Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:674/09.7BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:11/19/2020
Relator:HÉLIA GAMEIRO SILVA
Descritores:ERRADA VALORAÇÃO DA PROVA
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
IRS
MAIS-VALIAS
EXCLUSÃO DE TRIBUTAÇÃO
CONTRATO DE PROMESSA DE TRANSMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS
PRESUNÇÃO – ARTIGO 10.º. Nº 3 AL. A) DO CIRS
Sumário:I. A alteração da matéria de facto pressupõe a existência de nítida disparidade entre erro na sua apreciação e a divergência do sentido em que se formou a convicção do julgador, sendo que a respetiva reapreciação por parte do tribunal de recurso está limitada aos casos em que ocorreu erro manifesto ou grosseiro ou em que os elementos documentais fornecem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi considerado no tribunal a quo.
II. Na alínea a) do n.º 3 do artigo 10.º do CIRS vem instituída uma presunção legal aplicável aos casos de promessa de compra e venda ou de troca, prevendo que, nestas situações, o ganho se considera obtido, logo que verificada a tradição ou posse dos bens ou direitos objeto do contrato.
III. De acordo com o artigo 73.º da LGT, as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário.
IV. O conceito de transmissão para efeitos de incidência tributária, nos casos de promessa de compra e venda de bens, encontra-se, desde há muito, estritamente ligado ao seu resultado económico, com relevância para a situação material resultante da simples mudança dos possuidores dos bens e, neste sentido, a lei ficcionou o momento da transmissão naquele em que se verifica a tradição ou posse.
Votação:Voto de vencida
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a primeira Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

J..., veio deduzir impugnação judicial contra a liquidação oficiosa n° 20095... referente a IRS (mais-valias) do ano de 2007, acrescida de juros compensatórios, no valor total de € 76.459,76.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, por decisão de 06 de março de 2014, julgou procedente a impugnação.

Inconformada, a FAZENDA PÚBLICA, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

«1. A presente Impugnação refere-se à liquidação adicional de IRS de 2007, decorrente de correcções à matéria colectável, relativamente a mais-valias de alienação de valores mobiliários.

2. Foi alegado que as acções foram detidas durante mais de 12 meses, devendo ser excluídas de tributação as mais-valias respectivas.

3. A douta sentença julgou a Impugnação procedente, anulando a liquidação, decisão com a qual a FP não pode concordar pelas seguintes razões:

4. A aquisição, pelo aqui Recorrente, das acções na sociedade V... Investimentos e Participações SGPS, S.A. ocorreu em 24/11/2006.

5. Decorridos menos de 12 meses, mais concretamente no dia 23/08/2007, o Recorrente celebrou com a sociedade V... SGPS, S.A., contrato promessa de transmissão de 2.498 acções que detinha na sociedade V..., conjuntamente com A..., que pretendia igualmente vender acções da mesma sociedade, pelo valor global de €1.499.700,00.

6. No acto da celebração do referido contrato promessa foi pago pela adquirente 80% do preço,

7. No contrato promessa ficou estabelecido que seria a sociedade V... a indicar pessoas para exercido dos direitos e faculdades dos accionistas transmitentes.

8. Essa indicação ficaria, ainda, a suas próprias expensas.

9. Assim, em 22/10/2007, foi inscrito Vogal do Conselho de Administração da V..., C... que é simultaneamente Administrador único da V....

10. Foi por altura do contrato promessa que a sociedade V... efectuou o acto de registo de constituição e designação de membros de órgãos sociais.

11. O Recorrido deixou, assim, de ter qualquer domínio sobre as acções e os respectivos direitos desde a assinatura do contrato promessa.

12. Estão, por isso, reunidos os requisitos impostos no art. 10º N.º 3 a) do CIRS, os quais consistem na tradição e posse dos direitos objecto do contrato promessa, devendo-se presumir que o ganho foi obtido nesse momento, não tendo o Recorrido logrado afastar a referida presunção.

13. Tratando-se de acções ao portador, a transmissão da posse não se encontrava sujeita a qualquer formalidade. No entanto, as circunstâncias que envolveram a outorga do contrato promessa, supra descritas, confirmam a tradição das acções.

14. A argumentação utilizada pelo Recorrido e vertida na douta sentença, de que o administrador nomeado, C..., não podia tomar decisões isoladamente, uma vez que apertas representava 25% dos direitos da sociedade V..., não deve proceder por se mostrar irrelevante.

15. Tal não interfere com a existência da sua tradição no momento da celebração do contrato promessa de venda, porquanto o Recorrido deixou, a partir daquele momento, de exercer os direitos inerentes à posse das acções que havia adquirido em 2006.

16. Há uma clara mudança no exercício dos direitos inerentes às acções, a partir da outorga do contrato promessa em 23/08/2007,

17. De qualquer forma, as acções adquiridas em 2006, pelo Recorrido, em conjunto com as acções adquiridas na mesma altura por A..., correspondem a 50% do capital social da sociedade V...Investimentos e Participações SGPS, S.A.

18. Como se disse, o contrato promessa de venda das acções foi celebrado em simultâneo para ambos os accionistas. Assim, a sociedade V..., representada por C..., foi beneficiária de 50% do capital.

19. Os direitos de ambos os accionistas passaram a ser exercidos por pessoas que para o efeito foram indicadas pela V... e a expensas desta.

20. Aos transmitentes coube-lhes absterem-se de praticar actos que pudessem prejudicar a administração da V....

21. A douta sentença não valorou devidamente os factos relevantes e supra descritos, incorrendo em erro de julgamento por não os subsumir à presunção contida na norma do art. 10° n.º 3 a) do CIRS.

Face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a sentença recorrida, que deverá ser substituída por acórdão que mantenha na ordem jurídica a liquidação impugnada, só assim se fazendo JUSTIÇA.»


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O recorrido, J..., apresentou as suas contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

«(i) A Recorrente pretende com o presente recurso reagir contra a Douta Sentença que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pelo Recorrido contra a liquidação adicional n.° 2009 5..., em sede de IRS, respeitante ao ano de 2007;

(ii) Com efeito, perante a matéria de facto dada como provada na Douta Sentença ora recorrida, o Douto Tribunal de 1.ª instância, acertadamente, julgou a referida impugnação judicial totalmente procedente, no sentido de que “As mais-valias geradas, também como se concluiu, estão, no caso dos autos, excluídas de tributação por se considerar preenchido o art. 10° n° 2 al. a) do CIRS. A liquidação viola o princípio da incidência, porquanto, ao tempo do facto tributário, este (a alienação onerosa) estava expressamente excluído de tributação, por se verificar que a mesma só ocorreu com a escritura pública de compra e venda e não, com o contrato-promessa”;

(iii) Como questão prévia, cumpre salientar que, em conjugação do disposto no n.° 3 do art.° 282.° do CPPT, no n.° 1 do art.° 138.° do CPC, no art.° 28.° da LOSJ e no n.° 2 do art.° 138.° do CPC e da alínea e) do art.° 279.° do Código Civil, o termo do prazo para a Recorrente apresentar as suas alegações verificou-se no dia 2 de Maio de 2014;

(iv) Atento o facto de o carimbo de entrada das alegações apresentadas pela Recorrente, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, datar de 5 de Maio de 2014, poderá verificar-se a extemporaneidade das mesmas, o que, a ter sucedido, implicaria que o recurso tivesse sido julgado logo deserto no Douto Tribunal recorrido, nos termos do n.° 4 do art.° 282.° do CPPT;

(v) Por outro lado, nos termos e para os efeitos do n.° 1 do art.° 639.° do CPC, a Recorrente deveria ter tomado uma posição clara, nas conclusões, sobre as questões jurídicas objecto do recurso, especificando as normas que considera violadas ou o erro de interpretação que imputa à decisão, o que implicaria, necessariamente, proceder a uma análise crítica da sentença recorrida, expondo os factos que, no seu entender, não foram correctamente valorados e subsumindo-lhes o Direito aplicável;

(vi) Porém, não indica a Recorrente uma única norma jurídica em virtude da qual se pudesse, sequer, presumir que, face aos factos dados como provados na Douta Sentença recorrida, os quais não foram impugnados pela Recorrente, nos encontraríamos perante uma situação de “tradição e posse dos direitos objectos do contrato promessa” (nem, em bom rigor, o conseguiria fazer, porque tal norma inexiste);

(vii) Com efeito, deveria a Recorrente ter identificado, não só, as eventuais “normas jurídicas violadas”, como os “concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados”, bem como a indicação dos “meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida” (nos termos e para os efeitos da alínea a) do n.° 2 do art.° 639.° e das alíneas a) e b) do n.° 1 do art.° 640.°, ambos do CPC);

(viii) O que, no entender do Recorrido, a Recorrente não logrou cumprir, pelo que não serão perceptíveis, quais os pontos da sua discórdia face à factualidade dada como provada, e consequente subsunção ao direito plasmado na Douta Sentença recorrida;

(ix) Em face do exposto, afere-se que, aquando das suas alegações, e de modo a permitir ao Douto Tribunal ad quem proceder a uma correcta reapreciação da factualidade em causa, e consequentemente, apreciar a sua correcta subsunção do Direito aplicado, a Recorrente deveria ter procedido não apenas à delimitação do objecto do recurso, identificando, na Douta Sentença recorrida, os concretos pontos de facto que considera terem sido incorrectamente julgados, e deveria ter indicado os concretos meios probatórios, constantes do processo ou da gravação de prova testemunhal realizada, que impunham um conclusão diferente da que foi alcançada pela Douta Sentença recorrida;

(x) Pelo que, recorrendo às conclusões ínsitas no Douto Acórdão de 10 de Abril de 2014, do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo n.° 04444/11, “não pode deixar de estar votado ao insucesso o fundamento do recurso em análise devida a manifesta falta de cumprimento do ónus mencionado supra”;

(xi) Acresce que, da análise das alegações apresentadas pela Recorrente, é possível concluir que não é invocada uma só disposição legal que legitime a conclusão de se ter verificado uma transmissão das participações sociais, nem tão pouco contesta fundamentadamente os pontos essenciais em que assentou a Douta Sentença recorrida;

(xii) Em face do exposto, entende o Recorrido que, salvo melhor opinião, as alegações de recurso produzidas pela Recorrente poderão não cumprir também os requisitos exigidos nos n.os 1 e 2 do art.° 639.° do CPC;

(xiii) No que se refere, em concreto, ao objecto das alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, concluiu, e bem, a Douta Sentença recorrida que, face a toda a factualidade provada “as mais-valias geradas, também como se concluiu, estão, no caso dos autos, excluídas de tributação por se considerar preenchido o art. 10° n° 2 al. a) do CIRS (...) porquanto, ao tempo do facto tributário, este (a alienação onerosa) estava expressamente excluído de tributação, por se verificar que a mesma só ocorreu com a escritura pública de compra e venda e não, com o contrato-promessa”, sendo que a Douta Sentença recorrida não merece qualquer censura;

(xiv) Com efeito, não resulta da matéria de facto dada por assente, e bem, não tendo sido a mesma objecto de impugnação por parte da Recorrente, qualquer comprovação de que se verificou a “tradição” das participações sociais, por parte do Recorrido, a favor da sociedade V..., aquando da celebração do contrato promessa de compra e venda;

(xv) Na medida em que decorre do contrato-promessa que a efectiva transmissão das acções apenas poderia ser exigida ao Recorrido a partir do dia 30 de Novembro de 2007, resultando ainda cabalmente provado que, por convenção das partes, o contrato definitivo de transmissão das 2.498 acções detidas pelo Recorrido na sociedade V..., a favor da sociedade V..., veio a ser efectivamente realizado em 29 de Novembro de 2007, bem andou a Douta Sentença recorrida ao decidir no sentido de que o Recorrido adquiriu originalmente as acções da sociedade V...na data de 24 de Novembro de 2006 e procedeu à sua alienação apenas na data de 29 de Novembro de 2007;

(xvi) Contudo, vem a Recorrente apontar como “circunstâncias” reveladoras da alegada tradição e posse das acções a favor da sociedade V..., o facto de o Recorrido se ter obrigado a não praticar actos que pudessem pôr em causa a administração da sociedade V..., bem como o facto de, em 22 de Outubro de 2007, ter sido inscrito como vogal do Conselho de Administração da sociedade V...o Senhor C..., simultaneamente administrador único da sociedade V..., e ainda o facto de, a partir da assinatura do contrato- promessa de transmissão das acções, ter sido estipulado que o Recorrido seria representado, no exercício dos seus direitos como accionista, por pessoas indicadas pela adquirente;

(xvii) Sucede, porém, que bem andou a Douta Sentença recorrida ao sustentar que “tal facto [representação do Recorrido no exercício dos seus direitos e faculdades como accionista da sociedade adquirida] em confronto com o depoimento da testemunha (...) não pode ser interpretado no sentido em que a Administração Tributária fez, ou seja, de que a partir do contrato-promessa, o Impugnante já não detinha as acções em causa” (comentário nosso);

(xviii) Para além de ter concluído que “pelo facto de a cláusula terceira do contrato- promessa referir que o Impugnante será 'representado' no exercício dos seus direitos e faculdades como accionista, também não importa, de imediato, como o fez a Administração Tributária, a interpretação de que deixava de ser titular das referidas acções. De facto, pela leitura do contrato-promessa, em lado algum se refere que os direitos inerentes à titularidade das partes sociais são transmitidos no momento da celebração do contrato-promessa. Aliás, expressamente se refere que a efectiva transmissão de acções só poderia ser exigida ao Impugnante a partir do dia 30/11/2007, não obstante o contrato definitivo ter sido celebrado a 29/11/2007’ (destaque nosso);

(xix) Neste sentido, a Douta Sentença recorrida fez uma correcta interpretação da matéria de facto que resulta dos autos, inexistindo igualmente qualquer erro na interpretação do Direito aplicável;

(xx) Com efeito, é notória a confusão de conceitos jurídicos (mandato de representação conferido no interesse do mandante vs mandato de representação conferido no interesse de terceiros) realizada pela Recorrente;

(xxi) Isto porque, de acordo com o n.° 1 do art.° 380.° do CSC, sempre estaríamos perante uma mera relação de representação voluntária, sendo exigido que o representante aja em nome do representado, ou seja, no caso vertente, em nome do Recorrido e nunca em nome da sociedade V...;

(xxii) Acresce que, resulta da conjugação do disposto nos art.os 1157.°, alínea a) do art.° 1161.° e 1178.° do CC, que, na ausência de convenção em contrário, o mandato presume-se sempre conferido em nome e por conta do mandante, ou seja, qualquer pessoa que fosse nomeada representante do Recorrido teria de actuar em nome, por conta e no interesse deste último, perante a falta de qualquer convenção que definisse que o mandado seria conferido no interesse da sociedade V..., sendo que, não resulta da matéria dado como provada pelo Tribunal ad quo, nem tão pouco é alegado pela Recorrente, a existência de um qualquer mandato com poderes de representação conferido no interesse da sociedade V...;

(xxiii) Naturalmente, na falta de prova em contrário, bem andou a Douta Sentença recorrida ao concluir no sentido de que “em lado algum se refere que os direitos inerentes à titularidade das partes sociais são transmitidos no momento da celebração do contrato-promessa”;

(xxiv) Por outro lado, resulta da conjugação do disposto no n.° 1 do art.° 373.°, n.° 1 do art.° 405.° e n.° 1 do art.° 64.° do CSC, que o administrador C... deveria actuar no interesse da sociedade e dos seus sócios, e não no interesse de uma terceira entidade tal como a sociedade V..., sob pena de poder vir a ser responsabilizado pelos danos causados à sociedade V..., nos termos do art.° 72.° do CSC;

(xxv) Acresce que, ficou por demonstrar pela Recorrente como seria possível o Recorrido ter indicado, de forma isolada, o administrador C..., quando apenas detinha uma participação de 24,98% no capital social da sociedade V..., sendo que, nos termos do n.° 1 do art.° 386.° do CSC, a assembleia-geral de accionistas delibera por maioria de votos emitidos;

(xxvi) Sendo que é falso o argumento vertido nas alegações apresentadas pela Recorrente no sentido de que o Recorrido, em conjunto com A... detinham acções que correspondiam a 50% do capital social da V..., isto porque, as acções detidas, em conjunto, representavam apenas 49,98% do capital social;

(xxvii) Neste sentido, resulta evidente que o administrador C... foi designado por comum acordo de todos os accionistas da sociedade V...;

(xxviii) No que se refere às alegações da Recorrente no sentido de que se verificou a tradição das participações sociais detidas pelo Recorrido a favor da sociedade V..., a partir da assinatura do contrato-promessa, uma vez que resultava do clausulado no contrato-promessa que o Recorrido se obrigava a não praticar qualquer acto que pudesse pôr em causa a sociedade (?), cumpre referir que a existência de uma cláusula deste tipo apenas reforça o facto de que as acções continuaram na posse e título do Recorrido até ao momento da venda, dado que, apenas na posse das acções poderia o Recorrido praticar qualquer acto que pudesse colocar em causa o cumprimento do contrato-promessa ou participar em qualquer deliberação que pudesse colocar em causa a sociedade V...;

(xxix) A Recorrente olvida que, nos termos da presunção legal estabelecida na alínea a) do n.° 3 do art.° 10.° do Código do IRS (na redacção em vigor à data dos factos), a mesma assentava em dois requisitos de verificação cumulativa: (i) a celebração de um contrato e (ii) a entrega física da coisa objecto do contrato, independentemente da forma;

(xxx) No entanto, a prova documental e testemunhal produzida nos autos é manifestamente insuficiente para que se possa concluir pela efectiva tradição das acções detidas pelo Recorrido a favor da sociedade V..., bem pelo contrário, pelo que a Douta Sentença recorrida não merece qualquer tipo de censura;

(xxxi) Acresce que, nos termos do disposto no art.° 101.° e n.° 1 do art.° 104.° do Código dos Valores Mobiliários, aprovado pelo Decreto-Lei n.°486/99, de 13 de Novembro, na redacção em vigor à data dos factos, a transmissão de acções ao portador envolve a transferência da posse da participação societária que elas representam, com todos os direitos e obrigações inerentes às acções transmitidas;

(xxxii) Resultando do exposto que as acções ao portador se transmitem pela entrega material do título, e não resultando dos autos qualquer prova no sentido de que o Recorrido procedeu à entrega material das acções à sociedade V..., aquando da celebração do contrato-promessa, mas apenas meras presunções, sem valor legal, relativamente às quais tão pouco é possível retirar as ilações apresentadas pela Recorrente, e não se demonstrando, em momento algum, quer através da análise da prova documental, quer da prova testemunhal, que a sociedade V... exerceu os direitos inerentes à titularidade das acções em questão, nomeadamente, o direito a dividendos, juros e outros rendimentos, o direito de voto ou exercício do direito de voto por terceiro actuando em seu nome e por sua conta, será forçoso concluir que as acções detidas pelo Recorrido na sociedade V...apenas foram entregues na data da celebração do contrato definitivo de compra e venda das acções, ou seja, em 29 de Novembro de 2007;

(xxxiii) Motivo pelo qual resulta da Douta Sentença recorrida, como não poderia deixar de ser, que “a Administração Tributária, errou ao considerar, conforme consta do relatório de inspecção tributária, que o Impugnante deteve as acções em causa, por um período inferior a 12 meses”;

(xxxiv) Em virtude do exposto, é indiscutível que a entrega das acções, a traditio, assume valor inexoravelmente determinante, não só para a eficácia da transmissão da propriedade, como também, necessariamente, para o exercício dos direitos incorporados nos títulos negociados, e, principalmente, para que a mais-valia resultante dos ganhos obtidos se considere obtida no momento da entrega;

(xxxv) Termos em que, ao contrário do que alega a Recorrente, deverá a Douta Sentença ora recorrida ser mantida na ordem jurídica, uma vez que a mesma procede a um correcto julgamento da matéria de facto e revela a adequada interpretação e aplicação do disposto nos art.° 10.°, n.° 2, alínea a), do Código do IRS, bem como do disposto na alínea a) do n.° 3 do referido art.° 10.° do referido diploma legal.

Termos em que, sempre com o Mui Douto Suprimento de Vossas Excelências, Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Sul, deverá o presente recurso jurisdicional ser julgado improcedente e, em consequência, ser mantida in totum a Douta Sentença recorrida,

Assim se fazendo JUSTIÇA!»


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A Exma. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal, nos termos do artigo 289.º, n. º1 do CPPT, veio, relativamente à questão da intempestividade do recurso, arguida pelo recorrido em sede de contra-alegações recursivas, vem dizer que, em seu entender, a mesma não se verifica dado que as alegações foram enviadas via CTT em 02/05/2014.

Quanto ao mérito do recurso, ofereceu o seu parecer no sentido da improcedência do mesmo.


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Com dispensa de vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta primeira Subsecção do Contencioso Tributário para decisão.

II – OBJECTO DO RECURSO

Como sabemos, independentemente das questões que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente é pelas conclusões do recorrente nas alegações de recurso que se determina o âmbito da sua e intervenção (cfr. artigos 635.º, n.º 4 e 639 n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003 de 26/06).

Atento, in casu, a questão que se nos coloca, para além da questão prévia suscitada pelo recorrido quanto à tempestividade do recurso, é a de saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto ao considerar que in casu, se verificam os pressupostos de exclusão de tributação de IRS (mais-valias) pela transmissão de partes sociais (ações) detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses (alínea a) do n, º 2 do artigo 10.º do CIRS), ou, se pelo contrário, ficou demonstrada a tradição e posse dos direitos objeto do contrato-promessa, nos termos previstos no art.º 10.º, n.º 3, al. a), do Código do IRS (CIRS), como alega a recorrente.


III – FUNDAMENTAÇÃO

De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

« A) Em 24/11/2006, o Impugnante celebrou “contrato de compra e venda de acções” com M... que aqui se dá por integralmente reproduzido em que, aquele, juntamente com J..., adquiriram acções representativas de 25% do capital social da sociedade V..., correspondente a 5.000 acções com o valor nominal de €5,00 cada (cfr. fls. 50 a 53 dos autos);

B) Em 02/11/2006, o impugnante emitiu cheque no valor de €12.500,00 a M... (cfr. fls. 55 dos autos);

C) O Impugnante celebrou em 23/08/2007, “contrato-promessa de transmissão de acções” com V..., S.G.P.S. S.A. referente a acções representativas do capital social da sociedade V...- Investimentos e Participações, SGPS S.A., que aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 86 a 95 dos autos);

D) Em 23/08/2007 V..., S.G.P.S.S.A. emitiu cheque à ordem do Impugnante, no valor de €599.700,00 (cfr. fls. 96 dos autos);

E) Em 22/10/2007, foi inscrito como vogal do Conselho de Administração de V..., C... (cfr. fls. 73 dos autos);

F) Em 29/11/2007, o Impugnante celebrou “contrato de compra e venda de acções” com V..., S.G.P.S. S.A. referente a acções representativas do capital social da sociedade V...- Investimentos e Participações, SGPS S.A., que aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 76 a 82 dos autos);

G) Em 29/11/2007 V..., S.G.P.S.S.A. emitiu cheque à ordem do Impugnante, no valor de €150.000,00 (cfr. fls. 84 dos autos);

H) Por Ordem de Serviço Interna n° OI20090…, emitida em 26/03/2009, pela Direcção de Finanças de Faro, foi determinada a realização de acção de inspecção ao Impugnante (cfr. fls. 41 dos autos);

I) A acção de inspecção incidiu sobre IRS do exercício de 2007 (mais-valias) (cfr. fls. 45 dos autos);

J) Em Março/Abril de 2009, uma vez que, não consta um dia concreto, foi elaborado o relatório de inspecção tributária, que se dá aqui por integralmente reproduzido (cfr. fls. 41 a 47 dos autos);

K) Em 30/04/2009 o Chefe de Equipa R... emitiu parecer com o seguinte teor: “Concordo. (...)” (cfr. fls. 41 dos autos);

L) Em 06/05/2009, o Director de Finanças de Faro emitiu despacho com o seguinte teor: “Concordo. Proceda-se em conformidade.” (cfr. fls. 41 e 42 do p.a.);

M) Em 07/05/2009, através do oficio n° 5685, foi enviada ao Impugnante notificação das correcções resultantes do relatório de inspecção tributária (cfr. fls. 38 dos autos);

N) Em 20/05/2008, o Impugnante apresentou Mod. 3 de IRS onde declarou a compra e venda das partes sociais referidas na alínea E), mas considerou-a excluída de tributação (cfr. fls. 13 a 22 e 77 do p.a.);

O) Em 30/04/2009 foi elaborado “documento de correcção/ declaração oficiosa” (cfr. fls. 53 a 65 do p.a);

P) Foi emitida a liquidação n° 20095..., referente a IRS de 2007, no valor de €77.765,95 (cfr. fls. 101 dos autos);

Q) Foi emitido documento de cobrança com acerto de contas, com inclusão dos juros compensatórios no valor de €2.738,78, para pagamento até dia 22/07/2009, no valor total de €76.459,76 (cfr. fls. 100 dos autos);

R) Não tendo sido paga a liquidação ora impugnada, foi extraída a competente certidão de dívida o que originou o processo de execução fiscal n° 1... (cfr. fls. 72 do p.a.);

Fundamentação do julgamento:

Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na documentação junta com os articulados e no processo administrativo junto aos autos, cuja veracidade não foi posta em causa, bem como, do depoimento da testemunha arrolada pela Fazenda Pública.

A testemunha, A..., que, por ter sido o inspector tributário que elaborou o relatório de inspecção tributária, tem conhecimento directo dos factos a que foi questionado e atenta a espontaneidade e clareza do seu depoimento, esclareceu o tribunal sobre os mesmos e contribuiu para o apuramento da verdade dos factos.

Em suma, referiu como foi feita a inspecção, os documentos que foram consultados e que se encontram nos autos. Confirmou o conteúdo do relatório de inspecção tributária. Confrontado com a “cláusula terceira” do contrato-promessa e perguntado se encontrou alguma procuração que atribuísse poderes de representação, disse que todos os documentos estão no processo e que bastou a leitura da cláusula para concluir a representação tal qual referido no relatório.

Esclareceu que o administrador nomeado, C..., não poderia tomar decisões isoladamente, porque apenas representava 25% dos direitos da V...e que foram transmitidos à V....

III-2. Factualidade não provada:

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.»


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De direito

Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRS e respetivos juros compensatórios, relativas ao ano de 2007 e, em consequência, determinou a anulação do ato de liquidação contestado.

Contra o assim decidido insurge-se a recorrente (FP), tal como resulta sintetizado nas conclusões recursivas supratranscritas.

De acordo com a delimitação de apreciação do presente recurso, já autonomizada, encetamos pela análise da questão prévia suscitada pelo recorrido e que se reporta à tempestividade do recurso, já que esta constitui uma exceção que, a verificar-se, inviabiliza o conhecimento de mérito.

Vejamos então.

Decorre do n.º 2 e 3 do art.º 282.º, do CPPT, na redação vigente à data dos factos, que o prazo para alegações a efetuar no tribunal recorrido é de 15 dias contados, para o Recorrente, a partir da notificação do despacho que admite o recurso.

Importa reter que o salvatério foi admitido por despacho proferido em 02/04/2014 e notificado às partes em 03/04/2014, presumindo-se notificado no 3.º dia posterior ao registo ou no 1.º dia útil seguinte, quando aquele, o não seja. Por conseguinte, “in casu”, as partes consideram-se notificadas em 07/04/2014, segunda feira.

Atendendo a que as férias judiciais no ano de 2014 decorreram entre 13/04 (domingo de ramos) e 21/04 (segunda feira de Páscoa), a contagem do prazo suspendeu-se nesse período (cfr. artigo 28.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário (LOSJ) e no artigo 138.º, n.º 1, do CPC).

A contagem do prazo, iniciada assim em 08/04/2014, e termina em 01/05 do mesmo ano, porém, sendo este dia, feriado, transpõe-se o seu terminus para o 1.º dia útil seguinte, 02/05/2014, (n.º 2 do, já citado artigo 138.º do CPC).

Assim e tendo o articulado com as alegações de recurso sido remetidas ao tribunal com o registo dos CTT n.º RF 01…6 PT, constatamos, pelo documento extraído do site dos CTT, referente a “pesquisa de objetos” que esse registo foi aceite na estação de Faro em 02/05/2014, consideramos assim ser essa a data do envio, através dos CTT.

Do exposto se conclui que as alegações recursivas foram apresentadas em tempo, carecendo de razão, nesta parte, o recorrido.

Dito isto, prosseguimos

Na situação que nos ocupa damos conta que a discordância da apelante com o decidido na sentença recorrida se fundamenta no facto de não ter sido relevado na apreciação factual, as circunstâncias em que foi elaborado o contrato de promessa de transmissão de ações celebrado em 23/08/2007 nomeadamente que: (i) com a celebração do referido contrato foi pago pela adquirente 80% do preço (ii) no contrato-promessa ficou estabelecido que seria a sociedade V... (promitente compradora das ações detidas pelo impugnante) a indicar pessoas para exercido dos direitos e faculdades dos acionistas transmitentes, (iii) essa indicação ficaria, ainda, a suas próprias expensas (da sociedade V...), (iiii) em, 22/10/2007, foi inscrito Vogal do Conselho de Administração da V..., C... que é simultaneamente Administrador único da V.... - (conclusões 6. a 10.)

Da conclusão 11., retira-se que a recorrente pretende demonstrar que: “o recorrido deixou de ter qualquer domínio sobre as ações e os respetivos direitos desde a assinatura do contrato promessa.

Concluindo diz que a sentença não valorou devidamente os factos relevantes, incorrendo em erro de julgamento por não os subsumir à presunção contida na norma do artigo 10° n.º 3 alínea a) do CIRS. – (conclusão 21.)

Vejamos então

A impugnação da matéria de facto, encontra-se, em primeira linha, balizada pelo disposto no artigo 640º do CPC e obedece a regras que não podem deixar de ser observadas, impondo-se, nomeadamente, ao recorrente a obrigatoriedade de especificar, nas alegações de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida, sendo que o não cumprimento do ónus fixado o recurso quanto à matéria de facto estará condenado ao insucesso.

Daí que sobre o recorrente impende um especial ónus de alegação quando pretenda efetuar impugnação com este âmbito, impondo-se-lhe, por conseguinte, respeito pela plena satisfação das regras ali previstas.

Por seu lado ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no artigo 662.º do CPC, incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objeto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre as questões controvertidas.

Acolhemos, quanto a esta matéria e, bem assim, quanto ao princípio da livre apreciação da prova pelo tribunal de recurso a posição largamente adotada neste TCA Sul transcrevendo parte do acórdão deste Tribunal, proferido em 08/05/2019 do processo n.º 838/17.0BELRS,

Diz-se ali:

“(…)

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).

(…)”

Em suma, dir-se-á que a alteração da matéria de facto pressupõe assim a existência de nítida disparidade entre erro na sua apreciação e a divergência do sentido em que se formou a convicção do julgador, sendo que a respetiva reapreciação por parte do tribunal de recurso está limitada aos casos em que ocorreu erro manifesto ou grosseiro ou em que os elementos documentais fornecem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi considerado no tribunal a quo, sendo certo que na situação em análise, pese embora venha alegado erro de julgamento, não vem expressamente enunciada qualquer situação em que se conteste a matéria de facto fixada no probatório.

Na verdade, o recorrente não põe em causa a matéria de facto apurada no texto decisório, o que diz é que, a sentença não valorou devidamente os factos relevantes, nomeadamente: os que constam do contrato-promessa realizado em agosto de 2007.

Ora, da materialidade dada por provada pelo tribunal a quo consta que - ponto C) - «[O]o Impugnante celebrou em 23/08/2007, “contrato-promessa de transmissão de acções” com V..., S.G.P.S. S.A. referente a acções representativas do capital social da sociedade V...- Investimentos e Participações, SGPS S.A., que aqui se dá por integralmente reproduzido” (cfr. fls. 86 a 95 dos autos)».

Como vimos, os factos invocados pela recorrente nas conclusões 7. 8. 9. 10., e bem assim, o remate enunciado na conclusão 11., encontram assento no teor dos contratos dados por reproduzidos no probatório, assim, e sem olvidar que a remissão para documentos, tem apenas o alcance de dar como provada a existência desses documentos, e não o de dar como provada a existência de factos ali referidos importa, ainda assim, atentar no teor dos referidos contratos considerando que, com a referência a tal factualidade a recorrente pretende retirar efeitos relevantes quanto ao momento em que o ganho foi obtido, pelo que, para melhor entendimento, se entende pertinente, proceder ao seguinte aditamento (artigo 662.º do CPC):


S) O “contrato-promessa de transmissão de ações” enunciado no ponto C) do probatório foi celebrado entre:

“1. A..., natural da freguesia do Campo Grande, concelho de Lisboa, casado (…), residente na E..., Quinta do Lago, Almancil, (…), adiante abreviadamente designada por “AFC”;
“2. J..., natural da freguesia de São Sebastião da Pedreira, concelho de Lisboa, divorciado, residente na E..., Quinta do Lago, Apartamento 5… Almancil, (…) adiante abreviadamente designada por “JFC”;
adiante conjuntamente designados por “Transmitentes”;
E
V..., S.G.P.S., S.A., com sede em Rua A... em Loulé (…), adiante designada por “Adquirente”, representada por C...», na qualidade de Administrador Único, com poderes para o acto;”
Considerando que:
(…)
b) As acções são representadas por títulos ao portador, (…)
- Cfr. consta de fls. 57 e seg. dos autos

T) Resulta da clausula terceira do referido “contrato-promessa de transmissão de ações”, com o titulo “Obrigações acessórias até à celebração do contrato definitivo”, que:

“1. A partir da presente data, os Transmitentes AFC e JFC serão representados, no exercício dos seus direitos e faculdades como accionistas da V..., pelas pessoas que para esse efeito forem indicadas pela Adquirente, nomeando os mandatários ou representantes que forem indicados para o efeito, a expensas da Adquirente.

2. Até à celebração do contrato definitivo, os Transmitentes AFC e JFC obrigam- se a não praticar actos que possam pôr em causa o cumprimento deste contrato ou prejudicar a administração da V....

3. Em face do disposto nos números anteriores da presente cláusula, a Adquirente fica obrigada a assegurar o efectivo pagamento, aos Transmitentes AFC e JFC, do valor correspondente à totalidade do preço das acções cuja transmissão é prometida nos termos do presente contrato, independentemente das decisões que venham a ser tomadas pela V..., nomeadamente, mas sem limitar, alterações do contrato social, redução do capital social, amortização de participações sociais, fusão, cisão ou transformação, bem como quaisquer outros actos que ponham ou possam pôr em causa a existência das participações a transmitir ou que dificultem ou tomem impossível o cumprimento da obrigação de transmissão das acções e do correspondente pagamento do preço.”

- Cfr. consta de fls. 64 e seg. dos autos

Estabilizada a matéria de facto, vejamos, então o direito.

Recordemos que a matéria de apelação se resume a saber se estão reunidos os requisitos impostos no artigo 10º n.º 3 alínea a) do CIRS.

Antes de prosseguir, vejamos o que, quanto a esta matéria estipulava, à data dos factos o artigo 10° do CIRS, nas alíneas que para o caso importa:

“1 - Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:

(...)

b) Alienação onerosa de partes sociais, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, e de outros valores mobiliários e, bem assim, o valor atribuído aos associados em resultado da partilha que, nos termos do artigo 75. ° do Código do IRC, seja considerado como mais-valia;

(…)

2 - Excluem-se do disposto no número anterior as mais-valias provenientes da alienação de:

a) Acções detidas pelo seu titular durante mais de 12 meses;

(...)

3 - Os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática dos actos previstos no n.° 1, sem prejuízo do disposto nas alíneas seguintes:

a) Nos casos de promessa de compra e venda ou de troca, presume-se que o ganho é obtido logo que verificada a tradição ou posse dos bens ou direitos objecto do contrato.

b) Nos casos de afetação de quaisquer bens do património particular a atividade empresarial e profissional exercida pelo seu proprietário, o ganho só se considera obtido no momento da ulterior alienação onerosa dos bens em causa ou da ocorrência de outro facto que determine o apuramento de resultados em condições análogas

(...) ". (o negrito é nosso)

Decorre assim, do texto legal, que o conceito de mais-valias integra, os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem nomeadamente da alienação onerosa de partes sociais, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, e de outros valores mobiliários e, bem assim, o valor atribuído aos associados em resultado da partilha que, nos termos do artigo 75.° do Código do IRC (alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º supra transcrito).

Contudo, sem prejuízo do ali estatuído, o legislador quis instituir na alínea a) do referido n.º 3 da mesma disposição legal uma presunção para os casos de promessa de compra e venda ou de troca, prevendo que, nestas situações, o ganho se considera obtido, logo que verificada a tradição ou posse dos bens ou direitos objeto do contrato, ou seja, escoa da norma citada uma exceção às regras de incidência tributária segundo a qual a tradição “da coisa” ou a posse dos bens ou direitos objeto do contrato é equiparada a alienação, determinando-se por essa tradição ou posse o momento da exigibilidade do tributo (1), aqui considerado como transmissão para efeitos de tributação por aplicação do principio da prevalência da substância sobre a forma que o legislador quis concretizar com este tipo de presunções.

Esta situação não é ímpar em matéria tributária, na verdade, em determinadas situações o legislador recorreu a regras presuntivas para a determinação do momento em que os rendimentos e/ou ganhos se consideram obtidos, designadamente, nas situações previstas nas alíneas a) e b) do n.º 3 da norma supracitada.

Trata-se de presunções legais. Como sabemos, as presunções legais são ilações que a lei retira de um facto conhecido para firmar um outro que é desconhecido, sendo que, conforme decorre do Código Civil (2), quem beneficia de uma presunção legal não tem de provar o facto a que ela conduz, ou seja, apenas tem de provar o facto que serve de base à presunção para se considerar provado o facto presumido.

Todavia, as presunções legais, podem ser ilididas mediante prova em contrário, exceto nos casos em que a lei expressamente o proíba.

Por seu lado o artigo 73.º da LGT, enuncia que “[A]as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário.”

Ora, a presunção estabelecida na alínea a) do n.º 3 do artigo 10.º do CIRS, a que nos vimos referindo, admite sempre prova em contrário, pois que esta é uma norma de incidência tributária.

A respeito de normas de incidência tributária dizem-nos Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (3) que “[S]são normas de incidência, em sentido lato, as que «definem o plano de incidência, ou seja, o complexo de pressupostos de cuja conjugação resulta o nascimento da obrigação de imposto, assim como os elementos da mesma obrigação» (SOARES MARTINEZ, Direito Fiscal, 7.ª edição, página 126. Em sentido idêntico, pode ver-se e NUNO SA GOMES, Manual de Direito Fiscal, volume II, página 56).
Neste sentido, são normas de incidência as que determinam os sujeitos activo e passivo da obrigação tributária, as que indicam qual a matéria colectável, a taxa e os benefícios fiscais. (Obra e local citados).
O termo incidência pode ser utilizado num sentido mais restrito, para referenciar as normas que indicam o sujeito passivo e a definição da matéria colectável, sem abranger a sua determinação. (Sobre este ponto, pode ver-se NUNO SÁ GOMES, Manual de Direito Fiscal, volume II, páginas 56-57).
No entanto, para os efeitos previstos no art. 73.º da LGT e no art. 64.º do CPPT, deve entender-se que a referência a normas de incidência é utilizada na acepção lata, pois as razões que justificam a admissibilidade de ilidir presunções, que se ligam à comprovação da existência real dos pressupostos subjectivos e objectivos da tributação, que é exigida pelo princípio constitucional da igualdade, valem relativamente a qualquer destes pressupostos.”

Nestes termos há que concluir que aquela norma da alínea a) do n.º 3 do artigo 10.º do CIRS, como norma de incidência tributária, que é, consagra uma presunção legal ilidível.

Dito isto e regressando ao caso que nos vem ocupando, temos que a questão central do conflito se foca em ganhos provenientes da alienação de ações, divergindo as partes quanto ao momento em que os ganhos se consideram obtidos para efeitos de tributação em sede de IRS.

Importa assim aferir se, conforme invoca a recorrente (FP), o facto tributário ocorreu na data da celebração do contrato de promessa de compra e venda (23/08/2007) ou, conforme se epiloga na sentença recorrida, na data da celebração do contrato definitivo (29/11/2007) – (cfr. potos C. e F. do probatório).

Vejamos antes de mais o texto decisório, na parte em que assim conclui:

“(…)

O contrato definitivo de compra e venda das acções ocorreu em 29/11/2007.

As acções são representadas por títulos ao portador, os quais não se encontram integrados em sistema de depósito centralizado, como decorre do texto do contrato-promessa celebrado pelo Impugnante, daí a aplicação do art. 101° do Código dos Valores Mobiliários.

Decorre do probatório que a partir da assinatura do contrato promessa, o Impugnante seria representado no exercício dos seus direitos e faculdades como accionista da sociedade adquirida, pelas pessoas que para esse efeito, fossem indicadas pela sociedade adquirente.

Ora, tal facto em confronto com o depoimento da testemunha que confirmou que o administrador nomeado, C..., não poderia tomar decisões isoladamente, porque apenas representava 25% dos direitos da V...e que foram transmitidos à V..., não pode ser interpretado no sentido em que a Administração Tributária fez, ou seja, de que a partir do contrato-promessa, o Impugnante já não detinha as acções em causa.

Acresce que, pelo facto de a cláusula terceira do contrato-promessa referir que o Impugnante será “representado” no exercício dos seus direitos e faculdades como accionista, também não importa, de imediato, como o fez a Administração Tributária, a interpretação de que deixava de ser titular das referidas acções.

De facto, pela leitura do contrato-promessa, em lado algum se refere que os direitos inerentes à titularidade das partes sociais são transmitidos no momento da celebração do contrato-promessa.

Aliás, expressamente se refere que a efectiva transmissão de acções só poderia ser exigida ao Impugnante a partir do dia 30/11/2007, não obstante a celebração do contrato definitivo ter sido celebrado a 29/11/2007.

Da conjugação destes factos, resulta que, a Administração Tributária, errou ao considerar, conforme consta do relatório de inspecção tributária, que o Impugnante deteve as acções em causa, por um período inferior a 12 meses.

Assim sendo, não se encontra preenchido o art. 10° n° 3 a) do CIRS pois não pode operar a presunção, já que faltou à Administração Tributária, provar a tradição dos direitos objecto do contrato-promessa de compra e venda para a sociedade adquirente por entrega do título conforme exigido pelo art. 101° do Código de Valores Mobiliários.

(…)”

Neste ponto, é bom recordar que, o conceito de transmissão para efeitos fiscais nem sempre é coincidente com aquela que é tida na lei civil, desde logo porque, o interesse da Administração Tributária incide sobre a realidade fáctica e económica, abstraindo-se por vezes da questão formal, com a prevalência da substância, contrariamente ao conceito civil de transmissão que assenta na formalidade, ou seja, no titulo.

Esta posição obteve acolhimento legal nas regras de incidência tributária nomeadamente, nos casos de promessa de compra e venda de bens, com relevância para a situação material resultante da simples mudança dos possuidores dos bens e, neste sentido, a lei ficcionou o momento da transmissão naquele em que se verifica a tradição ou posse, não a propriedade.

Situação que se mostra legalmente assumida pelo n.º 3 do artigo 11.º da LGT que de forma residual, vem dizer: “[P]persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar deve atender-se à substância económica dos factos tributários.”

Neste sentido acolhemos, para simplificar o que se deixou dito no acórdão do STA proferido em 13/07/2016 processo n.º 01624/15, a respeito de uma questão diferente da que nos ocupa, mas de formato idêntico, com a diferença de que se trata de contrato promessa de compra e venda e tradição do imóvel, diz-se assim: “… o conceito de transmissão fiscal é apenas um quando se trate da delimitação material da incidência fiscal (v. g. art. 10º, nº 1, a) e nº 3 do CIRS) ou quando se trate de uma delimitação negativa dessa mesma incidência (art. 5º do DL 442-A/88), pois que na relação de direito fiscal aqui em causa, do que se trata é da transmissão fiscal do bem e, correspectivamente, da substância económica dos factos, e não da sua transmissão civil e, assim sendo, aquele conceito de “aquisição” previsto no art. 5º do citado DL abrange a transmissão fiscal relevante. Pelo que, tendo ficado provada a celebração do contrato promessa de compra e venda e a ocorrência da tradição do imóvel, anteriormente a 1/1/1989, é aplicável a aludida disposição de direito transitório, constante do DL nº 442-A/89.
(…)
Mas, por outro lado, na interpretação legal do regime transitório previsto no apontado art. 5º do DL 442-A/88, não pode desconsiderar-se que o momento que, no caso, a actual norma de incidência presume como sendo aquele em que se verifica o acréscimo de rendimento que origina a tributação, também é, precisamente, o da tradição ou posse: de acordo com a al. a) do nº 1 do art. 10º do CIRS consideram-se mais valias os ganhos obtidos com a alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, sendo que logo a al. a) do nº 3 do mesmo art. 10º estatui que «Nos casos de promessa de compra e venda ou de troca, presume-se que o ganho é obtido logo que verificada a tradição ou posse dos bens ou direitos objecto do contrato». Isto é, «[A] lei prevê que a verificação da tradição da coisa ou da posse dos bens ou direitos objecto do contrato seja equiparada a alienação, determinando-se por essa tradição ou posse o momento da exigibilidade do tributo.» (José Guilherme Xavier Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, p. 428).)
Ou seja, esta “transmissão fiscal” relevará como “aquisição” na esfera jurídica daquele para quem é operada a tradição do imóvel, não se vendo, que seja de excluir, para efeitos da questionada disposição transitória, este conceito de transmissão fiscal.
(…)”

Em suma, advindo provado o momento da tradição ou posse dos bens ou direitos objeto do contrato promessa de compra e venda, presume-se, sem mais, que o ganho é obtido nesse mesmo momento, não obstante, tal presunção pode, como já se deixou dito, ser afastada se emergir prova capaz de demonstrar que o ganho foi granjeado em momento diferente.

Porém, antes de avançar damos conta de que as ações, enquanto valores mobiliários que são, podem ser “nominativos ou ao portador, conforme o emitente tenha ou não a faculdade de conhecer a todo o tempo a identidade dos titulares.”, conforme decorre do artigo 52.º do Código dos Valores Mobiliários (CVM).

Em matéria de transmissão das ações tituladas ao portador, como vimos que é o caso dos autos (ponto S. da materialidade dada por provada) opera o estatuído nos n.ºs 1 e 2 do artigo 101.º do Código dos Valores Mobiliários CVM, em vigor à data dos factos, de acordo como o qual, os valores mobiliários titulados ao portador se transmitem por entrega do título ao adquirente ou ao depositário por ele indicado, por registo na conta deste, se os títulos já estiverem depositados junto do depositário indicado pelo adquirente, neste caso, com efeitos a partir da data do requerimento do registo.

Sabemos que o exercício de direitos inerentes aos valores mobiliários titulados ao portador depende da posse do título ou de certificado passado pelo depositário, nos termos do n.º 2 do artigo 78.º (cfr. n.º 1 do artigo 104.º do CVM).

Dito isto, regressemos ao caso que nos ocupa para aferir se da materialidade provada se pode extrair, que, ao arrepio do decidido na sentença recorrida, se mostra provado o alegado pela recorrente, ou seja “… a existência da sua tradição no momento da celebração do contrato promessa de venda…” – (clausula 15.), situação que, a verificar-se, releva para efeitos fiscais.


Considerando que, os promitentes transmitentes se obrigaram expressamente, até à celebração do contrato definitivo, a não praticar atos que possam pôr em causa o cumprimento deste contrato ou prejudicar a administração da V..., obrigando-se a não agir, contra a sociedade emissora das ações transmitidas e, por conseguinte, a prescindir dos direitos que lhe são conferidos pela detenção das ações que, pelo referido contrato, prometem transmitir (n.º 2 da cláusula 3.ª – ponto T) do probatório).


Atentando ainda que dessa resignação resulta também uma transferência do exercício dos direitos e faculdades que lhe são conferidos pela detenção das ditas ações enquanto acionistas, para “pessoas que para esse efeito forem indicadas pela Adquirente, nomeando os mandatários ou representantes que forem indicados para o efeito, a expensas da Adquirente.”


Torna-se para nós evidente que, que estamos perante um clausula contratual, que demonstra, que a vontade das partes contratantes vai muito para além da simples promessa de transmissão de ações. Com efeito, há aqui uma clara transferência dos direitos e faculdades advenientes da detenção das ações que por acordo se mostram transferidas da esfera jurídica dos transmitentes, para a sociedade adquirente (promitente adquirente), e que se apresenta para os promitentes transmitentes, e ainda detentores dos títulos, como uma obrigação de “não agir” contra a sociedade emissora das ações transmitidas, ou seja consubstancia, por parte destes, uma renúncia aos direitos dos sócios das sociedades , ao arrepio daquilo que quanto a esta matéria se encontra instituído Código das Sociedades Comerciais (artigo 21.º e 376.º), nomeadamente no que se reporta ao direito de participar nas respetivas deliberações.


Sendo certo que, em troca, de todas estas obrigações de “não agir” ou seja de prescindir do exercício dos respetivos direitos, foi pago 80% do preço (ponto D) do probatório) e a sociedade adquirente assume ainda a obrigação de “… assegurar o efectivo pagamento, aos Transmitentes AFC e JFC, do valor correspondente à totalidade do preço das acções cuja transmissão é prometida nos termos do presente contrato, independentemente das decisões que venham a ser tomadas pela V..., nomeadamente, mas sem limitar, alterações do contrato social, redução do capital social, amortização de participações sociais, fusão, cisão ou transformação, bem como quaisquer outros actos que ponham ou possam pôr em causa a existência das participações a transmitir ou que dificultem ou tomem impossível o cumprimento da obrigação de transmissão das acções e do correspondente pagamento do preço.” (n.º 3 da cláusula 3.ª – ponto T) do probatório).


Ou seja, independentemente, das alterações que vierem a ocorrer até à data da realização do contrato prometido, a sociedade adquirente assume a situação existente à data da realização do contrato de promessa e vincula-se a ela, incluindo quanto a “… actos que ponham ou possam pôr em causa (…) ou tomem impossível o cumprimento da obrigação de transmissão das acções e do correspondente pagamento do preço.”


Aqui chegados, torna-se inconcebível não concluir que a tradição ou posse das ações ocorreu na data do contrato-promessa, sendo essa, a data em que se presume obtido o ganho (alínea a) do n.º 1 e alínea a) do n.º 3, do artigo 10.º do CIRS).


Em suma, acolhendo a jurisprudência citada e, verificando-se, in casu, a existência de um contrato-promessa de transmissão de ações celebrado em 23/08/2007, no qual se refere expressamente (n.º 1 da cláusula 3.ª – ponto T) do probatório) que a partir data da assinatura do contrato, os transmitentes (AFC e JFC, o último aqui recorrido) serão representados, no exercício dos seus direitos e faculdades como acionistas da V..., pelas pessoas que para esse efeito forem indicadas pela Adquirente, nomeando os mandatários ou representantes que forem indicados para o efeito, a expensas da Adquirente, forçosa sairá a ilação de que se verifica a tradição ou posse da coisa, ou seja que a promessa de transmissão dos bens e direitos objeto do presente contrato, é equiparada a alienação e por conseguinte, é por via deste contrato, que o ganho se considera obtido, sendo, consequentemente, o momento da respetiva celebração, aquele em que se verifica a exigibilidade do imposto.


Para além do mais, urge ainda dizer que era ao impugnante que cabia ilidir a presunção, o que sempre poderia fazer, com a apresentação de prova capaz de mostrar que, após a realização do contrato-promessa, exerceu na sociedade emissora das ações os direitos e faculdades que a detenção das mesmas, lhe conferia, já que, repete-se, estamos perante uma presunção ilidível.


Em suma, in casu, importa concluir que ao contrário do que entendeu o tribunal de 1.ª instância, deverá ser mantida a liquidação de IRS do ano de 2007.

Pelo exposto, procede este fundamento do recurso e revoga-se a decisão recorrida.

IV - DECISÂO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a impugnação.

Custas pela Recorrida

Registe e Notifique

Lisboa em 19/11/2020


Hélia Gameiro Silva - Relatora
Ana Cristina carvalho – 1.ª Adjunta
Ana Pinhol – 2.ª Adjunta


Declaração de Voto

Divirjo do entendimento dominante pelo essencial dos fundamentos constantes do acórdão deste Tribunal Central Administrativo de 21.05.2020, proferido no âmbito do processo n.º 675/09.5BELLE que apreciou e decidiu questão em tudo idêntica à dos presentes autos.

Além disso, não vislumbramos, do acervo factual que aqui importa considerar, a prática de qualquer acto material que nos autorize a concluir que a posse dos títulos em causa se verificou no momento da celebração do contrato-promessa de compra e venda.

Negaria, pois, provimento ao recurso.

Lisboa, 19 de Novembro de 2020

Ana Pinhol

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(1) Vide neste sentido José Xavier de Basto, in IRS - Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, outubro de 2007, p. 428).
(2) Artigos 349.º e 350.
(3) In Lei Geral Tributária – Anotada e Comentada, 4.ª edição 2012 - Vislis, - pag. 649/650.