Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04189/10
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:12/15/2010
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL.
NULIDADES.
OMISSÃO PRONÚNCIA.
CADUCIDADE.
ERRO.
Sumário:1. As nulidades processuais secundárias, cometidas antes da prolação da sentença e por esta não recoberta, devem ser arguidas no prazo geral de dez dias a contar do seu cometimento ou da notificação de qualquer acto processual posterior que implique que o interessado delas tomou conhecimento ou pudesse ter tomado, se agindo com devida diligência;

2. Encontra-se precludido o prazo da arguição das mesmas pelo MP, apenas efectuado no recurso interposto da sentença final, quando o mesmo foi notificado para emitir parecer pré-sentencial que emitiu, quando as invocadas nulidades se reportavam a omissões ocorridas antes da emissão do mesmo parecer (falta de despacho a dispensar a produção de quaisquer outras provas e para a produção de alegações pelas partes);

3. Não padece do vício formal de omissão de pronúncia a sentença recorrida que não conheceu dos fundamentos atinentes à errada quantificação do tributo por entender que em sede de oposição vedado lhe estava conhecer dessa concreta ilegalidade;

4. O prazo de três anos para ocorrer a caducidade do direito à liquidação previsto no n.º2 do art.º 45.º da LGT, consubstanciado em erro evidenciado na declaração, apenas pode ter lugar nos casos em que tal erro resulta dos termos declarados na mesma e não perante a pura omissão de rendimentos declarados e que depois vieram a ser apurados em sede de inspecção tributária ao sujeito passivo.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. O Exmo Representante do Ministério Público (RMP) e Maria ..................., identificados nos autos, dizendo-se inconformados com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a oposição à execução fiscal deduzida, vieram da mesma recorrer, o primeiro para o STA e a segunda para este Tribunal, formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


Do Exmo RMP:
I - Recorre-se da aliás douta sentença proferida de fls. 129 a 131 dos autos, e mediante a qual o Mmo. Juiz a quo julgou a oposição, apresentada por Maria ..............., totalmente improcedente e determinou o prosseguimento do processo de execução fiscal.
II - Sucede porém que na tramitação dos autos se passou da fase dos articulados para a fase da sentença, com preterição da diligência de prova testemunhal requerida na petição inicial pela Oponente, ou pela omissão de qualquer despacho determinando, e fundadamente, a dispensa da fase de instrução e disso notificando aquela, sendo que tal constitui nulidade nos termos do disposto no artigo 201°, do CPC (aplicável ex vi do artigo 2°, alínea e), do CPPT), porque susceptível de influir no exame ou na decisão da causa;
III - Por outro lado, a passagem da fase dos articulados para a sentença, com igual preterição da fase de alegações de direito, obrigatória de acordo com as disposições dos artigos 120º e 211°, ambos do CPPT, constitui também nulidade processual secundária, de acordo com o disposto no artigo 201°, do CPC, por identidade de razões, e ainda porque tal constitui também violação dos princípios do contraditório e da igualdade dos meios processuais (artigos 3°, nº 3, do CPC, e 98º, da LGT).
IV – O Mmo. Juiz violou pois a invocadas disposições e princípios e bem assim como a referida disposição do artigo 120º, do CPPT (aplicável ex vi do artigo 211°, do mesmo diploma legal).
V - Daí pois que seja de anular a sentença recorrida devendo os autos baixar à 1ª instância para efeitos de produção de prova, e ainda para que as partes sejam notificadas para apresentação das suas alegações de direito nos termos do disposto no artigo 120º, do CPPT (aplicável ex vi do artigo 211°, do mesmo diploma).

Porém, V. Exas., Venerandos Conselheiros, apreciarão e decidirão como for de Direito!.


Da oponente/recorrente:


I - O Tribunal a quo erra na apreciação da matéria de facto e na aplicação do Direito.
II - O Tribunal a quo dá como provados factos que não estão provados, concretamente, que a dívida resulta de omissão na declaração de substituição do sujeito passivo, quando da prova produzida nestes autos, resulta que tal dívida provém de erros e inexactidões da declaração conforme relatório da administração fiscal, pelo que se impõe a alteração da decisão da matéria provada.
III - Por outro lado, da prova produzida nestes autos, documental, resulta provada a factualidade constante nos artigos 16°, 18°, 19º a 25°, 32º, 36° a 39° e 43º oposição; ao não considerar provada a matérias patente em tais artigos o Tribunal a quo errou na apreciação da matéria de facto, o que impõe a alteração da decisão dando como provado tais factos.
IV - O direito à liquidação do imposto em referência já se encontra caducado
VI - É aplicável o prazo de caducidade de 3 anos, atento o disposto no n.º 2 do art. 45° da L.G.T, contando-se nos impostos periódicos, como é o caso em apreço, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário
VII - Sendo o imposto relativo ao ano de 2004, o prazo para efeitos de liquidação terminou ao fim de 3 (três) anos, contados a partir de dia 31 de Dezembro de 2004, logo dia 31 de Dezembro de 2007.
VIII - A liquidação efectuada no ano de 2008 viola o disposto no artigo 45.º, n.º 2 LGT, pelo que o Tribunal a quo deveria ter proferido decisão diversa.
IX - Para além do mais a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia, al. d) do artigo 668.º CPC.
X - Com efeito, o tribunal a quo suscita questões de legalidade quando se limita a referir que a errónea qualificação e quantificação dos rendimentos não constitui fundamento do processo de oposição.
XI - Para além do mais, o Tribunal a quo não apreciou as despesas e encargos enunciados na oposição apresentada pelo Recorrente, pese embora tal questão tenha sido invocada, consequentemente, impunha uma apreciação por parte do Tribunal.
XII - A Recorrente apresentou os recibos das respectivas despesas, meio ­probatório bastante para demonstrar a existência dos encargos a considerar na determinação das mais-valias que possam existir,
XIII - Com efeito, pelo que se impõe dar como provada a factualidade supra enunciada e considerar o valor total das despesas para o cálculo das eventuais mais-valias.
XIV - Pelo que, as despesas que foram apresentadas deveriam ter sido consideradas, por força do disposto no artigo 51° CIRS.
XV - O Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 45°, n.º 2 LGT, 51° CIRS, al. a) do n.º 4 do artigo 10.º, 44.º e 46.º do CIRS e al. d) do artigo 668.º CPC.

Como é imperativo do Direito e da Justiça!


Foram admitidos ambos os recursos para subirem imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, quanto ao recurso interposto pelo Exmo RMP, junto do Tribunal “a quo”, nada disse, e quanto ao recurso interposto pela ora recorrente, pronuncia-se por ser negado provimento ao mesmo, por a sentença recorrida não padecer dos vícios que lhe vêm assacados, tendo a mesma feito uma correcta análise da factualidade pertinentes, a que depois, não deixou de aplicar o direito devido.


Por ao Relator se afigurar que o recurso interposto pelo Exmo RMP, deveria ser rejeitado por ter sido deduzido fora do prazo que a lei prevê para o efeito, foram as partes notificadas nada tendo as mesmas vindo dizer no respectivo prazo legal.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se o recurso interposto pelo Exmo RMP, quanto às invocadas nulidades processuais deve ser rejeitado por ter sido deduzido fora do prazo que a lei prevê para a respectiva arguição; Se a sentença recorrida padece do vício formal de omissão de pronúncia conducente à declaração da sua nulidade; E não padecendo, se o probatório fixado na sentença recorrida deve ser alterado no sentido proposto pela ora recorrente; E se o imposto exequendo (IRS) foi apurado com base em erro evidenciado na declaração de rendimentos apresentada, de modo a que o prazo para o direito à sua liquidação seja de apenas 3 anos.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório o M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
1- A Fazenda Pública instaurou execução fiscal contra Maria ..............., com o n°............., por dívidas de IRS do ano de 2004, para cobrança coerciva das quantias em dívida no montante de € 33.647,67. (Cfr certidão de dívida de fls 57, dos autos).
2- A dívida mencionada em 1 resultou de uma acção inspectiva ao contribuinte, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, e do qual consta que face à apresentação de uma declaração de substituição de anterior declaração de rendimentos para aquele ano procedeu-se à alteração dos elementos declarados em resultado das correcções dos rendimentos constantes daquela declaração, por se haver verificado a omissão de alienação de um prédio rústico sujeito a mais-valias, tendo-se procedido a liquidação do imposto e notificado os interessados, em 10.12.08. - cfr p.i de fls 6 e segs e relatório de fls 86 a 101, dos autos.
X
Factos não provados
Dos factos constantes da oposição, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade acima descrita.
X
Motivação da Decisão de Facto
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

A que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º1 do art.º 712.º do Código de Processo Civil (CPC, se acrescentam ao probatório mais dois pontos, em ordem a dele constar a factualidade relevante para a apreciação da questão conhecida no recurso interposto pelo Exmo RMP, junto do Tribunal “a quo”:
3- Nos presentes autos, após a dedução da contestação da FP que foi notificada à ora recorrente e que nada disse, o M. Juiz do mesmo Tribunal, antes de proferir a sentença final, proferiu o despacho de fls 125, “Ao M.P.”, o qual, na sequência, este Ilustre magistrado do MP apôs o seu visto em 12/04/2010 e escreveu: A nosso ver não existem quaisquer excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa, e daí que se pr. o prosseguimento da instância, sendo que nos autos não havia sido proferido qualquer despacho a considerar desnecessária a produção de qualquer outra prova e nem as partes haviam sido notificadas para alegarem por escrito – cfr. processado de fls 121 e segs;
4- A arguição das nulidades consistentes nas faltas dos despachos descritos no ponto anterior, apenas foi suscitada pelo Exmo RMP, no recurso interposto da sentença final, nas respectivas alegações do recurso, entradas no Tribunal “a quo” em 4/6/2010 – cfr. fls 144 e segs dos autos.


4. Tendo sido interpostos dois recursos da mesma sentença final, um para o STA e o outro para este Tribunal, sendo que o deduzido pela ora recorrente/oponente se reporta a matéria de facto que não só de direito, o que quer dizer que o julgamento da matéria de facto não se encontra ainda totalmente estabilizado (independentemente do mérito da arguição de tal errado julgamento desta matéria), a competência em razão da hierarquia para de ambos conhecer radica-se neste Tribunal, como constitui jurisprudência corrente, designadamente do mesmo STA(1), pelo que de ambos passamos a conhecer.

Assim e desde logo, passamos a conhecer do recurso interposto pelo Exmo RMP, junto do Tribunal “a quo”, por versar sobre invocadas nulidades processuais cometidas antes da prolação da sentença final e que, a procederem, teriam por efeito a anulação dos seus termos posteriores, incluindo da mesma sentença final, desta forma existindo uma prioridade lógica no conhecimento do mesmo, caso que poderia levar à perda de objecto do recurso interposto pela oponente.

Este recurso tem por objecto as nulidades invocadas que teriam sido cometidas no processado no Tribunal “a quo”, quer pela inexistência de despacho a dispensar a inquirição de testemunhas e respectiva notificação, quer pela inexistência de despacho a ordenar a produção de alegações pelas partes antes da prolação da mesma sentença final.

Tratam-se assim tudo, de actos processuais que no entender do recorrente deveriam ter tido lugar, na marcha processual anterior à prolação da mesma sentença e mesmo em momento anterior à prolação do seu parecer pré-sentencial.

Contudo, por força do disposto nos art.ºs 113.º, 114.º e 120.º, ex vi do art.º 211.º, todos do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), todas estas reputadas nulidades teriam tido lugar antes da notificação do mesmo ora recorrente para se pronunciar sobre as questões de legalidade que tenham sido suscitadas no processo ou suscitar outras nos termos das suas competência legais – cfr. n.º1 do art.º 121.º do mesmo CPPT – ou seja, tal notificação para o ora recorrente emitir tal parecer pré-sentencial surge assim, em termos da marcha do mesmo processo, como um acto consequente do fim dessa instrução (ou do respectivo despacho a dispensá-la, como o mesmo pretende) e da produção de alegações, sendo pois, consequentemente, posterior àquela tramitação pretensamente preterida.

Não se tratando de nenhuma das nulidades insanáveis previstas no art.º 98.º do mesmo CPPT e nem das nulidades com específico regime de arguição previsto nos art.ºs 193.º a 200.º do CPC, a sua relevância jurídica apenas se pode encontrar no âmbito das nulidades secundárias previstas no art.º 201.º e segs deste CPC, como nesta parte bem se pronuncia o mesmo recorrente.

Para estas nulidades contudo, o seu conhecimento depende desde logo, da sua arguição ter sido efectuada em tempo, qual seja, no prazo de dez dias a contar da data em que a mesma tenha sido cometida e a parte tenha intervindo em qualquer acto praticado no processo ou tenha sido notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência – n.º1 do art.º 205.º do mesmo CPC – ou seja, no caso, como o ora recorrente lhe foi aberta vista dos autos finda a fase dos articulados e no final da instrução, em 12/04/2010 (ainda que o mesmo não seja parte nos autos, deve-se-lhe aplicar o mesmo regime destas no que a tal arguição diz respeito), e as não veio a arguir, antes tendo proferido parecer nos seguintes termos “A nosso ver não existem quaisquer excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito da causa, e daí que se pr. o prosseguimento da instância”, deixou precludir o respectivo prazo para o efeito, já que só as veio a invocar nas alegações e conclusões do presente recurso que deram entrada neste Tribunal em 4/6/2010, muito para além dos dez dias, no recurso interposto da sentença final, que as não recobriu e nem de qualquer forma sobre tais questões se pronunciou(2).

Esta questão da in/tempestividade da arguição das mesmas é de conhecimento oficioso por banda do tribunal, porque a dedução fora do prazo do recurso que as invoca autoriza, desde logo, o indeferimento do mesmo nos termos do disposto no art.º 687.º, n.º3 do CPC, ex vi do art.º 2.º, alínea e) do CPPT, e tendo sido indevidamente admitido, como no caso foi, deve o mesmo ser agora rejeitado e não ter prosseguimento, por indevidamente admitido, o que ora se dispõe, não se tomando conhecimento do seu objecto.


5. Passamos agora a tomar conhecimento do recurso da oponente e desde logo pela invocada omissão de pronúncia, constante da matéria das suas conclusões IX) a XV), onde veio imputar à sentença recorrida tal vício formal, a existir, conducente à declaração da sua nulidade – embora a final se “tenha esquecido” de formular o correspondente pedido, aliás, nada veio mesmo peticionar, apenas tendo vindo a invocar “Como é imperativo do Direito e da Justiça!” - porque o mesmo a ocorrer gerar, na realidade, a nulidade desta, nos termos do disposto nos art.ºs 668.º n.º1 alínea d), 660.º n.º2 e 713.º n.º2 do Código de Processo Civil (CPC), 143.º e 144.º do Código de Processo Tributário (CPT), e hoje dos art.ºs 124.º e 125.º do CPT, importa por isso conhecer, em primeiro lugar, desta invocada nulidade.

Aquela invocada nulidade só pode ocorrer, nos termos daquelas normas citadas em primeiro lugar, quando o Juiz deixe de pronunciar-se em absoluto de questão que deva conhecer, que por isso tenha sido submetida à sua apreciação e da qual não conheça, nem o seu conhecimento tenha sido considerado prejudicado pela solução dada a outra(s), como constitui jurisprudência abundante(3).

Como sabiamente invocava o Professor Alberto dos Reis - Código de Processo Civil Anotado, volume V, (Reimpressão), pág. 142 e segs - «Esta nulidade está em correspondência directa com o 1.º período da 2.ª alínea do art.º 660.º. Impõe-se aí ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras....
São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão».

Consubstancia, no caso, a recorrente, tal omissão de pronúncia, segundo se consegue apreender da matéria das suas conclusões das alíneas em causa das alegações do recurso, por a M. Juiz do Tribunal "a quo", na sentença recorrida ... o tribunal a quo suscita questões de legalidade quando se limita a referir que a errónea qualificação e quantificação dos rendimentos não constitui fundamento do processo de oposição ...o tribunal não apreciou as despesas e encargos enunciados ... as despesas apresentadas deveriam ter sido consideradas ... sendo assim estas as concretas questões que aponta como tendo sido omitido o seu conhecimento na sentença recorrida e que por si tenham sido articuladas na respectiva petição inicial de oposição à execução fiscal, sendo certo, na verdade, que o juiz deve conhecer na sentença, ...das questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não de todos os argumentos ou raciocínios expendidos pelo recorrente para sustentar a sua posição, nos termos do disposto no art.º 660.º n.º2 do CPC, sendo manifesto não poderem ter ocorrido as apontadas omissões de pronúncia, já que a questão atinente ao não conhecimento da legalidade em concreto da liquidação em sede de oposição, como se fundamentou na mesma sentença, se não perceba onde possa residir essa omissão, quando houve pronúncia do tribunal quanto a essa questão, e quanto ao não conhecimento do acerto dessa liquidação, que a mesma recorrente pretendia por via dos encargos que enuncia, prendem-se com a legalidade em concreto que o M. Juiz do Tribunal “a quo” não conheceu, mas justificou porque o não podia fazer, citando a lei e mesmo doutrina que em tal sentido impõem, pelo que tal questão não ficou esquecida, antes ficou prejudicada pela solução dada de não ser possível conhecê-la nesta sede processual – cfr. art.º 660.º, n.º2 do CPC – desta forma não podendo ter ocorrido as apontadas omissões de pronúncia.

Como é sabido, por questões a que se reporta a norma do art.º 668.º n.º1 d) do CPC, não abrangem os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir(4), como se pronuncia entre outros, o acórdão deste Tribunal de 27.9.2005, recurso n.º738/05, tendo como relator o do presente.

No caso, tendo o M. Juiz do Tribunal “a quo” conhecido e decidido que a legalidade em concreto não constituía fundamento válido de oposição à execução fiscal, desta forma não tendo conhecido dos invocados encargos que a recorrente pretendia que fossem atendidos nessa mesma liquidação de IRS exequendo, este não conhecimento encontra-se justificado pela posição tomada pelo mesmo de não lhe caber tomar dos mesmos conhecimento nessa liquidação, desta forma tendo ficado prejudicado este conhecimento face ao outro fundamento invocado e que faz parte da mesma decisão, e que ao abrigo da citada norma do art.º 660.º, n.º2 do CPC, autoriza que dele se não conheça, pelo que não podem ter ocorrido as apontadas omissões de pronúncia, desta forma improcedendo a matéria das conclusões do recurso atinente a este vício formal.


Na matéria das três primeiras conclusões do recurso, insurge-se a ora recorrente com a sentença recorrida, pretendendo que a matéria de facto provada seja alterada, quer sendo fixada outra que entende também provada, quer sendo dada como não provada outra que foi dada como provada, sem que no entanto tenha dado cumprimento ao disposto no actual e já aplicável art.º 685.º-B do CPC, na redacção do Dec-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto (correspondente ao art.º 690.º-A, na anterior redacção), o que desde logo levaria à sua rejeição nos termos da mesma norma.

Porém, sempre se dirá que ao probatório da sentença recorrida devem ser levados os factos relevantes para a decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito – cfr. art.º 511.º do CPC – e não toda e qualquer matéria que não tenha qualquer relevo para tal desiderato, e que no probatório da sentença recorrida se mostram fixados os factos relevantes para o conhecimento do objecto da presente oposição, tendo em conta os seus possíveis fundamentos nos termos do disposto no art.º 204.º, n.º1 do CPPT, pelo que não vimos que a mesma deva ser alterada nos termos propostos pela mesma ora recorrente, cuja matéria, assim improcede.


Na matéria das restantes conclusões do recurso pretende a mesma ora recorrente que o prazo de caducidade do direito à liquidação seja de apenas três anos, ao abrigo do disposto no art.º 45.º, n.º2 da LGT, por se tratar de erro evidenciado na declaração, que constitui um dos casos em que tal prazo é encurtado para os tais três anos, pelo que a sua notificação da liquidação ocorrida em 10/12/2008, relativa ao ano de 2004, já o foi fora desse prazo.

Para o M. Juiz do Tribunal “a quo”, tal prazo não é de três anos, porque não se tratou de nenhum erro evidenciado em declaração de rendimentos apresentada pelo sujeito passivo donde resultou a liquidação em causa, mas sim de uma declaração de substituição apresentada pelo sujeito passivo em resultado de notificação efectuada pela AT para a apresentar, mas que esta declaração de substituição continuava a conter omissões, tendo existido uma acção inspectiva que as detectou, designadamente a omissão de rendimentos declarados provenientes de mais-valias resultantes da alienação de um prédio sujeito a mais-valias.

Sob a epígrafe “Caducidade do direito de liquidação”, dispunha a norma do art.º 45.º da LGT:
O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro – seu n.º1.
Nos casos de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo ou de utilização de métodos indirectos por motivo da aplicação à situação tributária do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade previstos na presente lei, o prazo de caducidade referido no número anterior é de três anos – seu n.º2.

Ou seja, tal prazo de três anos, por motivo de erro evidenciado na declaração, apenas pode ter lugar para aqueles casos em que, o sujeito passivo entrega uma declaração de rendimentos e face aos seus próprios dizeres, dela própria ressalta um qualquer erro que torna o apuramento do imposto em montante inferior ao nela apurado, sem a necessidade de a AT lançar mão de quaisquer outros elementos para o apurar o imposto legalmente devido, designadamente inspecção ou exame à escrita (5), não para os casos de omissão de rendimentos declarados que, como é bem de ver, dessa declaração pode nada resultar no sentido da sua existência, donde, em nosso entender, se justifica o encurtamento de tal prazo de caducidade porque nenhuma outra diligência investigatória se tornava necessária para a AT apurar o mesmo imposto, sendo este o elemento teleológico da norma subjacente a tal encurtamento do prazo de caducidade e que deve ser tomado em conta pelo intérprete nos termos do disposto no art.º 9.º do Código Civil.

Mas não foi isto que aconteceu nos presentes autos, como se pode ver do respectivo relatório da acção inspectiva cuja cópia consta de fls 86 e segs dos autos.

O que aconteceu foi que a ora recorrente entregou uma declaração de rendimentos em sede de IRS e nela omitiu os rendimentos (não os declarou) relativos à alienação ocorrida em 2004, de dois imóveis de que era co-proprietária, tendo sido notificada para apresentar uma declaração de substituição corrigindo as omissões detectadas, reafirma-se, em sede de inspecção, declaração esta de substituição que veio a entregar e nela, ainda assim, omitiu os rendimentos provenientes da alienação de um dos prédios, e nem mencionou de forma correcta o rendimento do que havia declarado nesta declaração de substituição, como se diz no relatório da mesma inspecção, pelo que a liquidação não pode ter tido por fonte apenas, tal declaração de substituição e os seus próprios dizeres, mas sim os dados e elementos recolhidos em sede de tal acção de inspecção, designadamente as diligências instrutórias levadas a efeito em tal procedimento de inspecção, como sejam as diligências realizadas junto do Cartório Notarial e da Conservatória do Registo Predial em ordem a apurar a real situação tributária da contribuinte, pelo que o prazo de caducidade do direito à liquidação, no caso, não pode ser de 3 anos como pretende a ora recorrente, mas sim de 4 anos como se decidiu n sentença recorrida, que assim não se mostrava ultrapassado quando da mesma foi notificada.


Improcede assim, toda a matéria das conclusões das alegações do recurso, sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em rejeitar o recurso interposto pelo Exmo RMP, dele se não conhecendo, e em negar provimento ao recurso interposto pela oponente e em confirmar a decisão recorrida.


Custas pela recorrente, e sem custas pelo recurso do Exmo RMP, por força da isenção legal – art.º 2.º, n.º2, alínea a) do CCJ.


Lisboa,15 de Dezembro de 2010

Eugénio Sequeira
Aníbal Ferraz
Pereira Gameiro


(1) Cfr. neste sentido, entre muitos outros, o acórdão do STA de 16/01/2008, recurso n.º 940/07.
(2) Se tais invocadas nulidades estivessem recobertas pela sentença final então o meio próprio para contra elas reagir já seria o recurso de tal sentença, como já vinha entendendo o Prof. Alberto dos Reis no seu Comentário, 2.º, pág. 507.
(3) Cfr. entre outros, os acórdãos do STA de 2.10.1996 (ambos), recursos n.ºs 20472 e 20491.
(4) Cfr. neste sentido, para além do acórdão deste TCAS de 12.10.2004, recurso n.º 5815/01, entre muitos outros, os acórdãos do STJ de 2.10.2003 (ambos), recursos n.ºs 2585/03, Rec. Rev., 2.ª Secção e n.º 480/03, Rec. Agravo, 7.ª Secção.
(5) Cfr. em sentido semelhante o acórdão do STA de 26/9/2007, recurso n.º 481/07.