Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:754/15.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/24/2024
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
GERÊNCIA DE FACTO
ÓNUS DA PROVA
Sumário:I - A reversão operada ao abrigo do apontado artigo 24º, nº1 da LGT pressupõe sempre - independentemente de se tratar da alínea a) ou b) – o exercício efetivo das funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados.
II - Para efeitos de efetivação da responsabilidade subsidiária dos gerentes, não basta a mera titularidade de um cargo, sendo indispensável que tenham sido exercidas as respetivas funções.

III - Para que se verifique a gerência de facto é indispensável que o gerente use, efetivamente, dos respetivos poderes, que seja um órgão atuante da sociedade, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros.

IV - No caso, e não obstante a Fazenda Pública ter carreado para os autos alguns elementos que podiam ser indiciadores do exercício da administração por parte da Recorrida, a verdade é que a prova produzida, designadamente a testemunhal, corrobora a alegação da Oponente, no sentido de que, apesar de ter figurado como administradora de direito da …, jamais assumiu a administração da mesma.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção de execução fiscal e de recursos contra-ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I – RELATÓRIO

F ………………….., contribuinte fiscal n.º ……………, executado por reversão no processo de execução fiscal n.º…………….670, instaurado pelo Serviço de Finanças de P.............., contra a sociedade P……….. F....... - Supermercados, S.A., por dívida de IRS (retenção da fonte) de 2011, deduziu no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada oposição à referida execução fiscal.

Por sentença de 17/11/22, o referido Tribunal julgou procedente a oposição e, em consequência, determinou a extinção da execução fiscal quanto ao Oponente.

Inconformada com o assim decidido, a FAZENDA PÚBLICA apelou para este Tribunal Central Administrativo Sul (TCA Sul), formulando na sua alegação as seguintes conclusões:

A). Através da, aliás, douta Sentença aqui em apreço, o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo”, julgou procedente a oposição e, em consequência, determinou a extinção, quanto ao oponente, do PEF n.º ………………..670;

B). Salvo o devido respeito por diferente entendimento, a Fazenda Pública entende que tal decisão não pode manter-se na ordem jurídica, nos exatos termos em que foi proferida, porque nela se fez um errado julgamento de direito;

C). No caso dos autos, e atento o disposto no artigo 24.º da LGT, a Fazenda Pública cumpriu o ónus de prova que sobre si impende, ou seja, provou o exercício efetivo de funções de administração ou gestão por parte do oponente;

D). Está provado nos presentes autos que o oponente foi, para além de gestor de direito, gestor de facto da sociedade devedora originária, exercendo essas funções na data limite de pagamento/entrega da prestação tributária que está na origem da instauração do PEF antes mencionado;

E). O oponente, no exercício do seu mandato, ocorrido entre 01.02.2011 e 27.01.2012, e enquanto vogal do conselho de administração da referida sociedade, assinou diversos documentos essenciais à prossecução da atividade desta;

F). Para a responsabilização subsidiária dos administradores ou gerentes de facto, a lei não exige que estes pratiquem todos os atos de administração da sociedade, podendo a administração de facto limitar-se à prática de determinados atos em representação da mesma, o que, como se encontra provado, sucedeu neste caso concreto, através da assinatura de diversa documentação, agindo, assim, o oponente, no interesse e em representação da sociedade devedora originária, vinculando-a perante terceiros;

G). Resulta da factualidade dada como provada neste processo, que o oponente, no período a que se reporta a dívida fiscal em causa, praticou atos em representação da sociedade devedora originária, na qualidade de vogal do respetivo conselho de administração e, portanto, no exercício de poderes de representação da mesma, que condicionaram, direta ou indiretamente, com maior ou menor intensidade, os destinos da referida sociedade naquele período;

H). A pática de tais atos evidencia, segundo as regras da experiência comum, a intervenção efetiva do oponente na condução do destino da sociedade, determinando o seu rumo e exteriorizando opções de gestão perante terceiros;

I). Não poderia o Tribunal “a quo” ter concluído que o oponente, apesar da prática daqueles atos, não estava a dirigir a vontade e destino da sociedade devedora originária;

J). In casu, pouco importa a “assunção de culpas” por parte do Presidente do Conselho de Administração da sociedade devedora originária, pois, sem a atuação/intervenção do oponente, esta não poderia ter alterado e celebrado alguns importantes contratos, ou até, nomeado um CFO;

K). O despacho de reversão aqui em apreço não enferma do alegado vício formal de violação do direito de audição prévia;

L). O despacho de reversão aqui em apreço não enferma do alegado vício de violação do princípio do inquisitório;

M). Tendo em consideração que o prazo legal de pagamento/entrega do montante correspondente à dívida exequenda terminou no período em que o oponente exercia o cargo de gerente, a reversão fundamentou-se no disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT, norma que impõe ao revertido o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento das dívidas em questão;

N) O afastamento da presunção de culpa constante do artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT, não se compadece com uma alegação e prova genérica, pouco circunstanciada e desprovida de qualquer quantificação dos valores envolvidos e do seu peso relativo na atividade, que foi precisamente o que fez o oponente nesta oposição;

O). Mesmo admitindo o impacto da rescisão contratual, operada pelo Estado Angolano, no “Grupo G........”, no qual a sociedade devedora originária se integrava, o que se pode concluir é que, esse impacto não ocorreu, diretamente, na sociedade devedora originária, pois nem sequer existe prova da sua participação naquele negócio;

P). O oponente também não fez prova que a nomeação do CFO, ocorrida cerca de um mês antes data limite de pagamento/entrega da prestação tributária aqui em causa, tenha obstado ao cumprimento daquela obrigação;

Q). O processo especial de revitalização de que foi objeto a sociedade devedora originária e a nomeação de um administrador judicial provisório, nenhuma relação têm com o facto de o referido prazo de pagamento/entrega não ter sido cumprido, pois esses factos ocorreram depois da correspondente data;

R). Na verdade, o oponente não logrou provar que o não pagamento da dívida exequenda não lhe é imputável;

S). Ficou devidamente provado nesta oposição judicial que a decisão de reversão não padece de qualquer vício que possa conduzir à sua anulação judicial, sendo completamente legal;

T). Tendo sempre presente os factos que se devem ter como provados nos presentes autos, importa reconhecer que a decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal e Administrativo e Fiscal de Almada, ora sob recurso, não pode manter-se na ordem jurídica, já que nela se fez um errado julgamento de direito, violando-se o disposto no artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar o presente recurso PROCEDENTE, por totalmente provado e, em consequência, ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a presente oposição judicial, por provada, com todas as devidas e legais consequências.


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São as seguintes as conclusões das contra-alegações:

1. O Recurso interposto pela AT, contra a Sentença recorrida, na medida em que extinguiu a execução por reversão do Recorrido, por considerar o que o mesmo não foi gerente de facto da devedora originária, deve ser julgado improcedente.

2. Falece razão à AT, quando se insurge contra a Sentença proferida nos presentes autos por considerar que, estando provado que o Recorrido assinou documentos, entre os quais contratos, fica no entender da AT demonstrado que exerceu a administração de facto da devedora originária.

3. A reversão por dívidas tributárias encontra-se ligada ao exercício efetivo da gerência/administração/direção (dependendo da natureza da devedora originária).

4. E tal exigência do exercício efetivo de funções de administração decorre do facto de a reversão prevista na mencionada disposição legal estar ligada a uma lógica de culpa: ou culpa, em atos praticados pelo administrador que levaram a que o património da sociedade se tenha tornado insuficiente para o pagamento de dívidas (al. a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT); ou culpa (ainda que presumida e não ilidida) pela falta de pagamento das dívidas tributárias (al. a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT).

5. Ora, só agiu (ou se pode presumir que agiu) com culpa, aquele que efetivamente esteve a agir em nome da sociedade devedora originária. Aquele que decidiu a vida da sociedade, tomado as decisões em nome da mesma de contratar, com fornecedores, clientes, funcionários e outros que se relacionassem com a empresa.

6. Conforme decorre de forma direta do probatório em Y), Z) e EE) o Recorrido nunca decidiu ou determinou a vontade da devedora originária. Era um mero diretor operacional, que cumpria ordens e instruções do Presidente do Conselho de Administração.

7. Ao contrário do invocado pela AT, toda a prova realizada nos autos, relacionada com a atuação do Recorrido demonstra que o mesmo era um mero operacional de segunda linha que não determinava, nem tinha poderes efetivos para determinar a vontade da SOCIEDADE.

8. Colegas e prestadores de serviço da SOCIEDADE não reconheciam ao Recorrido poderes de administração e declararam inequivocamente que não era ele que determina a vontade da SOCIEDADE

9. Não é pelo facto de alguém assinar documentos em nome de uma sociedade que determina a sua vontade. Veja-se desde logo o caso dos procuradores, que assinam documentação a pedido e por ordens de terceiros, não determinam a vontade da assinatura e por isso não exercem a administração da sociedade.

10. No caso vertente, foi também isso que sucedeu, pois conforme provado nos autos pontos Y), Z) e EE) do probatório, o Recorrido assinou documentação não por vontade própria, mas a pedido e por vontade do Presidente do Conselho de Administração.

11. O nexo causal de culpa estatuído pelas alíneas a) e b) do n.º1 do art. 24.º da LGT, e afastamento literal da administração de direito, para efeitos de reversão não se compadecem com qualquer juízo de presunção de responsabilidade tributária subsidiária pela assinatura de documentos

12. A assinatura de documentos na qualidade de administrador é, tal como a nomeação e registo de alguém como administrador, um mero indício de que essa pessoa determina a vontade da sociedade, e que, como tal, exerce a sua administração de facto, mas não é prova disso mesmo.

13. Só é administrador de facto se tiver efetivamente determinado a assinatura e a assinatura for a expressão do exercício desse poder, aferido junto de quem se relaciona ou se relacionou com a SOCIEDADE, tais como funcionários, clientes, fornecedores e outros terceiros.

14. O cuidado do legislador ao abranger no normativo do art. 24.º da LGT “ainda somente que de facto” é apodítico do que vai dito, pretendendo-se abranger com a reversão não aqueles que têm a aparência de administradores, mas os que efetivamente exerceram a administração

15. No caso vertente a AT escusa-se no silogismo da assinatura documentação pelo administrador de direito para inferir a administração de facto do Recorrido, quando sabe por toda a prova produzida nos autos que o Recorrido não determinava, nem determinou a vontade da sociedade, o que de conduzir à improcedência do recurso apresentado pela AT.

16. Contudo, caso por absurdo assim não se entenda, hipótese académica, levantada à cautela, por estrito dever de patrocínio, e se considere que deve vingar a tese da AT de que se verifica a administração de facto do recorrido, então o Recorrido, passa a ter interesse, nos demais fundamentos para a Oposição, sobre os quais a Sentença recorrida não se pronunciou e que foram objeto de análise pela AT no respetivo recurso.

17. A AT teve acesso à declaração do Dr. C........ ………… a indicar que o Recorrido nunca exerceu poderes de administração de facto da SOCIEDADE, as declarações do Dr. P………………….. e do Dr. José …………., que indicavam que o Recorrido não era administrador de facto da sociedade, bem como a assinatura de diversos documentos pelo Recorrido. E perante a contraditoriedade desses elementos não curou por qualquer outra diligência de apuramento da verdade material, violando o dever de inquisitório.

18. Ao existirem elementos contraditórios, impunha-se à AT esclarecer os factos bem como esclarecer toda a factualidade apresentada sobre os negócios com Angola.

19. A reversão é ilegal, e deverá ser anulada, por violação do já referido art. 58.º da LGT, no sentido de que, perante elementos que, no limite suscitavam dúvidas acerca da administração de facto do Recorrido na devedora originária, a AT não curou de as esclarecer, nem procurou compreender o impacto da perda dos negócios com Angola

20. A reversão é ilegal, e deverá ser anulada, por violação do já referido art. 58.º da LGT, no sentido de perante elementos que provavam que tinham ocorrido circunstâncias excecionais que demonstravam a ausência de culpa do Recorrido na falta de pagamento das dívidas, não curou de os verificar e analisar.

21. A AT teve acesso ao Plano de Negócios, Contratos com os Bancos e cartas à AT sobre a suspensão de pagamentos indicada pelo Administrador Provisório, inquiriu várias testemunhas, incluindo o ROC das empresas do Grupo que assumiu tudo o que consta da documentação antecedente, indicando que não houve responsabilidade da Administração na insolvência do Grupo ou na falta de pagamento dos tributos, pois foram circunstâncias exteriores que se impuseram, sem que nada fosse possível fazer.

22. E perante toda a documentação e depoimentos, a AT nada diligencia no sentido de se esclarecer acerca do que se passou com a empresa, não inquiriu mais ninguém, nada diz na decisão de reversão acerca do valor dos elementos de prova juntos e limita-se a fazer, como se os mesmos não existissem, mantendo a decisão de reversão.

23. Com tal atuação a AT demitiu-se de analisar verdadeiramente o que havia sucedido e de procurar a verdade material, em violação do disposto no art. 58.º da LGT, procurando apenas recolher elementos e usá-los para justificar a existência de atos de gestão, sem verdadeiramente procurar compreender o sucedido.

24. Ao contrário do que é invocado pela AT em sede de Recurso, a Sentença deveria ter dado por provado que 1. A devedora originária, P…….. F....... – SUPERMERCADOS S.A. foi afetada pela nacionalização da atividade em Angola e pela perda dos 17.000.0000,00 € referidos no probatório em O), porque teve pessoal destacada em Angola, que teve que indemnizar e porque era parte nos contratos de financiamento grupados do grupo, resultando esse facto diretamente do Business Plan junto aos autos.

25. Este fato é fundamental pois em sede de Recurso a AT invoca não haver ligação entre a devedora originária e a nacionalização da atividade ocorrida em Angola e com o crédito de 17 milhões de euros.

26. A Sentença recorrida deveria ter também dado por provado que: 2. A tesouraria das empresas do Grupo incluindo a da devedora originária era centralizada .

27. Esse facto decorre dos depoimentos prestados nos autos, identificados os minutos da sua gravação, e é fundamental para a descoberta da verdade material porque explica a ligação entre as empresas do Grupo no tocante à gestão de tesouraria e como a devedora originária estava ligada às outras empresas, esclarecendo que ao contrário do que é aventado pela AT, havia relação direta da devedora originária com a perda de atividade em Angola.

28. A Sentença recorrida deveria ter dado por provado que: 3. A “nacionalização” ocorrida em Angola foi completamente inesperada pela G........ que não contribuiu para a mesma.

29. Esse facto decorre dos depoimentos prestados nos autos, identificados os minutos da sua gravação, e é fundamental para a descoberta da verdade material pois a AT coloca este facto em causa indicando que não foram apresentados nos autos factos concretos que demonstrem a ausência de culpa na falta de pagamento das dívidas tributárias, lançando suspeita até sobre a existência de responsabilidade da Administração do Grupo G.........

30. A Sentença recorrida deverão ter dado por provado que: 4. O Business Plan e o Plano Financeiro referidos em C) foram elaborados com o apoio da P …………… (PWC).

31. Esse facto decorre dos depoimentos prestados nos autos, identificados os minutos da sua gravação, e é fundamental para a descoberta da verdade material porque ao contrário do que é invocado pela AT a Administração da devedora originária atuou de forma zelosa e tecnicamente fundada, em consultoras externas, ao considerar que era viável reestruturar o Grupo e solver todos os compromissos, incluindo os tributário, apoiando-se em entidades de renome internacional.

32. A Sentença recorrida deveria ter dado por provado que: 5. Em 11 de Setembro de 2012, o Presidente do Conselho de Administração, dirigiu carta ao Serviço de Finanças de P.............. e à Direção de Finanças de Setúbal, com conhecimento ao Dr. Jorge ……….., solicitando ser esclarecido, se de facto durante o PER deveriam ser suspensos os pagamentos ao Estado, não tendo obtido qualquer resposta à mesma.

33. Esse facto decorre da prova documental e testemunhal identificados os minutos da sua gravação, e é fundamental para a descoberta da verdade material pois demonstra que a Administração da devedora originária teve sempre a preocupação de responder com as responsabilidades tributárias.

34. A Sentença recorrida deveria ter dado como provado que: 6. Em relação à causa da Insolvência da P……… F....... foi parecer do Administrador de Insolvência “…não podemos apontar uma única causa para a situação de insolvência, mas um conjunto de factores adversos que isoladamente até poderiam ser combatidos mas, evidenciando-se em simultâneo, tornam incontrolável a manutenção da saúde económica e financeira de qualquer empresa”.

35. Esse facto decorre da prova documental junta aos autos -designadamente relatório do Administrador de Insolvência e é fundamental para a descoberta da verdade material pois atesta que houve vários motivos para a insolvência que a tornaram incontrolável.

36. A Sentença recorrida deveria ter dado como provado que: 7. O Plano de Negócio referido em L) do probatório previa o pagamento de impostos ao Estado por todas as empresas do Grupo, que foram sendo cumpridos até a Banca deixar de apoiar o Grupo, momento a partir do qual passaram a ser pedidos e pagos todos os impostos em prestações, que cessaram apenas com o PER.

37. Esse facto decorre dos depoimentos prestados nos autos, identificados os minutos da sua gravação, e é fundamental para a descoberta da verdade material porque demonstra ao contrário do referido pela AT que havia preocupação no cumprimento das responsabilidades tributárias.

38. Em sede de Oposição na penúltima e última página da PI, o Recorrido solicitou a realização da prova documental vária, tal como listagens de valores pagos à AT, e de dívidas existentes, listagem dos prestacionais requeridos e dos pagamentos realizados e balancetes contabilístico

39. A documentação solicitada destinava-se a fazer prova de que: até 2011 a devedora originária tinha a respetiva situação tributária regularizada; até ao PER todas as dívidas da devedora originária estavam pagas ou com pedidos de pagamentos em prestações que estavam a ser cumpridos até ao PER; os pagamentos da devedora originária ao Estado estavam a ser cumpridos tal como das demais empresas do Grupo até ao PER; a envolvência da devedora originária com as demais empresas do Grupo, exposta nos balancetes, demonstra que a mesma não foi onerada com dívidas de outras empresas em prejuízo da mesma.

40. A mencionada prova é importante, por explicar as relações entre as empresas do Grupo e os pedidos de pagamentos em prestações, bem como a conduta dos administradores da devedora originária.

41. Contudo, o Tribunal a quo não ordenou a realização da prova requerida, e nem sequer se pronunciou sobre a dispensa da mesma, inquinando a Sentença recorrida de erro por défice instrutório em violação do disposto nos art. 99.º n.º 1 da LGT e erro de julgamento da matéria de facto nos termos da al. c) do n.º 2 do art. 662.º do CPC, aplicável ex vi al. e) do art. 2.º do CPPT, pelo que deve a Sentença recorrida ser anulada e os autos remetidos à 1.ª instância a fim de ser produzida a prova requerida, nos termos da al. c) do n.º 2 do art. 662.º do CPC, aplicável ex vi al. e) do art. 2.º do CPPT.

42. A AT incorre em erro de análise ao indicar em sede de Recurso que o Recorrido não logrou provar que não teve culpa na falta de pagamento das dívidas e na insuficiência de património para pagamento das dívidas exequendas.

43. A insolvência da devedora originária resulta da falta de receitas por perda do negócio em Angola e das indemnizações que se viu obrigada a pagar para se reestruturar.

44. A nacionalização dos ativos em Angola ocorrida em Agosto de 2010 e dívida de 17.000.000,00 €, foram inesperados e o Grupo não contribuiu para a mesma, já que nada o fazia prever pois o projeto naquele país estava a correr como esperado, havendo até uma comissão de acompanhamento.

45. Foi um elemento de boa gestão, ter procurado viabilizar as empresas do Grupo, tendo sido procurada ajuda técnica para o efeito – a PWC.

46. A PWC atestava, com um plano de negócios detalhado que era viável recuperar as empresas e cumprir com todas as responsabilidades incluindo as fiscais.

47. A Administração da devedora originária não foi imprudente perante as dificuldades, em tentar resgatar as empresas, foi antes criteriosa, preocupada e disponível, seguindo o que os técnicos – note-se dos mais avalizados do mundo – lhe indicaram para fazer.

48. Imprudente seria deixar o Grupo colapsar, prejudicando os credores, apresentando-se à insolvência, sem o tentar resgatar.

49. Para resgatar o Grupo era necessário o apoio da Banca que estabeleceu como condição controlar os pagamentos, e a Administração da devedora originária fez o que tinha que ser feito, aceitando esse controlo, até porque sendo cumprido o Plano de Negócios seriam pagos todos os credores, incluindo o Estado.

50. A devedora originária foi solvendo os seus compromissos, incluindo os de impostos e, nas situações de défice de tesouraria ia pedindo e pagando prestacionalmente as dívidas.

51. Ao obter financiamentos da Banca a Administração da devedora originária deixou de ser livre de determinar pagamentos, estando sujeita à sindicância e validação da Banca e de um CFO imposto pela mesma

52. Os pagamentos em prestações só foram suspensos a partir do PER por indicação do Administrador judicial provisório, em cumprimento do disposto no n.º 1 do art. 17.º-E e a alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C do CIRE, de onde resulta que todos os processos contra a entidade que requereu o PER se suspendem após a entrada do pedido em Tribunal.

53. A Administração da devedora originária compreendo o indicado pelo Administrador Judicial, mas prudente, cautelosa e zelosa do cumprimento das suas obrigações fiscais dirigiu ainda assim carta à AT, no dia 11/9/2012, ou seja, antes até da data limite de pagamento das dívidas exequendas, dando-lhe conhecimento do entendimento do Administra Judicial Provisório e solicitando ser informada se a AT tivesse entendimento diverso.

54. E perante a preocupação da Administração da devedora originária, o que fez a AT? Nada. Ignorou a comunicação em violação dos deveres de colaboração com os contribuintes, previstos no art. 59.º da LGT

55. Tal atuação é correta e adequada ao pagamento das dívidas tributárias e conservação do património para pagamento das dívidas.

56. O facto de antes do ser requerida a insolvência ter sido requerido um PER ficou a dever-se à expetativa da Administração da devedora originária de que continuaria, tal como no passado recente a ter o apoio da Banca, do Estado Português, através da PME Investimentos e de parceiros de negócio como a S…………. MC.

57. De 2010 a 7/1/2014 nenhum credor requereu a Insolvência de qualquer empresa do Grupo, dada a confiança que existia que o mesmo poderia ser bem sucedido na reestruturação

58. Quem teve apoios de cerca de 20 milhões de euros da Banca, durante 2011 e 2012, para a reestruturação, conforme consta do probatório da Sentença recorrida, esperava que esses apoios se mantivessem, especialmente no PER.

59. Daí que a decisão de pedir o PER foi um ato de boa gestão, responsabilidade e procura de solver compromissos.

60. E note-se que entre o PER e a Declaração de Insolvência mediaram 16 meses. Hoje, mais de 10 anos volvidos ainda não se encontra encerrado o processo de Insolvência das empresas (conforme é verificável no portal eletrónico das insolvências no CITIUS (https://www.citius.mj.pt/portal/consultas/consultascire.aspx).

61. Caso tivesse sido pedida a Insolvência no momento em que foi requerido o PER, em que medida seria melhor acautelado o pagamento do crédito tributário, ou teria sido evitado que o património não fosse suficiente para pagamento das dívidas tributárias? Em medida nenhuma. Não seria acautelada nenhuma das situações, pois se não houve apoios no PER não haveria logo na insolvência e o processo iria durar o que está a durar com avolumar de dívidas e juros por incumprimentos vários.

62. Não foram seguramente os 16 meses do PER, que podem ter conduzido à ausência de património para pagamento das dívidas tributárias ora em apreço.

63. Não há qualquer conduta que possa ser censurável à Administração da devedora originária.

64. Houve cuidado, empenho, disponibilidade, competência técnica, ordenada, de lealdade, dirigida à sustentabilidade da sociedade. Houve cuidado, empenho e disponibilidade ao atuar logo após a nacionalização de Agosto de 2010, apresentando um Plano de restruturação, 2 meses depois. Foram inúmeros os contactos e envolvimento com todos os credores, em especial com a Banca, mas com parceiros de negócio – S………….- e com o Estado através da PME Investimentos

65. Houve competência técnica, com o apoio e acompanhamento de várias consultoras internacionais E………. e a P………, e a atuação for ordenada e organizada, com um Plano, desde o início tecnicamente bem elaborado e com calendários bem definidos, com identificação de meios e aplicações.

66. Houve lealdade de sempre dar a conhecer todos os passos aos parceiros – incluindo à AT, mesmo perante a indicação do Administrador Judicial Provisório em serem suspensos os pagamentos dos prestacionais.

67. Apesar de tudo o que foi feito pela Administração das sociedades, malogradamente não foi possível recuperar as empresas, pois “…não podemos apontar uma única causa para a situação de insolvência, mas um conjunto de factores adversos que isoladamente até poderiam ser combatidos mas, evidenciando-se em simultâneo, tornam incontrolável a manutenção da saúde económica e financeira de qualquer empresa” conforme concluiu no seu Relatório o Administrador de Insolvência que acompanhou o Grupo desde o PER.

68. Assim, fica demonstrado à saciedade a gestão criteriosa, preocupada, cuidada e tecnicamente válida da Administração da devedora originária, afastando a presunção de culpa prevista na al. b) do n.º 1 do art. 24.º da LGT, o que deve conduzir à anulação da decisão de reversão

TERMOS EM QUE DEVE SER NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELA FAZENDA PÚBLICA E MANTIDA A SENTENÇA RECORRIDA OU SUBSTITUIDA POR DECISÃO QUE ACORDE NA PROCEDÊNCIA DA OPOSIÇÃO E ANULAÇÃO DA EXECUÇÃO POR REVERSÃO


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O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) pronunciou-se no sentido de ser concedido provimento do recurso.

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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.

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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

A) Pelo averbamento da inscrição Ap. 30, de 01.02.1991, foi registada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa a constituição da sociedade anónima com a denominação de “P…………. F....... - Supermercados, S.A.” e o seguinte objeto social: “O exercício da actividade comercial de importação, exportação e distribuição de produtos alimentares, de higiene, limpeza e outros produtos de consumo particular em supermercados; representação de interesses e marcas de produtos nacionais e estrangeiros” (cfr. certidão permanente a fls. 15 a 22 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

B) A sociedade identificada em A) que antecede obrigava-se: “a) pela assinatura do presidente do conselho de administração; b) pela assinatura de dois administradores; c) pela intervenção de um administrador delegado, dentro dos limites da delegação do Conselho de Administração; d) pela assinatura de um administrador e de um procurador com poderes para a categoria de actos na qual se inclua aquele em que intervém; e) pelas assinaturas de dois procuradores, conjuntamente, com poderes para a categoria de actos na qual se inclua aquele em que intervém; f) pela assinatura de um procurador com poderes especiais” (cfr. certidão permanente a fls. 15 a 22 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

C) A sociedade identificada em A) supra faz parte do grupo de sociedades designado por G........, do qual fazem parte, para além daquela sociedade, as sociedades G........ – Gestão ………………., SGPS, S.A., G........ On Line – ……………….., S.A., GG.............. – Sociedade ……………., S.A., GP... – Gestão …………….., S.A. e a sociedade G........ – Sociedade …………, S.A. (cfr. “business plan” de fls. 207 a 260, relatório a fls. 272 a 355 e “Memorando de Entendimento” de fls. 449 a 465, todas dos autos);

D) O “Grupo G........”, identificado na alínea anterior, dedica-se à atividade de logística e distribuição, por grosso e a retalho, nas áreas alimentares e não alimentares (cfr. “business plan” de fls. 207 a 260, relatório a fls. 272 a 355 e “Memorando de Entendimento” de fls. 439 a 465, todas dos autos);

E) Até 2006, o “Grupo G........” desenvolvia a sua atividade essencialmente em Portugal (cfr. relatório a fls. 272 a 355 dos autos);

F) A partir de 2006, o “Grupo G........” passou a desenvolver a sua atividade também no mercado angolano, no âmbito da criação e gestão do denominado “PRESILD – Programa de Reestruturação de Logística e Distribuição de Meios Essenciais à População” (cfr. relatório a fls. 272 a 355 dos autos);

G) Em 10.10.2007, foi celebrado entre o “Grupo de Coordenação do Presild – ……………….” e o “Grupo G......../P…………. – Consultores ……………, Lda.”, em representação de “G........ Angola – ……………….., S.A.” e “EAA – Entreposto Aduaneiro de Angola, E.P.”, o denominado “Contrato de Gestão Integrada por Objectivos”, relativo à “conceptualização, implementação e gestão da Rede Integrada de Logística e Distribuição, de uma Nova Rede Comercial de Proximidade, das Lojas Pedagógicas para o Setor do Comércio e do Desenvolvimento da Produção Interna, tudo no âmbito do Programa de Reestruturação do Sistema de Logística e de Distribuição de Produtos Essenciais à População – Presild – ……………….” (cfr. “Contrato de Gestão Integrada por Objectivos” a fls. 630 a 685 dos autos);

H) O negócio de Angola significava 50% do volume de negócio do grupo G........ (cfr. relatório junto a fls. 272 a 355 dos autos e depoimento das testemunhas José ……………. e T …………….;

I) Em agosto de 2010, o Estado Angolano rescindiu unilateralmente o contrato identificado na alínea G) supra com o grupo G........ (facto não controvertido, que se extrai da carta remetida pela sociedade G........ – Gestão ………….., SGPS, S.A.” ao Banco ………….., a fls. 204 a 206 dos autos, que integra o doc. 3 junto com a petição inicial, e depoimento das testemunhas José ………………. e T …………….);

J) Na sequência da rescisão unilateral do contrato identificado na alínea G) supra, o “Grupo G........” perdeu cerca de 50% do respetivo volume de negócios (facto que se extrai do “Business Plan” e do relatório juntos a fls. 207 a 260 e 272 a 355 dos autos, que integram o doc. 3 junto com a petição inicial);

K) O “Grupo G........” ficou com um crédito sobre entidades angolanas de cerca de dezassete milhões de euros (cfr. facto que se extrai do “Plano Financeiro” anexo ao “Business Plan”, a fls. 262 a 271, e do relatório de fls. 272 a 355 dos autos, que integram o doc. 3 junto com a petição inicial, e é confirmado pelo depoimento das testemunhas José …………. e C........ …………….);

L) Em outubro de 2010, o “Grupo G........” apresentou junto de entidades bancárias um plano de reestruturação de toda a atividade do grupo (cfr. “Business Plan” e respetivo “Plano Financeiro”, a fls. 207 a 271 dos autos);

M) Em 13.12.2010, foi aprovada a disponibilização ao “Grupo G........” da denominada “linha confirming”, no valor de oito milhões de euros (cfr. facto que se extrai do relatório a fls. 272 a 355 dos autos, que integra o doc. 3 junto com a petição inicial);

N) Por deliberação de 01.02.2011, registada na Conservatória do Registo Predial/Comercial do Seixal em 16.02.2011, o Oponente foi designado como vogal do Conselho de Administração da sociedade identificada em A) supra, para o triénio 2011/2013 (cfr. certidão permanente a fls. 15 a 22 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

O) Em data não concretamente apurada, o “Grupo G........” encetou negociações com o IAPMEI com vista à participação do Estado, através da “PME Investimentos, S.A.” e do “Fundo Autónomo à Concentração e Consolidação de Empresas” («FACCE»), no apoio à tesouraria do grupo (facto que se extrai do “Memorando de Entendimento” e respetivo Anexo I, a fls. 449 a 467 dos autos, integrante do doc. 4 da petição inicial);

P) Em 31.08.2011, foi assinado um “Memorando de Entendimento” entre C........ …………….., G........ – Gestão ………….., SGPS, S.A., G........ Online – Distribuição ………….., S.A., GP... – Gestão …………., S.A., GG.............. – Sociedade Imobiliária, S.A., P……. F....... – Supermercados, S.A., G........ – Sociedade ………….., S.A. e Banco ……………, S.A., Banco Espírito Santo, S.A., Banco …. S.A. e B…… – Banco ……………….., S.A., no qual foram estabelecidos os termos e condições de “alteração dos financiamentos existentes e contratação de novos financiamentos”, do qual consta, designadamente, que o grupo de empresas se candidatou ao “Fundo Autónomo de Apoio à Concentração e Consolidação de Empresas” gerido pela PME Investimentos, S.A. (cfr. “Memorando de Entendimento” e respetivo Anexo I, a fls. 449 a 467 dos autos, integrante do doc. 4 da petição inicial);

Q) Prevê o “Memorando de Entendimento” mencionado na alínea anterior que os compromissos assumidos pelas entidades bancárias ficariam sujeitos, entre outros, à nomeação de um “CFO” (“chief financial officer”), para intervir em todas as operações com impacto financeiro no “Grupo G........”, e à nomeação da “E....... & Y........”, enquanto revisor oficial de contas de todas as sociedades do “Grupo G........” (cfr. “Memorando de Entendimento” e respetivo Anexo I, a fls. 449 a 467 dos autos, integrante do doc. 4 da petição inicial);

R) Em 14.11.2011, o conselho de administração da sociedade P………… F....... –Supermercados, S.A., identificada na alínea A) supra, deliberou, por unanimidade, nomear, para “CFO” da sociedade, José ……………….. (cfr. documento junto a fls. 533 dos autos);

S) Em 17.11.2011, foi celebrado entre a sociedade G........ – Gestão de …………….. SGPS, S.A. e a S…………….MC – ……………….., SGPS, S.A. um “Acordo”, no qual foram estabelecidos “os principais termos e condições de uma relação de natureza duradoura entre sociedades pertencentes aos dois grupos” (cfr. documento junto a fls. 506 a 519 dos autos, como anexo 2 do doc. 4 da petição inicial);

T) Em 25.11.2011, foi celebrado um “contrato de prestação de serviços”, entre a sociedade identificada em A) supra e a sociedade E....... & Y........ …………. & Associados – SROC, S.A., nos termos do qual esta se obrigou a “prestar os seus serviços de revisão legal das contas” (cfr. documento junto a fls. 580 a 587 dos autos);

U) Em 25.11.2011, foi celebrado entre as sociedades G........ Online – ……………….., S.A., G........ – Gestão ……………., SGPS, S.A., Banco ………………., S.A. e Banco …………, S.A. um “Contrato de Abertura de Crédito”, nos termos do qual cada um dos bancos concedeu à sociedade G........ Online – ………….., S.A., que aceitou, “uma abertura de crédito em conta corrente até ao montante total máximo de um milhão e novecentos mil euros”, “ambos os montantes para reembolso integral na data de vencimento”, ficando os pedidos de utilização, em tranches mínimas de quinhentos mil euros, sujeitos a apreciação dos bancos (cfr. documento junto a fls. 485 a 504 dos autos, integrante do doc. 4 da petição inicial);

V) Em 28.12.2011 foi celebrado um aditamento ao Contrato de Abertura de Crédito – Contrato Umbrella Grupado - celebrado em 29.12.2004, entre o Banco …………….., S.A., a G........ – Gestão …………….., SGPS, S.A., a GG.............. – Sociedade …………, S.A., a G........ Online – ………….., S.A., GP... – Gestão de …………….., S.A., P………. F....... – Supermercados, S.A. e a sociedade G........ – Sociedade …………., S.A., sendo disponibilizado um crédito de 10.000.000,00 EUR que se vencia em 31.12.2013, podendo ser prorrogado por prazos sucessivos de noventa dias, sendo que todas as utilizações de crédito teriam de ser autorizadas pelo Banco (cfr. documento junto a fls. 615 a 622 dos autos);

W) A administração do grupo G........, no âmbito do contrato de “confirming”, elaborava listas de pagamentos que tinha que efetuar e o CFO/supervisor financeiro nomeado para todas as empresas do grupo validava e autorizava os pagamentos dessas empresas, de acordo com as instruções da Banca (cfr. relatório a fls. 272 a 355 dos autos, que integra o doc. 3 junto com a petição inicial, e depoimento das testemunhas J ……………. e C........ …………….);

X) O Oponente foi nomeado vogal do conselho de administração da sociedade identificada em A) supra pela necessidade de preencher o órgão colegial, nos termos definidos pelo pacto estatutário (cfr. depoimento das testemunhas J………………..e C........ ………….);

Y) O Oponente exerceu funções de diretor da área operacional da sociedade P……… F....... – Supermercados, S.A., identificada na alínea A) supra, na área de retalho, tratando de questões logísticas (cfr. depoimento das testemunhas J ……………. e C........ …………..);

Z) Era o presidente do concelho de administração da sociedade identificada em A) supra, C........ …………….., quem negociava e tomava todas as decisões de gestão da referida sociedade (cfr. documento de fls. 10 do processo de execução fiscal apenso aos autos e depoimento das testemunhas J …………. e C........ ……………….);

AA) Em 31.08.2011, o ora Oponente assinou, na qualidade de administrador da sociedade P…………F....... - Supermercados, S.A., identificada em A) supra, o “Memorando de Entendimento” mencionado na alínea P) supra (cfr. documento junto a fls. 449 a 467 dos autos);

BB) Aos 14.11.2011, o ora Oponente assinou, na qualidade de administrador da sociedade P……….F....... - Supermercados, S.A., identificada em A) supra, a Ata n.º 12, pela qual foi nomeado o Dr. José ………….. como CFO da referida sociedade (cfr. documento junto a fls. 533 dos autos);

CC) Em 25.11.2011, o ora Oponente e C........ ……………. assinaram, na qualidade de administradores da sociedade P………… F....... - Supermercados, S.A., identificada em A) supra, o denominado “contrato de prestação de serviços” mencionado na alínea T) supra (cfr. documento junto a fls. 580 a 587 dos autos);

DD) Em 28.12.2011, o Oponente assinou, na qualidade de administrador da sociedade P……….. F....... - Supermercados, S.A., identificada em A) supra, o denominado “Aditamento ao Contrato de Abertura de Crédito – Contrato Umbrella Grupado - celebrado em 29.12.2004”, mencionado na alínea V) supra (cfr. documento junto a fls. 615 a 622 dos autos);

EE) Em 29.02.2012, foi registada na Conservatória do Registo Comercial de Setúbal a “cessação de funções” do Oponente como vogal do conselho de administração da sociedade identificada em A) supra, por renúncia em 27.01.2012 (cfr. certidão permanente a fls. 15 a 22 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

FF) Em 30.03.2012, foi emitida a ata n.º 16, relativa a reunião do conselho de administração da sociedade identificada na alínea A) supra, da qual conta que, na referida reunião, C........ …………………….declarou, na qualidade de presidente do conselho de administração, que “o não cumprimento das obrigações da sociedade perante o Fisco e a Segurança Social, ocorrido entre Maio de 2011 e Fevereiro de 2012, resultou de decisões que ele próprio tomou e negociou no âmbito dos acordos de reestruturação discutidos com os Bancos, em consequência da situação económica e financeira da sociedade da sociedade e do grupo” e que “tais decisões são da sua inteira e exclusiva responsabilidade já que os Administradores da sociedade ascenderam da sua condição de quadros superiores a este cargo num enquadramento de subordinação funcional” e que “todas as opções de gestão e administração adoptadas na sociedade são da sua exclusiva responsabilidade, não tendo nelas participado materialmente os restantes administradores” (cfr. documento de fls. 10 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

GG) Em 02.06.2012, foi instaurado no Serviço de Finanças de P.............., contra a sociedade identificada na alínea A) supra, o processo de execução fiscal n.º ……………….670, por dívida de IRS (retenção na fonte) do ano de 2011, no valor de 20.082,00 EUR, tendo como data limite de pagamento voluntário o dia 23.12.2011 (cfr. documentos de fls. 1 a 2 verso do processo de execução fiscal apenso aos autos);

HH) A sociedade identificada em A) supra intentou um processo especial de revitalização, que correu termos no 3.º Juízo do Tribunal de Comércio de Lisboa, sob o n.º 1523/12.4TYLSB (cfr. documento n.º 4 para que remete o despacho de reversão, junto do processo de execução fiscal apenso aos autos;

II) Em 10.09.2012, no âmbito do processo especial de revitalização referido na alínea anterior, foi nomeado como administrador judicial provisório Jorge ………………… (cfr. documento n.º 4 para que remete o despacho de reversão, junto do processo de execução fiscal apenso aos autos);

JJ) No âmbito do processo especial de revitalização a que se referem as alíneas anteriores, o administrador judicial provisório emitiu “Parecer” no sentido de que a sociedade identificada na alínea A) supra se encontrava em situação de insolvência, dele resultando que “verificados os elementos contabilísticos, conclui-se que o activo da sociedade é substancialmente inferior ao seu passivo”, encontrando-se inativa (cfr. documento n.º 6 – páginas 4 a 9 – para que remete o despacho de reversão, junto do processo de execução fiscal apenso aos autos);

KK) Por indicação do administrador judicial provisório identificado em II) supra, foram suspensos todos os pagamentos a que a sociedade devedora originária estava vinculada (cfr. depoimentos de C........ ……………. e J ………………………);

LL) Em 07.01.2014, foi declarada a insolvência da sociedade identificada em A) supra, por sentença proferida pelo Tribunal de Comércio de Lisboa, 2.º Juízo, no âmbito do processo n.º 1133/11.3TYLSB, tendo sido nomeado administrador da insolvência Jorge ……………….. (cfr. documento n.º 5 para que remete o despacho de reversão, junto do processo de execução fiscal apenso aos autos);

MM) Por despacho datado de 02.12.2014, a Chefe do Serviço de Finanças de P.............. determinou a reversão da execução fiscal identificado em GG) supra contra C........ ……………. (cfr. documento de fls. 106 a 118 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

NN) Em 04.12.2014, foi proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de P.............. o denominado “Projecto de Decisão”, no qual foi determinada a notificação do Oponente para o exercício do direito de audição prévia à reversão contra o mesmo do processo de execução fiscal identificado em GG) supra, constando do mesmo o seguinte:

«Texto no original»

(cfr. documento de fls. 121 a 133 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

OO) Em cumprimento do despacho reproduzido na alínea anterior, o Serviço de Finanças de P.............. remeteu ao Oponente ofício de “NOTIFICAÇÃO AUDIÇÃO PRÉVIA (Reversão)”, datado de 04.12.2014 (cfr. documentos de fls. 135 processo de execução fiscal apenso aos autos);

PP) Em 08.01.2015, o Oponente apresentou junto do Serviço de Finanças de P.............., no âmbito do processo de execução referido na alínea GG) supra, requerimento “para o exercício de audição prévia”, no qual requer a “anulação do presente processo de reversão”, com as seguintes conclusões:


“CONCLUINDO

101. Atento o exposto, é evidente que não existe culpa do Requerente ou do Dr. C........ ......... pela alegada falta de pagamento das dívidas exequendas, sendo ilidida a presunção legal, porquanto, ocorreu um evento inesperado e não controlável que levou à inexistência de tesouraria para fazer face ao normal desenvolvimento da actividade e aos compromissos a ela inerentes, colocando em causa a subsistência do grupo.
102. Por via disso, foi necessário elaborar um plano de reestruturação e vincular as decisões do grupo e acção do Dr. C........ ......... aos circunstancialismos e constrangimentos no mesmo assumidos.
103. Por seu turno, os compromissos assumidos no próprio plano de reestruturação, levavam a que a tesouraria ficasse dependente da vontade de terceiros.
104. O Dr. C........ ......... foi sempre um escrupuloso gestor, cumpridor de todas as obrigações fiscais das empresas do grupo que presidia, tendo ocorrido o pagamento de vários milhões de euros em tributos ao Estado.
105. As presente dívidas ficam a dever-se a motivos que lhe são estranhos e que se lhe impuseram de forma inexorável, que o mesmo não conseguiu, apesar de tudo ter feito, ultrapassar, porquanto:
a. Perdeu a área de negócios desenvolvida com Angola, o que lhe ocasionou sérias repercussões a nível económico, pelo volume de negócios realizado, e a nível financeiro pelos créditos detidos;
b. Apesar tais factos, os imposto directos referentes às exportações e prestações de serviços a Angola foram pagos;
c. Imediatamente o Dr. C........ ......... logrou apurar se era possível recuperar o grupo e honrar os respectivos compromissos, tendo sido apresentado em menos de 1 mês um projecto de recuperação aos parceiros de negócio;
d. Os parceiros aceitam em princípio de apoio apoiar a recuperação;
e. São acordados contractos de financiamento - Confirming - com a Banca;
f. A gestão da tesouraria das empresas do grupo deixa de depender apenas do Dr. C........ .........;
g. Problemas no circuito bancário atrasam a execução do projecto de recuperação;
h. O Estado português aceita associar-se e apoiar a recuperação;
i. Contudo, o estado do País atrasa a formalização dos contractos de apoio com o Estado, sem que nada mais o Dr. C........ ......... pudesse fazer para acelerar o processo;
j. Foram firmados novos contractos de financiamento com a Banca, em Agosto de 2011, com perda integral da determinação de pagamentos nas empresas do grupo;
k. O Estado finalmente aceita formalmente participar na recuperação;
l. O Dr. C........ ......... acredita que o processo de recuperação se viabilizará e que começarão a ser cumpridos todos os compromissos;
m. O PER esgota o calendário sem acordo final;
n. O Administrador Judicial Provisório impede a realização de pagamentos ao Estado, tal como as dívidas ora em execução;
106. Fica assim mais que demonstrada a ausência de culpa do Requerente edo Dr. C........ ......... no pagamento das dívidas exequendas;
107. Pelo que, não pode proceder a presente reversão contra o Requerente sob pena de violação frontal do disposto no art. 24.° n.° 1 al. b) da LGT;
108. Para prova dos pontos anteriores, designadamente prova da ausência de culpa na falta de pagamento das dívidas exequendas, requer-se que sejam atendidas nos autos as declarações já referidos prestados pelo Dr. P....... .............. e do Dr. C........ ........., os outros dois elementos nomeados para o Conselho de Administração da devedora originária, bem como do Dr. Soares Barroso, responsável pela BDO, a empresa auditora da devedora originária e do grupo G........, prestadas no âmbito do processo executivo 2208200901106201.
109. Logo, por todo o vertente, a presente proposta de reversão deverá ser totalmente anulada”

(cfr. documento a fls. 140 a 148 do processo de execução apenso aos autos);

QQ) Por despacho datado de 08.01.2015, a Chefe do Serviço de Finanças de P.............. determinou a reversão contra o Oponente do processo de execução fiscal identificado na alínea GG) supra, constando do mesmo o seguinte:

« Texto no original»

(…)” (cfr. documento de fls. 150 a 161 do processo de execução fiscal apenso aos autos);

RR) O Serviço de Finanças de P.............. remeteu ao Oponente, por carta registada com aviso de receção, o denominado ofício de “citação (reversão)”, datado de 08.01.2015, e rececionado pelo Oponente em 13.01.2015, comunicando o despacho mencionado na alínea anterior (cfr. documentos de fls. 163 a 165 do processo de execução fiscal apenso aos autos).


*


FACTOS NÃO PROVADOS: não existem factos a dar como não provados com interesse para a decisão.

*


A decisão da matéria de facto relevante para a decisão da causa, salvo quanto aos factos assentes nas alíneas H), I), K), W), X), Y), Z) e KK) do probatório, efetuou-se, exclusivamente, com base no exame dos documentos constantes dos presentes autos e do processo de execução fiscal apenso, não impugnados, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

Quanto à factualidade vertida nas alíneas H), I), K), W), X), Y), Z) e KK) do probatório, a convicção do tribunal formou-se com base nos documentos aí especificados, bem como nos depoimentos das testemunhas J ……………., C........ …… ......... e T ……………… − produzidos nos presentes autos e no âmbito do processo de oposição n.º 669/14.9BEALM (prova aproveitada no presente processo) −, testemunhas que demonstraram ter um conhecimento direto dos factos relatados.

Quanto ao facto dado como provado na alínea H) do probatório, a convicção do Tribunal formou-se, não só pela análise do documento mencionado para fundamentação do referido facto, mas também com base no depoimento das testemunhas J ……………… e T ………………….. .

A testemunha J …………… foi revisor oficial de contas de todo o “Grupo G........”, nos anos de 2010 e 2011, tendo acompanhado o mesmo até à entrada do administrador judicial provisório.

Já quanto a T ………….., declarou ser responsável de controlo de gestão, tendo trabalhado na sociedade Gestão …………….., SGPS, S.A., desde agosto de 2007 até novembro de 2011.

Ambas as testemunhas corroboraram a informação constante do relatório junto a fls. 632 a 717 dos autos, declarando de forma expressa e segura que o negócio de Angola significava cerca de 50% do volume de negócio do “Grupo G........”. Tendo, assim, a conjugação do teor do mencionado documento com o depoimento das referidas testemunhas permitido a fixação do facto assente em H) do probatório.

O depoimento das referidas testemunhas, J …………….. e T ………………., relevaram também para a fixação do facto assente em I) do probatório, ao confirmaram a ocorrência da rescisão unilateral pelo Estado Angolano do contrato identificado em G) do probatório, já mencionada no documento a fls. 566 a 568 dos autos.

Quanto ao facto dado como provado em W) do probatório, relevou aqui, para além do relatório junto a fls. 634 a 717 dos autos, o depoimento das testemunhas J ……………… e C........ …………............ A razão de ciência desta última testemunha reside no facto de ter sido presidente do conselho de administração de todas as sociedades do “Grupo G........”, incluindo a sociedade devedora originária, tendo, assim, um conhecimento privilegiado dos factos.

Ambas as testemunhas afirmaram, de forma clara e perentória, que, no seguimento do processo de reestruturação da sociedade, com o acordo com a banca, os pagamentos das sociedades do grupo G........ ficaram dependentes da autorização pela Banca.

A testemunha J ………………… declarou que o grupo G........ elaborava listas com os pagamentos a efetuar, todavia, depois, a Banca é que decidia se pagava ou não, tendo sido nomeado um diretor financeiro, Dr. Silva Pereira, indicado pelos bancos, que tinha a função de definir a quem se deveria pagar.

Em consonância, a testemunha C........ ………. ......... afirmou que, no seguimento do processo de reestruturação da sociedade, foi nomeado um CFO, o citado Dr. S …………, indicado e exigido pelos bancos (BCP e BES), que “validava as listas de pagamentos”.

Também relativamente aos factos assentes em X), Y) e Z) do probatório foram relevados os depoimentos das testemunhas J ……………….. e C........ ……….. ........., os quais, de forma segura e coerente, confirmaram estes factos.

Com efeito, a testemunha J ……………………. declarou que o Oponente era um simples funcionário, operacional da sociedade devedora originária, que liderava a equipa na componente operacional. Mais afirmando que o Oponente foi nomeado para o conselho de administração da sociedade, dado que se exigia mais de um gestor, tendo sido critério de escolha para tal cargo a designação de bons operacionais.

Todavia, ressalvou que, em termos de gestão, o Oponente não tinha poderes, sendo diretor operacional, não tendo poderes para, por exemplo, determinar pagamentos. Esclarecendo que a administração da sociedade se encontrava completamente centralizada na pessoa de presidente do conselho de administração, Dr. C........ .......... Todas as decisões eram tomadas por este, sendo com o mesmo que reunia.

No mesmo sentido depôs a testemunha C………. ........., presidente do conselho de administração da sociedade, que assumiu que todas as decisões eram tomadas por si, sendo ele quem negociava em nome da sociedade, designadamente aquando da sua reestruturação. Confirmando que o Oponente era um diretor operacional, na área de retalho, tratando das encomendas, montagem de lojas, questões logísticas, pelo que não tinha intervenção na gestão, ainda que tenha tido intervenção em certas questões (documentos) por razões legais.

Sendo estas declarações consentâneas e coerentes com as que já havia assumido, constantes do documento reproduzido na alínea FF) do probatório, a fls. 10 dos autos.

Mais declarou que o Oponente foi designado administrador por questões legais, dado que era preciso mais do que um administrador (no conselho de administração).

Também para a fixação do facto assente em KK) do probatório concorreram os depoimentos das testemunhas C…………… ......... e J ……………….., tendo o primeiro declarado que, quando o processo especial de revitalização foi aceite, na primeira reunião com o administrador daquele processo, este afirmou que todos os acordos estabelecidos ficavam suspensos, começando um novo ciclo, não tendo que pagar os impostos, tendo aquela segunda testemunha afirmado que o administrador judicial nomeado no âmbito do processo especial de revitalização considerou que, com a entrada em vigor do referido processo, cessavam os pagamentos a todos os credores, incluindo os devidos à Autoridade Tributária e Aduaneira.

A coerência e objetividade dos depoimentos mencionados supra, revelando um conhecimento direto e convergente dos factos, permitiu (em alguns casos, corroborando outros elementos de prova) dar como provados os factos assentes nas alíneas H), I), K), W), X), Y), Z) e KK) do probatório.”


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- De Direito

A sentença que aqui vem posta em causa julgou a oposição procedente e, em consequência, determinou a extinção da execução fiscal quanto ao Oponente.

Foram vários os fundamentos de oposição invocados na p.i, tendo a sentença iniciado a sua análise pela alegada falta de prova quanto à insuficiência patrimonial da devedora originária. Tal fundamento foi julgado improcedente. Seguidamente, o TAF de Almada passou a apreciar o vício correspondente à ilegitimidade, assente na falta de exercício de facto da administração da sociedade devedora originária e, quanto a este fundamento, deu razão ao Oponente. Assim sendo, ficou prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos da oposição.

Importa dizer, desde já, que, como é patente, a ora Recorrente, Fazenda Pública, não impugnou a (extensa) matéria de facto, pelo que a mesma mostra-se estabilizada.

Avançando.

A sentença que aqui vem posta em causa julgou a oposição procedente e, em consequência, determinou a extinção da execução fiscal quanto ao Oponente, ora Recorrido, por considerar a ilegitimidade da pessoa citada para a execução fiscal.

Com efeito, o Mmo. Juiz, após fazer o enquadramento legal e jurisprudencial da questão da responsabilidade subsidiária dos administradores e gerentes, concluiu que F ……………………………, não pode ser responsabilizado pelas dívidas em causa, já que não ficou “demonstrado que o Oponente, designadamente no período a que respeita a dívida exequenda ou em que esta se venceu, era administrador de facto da sociedade devedora originária, antes pelo contrário”.

Para assim concluir, o Mmo. Juiz alinhou, no que para aqui releva, o seguinte discurso fundamentador:

“(…)

No caso dos autos, o Oponente foi designado como vogal do conselho de administração da sociedade devedora originária, para o triénio 2011/2013, por deliberação de 01.02.2011, registada em 16.02.2011. Tendo mantido essa qualidade até à sua renúncia a esse cargo, em 30.11.2011, facto registado em 29.12.2011 [cfr. alíneas N) e EE) do probatório].

É certo que, conforme resulta, ainda, da factualidade provada [cfr. alíneas AA), BB), CC) e DD)], num período curto (quatro meses) e circunstanciado de reestruturação da sociedade, entre 31.08.2011 e 28.12.2011, o Oponente assinou documentos em nome da sociedade devedora originária, traduzindo-se em acordos/contratos.

Contudo, para além do curto período em que se inserem estes atos, resulta demonstrado nos autos, tal como deixado assente na factualidade dada como provada, que os acordos/contratos ou decisões a que se reportam os mencionados documentos eram negociados e/ou decididos pelo referido presidente do concelho de administração da sociedade, pois era este quem negociava em nome da sociedade e tomava todas as decisões de gestão [cfr. alíneas Z) e FF) da factualidade assente].

Isto mesmo foi já assumido pelo presidente do concelho de administração da sociedade devedora originária, em termos que constam no documento reproduzido na alínea FF) do probatório, a fls. 10 dos autos.

Com efeito, o Oponente, no âmbito da sua atividade na sociedade devedora originária, exercia funções na área operacional, na área de retalho, tratando das encomendas, montagem de lojas, questões logísticas, atividade que exerceu no período em que esteve nomeado como vogal do conselho de administração da sociedade devedora originária [cfr. alínea Y) da factualidade assente].

Ou seja, a atividade do Oponente limitava-se à área operativa, não participando nas decisões e definição das orientações e linhas estratégicas da sociedade.

Com efeito, como se deixou assente em X) do probatório, o Oponente foi nomeado vogal do conselho de administração da sociedade devedora originária por mera conveniência, com a finalidade de preencher o órgão colegial, nos termos definidos pelo pacto estatutário, dada a renúncia dos anteriores administradores.

É, assim, entendimento do Tribunal que, não obstante o Oponente ter praticado alguns, poucos, atos concretos que poderiam indiciar o exercício das funções de administrador, analisando o contexto da matéria de facto provada, verifica-se que o Oponente não estava a dirigir a vontade e destino da sociedade devedora originária, mas que se limitava a assinar documentos negociados e decididos pelo presidente do conselho de administração.

Como decidiu o Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 8 de março de 1995, no processo n.º 018834 (publicado em 31 de julho de 1997 no Apêndice do Diário da República, e disponível para consulta em www.dre.pr) “Não exerce tal gerência de facto um membro da administração que apenas desempenha funções de director-técnico comercial, sem qualquer intervenção na parte administrativa e financeira da sociedade, não participando nas reuniões da administração nem sequer sendo ouvido quanto às decisões ali tomadas”.

O mero gerente/administrador de direito pode praticar atos formais de gerência/administração; fazendo-o, porém, na dependência do gerente/ administrador efetivo que lhe determina a oportunidade, o que, o como e o quando fazer. A sua função esgota-se nas assinaturas e não pode (porque não tem o poder) ir para além disso.

Assim, no caso como o dos autos, se o administrador de direito se limite a assinar alguns (poucos) documentos que o verdadeiro administrador de facto lhe diz para assinar, e não tem qualquer controlo sobre os destinos da sociedade, ou seja, não compra, não vende, não contrata, nada sabe sobre o assunto, sendo tudo decidido por quem efetivamente administra a sociedade, não se pode considerar aquele administrador um gerente de facto para efeitos do disposto no artigo 24.º da LGT.

Face a todo o exposto, não tendo sido demonstrado que o Oponente, designadamente no período a que respeita a dívida exequenda ou em que esta se venceu, era administrador de facto da sociedade devedora originária, antes pelo contrário, impõe-se decidir pela procedência da alegação de ilegitimidade em apreciação, com a consequente procedência da oposição”.

A Recorrente discorda de tal conclusão, acentuando que “a Fazenda Pública cumpriu o ónus de prova que sobre si impende, ou seja, provou o exercício efetivo de funções de administração ou gestão por parte do Oponente”. Concretizando, salienta a Fazenda Pública que “Está provado (…) que o Oponente foi, para além de gestor de direito, gestor de facto da sociedade devedora originária, exercendo essas funções na data limite de pagamento/entrega da prestação tributária que está na origem da instauração do PEF antes mencionado”, tendo em conta que o Oponente, “enquanto vogal do conselho de administração da referida sociedade, assinou diversos documentos essenciais à prossecução da atividade desta”. Para a Fazenda Pública, importa ter em conta que para efeitos de responsabilização “subsidiária dos administradores ou gerentes de facto, a lei não exige que estes pratiquem todos os atos de administração da sociedade, podendo a administração de facto limitar-se à prática de determinados atos em representação da mesma”. Ainda com interesse para o fundamento apreciado na sentença, a Recorrente salienta que “pouco importa a “assunção de culpas” por parte do Presidente do Conselho de Administração da sociedade devedora originária, pois a atuação/intervenção do Oponente na celebração de alguns importantes contratos, ou até nomeando um CFO, demonstram evidente vontade e concretização de uma efetiva representação e vinculação da sociedade, tanto interna como externamente”.

Adiante-se, desde já, que o sentido da decisão, isto é, a procedência da oposição com base na ilegitimidade do revertido, atento o não exercício da administração da devedora originária, não nos merece censura.

Vejamos as razões para assim concluirmos.

A AT reverteu a execução fiscal contra F …………………….., com base na administração de facto da apontada sociedade comercial, invocando, para tanto, o disposto no artigo 24º, nº1, alínea b) da LGT, nos termos do qual:

«1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:

(…)

b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento».

Ora, a reversão operada ao abrigo do apontado artigo 24º, nº1 da LGT pressupõe sempre - independentemente de se tratar da alínea a) ou b) – o exercício efetivo das funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entes fiscalmente equiparados, o que resulta claramente da inclusão na disposição apontada das expressões “exerçam, ainda que somente de facto, funções” ou, também, da alusão ao “período de exercício do seu cargo”.

Por conseguinte, é fácil concluir que, para efeitos de efetivação da responsabilidade subsidiária dos gerentes e administradores, não basta, para a responsabilização das pessoas aí indicadas, a mera titularidade de um cargo, sendo indispensável que tenham sido exercidas as respetivas funções.

Assim, desde logo se vê que a responsabilidade subsidiária depende, antes de mais, do efetivo exercício da gerência ou administração.

A este propósito, deixamos transcritas as considerações feitas no acórdão do TCAN, de 30/04/14, no processo nº 1210/07.5, as quais assumem aqui inteira pertinência:

“(…)

Pois bem, e tal como se aponta no Ac. do S.T.A. de 02-03-2011, Proc. nº 0944/10, www.dgsi.pt, “… Na verdade, há presunções legais e presunções judiciais (arts. 350.º e 351.º do CC). As presunções legais são as que estão previstas na própria lei. As presunções judiciais, também denominadas naturais ou de facto, simples ou de experiência são «as que se fundam nas regras práticas da experiência, nos ensinamentos hauridos através da observação (empírica) dos factos». (ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA, e SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, 1.ª edição, página 486; Em sentido idêntico, MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, páginas 215-216, e PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, volume I, 2.ª edição, página 289.).

De facto, não há qualquer norma legal que estabeleça uma presunção legal relativa ao exercício da gerência de facto, designadamente que ela se presume a partir da gerência de direito.

No entanto, como se refere no acórdão deste STA de 10/12/2008, no recurso n.º 861/08, «o facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência comum.

E, eventualmente, com base na prova de que o revertido tinha a qualidade de gerente de direito e demais circunstâncias do caso, nomeadamente as posições assumidas no processo e provas produzidas ou não pela revertida e pela Fazenda Pública, o Tribunal que julga a matéria de facto pode concluir que um gerente de direito exerceu a gerência de facto, se entender que isso, nas circunstâncias do caso, há uma probabilidade forte (certeza jurídica) de essa gerência ter ocorrido e não haver razões para duvidar que ela tenha acontecido. (Sobre esta «certeza» a que conduz a prova, pode ver-se MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, páginas 191-192.).

Mas, se o Tribunal chegar a esta conclusão, será com base num juízo de facto, baseado nas regras da experiência comum e não em qualquer norma legal.

Isto é, se o Tribunal fizer tal juízo, será com base numa presunção judicial e não com base numa presunção legal.»

Todavia, ainda que não seja possível partir-se do pressuposto de que com a mera prova da titularidade da qualidade de gerente que a revertida tinha não se pode presumir a gerência de facto, é possível efectuar tal presunção se o Tribunal, à face das regras da experiência, entender que há uma forte probabilidade de esse exercício da gerência de facto ter ocorrido.

Mas, por outro lado, na ponderação da adequação ou não de uma tal presunção em cada caso concreto, nunca há num processo judicial apenas a ter em conta o facto de a revertida ter a qualidade de direito, pois há necessariamente outros elementos que, abstractamente, podem influir esse juízo de facto, como, por exemplo, o que as partes alegaram ou não e a prova que apresentaram ou deixaram de apresentar” (fim de citação).

Ora, da factualidade apurada resulta, desde logo, que:

- em 01/02/91, foi averbada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa a constituição da sociedade anónima com a denominação de “P……..F....... - Supermercados, S.A.”

- A referida sociedade obrigava-se: “a) pela assinatura do presidente do conselho de administração; b) pela assinatura de dois administradores; c) pela intervenção de um administrador delegado, dentro dos limites da delegação do Conselho de Administração; d) pela assinatura de um administrador e de um procurador com poderes para a categoria de atos na qual se inclua aquele em que intervém; e) pelas assinaturas de dois procuradores, conjuntamente, com poderes para a categoria de atos na qual se inclua aquele em que intervém; f) pela assinatura de um procurador com poderes especiais”;

- Por deliberação de 01.02.2011, registada na Conservatória do Registo Predial/Comercial do Seixal em 16.02.2011, o Oponente foi designado como vogal do Conselho de Administração da mencionada sociedade, para o triénio 2011/2013.

Até aqui, daquilo que se trata, no que vem evidenciado, é da administração de direito e, como é pacífico, da administração de direito não se retira a de facto.

A Fazenda Pública, ciente do ónus que lhe compete quanto ao exercício efetivo da gerência/administração, sublinha um circunstancialismo fático que, na sua tese, aponta no sentido do concreto exercício da administração, a saber:

- Em 31.08.2011, o ora Oponente assinou, na qualidade de administrador da sociedade P……. F....... - Supermercados, S.A., identificada em A) supra, o “Memorando de Entendimento” mencionado na alínea P);

- Em 14.11.2011, o ora Oponente assinou, na qualidade de administrador da sociedade P………. F....... - Supermercados, S.A., a Ata n.º 12, pela qual foi nomeado o Dr. ………………… como CFO da referida sociedade;

- Em 25.11.2011, o ora Oponente e C ……………….. assinaram, na qualidade de administradores da sociedade P……… F....... - Supermercados, S.A., o denominado “contrato de prestação de serviços” mencionado na alínea T do probatório;

- Em 28.12.2011, o Oponente assinou, na qualidade de administrador da sociedade P………… F....... - Supermercados, S.A, o denominado “Aditamento ao Contrato de Abertura de Crédito – Contrato Umbrella Grupado - celebrado em 29.12.2004”, mencionado na alínea V do probatório.

Vejamos, tendo presente que tais atuações se situam num curto período de 4 meses, concretamente entre agosto de 2011 e dezembro desse mesmo ano.

Fazendo uso do que se escreveu no acórdão deste TCA, de 21/05/15, no processo nº 8445/15, aí se diz sobre a responsabilidade subsidiária o seguinte:

“(…)

Mas que responsabilidade é esta. Segundo a opinião que defendemos, a responsabilidade do gerente pela violação das normas que impõem o cumprimento da obrigação fiscal radica no instituto da responsabilidade por facto ilícito assente em culpa funcional, isto é, em responsabilidade civil extracontratual (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 9/12/2004, rec.28/04, in Revista Fiscal, Vida Económica, Fevereiro, 2006, pág.28; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13).

O estatuto do gerente/administrador advém-lhe por virtude da sua relação negocial com a sociedade, iniciada com a sua nomeação para o exercício do cargo de gerente e consequente aceitação do mesmo, em virtude do que assume uma situação de garante das dívidas sociais, embora com direito à prévia excussão dos bens da empresa (cfr.artº.146, do C.P.C.Impostos; artº.239, nº.2, do C.P.Tributário; artº.153, nº.2, do C.P.P. Tributário).

A lei não define, precisamente, em que é que se consubstanciam os poderes de gerência, mas, em face do preceituado nos artºs.259 e 260, do Código das Sociedades Comerciais, parece dever entender-se que serão típicos actos de gerência aqueles que se consubstanciam na representação da sociedade perante terceiros e aqueles através dos quais a sociedade fique juridicamente vinculada e que estejam de acordo com o objecto social (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/5/1989, rec.10492;ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.465 e seg.).

É no artº.64, do C. S. Comerciais, que se encontra consagrado o dever de diligência dos administradores/gerentes de sociedade, nos termos do qual estes devem actuar com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, no interesse da sociedade, tendo em conta os interesses dos sócios e dos trabalhadores.

A gerência é, por força da lei e salvo casos excepcionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir actuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito. Estes poderes não são restritos a alguma espécie de relações jurídicas; compreendem tantas quantas abranja a capacidade da sociedade (cfr.objecto social), com a simples excepção dos casos em que as deliberações dos sócios produzam efeitos externos (cfr.artºs.260, nº.1, e 409, nº.1, do C.S.Comerciais). O gerente/ administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13; Raúl Ventura, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Sociedades por Quotas, III, Almedina, 1991, pág.128 e seg.; Rui Rangel, A vinculação das sociedades anónimas, Edições Cosmos, Lisboa, 1998, pág.27 e seg.)”.

Não percamos de vista, como deixámos aflorado, que a chamada gerência/administração de facto de uma sociedade comercial consistirá no efetivo exercício das funções que lhe são inerentes e que passam, nomeadamente, pelas relações com os fornecedores, com os clientes, com as instituições de crédito e com os trabalhadores, tudo em nome, no interesse e em representação dessa sociedade.

Para que se verifique a gerência/administração de facto é indispensável que o gerente use, efetivamente, dos respetivos poderes, que seja um órgão atuante da sociedade, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros - nestes termos, Rúben Anjos de Carvalho, Francisco Rodrigues Pardal, Código de Processo das Contribuições e Impostos, Anotado e Comentado, 2ª Edição, Coimbra, 1969, pág. 139 - citado, entre outros, nos acórdãos do TCAN de 18/11/2010 e 20/12/2011, Processos 00286/07 e 00639/04, respetivamente; vide, também, o acórdão do TCA Norte, de 27/03/14, processo nº 808/11.1BEPNF que aqui seguimos de perto.

No caso, da avaliação que fazemos do julgamento de facto, e na linha seguida na sentença, concluímos que a factualidade trazida aos autos - em concreto a nomeação como administrador do Revertido e a assinatura dos documentos a que aludem os pontos AA, BB, CC e DD do probatório - apesar de prima facie ser indiciadora do real e efetivo exercício da administração por parte do revertido, mostra-se insuficiente para efeitos da sua responsabilização, pois o que a matéria de facto (não impugnada) também demonstra é que o Recorrido não exerceu de facto funções de administração da devedora originária, no período a que respeitam as dívidas exequendas.

Vejamos. Vem demonstrado, que:

- - O Oponente foi nomeado vogal do conselho de administração da sociedade devedora originária pela necessidade de preencher o órgão colegial, nos termos definidos pelo pacto estatutário; sendo exigido mais de um gestor, o critério de escolha para tal cargo residia na designação de bons operacionais;

- O Oponente exercia funções de diretor da área operacional da sociedade Ponto F....... – Supermercados, S.A., na área de retalho, tratando de questões logísticas; o Oponente era um funcionário, operacional da sociedade devedora originária, que liderava a equipa na componente operacional;

- Apesar de administrador, o Oponente mantinha um enquadramento de subordinação funcional.

- Era o presidente do concelho de administração da sociedade P………. F......., C …………………, quem negociava e tomava todas as decisões de gestão da referida sociedade; a este propósito destaca-se a declaração proferida por C ……………… e o seu depoimento testemunhal, no sentido de que todas as opções de gestão e administração adotadas na sociedade são da sua exclusiva responsabilidade, não tendo nelas participado materialmente os restantes administradores. Destaca-se do seu testemunho que o Oponente não tinha poderes de decisão, sendo um diretor operacional. A administração da sociedade encontrava-se completamente centralizada na pessoa de presidente do conselho de administração, Dr. C …………... Todas as decisões eram tomadas por este.

- o modelo de administração da devedora originária centrava-se na pessoa do presidente do conselho de administração, C ………………………;

Temos, pois, face à da análise que fazemos de toda a extensa prova produzida e atentas as especificidades do caso concreto, que a assinatura pelo Recorrido dos apontados documentos, num curto período de 4 meses, num momento de restruturação da sociedade, surge num contexto de dependência funcional relativamente ao administrador C ………………, evidenciando a prática de atos pontuais, a pedido, e, como tal, sem o alcance que a Fazenda Pública lhes imputa.

Com efeito, apesar da factualidade indiciadora da administração da P………. F....... que o órgão de execução fiscal, em sede do procedimento de reversão elencou (acompanhado pela Recorrente, neste recurso jurisdicional), no caso dos autos foram dados como provados outros factos que permitem, com segurança, afastar a conclusão que o Oponente foi administrador de facto da sociedade devedora originária.

Efetivamente, tal como resulta do probatório, o Oponente, apesar de formalmente ter sido designado administrador da sociedade devedora originária, manteve-se a exercer as funções que sempre desempenhou, enquanto diretor da área operacional da P………… F....... – Supermercados, S.A., na área de retalho, tratando de questões logísticas.

Mostram-se provadas as efetivas funções do ora Recorrido, enquanto mero diretor operacional, demonstrando-se que era C …………. quem, após tomar as decisões relevantes para a gestão da empresa, solicitava a assinatura de diversos documentos aos administradores, sem que os mesmos neles tivessem qualquer intervenção. De resto, era o C …………., tal como resulta da prova efetuada, que concentrava em si todos os poderes de administração, tomando as decisões, dando ordens e instruções (inclusive aos administradores), decidindo pagamentos e representando a sociedade perante terceiros. Neste sentido, o TAF recorrido ficou convencido, e este TCA nisso o acompanha, que a assinatura dos documentos em causa foi feita num contexto de obediência funcional a C ……………………, sem intervenção no processo negocial correspondente ou na escolha das opções tomadas. Ou seja, a assinatura da apontada documentação foi feita a pedido do presidente do conselho de administração, C …………….., que era a pessoa que concentrava em si toda a gestão e desenvolvimento estratégico da sociedade devedora originária.

Na prática, era o C ……………… quem administrava sozinho, de forma centralizadora, a sociedade, o que equivale a dizer, no caso, e perante a abundante prova, que o Oponente, em termos de facto/ materiais, não exercia, de nenhum ponto de vista, a administração da P……… F........

Ora, não é demais lembrar que o exercício efetivo da administração é facto constitutivo de um pressuposto da responsabilidade subsidiária que se pretende efetivar através da reversão e a lei não estabelece, nesse domínio, qualquer presunção que inverta o ónus da prova.

Não obstante a Fazenda Pública ter carreado para os autos alguns elementos que podiam ser indiciadores do exercício da administração por parte do Recorrido, a verdade é que a prova produzida, designadamente a testemunhal, corrobora a alegação do Oponente, no sentido de que, apesar de ter figurado como administrador de direito da P……….. F......., jamais assumiu a administração da mesma. Trata-se – repete-se – de um circunstancialismo amplamente demonstrado nos autos, assente em prova sólida e que não foi impugnada pela Recorrente. De resto, resulta para nós evidenciado que C ……………… era o único administrador de facto da sociedade devedora.

Assim, e não obstante o Oponente ter praticado atos que tipicamente são suscetíveis de traduzirem atos de administração, fê-lo, contudo, desacompanhado dos inerentes poderes de gestão nos quais os gerentes e administradores se encontram investidos. Isto é, praticou atos vazios no seu conteúdo decisório, sem o animus de um administrador, na justa medida em que não era o Oponente que lhes dava uso, alheando-se por completo da administração da sociedade, a qual era assegurada e centrada na pessoa do presidente do conselho de administração, C ……………………... Era este que, de facto, detinha o poder efetivo de controlar os destinos da sociedade. Ao Oponente faltava, na certeira expressão utilizada no acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 16.04.2015, proferido no proc. n.º 01417/05.0BEVIS, “a densidade substantiva do cargo” (disponível em www.dgsi.pt).

Deste modo, e sem necessidade de mais nos alongarmos face ao julgamento de facto e ao entendimento adotado na sentença que deixámos parcialmente transcrita, há que concluir, com o TAF de Almada, que não pode o Recorrido ser responsabilizado, a título subsidiário, pelo pagamento das dívidas exequendas ao abrigo do artigo 24º da LGT, nº1, alínea b) da LGT. É, pois, parte ilegítima na execução fiscal – artigo 204º, nº1, alínea b) do CPPT.

Por conseguinte, a sentença, que assim decidiu, é de manter, com a consequente procedência da oposição, deixando prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos de oposição invocados.

Improcedem, pois, as conclusões da alegação de recurso e, nessa medida, há que negar provimento ao mesmo.


*

III - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 24/01/24

(Catarina Almeida e Sousa)

(Lurdes Toscano)

(Isabel Fernandes)