Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03877/10
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:11/20/2012
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IRC.
NULIDADE DA SENTENÇA.
NORMAS ANTI-ABUSO.
CORRECÇÕES.
ART. 63º Nº 1 DO CPPT.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO.
NOTIFICAÇÃO.
PRINCIPIO DA ESPECIALIZAÇÃO DOS EXERCÍCIOS.
Sumário:I) A sentença é nula quando ocorra “a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer” e, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.

II) As normas anti-abuso encontram a sua razão de ser no comportamento evasivo e fraudatório dos sujeitos passivos em matéria fiscal tem e na necessidade de estabelecer meios de reacção adequados por forma a garantir o cumprimento do princípio da igualdade na repartição da carga tributária e na prossecução da satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas (cfr.art°.103, n°.1, da C.R. Portuguesa), na medida em que é inerente à racionalidade económica a minimização dos impostos a suportar, podendo utilizar-se várias vias para atingir tal desiderato, embora a fronteira de distinção entre elas nem sempre seja fácil de vislumbrar e nesse sentido são seguidas normalmente as vias da gestão ou planeamento fiscal da evasão ou elisão fiscal e da fraude fiscal.

III) É em vista de tais situações que os Estados se preocupam com a tomada de medidas visando combater os comportamentos evasivos e fraudatórios dos sujeitos passivos através das designadas cláusulas específicas anti-abuso ( de que são exemplo as normas contidas nos art°s. 58, relativa a preços de transferência, e 61, atinente à subcapitalização, ambas do C.I.R.C.), e cláusulas gerais anti-abuso (de que é exemplo a norma contida no art°.38, n°.2, da L.G.Tributária).

IV) Se é certo que não poderá vislumbrar-se no caso concreto a figura do antiabuso até porque não foi aberto o procedimento específico, situação que afasta o exposto pela Recorrente quanto à invocada caducidade por aplicação do art. 63º do CPPT, dúvidas não podem subsistir de que a conduta da AT mostra-se legitimada nos termos acima expostos, sendo ainda de notar que, estabelecendo o ordenamento jurídico duas metodologias alternativas ao método declarativo - correcções técnicas e presunções -, o recurso a qualquer delas não depende de um critério discricionário da AT, sendo que a AT encontra-se vinculada ao recurso às correcções técnicas, quando, apesar da violação dos deveres de cooperação do contribuinte, se encontre, sem embargo, em condições de apurar com efectividade os rendimentos tributar, tal como sucedeu na situação em análise.

V) Conforme resulta da factualidade assente pelo Tribunal a quo, o procedimento de inspecção foi concluído a 12 de Abril de 2007, data da notificação do relatório final de inspecção, em obediência ao preceituado no n.º 1 do artigo 62.º do RCPIT, de modo que, não tendo o procedimento de inspecção excedido o prazo máximo de duração de seis meses, parece inequívoco que o prazo legal de caducidade esteve suspenso por idêntico período, i.e., esteve suspenso entre 24-10-2006 e 12-04-2007, pelo que o prazo de caducidade se consumou a 18 de Junho de 2007, sendo esta a data limite para a Administração Tributária validamente notificar a Recorrente da liquidação ora sindicada, considerando o referido prazo de 4 anos e o período de suspensão), de modo que, é manifesto que o contribuinte tomou conhecimento da liquidação (03-05-2007) numa altura em que não haviam decorrido os 4 anos previstos para o exercício do direito à liquidação.

VI) A notificação é um acto exterior e posterior ao acto tributário notificado e os vícios que afectem a notificação em si, podendo embora determinar a ineficácia do acto notificado, são insusceptíveis de gerar a invalidade do acto tributário e de determinar a anulação visada com a presente impugnação.

VII) Estando em causa a consideração dos custos a considerar no âmbito do exercício de 2002 e não permitir ao contribuinte manipular o apuramento do lucro tributável de acordo com aquilo que for mais conveniente para a respectiva tributação, então impõe-se o apuramento da matéria relevante com referência ao referido exercício.

VIII) Não tem qualquer viabilidade a invocada dupla tributação/duplicação de colecta, dado que, para além de os autos não conterem quaisquer elementos que permitam, em termos de facto, apreciar o que se passou nos exercícios posteriores, a matéria em apreço nunca poderia ser considerada nesta sede, dado que, para o efeito em análise, este é o primeiro procedimento, o primeiro exercício em causa, de modo que, a tal duplicação apenas poderá ser afirmada no âmbito dos exercícios posteriores, não se vislumbrando rasto da invocada violação do principio constitucional da tributação de acordo com a capacidade contributiva e da especialização dos exercícios - artigo 18.° do Código do IRC.

IX) Neste caso, tem de entender-se que a AT estava legitimada para agir nos termos que se mostram descritos nos autos, na medida em que “segundo o critério utilizado pela impugnante o custo das fracções é determinado em função dos valores da venda dessas fracções, e em função das vendas estimadas, o que motivou a correcção efectuada, pois o custo é invariável, o preço de venda é que pode ser variável em função do exercício em que é vendido, o que leva a que fracções iguais, com a mesma área, tenham custos diferentes, o que distorce os resultados da obra nos exercícios em que se verificam as vendas das fracções”, sendo que “já quanto ao critério da permilagem, utilizado pela AT, consiste na repartição dos custos totais de construção pelas fracções em função da permilagem correspondente a cada fracção a qual foi definida pela impugnante na escritura de constituição da propriedade horizontal e respectivo anexo, mostrando-se o mais adequado para repartir os custos de construção do referido lote 8., pois a descrição do imóvel, a individualização das fracções autónomas, a sua composição, o respectivo destino e permilagem foram definidos pelo próprio impugnante.”.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário ( 2ª Secção ) do Tribunal Central Administrativo Sul:
1. RELATÓRIO
“A…………. - Compra ………………, Lda.”, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 18-12-2009, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de IMPUGNAÇÃO relacionada com a liquidação adicional de IRC referente ao ano de 2002, no montante de € 215.557,05.

Formulou as respectivas alegações ( cfr. fls. 276-300 ) nas quais enuncia as seguintes conclusões:
“(…)
- Ilegalidade do procedimento de aplicação da norma antiabuso - simulação fiscal -, consagrada no artigo 39.º da LGT - simulação fiscal;
- Caducidade, relativamente á simulação fiscal, do direito à liquidação no dia 31/12/2005 - por aplicação do artigo 63° do CPPT;
- Caducidade do direito à liquidação verificada no dia 31 de Dezembro de 2006, por aplicação do artigo 46.º da LGT;
- Considerarem-se não provados os valores juntos como sendo os de permilagem das fracções, uma vez que a escritura pública de propriedade horizontal não surge junta com o Relatório de Inspecção;
- Violação do principio da capacidade contributiva e especialização dos exercícios, uma vez que foram imputados proveitos de 2003, 2004, 2005 e 2006 ao exercício de 2002, sem que tivesse sido feita, a equivalente correcção nesses exercícios, o que originou e origina uma dupla tributação/duplicação de colecta;
- Realização de correcções em violação da al. b) do n.º 2 do artigo 19.º do Código do IRC e métodos indicados pela AF na Circular n.º 5/90;
- Considerar-se a AF a litigar em venire contra factum proprium;
PEDIDO
Nestes termos e nos mais de direito, deverá a presente sentença ora colocada em crise, ser anulada por padecer de vários vícios de violação de lei, bem como de omissão de pronúncia, tudo para que se faça a habitual justice”.

A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em apreciar a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia e ainda indagar da ilegalidade do procedimento de aplicação da norma antiabuso - simulação fiscal -, consagrada no artigo 39.º da LGT - simulação fiscal, da caducidade, relativamente á simulação fiscal, do direito à liquidação no dia 31/12/2005 - por aplicação do artigo 63° do CPPT e da caducidade do direito à liquidação verificada no dia 31 de Dezembro de 2006, por aplicação do artigo 46.º da LGT e ainda apreciar da fundamentação dos valores juntos como sendo os de permilagem das fracções, uma vez que a escritura pública de propriedade horizontal não surge junta com o Relatório de Inspecção e averiguar da violação do principio da capacidade contributiva e especialização dos exercícios, uma vez que foram imputados proveitos de 2003, 2004, 2005 e 2006 ao exercício de 2002, sem que tivesse sido feita, a equivalente correcção nesses exercícios, o que originou e origina uma dupla tributação/duplicação de colecta, da realização de correcções em violação da al. b) do n.º 2 do artigo 19.º do Código do IRC e métodos indicados pela AF na Circular n.º 5/90 e ainda se a AF litiga em venire contra factum proprium.
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
A) A AT procedeu a uma inspecção à impugnante, ao abrigo da Ordem de Serviço nº 0I200606569, de 20/10/2006, relativamente ao exercício de 2002, mediante o envio de carta aviso do início do procedimento de inspecção em 23/10/2006, (cfr. fls. 181 e 182 do processo administrativo tributário - PAT), tendo a ordem e serviço sido assinada em 30/10/2006 (cfr. fls. 180 do PAT).
B) Em resultado da acção inspectiva foi elaborado o relatório final, o qual foi notificado à impugnante através do ofício nº 030337, de 12/04/2007 (cfr. fls. 80 do PAT).
C) No âmbito da citada inspecção foram detectadas as seguintes irregularidades (cfr. relatório da inspecção a fls. 31 a 79 do PAT, que aqui se dá como integralmente reproduzido):
1 - Diferenças entre os preços escriturados e os valores reais de venda de 3 fracções do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ………, da freguesia de ………..e concelho da …………, no montante de € 244.833,47 (cfr. ponto 1.1 do relatório da inspecção a fls. 36 a 40 e docs. de fls. 58 a 75 do PAT);
2 - Contabilização de custos não aceites fiscalmente, no valor de € 404.451,95, derivados do cálculo do preço de custo de cada fracção vendida e o da variação da produção estar incorrecto (cfr. ponto 1.2 do relatório da inspecção a fis. 40 a 50 do PAT);
3 - Dedução indevida de um proveito no campo 237 do quadro 07 da declaração modelo 22, na quantia de € 17.550,00 (cfr. ponto 1.3 do relatório da inspecção a fls. 31 a 56 do PAT).
D) Como se refere no ponto 1.2 do relatório da inspecção a correcção efectuada aos custos relacionados com a construção do edifício lote 8, sito na Praceta do ……………, nº 3, …………., …………., fundamentou-se na escritura de constituição da propriedade horizontal e respectivo documento complementar, tendo a administração tributária adoptado o método da permilagem (cfr. documento de 242 a 251 do PAT).
E) Na sequência das correcções supra referidas foi efectuada a liquidação adicional de IRC nº ………………., referente a 2002, no valor de € 217.065,86, a liquidação nº …………….., relativa a juros compensatórios, no valor de € 33.558,55 e o estorno da liquidação nº …………….., no valor de € 932,64, o que totaliza o montante de € 251.557,05, tendo a impugnante sido notificada em 03/05/2007 (cfr. fls. 35 dos autos).
F) A presente impugnação foi deduzida em 09/08/2007 (cfr. fls. 2 dos autos.
*
Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
*
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.”.
Ao abrigo do disposto no art. 712º nº 1 al. a) do C. Proc. Civil, altera-se/adita-se ao probatório o seguinte:
G) A carta aviso a que se alude em A) foi recepcionada pela ora Recorrente em 24 de Outubro de 2006.
H) Do relatório de inspecção constante do PAT consta, além do mais que: “…
1.2 - Custos não aceites fiscalmente - Variação da produção
A sociedade A …………efectuou a construção de um edifício, o Lote 8 sito na Praceta ………….., n° 3, Quinta ………. em A……… e de acordo com a Declaração para inscrição de prédios urbanos na Matriz, Modelo 129, apresentado no 3° Serviço de Finanças da Amadora, a data de conclusão das obras foi 06/05/2002.
De acordo com a escritura de Constituição de Propriedade Horizontal celebrada em 26/06/2002, aquele prédio é composto por 26 fracções autónomas cujo destino, designação, composição, valor e permilagem em relação ao valor total do prédio, são as constantes no documento complementar a esta escritura, da qual faz parte integrante, que no Quadro 5 da página seguinte se descrevem.

Para determinação dos Produtos e Trabalhos em Curso e dos Custos imputáveis às fracções vendidas em cada exercício, a sociedade Aplafer utilizou um critério misto, isto é, utiliza o Critério da Percentagem de Acabamento para apuramento do custo anual das fracções vendidas e do valor total das existências finais de Produtos e Trabalhos em Curso. A repartição desses custos a cada fracção, é efectuada em função da respectiva área, conforme é demonstrado mais adiante.
O critério da Percentagem de Acabamento, de acordo com o n° 1 da Circular 5/90 adiante referida e conforme se demonstra nos Quadros 8 e 9, consiste:
- Na determinação do Grau de Acabamento (custos incorporados / custos estimados) e na determinação da Percentagem de Facturação (vendas realizadas / vendas estimadas);
- Sempre que o Grau de Acabamento seja superior à Percentagem de Facturação, é considerada como proveito a totalidade das vendas efectuadas, que não tenha sido ainda incluída nos resultados de exercícios anteriores, sendo considerados como custos os que correspondam a um grau de acabamento igual à Percentagem de Facturação, deduzidos dos já tidos em conta cm exercícios anteriores, transitando os restantes custos em obras em curso.
Assim no exercício de 2002 reconheceu como custo das 9 Fracções vendidas o montante de 1.734.886,02 € e o valor das Existências Finais de Produtos e Trabalhos em Curso apurado foi de 2066.354,18 E, calculados de acordo com o Quadro 7, e que consta no documento da página 20 do Anexo, recolhido na sociedade.

Com o objectivo de aferir da adequabilidade deste critério para determinação dos resultados da obra em apreço, foi testado aquele critério em todos os exercícios em que ocorreram as vendas das fracções, entre 2002 e 2006.
Para tal, foi elaborado o Quadro 8 no qual se determina, através do critério da Percentagem de Acabamento utilizado pela sociedade, o Custo Anual das Fracções Vendidas e o valor dos Produtos e Trabalhos em Curso em cada exercício.
Quadro 8
Descrição
2002
2003
2004
2005
2006
(1) Custos Estimados3.890.623,603.890.623,60
3.890.623,60
3.890.623,60
3.890.623,60
(2) Custos Incorporados3.801.240,203.801.240,20
3.801.240,20
3.801.240,20
3.801.240,20
(3) Grau de Acabamento (2) / (197,70%97,70%97,70%97,70%97,70%
(4) Vendas Estimadas4.289.661,91
4.289.661,91
4.289.661,91
4.289.661,91
4.289.661,91
(5) Escrituras Realizadas1.957.612,301.422.956,42
422.169,00
149.500,00512.500,00
(6) Escrituras Realizadas (Valor Acumulado)1.957.612,303.380.568,72
3.802.737,72
3.952.237,72
4.464.737,72
(7) Percentagem de Facturação Acumulada (6)/(4)45,64%78,81%88,65%92,13%104,08%
(8) Custo das Fracções Vendidas Anual (a)1.734.886,021.260.871,38
374.042,04
132.283,16299.157,60
(9) Custo das Fracções Vendidas Acumulado (7) x (2)1.734.886,022.995.757,40
3.369.799,44
3.502.082,60
3.801.240,20
(10) Produtos e Trabalhos em Curso (FTC) (2) -(9)
2.066.354,18805.482,80
431.440,76
299.157,60
0,00
(a) Custo das Fracções Vendidas Acumulado do ano N - Custo das Fracções Vendidas Acumulado do ano N- 1

No inventário final de 2002 (documento da página 22 do Anexo), o montante das existências finais de Produtos e Trabalhos em Curso de 2.066.354,18 € está discriminado pelas 17 fracções em função da sua área, conforme Quadro 9.
Quadro 9 - Produtos e Trabalhos em Curso - 2002
Fracção
Área
Valor
RJCC
140
118.318,85
1°A
135
114.093,18
1°B
160
135.221,54
1°C
140
118.318,85
2°A
135
114.093,18
2°B
160
135.221,54
2°C
140
118.318,85
3°A
135
114.093,18
4°A
135
114.093,18
4°B
160
135.221,54
4°C
140
118.318,85
5°A
135
114.093,18
5°B
160
135.221,54
5°C
140
118.318,85
6°A
135
114.093,18
6°B
160
135.221,54
7°A
135
114.093,18
Total
2.445
2.066.354,18
Assim, se a distribuição do Custo das 17 fracções em Existências Finais de Produtos e Trabalhos em Curso em 2002, foi feita em função da sua área, também se efectua a repartição do montante de 1.734.886,02 € que corresponde ao custo das 9 fracções vendidas em 2002 em função da sua área e determina-se o custo da fracção vendida, de acordo com o Quadro 10.
Quadro 10 - Custo das Fracções Vendidas - 2002
Fracção
Area
Valor
Lj 1
663,40
486.278,26
Lj 2
663,40
486.278,26
R/CA
140,00
102.621,28
RJCB
160,00
117.281,46
3°B
160,00
117.281,46
3°C
140,00
102.621,28
6°C
140,00
102.621,28
7°B
160,00
117.281,46
7°C
140,00
102.621,28
Total
2.366,80
1.734.886,02

De acordo com o critério demonstrado nos Quadros 9 e 10, utilizado pela sociedade em 2002 para custear cada fracção em curso e para custear cada fracção vendida, respectivamente, utilizando o mesmo critério, nos Quadros 11, 12 e 13 reparte-se o montante dos Produtos e Trabalhos em Curso e o Custo Anual das fracções vendidas, dos anos de 2003 a 2006, apurados no Quadro 8, pelas correspondentes fracções em função da sua área.
Quadro 11 - Produtos e Trabalhos em Curso
Ano 2003
Ano 2004
Ano_2005__________
Fracção
Área
Valor
FracçãoÃreaValorFracçãoÁreavalor
1° A
2°A
3°A
4°A
5°A
5°C
7° A
135
135
135
135
135
140
135
114.463,35
114.463,35
114.463,35
114.463,35
114.463,35
118.702,73
114.463,35
1° A

3°A
4°A
5°A135

135
135
135107.860,19

107.860,19
107.860,19
107.860,191° A

3°A
4°A135

135
13599.719,20

99.719,20
99.719,20
Total
950
805.482,80
Total540431.440,76Total405299.157,60



Quadro 13 - Custo das Fracções Vendidas
Ano 2005Ano 2006
FracçãoÁreaValorFracçãoÁreaValor
5°A135132.283,161°A
3°A
4°A135
135
13599.719,20
99.719,20
99.719,20
Total135132.283,16Total405299.157,60

Da análise dos Quadros 8 a 13 conforme atrás foi referido, constata-se que a determinação dos custos das fracções é efectuado de uma forma mista, por um lado, determina-se o custo anual das fracções vendidas pela aplicação da percentagem de facturação acumulada aos custos incorporados e por outro lado, esse custo anual é repartido pelas fracções em função da sua área. Não havendo qualquer acréscimo ou diminuição de custos incorporados, ou seja, mantendo os custos inalterados de 3.801.240,20 €, nesses quadros constatam-se e demonstram-se as seguintes situações:
- O custo de uma mesma fracção vai sofrendo alterações ao longo dos exercícios em que permanece em existências finais de Produtos e Trabalhos em Curso (ver 1° A, 3° A e 4° A, Quadro 11);
- Que duas fracções com a mesma área têm custos diferentes no mesmo exercício, consoante ela permaneça em existências finais em Produtos e Trabalhos em Curso ou tenha sido vendida ( ver Ano 2004, A-Quadro 11 e 7° A-Quadro 12) e ainda
- Que uma determinada fracção quando é vendida não é custeada pelo valor que tinha no inventário (Ver fracção 2° A, Quadros 11 e 12).
O critério da Percentagem de Acabamento é referido no art° 19º do CIRC, o qual estabelece os princípios gerais a observar na determinação dos resultados de obras de carácter plurianual, isto é aquelas cujo ciclo de produção ou tempo de construção seja superior a um ano.
A circular 5/90 sobre obras de carácter plurianual, esclarece o desenvolvimento técnico do regime de modo que se concretizem os objectivos estabelecidos no artº 19º do CIRC e se facilite o cumprimento das obrigações fiscais dos contribuintes.
Ela dita as instruções aprovadas por despacho de Sua Exa o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e explicita o modo de utilizar o Critério da Percentagem de Acabamento e esclarece nos n°s 1 e 2, que este critério se utiliza nas obras efectuadas em regime de empreitada.
Relativamente às obras vendidas por fracções, no n° 5 da referida circular, é dito que a determinação dos resultados das obras a que se refere a alínea b) do n° 2 do art° 19° do CIRC que são as obras vendidas por fracções, será feita com base no valor da venda e nos custos imputáveis à fracção vendida e relativamente aos custos indirectos o n° 6, refere que deverão ser repartidos e imputados a cada fracção tendo em conta a permilagem, a área ou de acordo com outro critério, devidamente justificado, que se revele adequado à especificidade da situação.
Deste modo, pelo que atrás foi exposto, no critério utilizado pela empresa, uma vez que o custo anual das fracções vendidas é determinado pela aplicação da percentagem de facturação acumulada aos custos incorporados (ver Quadro 8), significa que o custo das fracções é determinado em função dos valores da venda dessas fracções, e em função das vendas estimadas, o que obviamente é um absurdo, o custo é invariável, o preço de venda é que pode ser variável em função do exercício em que é vendido.
E este o motivo pelo qual neste critério, fracções iguais, com a mesma área, tenham custos diferentes.
Pelo exposto, conclui-se que o critério utilizado pela empresa não é adequado à especificidade da obra em apreço, uma vez que distorce os resultados da obra em todos os exercícios em que se verificaram as vendas das fracções, pelo que não é dado cumprimento ao princípio da especialização dos exercícios estabelecido no art° 18° do CIRC que determina que os proveitos e os custos são imputáveis ao exercício a que digam respeito.
Na Circular 5/90 também é referido o critério da área ou outro que se revele adequado, para imputação de custos às fracções.
A repartição em função da área, significa que é determinado um custo de construção por m2, obtido pela divisão dos custos de construção totais pelo somatório das áreas de todas as fracções.
O lote em apreço tem 2 lojas amplas, as fracções A e B, cuja área total é de 1.326,80 m2, conforme se constata no documento da página 21 do Anexo, recolhido na sociedade, a qual representa 27,57 % da área total das 26 fracções.
Sabe-se que o custo de construção por m2 de uma loja como é óbvio, é inferior ao custo de construção por m2 de uma fracção destinada a habitação, pelo que na utilização desse critério custeiam-se as lojas ao mesmo preço por m2 das fracções que se destinam a habitação, o que obviamente não é correcto e adequado.
Pelo exposto na obra em apreço o critério da imputação de custos em função da área também não se revela adequado para imputação dos custos a cada fracção.
O critério da Permilagem também referido na Circular 5/90 consiste na repartição dos custos totais de construção pelas fracções em função da Permilagem correspondente a cada fracção.
A Permilagem de cada fracção foi definida pela sociedade e consta na escritura de Constituição de Propriedade Horizontal já atrás referida, pelo que se aceita que ela represente o peso de cada fracção em relação ao total e se considere este critério adequado para a repartição dos custos a cada fracção.
Assim, sendo os custos incorporados na obra acumulados em 31/12/2002 de 3.801.240,20€, no Quadro 14 determina-se o custo de cada fracção, tendo em conta a respectiva Permilagem já indicada no Quadro 5.
Quadro 14 - Determinação do Custo de cada fracção
Fracção
Perm.
Valor
Fracção
Perm.
Valor
Lj 1
41
155.850,85
Transporte
538
2.045.067,23
Lj2
41
155.850,85
4°A
38
144.447,13
RIC A
36
136.844,65
4° B
40
152.049,61
R/C B
39
148.248,37
4°C
38
144.447,13
R/C c
33
125.440,93
5°A
38
144.447,13
1°A
38
144.447,13
5°B
40
152.049,61
1° 13
40
152.049,61
5°C
38
144.447,13
1°C
38
144.447,13
6°A
38
144.447,13
2° A
38
144.447,13
6° 13
40
152.049,61
2°B
40
152.049,61
6°C
38
144.447,13
2°C
38
144.447,13
7° A
37
140.645,89
3°A
38
144.447,13
7°B
40
152.049,61
30 B
40
152.049,61
7°C
37
140.645,89
3°C
38
144.447,13
Transportar
538
2.045.067,23
Total
1000
3.801.240,20



No Quadro 15, com os valores de cada fracção determinado no Quadro 14, determina-se o custo das fracções vendidas e o custo das fracções em Existências Finais de Produtos e Trabalhos em Curso, no exercício de 2002.
Quadro 15-Ano 2002
Custo das fracções Vendidas
Produtos e Trabalhos em Curso
Fracção
Perm.
ValorFracçãoPerm.Valor
Lj 1
41
155.850,85R’C C33125.440,93
Lj 2
41
155.850,851° A38144.447,13
R/C A
36
136.844,651° B40152.049,61
R/C B
39
148.248,371°C38144.447,13
3°B
40
152.049,612°A38144.447,13
3°C
38
144.447,132° B40152.049,61
6°C
38
144.447,132°C38144.447,13
7°B
40
152.049,613°A38144.447,13
7°C
37
140.645,894°A

4°13
4°C
5°A
5°B
5°C
6°A
6°B
7° A38
40
38
38
40
38
38
40
37144.447,13
152.049,61
144.447,13
144.447,13
152.049,61
144.447,13
144.447,13
152.049,61
140.645,89
Tota!
350
1.330.434,07Total6502.470.806,13

Sendo de 2.470.806,13 € o valor das Existências Finais de Produtos e Trabalhos em Curso apurado pelo critério da Permilagem, a correcção a efectuar à Variação da Produção no exercício de 2002 é de 404.451,95€, assim apurada:
Quadro 16 - Correcção à Variação da Produção
Descrição
Produtos e Trabalhos em Curso
DeclaradoCorrigidoCorrecção
(1)
(2)(3)(4)=(3)-(2)
Existências Iniciais (1)2.929.102,832.929.102,83
Existências Finais (2)2.066.354,182.470.806,13
Variação da Produção (2)-(1)-862.748,65-458.296,70404.451,95

Estes custos não são comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos, pelo que ao abrigo do art° 23° do C1RC, não são aceites fiscalmente.
Refere-se que, corrigindo o valor das Existências Finais de Produtos e Trabalhos em Curso de 2.066.354,18€ para 2.470.806,13 € por aplicação do critério da Permilagem, significa que nos exercícios seguintes, até 2006, os custos a imputar às fracções vendidas deverão ser corrigidos a favor da empresa, pelo mesmo montante de 404.451,95 €, e desta forma determinar os resultados da obra de forma coerente em todos os exercícios.
Assim é dado cumprimento ao princípio da especialização dos exercícios estabelecido no art° 18° do CIRC que determina que os proveitos e os custos são imputáveis ao exercício a que digam respeito. …” ( fls. 85-206 do PAT)
«»
3.2. DE DIREITO
A partir daqui, cabe entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida, desde logo, a tarefa de indagar da nulidade do despacho por omissão de pronúncia.
Com efeito, no âmbito das suas alegações, o Recorrente refere que a sentença recorrida olvidou a questão do prazo de caducidade inerente ao procedimento a que alude o art. 63º do CPPT.
Segundo o disposto no artigo 125º nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é nula a sentença quando ocorra “a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”, sendo que esta nulidade está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz, pelo artigo 660º nº 2 do Código de Processo Civil, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, impondo-se aqui considerar esta matéria com referência ao disposto no art. 666º nº 3 do C. Proc. Civil.
Assim, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.
A partir daqui, é manifesto que o Recorrente não tem razão no que diz respeito à invocada nulidade da decisão, dado que, em função do seu enquadramento, a matéria apontada foi apreciada pela decisão em apreço, considerando que a alegação da ora Recorrente não tinha fundamento, na medida em que “a liquidação impugnada não teve por base qualquer disposição anti-abuso, antes resultou de um procedimento de avaliação directo da matéria colectável, perante a constatação objectiva da omissão de proveitos”, o que significa que a discussão sobre a matéria tem de ser equacionada no âmbito do erro de julgamento.
Cumpre, agora, entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se, desde logo, abordar a questão da ilegalidade do procedimento de aplicação da norma antiabuso - simulação fiscal -, consagrada no artigo 39.º da LGT - simulação fiscal e bem assim da invocada caducidade, relativamente á simulação fiscal, do direito à liquidação no dia 31/12/2005 - por aplicação do artigo 63° do CPPT.

Neste domínio, a Recorrente considera que o mecanismo da simulação mais não consubstancia que uma norma anti-abuso, tal como a norma do nº 2 do art. 38º da LGT, sendo que ambas as normas tornam claro que a tributação incide sobre o negócio real e não sobre o negócio declarado, o que significa que deveria a AF ter-se socorrido do mecanismo processual próprio, ou seja, o art. 63º do CPPT, o que não veio a acontecer, para além de não ter respeitado o prazo de caducidade inerente a esse procedimento, ou seja, 3 anos.

Nesta matéria, tal como se retira do Ac. deste Tribunal de 15-02-2011, Proc. nº 04255/10, www.dgsi.pt, é sabido que “o comportamento evasivo e fraudatório dos sujeitos passivos em matéria fiscal tem estimulado a doutrina a procurar meios de reacção adequados por forma a garantir o cumprimento do princípio da igualdade na repartição da carga tributária e na prossecução da satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas (cfr. artº. 103 nº.1, da C.R. Portuguesa).

Refere a doutrina que é inerente à racionalidade económica a minimização dos impostos a suportar, podendo utilizar-se várias vias para atingir tal desiderato, embora a fronteira de distinção entre elas nem sempre seja fácil de vislumbrar. Nesta linha de busca das formas possíveis de minimização dos impostos a doutrina aponta 3 vias: a gestão ou planeamento fiscal; a evasão ou elisão fiscal; e a fraude fiscal (cfr.Manuel Henrique de Freitas Pereira, Fiscalidade, Almedina, 2a edição, 2007, pág. 401).

A primeira delas consiste na minimização dos impostos a pagar de um modo totalmente legítimo e lícito, querido até pelo legislador, ou deixado à liberdade de opção do contribuinte, como sejam os benefícios fiscais e as alternativas fiscais (v.g.a decisão de tributação separada, ou conjunta, em sede de uniões de facto no I.R.S.; a opção pelo regime simplificado ou pela contabilidade organizada para a determinação do lucro tributável em sede de I.R.C.; a opção, ou não, pelo regime especial de tributação dos grupos de sociedades em I.R.C.).

Nestes termos, dentro dos limites da lei e do direito, o sujeito passivo pode escolher as formas menos onerosas de tributação tendo como limite da sua pretensão minimizadora a fraude à lei (cfr. J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 3a edição, 2007, pág. 159).

A segunda via - da evasão ou elisão fiscal - caracteriza-se pela prática de actos ou negócios lícitos mas que a lei fiscal qualifica como não sendo conformes com a substância da realidade económica que lhe está subjacente, assim devendo qualificar-se como anómalos, anormais ou abusivos. Também caracterizados como comportamentos "extra legem", em contraposição com a via da fraude fiscal, caracterizada como "contra legem". Dos comportamentos tributários evasivos resulta um sério entrave à concorrência empresarial, uma notória erosão das receitas fiscais, a distorção do princípio da equidade e um claro menosprezo do cumprimento das regras de cidadania, situações que se fundam em causas de carácter político, económico, psicológico e técnico. As formas utilizadas giram em torno de actos e contratos atípicos ou anormais visando tornear a lei (vg. utilização do regime especial de tributação dos grupos de sociedades - art°.63 e seg. do C.I.R.C. - através da produção de menos-valias ou da utilização de benefícios fiscais através da transmissão de prejuízos) ou interpretando-a com fins diversos daqueles que o legislador tinha em mente, designadamente aproveitando-se da existência de jurisdições fiscais diferentes para escolher, apenas por motivações de diminuição do imposto a pagar, a localização mais favorável para a residência de pessoas singulares ou colectivas ou para nelas instalar "estruturas" que não desempenham outra função que não seja permitirem essa diminuição (cfr.Manuel Henrique de Freitas Pereira, ob.cit., pág. 423 e seg.).

A terceira via - da fraude fiscal - caracteriza-se pela realização de actos ou negócios ilícitos frontalmente contrários à lei fiscal, por isso mesmo também designados como "contra legem". São exemplo desta via de minimização dos impostos a não entrega ao Estado dos tributos cobrados a terceiros, a obtenção de reembolsos de tributos indevidos, a alteração ou ocultação de factos ou valores que devam constar de livros de contabilidade ou de declarações fiscais, ou a existência de negócios simulados, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza.

É, pois, neste contexto, que os Estados se preocupam com a tomada de medidas visando combater os comportamentos evasivos e fraudatórios dos sujeitos passivos através das designadas cláusulas específicas anti-abuso (de que são exemplo as normas contidas nos art°s.58, relativa a preços de transferência, e 61, atinente à subcapitalização, ambas do C.I.R.C.), e cláusulas gerais anti-abuso (de que é exemplo a norma contida no art°.38, n°.2, da L.G.Tributária). …”.

No mesmo aresto, refere-se, mais à frente, que “na verdade, seguindo o estudo “Cláusulas anti -abuso e direitos e garantias dos contribuintes” de CLOTILDE CELORICO PALMA elisão fiscal (do latim elidere, eliminar, suprimir): implica a prática de acto ou conjunto de actos (operações), no âmbito da esfera de liberdade concedida aos particulares pelo princípio da legalidade ou tipicidade da tributação, e que têm como efeito a aplicação de regime tributário menos oneroso do que se aplicaria sem que tal acto ou conjunto de actos tivesse sido praticado.

Significa isto que as operações de planeamento fiscal são, em princípio, lícitas mas há que distinguir certos negócios que a lei considera como abusivos, anómalos, os quais são objecto de normas anti -abuso especiais ou gerais e que se podem considerar como actos antijurídicos, ao abrigo dessas leis anti –abuso (anti ‘taxavoidanceclauses’).

Como assinala a citada autora, a evolução legislativa da passada década caracteriza-se por um acentuado reforço das garantias dos contribuintes, existindo uma forte oposição ao alargamento dos poderes da AF (ex. introdução da cláusula geral anti -abuso, colecta mínima, acesso directo a dados cobertos pelo sigilo bancário). Na década actual em vez da demagogia anti impostos, assiste-se a uma subalternização sistemática dos direitos dos contribuintes ao objectivo central da maximização das receitas tributárias.

Saliente-se que a causa ancestral das medidas anti -abuso é a obtenção da igualdade tributária e a justiça na distribuição dos encargos tributários, mas isso implica que o respeito pelas garantias dos contribuintes tem que se verificar em dois momentos fundamentais, a saber, na criação de cláusulas anti -abuso e na aplicação das cláusulas anti -abuso.

Porém, o direito ao planeamento fiscal não é absoluto e sem limites tendo o sujeito passivo passa um ónus de planeamento e o direito subjectivo de optar entre vários comportamentos legalmente admissíveis, pelo que estamos perante um direito fundamental, cujo núcleo tem que ser respeitado e cujos limites terão que ser definidos.

Note-se que foi em especial durante a década de 90 e por mor da forte influência da harmonização fiscal comunitária, que em Portugal se adoptaram progressivamente medidas defensivas anti -abuso contra a evasão e fraude internacionais. …”.

Diga-se ainda que através desse mecanismo pode a AT, desde que se verifiquem aqueles pressupostos e com observância de específica tramitação - art. 63 do CPPT - desconsiderar os actos praticados ou negócios jurídicos concluídos com o objectivo principal de obstar à tributação ou de obter vantagens fiscais, considerando a correspondente situação fiscal como se tais actos não tivessem sido praticados ou esses negócios não tivessem sido concluídos.
A partir daqui, resulta claro que não pode proceder a pretensão da Recorrente em função do enquadramento da situação em apreço, na medida em que está em causa o facto de a AT, no âmbito de um procedimento de inspecção, que abrangeu o exercício de 2002, ter detectado as seguintes irregularidades:
1 - Diferenças entre os preços escriturados e os valores reais de venda de 3 fracções do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 931, da freguesia de Alfragide e concelho da Amadora, no montante de € 244.833,47 (cfr. ponto 1.1 do relatório da inspecção a fls. 36 a 40 e docs. de fls. 58 a 75 do PAT);
2 - Contabilização de custos não aceites fiscalmente, no valor de € 404.451,95, derivados do cálculo do preço de custo de cada fracção vendida e o da variação da produção estar incorrecto (cfr. ponto 1.2 do relatório da inspecção a fis. 40 a 50 do PAT).
Assim sendo, ganha acuidade o exposto no Ac. deste Tribunal de 06-10-2010, Proc. nº 03629/09, www.dgsi.pt, onde se aponta que “… Todavia e na senda não só da jurisprudência citada na sentença recorrida, como, ainda, dos Acórdãos do TCA de 29/04/03, tirado no Recurso nº3101/01 e de 18/11/2003, no Recurso nº 6594/02, cuja fundamentação vamos acompanhar nesta parte, há que ter em conta que art. 39° n° 2 da LGT normativo que dispõe que:
" 1 - Em caso de simulação de negócio jurídico, a tributação recai sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado.
2 - Sem prejuízo dos poderes de correcção da matéria tributável legalmente atribuídos à administração tributária, a tributação do negócio jurídico real constante de documento autêntico depende de decisão judicial que declare a sua nulidade."
Assim, deste nº 2 decorre que os actos ou negócios jurídicos nulos ou anuláveis constantes de documentos autênticos produzem os correspondentes efeitos jurídico - tributários enquanto não houvesse decisão judicial a declará-los nulos ou anuláveis, salvo as excepções expressamente previstas nas leis tributárias.
Assim sendo e também de acordo com a doutrina vazada no acórdão do STA proferido em 26/02/03, no Recurso n° 89/03, a AF não pode ignorar tais negócios jurídicos enquanto não for declarada a sua nulidade ou anulabilidade, mas não está impedida de proceder a correcções à matéria colectável, introduzindo as que forem pertinentes face aos elementos apurados.
E prossegue o mencionado aresto, citando o acórdão de 4/12/73 do STJ e a anotação a ele feita pelo Prof. Vaz Serra na RLJ, ano 107, fls. 309-314,«(...) "a simples simulação do preço não torna nulo o contrato, ainda que feita para prejudicar o direito do Estado ao imposto". E acrescentava adiante: "o contrato não é nulo por motivos de natureza fiscal, sendo a sua validade ou nulidade determinada pelas regras do direito privado. A lei fiscal não impõe, consequentemente, a nulidade do contrato em que exista simulação do valor; e essa nulidade não resulta também da lei civil, pois, ainda que se trate de contrato sujeito legalmente a uma forma especial, como acontece com o contrato de compra e venda de coisa imóvel, a razão da exigência da forma não abrange o montante do preço, o qual não tem de ser determinado no contrato, bastando que seja determinável".
No Manual dos Contratos em Geral, fls. 151 e segs., definia o Prof. Galvão Teles os vários tipos de simulação. Assim:
l. simulação: divergência entre a vontade e a declaração, estabelecida pôr acordo entre as partes com o intuito de enganar terceiros;
1. - simulação absoluta: quando na aparência se celebra um contrato, mas na realidade nenhum contrato se quer;
3. - simulação relativa: dá-se quando as partes pretendem realizar, e de facto realizam, um contrato, mas para iludir terceiros o ocultam, o encobrem, com um contrato diverso pela sua função e natureza, ou divergente em algum aspecto.
No caso vertente estamos perante uma simulação relativa. O negócio existe (...), cingindo-se a simulação ao preço pago pelo mesmo. Como atrás referimos tal simulação não torna nulo o negócio que consta da escritura e foi esse o que a Administração Fiscal tomou em consideração como facto tributário. Mas, tendo encontrado elementos indiciadores de que o preço pago não correspondia ao declarado, procedeu à correcção à matéria colectável nos termos que a lei lhe permitia.
O Prof. Leite de Campos (Simulação dos negócios jurídicos in Problemas fundamentais do Direito Tributário, fls. 224), após referir a necessidade da via judicial para declarar a nulidade do negócio jurídico simulado, escreve "Isto não impede, nos termos da primeira parte do nº2 (do artigo 39º da Lei Geral Tributária), que a Administração Fiscal corrija a matéria tributável revelada pelo negócio real, nos termos indicados na última parte do n"2". O facto de constar da escritura um preço determinado apenas demonstra ter sido esse o declarado pelas partes perante o notário mas não inibe a Administração Fiscal de ter outro entendimento face aos elementos que apura. Como bem se referiu no acórdão 1757/02 de 19 de Fevereiro de 2003 "mal se compreenderia que, consagrando a Lei Geral Tributária a presunção de veracidade das declarações dos contribuintes apresentadas à Administração Fiscal, e nem pôr isso lhe proibindo o recurso a métodos presuntivos (artigo 75°), atribuísse às declarações prestadas perante outro oficial público - o notário - valor superior, tal que a Administração ficasse manietada, dependente da obtenção de uma declaração judicial de nulidade. Não se vislumbra razão para conferir maior força à declaração feita perante um notário do que àquela que é produzida perante a Administração Fiscal".
Esta doutrina é, aliás, a acolhida pelo art. 39° da LGT, onde, como se viu, se estipula o seguinte:
"l. Em caso de simulação de negócio jurídico, a tributação recai sobre o negócio jurídico real e não sobre o negócio jurídico simulado. 2. Sem prejuízo dos poderes de correcção da matéria tributável legalmente atribuídos à administração tributária, a tributação do negócio jurídico real constante de documento autêntico depende de decisão judicial que declare a nulidade".
Como se diz no n°2 desse preceito, a tributação do negócio constante de documento autêntico é feita sem prejuízo dos poderes de correcção da matéria tributável legalmente atribuídos à AF, poderes que, lhe são conferidos nos termos dos artigos 58°, 74° e 90° da LGT.
Claro que isso é assim, sem prejuízo de a recorrente provar a falta ou insuficiência de indícios aptos a provarem que o preço pago correspondia ao declarado na escritura e/ou a incerteza ou dúvida sobre a existência e conteúdo do facto tributário ou que existe erro ou manifesto excesso na quantificação da matéria tributável, fundamentos que também estão invocados e são objecto do presente recurso e podem tornar ilegais as correcções e a consequente liquidação adicional. …”.

Ora, se é certo que não poderá vislumbrar-se no caso concreto a figura do antiabuso até porque não foi aberto o procedimento específico, situação que afasta o exposto pela Recorrente quanto à invocada caducidade por aplicação do art. 63º do CPPT, dúvidas não podem subsistir de que a conduta da AT mostra-se legitimada nos termos acima expostos, sendo ainda de notar que, estabelecendo o ordenamento jurídico duas metodologias alternativas ao método declarativo - correcções técnicas e presunções -, o recurso a qualquer delas não depende de um critério discricionário da AT, sendo que a AT encontra-se vinculada ao recurso às correcções técnicas, quando, apesar da violação dos deveres de cooperação do contribuinte, se encontre, sem embargo, em condições de apurar com efectividade os rendimentos tributar, tal como sucedeu na situação em análise, o que retira qualquer virtualidade, em ambas as vertentes, à alegação da Recorrente neste domínio.

Avançando, importa ponderar se ocorre a caducidade do direito à liquidação por aplicação do art. 46º da LGT, ou seja, coloca-se nos autos um problema de configuração do elemento temporal do facto tributário havendo que precisar, nesse sentido, que os impostos instantâneos ou de obrigação única, porque têm na base do facto tributário um elemento temporal cuja definição dispensa critérios jurídicos já que se basta com meros critérios naturalísticos, são simples de solucionar; ao invés, os impostos duradouros ou periódicos, uma vez que têm na base do facto tributário um elemento temporal que tendencialmente se mantém ou se reitera, levanta a problemática do fraccionamento jurídico do facto, o qual se considera naturalisticamente unitário no tempo, coincidindo o período do imposto com o ano civil.

Constitui uma garantia dos contribuintes a caducidade do poder de determinação do montante do imposto e de outras prestações tributárias, pelos serviços da AT, quando o valor dessa determinação não for notificado ao contribuinte no prazo fixado na lei, nos impostos periódicos, a partir do termo daquele em que ocorreu o facto tributário.

Assim, a caducidade do direito de liquidação, como a caducidade em geral, serve-se de prazos pré - fixados, caracterizados pela peremptoriedade e, no ensinamento de Aníbal de Castro, A Caducidade na Doutrina, na Lei e na Jurisprudência, pág. 41, visa «limitar o lapso de tempo a partir do qual ou dentro do qual há-de exercer-se o direito...», havendo sido invocada logo na petição inicial como fundamento da impugnação.

De acordo com o disposto no art. 45º n°s l e 4 da LGT o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única a partir da data em que o facto tributário ocorreu.

Nesta sequencia, a Recorrente aponta que o prazo de caducidade se consumou em 31 de Dezembro de 2006, considerando que foi notificada em 24-10-2006 do início do procedimento de inspecção externa, em 12-04-2007 foi notificada do relatório de inspecção e em 03-05-2007 foi notificada da liquidação adicional de IRC quanto ao exercício de 2002.

Neste ponto, deve dizer-se que assiste razão à Recorrente quando questiona o momento em que se verificou o início do processo inspectivo tal como afirmado na sentença - 30-10-2006, data em que a ora Recorrente foi notificada da Ordem de Serviço.

Com efeito, tal como se aponta do Ac. deste Tribunal de 06-10-2009, Proc. nº 02941/09, www.dgsi.pt, a que alude a Recorrente, “… Assim, secundando o Ac. deste Tribunal, de 2009JUN09, tirado no Proc. n.º 02729/08, que aqui se acolhe enquanto discurso fundamentador, depois de se ter dado por provado, ao que, aqui, agora nos importa, que «A impugnante foi objecto de uma acção de fiscalização por parte da Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária, relativa a IRC, IRS, IVA e IS dos exercícios de 1997, 1998 e 1999, […]» e que, «A impugnante recebeu carta aviso em 20 de Fevereiro de 2001, onde consta o seguinte: "Nos termos da alínea l) do n.º 3 do Art. 59° da Lei Geral Tributária e do Art. 49° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT) fica(m) V.a(s) Ex.a(s) notificados de que, a muito curto prazo, se deslocará(ão) à morada acima referenciada, técnico(s) dos Serviços de Inspecção Tributária."», veio a considerar que, «A Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho de 2001, com entrada em vigor em 6.7.2001 (cfr. seu art.º 14.º), veio acrescentar ao artigo 45.º da LGT, um n.º5, prevendo um prazo mais curto para se verificar a caducidade do direito à liquidação nos casos em que tenha havido inspecção tributária e que tem a seguinte redacção:

“Instaurado o procedimento de inspecção tributária, o direito de liquidar os tributos incluídos no âmbito da inspecção caduca no prazo de seis meses após o termo do prazo fixado para a sua conclusão, sem prejuízo das prorrogações previstas na lei reguladora daquele procedimento, a não ser que antes dessa ocorra a caducidade prevista no prazo geral fixado no n.º1.”

Ou seja, por virtude da introdução desta norma no art.º 45.º da LGT, a caducidade do direito à liquidação poderá ocorrer por uma dupla via: ou pelo decurso do prazo geral contido na norma do seu n.º1 (4 anos); ou o prazo, em regra mais curto, de seis meses, a contar do termo do prazo fixado para a conclusão da inspecção tributária.», e que, «Dispõe a norma do art.º 49.º do mesmo RCPIT, subordinada à epígrafe, Notificação para início do procedimento de inspecção:

1 – O início do procedimento externo de inspecção deve ser notificado ao sujeito passivo ou obrigado tributário com uma antecedência mínima de cinco dias.

2 – A notificação para início do procedimento de inspecção efectua-se por carta-aviso elaborada de acordo com modelo aprovado pelo director-geral dos Impostos, contendo os seguintes elementos:

...

E a norma do art.º 51.º do mesmo RCPIT, subordinada à epígrafe, Forma da notificação:

1 – Da ordem de serviço ou de despacho que determinou o procedimento de inspecção, será, no início deste, entregue uma cópia ao sujeito passivo ou obrigado tributário.

...

4. A recusa da assinatura da ordem de serviço não obsta ao início do procedimento de inspecção.

Tendo ainda especial relevo para este efeito a norma do artº 46.º da mesma LGT, sob a epígrafe, Suspensão e interrupção do prazo de caducidade, epígrafe esta que foi introduzida pela referida Lei n.º 15/2001, e que reza assim:

1 – O prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, de início de acção de inspecção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo desde o seu início, caso a duração da inspecção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação.

2 - ...

...

E a norma do n.º2(1)do art.º 36.º do mesmo RCPIT, a qual tem a seguinte redacção:

O procedimento de inspecção é contínuo e deve ser concluído no prazo máximo de seis meses a contar da notificação do seu início.» pelo que, «Face a estas duas últimas normas, quer a da LGT quer a do RCPIT, o dito prazo de seis meses não poderá deixar de se contar desde a data da notificação ao sujeito passivo do início do procedimento externo de inspecção, quer quanto à data em que se opera o início do prazo para se verificar a suspensão do prazo de caducidade quer quando o mesmo se inicia para efeitos da sua duração de seis meses, ou seja desde a notificação referida no art.º 49.º do mesmo RCPIT(2), que não desde a data da ordem de serviço ou de despacho que determinou o procedimento de inspecção referida no art.º 51.º do mesmo RCPIT, tendo também em conta que as normas da LGT têm valor reforçado(3)e se devem sobrepor às de natureza regulamentar como as contidas no citado RCPIT, se oposição houvesse, e que aquelas foram editadas ao abrigo da autorização legislativa concedida ao Governo pela Lei n.º 41/98, de 4 de Agosto, ao passo que estas o foram no âmbito da competência própria deste [art.º 198.º, n.º1 alínea a) da CRP], como nos mesmos diplomas expressamente se invoca.

Por outro lado, também a nova redacção introduzida no art.º 46.º da LGT pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2003), pelo seu art.º 43.º, veio expressamente alterar a data a partir da em que se deveria considerar a contagem do início do prazo de caducidade e que a veio fixar, da notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da acção de inspecção externa, só fazendo sentido tal alteração se antes o não fosse ainda nesses termos e pela mesma tenha pretendido inverter o anterior modo de contagem desse prazo.

Acresce que, como bem foi invocado pela ora recorrida, tal questão já fora apreciada por este Tribunal, no seu recurso de 6.2.2007, processo n.º 1456/06, acórdão cuja doutrina foi seguida na sentença recorrida, em que o aqui Relator ali foi 1.º Adjunto, não vendo também razões para agora alterar esse mesmo entendimento sufragado no citado acórdão, pese embora a pertinência e a clarividência dos fundamentos invocados pela aqui recorrente com vista à revogação da sentença recorrida, os quais contudo, não vemos que encontrem eco no direito positivo aplicado.

[…]

No caso, como a ora recorrida foi notificada da realização da inspecção externa em 20.2.2001 e que só em 14.9.2001 e 12.12.2001 foi notificada das suas prorrogações, estas não tiveram qualquer efeito na contagem daquele prazo, porque já depois de concluído o prazo de seis meses do mesmo procedimento, que se iniciou naquela primeira data de 20.2.2001 e se verificou o seu termo final em 20.8.2001, data a partir da qual se iniciou o decurso do prazo de seis meses para operar a caducidade do direito à liquidação, cujo termo assim se verificou em 20.2.2002, pelo que em 25.3.2002, data em que foi notificada da liquidação impugnada, já o respectivo prazo se mostrava decorrido, desta forma tendo esta notificação da liquidação ocorrido em data posterior ao do termo desse prazo de caducidade, que assim a inquina de ilegalidade, por perda do respectivo direito.». …”.

Nesta medida, e acolhendo o exposto, e ao que aqui nos importa, a data que baliza o início do referido prazo de seis meses é, efectivamente, o da notificação/recebimento, pela ora recorrente, da carta aviso a que se faz alusão e que se não controverte ter ocorrido em 24 de Outubro de 2006.

Por outro lado, conforme resulta da factualidade assente pelo Tribunal a quo, o procedimento de inspecção foi concluído a 12 de Abril de 2007, data da notificação do relatório final de inspecção, em obediência ao preceituado no n.º 1 do artigo 62.º do RCPIT, de modo que, não tendo o procedimento de inspecção excedido o prazo máximo de duração de seis meses, parece inequívoco que o prazo legal de caducidade esteve suspenso por idêntico período, i.e., esteve suspenso entre 24-10-2006 e 12-04-2007, pelo que o prazo de caducidade se consumou a 18 de Junho de 2007, sendo esta a data limite para a Administração Tributária validamente notificar a Recorrente da liquidação ora sindicada, considerando o referido prazo de 4 anos e o período de suspensão).
Perante a factualidade apurada nos autos, é manifesto que o contribuinte tomou conhecimento da liquidação (03-05-2007) numa altura em que não haviam decorrido os 4 anos previstos para o exercício do direito à liquidação, pelo que a sentença recorrida não merece qualquer censura nesta matéria, sendo esta também a leitura que emerge do Ac. do STA de 07-12-2005, Proc. nº 0993/05 apontado pela Recorrente, onde é confirmada decisão que considerou a suspensão do prazo de caducidade, nos termos do art. 46.º, n.º 1 da LGT, entre 12/12/2002, data da notificação à impugnante do início da inspecção externa, e a sua conclusão em 15/04/2003 pelo que, tendo a notificação da liquidação sido efectuada em 26/06/2003, «havia já caducado, em 04/05/2003 o respectivo direito já que a suspensão ocorreu a 19 dias do final de 2002, os quais somados a 15/04/2003 nos levam a 04/05/2003», ou seja, tal como acima se considerou, importa anotar o tempo que faltava entre 24-10-2006 e 31-12-2006, acrescentando tal período após o fim da suspensão do prazo de caducidade - 15-04-2007, o que nos remete para a data descrita - 18-06-2007 e a conclusão de que não haviam ainda decorrido os 4 anos previstos para o exercício do direito à liquidação, improcedendo a alegação da Recorrente neste domínio.

A Recorrente discute depois o facto de a sentença recorrida ter ponderado a aplicação do método da permilagem, apesar de não se encontrar junta a escritura pública de constituição em propriedade horizontal dos bens imóveis em questão, a fim de fazer prova dos valores utilizados a título de permilagem, pelo que a questão que tem de se colocar é, como é que o Meritíssimo Tribunal a quo, pode afirmar que os valores atribuídos a titulo de permilagem a cada fracção estão correctos, pois que, junto com o Relatório de Inspecção não se encontra a referida escritura pública de constituição em propriedade horizontal, questionando a fundamentação da situação em apreço.
Sobre esta matéria, cumpre notar que a lei tributária distingue de forma clara a fundamentação do acto tributário da comunicação dos fundamentos (cfr. nº 1 do art. 77º e nº 1 do art. 36º do CPPT), sendo que a comunicação do acto, seja na forma de citação ou notificação, não é um elemento intrínseco que faça parte da sua existência ou validade, mas sim um elemento que lhe é extrínseco, cuja função é dar a conhecer o seu conteúdo, e por isso mesmo uma condição de eficácia.
Isto para dizer que a falta de notificação dos fundamentos da liquidação não coloca quaisquer problemas à sua perfeição ou validade, tornando apenas nulo o acto instrumental, com a consequência da sua ineficácia, tudo se passando como a liquidação não tenha sido comunicada, de modo que não está em condições de produzir efeitos em relação ao seu destinatário.
Atento o exposto, considerando que a referida escritura se encontra em anexo ao relatório de inspecção, e sem deixar de notar que se trata de uma alegação algo despropositada, na medida em que se existe alguém que deve conhecer tal elemento é a ora Recorrente, e considerando, como se disse, que a notificação é um acto exterior e posterior ao acto tributário notificado e que os vícios que afectem a notificação em si, podendo embora determinar a ineficácia do acto notificado, são insusceptíveis de gerar a invalidade do acto tributário e de determinar a anulação visada com a presente impugnação, não pode deixar de concluir-se pela improcedência das conclusões das alegações do Recorrente no que a esta questão concerne.

A Recorrente invoca ainda a violação do principio da capacidade contributiva e especialização dos exercícios, uma vez que foram imputados proveitos de 2003, 2004, 2005 e 2006 ao exercício de 2002, sem que tivesse sido feita, a equivalente correcção nesses exercícios, o que originou e origina uma dupla tributação/duplicação de colecta e a realização de correcções em violação da al. b) do n.º 2 do artigo 19.º do Código do IRC e métodos indicados pela AF na Circular n.º 5/90, aludindo ainda que a AF litiga em venire contra factum proprium.

Sobre o princípio da especialização dos exercícios, é sabido que tal princípio visa tributar a riqueza gerada em cada exercício, independentemente do seu efectivo recebimento, pelo que ganha especial relevância nos casos em que não existe coincidência entre o exercício em que os ganhos ou perdas são contabilizados e o exercício em que os recebimentos ou despesas correspondentes têm lugar.
Aquele princípio vale assim para os casos em que os custos são contabilizados num exercício mas em que a despesa efectiva só é suportada noutro, e para os casos em que o ganho ainda que contabilizado num exercício, só é, de facto, recebido noutro. Ora em tais situações, em que existe desencontro entre a contabilização dos custos e dos proveitos e a sua efectiva concretização, a lei ordena que os mesmos sejam contabilizados à medida que sejam obtidos e suportados, e não à medida que o respectivo recebimento ou pagamento ocorram. Daí que se devam imputar ao exercício os encargos que emergem de operações nele realizadas, ainda que nele não suportadas, do mesmo modo que se devem imputar a um exercício os proveitos resultantes de operações nele feitas mesmo que arrecadados noutro.
Como regra que é, admitirá as excepções que a confirmam. E essas excepções, como tal, devem, obviamente, estar também previstas na lei e são elas:
· Nos casos em que haja imprevisibilidade ou manifesto desconhecimento das componentes positivas ou negativas e das obras de carácter plurianual (artigo 18°, nos 2 e 5 e 19° do CIRC);
· Nas situações em que a administração fiscal não teve qualquer prejuízo com o erro praticado pelo contribuinte;
· Quando esse erro não resultar de omissões voluntárias ou intencionais, com vista a operar as transferências de resultados entre exercícios.
Diga-se ainda que este princípio, embora não seja absoluto, tem em vista não permitir ao contribuinte manipular o apuramento do lucro tributável de acordo com aquilo que for mais conveniente para a respectiva tributação, devendo as circunstâncias imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas que não permitiram ao contribuinte determinar-se pelo cumprimento da regra da imputação dos custos ou proveitos ao exercício do ano a que diziam respeito previstas no nº 2 do mesmo artigo, serem por este invocadas e provadas.

Por outro lado, importa notar que o art. 19º nº 1 do CIRC refere que “a determinação de resultados em relação a obras cujo ciclo de produção ou tempo de construção seja superior a um ano pode ser efectuada segundo o critério de encerramento da obra ou segundo o critério da percentagem de acabamento, sendo que (nº 2) “é obrigatória a utilização do critério da percentagem de acabamento nos seguintes casos: a) Nas obras públicas ou privadas efectuadas em regime de empreitada quando se verifiquem facturações parciais do preço estabelecido, ainda que não tenham carácter sucessivo, e as obras realizadas tenham atingido o grau de acabamento correspondente aos montantes facturados; b) Nas obras efectuadas por conta própria vendidas fraccionadamente, à medida que forem sendo concluídas e entregues aos adquirentes, ainda que não sejam conhecidos exactamente os custos totais das mesmas”, verificando-se que o nº 6 desta norma determina que “salvo autorização prévia da Direcção-Geral dos Impostos, as empresas envolvidas em obras de carácter plurianual devem: a) Adoptar o mesmo critério de apuramento de resultados para obras de idêntica natureza; b) Manter até ao final da obra o método adoptado para o apuramento de resultados da mesma.”.
Para cabal enquadramento da realidade agora em equação, cabe ainda ter em consideração o teor da Circular nº 5/90, a qual aponta, além do mais, que:
Obras efectuadas por conta própria e vendidas por fracções
5 - A determinação dos resultados das obras a que se refere a alínea b) do número 2 do artigo 19.º do Código do IRC será feita com base no valor da venda e nos custos imputáveis à fracção vendida.
6 - Para efeitos do disposto no número anterior, os custos indirectos deverão ser repartidos e imputados a cada fracção tendo em conta a respectiva permilagem ou área ou de acordo com outro critério, devidamente justificado, que se revele adequado à especificidade da situação.”.

Neste âmbito, a Recorrente refere que utilizou o critério da percentagem de acabamento, para os imóveis alienados, e o critério da área para os imóveis não alienados no exercício, sendo que a pretensão da AF, corroborada pelo Meritíssimo Tribunal a quo, em proceder à alteração de critério utilizado, não tem qualquer outro sentido, que não uma angariação mais rápida de receita para, posteriormente, nos restantes exercícios reconhecer uma perda de receita, o que como veremos não foi feito, ou seja, o imposto deixado de liquidar no exercício de 2002, veio a ser liquidado no exercício de 2004, pois que se os custos são os mesmos e os proveitos também, o facto de se reconhecer um custo menor no exercício de 2002, aumentando a receita fiscal nesse exercício, implica automaticamente, um reconhecimento de um custo superior no exercício de 2003 e 2004, o que significa que face a tal facto, e ao abrigo dos princípios going concern, tributação pela capacidade contributiva e especialização dos exercícios deveria a AF ter procedido não só a correcções ao exercício de 2002, mas, consequentemente, correcções ao exercício de 2003, 2004, 2005 e 2006 a fim de repor a verdade tributária, o que não sucedeu.
Com referência a esta matéria, ao contrário do que supõe a Recorrente, diga-se que o princípio que suporta a sua alegação é precisamente o elemento que impõe a rejeição da sua proposta de análise da matéria em apreço.
Com efeito, estando em causa a consideração dos custos a considerar no âmbito do exercício de 2002, e estando em causa não permitir ao contribuinte manipular o apuramento do lucro tributável de acordo com aquilo que for mais conveniente para a respectiva tributação, então impõe-se o apuramento da matéria relevante com referência ao referido exercício, não podendo aceitar-se a tese da Recorrente de que está apenas em causa a antecipação de receita, pois que, no final, os custos seriam sempre os mesmos.
Pois bem, em função da própria conduta da Recorrente, ao impugnar a presente liquidação, logo se intui que a situação não é tão inócua como a Recorrente quer fazer crer, além de que o princípio acima apontado impõe à AT a apreciação da situação relacionada com o exercício em causa e a consideração de todos os elementos, quer ao nível dos proveitos, quer ao nível dos custos, com interesse para o apuramento do lucro tributável para aquele exercício, o que significa que não se pode considerar nesta matéria a eventual repercussão dos elementos em apreço para exercícios posteriores enquanto forma de proceder como que a um “acerto de contas”.
Tal significa também que não tem qualquer viabilidade a invocada dupla tributação/duplicação de colecta, dado que, para além de os autos não conterem quaisquer elementos que permitam, em termos de facto, apreciar o que se passou nos exercícios posteriores, a matéria em apreço nunca poderia ser considerada nesta sede, dado que, para o efeito em análise, este é o primeiro procedimento, o primeiro exercício em causa, de modo que, a tal duplicação apenas poderá ser afirmada no âmbito dos exercícios posteriores, não podendo proceder a alegação da Recorrente neste contexto, não se vislumbrando rasto da invocada violação do principio constitucional da tributação de acordo com a capacidade contributiva e da especialização dos exercícios - artigo 18.° do Código do IRC, sendo que este último princípio impõe a rejeição da análise proposta pela Recorrente.

A Recorrente aponta ainda que, no que à distribuição de custos diz respeito, o método da percentagem de acabamento e o método da área, não revelam diferenças substanciais entre si, sendo este método da área, um dos métodos recomendados pela AF no n.° 6 da Circular n.° 5/90, a qual “não fecha as portas”, à possibilidade de utilização do método da percentagem de acabamento para as existências finais, além de que a Recorrente, como aliás referiu em sede de audição prévia, utilizou um dos métodos recomendados pelo artigo 19.º do Código do IRC, bem como o referido na Circular n.° 5/90, de modo que, não pode a AF, por razões de conveniência de receita fiscal, imiscuir-se em questões de natureza técnica, que no final da obra, não influenciam os montantes de imposto a liquidar ao Estado e diga-se que, em momento algum, a Circular impõe qual o método a utilizar pelos sujeitos passivos, deixando a circular em aberto a possibilidade de utilização de um dos métodos consagrados na mesma ou outro mais conveniente.
Que dizer?
Desde logo, é ponto assente que a ora Recorrente utilizou o método de acabamento final para o apuramento do custo anual das fracções vendidas e o método da área para o apuramento das existências finais.
Por outro lado, a alínea b) do n° 2 do art. 19º do CIRC impõe a utilização do critério da percentagem de acabamento “nas obras efectuadas por conta própria vendidas fraccionadamente, à medida que forem sendo concluídas e entregues aos adquirentes, ainda que não sejam conhecidos exactamente os custos totais das mesmas... sendo a empresa obrigada a “adoptar o mesmo critério de apuramento de resultados para obras de idêntica natureza” segundo a alínea a) do n° 6 do mesmo artigo.
Neste domínio, é ponto assente que a conduta da Recorrente coloca em crise o disposto no art. 19º nº 6 do CIRC.
Por outro lado, consta do relatório de inspecção o seguinte:
“Da análise aos quadros 8 a 13, conforme atrás foi referido, constata-se que a determinação dos custos das fracções é efectuado de uma forma mista, por um lado, determina-se o custo anual das fracções vendidas pela aplicação da percentagem da facturação acumulada aos custos incorporados e por outro lado, esse custo anual é repartido pelas fracções em função da sua área. Não havendo qualquer acréscimo ou diminuição de custos incorporados, ou seja, mantendo os custos inalterados de 3.801240,20 €, nesses quadros constatam-se e demonstram-se as seguintes situações:
- O custo de uma mesma fracção vai sofrendo alterações ao longo dos exercícios em que permanece em existências finais de Produtos e Trabalhos em Curso (ver 1°A, 3°A, e 4°A, Quadro 11);
- Que duas fracções com a mesma área têm custos diferentes no mesmo exercício, consoante ela permaneça em existências finais em Produtos e Trabalhos em Curso ou tenha sido vendida ( ver Ano 2004, 5º A-Quadro 11 e 7º A-Quadro 12) e ainda;
- Que uma determinada fracção quando é vendida não é custeada pelo valor que tinha no inventário (ver fracção 2º A, Quadros 11 e 12).”.
Nestas condições, tem de entender-se que a AT estava legitimada para agir nos termos que se mostram descritos nos autos, na medida em que, tal como se aponta na decisão recorrida “segundo o critério utilizado pela impugnante o custo das fracções é determinado em função dos valores da venda dessas fracções, e em função das vendas estimadas, o que motivou a correcção efectuada, pois o custo é invariável, o preço de venda é que pode ser variável em função do exercício em que é vendido, o que leva a que fracções iguais, com a mesma área, tenham custos diferentes, o que distorce os resultados da obra nos exercícios em que se verificam as vendas das fracções”, sendo que “já quanto ao critério da permilagem, utilizado pela AT, consiste na repartição dos custos totais de construção pelas fracções em função da permilagem correspondente a cada fracção a qual foi definida pela impugnante na escritura de constituição da propriedade horizontal e respectivo anexo, mostrando-se o mais adequado para repartir os custos de construção do referido lote 8., pois a descrição do imóvel, a individualização das fracções autónomas, a sua composição, o respectivo destino e permilagem foram definidos pelo próprio impugnante.”.
Efectivamente, aquilo que importa destacar neste domínio é que em função dos elementos presentes nos autos, e por aplicação do princípio da especialização dos exercícios a que alude a Recorrente, tem de entender-se que, “in casu”, a conduta da AT tem fundamento legal em função do que ficou exposto, não emergindo da alegação da Recorrente matéria capaz de colocar em crise a conduta da AT, até porque, mais à frente, a Recorrente vem a concluir, tal como acima ficou dito, que a situação seria substancialmente idêntica, tratando-se apenas de a AT antecipar receita, referindo mesmo que o método da área tinha gerado uma matéria colectável superior ao método da permilagem (o que de algum modo mitiga a invocada ânsia de obter receita fiscal), para depois voltar a insistir no facto de a AT não ter sido consequente para os exercícios posteriores, matéria que já foi tratada, não fazendo sentido também nesta sequência falar de venire contra factum proprium, pois o que está em causa é a existência de fundamento para a actuação da AT e da invocação por parte da Recorrente de matéria susceptível de colocar em crise a correcção efectuada.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.

4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Lisboa, 20 de Novembro de 2012
Pedro Vergueiro
Lucas Martins
Joaquim Condesso