Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08694/15
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2016
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:ISENÇÃO DE CUSTAS DA FAZENDA PÚBLICA NA OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:Para se aferir da isenção de custas de que beneficiava ao abrigo do art. 3.º do Regulamento das Custas dos Processos Tributários (RCPT) importa ter em consideração, não a data da instauração do processo de execução fiscal, mas antes a data da instauração do processo de oposição, que deve ser anterior à 1 de Janeiro de 2004, pois é este processo, e não aquele, cujo desfecho jurídico está na origem da condenação em custas.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:A FAZENDA PÚBLICA, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário (TT) de Lisboa, que julgou procedente a oposição apresentada por João…, ao processo de execução fiscal que contra si reverteu, sob o número e apensos, visando a cobrança coerciva do montante de €1.162.043,80, relativo a dívidas de cotizações e contribuições à Segurança Social da sociedade T…, S.A., dos anos de 1992 a 1994.

A Fazenda Pública apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES
Assim, nos termos dos artigos 685°-A e 685°-B (actuais artigos 639° e 640°) do Código de Processo Civil:

a) Foram violados o anterior Código das Custa Judiciais e o artigo 13° do CPPT.

b) O tribunal "a quo" ao julgar procedente a presente oposição considerou as "custas pela fazenda que decaiu", determinando como "valor da causa: o da dívida exequenda [artigo 97-A/1.e) CPPT]".

c) É objecto da presente oposição o processo de execução fiscal n° e apensos concernente a dívidas de contribuições e juros de mora à segurança social dos anos de 1992 a 1994, no montante total de 1.162.043,80€, originariamente da responsabilidade da sociedade comercial "T, S.A.".

d) Conforme Acórdão do STA proferido no âmbito do Recurso n°1330/13, de 16/10/2013, embora nele a fazenda pública tenha obtido perda de causa, em sede de custas o STA decidiu "sem custas, dado que a execução é anterior a 2004, altura em que a FP estava isenta de custas" (sublinhado nosso), isentando, assim, de custas a fazenda pública sempre que, ainda que obtenha perda de causa, estejam em causa processos de execução fiscal anteriores a 2004, precisamente a situação em apreço.

e) Assim, violou a douta sentença o anterior Código das Custas Judiciais, que isentava a fazenda pública de custas judiciais.

f) Quanto ao não exercício de facto da gerência na originária devedora, de acordo com certidão do registo comercial João é, para além de sócio, também gerente da originária devedora, sendo tal facto confirmado através da certidão do registo comercial da firma, que dá a conhecer as vicissitudes da vida da sociedade, a participação dos sócios e gerentes nas deliberações que provocaram as alterações ao pacto social, das quais se salienta, desde logo, a transformação em sociedade anónima, deliberada em 5 de Agosto de 1992, ficando o oponente a fazer parte do conselho de administração, composto por um presidente e 4 vogais, tendo o oponente sido nomeado como primeiro vogal (uma vez que o seu nome é, após o do presidente, o primeiro a constar na lista dos administradores).

g) Tendo sido também determinado que a "forma de obrigar" a sociedade é "pela assinatura de dois administradores, ou de um só, no exercício da competência que nele for delegada pelo conselho de administração".

h) É também de notar que o oponente, para além de fazer parte do conselho de administração, surgindo aos olhos de terceiros como primeiro vogal, é ainda detentor duma quota no valor de 256.000.000$00, sendo o capital social de 1.200.000.000$00, ou seja, aparecendo como detentor de 21,3% do capital social, não sendo de somenos importância a sua posição na originária devedora.

i) E no concernente ao exercício das funções de administrador, é de evidenciar o testemunho do irmão do oponente - Luís -, que referiu ser também sócio gerente da empresa mas não participando na gestão da mesma, à semelhança do oponente. Ora, conforme consta da certidão de registo comercial, esta testemunha, ao contrário do oponente, a partir de 5 de Agosto de 1992 deixou de fazer parte dos órgãos sociais da sociedade, uma vez que do conselho de administração fazem parte Joaquim, como presidente, e João (o ora oponente), Joaquim, Kelso e Miguel, como vogais. Revelando-se, pois, como testemunha, no mínimo, inidónea.

j) Depois, o ora oponente é sócio fundador da originária devedora e gerente desta também desde o início em 1984. E nunca veio renunciar à gerência, ao contrário, de acordo com as vicissitudes da empresa relatadas no registo comercial, subiu em grau de importância na administração da sociedade e ao nível das assembleias gerais, urna vez ter-se tornado detentor de 21,3% do capital social.

k) É ainda de realçar que 4 dos 5 administradores, sendo 3 deles também sócios, são familiares, com maior facilidade de exercício da respectiva gerência. E ainda de referir que a gerência de direito faz presumir a gerência de facto.

l) Ainda quanto às testemunhas inquiridas, todas elas são, ou familiares, ou muito próximas do oponente, uma vez que toda a vida trabalharam em empresas que gravitavam à volta da família F, não podendo, naturalmente, por razões de parentalidade, de gratidão e proximidade, o seu depoimento ser completamente isento.

m) Por outro lado, nunca é feita contraprova documental relativamente às vicissitudes da vida da sociedade dadas a conhecer por esta - veja-se a nomeação do oponente como administrador e a sua qualidade de sócio detentor de 21,3% do capital social -, prova documental que se revelará a prova rainha no mundo do direito tributário, que nunca poderá ser facilmente combatida pela prova testemunhal.

n) No que se refere aos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, eles constam dos documentos instrutórios juntos pela fazenda pública e pelo ora recorrido.

Pelo que, com o mais que Vossas Excelências se dignarão suprir, deve ser dado provimento ao recurso e em consequência ser revogada a decisão recorrida».

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O Recorrido contra-alegou, pugnando pelo improvimento do recurso sem, no entanto, formular conclusões.

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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu douto parecer, no qual concluiu que o recurso «deve parcialmente improceder, devendo a douta decisão sob recurso ser mantida na esfera jurídica, por não sofrer de qualquer vício, no que se refere á ilegitimidade do oponente na execução, devendo apenas se alterar a decisão no que se refere às custas processuais, das quais a Fazenda Pública está isenta».
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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As questões invocadas pela Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso, que delimitam o objecto do mesmo, e que cumpre apreciar e decidir são as seguintes:
_ Erro de julgamento por violação do anterior Código das Custas Judiciais, porquanto tratando-se de processo de execução fiscal anterior a 2004 a Fazenda Pública se encontra dispensada de custas;
_ Erro de julgamento por violação do art. 13.º do CPT uma vez que o Oponente exerceu de facto a gerência da sociedade executada originária.

II. FUNDAMENTAÇÃO

1. Matéria de facto

A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«III - Fundamentação

a) Factos provados

Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com interesse para a decisão:

A) Em 1993.03.05, no Serviço de Finanças de , foi autuado o processo de execução fiscal (PEF) n°, contra T, SA., com sede em (cf. fls. 11 dos autos);

B) Tem por base:
a. Certidão de dívida n° , emitida em 1993.03.31, que atesta que T, SA., com sede em , é devedora de PTE 80 384 877$00, dos quais PTE 72 041 473$00 de contribuições à segurança social dos meses de Junho a Dezembro de 1992 (cf. fls. 12 dos autos);

C) A este PEF foram juntos os seguintes processos de execução fiscal:
a. PEF n°, instaurado por dívidas de contribuições dos meses de Fevereiro a Julho de 1993 (cf. fls. 13 e 14 dos autos);
b. PEF n°, instaurado por dívidas de contribuições dos meses de Agosto e Setembro de 1993 (cf. fls. 15 e 16 dos autos);
c. PEF n°, instaurado por dívidas de contribuições dos meses de Outubro a Dezembro de 1993 (cf. fls. 17 e 18 dos autos);
d. PEF n°, instaurado por dívidas de contribuições dos meses de Dezembro de 1993, Janeiro, Fevereiro e Março de 1994 (cf. fls. 19 a 21 dos autos);
e. PEF n°, instaurado por dívidas de contribuições dos meses de Abril a Julho de 1994 (cf. fls. 22 a 23 dos autos);
f. PEF n°, instaurado por dívidas de contribuições dos meses de Agosto a Dezembro de 1994 (cf. fls. 24 a 25 dos autos);

D) Em 2007.12.27, o Chefe de Finanças proferiu despacho de reversão da execução fiscal contra João, constante de fls. 78 a 80 dos autos e aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual se transcreve:
a. (...);
b. A originária devedora T, SA (...), não possui quaisquer bens, tendo todo o património sido vendido por negociação particular através de escritura lavrada no Cartório Notarial de em 2001.02.21 (...);
c. Assim, porque se encontra reunida a condição referida na alínea a) do n° 2 do artigo 153° do CPPT (...), reverto a presente execução nos termos do n°1 do artigo 13° do Código de Processo Tributário (...);
d. João (...) o montante de €1.162 043,80, correspondente ao período de 15 de Maio de 1984 a 13 de Março de 1995;
e. (...);
f. De harmonia com o n°3 do artigo 191° do CPPT, proceda-se à citação pessoal dos responsáveis subsidiários, fazendo-lhes saber que se efectuarem o pagamento no prazo de 30 dias, a que se refere o artigo 203° do CPFT, ficam isentos de juros de mora e custas, de harmonia com o n° 5 do artigo 23° da Lei Geral Tributária;
g. [Local, data e assinatura];

E) Por carta registada com aviso de recepção assinado em 2008.01.02, foi enviado ao Opoente ofício normalizado Citação (Reversão) - cf. fls. 81 a 81-v dos autos;

F) Em 2008.01.30, a presente oposição deu entrada no serviço de Finanças de (cf. carimbo aposto a fls. 4 dos autos);

G) O Opoente era gerente da sociedade segundo o pacto social (cf. fls. 28 a 32-v dos autos);

b) Factos não provados

Os factos constantes das precedentes alíneas consubstanciam o circunstancialismo que, em face do alegado nos autos, se mostra provado com relevância, necessária e suficiente à decisão final a proferir, à luz das possíveis soluções de direito.

IV - Motivação da Decisão de Facto

A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes do processo e das testemunhas ouvidas

1ª Testemunha: Rui, trabalhou para a empresa devedora originária T, era chefe de secção do armazém de matérias-primas, conhece o Opoente, Eng.° João, quem o contratou foi o Sr. Eng.° Joaquim que via diariamente; o Sr. João trabalhava na "F" nunca o viu na T; nunca lhe deu ordens ou o contactou na qualidade de gerente; quem efectuava as compras e dava ordens a si e aos demais trabalhadores era o Sr. Eng.° Joaquim ; não sabia que o Opoente era gerente ou administrador da empresa;

2ªTestemunha: Jorge, conhece o Opoente e a família, trabalhou na T como Chefe dos Serviços de Manutenção e não trabalhava com o Eng.° João; tinha relações profissionais com o Senhor Comendador Joaquim, com quem trabalhava; o Sr. Eng. João trabalhava na F; a F tinha em 1975 1400 trabalhadores; quando via o Sr. Eng.°. João na T era a visitar o pai; a T foi criada pelo Senhor Eng.° Joaquim já com 65 anos; nunca viu o Sr. Eng.°. João como administrador da empresa; ainda hoje trabalha na empresa; a crise que a empresa atravessou deveu-se à perda da carteira de clientes e de encomendas; o Senhor Comendador era uma pessoa cumpridora e exigente com os outros e consigo mesmo.

3ª Testemunha: António; conhece o Opoente, e trabalhou com ele na empresa F; não tem conhecimento que o Sr. Eng.° João trabalhasse na T; quem dirigia a empresa era o pai do Sr. Eng.°; o Opoente trabalhava na F a tempo inteiro; era uma empresa com mais de 1000 pessoas; toda a gente sabia que quem geria a T era o Sr. Comendador; com a crise internacional a T começou a atravessar dificuldades; a T fazia fios para os tapetes que eram produzidos nos países do médio-oriente e com a Guerra do Golfo as encomendas diminuíram drasticamente; depois da venda da empresa quem a dirigia eram os «pedips»; antes era o pai do Opoente; foi membro e Presidente do Conselho Fiscal da T; a empresa tinha um ROC;

5ª Testemunha: Luís, é irmão do Opoente e foi sócio-gerente da T; embora fossem ambos sócios-gerentes da empresa não iam lá nem participavam na gestão da empresa; trabalhava na F, que também é uma empresa criada pelo pai de ambos;

6ª Testemunha: António, era sócio da T e trabalhava numa secção da T que depois foi autonomizada; não sabe bem o que se passava na T porque vinha poucas vezes cá abaixo; não sabe o que se passava na empresa nem na qualidade de sócio; o Opoente não tinha qualquer função na T pois trabalhava na F; as ordens eram todos do seu tio e de mais ninguém; só ele geria a empresa».


Dá-se como provada a seguinte factualidade, ao abrigo do artigo 662.º do CPC, com relevo para a decisão do recurso:

H) O Oponente é sócio gerente da sociedade executada originária desde 11/07/1984, juntamente com mais três outros sócios gerentes (cfr. certidão do registo comercial de a fls. 27 e ss dos autos).

I) Desde 11/07/1984 para obrigar a sociedade era necessário, e suficiente, a assinatura de Joaquim (cfr. certidão do registo comercial de a fls. 27 e ss dos autos).

J) Em 05/04/1993 a sociedade executada originária é transformada em sociedade anónima, sendo que o Oponente permanece sócio juntamente com vários outros sócios (cfr. certidão do registo comercial de a fls. 27 e ss dos autos).

L) A partir da transformação referida no ponto anterior a administração da sociedade executada originária compete a um conselho de administração composto por cinco membros, dos quais faz parte o Oponente, e a sociedade obriga-se com a assinatura de dois administradores, ou de um só no exercício da competência que nele for delegada pelo conselho de administração (cfr. certidão do registo comercial de Seia a fls. 27 e ss dos autos).

M) Em 24/06/1993, por força da acção de recuperação de empresa, foi nomeado administrador da sociedade executada originária José (cfr. certidão do registo comercial de a fls. 27 e ss dos autos).

N) Em 25/08/1995 foi nomeado o conselho de administração composto por Joaquim , Joaquim G e Júlio (cfr. certidão do registo comercial de a fls. 27 e ss dos autos).

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2. Do Direito

Invoca a Recorrente Fazenda Pública, antes de mais, erro de julgamento por violação do anterior Código das Custas Judiciais, porquanto tratando-se de processo de execução fiscal anterior a 2004 a Fazenda Pública se encontra dispensada de custas.

Mas sem razão.

Conforme se escreveu no acórdão do STA de 15/10/2014, proc. n.º 01937/13 “no regime de custas anterior à vigência do Código das Custas Judiciais introduzido pelo Dec.Lei nº 324/2003, de 27 de Dezembro, a Fazenda Pública estava isenta de custas nos processos de natureza tributária, por expressa previsão dessa isenção no art. 3º do Regulamento das Custas dos Processos Tributários vigente à data da instauração do processo (Dec.Lei nº 29/98, de 11 de Fevereiro), como, aliás, pela anterior previsão do art. 5º do Regulamento das Custas nos Processos das Contribuições e Impostos e do art. 2º da Tabela das Custas no Supremo Tribunal Administrativo aprovado pelo DL nº 42.150, de 12 de Fevereiro de 1059.
E embora todos esses diplomas legais tenham sido revogados pelo Código das Custas Judiciais (CCJ) introduzido no nosso ordenamento jurídico pelo Dec.Lei nº 324/2003, e nele a Fazenda Pública deixasse de beneficiar da aludida isenção, o certo é que tal diploma só era aplicável aos processos instaurados após a sua entrada em vigor (art. 14º, nº 1) e só produziu efeitos, no tocante às custas judiciais tributárias, a partir da data da transferência dos tribunais tributários para a tutela do Ministério da Justiça (art. 15º, nº 2), transferência que ocorreu com a publicação do Dec.Lei nº 325/2003, de 29 de Dezembro, que entrou em vigor no dia seguinte à sua publicação (art. 18º).
O que significa que, pese embora a entrada em vigor do CCJ em 1 de Janeiro de 2004, a Fazenda Pública continuou a beneficiar de isenção de custas em todos os processos tributários instaurados até àquela data e que se encontrassem pendentes.
E o mesmo aconteceu após a entrada em vigor do Regulamento das Custas Processuais introduzido no nosso ordenamento jurídico pelo Dec.Lei nº 34/2008, de 26 de Fevereiro, tendo em conta que inicialmente este era apenas aplicável aos processos instaurados após a sua entrada em vigor (art. 27º) e que, apesar de algumas das suas normas terem passado a ser aplicáveis a processos anteriormente instaurados por força da oitava alteração introduzida nesse Regulamento pela Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, o certo é que este diploma ressalvou o seguinte no nº 4 do seu art. 8º: «Nos processos em que as partes se encontravam isentas de custas, ou em que não havia lugar ao pagamento de custas em virtude das características do processo, e a isenção aplicada não encontre correspondência na redacção que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei, mantém-se em vigor, no respectivo processo, a isenção de custas.» (…)”

Ora, in casu, o processo de execução fiscal foi instaurado em data anterior a 2004 tal como afirma a Recorrente Fazenda Pública.

Porém, o presente processo de oposição à execução fiscal que está na origem da condenação em custas foi instaurado em 2008.

Na verdade, e ao contrário do que parece entender a Recorrente Fazenda Pública, para se aferir da isenção de custas de que beneficiava importa ter em consideração, não a data da instauração do processo de execução fiscal, mas antes a data da instauração do processo de oposição, pois é este processo, e não aquele, cujo desfecho jurídico está na origem da condenação em custas.

O processo ora em causa nos autos e que originou a condenação em custas é o processo de oposição, e deste modo, é a data da sua instauração que deve ser aferida para efeitos da determinação do regime legal aplicável em matéria de custas.

Pelo exposto, não se verifica o erro de julgamento invocado, e nessa medida improcedem as conclusões a) 1.ª parte a e).



Invoca ainda a Recorrente Fazenda Pública erro de julgamento por violação do art. 13.º do CPT uma vez que o Oponente exerceu de facto a gerência da sociedade executada originária [conclusões f) a n)].

Alicerça o alegado quer nos registos constantes da certidão do registo comercial, mais colocando em causa os depoimentos das testemunhas dadas as relações familiares, ou muito próximas, com o Oponente.

No que diz respeito aos laços familiares e relação próxima das testemunhas com o Oponente invocadas pela recorrente, aquelas não obstam a que se considerem os depoimentos prestados e se valorem em conformidade. Com efeito, não se poderá excluir de per se a credibilidade de tais depoimentos, mas tais relações devem ser valoradas.

Prevê o art. 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil (CPC) que “ [o] juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.”

Este preceito legal consagra o princípio da livre apreciação da prova, segundo o qual, o juiz aprecia a prova produzida de acordo com a sua própria convicção, sendo que o princípio da imediação limita o reexame da matéria de facto fixada no tribunal a quo, pois a sua alteração apenas pode ocorrer em caso de erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais apontarem inequivocamente em sentido diverso.

O erro de julgamento de facto ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto.

Portanto, apenas se apuramos que o juízo de facto feito está em desconformidade com a prova produzida se concluirá pelo julgamento de facto.

Relativamente à prova testemunhal, como vimos, o argumento da Recorrente Fazenda Pública não colhe, pois radica tão-somente na qualidade das testemunhas para colocar em causa a credibilidade das mesmas, sem apontar nos seus depoimentos quaisquer contradições que importassem um juízo de facto diverso. À míngua da invocação de razões concretas para colocar em causa a convicção do tribunal a quo improcede a pretensão da Recorrente.

Idêntica conclusão se poderá tirar dos registos da certidão do registo comercial, ou seja, não se verifica o erro de julgamento quanto à apreciação da prova documental.

Senão, vejamos.

No presente recurso ampliou-se a matéria de facto de modo a tornar perceptível o juízo que importava fazer na análise das inscrições constantes da certidão do registo comercial da sociedade executada originária, e como veremos, analisando tais inscrições neste TCAS, podemos concluir que a sentença recorrida, pese embora não se tenha debruçado em pormenor sobre esta matéria, não enferma de erro de julgamento.


Resulta da certidão do registo comercial da sociedade executada originária que o Oponente é sócio gerente da sociedade executada originária desde 11/07/1984, juntamente com mais três outros sócios gerentes. Mais resulta que para obrigar a sociedade era necessário, e suficiente, a assinatura de Joaquim.

Portanto, desta inscrição apenas se poderá aferir da gerência de direito do Oponente, mas já não da gerência de facto. Na verdade, apenas relativamente àquele outro sócio, cuja assinatura é necessária para obrigar a sociedade (Joaquim) é que se poderá afirmar que de acordo com as regras da experiência comum estaremos perante um sócio gerente de facto, pois se a sua assinatura é necessária para obrigar a sociedade, então, é porque assinou documentos que a vinculam, praticando, portanto, actos de gerência.

Assim sendo, podemos afirmar com segurança que apenas com base nesta inscrição constante da certidão é manifesto que não se poderá concluir a gerência de facto do Oponente. Importava que o órgão de execução fiscal evidenciasse actos efectivos de gerência que tivessem sido praticados pelo Oponente, ou por ex, que este, em sede de audiência prévia à reversão confessasse o exercício de facto da gerência, o que também não sucedeu.

Por outro lado, também resulta da certidão em causa que em 05/04/1993 a sociedade executada originária é transformada em sociedade anónima, sendo que o Oponente permanece sócio juntamente com vários outros, e a administração passa a competir a um conselho de administração composto por cinco membros, dos quais faz parte o Oponente. Sucede que a sociedade obriga-se com a assinatura de dois administradores, ou de um só no exercício da competência que nele for delegada pelo conselho de administração.

Ora, também desta inscrição não resulta necessariamente a gerência de facto do Oponente, pois como são cinco os membros nomeados para o conselho de administração, e são necessárias apenas duas assinaturas, nada conduz à conclusão de que o Oponente tenha assinado qualquer documento que vinculasse a sociedade. E pese embora haja a possibilidade de obrigar-se apenas com uma das assinaturas, esta depende da delegação pelo conselho de administração. Sucede que, o órgão de execução fiscal nunca alegou nada a este respeito, e muito menos provou, conforme lhe competia, que efectivamente houve uma delegação no Oponente.

Prosseguindo na análise das inscrições.

Em 24/06/1993, por força da acção de recuperação de empresa, foi nomeado administrador da sociedade executada originária José, e em 25/08/1995 foi nomeado o conselho de administração composto por Joaquim , Joaquim G e Júlio.

Ora, a partir de 24/06/1993 o Oponente já não é gerente de direito da sociedade, pelo que, muito menos se poderá afirmar a partir destas últimas inscrições que exerceu de facto a gerência.

Em suma, face às inscrições constantes da sociedade certidão do registo comercial referente à matrícula da sociedade executada originária apenas resulta a gerência de direito do Oponente entre 11/07/1984 a 23/06/1993, mas tão-somente com base nessas inscrições nada se poderá afirmar relativamente à sua gerência de facto.

Portanto, cabia ao órgão de execução fiscal reunir provas suficientes do exercício de facto da gerência do Oponente para que se pudesse proceder à sua responsabilização subsidiária, pois ao contrário do que parece entender a Recorrente Fazenda Pública, não existe qualquer presunção de gerência de facto quando se é gerente de direito, cabendo o ónus da prova dessa gerência de facto ao órgão de execução fiscal.

Sucede que, analisado o despacho de reversão e toda tramitação no processo de execução fiscal subjacente a esse despacho, do mesmo não consta qualquer indício da gerência de facto do Oponente, nada, nem documentos, nem informações, nem declarações.

Por outro lado, in casu, também não releva o valor da quota que o Oponente detém, com parece entender a Recorrente Fazenda Pública, pois não está em causa a qualidade de sócio, mas de gerente, e ainda que seja um sócio detentor do capital social, tal facto, de per se, nada nos diz acerca da gerência efectiva. Por outras palavras, não se nega que em determinadas circunstâncias (que não as dos autos) poderá ter relevância o valor da quota detida, apenas em conjugação com outros factos, ou seja, poderá relevar num conjunto de factos que apontem no mesmo sentido, mas não no caso dos autos de forma isolada.

Por fim, também não vemos a relevância, no caso concreto, para a prova que cumpria fazer pelo órgão de execução fiscal, o facto de vários dos sócios serem familiares, aliás, em teoria também se poderia afirmar o contrário, ou seja, porque são familiares a gerência era apenas de um por os outros confiarem na gerência de um familiar, por isso, como se pode é manifestamente irrelevante o alegado na conclusão k), 1.ª parte.

Ademais, é manifestamente errada a afirmação da Recorrente Fazenda Pública exarada na conclusão K) de que a gerência de direito faz presumir a gerência de facto, como supra já evidenciamos a propósito da prova que competia ao órgão de execução fiscal fazer.

Com efeito, e no que diz respeito às regras do ónus da prova importa ter presente que o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão do Pleno do CT do STA de 28/02/2007, proc. n.º 1132/06 (reiterado posteriormente pelo o acórdão do Pleno do CT do STA de 21/11/2012, proc. n.º 0474/12) considerou que competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, «deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência».

Entendeu-se que no que respeita ao exercício das funções de gerência, «sendo possível ao julgador extrair, do conjunto dos factos provados, esse efectivo exercício, tal só pode resultar da convicção formada a partir do exame crítico das provas, que não da aplicação mecânica de uma inexistente presunção legal».

Com este acórdão, fica assim sem margens para dúvidas, afastado o entendimento segundo o qual, uma vez verificada a gerência nominal ou de direito, se presume a gerência de facto ou efectiva.

Em suma, não se verificam os vícios que a Recorrente Fazenda Pública imputa à sentença recorrida, improcedendo todas as conclusões, e nessa medida, o recurso não merece provimento.


III. DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas pela Recorrente.

D.n.

Lisboa, 9 de Junho de 2016.


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Cristina Flora

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Cremilde Abreu Miranda

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Joaquim Condesso