Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:522/05.7BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:10/22/2020
Relator:MÁRIO REBELO
Descritores:CERTIFICADOS DE RESIDÊNCIA.
PROVA APÓS DISPONIBILIZAÇÃO DOS RENDIMENTOS.
Sumário:1. A prova da residência em país com o qual Portugal celebrou CDT, apresentada depois de os rendimentos serem colocados à disposição dos beneficiários, não preclude o direito à dispensa de retenção na fonte à taxa normal, porque o respetivo direito emerge da lei - Convenção celebrada entre os Estados contratantes a qual define os pressupostos materiais para sua aplicação.

2. Os “formulários” destinados a provar a residência do beneficiário dos rendimentos têm caráter “ad probationem”.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

RECORRENTE: Autoridade Tributária
RECORRIDO: T........................, SA.

OBJECTO DO RECURSO:
Sentença proferida pelo MMº juiz do TT de Lisboa que julgou procedente a impugnação intentada por T........., SA. contra a liquidação IRC n.° .........., relativa ao ano de 2000, no montante de 12.693,15 EUR, julgando extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, quanto à parte do acto de liquidação revogado pela Administração Tributária e tendo anulado o acto de liquidação impugnado, na parte não revogada, com as legais consequências, designadamente em termos de restituição do valor indevidamente pago, condenando a Fazenda Pública ao pagamento de juros indemnizatórios sobre o valor pago, contados desde a data do pagamento indevido até à data da emissão da respectiva nota de crédito.

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
4.1. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou procedente a Impugnação judicial, intentada pela ora recorrida contra a liquidação de IRC, do exercício de 2000, n.° 2004, na parte em que anulou o acto de liquidação que entretanto não havia sido revogado pela Administração Tributária, e que ascendeu ao montante de 5.100,90 €.
4.2. Como fundamentos da impugnação alegou a impugnante, em suma, que a liquidação impugnada viola os artigos 8.°, n.° 2, e 112.° da Constituição da República Portuguesa, bom como o artigo 7.° dos Acordos de Dupla Tributação (ADT’s) celebrados por Portugal, uma vez que a aplicação dos benefícios constantes desses ADT’s não está dependente da obtenção dos certificados de residência fiscal em momento anterior ao pagamento ou colocação à disposição dos rendimentos, sendo certo que, in casu, encontra-se demonstrado que os beneficiários dos rendimentos em causa são residentes nos países com os quais Portugal celebrou os ADT’s.
4.3. Mais alegou a impugnante que, à data em que foi efectuada a liquidação impugnada, já se encontrava caducado o direito de proceder à liquidação, porquanto é aplicável o prazo de caducidade de 3 anos, nos termos do artigo 45.°, n.° 2, da LGT, sendo certo que, e no caso de ser aplicável antes o n.° 1 do mesmo artigo 45.°, sendo, nesse caso, o prazo de caducidade de 4 anos, tal caducidade ter-se-á verificado relativamente aos factos tributários ocorridos entre 01-10-2000 e 20-12-2000.
4.4. O Ilustre Tribunal "a quo” julgou parcialmente procedente a impugnação, declarando a ilegalidade do acto tributário impugnados, anulando, por conseguinte, a liquidação em questão, na parte em que não havia sido revogado pela Administração Tributária após a apresentação da presente impugnação, e condenado a Administração Tributária à restituição do montante de imposto entretanto pago pela impugnante, acrescidos dos juros indemnizatórios devidos, bem como nas custas judiciais da impugnação.
No entanto,
4.5. A decisão ora recorrida, não perfilhou, com o devido respeito, e salvo sempre melhor entendimento, a acertada solução jurídica no caso sub-judice.
Senão vejamos:
4.6. Entendeu o Ilustre Tribunal a quo, e em suma, por força do disposto no artigo 7.° das CDT’s em questão, afastada fica a retenção da fonte dos rendimentos obtidos em Portugal por uma sociedade não residente para efeitos fiscais, e pagos por uma entidade considerada residente em Portugal., sendo tais rendimentos tributados no Estado de residência do beneficiário de tais rendimentos.
4.7. E efectivamente assim é, desde que se verifiquem os pressupostos de que dependem a exclusão da obrigação de retenção por parte da entidade pagadora dos rendimentos, por aplicação das referidas CDT’s. E para se aferir acerca da verificação dos referidos pressupostos é necessária a sua demonstração in casu. Ou seja, é necessária a sua prova.
4.8. E no que à prova do facto referente à residência fiscal das entidades a quem foram pagas as remunerações em questão diz respeito refira-se que, em verdade, à data dos factos tributários em questão, não existia qualquer obrigação legal de tal prova ser feita através de documento, podendo a mesma, por isso, ser feita por qualquer meio de prova admissível em direito.
4.9. A questão coloca-se é no momento em que tal prova deve ser feita por quem se encontra onerado pela produção da mesma, ou seja, e in casu, pela impugnante.
4.10. É entendimento da Fazenda Pública, com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, que a referida prova de residência fiscal terá sempre de ser efectuada no momento em que as quantias pecuniárias devidas são entregues, ou são colocadas à disposição, do seu beneficiário, pois é nesse momento que se afere acerca dos pressupostos dos quais depende a aplicação das referidas ADT’s, sendo, por isso, nesse momento que nasce (ou não) a obrigação da entidade pagadora dos rendimentos de reter (ou não) o imposto devido na fonte.
4.11. E se é certo que, à data, não era exigível um concreto meio de prova da residência fiscal da beneficiária dos rendimentos, não é menos certo que para prova de determinado facto existe um concreto meio de prova que o demonstra, sendo que, in casu, o meio probatório adequado para o fazer é, indubitavelmente, o documento, concretamente, o documento oficial, emitido pela entidade competente, da residência fiscal das entidades beneficiárias dos rendimentos pagos por entidade portuguesa e obtidos em território nacional.
4.12. Ao não cumprir com este ónus que sobre si impendia no momento em que pagou os referidos rendimentos de comissões (porque foi neste momento que se aferiu acerca dos pressupostos substantivos legitimadores da aplicação das ADT’s em questão), a ora impugnante deveria ter retido o imposto devido, nos termos do disposto nos normativos acima referidos (por ser nessa altura o momento do nascimento da obrigação de retenção do IRC em questão) e, no momento em que em que fosse feita prova, junto da Administração Tributária,
da residência fiscal da sociedade beneficiária, deveria esta requerer, junto da Administração Fiscal, a devolução do imposto oportunamente retido.
4.13. com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, mal andou o Ilustre Tribunal recorrido ao considerar, com base na Jurisprudência constante do Ac. Proferido pelo TCA-Sul em 05/07/2005 no âmbito do processo n.° 5676/01, que “sendo que, embora tal prova tenha sido efectuada em momento posterior ao da data do pagamento dos rendimentos ou eventual entrega do imposto nos cofres do Estado, como resulta da jurisprudência assinalada, tal facto não tem a consequência que a Administração Tributária lhe pretende imputar, no que respeita à obrigatoriedade de proceder à retenção na fonte do imposto.”.
4.14. Razão pela qual não se vislumbra, nesta perspectiva, qualquer ilegalidade de que padeça a liquidação impugnada.
Por outro lado,
4.15. na fundamentação do decidido, invocou o Ilustre Tribunal a quo a aplicação ao caso do disposto nos n.° 1, 2, 5 e 6 do artigo 90.°-A do CIRC, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 67-A/2007, de 31 de Dezembro, mais afirmando a aplicabilidade directa à questão decidenda do disposto no n.° 6 do citado artigo 90.°-A do CIRC, por força do disposto no artigo 48.°, n.° 4, da Lei n.° 67-A/2007, de 31 de Dezembro, normativo este que determina a aplicação retroactiva do referido artigo 90.°-A, n.° 6, do CIRC.
4.16. Sempre com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimentos, andou mal o Ilustre Tribunal recorrido ao fazer apelo à aplicação retroactiva, no caso, da norma constante do n.° 6 do artigo 90.°-A do CIRC.
4.17. Isto porque o Ilustre Tribunal a quo aplicou uma norma que, à data da liquidação ora impugnada, não existia, tendo sido criada apenas com o Decreto-Lei n.° 211/2005, de 07-122005, com vigência a partir de 1 de Janeiro de 2006.
4.18. tal normativo não existia à data da liquidação ora impugnada, nem tão pouco à data da propositura da presente impugnação.
4.19. Por isso, não poderia a Administração Tributária, à data em que praticou o acto ora impugnado, ter agido de acordo com o disposto numa norma legal que, à data, não existia.
4.20. Razão pela qual a liquidação ora impugnada se encontra imaculada, não padecendo de qualquer vício que a inquine de ilegalidade - sendo a (i)legalidade da liquidação em questão a matéria que se encontra em discussão através da presente impugnação, constituindo o objecto desta, note-se.
4.21. O Ilustre Tribunal recorrido, ao aplicar o normativo constante do artigo 90.°-A do CIRC in casu, incorreu em erro de direito.
4.22. A decisão ora em crise, pelos motivos exposto, padece de erro de julgamento da matéria de direito, por violação do disposto nos artigos 88.°, n.° 1, al. g), 80.°, n.° 2, al. e) e 74.°, n.° 4, al. b), do CIRC em vigor à data dos factos tributários em questão, violando, ainda, o disposto nos n.° 1 e 2 do artigo 12.° do Código Civil, com a aplicação do disposto no artigo 90.°-A do CIRC, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 67-A/2007, de 31 de Dezembro.
Pelo que,
4.23. com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, deve ser revogada a decisão ora recorrida, com as legais consequências daí decorrentes, nomeadamente no que respeita à anulação das liquidações em questão e à condenação da Administração Tributária, á devolução à impugnante do imposto por esta entretanto pago, ao pagamento de juros indemnizatórios, bem como ao pagamento das custas judiciais da presente impugnação.
Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e acostumada JUSTIÇA!

CONTRA ALEGAÇÕES.

A T........., S.A. contra-alegou:

A) A Recorrida discorda em absoluto do entendimento preconizado pelo Recorrente quanto à suposta necessidade de certificados de residência fiscal para o accionamento das convenções para evitar a dupla tributação em vigor;

B) No ano 2000 não existia qualquer disposição legal que obrigasse os substitutos tributários, no contexto do pagamento de rendimentos a entidades não residentes, à exigência e arquivo de qualquer especifico meio de prova da residência daquelas entidades;

C) Desse modo, andou mal o Recorrente ao proceder à emissão da liquidação de IRC impugnada, resultando esta exclusivamente do entendimento de que sobre a Recorrida impendia, graças à Circular n.° 18/99, de 7 de Outubro, a obrigação formal de exigir e manter em arquivo certificados de residência fiscal, relativos às entidades beneficiárias dos rendimentos pagos, atestados pelas autoridades fiscais dos respectivos Estados de residência;

D) Não merece censura o procedimento seguido pela Recorrida na sua função de substituto tributário, tendo a mesma - no referido contexto de ausência de disposição legal de que resultasse um qualquer regime ou meio probatório específico para aplicação de disposições constantes de convenções para evitar a dupla tributação vigentes - aplicado a lei fiscal de acordo com o seu melhor juízo e em face das informações e elementos concretamente obtidos dos beneficiários dos rendimentos relativamente à respectiva residência fiscal;

E) A posição perfilhada pelo Recorrente, quanto à legalidade do acto de liquidação impugnado, equivale a aceitar como respectivo fundamento de direito o incumprimento pela Recorrida da obrigação acessória supostamente instituída pela Circular n.° 18/99, de 7 de Outubro, o que desde logo é manifestamente incompatível com, e contrário ao, disposto nos artigos 103.° da CRP e 8.°, n.° 2, da LGT;

F) Decididamente, a Circular n.° 18/99, de 7 de Outubro não era apta a criar para a Recorrida qualquer obrigação fiscal acessória relacionada com a aplicação de convenções para evitar a dupla tributação vigentes, nem tão-pouco a condicionar a aplicação dessas convenções ao preenchimento de quaisquer requisitos formais como seja o de apresentação de certificados de residência fiscal emitidos por autoridades fiscais estrangeiras;

G) É pois manifesta a ilegalidade da liquidação impugnada - e nessa medida o erro de que padece a posição assumida pelo Recorrente -, traduzindo aquela a recusa pela Administração Tributária de aplicação de convenções para evitar a dupla tributação vigentes por falta de prova através de formulário certificado pelas autoridades fiscais estrangeiras da residência fiscal das entidades beneficiárias dos pagamentos, cuja necessidade decorria apenas da referida circular administrativa;

H) Apenas a partir de 2003 veio a ter concretização legal o regime preconizado pela Administração Tributária e subjacente à liquidação impugnada, instituindo-se no artigo 90.° do CIRC um requisito formal para aplicação das taxas reduzidas constantes das convenções para evitar a dupla tributação - e uma correspondente obrigação fiscal acessória de verificação do respectivo cumprimento para os substitutos responsáveis por essa aplicação, sob pena de responsabilização pelo imposto não retido;

I) Face à inexistência de norma legal destinada a regular o procedimento de aplicação das convenções para evitar a dupla tributação, é plenamente aplicável o regime geral dos artigos 74.°, n.° 1, e 75.°, n.° 1, da LGT, o qual estabelece a presunção de veracidade das declarações dos contribuintes e faz impender sobre a Administração Tributária o ónus da prova na promoção de liquidações adicionais de imposto;

J) Enquanto substituto tributário, a Recorrida procedeu à aplicação de disposições constantes de convenções para evitar a dupla tributação internacionais que considerou aplicáveis em face das informações e elementos concretamente obtidos dos seus fornecedores, beneficiários dos pagamentos, tendo apresentado à Administração Tributária nos termos legalmente previstos uma declaração Modelo 130, discriminando pormenorizadamente os pagamentos efectuados, as respectivas entidades beneficiárias e os respectivos Estados de residência;

K) Os factos constantes da declaração Modelo 130 apresentada pela Recorrida gozam da presunção de veracidade das declarações prevista no artigo 75.°, n.° 1, da LGT;

L) Deste modo, o ónus da prova da falsidade desses factos - mormente, da eventual não residência das entidades beneficiárias dos pagamentos efectuados nos Estados indicados na declaração Modelo 130 apresentada pela Recorrida, na sua qualidade de substituto tributário - impendia sobre a Administração Tributária, em face do artigo 74.°, n.° 1, da LGT;

M) A Administração Tributária não aportou qualquer elemento probatório que infirmasse, sequer indiciariamente, os factos constantes da declaração Modelo 130 apresentada pela Recorrida, tendo cingido a fundamentação da liquidação impugnada ao incumprimento da suposta obrigação de apresentação de certificados de residência fiscal;

N) Aliás, a Administração Tributária não contestou em momento algum a residência das entidades beneficiárias das comissões pagas pela Recorrida, tendo-se limitado a exigir a apresentação de certificados de residência emitidos pelas autoridades fiscais dos Estados dos beneficiários dos pagamentos - que a Recorrida não tinha obrigação alguma de manter, despoletando a aplicação do regime de responsabilidade tributária dos substitutos tributários perante a falta dessa apresentação;

O) A Administração Tributária, caso tivesse efectivamente dúvidas sobre a veracidade dos factos declarados pela Recorrida na sua declaração Modelo 130, no que não se concede e apenas se admite por dever de patrocínio, em lugar de exigir a apresentação de certificados de residência fiscal cuja existência nenhuma lei determinava, tinha a obrigação legal, em face do princípio inquisitório expressamente previsto no artigo 58.° da LGT - e, bem assim, dos artigos 103.°, n.° 3, e 266.° da CRP de procurar confirmar essa veracidade, desde logo através dos mecanismos de troca de informações previstos nas diversas convenções internacionais aplicáveis, o que não cuidou de fazer;

P) Não tendo encetado qualquer diligência probatória, limitando-se a exigir da Recorrida a apresentação dos certificados de residência fiscal, e, perante a sua falta, a proceder à liquidação impugnada com base no incumprimento desse suposto requisito formal de aplicação das convenções para evitar a dupla tributação, a Administração Tributária praticou um acto tributário destituído de qualquer base legal ou factual bastante;

Q) Não é legalmente admissível que a Administração Tributária despolete a aplicação do regime da responsabilidade tributária de um substituto tributário - no caso a Recorrida - com base apenas no incumprimento de uma obrigação fiscal acessória sem qualquer consagração legal, prevista apenas numa circular administrativa;

R) Por tudo quanto ficou exposto, impõe-se a esse Douto Tribunal ad quem a manutenção do sentido decisório propalado pelo Douto Tribunal a quo no âmbito da sentença recorrida com a consequente anulação da liquidação impugnada e condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.°, n.° 1, da LGT, tudo com as demais consequências legais.

Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Ex.as doutamente suprirão, não pode a pretensão do Recorrente deixar de ser desatendida, negando-se provimento ao recurso, tudo com as demais consequências legais, o que se requer.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste TCA emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao julgar procedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IRC, referente ao exercício de 2000, por ter procedido ao pagamento de comissões a entidades não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal, aplicando as taxas reduzidas contidas nas normas das CDTs respetivas, sem que na altura estivesse munida dos certificados de residência das beneficiárias.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:

A) A Impugnante pagou à sociedade A......... a quantia de 166,01 EUR, em Novembro de 2000, e 406,84 EUR, em Dezembro de 2000, a título de rendimentos de comissões (cfr. documento de fls. 64 a 66 dos autos);

B) A Impugnante pagou à sociedade D......... a quantia de 223,59 EUR, em Dezembro de 2000, a título de rendimentos de comissões (cfr. documento de fls. 64 a 66 dos autos);

C) A Impugnante pagou à sociedade M......... a quantia de 11.222,40 EUR, em Outubro de 2000, 6.546,49 EUR, em Novembro de 2000, e 6.956,63 EUR, em Dezembro de 2000, a título de rendimentos de comissões (cfr. documento de fls. 64 a 66 dos autos);

D) A Impugnante pagou à sociedade O........ a quantia de 1.502,29 EUR, em Outubro de 2000, 2.696,43 EUR, em Novembro de 2000, e 2.701,07 EUR, em Dezembro de 2000, a título de rendimentos de comissões (cfr. documento de fls. 64 a 66 dos autos);

E) A Impugnante pagou à sociedade O........ a quantia de 2.713,14 EUR, em Outubro de 2000, 2.824,39 EUR, em Novembro de 2000, e 2.384,80 EUR, em Dezembro de 2000, a título de rendimentos de comissões (cfr. documento de fls. 64 a 66 dos autos);

F) A Impugnante pagou à sociedade R........ a quantia de 4.714,62 EUR, em Outubro de 2000, 3.499,18 EUR, em Novembro de 2000, e 2.462,57 EUR, em Dezembro de 2000, a título de rendimentos de comissões (cfr. documento de fls. 64 a 66 dos autos);

G) A Impugnante pagou à sociedade S........ a quantia de 7.051,32 EUR, em Outubro de 2000, 7.678,67 EUR, em Novembro de 2000, e 3.112,02 EUR, em Dezembro de 2000, a título de rendimentos de comissões (cfr. documento de fls. 64 a 66 dos autos);

H) A Impugnante não procedeu à retenção na fonte de imposto pelos pagamentos mencionadas em A) a G) supra (cfr. documento de fls. 64 a 66 dos autos);

I) Em 28.05.2001, foi emitido certificado de residência pela autoridade tributária suíça, no qual esta certifica que a sociedade O........, identificada em E), era residente fiscal na Suíça, no ano de 2000 (cfr. documento de fls. 104 dos autos e fls. 285 do processo administrativo apenso) ;

J) Em 04.03.2002, foi emitido certificado de residência pela autoridade tributária finlandesa, no qual esta certifica que a sociedade O........, identificada em D), era residente fiscal na Finlândia, no ano de 2000 (cfr. documento de fls. 99 dos autos e fls. 255 do processo administrativo apenso);

K) Em 08.03.2002, foi emitido certificado de residência pela autoridade tributária alemã, no qual esta certifica que a sociedade M........., identificada em C), era residente fiscal na Alemanha, no ano de 2000 (cfr. documento de fls. 97 dos autos e fls. 186 do processo administrativo apenso);

L) Em 08.03.2002, foi emitido certificado de residência pela autoridade tributária do Reino Unido, no qual esta certifica que a sociedade S........, identificada em G), era residente fiscal no Reino Unido, no ano de 2000 (cfr. documento de fls. 106 dos autos e fls. 336 do processo administrativo apenso);

M) Em 13.03.2002, foi emitido certificado de residência pela autoridade tributária norueguesa, no qual esta certifica que a sociedade R........, identificada em F), era residente fiscal na Noruega, no ano de 2000 (cfr. documento de fls. 108 dos autos e fls. 311 do processo administrativo apenso);

N) Em 21.03.2002, foi emitido certificado de residência pela autoridade tributária dos Estados Unidos da América, no qual esta certifica que a sociedade A........., identificada em A), era residente fiscal nos Estados Unidos da América, no ano de 2000 (cfr. documento de fls. 95 dos autos e fls. 156 do processo administrativo apenso);

O) Foi emitido certificado de residência pela autoridade tributária dos Estados Unidos da América, no qual esta certifica que D........., identificada em B), era residente fiscal nos Estados Unidos da América, no ano de 2000 (facto não controvertido, como se infere da posição da Impugnante, vertida na sua petição inicial, especial nos seus artigos 5°, 40° e 71°, e da Fazenda Pública, vertida no artigo 11° da informação junta a fls. 129 a 436 do processo administrativo apenso, para que remete nas suas alegações; facto que também se infere do teor do relatório de inspecção junto a fls. 72 a 87 dos autos; cfr. documento de fls. 51-52 dos autos e fls. 153-154 do processo administrativo apenso);

P) A Impugnante apresentou junto dos Serviços de Inspecção Tributária os certificados de residência mencionados nas alíneas I) a O) supra (facto não controvertido, que decorre do teor do relatório de inspecção e da integração dos referidos certificados no anexo II ao relatório de inspecção: cfr. fls. 156, 186, 255, 285, 311 e 366 do processo administrativo apenso);

Q) Em cumprimento da ordem de serviço n.° 34631, de 23.04.2004, os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa procederam a uma acção de inspecção à Impugnante, relativa ao exercício de 2000 (cfr. relatório de inspecção de fls. 72 a 87 dos autos e fls. 133 a 147 do processo administrativo apenso);

R) Da acção de inspecção referida na alínea anterior resultou um relatório de inspecção tributária, datado de 19.10.2004, no qual foi proposta uma correcção relativa a IRC - retenções na fonte em falta, no montante de 10.329,38 EUR (cfr. relatório de inspecção de fls. 72 a 87 dos autos e fls. 133 a 147 do processo administrativo apenso);

S) Do relatório de inspecção referido supra consta, como fundamento da correcção mencionada em R), o seguinte:


«imagem no original»

«imagem no original»


(...)” (cfr. relatório de inspecçao de fls. 72 a 87 dos autos e fls. 133 a 147 do processo administrativo apenso);

T) Sobre o relatório de inspecção mencionado na alínea S) supra, foi proferido, em 26.10.2004, parecer da Chefe de Equipa de Inspecção, concluindo que “(...) a correcção proposta deverá ser mantida (...).” (cfr. documento de fls. 71 dos autos e fls. 132 do processo administrativo apenso); 

U) Sobre o relatório de inspecção referido em S), e na sequência do parecer mencionado em T) supra, em 26.10.2004, foi proferido pelo Chefe de Divisão de Inspecção Tributária o seguinte despacho:

“Concordo.

Confirmo os procedimentos havidos, as correcções propostas e o parecer do chefe de equipa.

(...)” (cfr. documento de fls. 71 dos autos e fls. 132 do processo administrativo apenso);

V) Em consequência da correcção efectuada pela Administração Tributária, mencionada supra, foi emitida, em 18.11.2003, a liquidação de IRC n.° .........., relativa ao ano de 2000, no montante de 12.693,15 EUR, correspondendo 10.329,38 EUR a imposto e 2.363,77 EUR aos respectivos juros compensatórios (cfr. documentos de fls. 89 dos autos);

W) Em 20.12.2004, foi assinado por chefe de departamento da Impugnante certidão de notificação onde consta que, naquele referido dia, se notificou a Impugnante da liquidação identificada na alínea que antecede (cfr. documentos de fls. 90 dos autos);

X) Em 24.02.2005, deu entrada no tribunal a presente impugnação (cfr. fls.2 dos autos);

Y) A Impugnante procedeu, em 05.01.2005, ao pagamento do valor de imposto e juros compensatórios mencionado em V) (cfr. documentos de fls. 93 dos autos);

Z) Por despacho de 23.06.2005, da Chefe da Divisão de Justiça Contenciosa da Direcção de Finanças de Lisboa, foi parcialmente revogado o acto de liquidação mencionado em V) supra, por se ter entendido que “ ocorreu a caducidade da liquidação para os períodos cujo prazo de pagamento ocorreu até Dezembro (exclusive) - 7592,25 €.” (cfr. documento de fls. 429 a 437 do processo administrativo apenso).

FACTOS NÃO PROVADOS: não existem factos a dar como não provados com interesse para a decisão.

Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e do processo administrativo apenso, não impugnados, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.


*

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
A SociedadeT………….., SA impugnou a liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2000 efetuada com fundamento no pagamento de comissões a beneficiários não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal, sem que tivesse, atempadamente, em sua posse o certificado de residência nos respetivos países abrangidos pela CDT.

Depois de julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, por revogação parcial da liquidação, o MMº juiz julgou a ação procedente com fundamento em que, embora a Impugnante não tivesse em seu poder os certificados de residência na data em que colocou à disposição os rendimentos, os quais na altura nem sequer eram obrigatórios por não estarem previstos na lei, fê-lo posteriormente, sem que daí resulte a consequência que a AT pretende imputar à Impugnante. Acresce que o art.º 48º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, veio permitir a posterior prova da verificação dos pressupostos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte e estendeu este regime às situações anteriores independentemente de já ter sido efetuada a liquidação do imposto.
E em face da procedência da impugnação, julgou prejudicada a apreciação da alegada caducidade do direito à liquidação.
 
Recorrendo, a Autoridade Tributária aceita que para a prova da residência fiscal das entidades beneficiárias não existia, à data dos factos tributários em questão,  obrigação legal de ser feita através de documento, podendo a mesma ser feita por qualquer meio de prova admissível em direito.

A questão, salienta a RECORRENTE, coloca-se em saber qual é o  momento em que tal prova deve ser feita por quem se encontra onerada  pela produção da mesma, ou seja, in casu, pela Impugnante (Conclusões 4.9).

E tal momento, advoga, é o momento em que as quantias pecuniárias devidas são entregues aos beneficiários (Conclusões 4.10).

Com o devido respeito, afigura-se-nos que não tem razão, vejamos porquê.

No caso em apreço, os rendimentos colocados à disposição das entidades não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal respeitam ao ano de 2000.

Ora os Acordos de Dupla Tributação celebrados entre Portugal e os estados da residência dos beneficiários em causa[1] estabelecem em todos, de modo semelhante o n.º 1 do art. 7º, a regra de que  os lucros de uma empresa de um Estado contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça a sua atividade no outro Estado contratante por meio de um estabelecimento estável aí situado. Se a empresa exercer a sua actividade deste modo, os seus lucros podem ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem imputáveis a esse estabelecimento estável. 
Os beneficiários têm residência fiscal noutros Estados e não têm estabelecimento estável em Portugal.
Por conseguinte, à luz das respetivas CDTs, não podem ser sujeitos a tributação em Portugal.
Até aqui não há quaisquer dúvidas e a AT não questiona estes factos.

O problema reside na prova da residência - pois ninguém questiona que esta prova tem de ser efetuada -, e o momento em que o deve ser.

Quanto à prova da residência, é apodítico que a mesma terá de ser efetuada pelo devedor dos rendimentos, que neste caso assume o estatuto de substituto tributário (cfr. art.º 20º LGT).

Mas também é certo que a lei não exigia, à data, qualquer modelo ou formulário probatório pelo que, naturalmente, as circulares administrativas que isso exigiam, como é o caso da Circular n.º 18/99, não poderiam vincular os contribuintes, mas apenas os respetivos serviços.
Este é assunto pacífico[2],  pelo que nele não nos deteremos.

Ora, na falta de legislação sobre a obrigatoriedade de apresentação do original do certificado de residência do beneficiário dos rendimentos, em país contratante de Convenção para evitar a Dupla Tributação, a apresentação de outra prova que não os certificados de residência, ou formulários, não precludia a aplicação do mecanismo da isenção de retenção, pois só com a redação introduzida pela Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro na norma do n.º 3 do art. 90º do CIRC, é que passou a ser obrigatório que o devedor fizesse prova dos requisitos formais, sob pena de não obtenção dos benefícios previstos em matéria de tributação de IRC, designadamente o da retenção ser feita por valores inferiores aos da taxa normal[3].

Até lá, como bem salientou  o MMº juiz, os “...apenas com a Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro (em vigor em 01 de Janeiro de 2003), o legislador estabelece a exigência legal de um determinado “formulário” (cfr. artigo 90.°, n.° 2, 3 e 4, do CIRC), que de forma alguma é aplicável ao caso em apreço porquanto estamos no âmbito de factos ocorridos em 2000, sendo certo que a lei apenas dispõe para o futuro (artigo 12.° do Código Civil).

Ou seja, por não estar prevista na lei qualquer formalidade probatória,  a prova de residência no estrangeiro das sociedades beneficiárias de rendimentos em Portugal podia ser feita por outros meios que não os formulários aprovados pela Administração Tributária portuguesa[4].

Resolvida a questão da idoneidade da  prova da residência, vejamos o momento em que deve ser efetuada.

Notemos, antes de prosseguir, que a prova da residência no estrangeiro das sociedades beneficiárias foi efetuada, só que em data posterior àquela em que os rendimentos forma colocados à disposição das credoras, o que para a AT configura uma ilegalidade que legitima as liquidações impugnadas.
Todavia, tem-se entendido que a prova “tardia” da residência, isto é, depois de os rendimentos serem colocados à disposição dos beneficiários, não preclude o direito à dispensa de retenção na fonte, porque o respetivo direito emerge da lei - Convenção celebrada entre os Estados contratantes a qual define os pressupostos materiais para sua aplicação.
E dela não consta a exigência de que a prova seja efetuada antes da colocação à disposição dos rendimentos[5].

Por outro lado ainda, os formulários constituem meros documentos “ad probationem” (e não “ad substantiam”) razão pela qual deles não depende o nascimento do respetivo direito, podendo, como documentos probatórios dos factos ou condições legais, ser apresentados “a posteriori” dentro dos prazos legalmente fixados.

De resto, a questão tem sido objeto de apreciação pelo STA que repetidamente tem confirmado o entendimento de que os documentos, certificados de residência, não têm que estar na posse do Impugnante no momento em que os rendimentos são colocados à disposição dos beneficiários, em termos que inteiramente sufragamos[6] e que conduzem à improcedência das conclusões de recurso, nesta parte.
Por fim, a RECORRENTE também discorda da fundamentação do decidido, na medida em que, alega, o Tribunal “a quo” aplicou ao caso o disposto nos n.° 1, 2, 5 e 6 do artigo 90.°-A do CIRC, na redação que lhe foi dada pela Lei n.° 67-A/2007, de 31 de Dezembro, mais afirmando a aplicabilidade directa à questão decidenda do disposto no n.° 6 do citado artigo 90.°-A do CIRC, por força do disposto no artigo 48.°, n.° 4, da Lei n.° 67-A/2007, de 31 de Dezembro, normativo este que determina a aplicação retroactiva do referido artigo 90.°-A, n.° 6, do CIRC. (Conclusões 4.15 e 4.16).

Sobre a questão, a sentença refere o seguinte: “...o artigo 90.°-A, n.° 1, do CIRC, na redacção dada pelo artigo 48.° da Lei n.° 67-A/2007, de 31 de Dezembro, estabelece que, quando, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por uma entidade que não tenha a sede nem direcção efectiva em território português e aí não possua estabelecimento estável ao qual os rendimentos sejam imputáveis não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada, não existe obrigação de retenção na fonte de IRC no todo ou em parte, consoante os casos, relativamente aos rendimentos referidos no n.° 1 do artigo 88.° do Código do IRC.
Dispondo o n.° 2 do referido artigo que nesta situação os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova da verificação dos pressupostos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido.
Resultando do respectivo n.° 5 que “sem prejuízo do disposto no número seguinte, quando não seja efectuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, e, bem assim, nos casos previstos nos n.°s 3 e seguintes do artigo 14.°, fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei”.
Estabelecendo, por sua vez, o n.° 6 do mesmo normativo que “sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional, a responsabilidade estabelecida no número anterior pode ser afastada sempre que o substituto tributário comprove com o documento a que se refere o n.° 2 do presente artigo e os n.°s 3 e seguintes do artigo 14.°, consoante o caso, a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção”.
Sucede que o referido artigo 48.° da Lei n 67-A/2007, de 31 de Dezembro, veio estender às situações anteriores à entrada em vigor da mesma, independentemente de já ter sido efectuada a liquidação do imposto, o afastamento da responsabilidade prevista no n.° 4 do artigo 90.° e no n.° 6 do no artigo 90.°-A do Código do IRC. Só exceptuando aquele regime de afastamento de responsabilidade às situações em que tenha havido lugar ao pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação.
Ora, no caso sub judice, embora o imposto estivesse pago à data da entrada em vigor da Lei n.° 67-A/2007 (01.01.2008), estava pendente a presente impugnação (cfr. Y) do probatório). Sendo que os certificados de residência das entidades não residentes foram apresentados, embora depois do termo do prazo para entrega do imposto.
Logo, conforme tem sido entendimento jurisprudencial, de que é exemplo o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 24.02.2010 (processo n.° 0732/09), tanto basta para que se possa concluir que se verificam os pressupostos necessários para aplicação do referido normativo, do qual resulta o afastamento da responsabilidade jurídico- tributária do substituto tributário em que assenta a posição defendida nos presentes autos pela Fazenda Pública.
Face a todo o exposto, e em síntese, constatando-se que a prova da residência dos beneficiários de rendimentos auferidos em Portugal, para efeitos de dispensa de retenção na fonte, pode ser efectuada à posteriori, como o foi no caso dos autos, impõe-se concluir não ser devida a retenção na fonte que a Administração Tributária entendeu ser de efectuar, sendo, consequentemente, indevido o imposto liquidado à Impugnante por conta dessa mesma retenção na fonte”.

O MMº juiz tem razão. É a própria lei que atribui caráter retroativo determinando-se aplicável às situações anteriores à entrada em vigor da mesma[7]. E a jurisprudência também assim tem entendido, como bem salientou  o MMº juiz ao mencionar em abono da sua fundamentação o ac. do STA n.º 0732/09[8].

Assim, não tem razão a AT quando alega que não podia ter agido de acordo com o disposto numa norma legal que à data não existia, nem quando foi interposta a presente impugnação, pois é  precisamente por a norma não existir à data em que o acto foi praticado que  lhe é conferida eficácia retroativa.

Por outro lado, poder-se-á defender que por tal norma não existir na data em que foi proposta a ação impedia a AT de revogar o acto no prazo assinalado no art.º 112º/1 do CPPT.
Contudo, trata-se de uma conclusão que não temos por inquestionável uma vez que, nesse caso, estar-se-ia a frustrar a eficácia retroativa querida pelo legislador. Mas mesmo que assim se não entenda, a aplicação retroativa da norma em causa, pelos tribunais, sempre conduziria à procedência da Impugnação.

Assim, improcedendo todas as conclusões de recurso, deverá a sentença ser confirmada por não enfermar de qualquer ilegalidade.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da segunda sub-secção de contencioso Tributário deste TCAS em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 22 de outubro de 2020.

(Mário Rebelo)

[Nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, o relator consigna e atesta que têm voto de conformidade as Exmas. Senhoras Desembargadoras Patrícia Manuel Pires e Susana Barreto que integram a presente formação de julgamento.]



_____________


[1] Que no caso são os seguintes: Alemanha – Lei 12/82 de 3/6; EUA – Aprovada pela Resolução da AR n.º 39/95, de 21/6; Finlândia – Aprovada para ratificação pelo Decreto-Lei n.º 494/70, de 23/10; Noruega- Aprovada para ratificação pelo Decreto-Lei n.º  524/70 de 27/10; Reino Unido - Aprovada para ratificação pelo Decreto-Lei n.º  48497, de 24/7/1968; Suíça - Aprovada para ratificação pelo Decreto-Lei n.º  716/74, de 12/12 (com protocolo modificativo aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 87/2013 e ratificado por Decreto do Presidente da República n.º 70/2013 de 27/6)

[2] Cfr., por todos, o Ac .d o STA n.º 01988/07.6BEPRT de 16-09-2020 - Relator:       ANÍBAL FERRAZ
Sumário: I - Tanto na doutrina fiscalista, como na jurisprudência, a conclusão mais sufragada e difundida, aponta no sentido de que a interpretação da lei, realizada pela administração tributária e aduaneira (AT), através de circulares…, não tem força de lei, nem possui o caráter de vinculação próprio das normas legais, bem como, não constitui interpretação autêntica e, por isso, a sua legalidade pode ser, sempre, questionada, destacadamente, pela via contenciosa.
[3] A redacção do artigo 90º, nº 3, do CIRC passou a ser a seguinte:
“3- Nas situações referidas no número anterior, os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, da verificação dos pressupostos legais de que depende a isenção ou dos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação, consistindo neste último caso, na apresentação de um formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respectivo Estado de residência”.
[4] Cfr. Ac. do STA n.º 0283/11 de 22-06-2011 - Relator:  ANTÓNIO CALHAU         
Sumário: II - Se à data da ocorrência dos factos tributários, não existia no direito interno norma que impusesse a observância das formalidades que viriam a ser exigidas pela AF através do Despacho n.º 11701/2003, de 28/5, da Ministra de Estado e das Finanças, publicado no DR, II Série, n.º 138, de 17/6/2003, não se podia impor aos interessados a obrigatoriedade de utilização, nesse momento, de tais formulários.
III - Estes formulários não constituem requisitos “ad substantiam”, sendo a prova de residência um mero requisito “ad probationem”, já que a certificação de residência é um acto de mero reconhecimento dos pressupostos dos benefícios previstos nas convenções, limitando-se a AF à confirmação desses pressupostos, sendo que, na verdade, o que releva é a efectiva verificação dos respectivos pressupostos, pelo que não devem aqueles formulários constituir o único meio de prova necessário para certificar a sua residência.
IV - Assim, ainda que não correspondendo ao modelo oficial actual, atestando os certificados de residência apresentados a residência, e mostrando-se certificados pela autoridade fiscal respectiva, devem os mesmos ser aceites pela AF como prova efectiva da residência dessas entidades.
[5] 00129/03 – BRAGA - 28-06-2007 Relator:    Moisés Rodrigues
Sumário: I - Os pressupostos da dispensa de retenção na fonte de IRC por pagamentos feitos a entidades sedeadas na França, Reino Unido, Itália e EUA, são os que constam das respectivas CDT’s celebradas entre Portugal e aqueles países.
II - A prova da residência da beneficiária não é elemento constitutivo dessa dispensa; e uma vez feita, não poderá deixar de retroagir os seus efeitos à data da ocorrência dos factos tributários, ou seja, o pagamento dos rendimentos em causa.
III - As circulares administrativas não vinculam os contribuintes, mas apenas os respectivos serviços e, na falta de legislação sobre a obrigatoriedade de apresentação do original do certificado de residência do beneficiário dos rendimentos, em país contratante de Convenção para evitar a Dupla Tributação, ou a apresentação tardia do referido certificado, não fazia precludir a aplicação do mecanismo da isenção de retenção.
IV - Só com a redacção introduzida pela Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro na norma do n.º 3 do art. 90º do CIRC, é que passou a ser obrigatório que o devedor fizesse prova dos requisitos formais, sob pena da retenção ser feita à taxa normal.
[6] Cfr. Ac. do STA n.º 0141/14 de 14-12-2016 Relator: FONSECA CARVALHO                                                                                                                                             
Sumário: I - Existindo convenção destinada a evitar a dupla tributação há, para efeitos de conhecer da dispensa de efectuar a retenção na fonte de IRC, que atender apenas aos pressupostos materiais convencionados.
II - As normas convencionais vinculam os Estados contratantes não podendo ser alteradas pela lei interna de um deles, dada a primazia do direito convencional sobre a lei interna.
III - Ainda que seja da competência de cada um dos estados contratantes regular as normas procedimentais para efeitos da aplicação da convenção não pode aproveitar-se tal facto para em norma procedimental alterar os pressupostos materiais de aplicação da convenção sob pena de violação das normas convencionadas e do disposto no nº 1 do artigo 1º da LGT.
IV - Resulta da interpretação dos artigos 103 da CRP e 90 do CIRC que os formulários exigidos como prova da dispensa da retenção na fonte de IRC dos rendimentos auferidos por entidades não residentes são meros documentos ad probationem pelo que podem ser apresentados “a posteriori” dentro dos prazos legalmente fixados podendo ser substituídos nos termos do artigo 364 nº 2 do Código Civil.

E Ac. do STA n.º 0844/04.4BELSB 0934/17 de 14-11-2018 Relator: FRANCISCO ROTHES                                
Sumário: I - Antes da entrada em vigor da redacção dada ao n.º 3 do art. 90.º do CIRC pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2003), a lei não impunha que a prova prévia da qualidade de não residente do beneficiário dos rendimentos requerida para accionar o disposto em CDT fosse efectuada por um qualquer modo específico.
II - Assim, não questionando a AT que a sociedade à qual a impugnante efectuou pagamento em 1999 tem a qualidade de não residente em Portugal e residente nos Estados Unidos da América e fundamentando-se a correcção efectuada pela AT (que não aceitou a retenção na fonte do IRC à taxa reduzida prevista na CDT celebrada entre ambos os estados) apenas na não observância das formalidades prescritas na Circular n.º 18/99, a liquidação efectuada com base nessa correcção enferma de vício de violação de lei.

[7] O n.º 4 do art.º  48.° da Lei n 67-A/2007, de 31 de dezembro, diz expressamente que “O afastamento da responsabilidade prevista no n.º 4 do artigo 90.º e no n.º 6 do artigo 90.º-A do Código do IRC, na redacção que lhes foi dada pela presente lei, é aplicável às situações anteriores à entrada em vigor da mesma, independentemente de já ter sido efectuada a liquidação do imposto, excepto quando tenha havido lugar ao pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação”. (sublinhado nosso)
[8] Ac. do Pleno da Seção do CT do STA n.º 0732/09 de 24-02-2010 - Relator:            VALENTE TORRÃO
Sumário: I – Quando, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por uma entidade que não tenha a sede nem direcção efectiva em território português e aí não possua estabelecimento estável ao qual os rendimentos sejam imputáveis não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada, não existe obrigação de retenção na fonte de IRC (artº. 90.º-A, n.º 1, do CIRC, na redacção dada pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro).
II – Os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efectuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido (n.º 2 do mesmo artigo).
III – Quando tal prova não seja efectuada, o substituto tributário que não tenha efectuado a retenção fica desobrigado da entrega do imposto que deveria ter sido deduzido, desde que comprove com o documento a que se refere o n.º 2 do mesmo artigo a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção.
IV – Este regime é de aplicação retroactiva, por força do disposto no n.º 4 do seu art. 48.º da Lei n.º 67-A/2007.