Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:490/22.0BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:12/06/2022
Relator:ANA CRISTINA DE CARVALHO
Descritores:FALTA DE CITAÇÃO DA EXECUTADA PRINCIPAL
PRESCRIÇÃO
Sumário:I – A falta de citação da executada principal e a falta de requisitos essenciais do título executivo constituem nulidades insupríveis de conhecimento oficioso, podendo ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final devendo ser arguidas previamente em requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal, cabendo reclamação judicial da decisão que indefira essa arguição nos termos dos artigos 276.º e seguintes do CPPT.
II – Também a apensação dos processos de execução fiscal deve ser requerida previamente ao órgão da execução fiscal, cabendo reclamação judicial da decisão que a indefira, nos termos dos artigos 276.º e seguintes do CPPT.
III – O meio processual adequado à discussão da legalidade do despacho de reversão, bem como a própria ilegitimidade do revertido é a oposição à execução fiscal.
IV - As causas de interrupção da prescrição ocorridas relativamente ao executado principal deixam de ser oponíveis ao responsável tributário subsidiário, a citação deste (devedor subsidiário) ocorra mais de 5 anos após a liquidação do imposto, mantendo-se o prazo de prescrição de 8 anos sujeito, à suspensão e à interrupção decorrentes de causas que eventualmente se verifiquem na esfera do revertido.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, as Juízas que compõem a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I - RELATÓRIO


H…, inconformado com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou improcedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal, deduzida contra a decisão de indeferimento do pedido de declaração de prescrição das dividas em cobrança coerciva, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2186200701050532 e apensos, veio deduzir o presente recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:

«1. ILEGALIDADE DAS REVERSÕES - Segundo consta do referido despacho, o Reclamante foi alegadamente citado da reversão dos mesmos e das dívidas em 18-7-2012.

2. A devedora originária não foi nunca citada dos referidos PEF – tendo apenas o Reclamante sido alegadamente citado – segundo o despacho.

3. Entendendo que a citação do responsável subsidiário aproveita ao devedor originário (!), ao abrigo do art. 48.º n.º 2 da Lei Geral Tributária (LGT).


4. Com o que não se pode concordar, atento o disposto nas normas dos art. 22.º n.ºs 2 e 4, 23.º n.ºs 1, 2 e 4 da LGT e art. 159.º do CPPT.

5. Isto significa que as dívidas são da sociedade comercial referida e que os PEF que as têm por objecto foram (ou deveriam ter sido) instauradas contra a mesma, devendo a mesma ter sido citada para pagar ou se opor ao processo de execução fiscal, uma vez que “A citação é o acto destinado a dar conhecimento ao executado de que foi proposta contra ele determinada execução ou a chamar a esta, pela primeira vez, pessoa interessada.” (art. 35.º n.º 2 do CPPT).

6. Bem como o art. 189.º n.º 1 e 3 do CPPT, que prevê a possibilidade de requerer a dação em pagamento e pagamento em prestações, devendo o órgão de execução fiscal ordenar a citação do executado 24 horas após a instauração da execução e respectivo registo (art. 188.º n.º 1 do CPPT).

7. O que faz todo o sentido, no caso em apreço, uma vez que a sociedade S…, Lda é uma pessoa jurídica, com património próprio e separado do do seu sócio, e que responde pelas suas dívidas próprias – art. 5.º e 6.º, 197.º e 270.º-G do Código das Sociedades Comerciais.

8. Assim sendo, deveria a sociedade, que é uma entidade jurídica distinta do seu sócio, ter sido citada.

9. Constituindo a falta de citação e a falta de requisitos essenciais do título executivo nulidades insanáveis que têm por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente – sendo as mesmas de conhecimento oficioso e podendo ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final (art. 165.º do CPPT).

10. Até porque, a não ser assim, estar-se-ia perante uma violação das garantias dos contribuintes, uma vez que o espírito da lei foi salvaguardar os sócios aos até ao limite do património social, só os chamando a pagamento quando a sociedade não puder cumprir total ou parcialmente com as suas obrigações – sob pena de se fazer os sócios pagar duplamente e lesando assim as suas garantias e legítimas expectativas de forma intolerável.

11. Tendo-se procedido no caso concreto a uma inversão ilegal e desproporcionada das disposições legais que regem esta matéria, sacrificando assim o contribuinte em prol do suposto bem comum.

12. ILEGITIMIDADE - O Reclamante não podia ter sido alvo das reversões dos referidos PEF ao abrigo do art. 24.º da LGT porque a AT não apresentou prova da gerência de facto da Revertida e ora Reclamante, nem provou os pressupostos factuais da presunção de culpa acima referida, nos termos do art. 74.º da LGT.

13. Não sendo assim o Reclamante responsável subsidiário da referida sociedade, e como tal não podia ter sido legitima e legalmente alvo de qualquer reversão (art. 23.º n.º 1 e 2 e 24.º n.º 1da LGT e art. 159.º do Código do Procedimento e Processo Tributário - CPPT).

14. Com decidiram, entre outros, o Acórdão do TCA Norte Proc. n.º 2830/11.9BEPRT, os Acórdãos do TCA Sul, Proc. n.º 240/12.0BEFUN e Proc. n.º1119/14.6BELRS, o Acórdão do TCA Sul, 2410/11.9BELRS – todos em conformidade com o Acórdão do STA, Proc. n.º 0944/10.

15. Constituindo uma nulidade insanável e carecendo por isso de força executiva o(s) titulo(s) executivo(s) em que se baseiam os processos de execução fiscal/tributária revertidos contra a ora Reclamante, por não indicar um dos requisitos essenciais obrigatórios, i.e., o seu correcto e legítimo devedor, uma vez que o ora Reclamante carece de legitimidade passiva por não ser efectivamente responsável subsidiária, como se fundamentou supra (art. 23.º n.º 4 da LGT e art. 162.º, 163.º n. 1 al. d), e 165.º n.º 1 al. b) do CPPT).

16. Sendo a referida nulidade insanável de “conhecimento oficioso” e tendo “por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente, aproveitando-se as peças úteis ao apuramento dos factos” – art. 165.º n.º 2 e 4 do CPPT e o Acórdão do TCA Sul, Proc. n.º 00475/03, o Acórdão do TCA Norte, Proc. n.º 03493/10.4BEPRT e o Acórdão do STA, Proc. n.º 0447/13.2BEVIS 038/18.

17. - E isto porque a responsabilidade tributária é uma responsabilidade legal, acessória e excepcional – desde logo por atentar contra os princípios igualdade fiscal e da capacidade contributiva, tendo por isso de respeitar o princípio da proporcionalidade em sentido amplo.

18. Como defende Tânia Meireles da Cunha (Da Responsabilidade dos Gestores de Sociedades Perante os Credores Sociais – A culpa nas responsabilidades civil e Tributária, Almedina, 2.ª ed., 2009, pp. 86-88, 91-92, 93, 133, 136-137); e em idêntico sentido, quanto à excepcionalidade da responsabilidade tributária, vão D. Leite de Campos/B. Silva Rodrigues/J. Lopes de Sousa (Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita Ed., 2012, pp. 215-216).

19. Por outro lado, importa esclarecer que não obstante a Jurisprudência superior venha a apontar no sentido de ser a oposição à execução o meio processual adequado a conhecer da ilegitimidade do revertido e da ilegalidade da reversão, o mesmo não significa que as mesmas não possam (ou não devam) ser conhecidas em sede da reclamação judicial.

20. Desde logo porque o estatui peremptoriamente o art. 276.º do CPPT - o que está em consonância com as garantias dos contribuintes, nomeadamente os direitos de defesa e de tutela jurisdicional efectiva (art. 20.º, 103.º n.º 2 e 3 e 268.º n.º 3 e 4 da CRP).

21. Mas também porque, como foi referido acima e na reclamação judicial, em bom rigor, antes da apreciação das questões da ilegitimidade do revertido e da ilegalidade da reversão, está a falta de citação da devedora originária, o que constitui nulidade insanável no mesmo PEF que foi depois revertido contra o ora Recorrente, sendo que essa nulidade insanável, de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final, e tem “por efeito a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente, aproveitando-se as peças úteis ao apuramento dos factos” – art. 165.º n.º 2 e 4 do CPPT.

22. Nulidade insanável decorrente da falta de citação da devedora originária que podia e deveria ter sido observada quer pelo Órgão de Execução Fiscal (OEF), quer pelo Tribunal de Primeira Instância – cujas ocorrência e inobservância constituem ilegalidades que aqui expressamente se invocam para todos os devidos efeitos legais.

23. Sendo a reclamação judicial meio idóneo para conhecer dessa falta processual, quer porque ela constitui uma omissão lesiva de interesses legítimos do executado/terceiro ocorrida no decurso do PEF, quer porque consubstanciando a referida falta de citação uma nulidade insanável ela pode ser conhecida oficiosamente até ao trânsito em julgado da decisão final, e sendo a norma que a prescreve imperativa – sendo a falta de citação e a nulidade consequente distintas da questão da ilegalidade da reversão e da ilegitimidade do revertido (assim os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, Proc. n.º 032/13, decidido por unanimidade em 08-01-2014 e o Proc. n.º 0380/15, decidido por unanimidade em 14-05-2015).

24. Em segundo lugar, não podemos concordar com a interpretação absolutamente literal e redutora que foi feita, quer pelo OEF, quer pelo Tribunal de Primeira Instância, salvos o devido respeito e melhor opinião, do n.º 3 do art. 48.º da LGT.

25. Porque, por um lado, esta é uma norma garantística relativamente ao responsável subsidiário, que por não ser o devedor originário e principal, e por lesar os princípios da igualdade fiscal e da capacidade contributiva, vê assim o direito do OEF de reverter o PEF contra si limitado ao período de 5 anos desde a liquidação do tributo, sob pena de caducidade.

26. Mas antes e acima de tudo, estabelecendo o art. 48.º n.º 3 da LGT uma distinção capital entre o devedor originário e o responsável subsidiário, que por força da ligação àquele, e não obstante a lesão dos princípios da igualdade fiscal e da capacidade contributiva, é chamado ao PEF para pagar uma dívida que lhe é alheia – o que se reflecte nos distintos regimes jurídicos de ambos.

27. Pelo que na falta de citação da devedora originária e principal, todo o processado posteriormente no âmbito do referido PEF seria inválido e ineficaz ao Recorrente, devendo aquela ser citada para se defender e opor – uma vez que é uma pessoa jurídica distinta do seu sócio, e que tem um património social que responde pelas suas dívidas.

28. E só depois deveria ter sido notificado o Recorrente para se pronunciar quanto ao projecto de reversão e eventualmente citado para se defender e opor à reversão da execução fiscal contra si.

29. Tudo o que deveria ter sido tomado em atenção e não o foi – ou não o foi devidamente.

30. PRESCRIÇÃO - Em segundo lugar, a AT reconhece que todas as dívidas tributárias objecto dos referidos PEF, no montante total acima referido, são devidas originariamente pela S…, Lda.

31. Tendo os PEF e respectivas dívidas aí mencionados sido alegadamente revertidos contra o Reclamante, e a esta sido citados em 18-7-2012 – segundo consta do referido despacho.

32. E tendo considerado que as dívidas estavam prescritas ao abrigo dos art. 48.º n.º 2 e 49.º n.º 1 da LGT e do art. 327.º do Cciv.

33. Com o que não se pode concordar.

34. Primeiro, quanto ao PEF n.º 2186200701050532 e apensos, tratando-se de dívidas 2007, estão todas prescritas ao abrigo dos art. 48.º n.ºs 1 e 3 e 49.º n.º 3 da LGT, pois que desde a data da divida mais recente (2008) até à data da alegada citação decorreram os 5 anos, e até Maio de 2022 decorreram mais de 8 anos – além de que a prescrição só se interrompe uma vez com o facto que primeiro se verificar (a citação da devedora originária a S… Unipessoal, Lda.), uma vez que quanto a si não se verificou qualquer causa suspensiva ou interruptiva da mesma, nos termos do art. 49.º n.º 1 e 4 da LGT.

35. Neste sentido, o Acórdão do STA, Proc. n.º 115/12-30, o Acórdão do TCA Norte, Proc. n.º 01403/14.9BEBRG, os Acórdãos do STA, Proc. n.º 0730/13.7BELRA e Proc. n.º 0881/05.1BEPRT e o Acórdão do STA, Proc. n.º 0212/18.0BEMDL.

36. Por outro lado, as declarações de insolvência da sociedade S…, UNIPESSOAL, LDA e do Requerente não produziram quaisquer efeitos interruptivos ou suspensivos sobre o prazo prescricional das dívidas tributárias referidas, uma vez que se trata de uma dívida alheia ao mesmo, cujos PEF foram revertidos contra si – sendo um responsável subsidiário – pelas razões invocadas no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 557/2018, de 23 de Outubro, já que “do ponto de vista do responsável subsidiário, a norma em crise cria uma nova causa de suspensão da prescrição (a insolvência de outrem), declarada em processo em que este não é parte e sem que o Governo haja sido para tal autorizado.” (excerto retirado do referido Acórdão – sublinhado nosso).

37. Como também entendem, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo n.º 0115/14, decidido por unanimidade em 07-10-2015 e Acórdão do TCA Sul, Processo n.º 742/13.0BELLE, decidido por unanimidade em 30-09-2019.

38. Sendo que a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral “produz efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional ou ilegal”, nos termos do art. 282.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (negrito e sublinhado nossos).

39. A prescrição é de conhecimento oficioso e pode ser invocada a todo o tempo (art. 175.º do CPPT).

40. Neste sentido vai o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo n.º 01024/15., o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo n.º 0111/07.1BEBJA 0148/17 e mais incisivamente o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo n.º 0440/10.7BECBR 01088/17.

41. Em terceiro lugar, os referidos PEF têm por objecto dívidas tributárias cujos factos geradores ocorreram entre 2007 e 2010, pelo que, mesmo que a Reclamante tenha deles sido citada para efeitos de se operar a respectiva reversão dos PEF contra si, sempre se dirá que desde então até à presente data já passaram mais de 11 anos.

42. Estando assim ainda prescritas, segundo o entendimento de parte da doutrina e jurisprudência, as restantes dívidas tributárias ao abrigo da tese do efeito instantâneo da interrupção da prescrição das dívidas tributárias.

43. Pois que os art. 48.º e 49.º da LGT apenas se referem aos institutos da prescrição e da interrupção e suspensão da prescrição, não procedendo às respectivas definições legais.

44. Dispondo o art. 11.º da LGT que “1 - Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.

45. Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei.

46. Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.

47. As lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica.” (negrito e sublinhado nossos).

48. E dispondo o art. 2.º da LGT que se aplicam subsidiária e sucessivamente, como legislação complementar, as demais normas constantes de legislação tributária e administrativa – e só no fim a legislação substantiva e adjectiva civil.

49. Pelo que das normas acima referidas e citadas não se pode retirar outro sentido que não seja o do efeito instantâneo das causas de interrupção da prescrição.

50. Nomeadamente, não poderá proceder a tese do efeito duradouro das causas de interrupção da prescrição, como advoga outra parte da doutrina e jurisprudência, baseando-se na aplicação subsidiária do direito civil (art. 326.º e 327.º do Cciv), entendendo ser a prescrição um instituto próprio do Direito Privado em geral, e do Direito Civil em particular.

51. E isto porque, em primeiro lugar, o instituto da prescrição, tendo eventualmente nascido no seio do direito civil (até do Ius Civile romano), é hoje indiscutivelmente um instituto transversal a todos os ramos do Direito, incluindo naturalmente o do Direito Tributário e Fiscal – como não poderia deixar de ser atentas as razões e interesses de certeza e segurança jurídicas e das legítimas expectativas dos contribuintes que lhe subjazem.

52. Em segundo lugar, se a interpretação em direito fiscal não tem regras específicas, como afirma peremptoriamente o supra citado art. 11.º n.º 1 da LGT, ela sempre terá de atender às especificidades deste ramo do Direito, as quais estão, não por acaso, consagradas na própria constituição (art. 103.º e 165.º n.º 1 al. i) da CRP).

53. Estando em causa no Direito Fiscal em geral, e sendo particularmente sentido no instituto da prescrição, um complexo e delicado equilíbrio entre, por um lado, a obtenção de receitas segundo critérios de igualdade material e de estrita legalidade, e por outro, a garantia da propriedade privada, da segurança e certeza jurídicas e das legítimas expectativas dos contribuintes – em suma, entre os interesses fiscais da colectividade e os interesses individuais dos cidadãos.


54. Não se compreendendo, por conseguinte, que se aplicasse a este ramo do Direito, atentas as relações de poder ou de supra-infra ordenação que se estabelecem entre o Estado e os cidadãos, o instituto da prescrição nos mesmos termos em que este se aplica no Direito Civil, i.e., aos cidadãos relacionados entre si em condições de paridade.

55. Pelo que não pode de todo e em todo aplicar-se subsidiariamente ao Direito Fiscal as normas dos art. 326.º e especialmente do 327.º do Cciv – razão pela qual o art. 2.º da LGT manda aplicar sucessivamente, as normas tributárias, as normas administrativas e, só no fim de tudo, as normas civis; bem como que o art. 11.º n.º 4 da LGT dispõe que “As lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica”.

56. Não fazendo, portanto, qualquer sentido a aplicação de normas de direito civil no âmbito do direito Fiscal – pelas razões acima referidas, não obstante a estrutura da obrigação fiscal ser sensivelmente idêntica à da obrigação civil – não sendo evidentemente essa analogia estrutural bastante para a aplicação de normas civis em matéria tributária, atentas as diferenças axiológicas e teleológicas existentes entre estes dois ramos do Direito.

57. Quando muito, se se considerar que a omissão da definição dos efeitos da interrupção da prescrição tributária na legislação tributária é lacunosa, seria de recorrer a outros ramos e normas do Direito Público, nomeadamente do direito contraordenacional – como parece resultar do art. 2.º da LGT.

58. Ainda que se reconheça categoricamente que a diferença entre o Direito Fiscal e o Direito Sancionatório assenta precisamente na ausência de intenção sancionatória no primeiro, e no desígnio sancionatório no segundo.


59. Porém, ainda assim nos parece mais viável a aplicação dos efeitos da interrupção e da suspensão da prescrição contidos nas normas contraordenacionais (por exemplo, nos art. 28.º n.º 3 e 30.º-A n.º 2 do Regime do Ilícito de Mera Ordenação Social (DL n.º 433/82, de 27 de Outubro) – atenta uma maior afinidade entre o Direito Fiscal e os Direitos Contraordenacional e Penal, do que entre aquele e o Direito Civil.

60. Até porque parece-nos não fazer muito sentido que os procedimentos e as coimas resultantes de infracções fiscais acabem por prescrever quando “desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade.”, quando a própria prescrição tributária, segundo a tese do efeito duradouro da prescrição, pode ser sistematicamente interrompida e não começa a correr novo prazo até o fim do processo transitado em julgado – processo esse que é instaurado pela AT e tramitado maioritariamente nas suas mãos.

61. O que equivaleria – e equivale – a uma imprescritibilidade prática das dívidas tributárias, violando-se assim as mais elementares garantias dos contribuintes em matéria de certeza, segurança e expectativas jurídicas legítimas, as quais estão constitucionalmente consagradas (art. 2.º, 3.º, 18.º, 103.º e 165.º da CRP).

62. Imprescritibilidade essa que não pode também basear-se na indisponibilidade do crédito tributário (art. 30.º n.º 2 da LGT), pelas razões acima assinaladas.

63. Sendo, além do mais, a imprescritibilidade das dívidas tributárias manifestamente desproporcional em face das garantias dos contribuintes acima mencionadas.

64. Razões pelas quais pugnamos pelo efeito instantâneo das causas de interrupção da prescrição.

65. Neste sentido, como dissemos atrás, vai parte da doutrina e da jurisprudência portuguesa.

66. Quanto à Doutrina: Prof. Tomás Cantista Tavares (“PRESCRIÇÃO DA PRESTAÇÃO TRIBUTÁRIA: EXECUÇÃO FISCAL, SUSPENSÃO E DECLARAÇÃO EM FALHAS”, pp. 835-856, Março de 2020); Prof. Serena Cabrita Neto (“A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA”, in Execução Fiscal [Em linha], Lisboa, Centro de Estudos Judiciários, Março de 2019, pp. 120-121).

67. Quanto à Jurisprudência: o voto de vencida da Mm.ª Juíza Conselheira Ana Paula Lobo no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo n.º 01360/17, decidido em 10-01-2018; as Mm.ªs Juízas de Direito, Maria João Marques (“A PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA TRIBUTÁRIA – AS ETAPAS NA CONTAGEM DO PRAZO”, in Prescrição da obrigação tributária (2.ª edição) [Em linha], Lisboa, Centro de Estudos Judiciários, Maio de 2020, pp. 123 e ss.) e Claúdia Luísa Costa (“A IMPRESCRITIBILIDADE DAS DÍVIDAS TRIBUTÁRIAS – ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL N.º 122/2015”, in ob. cit., pp. 151 e ss.) - em sentido idêntico, ao menos no plano do Direito a constituir, parece ir também o Mm.º Juiz de Direito Carlos Valentim (“SOBRE A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO FISCAL”, in ob. cit., pp. 97 e ss.).

68. Nesta conformidade, deve a declaração em falhas jogar um papel decisivo no que tange às prescrições fiscais, uma vez que se o legislador consagrou legalmente prazos regra mais curtos do que o prazo regra civil (e tem vindo a encurtar os prazos prescricionais tributários) – atentos os interesses e direitos dos contribuintes e a segurança e certeza jurídicas e as legitimas expectativas dos contribuintes – já que a Jurisprudência maioritária tem vindo a consagrar o efeito interruptivo e suspensivo da citação (efeito instantâneo e duradouro), num cenário em que os PEF começam e muitas vezes acabam nas mão do OEF – sob pena de na prática as obrigações tributárias não prescreverem.

69. Devendo a declaração em falhas ser vista como um poder-dever e não uma faculdade discricionária (ou mesmo arbitrária) nas mãos do OEF – podendo e devendo os Tribunais fiscalizar o cumprimento deste dever e substituir-se ao OEF quando este não o cumpra.

Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o presente Recurso Judicial ser considerado procedente por provado, requerendo-se consequentemente a V. Exa. que sejam:

i) Revogada a douta sentença e reconhecidas e declaradas as acima mencionadas ilegalidade da reversão, a ilegitimidade do Reclamante, as nulidades insanáveis decorrentes de falta de citação da devedora originária e as prescrições tributárias, com os fundamentos acima mencionados;

ii) apensados os referidos Processos de Execução Fiscal, ao abrigo do art. 179.º do CPPT;

iii) e, em consequência, anulados/extintos os referidos os Processos de Execução Fiscal e as respectivas dívidas tributárias. “


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A Recorrida não apresentou contra-alegações.

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O Ministério Público, através do Exmo. Procurador Geral Adjunto, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso em relação ao pedido de declaração de prescrição das dívidas, devendo ser rejeitado quanto às invocadas ilegalidades da reversão, as nulidades insanáveis decorrentes de falta de citação da devedora originária e quanto à ilegitimidade do Reclamante por não poderem ser conhecidas nestes autos.

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Com dispensa dos vistos legais, dada a natureza urgente do processo, vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão.

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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Importa assim, decidir se a sentença recorrida:

i) Efectuou errado julgamento ao decidir que a reclamação do acto proferido pelo órgão da execução fiscal não é o meio processual adequado para conhecer dos pedidos de ilegalidade da reversão e ilegitimidade do devedor subsidiário bem como da insanável por falta de citação da executada principal e por falta de requisitos essenciais do título executivo;

ii) Errou ao julgar não verificada a prescrição das dívidas exequendas;

iii) Incorreu em erro de julgamento de direito por ser inaplicável à prescrição dos créditos tributários o regime previsto no artigo 327.º, n.º 1 do Código Civil quanto ao efeito duradouro da interrupção do prazo.

III - FUNDAMENTAÇÃO

III – 1. De facto


É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

«a) Em 20.04.2006, pelo averbamento da inscrição AP.2/2……., foi registada na Conservatória do Registo Comercial da Moita a constituição da sociedade S… Unipessoal, Lda., tendo sido designado como gerente o ora Reclamante (cf. certidão permanente a fls. 173 a 174 do SITAF);
b) Entre 07.08.2007 e 06.03.2011, foram emitidas pelo Serviço de Finanças da Moita em nome da S… Unipessoal, Lda. as seguintes certidões de dívida e instaurados os seguintes processos de execução fiscal:
«Imagem no original»
(cf. certidões de dívida a fls. 63 a 74 e 77 a 80 do SITAF e documentos a fls. 158, 220, 222, 224, 226, 235, 237 e 239 do SITAF);
c) Em 03.04.2012, foi emitida pelo Serviço de Finanças da Moita em nome da S… Unipessoal, Lda. a seguinte certidão de dívida e instaurado o seguinte processo de execução fiscal:

(cf. certidão de dívida a fls. 75 e 76 do SITAF e documento a fls. 242 do SITAF);
d) Em 14.06.2012, foi determinada a apensação ao processo de execução fiscal n.º 2186200701050532, no que ora releva, dos processos de execução fiscal com os n.ºs 2186200701070428, 2186200801010107, 2186200801020625, 2186201001089277, 2186201001094882, 2186201101007491 e 2186200701052020 (cf. documento a fls. 172 do SITAF);
e) Em 15.06.2012, foi dirigido pelo Serviço de Finanças da Moita ao Reclamante, por carta registada com a referência RC991407710PT, ofício denominado de “Notificação Audição-Prévia (Reversão)”, no âmbito dos processos de execução fiscal n.º 2186200701050532 e apensos, tendente a notificar da “(…) preparação do processo para efeitos de reversão da(s) execução(ões) fiscal(is) infra indicada(s) contra V. Ex.ª, na qualidade de Responsável Subsidiário. Face ao disposto (…) fica notificado(a) para, no prazo de 15 dias a contar da presente notificação, exercer o direito de audição prévia” (cf. ofício a fls. 188 a 189 e registo a fls. 190 do SITAF);
f) Em 09.07.2012, por despacho da Chefe do Serviço de Finanças da Moita, foi determinada a reversão contra o Reclamante, na qualidade de responsável subsidiário, dos processos de execução fiscal identificados na alínea b) que antecede (cf. despacho e documentos anexos a fls. 192 a 198 do SITAF);
g) Em 11.07.2012, por carta registada com aviso de receção com a referência RC8532570705PT, foi remetido pelo Serviço de Finanças da Moita ao Reclamante, com referência aos processos de execução fiscal referidos na alínea b) que antecede, o ofício denominado de “Citação (Reversão)”, comunicando que “Pelo presente fica citado(a) de que é EXECUTADO(A) POR REVERSÃO, nos termos do artigo 160.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), na qualidade de Responsável Subsidiário (…)” (cf. ofício e registo a fls. 199 a 202 do SITAF);
h) O aviso de receção correspondente à carta com o registo postal RC8532570705PT, datado de 11.07.2012, dirigida ao ora Reclamante, foi assinado em 18.07.2012 pelo Reclamante (cf. aviso de receção a fls. 203 do SITAF);
i) Em 15.06.2012, foi dirigido pelo Serviço de Finanças da Moita ao Reclamante, por carta registada com a referência RC991407697PT, ofício denominado de “Notificação Audição-Prévia (Reversão)”, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2186201201024124, tendente a notificar da “(…) preparação do processo para efeitos de reversão da(s) execução(ões) fiscal(is) infra indicada(s) contra V. Ex.ª, na qualidade de Responsável Subsidiário. Face ao disposto (…) fica notificado(a) para, no prazo de 15 dias a contar da presente notificação, exercer o direito de audição prévia” (cf. ofício a fls. 259 a 260 e registo a fls. 261 do SITAF);
j) Em 09.07.2012, por despacho da Chefe de Serviço de Finanças da Moita, foi determinada a reversão contra o Reclamante, na qualidade de responsável subsidiário, do processo de execução fiscal identificado na alínea c) que antecede (cf. despacho e documentos a fls. 265 a 270 do SITAF);
k) Em 11.07.2012, por carta registada com aviso de receção com a referência RC853257098PT, foi remetido pelo Serviço de Finanças da Moita ao Reclamante, com referência ao processo de execução fiscal referido na alínea c) que antecede, o ofício denominado de “Citação (Reversão)”, comunicando que “Pelo presente fica citado(a) de que é EXECUTADO(A) POR REVERSÃO, nos termos do artigo 160.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), na qualidade de Responsável Subsidiário (…)” (cf. ofício a fls. 271 a 273 do SITAF);
l) O aviso de receção correspondente à carta com o registo postal RC853257098PT, datado de 12.07.2011, dirigida ao ora Reclamante, foi assinado em 18.07.2012 pelo Reclamante (cf. aviso de receção a fls. 274 do SITAF);
m) Em 08.10.2013, foi proferida sentença de declaração de insolvência do ora Reclamante no âmbito do processo n.º 1665/13.9TBMTA, que correu termos no Tribunal Judicial da Moita, 1.º Juízo da Moita (cf. anúncio a fls. 47 do SITAF);
n) Em 21.01.2014, foi proferida sentença de declaração de insolvência da S… Unipessoal, Lda. no âmbito do processo n.º 47/14.0TYLSB, que correu termos no Tribunal do Comércio de Lisboa – 4.º Juízo (cf. sentença a fls. 49 a 54 do SITAF);
o) Em 15.09.2015, no âmbito do processo n.º 1665/13.9TBMTA, que correu termos no Tribunal Judicial da Moita, 1.º Juízo da Moita, foi determinado o encerramento do processo de insolvência (cf. anúncio a fls. 48 do SITAF);
p) Em 04.05.2016, foi proferida sentença, no âmbito processo n.º 47/14.0TYLSB, que correu termos no Tribunal do Comércio de Lisboa – 4.º Juízo, que determinou o encerramento do processo de insolvência (cf. sentença a fls. 55 a 58 do SITAF);
q) Em 04.08.2021, deu entrada no Serviço de Finanças da Moita um requerimento subscrito pela mandatária do Reclamante através do qual se requer, a final, que sejam declaradas “(…) prescritas as mencionadas dívidas em execução fiscal, em procedência pelo presente Requerimento, tendo em conta o decurso do prazo prescricional previsto no artigo 48.º, n.º 1, da LGT (…)” (cf. requerimento a fls. 206 a 211 do SITAF);
r) Por carta registada com aviso de receção, com a referência RF706581988PT, foi remetido ao mandatário do Reclamante pelo Serviço de Finanças da Moita o ofício n.º 1329, de 08.06.2022, com o assunto “Processos de Execução Fiscal n.º 2186200701050532 e apensos (2186200701052020, 2186200701070428, 2186200801010107, 2186200801020625, 2186201001089277, 2186201001094882 e 2186201101007491) e n.º 2186201201024124”, destinado a notificar “(…) do despacho datado de 17 de maio de 2022, proferido pela chefe deste serviço de finanças, por delegação de competências da Diretora de Finanças de Setúbal (…) em resultado da apreciação do requerimento recebido em 04-08-2021 (…)” (cf. ofício a fls. 25 e 217 do SITAF e registo postal a fls. 79 do SITAF);
s) Em 17.05.2022, foi elaborada a informação, pronunciando-se sobre o requerimento referido na alínea q) que antecede, anexa ao ofício referido na alínea que antecede, da qual consta, designadamente, o seguinte:
«Imagem no original»

(cf. informação a fls. 26 a 28 e 215 a 216 do SITAF);
t) Sobre a informação reproduzida na alínea que antecede, foi proferido, em 17.05.2022, pela Chefe do Serviço de Finanças da Moita, o despacho ora reclamado, cujo teor a seguir se reproduz: “Concordo com a contagem da prescrição que antecede. Não se encontram reunidas as condições para declarar a dívida prescrita. Notifique-se” (cf. despacho a fls. 26 e 216 do SITAF);
u) A presente reclamação foi remetida para o Serviço de Finanças da Moita através de correio com o registo RH826801500PT datado de 30.06.2022 (cf. envelope a fls. 62 do SITAF);
v) À data da interposição da reclamação, os processos de execução fiscal referidos nas alíneas b) e c) que antecedem não se encontravam extintos e tinham valores em dívida em nome do Reclamante (facto que se extrai, designadamente, do ofício a fls. 153 a 154 e da informação a fls. 26 a 28 e 215 a 216 do SITAF).

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Consta ainda da mesma sentença que «Não se considerou como provado, com interesse para a decisão da causa, o seguinte facto:
i) Que o Serviço de Finanças da Moita tenha expedido qualquer ofício dirigido à S… Unipessoal, Lda. tendente à sua citação para os processos de execução fiscal n.º 2186200701050532 e apensos (n.ºs 2186200701052020, 2186200701070428, 2186200801010107, 2186200801020625, 2186201001089277, 2186201001094882 e 2186201101007491) e n.º 2186201201024124, melhor identificados nas alíneas b) e c) da factualidade dada como provada.

Motivação da decisão de facto:
A convicção do Tribunal quanto à decisão sobre a matéria de facto baseou-se na análise da prova produzida nos autos, nomeadamente nos documentos juntos com os articulados, que não foram impugnados, e constantes do processo de execução fiscal, conforme referido a propósito de cada ponto da factualidade acima dada como provada.
Quanto ao facto dado como não provado, o Tribunal entendeu que o mesmo não se encontra provado na medida em que dos processos de execução fiscal apensos não consta qualquer elemento que ateste a referida citação.
Com efeito, tendo sido solicitado ao órgão de execução fiscal, através do despacho a fls. 150 a 151 do SITAF, que procedesse à remessa aos autos de cópia dos ofícios de citação e eventuais registos e avisos de receção, foi por este informado, através de ofício a fls. 153 a 154 do SITAF, que do processo de execução fiscal não consta “Os ofícios de citação enviados à devedora originária, S… UNIPESSOAL LDA, dado que estes foram emitidos centralmente e não se encontram reproduzidos nas respetivas execuções, apenas disponibilizada a sua informação na tramitação virtual processual”.
Sendo insuficiente para asseverar a realização da citação as afirmações constantes em informações oficiais ou requerimentos apresentados pela Executada, sem estarem devidamente documentados, designadamente com cópia dos ofícios de citação e eventuais registos postais e avisos de receção, consignou-se tal facto como não provado.»
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III – 2. Da apreciação do recurso


Resulta dos autos que em 4/8/2021 o ora recorrente dirigiu ao órgão da execução fiscal um requerimento em que requereu a declaração da prescrição das dívidas em execução nos processos identificados no ponto b), excepto o processo n.º 2186200701050532 e incluindo o processo n.º 2186201201024124 (cf. ponto q. do probatório).

No referido requerimento invocava que desde a data em que a obrigação deveria ter sido cumprida, havia decorrido o prazo de prescrição de 8 anos para cada uma das dívidas, nos termos dos artigos 48.º, n.º 1 e 49.º, n.º 1 da LGT e artigos 303.º e 305.º do Código Civil concluindo pela inexigibilidade da dívida.

Foi sobre este pedido e fundamentos que o órgão da execução fiscal se pronunciou no despacho reclamado datado de 17/05/2022 que consta transcrito nos pontos s) e t) da matéria de facto assente, indeferindo o pedido de declaração da prescrição das dívidas.

O recorrente deduziu a presente reclamação tendo por objecto o referido despacho formulando os pedidos de:

«i) reconhecimento e declaração as acima mencionadas ilegalidades da reversão, a ilegitimidade do Reclamante e as prescrições tributárias (…)» requerendo ainda,

ii) a apensação dos referidos PEF e,

iii) sejam «em consequência anulados/extintos referidos Processos de Execução Fiscal e as respectivas dívidas tributárias»

A pretensão do reclamante, ora recorrente não obteve provimento.

Nas conclusões 1 a 29 o recorrente alega que «a devedora originária não foi nunca citada nos referidos PEF» pretendendo daí extrair a consequência de que a reversão contra si dos processos de execução fiscal, de que estes autos constituem incidente, é ilegal e ineficaz, sustentando que deve ser declarada a nulidade da citação da executada principal com a anulação dos termos subsequentes.

Considera assim, que o processo de execução fiscal padece de nulidade por falta de citação da executada principal e por falta de requisitos essenciais do título executivo, alegando que constituem nulidades insupríveis de conhecimento oficioso, podendo ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final determinariam não só a ilegalidade da reversão, como a própria ilegitimidade do recorrente enquanto revertido.

A sentença recorrida decidiu, em sede de saneamento do processo, não tomar conhecimento dos fundamentos relacionados com a ilegalidade da reversão, a ilegitimidade do Reclamante e a apensação dos processos de execução fiscal.

Para tanto, sustentou-se no seguinte discurso fundamentador:

«(…) a reclamação prevista nos artigos 276.º e seguintes do CPPT é o meio processualmente adequado para conhecer da legalidade dos atos praticados no âmbito da execução fiscal.

Não obstante o exposto, como também se invoca na resposta do Ilustre Representante da Fazenda Pública e se corrobora no parecer do DMMP, os fundamentos relacionados com a ilegalidade da reversão e a ilegitimidade do Reclamante e a apensação dos processos de execução fiscal, não estando relacionados com a apreciação da legalidade do ato reclamado, não são suscetíveis de ser apreciados nesta sede, impondo-se que o Reclamante houvesse deduzido, para o seu conhecimento, os meios de reação processualmente adequados.

Desde logo, as questões relacionadas com a alegada nulidade por falta de citação e por falta de requisitos essenciais do título executivo, que o Reclamante reconduz à invocada ilegalidade da reversão, de acordo com a jurisprudência consolidada, têm de ser primariamente arguidas perante o órgão de execução fiscal, intervindo o tribunal na apreciação da questão se, na sequência do indeferimento dessa arguição, a sua intervenção for requerida através de reclamação judicial deduzida nos termos dos artigos 276.º e seguintes do CPPT (cf., neste sentido, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02.04.2014, proferido no âmbito do processo n.º 0247/14, e o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11.09.2019, proferido no âmbito do processo n.º 0462/15.1BEMDL).

(…)

As questões relacionadas com a alegada ilegitimidade do Reclamante para a reversão deveriam ter sido suscitadas em sede de oposição à execução, e não em sede de reclamação do ato do órgão de execução fiscal (cf., designadamente, neste sentido, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11.05.2016, proferido no âmbito do processo n.º 034/14 e o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 14.01.2021, proferido no âmbito do processo n.º 453/20.0BELRS).

Como se estatui expressamente neste último acórdão, “É a oposição à execução fiscal o meio próprio para suscitar a ilegitimidade do revertido”.

O mesmo se dirá quanto à apensação dos processos de execução fiscal, que, por se inserir na competência do órgão de execução fiscal (cf. artigo 150.º, n.º 1, do CPPT), deve ser primeiramente requerida junto do mesmo, sendo que, do seu indeferimento, caberá reclamação para o Tribunal Tributário (cf., designadamente, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 31.01.2018, proferido no âmbito do processo n.º 01257/17).

Efetivamente, como se expressa no acórdão supra citado, “Assiste o direito ao requerente da apensação de várias execuções, de impugnar por via de Reclamação o despacho do órgão de execução fiscal que recair sobre tal pedido” (sublinhado nosso)

Como bem se refere na sentença recorrida, a reclamação prevista nos artigos 276.º e seguintes do CPPT é o meio processualmente adequado para conhecer da legalidade dos actos praticados no âmbito da execução fiscal, desde que não esteja em causa o despacho de reversão isto porque para a sua impugnação, o legislador previu um meio específico para o revertido exercer a tutela dos seus direitos e interesses legalmente protegidos que constitui a oposição à execução fiscal prevista no artigo 203.º e ss do CPPT.

Para a impugnação dos restantes actos praticados no processo pelo órgão da execução fiscal, o meio processual adequado é a reclamação prevista no artigo 276.º e ss do CPPT.

Importa, no entanto, deixar bem claro que, o meio processual de reclamação das decisões do órgão da execução fiscal tem por objecto um acto concreto, por imperativo legal decorrente do n.º 1 do artigo 276.º do CPPT. Dito de outro modo, só depois de suscitada perante o órgão da execução fiscal uma questão relativa ao processo de execução fiscal pode o interessado reclamar para o tribunal. Daí que o Tribunal só possa conhecer das questões de legalidade do acto concreto praticado expressa ou tacitamente pelo referido órgão e não de outras questões suscitadas ex novo, excepto, as de conhecimento oficioso.

Ora, como se deixou dito supra, o recorrente requereu a declaração da prescrição das dívidas em cobrança em diversos processos executivos e em resposta foi proferida a decisão objecto de reclamação que alude à falta de «citação pessoal» da executada originária num contexto em que apreciava a existência de causas de suspensão e de interrupção da prescrição.

As nulidades insanáveis são de conhecimento oficioso, podendo ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final, conforme resulta do disposto o n.º 3 do artigo 165.º do CPPT, no processo de execução fiscal perante o órgão da execução fiscal e não suscitadas directamente ao Tribunal. Isso mesmo decorre da inserção sistemática da citada norma no Título IV Da execução fiscal, bem como da delimitação as competências que no âmbito do processo de execução fiscal cabem ao órgão da execução fiscal por recorte das competências que cabem aos tribunais tributários consagradas no artigo 151.º do CPPT.

Acresce dizer que a solução legal da arguição prévia das nulidades insanáveis perante o órgão da execução fiscal é a solução que resulta do Acórdão proferido pelo STA no processo n.º 032/13 de 8/1/2014 que o recorrente cita, em defesa da sua tese (em sentido contrário). Resultando ainda do citado Acórdão que a questão da nulidade da citação arguida naquela sede própria sem que o referido órgão emita qualquer decisão pode ser suscitada perante o tribunal em incidente inominado da execução fiscal cujo sumário que se transcreve parcialmente:

«III – A jurisprudência consolidada vai no sentido de que a nulidade do processo executivo por falta de citação do executado nos termos do n.º 6 do art. 190.º do CPPT tem de ser primariamente arguida perante o órgão de execução fiscal, intervindo o tribunal na apreciação da questão se, na sequência do indeferimento dessa arguição, a sua intervenção for requerida através de reclamação judicial deduzida nos termos dos arts. 276.º e seguintes do CPPT.

IV – A inércia da Administração tributária na apreciação da nulidade por falta de citação arguida perante o órgão da execução fiscal permite que o executado solicite a intervenção do tribunal, através de incidente inominado da execução fiscal, pedindo ao juiz que conheça da nulidade arguida.»

Tal solução da necessidade de arguição prévia, não contende com as garantias dos contribuintes, na medida em que têm ao seu alcance os meios processuais para o exercício dos seus direitos, resultando dos autos que em 1/01/2009 o próprio recorrente na qualidade de representante legal da executada principal requereu no processo de execução fiscal n.º 2186200701050532, nos termos dos artigos 198.º e 199.º, n.º 3 do CPPT o pagamento da dívida em prestações, com dispensa da garantia alegando insuficiência económica.

O recorrente desenvolve toda a sua alegação reiterando a argumentação em que se fundamentou na petição da reclamação judicial.

Importa referir, por fim, quanto à questão da ilegitimidade do revertido, que o recorrente cita acórdãos proferidos em sede de recurso de processos de oposição à execução que apenas vêm reforçam o sentido da decisão recorrida, pelo que não têm aplicação no caso vertente.

Mostram-se assim, improcedentes as conclusões de recurso apreciadas.


*


O recorrente alega nas restantes conclusões que as dívidas em causa nos autos estão prescritas nos termos do disposto nos artigos 48.º, n.º 3 e 49.º, n.º 1 e 4 da LGT, uma vez que, quanto a si, não se verifica qualquer causa suspensiva ou interruptiva da mesma, por ter ocorrido a sua citação para a execução após 5 anos desde o ano da liquidação, tendo decorridos mais de 11 anos desde o acto gerador das dívidas tributárias.

No que se refere à questão da prescrição, a sentença recorrida sustentou-se na seguinte fundamentação:

«Desde logo, no que concerne à alegação de que a dívida tributária se encontra prescrita pelo facto de a sua citação para a execução ter ocorrido após o 5.º ano posterior ao ano da liquidação, invocando o disposto no n.º 3 do artigo 48.º da LGT, a mesma não é de proceder, na medida em que, não tendo ocorrido a citação da devedora originária, não se verificou qualquer interrupção da prescrição quanto à mesma que sirva de pressuposto à aplicação da aludida norma.

A respeito da invocada norma, afirma-se na doutrina (cf. JORGE LOPES DE SOUSA, “Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária. Notas Práticas”, 2.ª edição, aumentada e melhorada, Áreas Editora, 2010, pág. 119), que: “É de notar que esta subordinação do efeito das causas interruptivas em relação aos responsáveis subsidiários não é um prazo especial de prescrição em relação ao responsável subsidiário. O prazo de prescrição, à face da LGT, é de 8 anos, tanto em relação ao devedor originário como ao responsável subsidiário. E o termo desse prazo pode ser diferido, se ocorrerem causas de interrupção e suspensão tanto em relação ao devedor originário como ao responsável subsidiário. É apenas a relevância das causas de interrupção que se verifiquem apenas em relação ao devedor originário (e o consequente diferimento do termo do prazo que delas deriva) que é afastada em relação ao responsável subsidiário, se a sua citação não ocorrer até ao 5.º ano posterior ao da liquidação. Mas, no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior até ao fim do 8.º ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzemse em relação a ele (e também em relação ao devedor originário, por força da regra do n.º 2 do art.º 48.º). O efeito daquele n.º 3 do art.º 48.º é apenas de tornar irrelevante em relação ao responsável subsidiário as causas de interrupção que se verifiquem em relação ao devedor originário” (sublinhado nosso).

No mesmo sentido, aduz-se ainda na doutrina (cf. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, “Lei Geral Tributária Anotada e Comentada”, 4.ª Edição, 2012, Encontro da Escrita editora, pp. 224) que: “O prazo de prescrição das dívidas tributárias previsto no art. 48.º, n.º 1, da LGT é de oito anos. Vale tanto para os sujeitos passivos originários como para os subsidiários. Ocorrendo qualquer das causas referidas no art. 49.º da LGT, a interrupção ou suspensão produzem efeitos perante o devedor originário e os responsáveis subsidiários (art. 48.º, n.º 2 da LGT). Se o responsável subsidiário não for citado da reversão da execução fiscal nos cinco anos posteriores ao ano em que o imposto foi liquidado à sociedade, a interrupção da prescrição relativamente à sociedade não lhe é oponível (art. 48.º, n.º 3 da LGT)”.

Esta posição é seguida pela jurisprudência dos nossos tribunais, nomeadamente pelo Tribunal de cúpula desta jurisdição, o Supremo Tribunal Administrativo.

Neste sentido, atente-se, a título de exemplo, no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18.01.2017, proferido no âmbito do processo n.º 0895/14:“(…) De facto, como vimos, no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5° ano, se ele for citado até ao fim do 8° ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (e também em relação ao devedor originário, por força da regra do n° 2 do art. 48°). O efeito daquele nº 3 do art. 48° é apenas de tornar irrelevante em relação ao responsável subsidiário as causas de interrupção que se verifiquem em relação ao devedor originário. E como sublinha Jorge de Sousa (ob. citada, pag. 119), «esta interpretação é a que melhor se adequa à teleologia global do art. 48º da LGT, permitindo, aliás, a conjugação do estatuído nos seus nºs 2 e 3. Ou seja, não fica afastada a necessidade de aferir se a citação do responsável subsidiário ocorre antes do termo do prazo de prescrição, aferindo esta (prescrição) também em função da causa interruptiva que é a própria citação do responsável subsidiário. E o sentido e alcance deste preceito não podem ser fixados de forma isolada, mas atendendo a outros preceitos do próprio artigo 48º da LGT, em especial, o seu nº 2, que é inequívoco no sentido de que o prazo de prescrição é de 8 anos tanto em relação ao devedor originário como ao responsável subsidiário, (….)». Ora, como se referiu no supra citado Acórdão de 26.08.2015, recurso 1012/15, o regime legal consagrado neste artigo 48º, n.º 3 da LGT determina um regime mais favorável no que toca ao devedor subsidiário que «não implica que se interprete o disposto no artigo 49º, n.º 3 da mesma LGT em contrário das regras de interpretação das leis consagradas no artigo 9º do Código Civil, isto é, sem respeito pelo próprio texto da lei e em contrário do pensamento legislativo. Ou seja, o que resulta da interpretação e aplicação conjugada do disposto naqueles preceitos legais é que a citação de cada um dos devedores, principal ou subsidiário, ocorrida no âmbito do processo de execução fiscal, interrompe a prescrição, cfr. artigo 49º, n.º 1, e só pode ocorrer uma vez relativamente a cada um deles, no entanto, as causas de interrupção da prescrição ocorridas relativamente ao devedor principal são oponíveis ao devedor subsidiário, cfr. artigo 48º, n.º 2, a não ser que a citação deste (devedor subsidiário) ocorra mais de 5 anos após a liquidação do imposto, cfr. artigo 48º, n.º 3.» No caso em apreço a citação dos oponentes, responsáveis subsidiários ocorreu mais de 5 anos após a liquidação, mas dentro do prazo prescricional, pelo que se aplica à situação concreta dos autos o disposto no artigo 48º, n.º 3, ou seja, tudo se passa relativamente ao responsável subsidiário como se nunca tivesse havido qualquer outra citação no processo com virtualidade interruptiva do prazo de prescrição, isto é, o prazo de prescrição só se interrompe com a sua própria citação e por uma única vez - cfr. artigo 49º, n.º 3 da LGT” (sublinhado nosso).

Resulta do acima exposto que a aplicação do artigo 48.º, n.º 3, da LGT apenas significa que, no caso em que o devedor subsidiário for citado após o 5.º ano subsequente ao ano da liquidação, o prazo de prescrição corre ininterruptamente, sem relevar a interrupção que se tenha verificado quanto à devedora originária.

Mas se o devedor subsidiário for citado no prazo de oito anos (o que determina a existência de uma causa interruptiva própria do devedor subsidiário), a dívida não estará prescrita, valendo aquela causa interruptiva.

Com efeito, in casu, não foram juntos aos presentes autos (nem consta dos processos de execução fiscal apensos) qualquer documento ou feita qualquer outra prova de que ocorreu a citação da devedora originária (cf. facto não provado), não se podendo, assim, concluir que esta foi citada e não ocorrendo causas de interrupção da prescrição relativas à mesma.

Assim sendo, a interrupção da prescrição só ocorreu com a citação do ora Reclamante, o qual, como já foi acima referido, foi citado para a execução fiscal, na qualidade de responsável subsidiário, em 18.07.2012 (cf. alíneas h) e l) da factualidade dada como provada), antes, portanto, de esgotado qualquer um dos prazos de prescrição a que acima se fez referência.

Conclui-se, deste modo, que aquela norma não tem aplicação no caso em apreço, por não se ter verificado qualquer facto interruptivo quanto à devedora originária, pelo que a citação do Reclamante, porque ocorrida antes de esgotado qualquer um dos prazos de prescrição acima aludidos, interrompeu a contagem do prazo de prescrição (destacados nossos).

A interpretação efectuada pelo Tribunal recorrido, no que se refere à interpretação da eficácia das causas de interrupção da prescrição verificadas na esfera do executado principal, decorridos que sejam 5 anos sobre a data da liquidação, na contagem da prescrição relativamente ao revertido, encontra-se profusamente fundamentada sustentando-se na jurisprudência não se vendo razões para dela divergir, pelo que improcede, também neste segmento, o recurso que nos vem dirigido.

O recorrente insurge-se ainda contra a consideração do efeito duradouro da interrupção da prescrição defendendo a tese do seu efeito instantâneo alegando a inaplicabilidade subsidiária neste aspecto, das normas do direito civil, no âmbito do qual os cidadãos e relacionam entre si em condições de paridade ao contrário do que sucede com o direito fiscal onde predomina a supra-infra ordenação entre o Estado e os cidadãos.

Alega ainda, em abono da sua tese, que nos termos do disposto no artigo 11.º da LGT não são susceptíveis de integração analógica as lacunas resultantes de norma tributárias abrangidas na reserva da Assembleia da República. Defendendo em alternativa a aplicação subsidiária do regime da prescrição contidas nas normas contraordenacionais.

Mais alega, reiterando os argumentos esgrimidos na petição inicial, invocando a tese do efeito instantâneo da interrupção da prescrição por contraposição ao efeito duradouro da mesma baseada na aplicação subsidiária dos artigos 326.º e 327.º do Código Civil, que o efeito duradouro equivaleria à imprescritibilidade das dívidas seria violadora das garantias dos contribuintes em matéria de certeza e expectativas jurídicas legítimas consagradas nos artigos 2.º, 3.º, 18.º, 103.º e 165.º da CRP.

Ora, quanto à legalidade da admissão do efeito duradouro da interrupção da prescrição nas dívidas tributárias, nos termos do artigo 327.º, n.º 1 do Código Civil, por aplicação do artigo 2.º, alínea d) da LGT, a questão já foi tratada na jurisprudência podendo afirmar-se que actualmente constitui questão pacífica, que aqui reiteramos por não existirem alterações legislativas que determinem solução diversa, citando-se por todos o Acórdão do STA de 08/01/2020 proferido no processo n.º 0717/19.6BEAVR:

«III.2.B - Se a aplicação e interpretação efetuada dos artigos 326.º e 327.º do Código Civil, em termos da interrupção da prescrição produzir efeitos suspensivos é violadora do art. 9.º n.º2 do Código Civil, do artigo 49.º, nomeadamente, dos n.ºs 4 e 5 da L.G.T., e se é também inconstitucional por violação do princípio da legalidade - artigos 103.º n.º2 e 165.º i) da C.R.P..

No que respeita aos factos interruptivos da prescrição, nas datas em que as citações foram efetuadas nos processos de execução fiscal, regia já o artigo 49.º da L.G.T., na redação dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 (Lei do Orçamento do Estado para 2007, que entrou em vigor no dia 01-01-2007, nos termos do seu art. 163.°), a qual revogou o n.º 2 daquele art. 49.º.

Nos termos do art. 91.° daquela Lei n° 53-A/2006 “a revogação do n.° 2 do artigo 49.º da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo”, conforme é referido na sentença recorrida.

Mais se considerou “que o primeiro e único facto que ocorreu com potencial efeito interruptivo foi a citação do responsável subsidiário”.

Foi ainda verificado que até à data em que a citação deste foi efetuada nos vários processos de execução fiscal não tinha aplicação o previsto no n.º 2 revogado.

Ora, não estando em causa a aplicação da redação inicial do art. 49.º n.º 2 da L.G.T., consideramos também ser de recorrer ao disposto nos artigos 326.º n.º 1 e 327.º n.º 1 do Código Civil, por aplicação subsidiária, nos termos do art. 2.º, d), da L.G.T..

Assim, o prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1 do art. 48.º da L.G.T., não começa a correr enquanto “não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo” - art. 327.º, n.º 1 do Código Civil.

A propósito do efeito duradouro da interrupção da prescrição, não há grandes dúvidas quanto à aplicação subsidiária das ditas disposições do Código Civil, conforme vem entendendo o S.T.A., após ter considerado que “a legislação tributária continha essa definição – cfr. o art.º 27º do CPCI, o art.º 34.º do CPT e o art.º 48º da LGT até à alteração pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/2 - sempre no sentido de conferir efeito duradouro a todos os actos interruptivos, já que a prescrição não corre após esses actos e só voltava a correr caso cessasse esse efeito duradouro por mor da paragem do processo por facto não imputável ao contribuinte” ponto II do sumário do acórdão de 13-3-2019, no proc. 01437/18.4BELRS, acessível em www.dgsi.pt.

Tal tem sido reiterado, nomeadamente, pelo acima referido acórdão de 17-12-2019, no processo 1053/19.3BEPRT.

O Tribunal Constitucional nos acórdãos n.ºs 6/2014 e 122/2015, acessíveis também em www.tribunalconstitucional.pt, analisou já a esse respeito a violação de vários princípios constitucionais, concluindo pela não violação de vários princípios constitucionais, e sem qualquer voto de vencido.

No segundo referido acórdão expressa-se também do seguinte modo: “o prolongamento da suspensão até à decisão definitiva do processo não é também uma solução que fosse inteiramente estranha ao sistema legal.

Na verdade, essa mesma solução já resultava do disposto no artigo 49.ºn, n.º3, da LGT, na sua redação primitiva, no ponto em que a suspensão do prazo de prescrição que aí se previa já devia entender-se como correspondendo à duração da paragem do processo execução em resultado de uma impugnação judicial que fosse acompanhada da prestação de garantia, e que, por efeito do artigo 169.º, n.º 1, do CPPT, se mantinha até à decisão do pleito”.

A ser assim, e não se podendo considerar inovatória a solução a que se chegou quanto ao prolongamento do prazo de prescrição até à conclusão do processo, consideramos não ocorrer violação das normas invocadas pelo recorrente, nem do princípio da legalidade que é invocado por referência aos arts. 103.º, n.º2 e 165.º, i), da C.R.P., no que se refere a garantias dos contribuintes e à sujeição a reserva de lei da Assembleia da República, ou a lei do Governo que tivesse de ser precedida de autorização legislativa.»

Importa destacar que o citado Acórdão foi objecto de recurso para o Tribunal Constitucional correndo termos com o n.º de processo 373/20 colocando-se a questão de constitucionalidade da norma do artigo 49.º, n.º 1, da LGT, na redação dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, em conjugação com o artigo 2.º, alínea d), desta mesma Lei e com o artigo 327.º, n.º 1, do Código Civil, na interpretação segundo a qual o prazo de prescrição das dívidas tributárias interrompido com a citação não volta a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo. No referido processo em 22/09/2021 foi proferido o Acórdão nº 731/2021 negando provimento ao recurso, decidindo «[n]ão julgar inconstitucional a norma do artigo 49.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, na redação dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, em conjugação com o artigo 2.º, alínea d), desta mesma Lei e com o artigo 327.º, n.º 1, do Código Civil, na interpretação segundo a qual o prazo de prescrição das dívidas tributárias interrompido com a citação não volta a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo;».

Constituindo o Tribunal Constitucional o órgão judicial com competência para jugar a conformidade constitucional da dimensão normativa que está em causa, nada mais haverá a dizer, impondo-se julgar improcedentes as conclusões de recurso.

Nas conclusões 68 e 69 pretende o recorrente que este Tribunal se substitua ao órgão da execução fiscal declarando em falhas as dívidas exequendas, por aquele órgão não o ter feito.

A questão não foi suscitada/alegada na petição de reclamação, nem foi objecto de apreciação na sentença recorrida, pelo que, está em causa uma questão nova.

Os recursos jurisdicionais são, como se sabe, os meios judiciais que visam a reapreciação do julgamento efectuado e não a decidir questões novas, não colocadas à apreciação do Tribunal de primeira instância. Ora, não tendo sido submetida ao tribunal a quo a questão suscitada nas alegações de recurso, sendo certo que não foi objecto de apreciação e decisão na sentença recorrida, constituindo questão nova que não é de conhecimento oficioso, este tribunal não pode dela conhecer, por inexistência de decisão de que recorrer, pelo que se rejeita este fundamento do recurso.

Impõe-se assim, julgar totalmente improcedente o recurso que nos foi dirigido.



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No que se refere às custas, o artigo 527.º do CPC consagra o princípio da causalidade, de acordo com o qual custas são pagas pela parte que lhes deu causa.

Atendendo à improcedência do recurso, considera-se que foi o recorrente que deu causa às custas do presente processo (cf. n.º 2), e, portanto, deve ser condenado nas custas (cf. n.º 1, 1.ª parte).


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IV – CONCLUSÕES

I – A falta de citação da executada principal e a falta de requisitos essenciais do título executivo constituem nulidades insupríveis de conhecimento oficioso, podendo ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final devendo ser arguidas previamente em requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal, cabendo reclamação judicial da decisão que indefira essa arguição nos termos dos artigos 276.º e seguintes do CPPT;

II – Também a apensação dos processos de execução fiscal deve ser requerida previamente ao órgão da execução fiscal, cabendo reclamação judicial da decisão que a indefira, nos termos dos artigos 276.º e seguintes do CPPT;

III – O meio processual adequado à discussão da legalidade do despacho de reversão, bem como a própria ilegitimidade do revertido é a oposição à execução fiscal;

IV - As causas de interrupção da prescrição ocorridas relativamente ao executado principal deixam de ser oponíveis ao responsável tributário subsidiário, a citação deste (devedor subsidiário) ocorra mais de 5 anos após a liquidação do imposto, mantendo-se o prazo de prescrição de 8 anos sujeito, à suspensão e à interrupção decorrentes de causas que eventualmente se verifiquem na esfera do revertido.


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V – DECISÃO

Termos em que, acordam as juízas da 1ª Subsecção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso jurisdicional, mantendo a sentença recorrida.


Custas pelo recorrente.


Lisboa, 6 de Dezembro de 2022.



Ana Cristina Carvalho - Relatora

Hélia Gameiro – 1ª Adjunta

Catarina Almeida e Sousa – 2ª Adjunta