Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:3009/04.1BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:10/22/2020
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:NULIDADE DA SENTENÇA
CONTRADIÇÃO REAL ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO
ERRO IMPUTÁVEL AOS SERVIÇOS
JUROS INDEMNIZATÓRIOS
INDEMNIZAÇÃO POR PRESTAÇÃO INDEVIDA DE GARANTIA
CADUCIDADE
MÉTODOS INDIRETOS
Sumário:
I. Verifica-se contradição real entre os fundamentos e a decisão proferida quando o discurso argumentativo constante da sentença recorrida conduzir a uma decisão distinta da que foi proferida.

II. O conceito de “erro imputável aos serviços”, quer para efeitos do art.º 43.º, n.º 1, quer para efeitos do art.º 53.º, n.º 2, ambos da LGT, é entendido como o “erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável à Administração Tributária”, não se verificando, designadamente, quando o ato de liquidação for anulado em consequência da procedência de vício de forma ou com base em caducidade do direito à liquidação, em virtude de a sua notificação ter sido efetivada depois de ultrapassado o prazo do respetivo direito.

III. Aplicando-se o prazo de caducidade do direito à liquidação previsto no art.º 33.º do CPT, no caso do IVA, tal prazo é contado a partir do facto tributário e não a partir do termo do ano da sua ocorrência, porquanto estamos perante um imposto de obrigação única.

IV. No caso de aplicação de métodos indiretos de determinação da matéria coletável, cabe ao administrado alegar e demonstrar o excesso na quantificação, não sendo suficiente uma alegação genérica referindo a desadequação do método utilizado pela AT.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 30.07.2019, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a impugnação primitivamente apresentada por D....., Lda, sociedade que veio a ser extinta, sucedendo na sua posição processual os seus sócios J..... e M..... (doravante Recorridos ou Impugnantes), impugnação que teve por objeto o indeferimento do recurso hierárquico relativo ao indeferimento da reclamação graciosa que, por seu turno, versou sobre a liquidação adicional de imposto sobre o valor acrescentado (IVA), atinente ao ano de 1995.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

“A) No segmento decisório da sentença, verifica-se que o Tribunal recorrido considerou, à exceção da caducidade, que a impugnação judicial não poderia proceder, no que respeita à invocada preterição de formalidades legais, porquanto considerou não estar a liquidação de IVA de 1995 inquinada de qualquer vício, sem que, para tanto, especificasse os respetivos períodos;

B) Não discorre, a Recorrente, Fazenda Pública, atendendo aos factos assentes, bem como a argumentação expendida pelo Tribunal a quo, da razão pela qual, veio a final, entender, na sua decisão que “(…) quanto ao IVA referente a dezembro de 1995, a liquidação vai ser anulada com fundamento em preterição de formalidade legal, ou seja, com base em vício de natureza formal, pelo que nesta parte a Impugnante não tem aos juros indemnizatórios e, também, como a garantia não foi mantida por um prazo superior a três anos, não tem direito a ser indemnizada pela prestação de garantia indevida, na proporção respetiva.”;

C) Não obstante as doutas e expensas considerações que o Tribunal recorrido efetua quanto às correções realizadas em sede inspetiva e que originaram a liquidação impugnada, não se vislumbra qualquer razão, nem se percebe qual o itinerário cognoscitivo e valorativo que presidiu à decisão de anular a liquidação de IVA referente ao mês de dezembro de 1995;

D) Nos termos do nº 1 do art. 125.º do CPPT e da al. c) do art. 615º do CPC, a sentença proferida será nula, por vício de oposição entre os fundamentos e a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;

E) Por outro lado, ainda que se considere que a liquidação de IVA, com referência aos meses de janeiro a novembro de 1995, seja de anular por se verificar a caducidade, deveria o Tribunal recorrido julgar a impugnação parcialmente improcedente e manter, nessa sequência, no ordenamento jurídico a liquidação de IVA relativa ao mês de dezembro daquele ano, por não padecer de qualquer vício formal ou outro;

F) Por conseguinte, deverá ser considerada a nulidade da sentença recorrida, no que se refere à decisão de anulação da liquidação de IVA do mês de dezembro de 1995, nula por vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos do art. 125º do CPPT e al. c) do n.º 1 do art. 615º do CPC;

G) A sentença recorrida, padece, ainda, de erro de julgamento de facto e de direito, violando as normas ínsitas nos arts. 88º do CIVA, art. 33º do CPT, à data dos factos anteriores, bem como dos arts. 43º e n.º 2 do art.53º da LGT;

H) Com efeito, na decisão ora recorrida, vem o Tribunal a quo determinar a anulação da liquidação de IVA na parte referente aos meses de janeiro a novembro de 1995, por entender que as mesmas foram “notificadas já depois de completado o prazo de caducidade do direito à liquidação”, bem como, nessa sequência, condena a Recorrente, Fazenda Púbica, no pagamento de juros indemnizatórios e de indemnização por prestação de garantia indevida por considerar existir erro imputável aos serviços;

I) A liquidação e respetiva notificação, no que respeita ao IVA devido com referência aos meses de janeiro a novembro de 1995 não padece de vício de caducidade;

J) À data dos factos, estatuía o disposto no art.º 88.º do CIVA que “Só poderá ser liquidado imposto nos cinco anos civis seguintes àquele em que se verificou a sua exigibilidade”;

K) Apenas com a entrada em vigor do Dec. Lei n.º 472/99 de 8/11, foi alterado o disposto no art. 88º do CIVA, passando a prescrever o n.º 1 que “Só poderá ser liquidado imposto nos prazos termos previstos nos artigos 45º da Lei Geral Tributária”, prescrevendo o n.º 2 do mesmo artigo e diploma que “Os prazos referidos no número anterior contam-se a partir da data em que o imposto se tornou exigível”;

L) Decorre da fundamentação apresentada que apenas com a entrada em vigor do Dec. Lei 472/99 de 8/11, é que a exigibilidade do imposto para efeitos de contagem do prazo de caducidade, se passou a contar a partir do facto tributário, como um imposto de obrigação única, até à introdução da Lei n.º 32-B/2002 de 30 de Dezembro, resultando de forma inequívoca que até à revogação do Art.º 88.º do CIVA pelo antedito diploma, o início do prazo de caducidade se contava a partir da data em que o imposto se tornou exigível, ou seja, a partir do termo do ano em que o facto tributário ocorreu;

M) O Tribunal a quo considerou como facto assente a notificação da liquidação em 14/12/2000 (alíneas FF) a II) do probatório);

N) Nos termos do art. 88º do CIVA, na redação em vigor, à data dos factos, a Recorrente, Fazenda Pública, teria de emitir e notificar o sujeito passivo no prazo de “5 anos civis seguintes àquele em que se verificou a sua exigibilidade”, ou seja, até 31/12/2000;

O) Andou mal o Tribunal a quo ao declarar a caducidade da liquidação de IVA na parte referente aos meses de janeiro a novembro de 1995, incorrendo em erro de julgamento da matéria de facto, violando, nessa sequência, os preceitos legais estatuídos no art.º 33.º do CPT e art. 88.º do CIVA, à data dos factos em vigor;

P) Não obstante, sem prescindir, ainda que se entenda provada a caducidade da liquidação de IVA do exercício de 1995, com referência aos meses de janeiro a novembro desse ano, o que só por mero raciocínio se admite, não se poderá aceitar a decisão proferida pelo Tribunal a quo ao condenar a Recorrente, Fazenda Pública, no pagamento quer de juros indemnizatórios, quer de indemnização por garantia indevida;

Q) A declaração de caducidade não implica a existência de um erro sobre os pressupostos de facto ou de direito de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, não implicando, na realidade, qualquer juízo sobre a validade da relação tributária subjacente;

R) Do facto da notificação não ter sido validamente efetuada dentro do prazo que a lei fixa para o efeito retira-se, apenas, como consequência a perda do direito de liquidar o imposto;

S) Constitui jurisprudência consolidada dos nossos Tribunais Superiores que quando o ato de liquidação impugnado é anulado apenas por vício de forma, não há suporte, nos termos do art. 43.º da LGT, para o pagamento de juros indemnizatórios;

T) Mal andou o Tribunal a quo, ao condenar a Recorrente, Fazenda Pública, no pagamento de juros indemnizatórios por considerar a verificação da caducidade do direito à liquidação um erro imputável aos serviços, apresentando-se, a mesma, ilegal por desconformidade com o art. 43º da LGT;

U) E, pelas mesmas razões, o mesmo se diga quanto à condenação da Recorrente, Fazenda Pública, no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida;

V) Não existindo qualquer erro imputável aos serviços, não tem, igualmente, direito os Impugnantes, aqui Recorridos, ao pagamento de qualquer indemnização por prestação de garantia indevida;

W) Violou, assim, ainda, o Tribunal a quo o disposto no n.º 2 do art. 53º da LGT, mostrando-se a sentença recorrida, também por esta via, ilegal”.

Os Recorridos apresentaram contra-alegações, nas quais referem, em síntese, que não foram cumpridos os requisitos previstos no art.º 640.º do CPC e, no mais, que a sentença recorrida não padece de qualquer erro.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT) vem o processo à conferência.

São as seguintes as questões a decidir:

Questão prévia suscitada pelos Recorridos:
a) O recurso deve ser rejeitado, por não terem sido cumpridos os requisitos exigidos pelo art.º 640.º do CPC?

Questões suscitadas pela Recorrente:
b) A sentença recorrida padece de nulidade, por contradição entre os fundamentos e a decisão e por obscuridade e ininteligibilidade?
c) Verifica-se erro de julgamento, no tocante à caducidade do direito à liquidação?
d) Mantendo-se a decisão quanto à caducidade do direito à liquidação, verifica-se erro de julgamento, no que respeita ao direito a juros indemnizatórios e indemnização por prestação indevida de garantia?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“A) Em cumprimento da ordem de serviço número ....., de 06/11/96, COD PAFT 22101, critério de seleção FTC e para cumprimento do despacho de 0310/96 do Chefe de Serviço da IV Divisão, os Serviços de Inspeção Tributária (SIT) procederam a ação inspetiva à atividade da Impugnante relativamente ao exercício de 1994 (conforme resulta de fls. 28).

B) A Impugnante tem por objeto social: Comércio por grosso de artefactos de ourivesaria, CAE: 051700 (conforme resulta de fls. 29).

C) Em sede de IRC, a Impugnante encontra-se enquadrado no Regime Geral de Tributação e em sede de IVA encontra-se enquadrada no regime normal de periodicidade mensal (conforme resulta de fls. 29).

D) Em se de IVA os SIT procederam à análise documental da Impugnante:

9.2.1. – Em sede de I.V.A.

Em relação ao IVA, a atividade desenvolvida pelo SP, enquadra-se no regime geral com periodicidade trimestral no exercício em análise, o volume das operações efetuadas, relevadas na contabilidade encontram-se assim distribuídas:

9.2.1.1.- IVA dedutível

No período relativo ao exercício em análise, procedemos ao controle e análise dos valores movimentados nas diferentes rubricas do IVA DEDUTÍVEL, a saber:

9.2.1.1.1. Imobilizado

Procedemos ao controle dos valores movimentados: na conta 24322212-IVA Imobilizado e não detetamos erros ou anomalias.

9.2.1.1.2. Existências

Procedemos ao controle de todos os valores movimentados na conta 243.2.1.2. -IVA EXISTÊNCIAS e não detetamos erros ou anomalias.

Foram conferidas todas as faturas movimentadas (com IVA dedutível à taxa normal e à taxa agravada), no período em análise.

9.2.1.1.3.- Outros bens e serviços

Procedemos ao controle dos valores movimentados na conta 243.23.1-IVA outros bens e Serviços e não detetamos erros ou anomalias.

9.2.1.2.- IVA liquidado

No período em análise, procedemos ao controle dos valores movimentados na conta 243.31.2-IVA LIQUIDADO e não detetamos erros ou anomalias.

As faturas são emitidas manualmente e constam numeradas sequencialmente, por ordem crescente de números e datas, obedecendo aos requisitos do art.° 35.º do CIVA.

No período em análise foram emitidas 562 faturas, relativas a operações de transmissão de bens, sujeitas à taxa normal (16%) e à taxa agravada (30%);

- Número da 1ª fatura: 2 907. datada de 06/01/94

- Número da última fatura: 3 469, datada de 27/12/94.»

(…)

10.- CONCLUSÕES

Face aos pontos anteriores, concluímos que o sujeito passivo vem cumprindo as suas obrigações fiscais, quer em sede de IVA, quer em sede de IRC.

(Conforme resulta de fls. 29 a 34).

E) A coberto da ordem de serviço n° ....., de 9/6/98, PAFT ....., foi efetuada ação de inspeção à Impugnante, com inicio em 26/02/1999 e conclusão em 22/10/1999 (conforme resulta de fls. 49 do PAT em apenso).

F) A ordem de serviço teve por base uma proposta de fiscalização resultante da análise interna efetuada em 27 de março de 1998, onde se verificou, a diferença entre a atividade que o sujeito passivo se encontra coletado e aquela que o mesma pratica e margens de comercialização bastante baixas para esta atividade (conforme resulta de fls. 50 do PAT em apenso).

G) A ação inspetiva foi de âmbito geral, com incidência temporal no exercício de 1995 (conforme resulta de fls. 50 do PAT em apenso).

H) A Impugnante:

a) Comercializa ouro e prata, representando no entanto o ouro cerca de 98% das compras efetuadas neste exercício. Assim, a fiscalização incidiu fundamentalmente na comercialização dos artefactos em ouro dado o peso dos mesmos no conjunto das compras efetuadas pelo sujeito passivo.

b) No ano de 1997 e seguintes, comercializa artefactos em ouro provenientes não só das compras de produtos acabados, como também resultantes da transformação de barras de ouro que adquire.

c) Apesar do Código de Atividade Económica (CAE) em que o sujeito passivo se enquadra, ou seja, 51.700 – “Comércio por Grosso, N.E.”, a equipa de fiscalização não encontrou, outro código que se identificasse mais, com a atividade exercida.

(Conforme resulta de fls. 50 do PAT em apenso).

I) III - MOTIVOS E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS

1 - Análise comparativa do Balanço dos anos de 1994, 1995 e 1996

COMPARAÇÃO DE BALANÇOS SUCESSIVOS - 1994, 1995 E 1996

Da análise aos Balanços, verifica-se:

a) O peso das existências no conjunto do total do ativo, com maior evidência no ano de 1994, em que representa cerca de 86% do total do ativo;

b) Um aumento bastante significativo das dívidas de clientes, verificando-se no ano de 1996 que representam cerca de 44% do total do ativo, enquanto no ano de 1994 representavam cerca de 0,5%.

c) Um aumento do imobilizado no ano de 1995 em relação ao ano de 1994, representando esse aumento cerca de 6 vezes mais o imobilizado de 1994;

d) Uma significativa variação das disponibilidades em caixa, do ano de 1995 em relação ao ano de 1996, verificando-se que no ano de 1995 representava cerca de 3,8% do valor do total do ativo, sendo que em 1996 representa cerca de 0,11%.

e) O peso dos fornecedores e outros credores em relação ao total do capital próprio e passivo, representando variações entre cerca de 44% (Ano de 1995 e 1996) e cerca de 52% (Ano de 1994);

f) O aumento em Esc. 13.000.000S00, no ano de 1995 dos acionistas;

g) Um aumento em cerca de 36%, do ativo no ano 1995 em relação ao ano de 1994.

2 - Mapa Comparativo das Vendas e Custo das Vendas - 1994, 1995 e 1996

MAPA COMPARATIVO DAS VENDAS E CUSTO DAS VENDAS

Assim, a margem bruta de vendas vem a decrescer, sendo em 1994 de 10%, e em 1996 de 9,3%, apesar das variações serem pouco significativas.

Verifica-se que o prazo da rotação de stocks, decresce igualmente, diminuindo em cerca de 60 dias de 1996 em relação a 1994.

(Conforme resulta de fls. 51 a 53 do PAT em apenso).

K) 3 - Análise ao ano de 1995

Tendo em atenção que o objetivo desta ação é a fiscalização do ano de 1995, vamos passar, então à sua análise.

3.1 - Notificação

Em 10 de março de 1999, foi notificado o Sr. J....., na qualidade de sócio gerente da firma em análise, para no dia 23/03/99, apresentar todos os elementos de escrita relativos ao exercício de 1995, nomeadamente livros selados e extratos bancários. (Ver fls. 103, Anexo 1).

No entanto, apesar de notificado, o sujeito passivo não apresentou os extratos bancários referindo que não dispõe dos mesmos. (Ver fls. 102, Anexo 1)

3.2 - Caixa

Verifica-se que a contabilidade reflete que praticamente todos os pagamentos e recebimentos, se efetuam por esta rubrica.

De uma análise aos recebimentos de clientes inscritos nesta rubrica, verifica-se a ausência de todos os documentos (Recibos) que suportam os mesmos.

Questionado o sujeito passivo sobre a situação, referiu que não dispõe dos mesmos. (Ver fls. 102, Anexo 1).

3.3 - Clientes

Verifica-se que a fatura n° .....do fornecedor A....., se encontra contabilizada em duplicado na contabilidade do sujeito passivo. (Ver fls. 95 a 97, Anexo 1)

3.4 - Fornecedores

Tendo em atenção a comparação dos valores contabilizados pelo sujeito passivo, com os resultantes da circularização efetuada a alguns dos fornecedores, verificam-se as seguintes situações:

J.....: O saldo de abertura contabilizado pelo fornecedor em 1/1/95 é de Esc. 5.329.233$, tendo o mesmo sido regularizado em 1997; (Ver fls. 58 e 59, Anexo l)

No entanto, o saldo de abertura apresentado pelo sujeito passivo é de Esc. 5.142.812$, não se verificando qualquer regularização; (Ver fls. 60, 61 e 65, Anexo 1)

P.....: O saldo de abertura contabilizado pelo sujeito passivo em 1/1/95 é de Esc. 2.998.629$, enquanto o saldo inicial apresentado pelo fornecedor é de Esc. 397.630$. (Ver fls. 61 e 66, Anexo 1)

O sujeito passivo fez a regularização deste saldo em 31/12/96, (Ver fls. 63 e 77, Anexo 1)

J.....: O saldo apresentado em 31/12/95 é de Esc. 13.599.699$, na contabilidade do sujeito passivo, sendo o saldo apresentado pelo fornecedor de Esc. 0$0, para igual período. (Ver fls. 62 e 72, Anexo 1)

Ora analisando os pagamentos contabilizados em 1996, relativos ao exercício de 1995, verifica-se que não foi efetuado nenhum e que o saldo final neste exercício de 1996 é de Esc. 20.161.968$00, sendo) o do fornecedor de 0$00. (Ver fls. 63, 64, 67 e 68, Anexo 1)

Pelo exposto e tendo em atenção que o sujeito passivo faz o pagamento aos seus fornecedores com um atraso, no máximo de 60 dias (Ver fls. 102, Anexo l), conclui-se que o mesmo não faz o registo na contabilidade dos pagamentos efetuados nas datas respetivas.

M.....: Verifica-se que o sujeito passivo não contabilizou a fatura n° ..... de 13/11/95 de Esc. 286.906$, (Ver fls. 76, Anexo 1), tendo no entanto efetuado o pagamento da mesma. (Ver fls. 75 e 81, Anexo 1)

V.....: O saldo apresentado em 31/12/95 pela contabilidade do sujeito passivo é de Esc. 5.080.071$0, verificando-se que o saldo apresentado pelo fornecedor é de 0$0.

Verifica-se que o sujeito passivo, vem corrigir tal situação mediante documento interno em 1998

(Ver fls. 78 e 79, Anexo 1)

3.5 - Outros Devedores

O saldo apresentado nesta rubrica está relacionado com remunerações, sendo que as mesmas foram pagas pelo sujeito passivo (foram entregues as respetivas declarações de IRS. pelos valores contabilizados pelo sujeito passivo), mas que entretanto esses pagamentos não se encontram refletidos na contabilidade. (Ver fls. 114 a fls. 119. anexo 1)

Refira-se que este saldo foi regularizado no exercício de 1998.

3.6 - Suprimentos

Verificou-se que o sócio gerente efetuou entregas à firma no valor de Esc. 28.000.000S00. sendo que essas entregas foram efetuadas durante o mês de fevereiro, retirando em setembro de 1995. Esc. 15.000.000$00. pelo que o saldo apresentado por esta conta em dezembro de 1995. é de Esc. 13.007.200$00. (Ver fls. 82 e 83, .Anexo 1)

Relativamente aos registos efetuados nesta conta, verifica-se que os suportes contabilísticos são meros documentos internos sem correspondência efetiva quanto a movimentos financeiros reais, dado que não se verificou a existência de cheque, transferência bancária, relacionados com os mesmos, pelo que parece-nos que os movimentos efetuados nesta conta são uma mera operação contabilística, resultante da omissão de proveitos.

3.7 - Análise das Existências

3.7.1 - Inventários de 1994 e 1995 / Faturas compra e venda

Dado o peso das existências no conjunto total do ativo desta firma, foram as mesmas analisadas, tendo em atenção os seguintes procedimentos:

a) Foram solicitados os inventários dos anos de 1994 (Existência inicial de 1995) e de 1995 (Existência Final); (Ver fls. 3 a fls. 31, Anexo 1)

b) Foram solicitadas faturas das compras e vendas efetuadas;

Da análise efetuada àqueles documentos, verificou-se que não era possível apurar a margem bruta de vendas declarada pelo sujeito passivo, dado que:

3.7.1.1 - Inventários de 1994 e 1995

Os inventários apresentados pelo sujeito passivo, além de não permitirem a identificação dos elementos patrimoniais, dado que os mesmos descrevem famílias de artefactos e não descrevem o artefacto individualmente de modo a ser identificado claramente, também não permite saber qual o custo individual de cada bem.

Refira-se que para a determinação do preço de custo deste tipo de bens, é necessário ter em consideração o custo do feitio e o peso do ouro que foi necessário para a transformação do bem.

Ora da análise aos inventários, verifica-se que o sujeito passivo não descrimina o peso do ouro por cada artefacto, considerando o peso total dos artefactos.

Do inventário de 1994, destaca-se ainda o facto de não ter sido referida além do peso, a quantidade de artefactos existentes.

3.7.1.2 - Faturas de Compras e Vendas

Verifica-se na contabilidade do sujeito passivo quatro tipos de faturação diferentes, conforme quadro abaixo:

Verifica-se por outro lado a existência de faturas que não mencionam nem as quantidades nem o respetivo preço de venda unitário, pelo que nestes casos a equipa de fiscalização presumiu que se tratasse de uma unidade. (Ver fls. 126, Anexo 2)

Existem ainda faturas que não mencionam a espécie de metal precioso tendo nestes os casos o sócio gerente referido que se tratava de artefactos em prata. (Ver fls. 90, Anexo 1)

Refira-se também o facto da equipa de fiscalização ter alertado em julho de 1999 o sujeito passivo, para a forma como este estava a processar as faturas de vendas, bem como para a forma como este aceitava as faturas de compras, dado que as mesmas não permitem identificar, o preço de venda/custo de cada artefacto e o próprio artefacto dado que este não se encontra devidamente referenciado.

Ora, apesar do sujeito passivo ter sido alertado daquela situação, o mesmo continua a ter o mesmo procedimento (Ver fls. 122, Anexo 2), sendo que a justificação que o mesmo deu em termo de declarações, é que no caso das faturas de compras, os fornecedores recusaram passar as faturas devidamente processadas (Ver fls. 99 e 100, Anexo 1). No caso das faturas de venda o mesmo refere que o mercado funciona daquela maneira, sendo que iria efetuar um estudo para alterar o sistema.

Ainda a propósito da forma como são processadas as faturas, chama-se a atenção para um oficio conjunto da Imprensa Nacional da Moeda e da Inspeção Geral das Atividades Económicas dirigido à Associação dos comerciantes de Ourivesaria e Relojoaria do Sul, em que o assunto é “Cumprimento da regulamentação legal da indústria e comércio de artefactos de metais preciosos”, onde se destaca o ponto 4 alínea 8 (ver fls. 106, Anexo l)na qual faz referência à emissão de faturas, referindo que na mesma deverá constar “a designação dos artigos, espécie de metal ou metais preciosos, peso e valor da transação...”.

3.7.2 - Contagem física das existências

Tendo em atenção o que foi referido anteriormente, considerou a equipa de fiscalização, que era necessário proceder-se à contagem física das existências à data da presença desta equipa nas instalações do sujeito passivo. (Ver fls. 6 a fls. 21, Anexo 2)

Assim, foi solicitado ao sujeito passivo que no dia 16 de julho apresentasse todos os artefactos que constituíam a sua existência naquela data, para se proceder à contagem.

Na altura da contagem, verificou-se que não era possível contar todos os artefactos naquele dia, pelo que se optou por fazer uma contagem por famílias de artefactos em cada um dos dias.

Assim, no dia 16 de julho, foram contados os anéis, alianças, medalhas, cruzes, berloques, alfinetes, botões de punho, molas gravata, fechos de colar, no dia 21 de julho procedeu-se à contagem dos pares de brincos, das pulseiras, sendo que no dia 22 de julho efetuou-se a contagem dos fios e colares.

No dia 30 de julho, foi efetuada a contagem do ouro fino e do cascalho que o sujeito passivo possuía nesta data.

As contagens tiveram sempre a presença do sujeito passivo, que colaborou na elaboração da mesma.

3.7.3 - Conclusões obtidas pela equipa de fiscalização em relação às existências

Após a contagem física das existências, procedeu esta equipa ao levantamento das compras de Mercadorias e transformação de Matérias Primas / Cascalho (ver fls. 41 a fls. 72, Anexo 2) e vendas de mercadorias (ver fls. 74 a fls. 103, Anexo 2), de compras e guias de entrega de ouro fino e cascalho (Ver fls. 105 e fls. 106, Anexo 2), efetuadas pelo sujeito passivo no período entre janeiro e julho de 1999.

Após o levantamento daqueles elementos, os artefactos foram separados, tendo em atenção o tipo de faturação.

Após esta separação e tendo em conta as datas em que foram realizadas as contagens físicas, procedeu-se à conversão das mercadorias a peso em quantidades. (Ver fls. 114, Anexo 2)

Refira-se que esta conversão foi feita tendo em conta o peso médio ponderado dos artefactos existentes às referidas datas.

Após estes procedimentos e considerando o inventário final de 1998 (inicial de 1999) (Ver fls. 23 a fls. 39, Anexo 2) procedeu-se à confrontação dos resultados obtidos, com os resultados apurados nas contagens. (Ver fls. 108 a fls. 113, Anexo 2)

Procedeu-se também à confrontação dos resultados apurados com o ouro fino e cascalho, em relação às contagens à data de 30 de julho.

Da análise aos resultados obtidos verificaram-se divergências bastante significativas (Ver fls. 118 a fls. 120, Anexo 2), levando a equipa de fiscalização a concluir que os inventários apresentados pelo sujeito não merecem credibilidade.

Dado que o inventário apresentado no ano de 1995, está elaborado da mesma forma em que se encontra o inventário de 1998, ou seja apresenta carência de elementos, considera-se que o inventário de 1995, também não apresenta credibilidade.

3.8 - Omissão de compras

Verifica-se que o sujeito passivo não contabilizou a fatura n° ..... .....

 de 13/11/95 do fornecedor ....., apesar de ter efetuado o pagamento da mesma, (ver fls. 75, 76 e 81, Anexo 1)

3.9 - Margem Bruta de Vendas

Verifica-se que a mesma neste exercício é de 9,5%. (Ver fls. 113, Anexo 1).

Ora, a margem bruta de vendas média correspondente ao código da atividade económica (CAE) 51700 é de 25,07 em Lisboa, verificando-se assim uma diferença substancial entre a margem declarada pelo sujeito passivo e a margem bruta de vendas média, para este código de atividade. (Ver fls. 112, Anexo 1).

Por outro lado, tendo presente outros códigos de atividade económica relacionados com a comercialização do mesmo tipo de artefactos, verifica-se, que a margem bruta de vendas média para ) Lisboa, se encontra acima dos 25%, como se pode analisar pelo quadro abaixo: (Ver fls. 108 a 111, Anexo 1)

Verifica-se ainda que para o CAE 51 700, relacionado com sujeitos passivos que praticam a mesma atividade que o sujeito passivo em análise, a margem bruta de vendas declarada para este exercício de 1995 é superior a 25%, tendo o sujeito passivo declarado apenas 9,5%. (Refira-se que estes elementos se encontram no processo, não fazendo parte dos a este relatório, nos termos do artigo 64° n° 1 da Lei Geral Tributária e artigo 22° do RCPIT, ou seja o dever de sigilo),

3.10 - Amostragens efetuadas a ourivesarias situadas no distrito de Lisboa

Foram efetuadas diversas amostragens a ourivesarias, de forma aleatória, de modo a verificar, não só, se o custo de aquisição dos artefactos, pelas ourivesarias a outros fornecedores, se aproxima dos preços praticados pelo sujeito passivo, como também para se saber qual o preço médio de cada grama de artefactos em ouro, no mercado.

Refira-se que estas amostragens se encontram no processo, não fazendo parte dos anexos a este relatório, nos termos do artigo 64° n° 1 da Lei Geral Tributária e artigo 22° do RCPIT, ou seja o dever de sigilo.

Da análise às amostragens, conforme quadro abaixo, verifica-se que:

- o preço por cada grama de um determinado artefacto em ouro, é em media, superior a Esc. 2.700$;

(1) O Custo médio de cada grama de artefactos em ouro, refere-se ao ouro e ao feitio, dado que o mesmo é determinado tendo em conta o valor do custo do ouro e feitio dos artefactos.

Tendo em atenção faturas de venda do sujeito passivo, conforme quadro abaixo, é possível verificar que o mesmo pratica preços abaixo dos Esc. 2 000$00, o preço médio de cada grama de artefactos em ouro:

(1) O Custo médio de cada grama de artefactos em ouro, refere-se ao ouro e ao feitio, dado que o mesmo é determinado tendo em conta o valor do custo do ouro e feitio dos artefactos.

3.11 - Amostragens existentes nos serviços de prevenção e de inspeção tributária

Na sequência da análise a algumas das amostragens efetuadas por estes serviços ao mesmo tipo de atividade, verifica-se conforme quadro abaixo, que o custo médio de cada grama de artefactos em ouro é superior aos valores apurados na amostragem efetuada pela equipa de fiscalização.

1) O Custo médio de cada grama de artefactos em ouro, refere-se ao ouro e ao feitio, dado que o mesmo é determinado tendo em conta o valor do custo do ouro e feitio dos artefactos.

Refira-se que estas amostragens se encontram no processo, não fazendo parte dos anexos a este relatório, nos termos do artigo 64° n° 1, da Lei Geral Tributária e artigo 22° do RCPIT, ou seja o dever de sigilo.

3.12 - Conclusão

Considerando que,

1 - O sujeito passivo não apresentou os extratos bancários, apesar de ter sido notificado para os apresentar, pelo que, não foi possível confirmar os saldos mencionados nas respetivas contas de bancos;

2 - No que se refere à rubrica “Caixa”, verifica-se que não existem os respetivos recibos das faturas emitidas aos clientes, pelo que não foi possível confirmar se os recebimentos correspondiam às datas em que os mesmos foram registados na contabilidade;

3 - Contabilização em duplicado da fatura n° ..... no valor de Esc. 1.057.347$, bem como o pagamento da fatura n° ..... de Esc. 286.906$, que não se encontra contabilizada;

4 - Em relação aos fornecedores, verifica-se:

- J....., Esc. 13.599.699$00, este saldo é relativo a este exercício, sendo que o mesmo não está refletido na contabilidade como pago.

No entanto pela análise do extrato do fornecedor e pelo facto do sujeito passivo efetuar os pagamentos aos seus fornecedores no prazo máximo de 60 dias, leva-nos à conclusão que o mesmo se encontra pago.

- V....., Esc. 5.080.071$0, verifica-se a correção deste saldo em 1998, referente a este exercício de 1995 reconhecendo assim o sujeito passivo que este valor foi pago em 1995. Por outro lado o saldo de conta corrente apresentado pelo fornecedor para aquele período é de 0$0;

5 - Não está refletido na contabilidade o pagamento de remunerações no valor de Esc. 1.040.225$, apesar das mesmas terem sido reconhecidos, como recebidas pelo sócio gerente, mediante a entrega da respetiva declaração de IRS, mencionando aquelas importâncias;

6 - Não ficaram devidamente esclarecidos as entregas de suprimentos, verificada em fevereiro, no valor de Esc. 28.000.000$00, verificando-se que essas entregas aproximam-se dos valores das receitas declaradas pelo sujeito passivo em janeiro (Esc. 15.054.191$0) e fevereiro (Esc. 16.537.204$), e visam suprir saldos credores de caixa;

7 - Pelo exposto e tendo em atenção que a caixa não reflete os pagamentos de Esc. 19.719.995$0, o valor dos suprimentos parece-nos indiciar omissão de proveitos, o que conjugando estes dados indicia uma omissão relativamente elevada de receitas;

8 - Os inventários apresentados pelo sujeito passivo, além de não permitirem a identificação dos elementos patrimoniais, também não permitem saber qual o custo individual de cada bem;

Refira-se que no inventário final de 1994, além do peso também não foi referido a quantidade dos artefactos existentes;

9 - Na comparação entre as existências de mercadorias sem inclusão do cascalho apuradas na contagem efetuada em julho de 1999 e o inventário de 1998 apresentado pelo sujeito apuraram-se divergências bastantes significativas, levando a equipa de fiscalização a concluir que os inventários apresentados pelo sujeito passivo não mereciam credibilidade;

10 - Na comparação entre o cascalho e ouro fino apurado na contagem em julho de 1999 e o inventário de 1998, verificam-se saídas de existências de ouro fino, sem que a mesma efetivamente exista.

Refira-se que para apuramento dos valores relacionados com o ouro fino e o cascalho, não houve lugar a presunções.

A diferença apurada na contagem em relação ao cascalho e ouro fino é de:

11 - A margem de lucro sobre as vendas apresentada pelo sujeito passivo, cerca de 9,5%, é bastante baixa comparada com a margem de lucro apresentada neste setor de atividade.

Refira-se, que este valor apresentado para a margem bruta de vendas foi dado não só pelos indicadores existentes nos serviços, bem como indicadores declarados por outros sujeitos passivos que exercem a mesma atividade;

12 - Verificou-se ainda que o preço de venda praticado pelo sujeito passivo é inferior ao preço de venda no mercado, tendo a equipa de fiscalização verificado através de amostragens efetuadas, que o preço médio de venda de cada grama de artefactos em ouro, é superior a Esc. 2.700$.

Por outro lado, este valor é confirmado pelas amostragens já existentes no serviço.

Após o apuramento do preço de venda, foi calculado o preço de custo de Esc. 2.025$ por cada grama de artefactos em ouro, verificando-se que este não se afasta do preço de compra apresentado pelo sujeito passivo na faturação tipo 1 e Tipo 2, sendo no entanto este preço bastante diferente do praticado na faturação Tipo 3. Pelo que as correções efetuadas às compras referem-se essencialmente para este último tipo de faturação.

Assim, tendo em atenção os motivos apresentados, a contabilidade não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido, nos termos da parte final da alínea d) do n° 1 do artigo 51.º do Código do I.R.C. e artigos 87° e 88° da Lei Geral Tributária.

(Conforme resulta de fls. 53 a 64 do PAT em apenso ).

W) IV - CRITÉRIOS E CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS

1 - INTRODUÇÃO

A determinação do lucro tributável foi efetuada nos termos do artigo 52° do CIRC, e 90° da Lei Geral Tributária nomeadamente, em elementos que a administração fiscal dispõe sobre as margens médias de lucro sobre as vendas

2 - ARTEFACTOS EM OURO

2.1 - Mercadorias sem inclusão do cascalho

Para determinação do lucro tributável para o exercício de 1995, foram as vendas corrigidas com base em dois pressupostos: - a margem bruta de vendas no mercado é de cerca de 25% e o preço médio de venda de cada grama de artefactos em ouro, cerca de Esc. 2 700S$00.

Refira-se que no termo de declarações (ver fls. 99, Anexo 1), o sujeito passivo refere que tanto a margem bruta de vendas como os preços de venda mantêm-se constantes desde o exercício de 1995 até ao momento (1999), verificando-se o preço de venda no mercado à data de agosto de 1999, se situa nos Esc. 2.700$00, cada grama de artefactos em ouro, o mesmo preço vai ser considerado para o exercício de 1995, para efeitos de correção dos valores das vendas tendo em atenção as declarações do sujeito passivo.

Pelo que, se o peço de venda de cada grama de artefactos em ouro é de 2 700$00, e com uma margem bruta de vendas de 25%, então o preço de custo de cada grama de artefactos em ouro, é de Esc. 2.025$00.

Assim, foram apuradas as quantidades de ouro adquiridas neste exercício, tendo as mesmas sido corrigidas com base no preço de custo de Esc.2 025$00, aplicando-se aos valores apurados a margem de 25%. (Ver fls. 32 a 56, Anexo 1)

Refira-se ainda que de uma análise aos inventários apresentados pelo sujeito passivo o preço de custo por cada grama artefactos em ouro, é de Esc. 2.024$ (Esc. 54.564.444$/26.957,5) para o ano de 1994 e de Esc. 2.000$ (Esc. 59.331.802$/29.657,5) para o ano de 1995.

Ou seja valores bastante aproximados dos valores considerados pela equipa de fiscalização.

Artefactos adquiridos tendo em atenção a faturação Tipo 1 e Tipo 2 - para os artefactos adquiridos nestas condições o peso do ouro é um dado imediato que se retira das faturas, sem necessidade de se presumir o peso dos artefactos adquiridos. Em 1995, adquiriu-se 105 199,83 g, sendo o custo médio por cada grama de artefactos em ouro, de Esc. 2 020$00. (Ver fls. 121, Anexo 1)

Artefactos adquiridos tendo em atenção a faturação tipo 3, neste caso, não existe a discriminação do peso de ouro dos artefactos, sendo que o peso do ouro dos artefactos foi presumido (Ver fls. 120, Anexo 1), tendo em conta o peso médio ponderado das famílias de artefactos. Assim, em 1995, o peso presumido do ouro foi de 17.202,14 g, com o custo unitário médio de cada grama de artefactos em ouro de Esc. 873$00. (Ver fls. 121, Anexo 1)

Artefactos adquiridos tendo em atenção a faturação tipo 4, neste caso o peso do ouro também é um dado imediato, verificando-se a existência de uma única fatura nestas condições, com o peso de 1578,8 gramas e o custo unitário de Esc. 2.022S00. (Ver fls. 121, Anexo 1)

Por outro lado tendo em atenção a fatura omitida pelo sujeito passivo, verifica-se que a mesma menciona o peso de 138,2 gramas e um custo de Esc. 245.219$, pelo que o custo médio de cada grama de artefactos em ouro, é de Esc. 1774$ (Ver fls.76, Anexo 1)

Assim, temos que o peso total do ouro é de:

Peso total = 105.199,83+17.202,14+1.578,8+138,2 = 124.118,97 g

Pelo que o total das compras presumidas é de Esc. 124.118,97 * 2 025$ = 251 340 914$00

2.2 - Cascalho

O total das compras foi de Esc. 427.800$00. (Ver fls. 121, Anexo 1)

Aplicou-se a estes artefactos igualmente a margem de 25%.

3 - ARTEFACTOS EM PRATA

Quanto aos artefactos em prata, as compras ascendem a Esc. 3.791.697$, às quais vai ser aplicada a margem bruta de vendas de 25%. (Ver fls. 121, Anexo 1)

A razão para aplicação desta margem deve-se ao facto da contabilidade não distinguir o tipo de metal precioso, verificando-se assim que a margem bruta de vendas refletida pela contabilidade tanto para o ouro como para a prata ser de 9,5%.

Ora como a equipa de fiscalização efetuou a correção da margem bruta de vendas do ouro tendo em atenção os 25%, então considerou a mesma margem para a prata.

4 - DETERMINAÇÃO DO CUSTO DAS EXISTÊNCIAS VENDIDAS

Foram desprezadas as existências iniciais e finais, dado que:

- O sujeito passivo tem como objetivo a venda das existências o mais rápido possível e não a sua armazenagem; (Ver fls. 100, Anexo 1)

- Os inventários não nos merecem credibilidade como foi referido no ponto 3.7.3 do grupo III deste relatório;

- Da análise às diferenças entre as existências iniciais e finais, as mesmas representam cerca de 1,8% em relação ao total das compras.

Assim, foi considerado que o custo das existências vendidas é igual às compras.

C.E.V.C.= 251.340.914$ + 427.800$ + 3.791.697$ = 255.560.411$0 ) Tendo em atenção a margem bruta de vendas de 25%, foram calculadas as vendas presumidas

Vendas presumidas = Compras / 0,75

Vendas presumidas - 340.747.215$

5 - DETERMINAÇÃO DO LUCRO TRIBUTÁVEL

Apuramento Lucro Tributável:

6 - APURAMENTO DO IVA EM FALTA

Determinação do valor do IVA em falta: (Ver fls. 122, Anexo 1)
(…)

(Conforme resulta de fls. 64 a 68 do RIT).

X) VII - DIREITO DE AUDIÇAO - FUNDAMENTAÇAO

1 - Entrega de Petição

O sujeito passivo entregou em 1999/11/09 uma petição, solicitando a prorrogação do prazo de audição prévia, para o máximo considerado em Lei (15 dias).

Em 1999/11/11, tal solicitação foi aceite.

2 - Análise da fundamentação

Procura o sujeito passivo demonstrar que o relatório de fiscalização não tem consistência a nível técnico-fiscal, é contraditório, não se preocupa com a aplicação da lei e por isso a sua falta-de-credibilidade quanto ao método de tributação e quantificação da matéria tributável.

Ora, não concordamos, tendo em atenção os motivos que o mesmo apresenta para fundamentar esta posição, como veremos adiante.

Refira-se entretanto, que dado algumas imprecisões de linguagem utilizada pela equipa de fiscalização, poderia levar o sujeito passivo a ter algumas dificuldades de interpretação do relatório. Assim, essas imprecisões foram corrigidas neste relatório final.

Assim, e tendo em atenção a referência inicial efetuada pelo sujeito passivo, este além de questionar a equipa de fiscalização sobre determinadas situações do relatório, também rebate ponto por ponto os factos apresentados por esta equipa, os procedimentos de aplicação de métodos indiretos e a quantificação da matéria tributável.

1 - Extratos Bancários

É possível verificar que neste exercício a contabilidade reflete que conta a do B.C.P. (Conta .....), apresenta um saldo de abertura de Esc. 2.350.243$70, neste ano de 1995.

Ora independentemente da contabilidade espelhar que a maior parte dos movimentos se processa por caixa, não invalida que a equipa de fiscalização procure confirmar se o saldo apresentado peio banco é o correto e se os movimentos efetuados na conta de bancos estão refletidos na contabilidade.

Dado que os pagamentos aos fornecedores envolvem importâncias elevadas para serem efetuados em dinheiro.

Por outro lado e dado que é referido pelo sujeito passivo os exercícios de 1997 e 1998, importa referir que no exercício de 1997 não se encontra na contabilidade o documento n° .....no valor de Esc. 11.452.034$4 que permite a conciliação do saldo bancário com o saldo contabilístico.

Por outro lado verifica-se também nestes exercícios que alguns dos depósitos bancários são justificados por meras fitas de máquina.

2 - Caixa

Quanto aos recibos das vendas efetuadas pelo sujeito passivo, verificou-se que os mesmos não existiam na contabilidade, pelo que foi questionado o sujeito passivo. Quanto ao facto do mesmo ter sido questionado no último dia da presença da equipa de fiscalização nas suas instalações, deve-se ao facto da equipa ter reunido um conjunto de questões ao longo do período da fiscalização com o objetivo de as lavrar a termo, procurando evitar interromper constantemente o sócio gerente, de modo a que o mesmo pudesse tratar da comercialização das mercadorias.

3 - Saldo das contas correntes de fornecedores

Procura o sujeito passivo justificar as divergências apresentadas nas contas correntes, referindo que:

a) No ramo de atividade as relações entre clientes e fornecedores são muito fortes;

b) Os pagamentos são primeiro efetuados e só mais tarde é enviado o documento de quitação.

c) Em qualquer empresa é muito difícil os seus saldos de conta corrente coincidirem com as existentes nos fornecedores;

d) Esta situação não tem qualquer relevância nos resultados da empresa:

e) A única situação que seria grave era se a faturação de compras não coincidisse com as vendas nos seus fornecedores.

Ora da análise às várias justificações dadas, verifica-se que nenhuma delas explica as divergências apresentadas.

A equipa de fiscalização teve o cuidado de verificar a evolução do saldo da conta corrente dos fornecedores ao longo dos exercícios de 1995 a 1998, verificando-se que no caso do saldo apresentado pelo fornecedor J.....em 31 de dezembro de 1995 no valor de Esc. 13.599.699$, o mesmo transita entre vários exercícios e encontra-se ainda por regularizar no ano de 1998.

Quanto ao saldo do Fornecedor V..... no valor de Esc. 5.080.071$ (Tratam-se de Vendas a dinheiro), o mesmo só veio a ser corrigido em 1998, mediante documento interno, sendo este saldo relativo a 1995.

Ora conjugando os casos referidos, com o facto do sócio gerente ter declarado que o prazo máximo pelo qual efetua o pagamento aos seus fornecedores é de 60 dias, então a anterior alínea d) não faz sentido dado que, o saldo de caixa em 31 de dezembro de 1995 é de Esc. 3.933.918540, e dado que os valores em causa são superiores aos valores em caixa, então parece-nos que estamos perante uma omissão de receitas, tendo efetivamente relevância nos resultados da empresa.

4 - Outros Devedores

Da análise a esta questão importa esclarecer que:

- O sujeito passivo entregou a respetiva declaração Modelo 3 durante a execução da ação de fiscalização, pelos valores constantes na contabilidade.

- Refira-se que o mesmo já tinha efetuado a entrega da declaração de IRS por valores inferiores aos valores declarados pela contabilidade.

- Verifica-se que em 31/12/95 a empresa deve aos sócios Esc. 6.523.733$

- Verifica-se que nos exercícios de 1996 e 1997 a empresa não efetuou qualquer pagamento aos sócios, ou seja os sócios não receberam um único escudo da empresa;

Ora conjugando estes elementos com o facto dos sócios terem como único rendimento os da empresa D...... Ld.ª. custa-nos a acreditar que o sujeito passivo não tivesse efetuado qualquer pagamento.

Retira-se ainda que, pelo facto do sócio gerente ter entregue voluntariamente as respetivas declarações de IRS referente aqueles exercícios, é porque o mesmo assumiu que recebeu as importâncias.

Quanto ao facto das remunerações estarem contabilizadas como custo do exercício, a equipa de fiscalização não põe essa situação em causa.

Por outro lado, não nos parece que a empresa tenha falta de fundos dado que neste exercício fez a aquisição de um automóvel novo da marca AUDI A4, no valor de Esc. 6.993.237$, e no ano de 1996 fez a aquisição de outro automóvel novo da marca HONDA CIVIC, no valor de Esc. 3.794.200$: ou seja em dois anos gastou cerca de Esc. 10.800.000$00, em automóveis novos.

5 – Suprimentos

Quanto aos suprimentos, o sócio gerente efetuou entregas de Esc.28.000.000$00. dado que existia uma saldo de abertura de Esc. 7.200$, tendo retirado Esc. 15.000.000$0, sendo que o saldo final em 31 de dezembro de 1995, é de Esc. 13.007.200$

Da análise a este ponto, verifica-se que o sujeito passivo limita-se a transcrever o que foi referido no relatório de fiscalização, não explicando qual a origem dos suprimentos que o sócio fez à sociedade.

Por outro lado, e tendo presente o ponto anterior custa-nos a perceber como foi efetuada esta entrega, dado que a empresa deve dinheiro aos sócios, na sequência das dificuldades de fundos e o único rendimento auferido por aqueles é o proveniente da empresa.

6 - Inventários

Neste ponto, verifica-se que o sujeito passivo tem uma noção incompleta de como deve ser apresentado um inventário.

No inventário, devemos considerar três fases:

a) Identificação, em que se verifica quais os elementos patrimoniais existentes;

b) Descrição e classificação;

c) Valorização, ato de atribuição de um valor a cada elemento patrimonial.

Ora tendo em atenção a definição e os inventários apresentados pelo sujeito passivo, verifica-se que os mesmos não permitem qualquer controle.

Quanto às faturas de compras e vendas o sujeito passivo refere que a faturação não é elevada e que teria sido perfeitamente exequível um teste de controle de stocks, ora não concordamos com a opinião do sujeito passivo dado que aquelas faturas apresentam quatro tipos diferentes de faturação, sendo bastante moroso o seu tratamento e por outro lado, teria que se recorrer a presunções, da mesma forma que foi efetuado para o período que decorreu entre janeiro a julho de 1999.

Por outro lado, as faturas referidas pelo sujeito passivo ou seja em unidades, foram exatamente aquelas em que o custo médio de cada grama de artefactos em ouro, mais se afastou dos valores médios do mercado, como foi referido no relatório de fiscalização.

Refira-se que, em relação ao facto de se ter efetuado a contagem em julho de 1999, tratou-se de um procedimento adicional efetuado por esta equipa para confirmar os valores apresentados pelo inventário a 31 de dezembro de 1998.

Verificando-se divergências significativas, havendo inclusive e no que se refere ao ouro fino e cascalho (dado que este não foi presumido) saídas de existências, sem a correspondente existência em stock.

Por outro lado como é que é possível determinar as existências em quantidades, se nem sequer no inventário de 1994 as mesmas se encontram mencionadas.

Quando o sujeito passivo refere que o teste realizado em 16/7/99, não tem qualquer sentido, refira-se que:

a) A única forma possível de controlar as existências do sujeito passivo expressas em peso é estimar as quantidades, com base em pesos médios ponderados;

b) O sujeito passivo não mudou a forma de faturar apesar da equipa de fiscalização o ter alertado para esta situação;

Pelo que, não existia outro método que a equipa de fiscalização pudesse seguir, para saber se as quantidades mencionadas no inventário de 1998 estavam corretas.

Porque razão, não se refere o contribuinte ao teste efetuado ao ouro fino e ao cascalho, em que nessa situação também surgiram divergências, e não houve lugar a presunções.

Quanto à valorização dos inventários a equipa de fiscalização mencionou no relatório os valores dados pelos inventários como forma de demonstrar, que o valor inscrito pelo sujeito passivo no inventário que se aproximava do valor por nós calculado e que é o valor de mercado. Ou seja, quando referimos o preço de custo dos inventários era para chamar a atenção, para o facto do sujeito passivo ter a preocupação de aproximar o preço do custo do inventário ao preço de custo no mercado.

Quanto ao assunto das faturas, verifica-se também uma certa confusão na forma de interpretação acerca dos elementos que das mesmas devem constar por parte do sujeito passivo, pelo que importa esclarecer:

Ora tendo em atenção o ofício circulado n° 181 044 de 6-12-1991 do SAIVA, o mesmo refere que nos termos do n°5 do artigo 35° do Código do IVA, as faturas devem conter a “quantidade e denominação usual dos bens transmitidos..., com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável”, isto é devem identificar corretamente os bens vendidos.

No seu ponto 1.1 refere que não são aceitáveis designações genéricas como por exemplo brinquedos, artigos de limpeza ou semelhantes.

Ora tendo em atenção a interpretação dada pelo sujeito passivo, se calhar o mesmo até está a utilizar elementos a mais nas suas faturas, dado que bastava a descrição “artigos em ouro”, para ser taxado a 17%.

7 - Margem Bruta de Vendas

Chama o sujeito passivo, a atenção para as seguintes situações:

a) O CAE onde a empresa está inserida;

b) Rentabilidade Fiscal das Vendas da empresa.

Quanto ao ponto a), ficou esclarecido no projeto de conclusões que a equipa de fiscalização, não encontrou outro CAE que se permitisse uma melhor identificação com a atividade da empresa.

Assim, o CAE onde se enquadra a atividade da empresa não foi alterado.

No entanto, quando a equipa de fiscalização reconhece que a margem bruta de vendas do setor é de 25%, não foi só com base elementos dados pelo CAE 51 700, mas também com base num conjunto de elementos que nos levaram a essa conclusão.

De entre esses elementos, foram tidos em consideração:

- Amostragens efetuadas a ourivesarias no distrito de Lisboa;

- Amostragens existentes nos Serviços de Prevenção e Inspeção Tributária;

- Declarações de Rendimentos Modelo 22, entregues por outros sujeitos passivos enquadrados no mesmo código de atividade (CAE 51700), mas a exercer a mesma atividade do sujeito passivo ou seja Armazenistas de Artefactos de Ourivesaria;

- Comparação de outros códigos de atividade relacionados com a comercialização do mesmo tipo de artefactos;

Assim, ao ser considerada a margem bruta de vendas de 25%, esta foi considerada tendo presente um conjunto elementos e não isoladamente (CAE 51700), aliás como vem explicado no relatório que acompanha o projeto de conclusões.

Quanto ao ponto b), de facto a rentabilidade fiscal é de 6,1.

Mas porquê?

Ora tendo em atenção a fórmula que nos permite calcular aquela, verifica-se:

Lucro Fiscal/ Volume de negócios * 100

Ora atendendo à estrutura de custos da empresa, verifica-se que a mesma é baixa, dado que por exemplo, a sede da empresa é a própria casa do sócio gerente, em que os sócios, são os empregados da empresa. (Verificando-se ser o Sr. J..... e a sua esposa).

Pelo que, não é de admirar a rentabilidade fiscal apresentada.

8 - Amostragens efetuadas aos preços de venda do grama / ouro

Neste ponto o sujeito passivo refere as seguintes situações:

a) Amostragem efetuada à faturação de vendas da empresa no exercício de 1999;

b) Amostragens existentes nos serviços;

c) Amostragem efetuada pela equipa de fiscalização

d) Amostragem apresentada pelo sujeito passivo;

e) Lapso praticado pela equipa de fiscalização;

f) Circularização efetuada a toda a faturação emitida pela empresa aos seus clientes e toda ela coincidente.

Passando à análise às situações referidas, verifica-se:

a) O quadro apresentado procura, tão somente, demonstrar faturas em que o sujeito pratica preços de venda inferiores a Esc. 2.000$, quando se verificou no mercado que os preços de venda em média praticados por outras armazenistas de artefactos de ourivesaria se situa, acima dos Esc. 2.700$.

Refira-se que o sujeito passivo declarou que tanto os preços de venda, como a margem bruta de vendas, manteve-se entre os anos de 1995 a 1999.

b) As amostragens existentes nos serviços foram elaboradas no distrito de Lisboa (a equipa de fiscalização não deve revelar as ourivesarias, tendo presente o dever de sigilo), em que os objetos comercializados, são do mesmo género que os comercializados pelo sujeito passivo, sendo que os critérios utilizados se afiguram semelhantes aos seguidos por esta equipa de fiscalização.

Refira-se que estas amostragens foram efetuadas por outras equipas de fiscalização, que não esta, verificando-se que os valores apurados, foram superiores aos valores obtidos por esta equipa de fiscalização.

c) Parece-nos haver alguma confusão por parte do sujeito passivo ao pretender referir-se às amostragens existentes nos serviços e referindo o peso de 854,1 gramas, peso esse que esteve na origem das amostragens efetuadas pela equipa de fiscalização.

Ora a equipa ao selecionar os artefactos em ouro seleciona apenas uma unidade de um conjunto de “famílias”, dado que essa unidade é representativa daquele conjunto.

Ora ao proceder desta forma é natural que o peso total dos artefactos selecionados seja menor que essa unidade a multiplicar pelo número total dos artefactos que fazem parte desse conjunto de famílias.

d) Na amostragem apresentada pelo sujeito passivo, verifica-se:

Elementos já confirmados pela equipa de fiscalização ou seja a existência de preços médios de venda de cada grama de artefactos, inferiores a Esc. 2000$, muito abaixo dos preços praticados no mercado de Esc. 2.700$. Refira-se que o custo do ouro neste ano variou entre, Esc. 1500$ e Esc. 1.600$.

Refira-se ainda que na amostragem apresentada pelo sujeito passivo os preços mais baixos dizem respeito a mercadorias que não identificam as quantidades, em que é impossível qualquer controle. ―Faturação tipo 4.

e) Quanto ao lapso praticado por esta equipa, o mesmo aconteceu, pelo que foi corrigido.

Refira-se que este lapso não altera qualquer valor para efeitos de determinação da matéria tributável, nem o sentido do que se pretendia demonstrar.

f) É curiosa a afirmação do sujeito passivo ao referir que “Os senhores inspetores circularizaram toda a faturação emitida pela empresa aos seus clientes e toda ela era coincidente”.

Ora tendo presente o relatório que acompanhou o projeto de conclusão não se verifica esta 1 conclusão em qualquer parte do mesmo.

Por um lado, a equipa não verificou toda a faturação, dado que o sujeito passivo apresenta na contabilidade cerca de 50 (Cinquenta) clientes, circularizando assim apenas uma pequena parte da faturação.

Dos poucos clientes circularizados, pareceu-nos que o sujeito passivo, já estava na posse dos extratos solicitados pela equipa de fiscalização aos seus clientes, dadas as questões levantadas por este relativamente aqueles, concluindo assim a equipa que se tomava desnecessário continuar a circularizar os mesmos.

Por outro lado, quanto às divergências, dos poucos clientes circularizados, as mesmas vieram a verificar-se, nomeadamente quanto à contabilização em duplicado de faturas por parte do sujeito passivo.

9 - Fiscalização aos exercícios de 1993 e 1994

Refira-se que esta empresa foi fiscalizada relativamente ao exercício de 1994 e não de 1993.

Das conclusões retiradas pelo técnico da fiscalização, relativamente a esse exercício de 1994, destacam-se as seguintes:

a) O sujeito passivo encontrava-se em crédito de imposto, estando este relacionado com os valores das existências;

b) A margem de lucro bruta situa-se entre os 30% a 35%, em que o mesmo considera manifestamente superior à MLB do setor - da ordem dos 27,84%, através de testes que efetuou.

c) Pelo que não efetuou qualquer correção de IVA e de IRC.

Em conclusão, poder-se-á referir que:

a) Este setor de atividade (desde o fabricante até ao retalhista) tem especificidades próprias resultantes, de primeiro, do preço do metal (ouro) que é “tabelado” e segundo, do funcionamento, quase “corporativo” do setor em que se encontra, que é um setor que sempre ofereceu resistência à discriminação (identificação do artefacto, peso e tipo de pedras que incorpora) nas faturas, o que obviamente permite a evasão fiscal que se verifica no setor.

b) É um setor em que se pode considerar auto regulado, desde o fabricante até ao retalhista, em que os respetivos preços de compra e venda estão em sintonia, em que as regras do mercado, estão controladas pelos seus intervenientes.

c) Assim não é aceitável que o sujeito passivo venda em média a Esc. 2.100$/Esc. 2.200$ por cada j grama de artefactos em ouro, quando o normal no mercado é em média de cerca de Esc. 2.700$, valor este comprovado nas ourivesarias do mercado com base em amostragens efetuadas por um lado e por outro, em fiscalizações já efetuadas em sujeitos passivos com idêntica atividade.

Refira-se por último que dado que não foi acrescentado nenhum dado novo ao processo (com exceção dos recibos), mantém-se os valores apurados pela equipa de fiscalização.

(Conforme resulta de fls. 69 a 79 do PAT em apenso).

Y) Sobre o RIT recaíram os pareceres e o despacho de concordância de fls. 43 a 45 do PAT em apenso.

Z) A Impugnante requereu a revisão da matéria tributável relativamente ao IRC e ao IVA (conforme resulta de fls. 39 e segs. do PAT apenso).

AA) O Perito da Impugnante, o Perito da Fazenda Pública e o Perito Independente reuniram, porém não lograram obter acordo (conforme resulta da ata de fls. 113-114 do PAT em apenso).

BB) O Diretor de Finanças proferiu a decisão a que se refere o artigo 90.º, n.º 6, da LGT, que constitui fls. 104 a 112 do processo de reclamação graciosa (PRG) em apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida.

CC) Resulta da informação a que se refere a alínea anterior:

(…)

O Perito da Fazenda Pública, o Perito do Contribuinte e o Perito Independente reuniram em 2000/10/11 (Ata M° .....) e devido ao facto de não ter existido acordo entre as partes foram lavrados os respetivos laudos.

- O Perito da Fazenda Pública é da opinião que a contabilidade não espelha todos os movimentos relacionados com a atividade da empresa e constata estarem reunidos os pressupostos para se proceder a aplicação de métodos indiretos. Destaca a existência de uma conta bancária na qual foram durante o exercício de 1995 efetuados sete movimentos contabilísticos. o registo na rubrica de caixa de todo o fluxo financeiro, a realização de suprimentos no valor de 28.000.000$ os quais se encontram apenas suportados por documentos internos, a impossibilidade de comprovar e valorizar as existências de forma clara e inequívoca através dos inventários como principais fundamentos para se aplicarem métodos indiretos.

Considera no entanto que o sujeito passivo encontra-se num Código de Atividade Económica genérico onde soo incluídas uma grande variedade de atividades, pelo que entende que a margem bruta sobre as vendas deve corresponder aos valores do 1.° Quartil (16,59%).

- O Perito do Contribuinte afirma que não existem razões para se determinar a matéria coletável por métodos indiretos, considerando que os argumentos utilizados pela Inspeção Tributária ou não têm influencia ou a Administração Tributária não os consegue comprovar conforme define o artigo 74.° da Lei Geral Tributária.

É ainda da opinião de que em situações nas quais existem irregularidades na escrita só se podem aplicar métodos indiretos se se notificar o contribuinte para suprir lacunas, além disso entende que a Administração Fiscal está a tributar este contribuinte de forma ilegal e que a mesma não obedece aos requisitos do artigo 88.° da Lei Geral Tributária

- O Perito Independente afirma que não foram apresentados pelo sujeito passivo novos elementos ao processo que permitam o esclarecimento das irregularidades verificadas pela Inspeção Tributária, aceitando os pressupostos apresentados no relatório para se aplicarem métodos indiretos. No que se refere à quantificação, o Perito Independente concorda com a forma de calculo apresentada pela Inspeção Tributária, excetuando-se a margem bruta das vendas a qual entende dever localizar-se no 1.° Quartil.

5. De harmonia com o n.° 6 do artigo 92.° da Lei Geral Tributária, quando não existe acordo entre as partes, cabe ao órgão competente para a fixação da matéria tributável resolver de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos.

Assim, fixo o lucro tributável de IRC 1995 em 37.951.213$, e o Imposto Sobre o Valor Acrescentado em falta, em 1995, em 4.551.351$, valores apurados por métodos indiretos e relativos ao exercício de 1995, com base nos elementos constantes do processo e ainda:

• Inexistência dos recibos que servem de suporte documentai à rubrica de caixa, além disso é nesta que são registados todos os recebimentos e pagamentos;

• No exercício de 1995, foram efetuados suprimentos no valor de 28.000.000$, sendo os mesmos suportados por documentos internos, não existindo uma correspondência efetiva com os movimentos financeiros reais;

• Os inventários apresentados não permitem quantificar e valorizar as existências de forma clara e inequívoca dado que apresentam vícios de forma, nomeadamente não descrevem as famílias de artefactos, os artefactos individualmente, o custo unitário e o peso do ouro por artefacto;

• O ofício conjunto da Imprensa Nacional Casa da Moeda S.A. e da Inspeção Geral das Atividades Económicas, o qual foi dirigido à Associação dos Comerciantes de Ourivesaria e Relojoaria do Sul, no seu ponto 4 diz-nos que a transação de artefactos de metais preciosos deve ser suportada por uma faturação em que consta a designação dos artigos, espécie de metal precioso ou metais, peso e valor de transação, e quando for caso disso a qualidade e quantidade de pedras preciosas ou pérolas, procedimento que não é seguido pela empresa, como concluiu a Inspeção;

• Atendendo a que o sujeito passivo está inserido num código genérico de classificação das atividades económicas (CAE 51700 - Comércio por Grosso Não Especificado), que abrange uma grande variedade de atividades, cuja rentabilidade média se apresenta inferior à determinada por métodos indiretos, a fixação da matéria coletável é efetuada tendo por base uma margem bruta das vendas de 16,59% (1.° Quartil). Esta margem bruta das vendas é obtida através dos rácios existentes na base de dados da Direção Geral dos Impostos para contribuintes com o mesmo tipo de atividade e unidade orgânica.

• O lucro tributável fixado após ação da Inspeção aponta uma rentabilidade fiscal das vendas de 22,4% que considero excessiva.

O perito independente emite parecer no sentido de considerar excessiva a margem de lucro de 25% utilizada pela Inspeção, concordando, no entanto, que estão reunidos os pressupostos de utilização de métodos indiretos.

Acresce ainda referir que o inventário final de existências não apresenta credibilidade, pelo para se determinar as vendas calculadas por métodos l indiretos, utiliza-se um Custo das Mercadorias Vendidas igual ao valor das Compras.

Para apuramento do Imposto Sobre o Valor Acrescentado em falta foi efetuada uma repartição percentual a partir das vendas declaradas.

Em face do exposto e tendo por base os pressupostos enumerados nos pontos anteriores o cálculo do rendimento tributável de IRC e do imposto em falta de IVA, é refeito da seguinte forma:

(…)

- Imposto Sobre o Valor Acrescentado:

1. Calculo das Vendas:

Margem Bruta das Vendas = (Vendas - Custo das Existências Vendidas) / Vendas 0,1659= (Vendas - 234.912.483$) / Vendas 0,1659 Vendas = Vendas - 234.912.483$

Vendas - 0,1659 Vendas = 234.912.483$

Vendas = 234.912.483$ / 0,8341

Vendas = 281.635.875$

2. Determinação da Correção às Vendas:

Vendas Omitidas = Vendas Calculadas - Vendas Declaradas Vendas Omitidas = 281.635.875$ - 254.863.220$

Vendas Omitidas = 26.772.655$

3. Determinação do Imposto em Falta

Imposto em Falta = Vendas Omitidas * 17%

Imposto em Falta = 26.772.655$ * 17%

Imposto em Falta = 4.551.351$

Para apuramento do Imposto Sobre o Valor Acrescentado em falta foi efetuada uma repartição percentual a partir das vendas declaradas.

(Conforme resulta de fls. 114 a 111 do PRG em apenso).

DD) A AT emitiu a Liquidação de IVA - Ano de 1995, Liquidação n° .....no montante de «52.011,44 euros» ou «4.551.351$», de imposto e respetivos Juros Compensatórios no montante de «24.207,91 euros » ou «2.937.169$»,

EE) O prazo para pagamento voluntário terminou em 28/02/2001.

FF) O Chefe do Serviço de Finanças (SF) 13, recorreu à notificação pessoal, emitindo, em 07/12/2000, um mandado de notificação à ora impugnante, a ser concretizada por um funcionário desse Serviço, na pessoa do seu sócio-gerente - Sr. J..... - e no domicílio fiscal deste (coincidente com a sede social da empresa - R.....Lisboa), relativo à liquidação agora em crise (conforme resulta de fls. 9 do PRG em apenso).

GG) Constatada a impossibilidade de concretizar a notificação pessoal, foi o contribuinte avisado, às doze horas do dia 13/12/2000, de que deveria comparecer nesse local (isto é, a morada correspondente ao seu domicilio fiscal) no dia 14 de dezembro de 2000, pelas catorze horas, a fim de receber a notificação (conforme resulta de fls. 10 do PRC em apenso).

HH) No dia e hora marcados, e por ninguém se ter prestado a receber a notificação, foi na presença do funcionário e de duas testemunhas efetuada a notificação por afixação (conforme resulta de fls. 11 do PRG em apenso).

II) Para comunicar ao contribuinte de que se havia procedido à notificação por afixação, foi expedida carta registada com aviso de receção (conforme resulta de fls. 13 a 15 do PRG em apenso).

JJ) A Impugnante apresentou reclamação graciosa em 06/04/2001, (conforme resulta de fls. 2 do PRG em apenso).

KK) Em apreciação da reclamação graciosa a que se refere a alínea anterior foi laborada a informação de fls. 149 a 153 do PRG em apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzida e donde resulta com interesse para a decisão:

«(…)

5 - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E PARECER.

5.1 - Na sequência de exame à escrita, Ordem de Serviço n° .....de 98/06/09 foi fixada com recurso à presunção a importância de «14.600.279$», referente a IVA em falta, relativamente às vendas omitidas na contabilidade no Exercício de 1995.

5.2- O recurso à presunção, foi ditado por:

a ) _ Não se encontram na posse do sujeito passivo os documentos ( recibos ) que suportam os movimentos da rubrica «Caixa», além de que é nesta rubrica que são registados todos os recebimentos e pagamentos.

b)_No exercício de 1995, foram efetuados suprimentos no valor de «28.000.000$», sendo os mesmos suportados por documentos internos, não existindo uma correspondência efetiva com os movimentos financeiros reais.

c) _Os inventários apresentados não permitirem quantificar e valorizar as existências de forma clara e inequívoca, nomeadamente não descrevem as famílias de artefactos, os artefactos individualmente, o custo unitário e o peso do ouro por artefacto,

d) _As faturas emitidas pela reclamante não estão de conformidade com o Art° 35° do CIVA nem com o recomendado pelo ofício conjunto da Imprensa Nacional Casa da Moeda S A e da Inspeção Geral das atividades Económicas, o qual foi dirigido à Associação dos Comerciantes de Ourivesaria e Relojoaria do Sul, e refere que a transação de artefactos de metais preciosos deve ser suportada por uma faturação em que conste a designação dos artigos, espécie de metal precioso ou metais, peso e valor da transação e quando for caso disso a qualidade e quantidade de pedras preciosas ou pérolas.

5.3- Por não concordar com tal fixação e consequentemente com os métodos utilizados na mesma, reclamou para a Comissão de Revisão do Art° 85° do CPT . A Comissão de Revisão reuniu em 11 de outubro de 2000. Não tendo havido acordo entre as partes a decisão da reclamação competiu ao Presidente da Comissão, nos termos do Art° 87° n° 3 do CPT. De harmonia com o n° 6 do Art° 92° da LGT e conforme Processo n° 1093 e 1094 o montante de IVA em falta em ....., foi fixado em «4.551.351$» ou «52.011,44 euros». ( fls. 104 a 111). Pelo ofício n° .....de 2000-11-27, «carta registada com aviso de receção», foi comunicado à reclamante, para a morada .....-Lisboa, a decisão da revisão da matéria coletável - Art° 91° da L G T - IRC/IVA 1995. (Fls 132).

Verifica-se que muito embora a carta tenha sido registada com data de 2000/11/27, foi recebida pela reclamante (fls. 142).

5.3- Em 2000/11/30, o sujeito passivo entregou Declaração de Alterações para mudança de morada da sede. ( Fls 143 ).

5.4- Em 7 de dezembro de 2000, o Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 13 mandou o funcionário Sr. V....., notificar a firma D..... na pessoa do seu sócio gerente J..... , nos termos do Art° 27° do CIVA para no prazo de 30 dias efetuar o pagamento do IVA de 1995 no valor de «4.551.351$», acrescido de Juros compensatórios de «2.937.169$». (Fls 9).

Não tendo sido possível notificar o sócio gerente, por não se encontrar presente, nos termos do Art° 240° do CPC foi afixado Aviso para comparecer na sua residência no dia 14 de dezembro de 2000 às 14 horas, afim de receber a notificação, conforme Certidão de 13 de dezembro de 2000. ( Fls 10).

5.5 - No dia 14 de dezembro de 2000, o sócio gerente J....., não esteve presente, para receber a Notificação, pelo que esta foi efetuada por afixação, na presença de duas testemunhas, conforme o disposto no n° 2 do Art° 240 do Código do Processo Civil, conforme Certidão de Notificação ( Fls 11 ).

Em 14 de dezembro de 2000 a reclamante foi informada por carta registada com aviso de receção de que tinha sido efetuada «notificação por afixação». ( Fls 12).

5.6 - A reclamante foi notificada por mandado pessoal, cumprido por um funcionário do Serviço de Finanças de Lisboa -13, conforme previsto no n° 5 do Art° 38° do CPPT, «As notificações serão pessoais nos casos previstos na lei ou quando a entidade a elas proceder o entender necessário.

Este tipo de notificação constitui uma exceção à regra geral, tipificada no n° 1 do Art° 38° do CPPT, que define que estas deverão ser efetuadas por carta registada, porém nada obsta que em vez da notificação postal, se ordene a notificação por mandato a cumprir por funcionário para notificar diretamente o interessado, o que foi feito.

5.7- O sócio gerente J....., foi notificado por afixação, na presença de duas testemunhas, para tomar conhecimento da Liquidação, em 14 de dezembro de 2000, conforme Certidão de Notificação ( Fls 10).

5.8- Não obstante a reclamante vir alegar que somente nos primeiros dias de janeiro de 2001, teve conhecimento do aviso postal da notificação da liquidação adicional de IVA, e por isso considerar que o sócio gerente não foi notificado da liquidação do imposto no período de caducidade, este facto não é oponível por a Administração Fiscal o considerar notificado.( Fls. 10).

Assim sendo a reclamante foi devidamente notificada nos termos do n° 1 e 5 do Art° 38 do CPPT não se verificando a caducidade do direito à liquidação.

5.9- Relativamente à aplicação de métodos indiretos e à quantificação da matéria coletável, a reclamante remete para a petição apresentada em sede de comissão de revisão e ainda para o laudo do perito do contribuinte não apresenta nem demonstra qualquer amostragem ou margem que contrarie a apurada na «Decisão nos termos do n° 6 do Art° 92 da L G T », a qual se encontra dentro dos parâmetros dos rácios sectoriais da DGCI.

O «Perito Independente» no seu parecer refere:

Dadas as deficiências e irregularidades apresentadas a Fls 15 do relatório da Inspeção Tributária e que não foram melhor esclarecidas pelo sujeito passivo aceita os pressupostos apresentados para aplicação de métodos indiretos ( Fls. 145).

Relativamente às Vendas Presumidas, aceita o valor de 16,59% correspondente ao 1.º Quartil dos Rácios R01 do setor enquadrado no CAE 51700, proposto pelo Perito da Fazenda Pública. (Fls 146).

Na presente reclamação nada é apresentado que contrarie os valores fixados pela Comissão de Revisão.

6- PROPOSTA DE DECISÃO

Em face do exposto se conclui da legalidade da notificação e liquidação em causa e pela improcedência do pedido.

Lisboa 21 de fevereiro de 2002.»

LL) A Impugnante, notificada do projeto de indeferimento da reclamação graciosa, exerceu o direito de audição (conforme resulta de fls. 154 a 156 do PRG em apenso).

MM) Em apreciação da argumentação da Impugnante foi elaborada a informação de fls. 173 a 180 do PRG apenso que aqui se dá por integramente reproduzida.

NN) Considerou a AT na informação a que se refere a alínea anterior:

«O sujeito passivo exerceu direito de audição produzido oralmente aos vinte e sete dias do mês de março do ano em curso.

Não carreou ao processo elementos probatórios documentais, que contrariassem a prova produzida pela administração fiscal.

É conveniente relembrar, que estamos perante uma fiscalização iniciada em 09.06.98, através da ordem de serviço n° ....., PAFT dos serviços de prevenção e inspeção tributária - divisão IV, determinada no seguimento de análise interna, onde foram verificadas divergências entre a atividade prosseguida pelo sujeito passivo, aquela em que se encontra coletado e as baixas margens de comercialização. Peça processual em fls. 19 do processo de reclamação graciosa, com o número ....., em sede de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, relativo ao mesmo contribuinte, ano de exercício e ato tributário.

No entanto mostra-se pertinente responder a algumas questões suscitadas pelo sujeito passivo no âmbito do processo, relacionadas com a atuação da administração fiscal, e relativas a alegados vícios que possam eventualmente afetar, a liquidação e o processo de reclamação graciosa.

A primeira das questões prende-se com alegados vícios formais a nível da fundamentação, tanto a nível da ausência como das divergências formalizadas nesta.

Argumenta o sujeito passivo que a argumentação de suporte é incerta e imperfeita, nomeadamente no que respeita ao processualismo e fundamento, inerentes à notificação.

Respondendo à questão formulada pelo requerente, e no que concerne à notificação pessoal da firma D..... Lda., na pessoa do seu sócio gerente Sr° J....., prevista no nº 5 do artigo 240° do código de processo civil, através da afixação com marcação de hora certa, a mesma ocorreu pelas 12 (doze) horas do dia 13 (treze) de dezembro do ano de 2000 na rua .....Lisboa, e foi marcada para o dia 14 (quatorze) do mesmo mês, pelas 14 (quatorze) horas, na mesma morada,

Pretendia-se efetuar uma notificação nos termos do n° 2 do artigo 240°.do já citado código de processo civil, ou seja a notificação na pessoa do sujeito passivo, ora requerente, ou na pessoa de terceiro capaz de a transmitir ao requerente, tal ato de notificação não foi efetuado com sucesso, uma vez que ninguém se aprestou ao seu recebimento.

Em face desta ocorrência, os dois funcionários disponibilizados para este ato de notificação pessoal, procederam à notificação, por afixação, nos termos do N° 3 do artigo 240° do código de processo civil ' peças processuais em fls. 8 e 9 dos autos.

No seguimento deste ato foi ainda informado o sujeito passivo, nos termos do N° 3 do artigo 293° do código de processo civil, através de carta registada com aviso de receção, de que se procedeu à notificação por afixação. Peça processual em fls. 10 a 12 dos autos.

Não se afigura existir aqui, qualquer divergência a nível da fundamentação. Pretendeu-se fazer uma notificação pessoal, nos termos do N° 2 do artigo 240° do código de processo civil, não sendo possível esta notificação, procedeu-se em conformidade com o N° 3 do mesmo artigo, e procedeu-se à notificação por afixação, desta afixação deu-se conhecimento ao sujeito passivo, através de carta registada com aviso de receção, nos termos do N° 3 do artigo 239° do código de processo civil.

Refere também o sujeito passivo expressamente, que a administração fiscal não estaria em condições de proceder à tributação por métodos indiretos.

Como já salientamos anteriormente a ordem de serviço que deu inicio à fiscalização foi emitida em 1998, ainda na vigência do código de processo tributário, sendo este o diploma que regia à data os procedimentos, neste contexto a legislação a aplicar séria o artigo 81° daquele diploma, o artigo 84° n° 1 do código do imposto sobre o valor acrescentado e o artigo 51° do código do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas, estipulava a al) d) do N° 1 deste artigo o recurso a métodos indiciários, sempre que ocorram, e passamos a citar:

" erros e inexatidões na contabilização das operações ou indícios fundados de que a contabilidade não reflete a exata situação patrimonial e o resultado efetivamente obtido."

As razões alegadas pelo sujeito passivo, com fundamento nas alíneas a) e c) do artigo 88º da Lei Geral Tributária e que seriam impeditivas da tributação por métodos indiretos, prendem-se com o facto da administração fiscal não ter notificado o sujeito passivo, para que este em tempo útil procedesse à regularização dos erros e omissões praticadas na contabilidade.

Verifica-se assim que o sujeito passivo, é o primeiro a reconhecer a existência de erros e omissões praticadas na sua contabilidade.

No entanto o que o artigo refere, é um prazo a conceder às empresas para escrituração de livros e registos e organização dos mesmos, quando for solicitada a sua apresentação, e os mesmos não se mostrem escriturados.

Somente nestes casos, há lugar à notificação para regularização genérica da contabilidade, situação esta que não têm aplicação relativamente ao sujeito passivo, pelo que a administração fiscal não estava obrigada à concessão de qualquer prazo, para regularização de erros e omissões detetadas.

Ainda relativamente aos métodos indiciários, as razões determinantes para a sua aplicação prendem-se com vários fatores, o primeiro dos quais têm a ver com a não apresentação dos extratos bancários, contrapondo o sujeito passivo que não dispõe dos mesmos, e citamos:

" ...que estes não são elementos obrigatórios da escrita dos contribuintes, mas sim elementos extra - contabilísticos tão só utilizados pelas empresas na reconciliação de contas de bancos e por isso não exigíveis por lei (..

A inspeção tributária quando pretende circularizar os bancos então tem de os solicitar à entidade bancária. É evidente que quando as empresas possuem extratos bancários apresentam-nos à administração tributária; quando não os possuem a inspeção tributária só terá de os pedir ao banco. (...)." peça processual in folhas 43 dos autos.

Se questões prioritárias, não existissem, por si só estas afirmações evidenciariam desrespeito pelo princípio da colaboração, previsto no artigo 59° da Lei Geral Tributária, em que existe um dever de colaboração recíproco entre a administração tributária, e os contribuintes, tanto mais conhecendo o reclamante a figura do sigilo bancário, limitativa à atuação da administração fiscal.

Porém, discordamos da afirmação produzida pelo sujeito passivo, pois os extratos bancários são elementos justificativos, previstos no n° 3 do artigo 98° do Código do Imposto s/ o Rendimento das Pessoas Coletivas, atual al) a) do n° 3 do artigo 115°. Neste sentido Lei Geral Tributária de António de Lima Guerreiro, editora Rei dos Livros in página 292, que passamos a citar:

"... O segredo bancário não compreende, a nosso ver, os documentos justificativos de suporte da contabilidade que o contribuinte deve possuir e apresentar, sempre que solicitado, à administração fiscal nos termos do artigo 98° n° 3, alínea a), do C.I.R.C, dado o caráter imperativo desta norma e o princípio da tributação do rendimento real..."

Assim, existindo conta bancos, têm que existir extratos bancários.

E, os extratos bancários, elementos probatórios fundamentais, não foram apresentados.

Por outro lado constatou-se que os saldos da conta corrente dos fornecedores, não eram concordantes, com os saldos dos respetivos extratos de conta corrente.

Estas discordâncias, foram justificadas pelo sujeito passivo com base em grandes relações de confiança, existentes entre a sua pessoa e os seus fornecedores, relações estas que permitiriam algum desfasamento temporal, entre o pagamento e a emissão do respetivo recibo de quitação.

Porém, prevê o normativo 35° do Código do Imposto s/ o Valor Acrescentado, no seu número 1, o prazo máximo de de cinco dias úteis para a emissão de tais documentos de quitação, pelo que o sujeito passivo também aqui se mostra em situação de incumprimento.

Em peça processual em fls. 42 dos autos, é o próprio sujeito passivo, quem assume algumas falhas na sua contabilidade, relativamente aos pagamentos a fornecedores.

No que concerne ao pagamento de remunerações ao sócio gerente, estas não estão refletidas na contabilidade.

O sujeito passivo argumenta que as mesmas foram contabilizadas, declaradas à administração fiscal e pagas em anos posteriores, no entanto não foi apresentada qualquer prova material que suportasse tais afirmações, até porque operações e movimentos desta natureza teriam de ser refletidos contabilisticamente.

É ainda relevante referir que a inspeção tributária verificou que nos exercícios de 1996 e 1997, a empresa não afetou qualquer pagamento aos sócios.

Notámos que esta constatação não foi do agrado do sujeito passivo, na medida em que ostensivamente questionou a administração fiscal, e passamos a citar:

"... Como é que a inspeção tributária tem o atrevimento de afirmar que o único rendimento do contribuinte são as remunerações da empresa?

Essas afirmações, cairiam imediatamente por base se o sócio gerente respondesse que tem rendimentos às taxas liberatórias. É evidente que esta resposta bastava para por em causa toda a argumentação da inspeção tributária, mas o sócio vai mais longe e demonstra que tem rendimentos e que nada precisava para subsistir das remunerações das empresas naqueles anos...." peça processual em fls. 44 dos autos.

O sujeito passivo, porém, não nos indicou a proveniência dos tais rendimentos à taxa liberatória, uma vez que já nos demonstrou que aqueles, não são provenientes do seu trabalho.

Relativamente aos suprimentos, também não foram verificados os correspondentes movimentos financeiros externos. Tais como cheques ou transferências bancárias, estes são apenas meras operações internas sem qualquer documento externo de suporte. Não existe a necessária correspondente bancária.

Nestas circunstâncias o sujeito passivo não está na posse de quaisquer provas materiais que contrariem ou afastem a presunção de que houve uma efetiva omissão de proveitos, conjugada com uma efetiva omissão de receitas.

Também no que respeita ao inventário, foi efetuada uma contagem física das existências em 16.07.1999, ao mesmo tempo foi efetuado um controle de stocks naquela data, também aqui foram verificadas divergências significativas, que lhe retiraram credibilidade.

Em face do que atrás foi descrito, afigura-se não existirem dúvidas de que a contabilidade do sujeito passivo, apresenta irregularidades que lhe retiram credibilidade, daí estarem reunidos os pressupostos suficientes para o recurso à aplicação de métodos indiretos.

Reforça esta nossa posição a opinião emitida pelo perito independente, aquando da discussão da matéria tributável, em sede de comissão de revisão. Peça processual que consta em fls. 109 dos autos, e que consta da ata dessa comissão de revisão.

Refere ainda o sujeito passivo, que em face do facto do imposto sobre o valor acrescentado ser alegadamente, um imposto de prestação única, as liquidações de janeiro a novembro enfermariam de ilegalidade, por vício de caducidade.

Porém, a fiscalização refere-se ao exercício de 1995, referia o artigo 88° do Código do Imposto s/ o Valor Acrescentado no seu n° 1, com redação à data que, e citamos:

" só poderá ser liquidado imposto nos cinco anos civis seguintes àquele em que se verificou a sua exigibilidade."

Assim a liquidação efetuada pelos serviços é temporal, não se encontrando afetada, por qualquer vício.

Para finalizar e referenciando as margens de comercialização apresentadas, salientamos que a mesma matéria já foi objeto de discussão em sede de comissão técnica (comissão de revisão), especializada para o efeito.

O sujeito passivo volta a discutir nesta sede, as mesmas margens, no entanto não carreou aos autos, quaisquer provas materiais que as contrariem pelo que somos de opinião em que as mesmas devem ser mantidas.

Fazemos ainda uma referência à faturação do contribuinte, que este considera de todo correta e apresenta no entanto algumas irregularidades.

Lembramos a existência de uma comunicação da Imprensa Nacional Casa da Moeda s a e da Inspeção Geral das Atividades Económicas que consideramos da máxima importância e que refere expressamente no ponto 4 § 8, que passamos a citar:

"Emissão de fatura nas transações de artefactos de metais preciosos que é obrigatória e da qual, sem prejuízo do disposto no n° 5 do artigo 35° do CIVA e no n° 3 do art° 3° e nos art° 4° e 7° do DL n° 45/89, de 11 de fevereiro. Constará a designação dos artigos, espécie de metal ou metais, peso e valor da transação e, quando for caso disso, a qualidade e quantidade das pedras preciosas ou pérolas. Nas faturas dos industriais deverá configurar impresso o desenho da sua marca privativa (artigo 102.° do DL n.° 391/79 com a nova redação do DL 57/98); peça processual em fls. 170 dos autos.

Conclusão e proposta de decisão:

Em face do exposto somos de opinião em que deve ser negado provimento ao pedido devendo manter-se a liquidação reclamada, com os fundamentos expressos no projeto de decisão em peça processual de fls. 149 a fls. 153.

À consideração superior

1ª Direção de Finanças de Lisboa em 13.05.2001»

PP) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaiu o despacho de concordância de fls. 172, do PRG apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.

QQ) A Impugnante foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa em 31/05/2002, por carta registada com aviso de receção (conforme resulta de fls. 181 a 184 do PRG apenso).

RR) Em 28/06/2002, a ora Impugnante interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa (conforme resulta de fls. 186 a 193 do PRG apenso).

SS) Em 13/09/2004, foi a Impugnante notificada da decisão de indeferimento do recurso hierárquico (conforme resulta o processo de recurso hierárquico em apenso).

TT) Em 30/04/2002, a Impugnante prestou garantia bancária para suspender o processo de execução fiscal n.º ..... (conforme resulta de fls. 38).

UU) Em 27/12/2002 a Impugnante procedeu ao pagamento da dívida exequenda a que se refere a alínea anterior (conforme resulta de fls. 36).

VV) A petição inicial da presente impugnação foi apresentada em 10/12/2004 (conforme resulta de fls. 1)”.

II.B. Relativamente aos factos não provados, refere-se na sentença recorrida:

“Com interesse para a decisão inexistem factos invocados que devam considerar-se como não provados”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A decisão da matéria de facto resultou do exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório”.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Da rejeição do recurso

Consideram, antes de mais, os Recorridos que o recurso deve ser rejeitado, por não ter sido dado cumprimento aos requisitos impostos pelo art.º 640.º do CPC.

Vejamos.

Considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão[1].

Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC];
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].

Especificamente quanto à prova testemunhal, dispõe o n.º 2 do art.º 640.º do CPC:

“2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.

Como tal, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo­‑se-lhe os ónus já mencionados[2].

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos e atenta a leitura das alegações de recurso apresentadas, resulta que nestas a Recorrente não se insurgiu contra a matéria de facto fixada, não a tendo impugnado.

Logo, e uma vez que os ónus mencionados supra são de atentar apenas quando haja impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, carece de materialidade o alegado pelos Recorridos a este propósito.

Passando à apreciação das questões suscitadas pela Recorrente.

III.B. Da nulidade da sentença, por oposição entre os fundamentos e a decisão e por ininteligibilidade ou obscuridade

Entende, desde logo, a Recorrente que a sentença recorrida padece de nulidade, por oposição entre os fundamentos e a decisão, na medida em que, em seu entender, num processo lógico, os fundamentos invocados na sentença deveriam conduzir a uma decisão no sentido da procedência parcial da impugnação, uma vez que o Tribunal a quo considerou que, à exceção da caducidade, os autos não poderiam proceder. Conclui pela obscuridade ou ambiguidade da sentença.

Refira-se ainda que, no corpo das alegações, a Recorrente invoca nulidade da sentença por excesso de pronúncia (cfr. ponto 5 das alegações), sem que, no entanto, nada seja consubstanciado a esse propósito, nem durante as alegações, nem nas conclusões, motivo pelo qual não se pode considerar cabalmente suscitada tal nulidade.

Vejamos então.

Nos termos do art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, constitui nulidade da sentença a oposição dos fundamentos com a decisão [cfr. igualmente o art.º 615.º, n.º 1, al. c), do CPC].

Esta nulidade consubstancia-se na contradição formal entre os fundamentos de facto ou de direito e o segmento decisório da sentença[3], ou seja, na circunstância de o iter constante da sentença, na sua motivação, estar em contradição com a decisão a final proferida[4].

Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 05.11.2014 (Processo: 0308/14), “… esta nulidade ocorre quando a construção da sentença é viciosa, quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas ao resultado oposto. Isto é, quando das premissas de facto e de direito que o julgador teve por apuradas, ele haja extraído uma oposta à que logicamente deveria ter extraído: a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente”.

Por outro lado, nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. c), do CPC, ex vi art.º 2.º, al. e), do CPPT:

“1 - É nula a sentença quando:

(…) c) (…) ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível…”.

Com efeito, na sequência da reforma do processo civil de 2013 e da eliminação do incidente de aclaração ou esclarecimento, antes previsto no art.º 669.º, n.º 1, al. a), do CPC/1961, o legislador consagrou uma nova nulidade da sentença, justamente consubstanciada na existência de ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível[5].

Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 08.11.2018 (Processo: 0149/18.3BALSB), “é «obscuro» o que não é claro, aquilo que não se entende; e é «ambíguo» o que se preste a interpretações diferentes. Em qualquer caso, fica o destinatário da sentença ou acórdão sem saber ao certo o que efectivamente se decidiu, ou quis decidir. Mas não é qualquer obscuridade, ou ambiguidade, que é sancionada com a nulidade do acórdão, mas apenas aquela que «torne a decisão ininteligível»”.

Assim, enquadram-se nestas situações os casos em que a fundamentação da sentença não faz dela uma peça processual compreensível.

Aplicando estes conceitos ao caso dos autos, cumpre, antes de mais, atentar no discurso argumentativo constante da decisão recorrida. Ali se escreveu, a propósito dos vícios imputados à liquidação impugnada:

“2.4.1. Invoca a Impugnante a caducidade do direito à liquidação, porquanto só teve conhecimento da liquidação em janeiro de 2001, quando após as férias natalícias regressou ao seu domicílio e atividade profissional.

(…) Considerando que a Impugnante foi notificada das liquidações de IVA referentes aos diferentes meses do ano de 1995 em 14/12/2000, sai logica a conclusão de que apenas relativamente ao IVA reportado ao mês de dezembro de 1995 ainda não se havia completado o prazo de caducidade do direito à liquidação.

Termos em que se anulam as liquidações impugnadas referentes aos meses de janeiro a novembro de 1995, porque foram notificadas já depois de completado o prazo de caducidade do direito à liquidação.

Assim, nesta parte a presente impugnação é procedente.

2.4.2. Invoca a Impugnante que não estavam reunidos os pressupostos para a aplicação de métodos indiretos.

(…)

Termos em que a decisão de recorrer a métodos indiciários para a determinação e quantificação da matéria tributável se encontra, pelo menos do ponto de vista formal, devidamente fundamentada.

A Impugnante discorda e veio analisar isoladamente os fundamentos invocados pela AT. Para concluir que não estavam reunidos os pressupostos que justificaram o recurso a métodos indiretos.

(…)

[A] argumentação da Impugnante não contraria as conclusões da AT que justificam o recurso a métodos indiciários.

Termos em que nesta parte a presente impugnação não pode proceder.

2.4.3. Invoca a Impugnante a preterição de formalidades legais, porquanto a AT:

- só poderia aplicar métodos indiretos após notificação ao contribuinte para dentro de um certo prazo suprir essas irregularidades, erros ou omissões que inviabilizavam o apuramento da matéria coletável;

- não tomou qualquer iniciativa no sentido de audição do contribuinte antes da aplicação de métodos indiretos;

A primeira questão tem a ver com a interpretação da alínea a) do artigo 88.º da LGT. Esta questão foi expressamente abordada no acórdão da Secção de Contencioso Administrativo do STA, proferido em 03/12/2014, no proc. nº 01262/13, onde se concluiu que «[e]mbora a letra da alínea a) do artigo 88.º da LGT não seja inequívoca, pois tanto permite sustentar que a condição nela ínsita – “quando não supridas no prazo legal” – se aplica a todas as situações nela previstas (assim, ANTÓNIO LIMA GUERREIRO, Lei Geral Tributária Anotada, Rei dos Livros, 2000, pp. 371/372 – nota 3 ao art. 88.º da LGT), como apenas às situações de falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução (como parecem entender DIOGO LEITE DE CAMPOS/BENJAMIM SILVA RODRIGUES/JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, 4ª ed., 2012, p. 765 – nota 2 ao art. 88º da LGT), a interpretação acolhida é a que melhor se ajusta à natureza subsidiária, de ultima ratio, da avaliação indireta (artigo 87.º, nº 1 da LGT), atento a que o legislador prevê expressamente a notificação para regularização da situação tanto nas situações de inexistência de escrita como nas de atraso na execução desta e em ambos os casos ―independentemente do procedimento para a aplicação da coima prevista nos números anteriores (cfr. os artigos 120º nº 2 e 121º, nº 2 do RGIT).»

E na verdade assim é.

A possibilidade de o contribuinte suprir as deficiências da escrita, após notificação, evitando a utilização de métodos indiretos, decorre, no âmbito do IRS, do disposto nos nºs. 2 e 3 do art. 39° do CIRS e, em sede de IRC, do disposto nos nºs. 2 e 3 do art. 57º do CIRC e a tal possibilidade se referem, igualmente, os arts. 120º e 121º do RGIT, evidenciando-se «a preocupação do legislador em reservar a avaliação indireta para aquelas situações irremediáveis em que já não é possível, como base na contabilidade ou nos elementos dos contribuintes, determinar o valor tributável real por avaliação direta» (LGT Comentada e anotada, Almedina, 2015, [José Maria Fernandes Pires (Coordenador), Gonçalo Bulcão, José Ramos Vidal e Maria João Menezes], Comentário nº 4 ao art. 88.º, pp. 911 e 912.)

E, no caso, tendo a AT procedido à correção, por métodos indiretos, da matéria tributável da impugnante, ao abrigo do disposto na al. b) do art. 87° e da al. a) do art. 88°, ambos da LGT, por irregularidades na organização ou execução da respetiva escrita, impunha-se, como refere a Impugnante, a prévia notificação desta (cfr. o art. 52° do CIRC) para suprir as irregularidades.

E no que respeita aos demais argumentos invocados pela AT, também eles não são suscetíveis de alterar esta interpretação, desde logo porque a serem válidos, teriam plena aplicação às situações que a recorrente também entende poderem ser supridas, acrescendo que enquanto não caducar o direito de liquidação dos tributos (art. 45° da LGT) a matéria tributável é sempre suscetível de ser alterada, quer através de correções meramente aritméticas, quer através de métodos indiretos.

Termos que, por preterição de formalidade legal, a presente impugnação não pode proceder”.

A final, o Tribunal a quo julgou procedente a impugnação.

Da análise do discurso argumentativo expendido, verifica-se que o Tribunal a quo considerou ocorrer, parcialmente, a caducidade do direito à liquidação – ponto 2.4.1.

No seu ponto 2.4.2., analisa a questão da reunião dos pressupostos para a aplicação de métodos indiretos, considerando formal e materialmente demonstrada tal reunião, com a consequente improcedência da pretensão da Impugnante.

Finalmente, no ponto 2.4.3. é analisada a preterição de formalidades legais, a saber a falta de notificação para a primitiva Impugnante suprir as irregularidades, erros ou omissões e a falta de audição prévia.

Do discurso argumentativo da sentença, concretamente quanto à falta de notificação para suprir as irregularidades, erros ou omissões [que, aliás, foi analisada em sede de reclamação graciosa, onde é assumida essa falta de notificação, decorrendo, pois, dos factos assentes – cfr. facto NN)], resulta que “… no caso, tendo a AT procedido à correção, por métodos indiretos, da matéria tributável da impugnante, ao abrigo do disposto na al. b) do art. 87° e da al. a) do art. 88°, ambos da LGT, por irregularidades na organização ou execução da respetiva escrita, impunha-se, como refere a Impugnante, a prévia notificação desta (cfr. o art. 52° do CIRC) para suprir as irregularidades. // E no que respeita aos demais argumentos invocados pela AT, também eles não são suscetíveis de alterar esta interpretação, desde logo porque a serem válidos, teriam plena aplicação às situações que a recorrente também entende poderem ser supridas, acrescendo que enquanto não caducar o direito de liquidação dos tributos (art. 45° da LGT) a matéria tributável é sempre suscetível de ser alterada, quer através de correções meramente aritméticas, quer através de métodos indiretos”.

Ora, todo este discurso é no sentido de que o Tribunal a quo considerou haver preterição de formalidade, em virtude da ausência da mencionada notificação. É certo que, a final do ponto 2.4.3., é escrito “Termos que, por preterição de formalidade legal, a presente impugnação não pode proceder”. No entanto, trata-se de evidente lapso de escrita, devendo ler-se “Termos que, por preterição de formalidade legal, a presente impugnação deve proceder” (cfr. art.ºs 614.º, n.º 1, do CPC, e art.º 249.º do Código Civil), porquanto todo o discurso argumentativo que precede a referida afirmação e, bem assim, o discurso argumentativo relativo aos juros indemnizatórios e à indemnização por prestação de garantia são no sentido da verificação de preterição de formalidade legal.

Logo, e em consequência, nesta parte não se verifica nem contradição entre os fundamentos e a decisão nem obscuridade ou ininteligibilidade de sentença. Não tendo sido invocado qualquer erro de julgamento a este propósito, a decisão da questão está, pois, consolidada.

Coisa distinta se verifica quanto aos juros indemnizatórios e à indemnização por prestação indevida de garantia.

Com efeito, apesar de a sentença sob apreciação se limitar, no segmento decisório, a julgar a impugnação procedente, atento o pedido formulado, tal segmento só pode ser interpretado quer no sentido da anulação da liquidação, quer no sentido da condenação em juros indemnizatórios e indemnização por prestação indevida de garantia (como, aliás, interpretado pela Recorrente e não posto em causa).

Refere-se, a este respeito, na sentença recorrida:

“No caso dos autos a anulação com fundamento na caducidade do direito à liquidação demonstra o erro imputável aos serviços e por isso a Impugnante tem direito aos correspondentes juros indemnizatórios e a ser indemnizada pela prestação de garantia indevida na respetiva proporção

Porém, quanto ao IVA referente a dezembro de 1995, a liquidação vai ser anulada com fundamento em preterição de formalidade legal, ou seja, com base em vício de natureza formal, pelo que nesta parte a Impugnante não tem aos juros indemnizatórios e, também, como a garantia não foi mantida por um prazo superior a três anos, não tem direito a ser indemnizada pela prestação de garantia indevida, na proporção respetiva”.

Não obstante este discurso fundamentador, do segmento decisório consta apenas, como referimos, a procedência da impugnação, quando a decorrência lógica do raciocínio expendido seria a condenação, apenas em parte, da Fazenda Pública no pagamento de juros indemnizatórios e em indemnização por prestação de garantia.

Como tal, verifica-se a nulidade da sentença nesta parte, por oposição dos fundamentos com a decisão [art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, e art.º 615.º, n.º 1, al. c), do CPC].

Nos termos do art.º 665.º, n.º 1, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, “[a]inda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação”.

Assim, cumprirá apreciar.

Ora, como referido pelo Tribunal a quo, concretamente quanto à parte da liquidação relativa a dezembro de 1995 (uma vez que na restante parte, o Tribunal a quo considerou ocorrer caducidade do direito à liquidação, sendo nesse pressuposto a motivação em torno do direito a juros indemnizatórios e indemnização por prestação de garantia quanto a essa parte), padecendo a mesma de vício por preterição de formalidade essencial (o que, como referimos, não é posto em causa), estamos perante um vício de forma.

Nos termos do art.º 43.º da LGT:

“1 - São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

Por seu turno, dispõe o art.º 53.º do mesmo diploma:

“1 - O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objeto a dívida garantida.

2 - O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo”.

No caso, cumpre, quer quanto aos juros indemnizatórios, quer quanto à indemnização por prestação de garantia indevida, atentar no conceito de erro imputável aos serviços, porquanto não estamos no âmbito do n.º 1 do art.º 53.º da LGT [uma vez que a garantia não foi mantida por mais de 3 anos – cfr. factos TT) e UU)].

Assim, é necessário que se verifique a ocorrência de um erro-vício e que o mesmo seja imputável aos serviços, respeitando este último requisito a “falta do próprio serviço, globalmente considerado”[6].

Sobre este conceito, chama-se à colação o recente Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 29.01.2020 (Processo: 02005/18.6BALSB), onde se refere:

“Sobre as razões pelas quais o artigo 43.º, n.º 1 da LGT não abrange a atribuição de juros indemnizatórios em caso de anulação do acto tributário com fundamento em vício de forma (falta de fundamentação) já se pronunciou inúmeras vezes a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, sempre de forma unânime e reiterada, (…) em sentido do qual não iremos divergir.

Com efeito, há muito que o STA sufraga o entendimento, formulado com base na letra do artigo 43.º, n.º 1 da LGT, de que os juros indemnizatórios apenas podem ser atribuídos ao sujeito passivo que tenha satisfeito uma obrigação tributária que venha a ser anulada com fundamento em “erro imputável aos serviços”, designadamente, por erro na aplicação do direito. É só neste caso, segundo a interpretação firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo, que se gera uma efectiva lesão na esfera jurídica do sujeito passivo, decorrente a imposição do cumprimento de uma obrigação tributária que se vem a apurar ser contrária ao direito e que, por isso, deve ser patrimonialmente reparada através do pagamento de juros indemnizatórios.

Já quando os actos tributários são anulados por vícios de forma (incompetência do autor do acto, vício procedimental ou falta de fundamentação, para referir alguns exemplos) não fica demonstrado que tenha sido exigida ao sujeito passivo o cumprimento de uma obrigação materialmente contrária à lei (ou seja, que não era devida), mas apenas que essa obrigação não foi determinada ou calculada em conformidade com as normas legais e, por essa razão, a mera restituição do que foi pago é suficiente para tornar indemne o sujeito passivo.

Mais, nos casos em que existam razões atendíveis (fundamentos que suportem a violação de um direito de natureza substantiva) para que o sujeito passivo cujo tributo anulado com fundamento em vício de forma se não deva considerar indemnizado pela mera restituição dos valores que tenha pago, pode sempre utilizar-se a acção de responsabilidade civil para obter a reparação dos respectivos danos.

Lembre-se, por fim, que o Tribunal Constitucional, confrontado com a antes mencionada interpretação do n.º 1 do artigo 43.º da LGT sufragada pela jurisprudência do STA, decidiu, no acórdão n.º 203/2013, “[N]ão julgar inconstitucional a norma extraída dos artigos 43.º e 100.º, ambos da Lei Geral Tributária, segundo a qual não são devidos juros indemnizatórios, em execução de decisão anulatória da liquidação de tributo, quando a anulação do ato tributário se funde em ilegalidade de natureza orgânico-formal”.

É, pois, esta interpretação do n.º 1 do artigo 43.º da LGT que uma vez mais se confirma e reitera”.

Veja-se igualmente o ainda mais recente Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 30.09.2020 (Processo: 02009/18.9BALSB), exatamente no mesmo sentido e que, aliás, em termos de motivação se sustenta no referido acórdão proferido no âmbito dos autos 02005/18.6BALSB.

Este mesmo entendimento tem sido defendido quanto ao direito a indemnização por prestação indevida de garantia, nos termos do n.º 2 do art.º 53.º da LGT.

A este respeito, chama-se à colação o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 21.01.2015 (Processo: 0632/14), no qual se sistematiza:

“De acordo com o disposto o artº 53º nº 1 da LGT o devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida. Nos termos do nº 2 do mesmo normativo o prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

A indemnização será total ou parcial conforme o vencimento que o interessado obtenha em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida (cfr.artº.53, nº.1, da L.G.T.). Se se comprovar que houve erro imputável aos serviços, essa indemnização será devida independentemente do período de tempo durante o qual a garantia tiver sido mantida (cfr. artº. 53, nº. 2, da L.G.T.). Se a anulação, total ou parcial, não tem por fundamento um erro daquele tipo (designadamente, se a liquidação for anulada por erro imputável ao próprio contribuinte ou por vício de forma ou incompetência) a indemnização só é devida se a garantia tiver sido mantida por mais de três anos (cfr. artº. 53, nº. 1, da L.G.T.).(neste sentido vide, Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.433 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.237 e seg.).

O objectivo da norma é assim indemnizar o contribuinte pelos prejuízos que teve com a prestação de uma garantia que não teria que prestar se a Administração não tivesse actuado ilegalmente”.

Ora, in casu, como já se referiu, a parte da liquidação relativa a dezembro de 1995 foi anulada por vício de forma – o que, nos termos já referidos, não se configura como erro imputável aos serviços. No caso concreto da garantia, como já mencionado, não tendo a mesma sido mantida por mais de três anos, não há sequer lugar à aplicação do n.º 1 do art.º 53.º da LGT.

Assim sendo, não assiste direito aos Impugnantes ao pagamento de juros indemnizatórios e indemnização por prestação indevida de garantia, relativamente à parte da liquidação atinente a dezembro de 1995, por vício de preterição de formalidade.

III.C. Do erro de julgamento, quanto à caducidade do direito à liquidação

Entende, por outro lado, a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, violando as normas ínsitas nos art.ºs 88.º do Código do IVA (CIVA) e no art.º 33.º do Código de Processo Tributário (CPT), porquanto, à data dos factos, estatuía o disposto no art.º 88.º do CIVA que “[s]ó poderá ser liquidado imposto nos cinco anos civis seguintes àquele em que se verificou a sua exigibilidade”. Defende que apenas com a entrada em vigor do DL n.º 472/99, de 8 de novembro, é que a exigibilidade do imposto, para efeitos de contagem do prazo de caducidade, se passou a contar a partir do facto tributário, como um imposto de obrigação única, até à introdução da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, resultando de forma inequívoca que, até à revogação do art.º 88.º do CIVA, o início do prazo de caducidade se contava a partir da data em que o imposto se tornou exigível, ou seja, a partir do termo do ano em que o facto tributário ocorreu.

Vejamos.

In casu, estamos perante uma liquidação adicional de IVA, relativa a todo o ano de 1995 (ou seja, sem discriminação dos respetivos períodos).

O Tribunal a quo, apesar de tal falta de discriminação, entendeu ser possível discernir o valor relativo aos diversos meses daquele ano (o que não é posto em causa por nenhuma das partes) e considerou que se verificava a caducidade do direito à liquidação na parte correspondente aos meses compreendidos entre janeiro e novembro de 1995.

Ficou provado ainda que houve notificação da liquidação, por afixação, a 14.12.2000 [cfr. factos GG) e HH)].

In casu, como referimos, está-se perante IVA de 1995, pelo que há que apelar à disciplina constante do CPT, a respeito da caducidade do direito à liquidação.

Assim, nos termos do seu art.º 33.º, n.º 1:

“O direito à liquidação de impostos e outras prestações tributárias caduca se a liquidação não for notificada ao contribuinte no prazo de cinco anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo daquele em que ocorreu o facto tributário ou, nos impostos de obrigações única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu”.

Por seu turno, e por referência à redação em vigor em 1995, determinava o art.º 88.º, n.º 1, do CIVA que “[s]ó poderá ser liquidado imposto nos 5 anos civis seguintes àquele em que se verificou a sua exigibilidade”.

No entanto, há que ter em conta o disposto no art.º 4.º do diploma preambular do CPT, que, a contrario, implica que o mencionado art.º 33.º do CPT se aplique ao IVA, dado que aquela disposição legal apenas faz depender de alteração do respetivo código a aplicação do prazo de caducidade às situações relativas ao imposto municipal de Sisa e ao imposto sobre as sucessões e doações.

A propósito do regime decorrente da alteração resultante da Lei n.º 32-B/2002 de 30 de dezembro, mencionada pela Recorrente, ao art.º 45.º da LGT, refere Patrícia Noiret da Cunha[7]:

“Esta norma entrou em vigor em 31.12.2002, sendo aplicável até essa data o disposto no n.º 1 do artigo 33.º CPT, segundo o qual o direito à liquidação dos impostos caducava se a liquidação não fosse notificada ao sujeito passivo no prazo de cinco anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo daquele em que ocorreu o facto tributário ou, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que sobreveio o facto tributário. Incidindo o IVA sobre factos isolados (transmissões de bens, prestações de serviços, importações de bens), deve ser considerado como um imposto de obrigação única, uma vez que lhe era aplicável a segunda parte do n.º 1 do artigo 33.º CPT pelo que o termo inicial do prazo de caducidade se fixava na data do surgimento do facto tributário e não no fim do ano da sua ocorrência”.

Chama-se a este propósito à colação o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 20.03.2002 (Processo: 026806), no qual se sumariou que:

“I - O imposto sobre o valor acrescentado deve ser qualificado como imposto de obrigação única, e não como imposto periódico, pois incide sobre factos tributários de carácter instantâneo, reportando-se a cada um dos actos concretos praticados, não relevando, para tal qualificação, que o sujeito passivo exerça continuada ou só ocasionalmente a respectiva actividade.

II - O termo inicial do prazo extintivo do direito da Fazenda à liquidação do IVA fixa-se, pois, com referência à data do surgimento do facto tributário, e não ao fim do ano da sua ocorrência”.

Mais recentemente, veja-se o acórdão deste TCAS, de 09.07.2020 (Processo: 75/17.3BCLSB), onde a ora relatora interveio na qualidade de 1.ª adjunta e no qual se refere:

“No que diz respeito à decisão da 1.ª instância que julgou verificada a caducidade do direito de liquidação (…), a Recorrente discorda da mesma quanto ao dies a quo, entendendo (…) que este é o mês de Dezembro de 1996, e assim sendo, considerando que a notificação foi efetuada em 27/12/2001, não se verifica o decurso do prazo de caducidade de cinco anos previsto no art. 34.º do CPT (…).

(…) Está em causa nos presentes autos a liquidação de IVA de 1996 correspondente a transações ocorridas entre Janeiro a Novembro desse ano.

(…) [E]fetivamente, nos termos do art. 33.º, n.º 1 do CPT, o dies a quo do prazo de 5 anos de caducidade do direito de liquidação de IVA referente a 1996 “fixa-se, pois, com referência à data do surgimento do facto tributário, e não ao fim do ano da sua ocorrência.” – cf. Acórdão do STA de 20/03/2002, processo n.º 026806, citado na sentença recorrida.

Repare-se que não é controvertido e resulta do relatório de inspeção que as correções em discussão dizem respeito a prestações de serviços efetivamente realizadas em vários meses(…).

Porém, note-se a correção é de natureza meramente aritmética resultante de imposição legal, e resulta do relatório de inspeção que o IVA diz respeito a vários períodos, não tendo sido invocado qualquer fundamento de direito que legitime a imputação dos montantes mês de dezembro de 1996”.

Portanto, ao contrário do defendido pela Recorrente, não há que atentar ao fim do ano da ocorrência do facto tributário, mas sim ao surgimento desse facto tributário, pelo que, não sendo controvertida a imputação efetuada pelo Tribunal a quo a cada um dos meses em causa (em consonância, aliás, com o que decorre desde logo da decisão proferida em sede de procedimento de revisão), é por referência ao termo de cada um desses meses que deve ser, como foi, aferida a caducidade do direito à liquidação.

Ora, in casu, como referido, a notificação ocorreu em dezembro de 2000, quando, tendo em conta o final de cada um dos meses compreendidos entre janeiro e novembro de 1995, já tinham decorrido os 5 anos de prazo para o exercício do direito à liquidação.

Como tal, verifica-se a caducidade de tal direito, não assistindo razão à Recorrente.

III.D. Do erro de julgamento, quanto ao decidido em termos de juros indemnizatórios e indemnização por garantia prestada

Considera, por outro lado, a Recorrente que, com referência à parte da liquidação anulada por caducidade, não há lugar a pagamento de juros indemnizatórios nem de indemnização por prestação de garantia, dado que a declaração de caducidade não implica a existência de um erro sobre os pressupostos de facto ou de direito de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, não implicando, na realidade, qualquer juízo sobre a validade da relação tributária subjacente.

Vejamos então.

A este respeito há que atender ao disposto nos art.ºs 43.º e 53.º da LGT, remetendo-se para o que foi supra mencionado a este propósito (cfr. supra III.B.), designadamente em termos de conceito de erro imputável aos serviços.

In casu, como está provado:
a) Foi prestada garantia bancária pela primitiva Impugnante a 30.04.2002 [cfr. facto TT)];
b) Foi pago o valor em causa a 27.12.2002 [cfr. facto UU)].

Como referimos supra, o Tribunal a quo considerou que se verificava a caducidade do direito à liquidação na parte respeitante aos meses compreendidos entre janeiro e novembro de 1995, em virtude de a notificação à primitiva Impugnante ter ocorrido depois de expirado o prazo em causa. Entendeu, igualmente, que, neste caso, assistiria direito ao pagamento de juros indemnizatórios e de indemnização por prestação indevida de garantia.

Em ambos os casos, estamos perante a densificação do conceito de erro imputável aos serviços (dado que, como já referimos supra, no caso da garantia bancária, a situação não se subsume ao n.º 1 do art.º 53.º da LGT).

Sobre esta questão já se pronunciou por diversas vezes o Supremo Tribunal Administrativo, chamando-se à colação o seu Acórdão de 12.02.2015 (Processo: 01610/13), do qual resulta:

“[A] declaração de caducidade não implica a existência de um erro – vício sobre os pressupostos de facto ou de direito – que permita a constituição a favor do contribuinte do direito a juros indemnizatórios ao abrigo do n.º 1 do art. 43.º da LGT Vejamos:

No caso (…) a situação (…) é de caducidade do direito à liquidação por falta de notificação dentro do prazo legal para o exercício desse direito (cfr. art. 45.º, n.º 1, da LGT); ou seja, do facto de a notificação não ter sido validamente efectuada dentro do prazo que a lei fixa para o efeito retirou-se como consequência a perda do direito de liquidar o tributo.

No entanto, se é certo que a falta de notificação no prazo de caducidade extinguiu o direito à liquidação do tributo (e nessa parte a sentença transitou em julgado), a declaração dessa caducidade não significa nenhum juízo sobre a validade da relação material tributária subjacente.

Como é sabido, a caducidade, juridicamente, é mero facto jurídico que releva do tempo e que determina a impossibilidade do exercício de um direito num caso concreto (Prescrição e caducidade têm em comum o facto de serem figuras jurídicas relacionadas com a aquisição ou perda de situações subjectivas pelo mero decurso do tempo: a primeira anda associada aos direitos ou situações jurídicas consolidadas, sendo o seu campo de eleição os direitos subjectivos a se; a segunda reporta-se a situações jurídicas em formação e aos direitos potestativos, cujo exercício está sujeito a prazos curtos. Em termos sintéticos, podemos dizer que a prescrição determina a extinção de um direito e a caducidade a impossibilidade de o exercitar num caso concreto (Cfr. A caducidade no Direito Administrativo: Breves considerações, Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, 2005, Coimbra Editora).). Significa isto que a decisão judicial, nos termos em que foi proferida, se limitou a extrair os efeitos jurídicos do decurso do tempo sem que tenha sido efectuada a notificação, o que não implica nenhum juízo sobre a validade da relação material tributária subjacente e, consequentemente, não permite concluir pela existência de um erro sobre os pressupostos de facto ou de direito.

Ora, como resulta do que deixámos já dito, o direito aos juros indemnizatórios previsto no art. 43.º da LGT exige que haja erro imputável aos serviços do qual tenha resultado (à luz de um nexo de causalidade) o pagamento de imposto indevido. É a existência desse erro que consideramos não poder dar-se como verificada em face da declaração da caducidade do direito à liquidação.

Não significa isto que o Contribuinte, se entender estar lesado nos seus direitos patrimoniais não possa exigir judicialmente a reparação a que se julgue com direito, o que lhe é assegurado não só pela Constituição da República (cfr. art. 22.º), como pela lei ordinária (Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, diploma em cujo art. 9.º se faz equivaler qualquer ilegalidade a ilicitude). Porém, para obter essa reparação o Contribuinte terá de fazer, em processo próprio, a demonstração da existência do direito a essa indemnização, à face das regras gerais da responsabilidade civil extracontratual, como qualquer outra pessoa que seja lesada nos seus direitos por actos de outrem, não havendo qualquer norma constitucional ou legal que imponha que, em todos os casos de anulação de actos administrativos, se presumam os prejuízos, como está ínsito nas normas que prevêem a atribuição de juros indemnizatórios (Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., volume I, anotação 5. ao art. 61.º, pág. 532/533..)

Conclui-se, assim, que nos casos em que a anulação da liquidação impugnada tenha por fundamento a caducidade do direito de liquidar por falta de notificação da liquidação dentro do prazo da caducidade, carece de suporte legal a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios ao abrigo do art. 43.º da LGT.» (fim de citação)”.

Como tal, atenta a esta jurisprudência, a que se adere, assiste razão à Recorrente nesta parte.

Considerando o decidido relativamente aos juros indemnizatórios e à indemnização por prestação de garantia e dado que o Tribunal a quo não conheceu a restante questão invocada pela Recorrida, uma vez que se dispõe de todos os elementos necessários, passa-se ao seu conhecimento em substituição (art.º 665.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT).

III.E. Do excesso de quantificação da matéria tributável fixada por recursos a métodos indiretos

Como decorre da análise da petição inicial, resultou por apreciar o alegado excesso na quantificação da matéria tributável fixada por recursos a métodos indiretos. Para o efeito, alega-se (além da falta de fundamentação da margem fixada pelo vogal da FP, vício que não se irá conhecer, uma vez que apenas se justifica o conhecimento em substituição de vícios de fundo, que possam dar origem a direito a juros indemnizatórios ou indemnização por prestação de garantia) que se compararam situações não comparáveis, exigindo-se uma rentabilidade fiscal exagerada, havendo um desajustamento da realidade.

Vejamos.

A aplicação de métodos diretos de avaliação da matéria coletável redunda nas chamadas correções técnicas ou meramente aritméticas[8].

Apelando às palavras de Casalta Nabais[9], “as correcções técnicas, são as correcções que a administração tributária faz à matéria tributável determinada no âmbito da avaliação directa, como a correcção concretizada, por exemplo, na não consideração de determinadas verbas como custos fiscais assim qualificadas na declaração de rendimentos (…) [;] (…) as correcções aritméticas ou correcções meramente aritméticas, têm lugar quando a administração tributária se limita a corrigir erros de cálculo das declarações-liquidações”.

Já a avaliação indireta deverá ocorrer apenas nos casos previstos nos art.ºs 87.º a 89.º da LGT.

Para que seja legítimo o recurso à tributação por via dos métodos indiretos, cabe à AT o ónus da prova de que se reúnem os pressupostos da sua aplicação, consubstanciando­‑se tal ónus probatório na demonstração da existência de situações fáticas, designadamente irregularidades contabilísticas, que assumam alcance tal que impossibilitam o recurso a métodos diretos de avaliação[10].

Assim, nos termos do art.º 87.º da LGT (redação vigente à data do início da ação inspetiva):

“A avaliação indireta só pode efetuar-se em caso de:

(…) b) Impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata dos elementos indispensáveis à correta determinação da matéria tributável…”.

A situação prevista na alínea b) supratranscrita remete-nos para o art.º 88.º da LGT, nos termos do qual (redação à época):

“A impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável para efeitos da aplicação de métodos indiretos, referida na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorreções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:

a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais;

b) Recusa de exibição da contabilidade e demais documentos legalmente exigidos, bem como a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação;

c) Existência de diversas contabilidades ou grupos de livros com o propósito de simulação da realidade perante a administração tributária e erros e inexatidões na contabilidade das operações não supridos no prazo legal”.

Logo, quando se verificarem os pressupostos de recurso à avaliação indireta é possível o recurso a métodos presuntivos de determinação da matéria coletável, surgindo como mecanismo de reação contra a fraude e evasão fiscal, dando resposta, por esta via, à incumbência do Estado, prevista no art.º 81.º, al. b), da CRP[11] (segundo o qual “[i]ncumbe prioritariamente ao Estado no âmbito económico e social: (…) b) Promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e operar as necessárias correções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, nomeadamente através da política fiscal”).

Quando se conclui pela possibilidade de recurso a métodos indiretos de tributação, como foi no caso dos autos, a AT tem de escolher um critério, para efeitos de quantificação da matéria coletável, designadamente um dos que constam no elenco do art.º 90.º da LGT.

A presunção de rendimento que venha a funcionar é ilidível, podendo o contribuinte, desde logo, demonstrar a ilegalidade das liquidações, por excesso de quantificação [cfr. a título exemplificativo os Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 17.10.2018 (Processo: 0261/11.0BECBR 0379/17), do Tribunal Central Administrativo Sul, de 25.06.2020 (Processo: 7711/14.1BCLSB), de 20.02.2020 (Processo: 1031/07.5BELRA), de 25.10.2018 (Processo: 1621/07.6BELSB) e de 19.09.2017 (Processo: 918/06.7BESNT)].

A este propósito, refere-se no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 19.11.2014 (Processo: 0407/12):

“[E]stabelecida a legitimidade do recurso aos métodos indirectos, impende sobre o Impugnante a demonstração do erro ou manifesto excesso na quantificação da matéria tributável, sendo que a dúvida a esse propósito será decidida em sentido desfavorável à sua pretensão.”

Como referido no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 18.05.2010 (Processo: 03865/10):

“… não bastava pôr em dúvida a existência e quantificação do facto tributário, antes se tornando necessário provar factos que comprovassem a alegada errónea quantificação da matéria tributária.

Ora, face aos factos alegados pelas AT sobre a sua contabilidade, caberia à impugnante trazer, e não trouxe salvo melhor opinião, novos elementos, credíveis, nomeadamente prova documental, que pudesse abalar a decisão.

Enfim, a impugnante não logrou provar o excesso na quantificação da matéria colectável apurada por métodos indiciários”.

E continua o mesmo acórdão:

“Na utilização de valores indiciários entende-se que a administração fiscal goza de uma margem de discricionariedade na sua quantificação, por ser ela que, pela sua continuada experiência e contacto com os operadores económicos, se encontra em melhor posição e com melhores dados para o efeito, e tendo em conta que se trata de valores necessariamente indicativos de médias generalizadas.

E por se tratar de uma margem de discricionariedade ela só pode ser jurisdicionalmente sindicável se inequivocamente, por si ou por elementos apresentados pelos interessados, se mostrar fora dos limites da razoabilidade. (…)

[É] sobre o Contribuinte que recai o ónus de demonstrar o erro ou manifesto exagero desta quantificação (art. 100.º, n.º 3, do CPPT), não bastando que o mesmo crie dúvida sobre a quantificação do facto tributário. Dúvida sobre a quantificação existe sempre quando se recorre aos métodos indirectos. (…)

[A] tributação através de métodos indiciários pressupõe, é inevitável e decorre da sua própria natureza, uma certa margem de falibilidade” (sublinhado nosso).

Por outro lado, citando o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 20.01.2004 (Processo: 1137/03):

“… a simples circunstância de a Administração Fiscal, no procedimento de apuramento do valor tributável, ter optado pela utilização de tal ou de tal critério, em vez de por um outro qualquer, achado (mormente pelo impugnante, ora recorrido) mais adequado ao caso, não faz com que seja errado o critério efectivamente utilizado pela Administração Fiscal - pois a lei não mostra preferência por qualquer dos critérios que elenca, nem esses critérios são exclusivos ou taxativos”.

Como referido por Saldanha Sanches[12], “… no caso de se verificarem os pressupostos da impossibilidade de tributação com base na declaração do sujeito passivo e se proceder à avaliação indiciária, vai caber ao contribuinte demonstrar que houve "erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada" (n.° 3 do artigo 100.° do CPPT). Quer isto dizer que, depois de demonstrada, pela Administração fiscal, a existência do facto tributário e a violação de um dever de cooperação do sujeito passivo, caberá a este a demonstração do erro ou do excesso por parte da Administração fiscal, uma vez que a determinação do rendimento ou de outro facto tributário por meio de métodos indiciários conduz sempre a uma quantificação aproximada: se aqui a dúvida revertesse a favor do sujeito passivo, a quantificação indiciária nunca seria possível”.

Retornando ao caso dos autos, foram detetadas anomalias e incorreções na contabilidade, que justificaram o recurso a métodos indiretos, como decidido pelo Tribunal a quo e não posto em causa, cabendo, como referido, ao contribuinte a efetiva demonstração do excesso na quantificação, não bastando criar dúvida sobre tal excesso[13].

Ora, in casu, verifica-se que a primitiva Impugnante nada alegou que concretamente permitisse evidenciar o excesso de quantificação, limitando-se, de forma conclusiva, a referir que os métodos não eram adequados e eram claramente excessivos.

Com efeito, atentando na decisão proferida em sede de procedimento de revisão, foi considerada uma margem bruta das vendas de 16,59%, obtida através dos rácios existentes na base de dados da AT, para contribuintes com o mesmo tipo de atividade e unidade orgânica

A prova que se exige em situações como a dos autos é, como referimos, uma prova que impõe, a montante, uma alegação concreta de como e em que termos se verifica o excesso de quantificação, o que não ocorreu. Ou seja, não foi demonstrado nem sequer cabalmente alegado o excesso de quantificação.

Como tal, não assiste razão aos Impugnantes nesta parte.

Assim sendo, não tendo procedido qualquer vício de fundo relativamente à liquidação impugnada, não há direito a juros indemnizatórios nem a indemnização por prestação indevida de garantia, por não estarmos perante erro imputável aos serviços nos termos já mencionados.

Em suma:

Assiste em parte razão à Recorrente, concretamente:
a) No tocante à nulidade da sentença, na parte respeitante aos juros indemnizatórios e à indemnização por prestação indevida de garantia, no que concerne à parte da liquidação atinente a dezembro de 1995, por oposição entre os fundamentos e a decisão;
b) No que respeita aos juros indemnizatórios e à indemnização por prestação indevida de garantia, no tocante à parte da liquidação atinente aos meses compreendidos entre janeiro e novembro de 1995.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:
a) Conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência:
a.1. Declarar a nulidade da sentença recorrida, no que respeita aos juros indemnizatórios e à indemnização por prestação indevida de garantia, relativamente à parte da liquidação atinente a dezembro de 1995, por oposição entre os fundamentos e a decisão, e, em substituição, julgar a impugnação improcedente nessa parte, absolvendo a Fazenda Pública desse concreto pedido;
a.2. Revogar a sentença, no tocante aos juros indemnizatórios e à indemnização por prestação indevida de garantia, relativamente à parte da liquidação atinente aos meses compreendidos entre janeiro e novembro de 1995;
a.3. Em substituição, julgar a impugnação improcedente quanto ao excesso de quantificação, com a consequente absolvição da Fazenda Pública no que respeita ao pagamento de juros indemnizatórios e indemnização por prestação indevida de garantia;
a.4. Manter a sentença recorrida quanto ao demais, com a correção do erro material supra decidida;
b) Custas por ambas as partes, na proporção do respetivo decaimento, que se fixa em 97% pela Recorrente e 3% pelos Recorridos;
c) Registe e notifique.


Lisboa, 22 de outubro de 2020


[A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores António Patkoczy e Mário Rebelo]

Tânia Meireles da Cunha

__________________________
[1] Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 169.
[2] V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada.
[3] Cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado e Comentado, 6.ª Edição, Vol. II, Áreas Editora, Lisboa, 2011, pp. 361 e 362; José Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum à luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª Ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2013, p. 333.
[4] V., exemplificativamente, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 17.04.2013 (Processo: 0969/12) e de 15.09.2010 (Processo: 01149/09) e os Acórdãos deste TCAS, de 05.06.2019 (Processo: 1747/08.9BELRS) e de 18.06.2013 (Processo: 06121/12).
[5] V. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 28.05.2014 (Processo: 01638/13).
[6] Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Vol. I, 6.ª Ed., Áreas Editora, Lisboa, 2011, p. 539.
[7] Patrícia Noiret da Cunha, Imposto sobre o Valor Acrescentado, Instituto Superior de Gestão, Lisboa, 2004, pp. 500 e 501
[8] Para uma noção de correções meramente aritméticas, v. o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 13.09.2013 (Processo: 00120/03 – Porto).
[9] Direito Fiscal, 5.ª Ed., Almedina, Coimbra, 2009, p.389.
[10] Neste sentido, v., exemplificativamente, os Acórdãos deste TCAS de 17.10.2019 (Processo: 487/11.6BECTB), de 25.05.2017 (Processo: 06473/13), de 17.03.2016 (Processo: 06556/13) e de 13.03.2014 (Processo: 07216/13).
[11] V. a este propósito o Acórdão do Plenário do Tribunal Constitucional n.º 84/2003, de 12.02.2003.
[12] Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3.ª Ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 478.
[13] Cfr., exemplificativamente, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 19.11.2014 (Processo: 0407/12), do Tribunal Central Administrativo Sul, de 18.05.2010 (Processo: 03865/10) e do Tribunal Central Administrativo Norte, de 27.11.2014 (Processo: 00258/01-Coimbra) e de 10.03.2016 (Processo: 00232/00-Coimbra).