Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:577/16.9BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:02/17/2022
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:ATRASO DA JUSTIÇA;
DANO MORAL
Sumário:I – O Estado será responsabilizado por atraso na justiça quando da factualidade apurada resultar que o processo que fundamenta aquele pedido foi julgado para além do «prazo razoável», que esse atraso se ficou a dever a culpa dos serviços do Estado, que daí decorreram danos para a Autora e que existe uma relação direta entre essa demora e os prejuízos cujo ressarcimento se peticiona.

II – A apreciação da razoabilidade de duração dum processo terá de ser feita em concreto, apreciação essa em que importa atender, nomeadamente, à complexidade do processo, ao comportamento das partes, à atuação das autoridades competentes no processo e à natureza do litígio.

III – Tendo ficado provada uma atuação da administração da justiça do Estado ilícita e culposa, porque a morosidade processual verificada foi, em boa medida, decorrente da sua atuação, pelo menos, a título de culpa leve, sempre o Estado deverá ser responsabilizado pelo referido atraso, dentro dos limites e padrões fixados na jurisprudência nacional e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

IV - O dano moral constitui o dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
J...., Professor Auxiliar do Instituto Superior Técnico, melhor identificado nos autos, intentou Ação Administrativa contra o Estado Português, peticionando, a final, a sua condenação a indemniza-lo pelos prejuízos sofridos pelo atraso na prolação da decisão final transitada em julgado, no montante de €140.644,40.

O TAC de Lisboa veio a proferir Sentença em 10 de setembro de 2019 condenando o Estado Português “(…) a pagar ao autor, a quantia de 4.000€, acrescidos de juros de mora desde a citação até integral pagamento, a título de danos não patrimoniais causados pelo funcionamento anormal dos serviços de administração da justiça”

Inconformado com a Sentença proferida, veio o Autor, em 16 de outubro de 2019 a Recorrer da referida Sentença, aí tendo concluído:
“14- A Douta Sentença está eivada de erro de julgamento, aplicando, de forma errada, o direito, aos factos em causa:
15- Assiste ao Recorrente, e a todos os cidadãos, A. ou RR., no âmbito da Tutela jurisdicional efetiva consagrada no artigo 2º. do CPTA o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, cada pretensão regularmente deduzida em juízo, bem como a possibilidade de a fazer executar, mais, a todo o direito ou interesse legalmente protegido, corresponde a tutela adequada junto dos tribunais administrativos, designadamente para o efeito de obter o reconhecimento de situações jurídicas subjetivas diretamente decorrentes de normas jurídico-administrativas.
16- O Recorrente recorreu à presente ação administrativa para reconhecimento e ressarcimento, daquele foi e está documentado junto aos autos, o prejuízo decorrente direta e necessariamente do funcionamento anormal do serviço, ilicitude essa decorrente da violação do direito a uma decisão jurisdicional em prazo razoável;
17- Que a douta Sentença Recorrida entendeu verificado;
18- Infelizmente, daí em diante, laborando no equívoco de que, por um lado, não existe nexo de causalidade entre os danos verificados e que esta reconhece existirem, e a ilicitude verificada, o que não é aceitável pois tal nexo é perfeitamente verificável;
19- Depois, que, existindo ilícito e nexo de causalidade, que, embora afastado, resulta das próprias conclusões da sentença, pois os danos são reconhecidos (à exceção dos danos morais), estes danos são imputáveis a outro, por via da alegada possibilidade utilização do mecanismo da Execução de sentença;
20- O que, também, é fruto de equívoco, pois que, por um lado nunca o R (IST) deveria, também ele, pagar pela ilicitude do atraso da justiça, e, depois, porque, ainda que essa questão não se levantasse (como raramente se levanta) não lhe é legalmente imputável o cumprimento retroativo da decisão por inexistência de enquadramento legal que o permita;
21- Assim, e em resumo, sendo aplicável, em matéria de responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional, o regime da responsabilidade por factos ilícitos cometidos no exercício da função administrativa, os pressupostos ou requisitos da responsabilidade administrativa são os requisitos clássicos da responsabilidade:
a) facto ilícito;
b) culpa, presumindo-se culpa leve na prática de atos jurídicos ilícitos:
«Sem prejuízo da demonstração de dolo ou culpa grave, presume-se a existência de culpa leve na prática de atos jurídicos ilícitos» (cf. art. 10.º, n.º 2).
c) dano e nexo de causalidade;
22- Decorre, claramente do disposto no n.º 4 do artigo 20.º da Constituição, segundo o qual todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável, que praticamente reproduz o disposto no artigo 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
23- A Douta Sentença considerou verificado que o Estado Português incorreu em responsabilidade civil extracontratual, com o respetivo dever de indemnizar o Autor pelos danos por esta sofridos, em resultado do funcionamento anormal do serviço, ilicitude essa decorrente da violação do direito a uma decisão jurisdicional em prazo razoável; pelo que se verificam os pressupostos de ilicitude e culpa;
24- Quanto ao nexo de causalidade afere-se da seguinte forma: quem estiver obrigado a reparar o dano nos termos da lei em análise, deve restituir a situação que existiria se não tivesse ocorrido o dano que obriga à reparação (artigo 3.º, n.º 1 da Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro).
25- Trata-se do princípio da restauração natural ou da indemnização específica dos interesses lesados, em paralelo com o que se prescreve no artigo 562.º do Código Civil.;
26- Funcionando também aqui a possibilidade da restituição por equivalente, ou seja, em dinheiro, nos casos de a restituição natural não ser possível ou não reparar integralmente o dano ou for excessivamente onerosa para o Estado, tal como decorre do n.º 1 do artigo 566.º do Código Civil (artigo 3.º, n.º 2);
27- Nos termos do n.º 3 deste artigo, o dano considerado é o prejuízo causado nos bens jurídicos do respetivo titular, de carácter patrimonial ou não patrimonial, e os produzidos ou futuros, nos termos gerais de direito, em paralelo com o que se prescreve nos artigos 564.º e 496.º, n.º 1, do Código Civil.
28- A Lei n.º 67/2007 não contém norma que se refira expressamente ao princípio da causalidade. Todavia, expressa que a responsabilidade a que se reporta compreende os danos patrimoniais e não patrimoniais, os emergentes e os futuros, nos termos gerais do direito.
29- A referida remissão justifica a aplicação no âmbito da responsabilidade civil de direito público, a que aquela lei se reporta, o que se prescreve no artigo 562º do Código Civil, segundo o qual a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.
30- Neste ponto, a lei estabelece a solução da causalidade adequada na sua formulação negativa, segundo a qual uma condição do dano deixará de ser considerada causa dele sempre que seja de todo indiferente para a sua produção e só se tenha tornado sua condição em virtude de outras circunstâncias extraordinárias.
31- Em consequência, o juízo sobre a causalidade integra, por um lado, matéria de facto, certo que se trata de saber se na sequência de determinada dinâmica factual um ou outro facto funcionou efetivamente como condição desencadeante de determinado efeito, e, por outro, matéria de direito, designadamente a determinação, no plano geral e abstrato, se aquela condição foi ou não causa adequada do evento, ou seja, dada a sua natureza, se era ou não indiferente para a sua verificação.
32- O atraso determinou a integração tardia do professor e fê-lo perder as retribuições e outros benefícios a que teria direito ocorrendo a sentença num prazo razoável e com esta à condenação na integração;
33- Corre por conta do Estado o atraso e a suas consequências que não são imputáveis ao então R (IST), quer porque derivam diretamente do atraso, que a todos penaliza, quer porque não existe norma que permitisse fazer essa imputação.
34- Pelo que se reiteram os pedidos de condenação efetuados quanto aos danos decorrentes do ilícito:
a) Indemnização que se arbitra em um vencimento bruto por ano de atraso na prolação da decisão final transitada em julgado, a contar de 30 de janeiro de 2008, e assim, em € 15.876,95 (€ 3.175,39x5);
b) € 5.000, contabilizando-se em € 1.000 por cada ano de vigência da lei até ao trânsito em julgado da sentença, para indemnização da insegurança e a angústia causadas pela situação, que não necessitam de ser provadas pois resultam de senso comum e do conceito de bónus pater familiae, seja, qualquer pessoa os sentiria em situação idêntica;
c) O pagamento do valor de € 6.292, a título de indemnização pela possível diferença no cálculo da pensão face aos vencimentos que deveria ter auferido nos cinco anos em causa;
d) Verbas que totalizam o montante de € 140.644,40.
Pretendendo-se que do Douto Acórdão nasça o reconhecimento, pelo direito invocado, e factos verificados, do direito ao pagamento de todas as verbas elencadas e devidamente fundamentadas.
Pelo que deve o presente Recurso ser julgado procedente e a sentença revista em conformidade, que é o que, humildemente, se requer, pelo presente, assim se fazendo devida JUSTIÇA!”

O Estado Português, através do Ministério Público, igualmente recorre da Sentença proferida em 1ª Instância, em 21 de outubro de 2019, concluindo:
“1- O instituto da responsabilidade civil extracontratual pressupõe a existência de um facto ilícito, de um dano, da verificação do nexo de causalidade entre aquele facto e o dano e da culpa do agente (art° 483c, nº 1 do CC e Lei n°67/2007, de 31/12). Contudo o Tribunal "a quo”, sem sequer se debruçar sobre a existência de um facto ilícito, invoca, desde logo a suposta alegação da existência de danos morais, encerrando assim o litígio.
2- Sucede que a verificação de danos decorrentes da violação do direito fundamental à decisão judicial num prazo razoável, depende intrinsecamente da existência de tal violação, e que no caso não foi minimamente demonstrado.
3- O Tribunal “a quo" impediu a demonstração dessa violação, e, portanto, a existência do facto ilícito e culposo, pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado, aqui em causa.
4- Só depois de objetivamente provada essa violação, é que funciona a presunção natural ou judicial de dano moral.
5- Termos em que o Juiz “a quo" deveria necessariamente ter aferido da existência de facto ilícito, antes de analisar os danos enquanto pressuposto da responsabilidade civil.
6- Verificando-se no caso sub judice, uma verdadeira omissão de pronúncia pelo Tribunal “a quo”, que desde já se invoca e que determina a nulidade da sentença recorrida, nos termos do art° 615°, nº 1, al. d) do CPC.
7- Já que, o Tribunal “a quo" não conheceu em absoluto de todas as considerações feitas pelas partes, por as refutar desnecessárias para a produção de prova e consequente resolução da causa.
8- Isto é, no caso vertente, não apreciou os motivos e considerações invocadas pelas partes em sustentação do seu ponto de vista.
9- Nem sequer foram apreciadas as teses do Réu Estado, apresentadas na sua contestação.
10- Mas pior ainda, nem sequer houve produção de prova, limitando-se a ser proferido "despacho-sentença”; que não mais é senão um mero despacho interlocutório.
11-Não decorre da lei que as ações ou omissões praticadas no exercício das "funções públicas, e por causa desse exercício, geram sempre ' e automaticamente responsabilidade civil e por isso. um dano.
12- Termos em que a sentença recorrida incorre em erro de julgamento.
13- Violando ainda o disposto no art° 615º, nº 1, ais. b) e d) do C.P.C.
Deverá por isso, ser concedido provimento ao presente recurso e em consequência, a sentença ser revogada, V. Exas. Farão JUSTIÇA!

O mesmo Estado Português veio em 18 de novembro a apresentar Contra-alegações de Recurso, aí tendo concluído:
1 – A sentença recorrida, não incorre em erro de julgamento.
2 – Inexiste nexo de causalidade entre o facto e o dano pelo que inexiste obrigação de indemnização.
3 – Mantendo a Sentença recorrida, na parte em que se absolveu parcialmente o Réu Estado Português, do pedido, far-se-á Justiça.”
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
As principais questões a apreciar resultam, designadamente, da necessidade de verificar os suscitados atrasos da justiça, verificando, como recursivamente alegado pelo Autor, se se verificará erro de julgamento, em resultado de errada forma como o direito foi aplicado aos factos em causa, ou se, como alegado pelo Estado Português, se inverificará qualquer ilicitude determinante da atribuição de indemnização, e que teria suportado a sua tese de verificação de omissão de pronuncia, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada, e não provada, a qual aqui se reproduz:
Com interesse para a decisão da causa, mostram-se provados os seguintes factos:
a) A 01/07/2004, deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loures – Lisboa 2 – Restelo, a petição inicial que deu origem ao Proc. 368/04.0BELRS, (cfr. fls. 1 do 1.º volume do referido Proc. 368/04.0BELRS apenso aos autos (Processo));

b) A referida ação, constituía-se como uma ação administrativa especial, de impugnação do ato administrativo de 24/03/04, da autoria do Presidente do Instituto Superior Técnico, sendo peticionado, a final, a anulação do ato impugnado e a condenação na prática do ato devida, no caso a “contratação do A. como professor Auxiliar do Departamento de Engenharia Informática do IST”, bem como se “determine ao R. que sejam salvaguardados todos os direitos que o A. teria se não fosse praticado o ato ilegal” (cfr. fls. 6 do Processo);

c) A 21/10/2004, mostra-se assinado o ofício de citação da entidade demanda (cfr. fls. 31 do Processo);

d) A entidade demandada não contestou (cfr. fls. 31 e segs. do Processo);

e) A 19/01/2005, a entidade demandada remeteu aos autos o Processo Administrativo Instrutor (cfr. fls. 37 do Processo);

f) A 17/05/2005, o mandatário do autor foi notificado da apensação aos autos do processo administrativo instrutor (cfr. fls. 39 dos autos);
g) A 18/05/2005, o Ministério Público (MP) emitiu pronúncia, nos termos do artigo 85.º, n.º4 e 5 do CPTA (cfr. fls. 41 a 43 do Processo);

h) A 30/06/2005, foi expedido para as partes o ofício de notificação da pronúncia do MP, a que se reporta a alínea anterior do probatório (cfr. fls. 44 e 45 do Processo);

i) A 15/04/2005, a entidade demandada remeteu aos autos, processo administrativo instrutor, relativo à nomeação de professora auxiliar para aquele instituto (cfr. fls. 50 do Processo);

j) A 23/11/2005, foi remetido ofício de notificação para a entidade demandada pronunciar-se sobre o novo vício invocado pelo MP (cfr. fls. 59 do Processo);

k) A 07/12/2005, deu entrada no Tribunal resposta da entidade demandada ao invocado vício (cfr. fls. 63 e segs. do Processo);

l) A 14/12/2005, mandatário do autor e o MP, foram notificados da apensação aos autos de processo administrativo (cfr. fls. 77 e 78 do Processo);

m) A 06/01/2006, o Ministério Público emitiu pronúncia, pugnando pela nulidade do ato impugnado (cfr. fls. 80 e 81 dos autos);

n) A 09/01/2006, foram as partes notificadas da pronúncia do MP (cfr. fls. 89 e 86 dos autos);

o) A 12/01/2006, foi proferido Despacho Saneador, tendo sido ordenada a notificação das partes para alegações escritas sucessivas (cfr. fls. 87 dos autos);

p) A 05/04/2006, foram as partes notificadas do referido despacho saneador (cfr. fls. 89 e 90 dos autos);

q) A 08/05/2006, o autor apresentou alegações escritas (cfr. fls. 91 e segs. do Processo);

r) A 06/06/2006, a entidade demandada apresentou alegações escritas (cfr. fls. 113 e a 119 do Processo);

s) A 13/10/2006, a entidade demandada foi notificada para juntar aos autos processo administrativo relativo ao concurso aberto pelo aviso n.º5037/2003, para assistente do Departamento de Engenharia Informática do IST (cfr. fls. 128 do Processo);
t) A 25/10/2006, a entidade demandada veio apresentar o processo administrativo instrutor solicitado (cfr. fls. 130 do Processo)

u) A 27/11/2006, o Ministério Público foi notificado da apensação aos autos do processo administrativo instrutor (cfr. fls. 137 do Processo);

v) A 05/05/2007, foram as partes convidadas a apresentarem o suporte informático dos articulados (cfr. fls. 140 e 141 dos autos);

w) A 25/05/2007 e a 31/05/2007, as partes apresentaram o suporte informático dos articulados disponíveis (cfr. fls. 144 e 145 dos autos);

x) A 08/12/2007, foi aberta vista aos Juízes Adjuntos (cfr. fls. 148 e 149 do Processo);

y) A 31/01/2010, foi proferida sentença que, julgou a ação procedente e anulou o ato por violação de lei e condenou a entidade demandada “à prática de todos os atos necessários à efetivação do direito do A. à sua contratação como Professor Auxiliar do Departamento de Engenharia Informática do IST, na sequência do aviso n.º5036/2003, publicado no DR IIª Série, n.º87, de 12 de abril de 2003” (cfr. fls. 151 a 160, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);

z) A 19/02/2010, foi expedido para as partes, o ofício de notificação da sentença a que se reporta a alínea anterior do probatório (cfr. fls. 161 e 162 do Processo);

aa) A 23/03/2010, a entidade demandada apresentou recurso da sentença dirigida ao Tribunal Administrativo Central Sul (cfr. fls. 172 e segs. do Processo);

bb) A 30/04/2010, foi admitido o recurso interposto (cfr. fls. 184 do Processo);

cc) A 03/12/2010, foi ordenada a subida do recurso (cfr. fls. 187 do Processo):

dd) A 20/12/2010, foi remetido o processo ao Tribunal Central Administrativo do Sul (cfr. fls. 190 do Processo);

ee) A 07/03/2013, foi proferido Acórdão que não admitiu o recurso jurisdicional, por legalmente inadmissível (cfr. fls. 195 a 197 do Processo Vol II, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
ff) A 08/03/2013, foram as partes notificadas do referido Acórdão (cfr. fls. 200 e 201 do Processo);

gg) A 19/03/2013, o acórdão supra referido transitou em julgado (cfr. fls. 200 a 201 do processo);

hh) A 28/01/2014, pelo Presidente do IST foi proferido o Despacho 2014/2014, no qual pode ler-se, o seguinte (cfr. DR, 2ª Série, n.º27, de 7 de fevereiro de 2017, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido):
“Por sentença do TAC de Lisboa de 31 de janeiro de 2010, que pôs termo ao processo 368/04.0BELRS, foi condenado este Instituto, e transcreve-se, «à prática de todos os atos necessários à efetivação do direito do A. à sua contratação como Professor Auxiliar do Departamento de Engenharia do IST, na sequência do aviso 5036/2003, publicado no DR 2.ª série, n.º 87, de 12 de abril de 2003. Os atos cuja prática vai determinada deverão ter lugar no prazo de 30 dias, concretamente, a notificação do A. para apresentar a documentação necessária à sua contratação».
Por acórdão do TCA Sul de 7 de março de 2013, transitado em julgado em 19 de abril de 2013 e que pôs termos ao processo 07086/11, não foi admitido o recurso interposto pelo Instituto da sentença atrás transcrita na sua parte decisória, «com as legais consequências».
Assim e em execução das sentenças judiciais atrás referidas determino.
1 - A contratação do Doutor J.... como Professor Auxiliar do Departamento de Engenharia Informática deste Instituto, com efeitos a partir de 19 de abril de 2013, data do trânsito em julgado do acórdão do TCA Sul atrás referido.
2 - Que o Doutor J.... entregue, nos 30 dias subsequentes à sua notificação deste despacho, na Direção de Recursos Humanos deste Instituto, a documentação necessária para a sua contratação como Professor Auxiliar agora determinada.
3 - A DRH deve, de imediato, notificar o Doutor J.... deste despacho que deve também ser publicado no DR”.
ii) A 10/03/2016, deu entrada no Tribunal a petição inicial que deu origem aos presentes autos (cfr. fls. 1 da numeração SITAF);
jj) Em certidão emitida pelo Serviço de Finanças de Odivelas, pode ler-se que o aqui autor, relativamente aos “anos económicos 2005, 2006, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011, 2012 e 2013 constata-se que não foi entregue qualquer declaração de rendimentos, a que se refere o artigo 57.º do Código do IRS, nem consta na respetiva base de dados Modelo. 10., DMR de ISR, na presente data, por obtenção por parte do requerente de quaisquer rendimentos sujeitos à obrigação de entrega da competente declaração” (cfr. doc. junto aos autos a 05/04/2016, de fls. 53 e segs. da numeração SITAF);
Não provado que “ o risco do não provimento definitivo, tenha provocado angústia e sofrimento ao autor, obrigando-o a um trabalho árduo e extenuante, pois não se pode recusar a qualquer serviço que sob pena de ser entendido como incompetência ou desleixo”.

IV – Do Direito
Sistematizamos desde logo o originariamente peticionado:
São peticionados, a título de danos patrimoniais, os que resultam do atraso na integração da carreira e consequente recebimento da retribuição devida e que se reporta ao vencimento bruto para Professor Auxiliar – correspondente ao índice 195, sucessivamente aplicável, e que cifrará em 103.765,45€, vencimentos que o Autor terá deixado de auferir.

Mais peticionou o Autor a titulo acrescido pelo risco do período experimental, 15.876,95€

Pela angustia de espera por decisão 5.000€ (1.000€ por cada ano de atraso).

Acrescem 6.292€ “a titulo de indemnização pela possível diferença no cálculo da pensão …”

Tudo o peticionado totalizaria 140.644,40€, valor que, em qualquer caso, é superior à soma das parcelas indicadas.

O Tribunal a quo decidiu atribuir ao Autor exclusivamente uma indemnização de 4.000€ a titulo de danos não patrimoniais.

Analisemos o Recursivamente suscitado.

Recurso do Autor:
Há um equivoco do Autor, logo na sua PI, pois que tendo sido, por decisão judicial, integrado, como pretendido, no IST, vem peticionar o valor dos vencimentos que deixou de receber anteriormente a esse facto, a titulo de atraso da Justiça, o que não merece acolhimento, como mais em pormenor se verá.

O certo é que o Autor, veio interpor recurso da sentença que julgou parcialmente procedente a ação que propôs contra o Estado Português, por atraso na administração da justiça.

Entende o Recorrente Autor que o tribunal a quo terá aplicado erradamente o direito aos factos dados como provados.

Sendo aplicável à responsabilidade civil por danos decorrentes do exercido da função jurisdicional, o regime da responsabilidade por factos ilícitos cometidos no exercício da função administrativa, os requisitos a atender são os tradicionais, a saber:
a) facto ilícito;
b) culpa,
c) dano e nexo de causalidade.

Conforme reiterado pela Doutrina e Jurisprudência, decorre do disposto no n.° 4 do artº 20.° da CRP que todos têm direito a que numa causa em que intervenham, seja objeto de decisão em prazo razoável, normativo que corresponde ao Artº 6.°, n.° 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

A Sentença recorrida considerou verificado que o Estado Português incorreu em responsabilidade civil extracontratual, com o respetivo dever de indemnizar o Autor, exclusivamente por danos não patrimoniais, em decorrência do deficiente funcionamento da Justiça, ilicitude resultante da violação do direito a uma decisão jurisdicional em prazo razoável.

No que respeita aos Danos Patrimoniais reclamados, discorreu-se em 1ª Instância:
Antes de mais, quanto aos danos patrimoniais, cumpra apenas referir que não pode ser assacada ao Estado qualquer responsabilidade pela eventual perda de vencimentos que deveria ter recebido e não recebeu, porquanto, sendo o dispositivo da sentença proferida naquele autos, constituído por uma parte anulatória e outra condenatória, e que no fundo, acarretava a anulação do ato impugnado e condenação à prática de todos os atos necessários à efetivação do direito do A. à sua contratação como Professor Auxiliar do Departamento de Engenharia Informática do IST, na sequência do aviso n.º5036/2003, publicado no DR IIª Série, n.º87, de 12 de Abril de 2003, tendo em consideração regime de execução de sentenças previsto nos artigos 157.º e segs. do CPTA, se a sentença não foi integralmente executada pela entidade demanda, não pode ser essa responsabilidade assacada ao Estado.
Sendo certo que o dever de executar, nos termos previstos no artigo 173.º do CPTA, “constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no ato entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter atuado” bem poderia o autor, em devido tempo, lançado mão da competente ação executiva, o que não se vislumbra ter feito, por forma à exigir ao IST a reconstituição da situação hipotética se tivesse sido admitido no referido concurso. E se não o fez, seja por desconhecimento do direito que lhe assistia, seja por falta de aconselhamento jurídico, seja até por vontade própria do autor, não pode tal reconstituição ser operada por via da responsabilidade do extracontratual do Estado, por atraso na justiça, pois que o nexo de causalidade é totalmente inexistente.
Não pode o autor confundir um dano que foi produzido através de um ato ilegal, que foi anulado, por via judicial, e cujo regime legal de execução lhe permitiria a recuperação integral dos vencimentos que devia ter ganho e deixou de ganhar por via daquele ato, bem como os respetivos juros, com o facto relacionado com o atraso na justiça.”

É assim patente que se o aqui Recorrente não recebeu os vencimentos que decorreriam do sentido das decisões judiciais proferidas, tal terá resultado da sua inércia, só se podendo queixar de si próprio, não sendo imputável aos Tribunais e ao Estado, enquanto dano patrimonial decorrente de atraso da Justiça.

Com efeito, mercê de decisão favorável ao aqui Recorrente, transitada em julgado em 19 de abril de 2013, foi o mesmo integrado a partir desse dia como Professor Auxiliar do Departamento de Engenharia Informática do IST, pelo que, sendo caso disso, quaisquer remunerações devidas face ao período anterior, teriam de ser assumidas pelo referido Instituto, e não “cobradas” ao Estado a titulo de atraso da Justiça.

Efetivamente, mal se compreenderia que vencimentos indevidamente não pagos ao Autor pelo IST, viessem a ser pagos pelo Estado a titulo de Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado por danos decorrentes do exercício da função jurisdicional, e, em concreto, por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoáveluma vez que foi esta a causa de pedir configurada pelo Autor na sua PI.

Do mesmo modo, os peticionados 15.876,95€, pelo risco do período experimental é valor que caberia ao Autor justificar, o que não logrou fazer.

Como se afirmou na Sentença Recorrida Por sua vez, quanto aos danos não patrimoniais, referentes ao período experimental, para além de ser aplicável o mesmo raciocínio supra descrito, não foi feita prova do referido dano no valor peticionado de 15.876,95”

Não logrou ainda o Autor fazer prova dos reclamados 6.292€ “a titulo de indemnização pela possível diferença no cálculo da pensão …”, pois que, mais uma vez, o período a contabilizar para efeitos de reforma e pagamentos dos correspondentes descontos, sendo caso disso, teriam de ser assegurados pelo IST.

Quanto aos Danos Não patrimoniais fixados em 1ª instância em 4.000€, uma vez que o Autor vem recursivamente peticionar um valor superior, e o Estado, o não pagamento de qualquer valor, serão, neste aspeto, ambos os Recursos tratados simultaneamente.

Discorreu-se em 1ª Instância:
Considerando o período global de cerca de 9 anos, sendo esse um prazo efetivamente, excessivo e subsumível no quadro legal das situações de deficiente funcionamento da justiça, considera-se adequado fixar o quantum debeatur no padrão referencial dos valores entre 3.750€ e 7.600€ fixado pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no quadro de petições dirigidas contra o Estado Português, para as ações cíveis e do foro laboral.
Do ponto de vista subjetivo, em favor da atribuição indemnizatória milita a circunstância de não resultar da matéria de facto levada ao probatório, que o autor, assumido no decurso da causa, por ação ou omissão de ato processual, qualquer comportamento passível de provocar demoras abusivas, em ordem a, intencionalmente, sabendo e querendo o resultado projetado, de fazer perdurar ou atrasar a prossecução da instância.
Tudo visto, ao abrigo do regime do artº 12º Lei 67/2007, 31.12, considera-se adequado arbitrar a indemnização a título de danos não patrimoniais causados pelo funcionamento anormal dos serviços de administração da justiça, no valor de 4.000€, acrescidos de juros de mora desde a citação até integral pagamento, a título de danos não patrimoniais causados pelo funcionamento anormal dos serviços de administração da justiça.”

Com efeito, na sequência do que temos vindo a referir, e tendo em atenção o que se pode considerar como violação do prazo razoável, tendo em atenção a globalidade do processo, tem sido jurisprudência aceite, quer no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, quer nos Tribunais Portugueses, o prazo de 3 anos como duração média aceitável de um processo na primeira instância, para a generalidade das matérias, e de 4 a 6 anos para a duração global da lide, ou seja, quando haja recurso para os Tribunas superiores.

Efetivamente, o Processo teve uma duração total de cerca de 8 anos e 9 meses, sendo que esteve no TCAS, no seguimento de Recurso Jurisdicional, 2 anos e 3 meses para ser proferida uma mera decisão de inadmissibilidade do Recurso.

Efetivamente, é incontornável que a decisão proferida no Processo foi excessiva, ainda que o atraso se tenha centrado predominantemente em 1ª Instância, o que se compreende, pela sua exorbitante pendência processual.

Estão aqui em causa os danos causalmente provocados pelo facto ilícito, resultante da violação do direito a uma decisão em prazo razoável, o que, desde logo, contraria a tese do Estado, de acordo com o qual, inexistiria ilicitude, e que serviu de argumento à sua tese de acordo com a qual se teria verificado omissão de pronuncia, o que se não reconhece, pois que a questão foi abordada e decidida.

De facto, independentemente de quaisquer questões dilatórias da responsabilidade das partes, que se não vislumbram, mal se compreende que um processo relativo a um Processo concursal, sem especial complexidade, tenha uma duração de perto de 9 anos, exatamente em função das enormes pendências processuais.

Como se sumariou no Acórdão do STA de 05/07/2018:
I - Constatada uma violação do art. 6.º, § 1.º, da CEDH, relativamente ao direito à emissão de uma decisão judicial em prazo razoável, existe e opera, em favor da vítima daquela violação da Convenção, uma forte presunção natural da verificação de um relevante dano psicológico e moral comum, de natureza não patrimonial, sofrido por todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo em tempo razoável.
II - Àquela vítima impenderá um ónus de alegação e de prova dos danos não patrimoniais que excedam aquele dano comum e se mostrem relativos à sua específica situação concreta.
III - Tal presunção é, todavia, ilidível pelo demandado, impendendo sobre este o ónus de alegação e de prova em concreto da inexistência daquele dano e do afastamento do automatismo entre a violação constatada da Convenção e aquele dano.
IV - O demandante, para poder beneficiar da operatividade e aplicação daquela presunção, carecerá apenas de alegar e demonstrar a existência de uma violação objetivamente constatada da Convenção, nisso radicando o seu ónus de alegação e prova, que, uma vez satisfeito, conduz a que se presuma como existente o dano psicológico e moral comum, sem necessidade de que dele por si seja feita a sua prova.”

Com efeito, é pacífico, por força do disposto no artigo 22.º da Constituição, que o Estado é civilmente responsável pelos danos decorrentes da violação do direito à obtenção de uma decisão judicial em prazo razoável, consagrado no artigo 6.º/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH, ratificada por Portugal em 1978) e no artigo 20.º/4 da CRP (desde a revisão constitucional de 1997).

Como se sintetiza no Acórdão do STA, de 27.11.2013, P. 0144/13, convocando jurisprudência reiterada do mesmo Supremo Tribunal, o Estado será responsabilizado por atraso na justiça quando “da factualidade apurada resultar que o processo que fundamenta aquele pedido foi julgado para além do «prazo razoável», que esse atraso se ficou a dever a culpa dos serviços do Estado, que daí decorreram danos para a Autora e que existe uma relação direta entre essa demora e os prejuízos cujo ressarcimento se peticiona.”

Além disso, como salientado pelo Supremo Tribunal Administrativo (cfr., entre outros, o Acórdão do STA, de 28.11.2007, P. 308/07), a apreciação destes pressupostos implica a densificação de conceitos como o de “prazo razoável”, de “indemnização razoável” e de “danos morais indemnizáveis”, a qual não pode deixar de implicar uma interpretação do direito interno em conformidade com a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) e com a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), sob pena de “divergência entre a aplicação tida por apropriada na ordem nacional e a interpretação dada pelo Tribunal de Estrasburgo” (cfr. Acórdão citado).

O referido implica a adoção de uma “metodologia dialogante, que tem subjacente a ´relação fisiológica´ existente entre a jurisdição nacional e a europeia” (nas palavras de Isabel Celeste Fonseca,Violação do prazo razoável e reparação do dano: quantas novidades mamma mia! - Anotação ao Ac. do STA, de 9.10.2008, P. 319/08”, CJA, 72, 28-46,39).
No que concerne ao montante do valor indemnizatório, estando em causa danos morais estes devem ser atribuídos segundo regras da equidade, tendo sempre em atenção a situação concreta dos autos.

O montante dos danos não patrimoniais deve ser calculado, não arbitrariamente, mas atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização (artigo 496º n.º 3), aos padrões de indemnização geralmente adotados na jurisprudência, às flutuações da moeda (João de Matos Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol I, 10º edição pág 607). A indemnização, refere ainda este Autor, reveste uma natureza acentuadamente mista: por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar; no plano civilística e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente.

No que se refere à jurisprudência, muito vasta nesta matéria, cita-se ainda o Acórdão do STA proc. n.º 0197/15, de 22-04-2015, no qual se sumariou que:
I - A indemnização por danos não patrimoniais visa compensar de forma justa, satisfatória e equilibrada aqueles que foram forçados a suportar desgostos e sofrimentos causados por factos ilícitos de outrem por forma, a que se sintam compensados por terem sido sujeitos a tais sofrimentos.
II - Todavia, só podem ser indemnizados os danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito e, atenta a impossibilidade da sua quantificação, o seu montante tem de ser fixado equitativamente pelo Tribunal tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (art.ºs 496.º e 494.º do CC).
III - Sendo certo que a gravidade desses danos deve ser medida por um padrão tanto quanto possível objetivo e não à luz de fatores subjetivos.

Objetivando e como tem sido reiteradamente salientado, “a determinação da razoabilidade da duração do processo é feita casuisticamente e mediante uma análise global ou de conjunto do mesmo” (Acórdão do STA, de 10.09.2014, P. 090/12 que segue de perto anterior Acórdão do STA, de 09.10.2008, P. 0319/08).

Por outro lado, sumariou-se no Processo nº 1684/13.5BEPRT, de 7 de julho de 2017 do TCAN, o seguinte:
“I- A apreciação da razoabilidade de duração dum processo terá de ser feita analisando cada caso em concreto e numa perspetiva global, tendo como ponto de partida a data de entrada da ação no tribunal competente e como ponto final a data em que é tomada a prolação definitiva, contabilizando as instâncias de recurso.
II- Tem-se como razoável o prazo de 3 anos como duração média de um processo na primeira instância, para a generalidade das matérias, e de 4 a 6 anos para a duração global da lide, ou seja, quando haja recurso para os Tribunas Superiores.”

Em face do que precede, mostra-se que na situação em apreciação, a duração do processo se revela globalmente excedido, pois que o prazo razoável ou duração média do processo está excedido.

Como se disse já, mostra-se verificada a ilicitude, traduzida num atraso na decisão do processo judicial que viola o direito de obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie, com força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo, garantido pelos artigos 20.º/4 da CRP e 6.º/1 da CEDH.

Quanto ao pressuposto da culpa, ou seja, o juízo de censura que, sendo imputável ao serviço de justiça em si mesmo considerado, equivale ao conceito de “culpa do serviço”, em concreto, tratar-se-ia de saber se a demora excessiva do processo foi devida a um funcionamento deficiente dos serviços de justiça do Estado português ou se o atraso do processo terá sido causado pela mera atuação conflituosa das partes, o que, como se viu, não terá ocorrido.

Assim, e em decorrência do declarado atraso de perto de 9 anos, como afirmado em 1ª instância, o aqui se ratificará, o Estado não adotou as medidas suficientes para garantir uma justiça em “prazo razoável”.

O certo é que no caso vertente ficou provada uma atuação da administração da justiça do Estado ilícita e culposa, porque a morosidade processual verificada foi, em boa medida, decorrente da sua atuação, pelo menos, a título de culpa leve.

Aqui chegados, mostra-se equilibrado e ajustado à realidade fática dada como provada, o valor indemnizatório a titulo de danos não patrimoniais, fixado pelo tribunal a quo, tanto mais que o Autor não terá contribuído para os atrasos verificados, sendo que foram convocados os padrões fixados na jurisprudência nacional e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

Este dano não patrimonial é um dano presumido, um dano moral in re ipsa “necessariamente ínsito no dano decorrente da violação do direito à prolação de sentença em prazo razoável” (Isabel Celeste Fonseca, ob. cit., 46).

O dano moral constitui o “dano psicológico e moral comum que sofrem todas as pessoas que se dirigem aos tribunais e não veem as suas pretensões resolvidas por um ato final do processo” (cfr. Ac. do STA de 09.10.2008, P. 0319/08). Este dano não carece de alegação nem se prova – artigo 412.º do CPC.
Em face do que precede, improcederão ambos os Recursos.

* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, negar provimento a ambos os Recursos, confirmando-se a Sentença Recorrida.
Custas pelos Recorrentes.
Lisboa, 17 de fevereiro de 2022
Frederico de Frias Macedo Branco

Alda Nunes

Lina Costa