repatriado para a República de Cabo Verde, perdendo o seu emprego, além de lhe ficar vedada a reentrada em território português durante 5 anos. Por sua vez, o SEF nada invocou de relevante, sendo certo que o único fundamento que motivou a expulsão do recorrente do território nacional foi o facto de nele permanecer irregularmente. Não foi o cometimento de qualquer acto atentatório contra a segurança nacional ou a ordem pública, o facto da sua presença ou actividades no País constituírem ameaça aos interesses ou à dignidade do Estado Português ou dos seus nacionais, a interferência abusiva no exercício de direitos de participação política reservados aos cidadãos nacionais, a prática de actos que, se fossem conhecidos pelas autoridades portuguesas, teriam obstado à sua entrada no País ou pelo facto de existirem sérias razões para crer que cometeu actos criminosos graves ou que tenciona cometer actos dessa natureza, designadamente no território da União Europeia [cfr. o disposto no artigo 134º da Lei nº 23/2007, de 4/7]. Ora, conforme se referiu, nos termos do nº 2 do artigo 120º do CPTA há que ponderar os danos e prejuízos que, num juízo de prognose relativo ao tempo previsível de duração da medida, tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, resultariam da recusa ou da concessão da providência cautelar. Ora, no caso presente afigura-se-nos que os prejuízos resultantes para o recorrente, consubstanciando uma situação de facto consumado de expulsão do território nacional, são superiores aos resultantes para a entidade recorrida ou mesmo para o interesse público. Assim, no caso concreto, consideramos que devidamente ponderados os interesses em presença, os danos que resultariam para o recorrente com a recusa da providência são superiores aos que resultam para o interesse público prosseguido pela entidade recorrida, pelo que nada obsta à adopção da providência cautelar requerida. Procedem, consequentemente, as conclusões da alegação do recorrente, sendo de revogar a sentença recorrida e de conceder a providência cautelar requerida. IV. DECISÃO Nestes termos e pelo exposto, acordam em conferência os juízes do 2º Juízo do TCA Sul em: a) Conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida; b) Decretar a suspensão de eficácia do despacho do Director Nacional Adjunto do SEF, datado de 12-3-2010, que determinou a expulsão do recorrente para a República de Cabo Verde, seu país de origem, pelo facto de permanecer irregularmente em Portugal; e, c) Condenar a entidade recorrida nas custas, em ambas as instâncias. Lisboa, 1 de Junho de 2011 [Rui Belfo Pereira – Relator] [Carlos Araújo, em substituição] [Fonseca da Paz] |