Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 7/20.1BCPRT |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 04/07/2022 |
| Relator: | PATRÍCIA MANUEL PIRES |
| Descritores: | OMISSÃO DE PRONÚNCIA FUNDAMENTAÇÃO POR ADESÃO QUESTÕES/ARGUMENTOS ERRO DE JULGAMENTO |
| Sumário: | I - Se o Tribunal Arbitral aquilatou a questão essencial coadunada com a legitimação por parte da AT, em ordem ao consignado no artigo 23.º, nºs 2 e 3, do CIVA, a aplicar um coeficiente de imputação específico tendo, por remissão e adesão, para Jurisprudência do STA, inclusive, de Uniformização, concluído no sentido de que se encontravam preenchidos os pressupostos atinentes para o efeito, mormente, a invocada “distorção significativa de tributação”, inexiste a arguida omissão de pronúncia. II - O Tribunal não está vinculado a rebater e minudenciar todos os argumentos e alegações avançadas pelas partes, sendo suficiente a pronúncia sobre as concretas questões em litígio, demonstrando que as ponderou. III - A lei apenas impede que a fundamentação se faça por mera adesão aos fundamentos alegados por uma das partes, nada obstando a que a fundamentação se faça por adesão a fundamentação jurídica de anterior Acórdão de Tribunal Superior. IV - Se a Impugnante, sob a invocação de nulidade por omissão de pronúncia, argui um erro de julgamento, assente numa desconformidade com o sentido jurídico adotado na decisão impugnada, tal questão já radica no mérito e nessa medida está cerceada a este Tribunal no âmbito dos seus poderes de cognição. |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | I-RELATÓRIO
BANCO ..., S.A., doravante abreviadamente designado por “Impugnante”, deduziu impugnação de decisão arbitral ao abrigo do n.º 1 do artigo. 27.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, contra a decisão proferida pelo Tribunal Arbitral no âmbito do processo n.º 709/2019-T, que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral, apresentado contra o indeferimento do Recurso Hierárquico deduzido na sequência do indeferimento da Reclamação Graciosa com referência ao ato de autoliquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) consubstanciado na Declaração Periódica de IVA, referente ao período de dezembro de 2010, no qual peticionava a sua anulação parcial e restituição do imposto pago em excesso no montante de €1.610.825,25. *** O Impugnante termina a sua impugnação formulando as seguintes conclusões: “ I. CONCLUSÕES Do objecto e admissibilidade da Impugnação A. Constitui objecto da presente impugnação a decisão arbitral, datada de 13 de Setembro de 2020, proferida pelo Tribunal Arbitral constituído sob a égide de Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) no processo n.º 709/2019-T, no qual decidiu o Tribunal Arbitral “Julgar totalmente improcedente o pedido arbitral” (cf. Documento 1); B. Nos termos do n.º 1 do artigo 27.º do RJAT: “[A] decisão arbitral pode ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo, devendo o respetivo pedido de impugnação, acompanhado de cópia do processo arbitral, ser deduzido no prazo de 15 dias, contado da notificação da decisão arbitral ou da notificação prevista no artigo 23.º, no caso de decisão arbitral emitida por tribunal coletivo cuja intervenção tenha sido requerida nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º”. Relativamente aos fundamentos da impugnação, consagra expressamente o n.º 1 do artigo 28.º do RJAT que “[A] decisão arbitral é impugnável com fundamento na: a) Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; b) Oposição dos fundamentos com a decisão; c) Pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia; d) Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artigo 16.º” C. Conforme se demonstra de seguida, a decisão arbitral sub judice é ilegal por manifesta omissão de pronúncia (cf. a alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT). D. Nos autos a quo está em causa o acto de autoliquidação de IVA consubstanciado na Declaração Periódica de IVA submetida pelo aqui Impugnante com referência ao período de Dezembro de 2010. E. Com efeito, o Impugnante, no decorrer de uma revisão interna de procedimentos, verificou que, no ano 2010, não havia exercido o direito à dedução de IVA que lhe assistia, nos termos dos artigos 20.º e 23.º do Código deste imposto. F. De facto, a componente de capital das rendas facturadas no âmbito dos seus contratos de locação financeira deveria ter sido incluída no cálculo da percentagem de dedução (pro rata), conforme previsto no n.º 4 do artigo 23.º do Código do IVA, e não foi. G. Neste contexto, e por forma a rectificar o apuramento do IVA dedutível, o Impugnante deduziu a Reclamação Graciosa com referência ao acto de autoliquidação de IVA consubstanciado naquela Declaração Periódica de IVA relativa ao período de Dezembro de 2010, requerendo a restituição do IVA entregue em excesso, no total de €1.610.825,25. H. Tendo sido notificado do indeferimento da referida Reclamação Graciosa, o Impugnante interpôs Recurso Hierárquico face ao mesmo e, tendo este Recurso sido igualmente indeferido, o Impugnante submeteu, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a correspondente Impugnação Judicial. Posteriormente, ao abrigo do regime previsto no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018, de 15 de Abril, o Impugnante apresentou junto do CAAD o correspondente PPA quanto à pretensão ali em apreço, tendo o Tribunal Arbitral decidido agora pela sua improcedência (cf. Documento 1, junto supra). I. O Tribunal Arbitral a quo, apreciando o mérito da pretensão do aqui Impugnante, decidiu que “[o ali Requerente, aqui Impugnante] não alegou quaisquer factos que permitam ao tribunal apurar, em sede de matéria de facto, se os custos gerais são preponderantemente determinados pelo financiamento e gestão dos contratos de locação financeira, ou, o invés, pela disponibilização dos veículos” e que, “a questão de direito que vem colocada obteve já resposta do acórdão de uniformização de jurisprudência do STA, em termos a que o tribunal arbitral não pode deixar de aderir, ao consignar que a norma do artigo 23.º, n.º 2 do CIVA efectuou a transposição para o direito interno do artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c) da Sexta Directiva e, por conseguinte, a Administração não está impedida de considerar que, no cálculo do pro rata das operações de locação financeira, apenas sejam tidos em conta os juros, ou seja, apenas a parte da remuneração do locador incluída na renda”. J. Deste modo, na decisão que aqui se impugna, o Tribunal Arbitral decidiu sobre a pretensão do ora Impugnante através da mera remissão para jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo sem, contudo, decidir sobre o caso concreto e as questões suscitadas no PPA. Omissão de pronúncia: o regime legal K. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes – cf. alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código do Processo Civil -, verificando-se o vício de nulidade da Sentença por omissão de pronúncia quando o Tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões ou pretensões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada. L. Conforme reiteradamente decidido pela jurisprudência: “a omissão de pronúncia é um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronuncia sobre questões com relevância para a decisão de mérito, aqui se incluindo as pretensões deduzidas ou os elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, as “concretas controvérsias centrais a dirimir”, acrescentando que “tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem” (…)- por força do princípio do dispositivo, o tribunal tem o dever de resolver todas aquelas que sejam submetidas à sua apreciação”. [cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 5 de Agosto de 2019, proferido no processo n.º 1211/09.9GACSC-A.L2-3 (sublinhados nossos)]; M. Na decisão arbitral aqui impugnada, o Tribunal Arbitral não se pronunciou sobre uma questão essencial para a decisão de mérito do processo, em concreto sobre um elemento integrador do pedido e da causa de pedir que não poderia deixar de ser atendido. A omissão de pronúncia: o caso concreto N. O ora Impugnante deduziu PPA contra a decisão da AT que, no âmbito do processo administrativo precedente, recusou taxativamente o método de dedução utilizado pelo Impugnante [Materializado, nos termos supra expostos, na utilização do método do pro rata de dedução e na inclusão no mesmo da componente de capital das rendas facturadas no âmbito dos seus contratos de locação financeira] e impôs a utilização do método de afectação real, alegadamente ao abrigo dos n.ºs 2 e 3 do artigo 23.º do Código do IVA. O. Suportando-se no Ofício-Circulado n.º 30.108, a AT veio alegar que a aplicação do método do pro rata, pelo Impugnante, conduz a “distorções significativas da tributação” e, com esse fundamento, veio determinar a imposição de um método de afectação real com recurso a um critério de imputação (excluindo a componente de amortização financeira inerente aos contratos de locação financeira). P. Ora, nos termos alegados pela AT, é permitido que “a AT imponha condições especiais na dedução relativa a bens de utilização mista, designadamente quando a aplicação do pro rata geral provoque distorções significativas na tributação, como é o caso”, sendo que “esta imposição pela Administração Fiscal está e estava (à data dos factos) legalmente consagrada, encontrando-se sujeita à demonstração da distorção significativa da tributação (…)” – cf. Ponto 38 do PPA, citando a decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico. Q. Conforme mencionado no PPA, não subsistem dúvidas de que “quer a directiva, quer o código do IVA permitem que a Administração quando verifique que haja distorções significativamente na tributação pode impor ao contribuinte o método da afectação real, sendo certo que este regime funciona a partir da data da sua imposição” [Cf. Acórdão de 31 de Janeiro de 2013 do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferido no processo n.º 1355/11.7BEPRT]– cf. Ponto 60 do PPA, citando jurisprudência do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto. R. Porém, embora a AT tenha alegado que a aplicação do método de pro rata à dedução do IVA nos contratos de locação financeira conduz às tais “distorções significativas na tributação” – requisito necessário para a imposição do método da afectação real nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 23.º do Código do IVA –, nunca o logrou demonstrar ou concretizar. S. A AT limitou-se a alegar que “o apuramento do IVA dedutível segundo a aplicação do pro rata geral estabelecido no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA é susceptível de provocar vantagens ou prejuízos injustificados pela falta de coerência das variáveis nele utilizadas, ou seja, pode conduzir a “distorções significativas na tributação” – cf. Ponto 78 do PPA, citando o Ofício-Circulado n.º 30108 –, sem nada demonstrar. T. Como decorre do PPA, no processo administrativo e no processo arbitral, “os serviços da AT não particularizaram os critérios que justificaram a desconsideração do componente de capital ou o aumento artificial da percentagem de dedução, apoiando-se em afirmações imprecisas e meramente conclusivas, descrevendo de forma sucinta e abstrata o conteúdo de algumas informações administrativas que consubstanciam meras orientações genéricas” – cf. Ponto 80 do PPA. U. Contudo, conforme alegado pelo ora Impugnante, “a mera invocação, pela AT, de que a incoerência das variáveis utilizadas “pode conduzir a «distorções significativas na tributação»” não bastará para a exclusão do componente de capital das rendas do cálculo do prorata geral de dedução” (cf. Ponto 79 do PPA), sendo que, “nos termos da alínea b) do número 3 do artigo 23.º do Código do IVA, a existência efectiva de “distorções significativas” é condição sine qua non para que a AT possa impor o método da afectação real, não sendo que haja uma “mera” possibilidade ou susceptibilidade de essas distorções ocorrerem” (cf. Ponto 81 do PPA). V. Conforme reiterado pelo Impugnante no processo, para que seja possível a imposição de um método de dedução nos termos do artigo 23.º do Código do IVA – como pretende a AT –, as alegadas “distorções significativas da tributação” têm que ser devidamente demonstradas – de resto, a própria AT faz menção a esta necessidade de demonstração das distorções. W. Contudo, apesar de reiteradamente alegada a necessidade de demonstração daquelas distorções e da falta de demonstração das mesmas pela AT in casu, o Tribunal Arbitral a quo não se pronunciou, em momento algum, sobre esta questão. X. Assim, apesar de o ora Impugnante ter suscitado expressamente a ilegalidade da decisão da AT com fundamento na falta de demonstração daquelas “distorções” pela AT, o Tribunal não decidiu i) se tal demonstração pela AT se afigura necessária ou não e, bem assim, ii) se, no caso concreto em análise, se deveria considerar que tal demonstração havia sido concretizada pela AT. Y. Assim, apesar de tudo o quanto foi expendido pelo ora Impugnante no PPA, o Tribunal nada disse sobre esta questão, a qual assume especial relevância para a boa decisão da causa. Z. Com efeito, caso seja de entender que aquelas “distorções” têm que ser demonstradas pela AT – do que não se prescinde – e que in casu não foram – do que igualmente não se prescinde –, a Decisão Arbitral só poderia ser procedente, sendo a decisão da AT (objecto do PPA) manifestamente ilegal, por vício de violação de lei. AA. Esta questão nunca poderia ter sido totalmente desatendida ou desconsiderada pelo Tribunal Arbitral na sua decisão – nem se compreende como pôde (como conseguiu) o Tribunal decidir o pedido do ora Impugnante sem se pronunciar sobre esta questão [Diferentemente, o Tribunal fez apenas referências às mencionadas “distorções significativas na tributação”em simples remissões para o respectivo regime legal: ”[p]arece não haver dúvidas que o artigo 23.º, n.º 1, alínea b), consagra o método pro rata para a dedução do IVA para sujeitos passivos mistos, estabelecendo no n.º 4 o cálculo da percentagem de dedução. Por outro lado, nos termos do n.º 2, pode o sujeito passivo efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, o que corresponde à aplicação de um método de dedução alternativo baseado na afectação real em função da efectiva utilização dos bens. Para esta última hipótese, esse n.º 2 prevê igualmente que a Administração possa impor condições especiais ao método da afectação real – quando o sujeito passivo tenha optado por esse método de dedução – e fazer cessar o procedimento quando se verifiquem distorções significativas na tributação. E nos termos da alínea b) do n.º 3, a Administração pode também obrigar o sujeito passivo a proceder de acordo com o método de afectação real quando a aplicação do método pro rata possa conduzir a distorções significativas na tributação”.]. 3 Diferentemente, o Tribunal fez apenas referências às mencionadas “distorções significativas na tributação”em simples remissões para o respectivo regime legal: ”[p]arece não haver dúvidas que o artigo 23.º, n.º 1, alínea b), consagra o método pro rata para a dedução do IVA para sujeitos passivos mistos, estabelecendo no n.º 4 o cálculo da percentagem de dedução. Por outro lado, nos termos do n.º 2, pode o sujeito passivo efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, o que corresponde à aplicação de um método de dedução alternativo baseado na afectação real em função da efectiva utilização dos bens. Para esta última hipótese, esse n.º 2 prevê igualmente que a Administração possa impor condições especiais ao método da afectação real – quando o sujeito passivo tenha optado por esse método de dedução – e fazer cessar o procedimento quando se verifiquem distorções significativas na tributação. E nos termos da alínea b) do n.º 3, a Administração pode também obrigar o sujeito passivo a proceder de acordo com o método de afectação real quando a aplicação do método pro rata possa conduzir a distorções significativas na tributação”. BB. De facto, o Tribunal Arbitral limitou-se a decidir que: “[p]or outro lado, o coeficiente específico de dedução que permite calcular a percentagem de dedução apenas com base no montante anual de juros foi somente introduzido pelo Ofício circulado n.º 30108, de 30 de Janeiro de 2009, pelo qual, a Administração Fiscal, tendo concluído, relativamente às instituições de crédito que desenvolvam simultaneamente actividades de Leasing ou de ALD, que o apuramento do IVA dedutível segundo a aplicação do pro rata geral estabelecido no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA pode conduzir a «distorções significativas na tributação», determinou, no uso da faculdade prevista no artigo 23.º, n.º 3, que esses sujeitos passivos passassem a utilizar a afectação real”. CC. Tais remissões nunca poderão ser consideradas como qualquer tipo de “pronúncia” sobre esta questão essencial. DD. Assim, resulta evidente que a decisão arbitral impugnada não comporta qualquer pronúncia sobre a necessidade (ou não) de demonstração, pela AT, das referidas “distorções significativas na tributação”, nem comporta qualquer pronúncia sobre a verificação daquelas distorções in casu – questões essenciais à decisão de mérito da causa, nos termos alegados e demonstrados no PPA. EE. De resto, ainda que o Tribunal Arbitral entendesse não dever conhecer desta questão – o que não se aceita e apenas por mero dever de patrocínio se admite –, sempre teria que referir que assim pretendia fazer e enunciar expressamente as razões subjacentes a essa não pronúncia – tratando-se de uma questão suscitada, sempre haverá omissão de pronúncia se nada disser sobre ela. FF. Por tudo o exposto, deverá a presente impugnação proceder, por verificados todos os seus pressupostos, e em consequência, ser anulada a decisão arbitral aqui impugnada, emitida no âmbito do processo n.º 709/2019-T do CAAD, por vício de omissão de pronúncia, nos termos do n.º 1 do artigo 125.º do CPPT, tal como a alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aqui aplicável ex vi alíneas c) e e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.” *** A Recorrida, devidamente notificada optou por não apresentar contra-alegações. *** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) teve vista nos termos do artigo 146.º do CPTA. *** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir. *** II. Fundamentação de Facto A decisão arbitral fixou a seguinte matéria de facto: “A) A Requerente é uma instituição de crédito abrangida pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro. B) A Requerente é sujeito passivo misto para efeitos de IVA na medida em que na sua actividade realiza operações de locação financeira mobiliária, que são tributáveis e conferem o direito de dedução do imposto, e operações de financiamento e concessão de crédito, que são isentas do imposto, que não permitem a dedução de IVA. C) Em 7 de Fevereiro de 2011, a Requerente submeteu, via Internet, a declaração periódica de IVA relativa a Dezembro de 2010, em que excluiu do numerador e do denominador da fracção representativa do cálculo pro rata as amortizações financeiras relativas aos contratos de locação financeira, seguindo a posição externada pela Autoridade Tributária no Ofício-Circulado n.º 30108, de 30 de janeiro de 2009; D) Consequentemente, o montante a deduzir foi reduzido de € 2.761.414,72 para € 1.150.589,47, tendo a Requerente entregue IVA em excesso no montante de € 1.610.825,25; E) Em 28 de Dezembro de 2012, a Requerente deduziu reclamação graciosa contra o acto de autoliquidação de IVA, relativa ao período de tributação de dezembro de 2010, requerendo a restituição no montante de € 1.610.825,25, referente a IVA entregue em excesso, por não ter sido incluído no cálculo da percentagem de dedução definitiva o valor das amortizações financeiras dos contratos de locação financeira; F) Em 28 de Janeiro de 2014, a Requerente foi notificada, através do ofício n.º0281, do indeferimento da reclamação graciosa; G) A Requerente interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que foi indeferido por despacho de 8 de Setembro de 2014, da Direcção de Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado, notificado pelo ofício n.º 3155, de 24 de setembro seguinte; H) Na informação que serve de base ao despacho de indeferimento do recurso hierárquico, considera-se, na parte mais relevante, o seguinte: 2 Apreciação do Recurso Hierárquico L) A Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu o Ofício Circulado n.º 30108, de 30 de janeiro de 2009, com o seguinte teor: Assunto: IVA - Direito à dedução Regras para a determinação do direito à dedução pelas instituições de crédito quando desenvolvam simultaneamente as actividades de Leasing ou de ALD. *** Consta como motivação da matéria de facto o seguinte: “O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e em factos não questionados pelas partes.” *** III) FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO In casu, a Impugnante não se conforma com a decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 709/2019-T, que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral, apresentado contra o indeferimento do Recurso Hierárquico deduzido na sequência do indeferimento da Reclamação Graciosa com referência ao ato de autoliquidação de IVA, referente ao período de dezembro de 2010, no qual peticionava a sua anulação parcial e restituição do imposto pago em excesso no montante de €1.610.825,25. Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto, no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações da impugnação definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, ponderando o teor das conclusões da impugnação cumpre apreciar se a decisão arbitral padece de nulidade por omissão de pronúncia, na medida em que o Tribunal a quo não se pronunciou se a demonstração das “distorções significativas de tributação” se afigurava necessária ou não e, bem assim, se, no caso concreto em análise, se deveria considerar que tal demonstração havia sido concretizada pela AT. Apreciando. Em termos de regime da arbitragem voluntária em direito tributário, introduzido pelo Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro (RJAT) o expediente processual de reação à decisão dos Tribunais Arbitrais para os Tribunais Centrais Administrativos, consiste na dedução de impugnação, consagrada no artigo 27.º, com os fundamentos enunciados, taxativamente, no artigo 28.º, nº 1 e que infra se enumeram: a-Não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; b-Oposição dos fundamentos com a decisão; c-Pronúncia indevida ou omissão de pronúncia; d-Violação dos princípios do contraditório e da igualdade das partes, nos termos em que estes são estabelecidos no artigo 16.º, nº 2 . Ora, subsumindo-se a arguida nulidade, no citado normativo, concretamente, na alínea c), vejamos, então, se a mesma procede. A propósito da omissão de pronúncia dispõe o artigo 125.º do CPPT, nº1, do CPPT que constitui nulidade a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar. Preceituando, por seu turno, a primeira parte da alínea d), do nº 1, do artigo 615.º do CPC, que a decisão é nula, quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. Na verdade, a nulidade da decisão por omissão de pronúncia sucede apenas quando a mesma deixe de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida à apreciação do Tribunal. Dir-se-á, neste particular e em abono da verdade que, as questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio. De notar para o efeito que, as questões não são passíveis de qualquer confusão conceptual com as razões jurídicas invocadas pelas partes em defesa do seu juízo de valoração, porquanto as mesmas correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa preceituada no citado normativo 615.º, nº 1, alínea d), do CPC. Conforme doutrinado por ALBERTO DOS REIS (1) “[s]ão, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão”. Vejamos, então, se assiste razão à Impugnante. A Impugnante propugna que a decisão arbitral sub judice é ilegal por manifesta omissão de pronúncia, visto que o Tribunal Arbitral decidiu sobre a sua pretensão através da mera remissão para jurisprudência do STA sem, contudo, decidir sobre o caso concreto e as questões suscitadas no PPA. Densifica, para o efeito, que embora tenha alegado, expressamente, a ilegalidade da decisão da AT com fundamento na falta de demonstração das “distorções significativas de tributação”, a verdade é que o Tribunal não decidiu i) se tal demonstração pela AT se afigura necessária ou não e, bem assim, ii) se, no caso concreto em análise, se deveria considerar que tal demonstração havia sido concretizada pela AT, incorrendo, por isso, em clara omissão de pronúncia. Adensa, ainda para o efeito, que mesmo que o Tribunal Arbitral entendesse não dever conhecer desta questão, sempre teria que o evidenciar de forma expressa, na medida em que tratando-se de questão suscitada, sempre haverá omissão de pronúncia se nada se disser sobre ela. Sublinha, in fine, que caso seja de entender que aquelas “distorções” têm que ser demonstradas pela AT e que, in casu, não o foram, sempre teria de determinar a procedência da impugnação. Apreciando. Comecemos por atentar no teor da petição de impugnação. No pedido de pronúncia arbitral, o Requerente aduz, expressamente, o seguinte: “[e]mbora a AT tenha alegado que a aplicação do método de pro rata à dedução do IVA nos contratos de locação financeira conduz a distorções significativas na tributação (requisito necessário para a imposição do método da afetação real nos termos dos n.°s 2 e 3 do artigo 23.° do Código do IVA), não o logrou, contudo, demonstrar ou concretizar essa mesma distorção, razão pela qual não será possível considerar cumprida a condição prevista no artigo 23.°, n.° 3 al. b) do Código do IVA.” Mais adensando que “[a] mera invocação, pela AT, de que a incoerência das variáveis utilizadas “pode conduzir a «distorções significativas na tributação» ” não bastará para a exclusão do componente de capital das rendas do cálculo do prorata geral de dedução.” Sublinhando, para o efeito, que “[o]s serviços da AT não particularizaram os critérios que justificaram a desconsideração do componente de capital ou o aumento artificial da percentagem de dedução, apoiando-se em afirmações imprecisas e meramente conclusivas, descrevendo de forma sucinta e abstrata o conteúdo de algumas informações administrativas que consubstanciam meras orientações genéricas.” Concluindo, in fine, que “[n]os termos da alínea b) do número 3 do artigo 23.° do Código do IVA, a existência efetiva de '‘distorções significativas” é condição sine qua non para que a AT possa impor o método da afetação real, não sendo suficiente que haja uma “mera” possibilidade ou suscetibilidade de essas distorções ocorrerem.” Como visto, a Impugnante advoga que a decisão arbitral não se pronunciou sobre o supra expendido, padecendo, por isso, de omissão de pronúncia, porém, assim o não entendemos, porquanto o Tribunal a quo emitiu pronúncia sobre todas as questões que lhe foram submetidas. Mas, explicitemos, então, com o devido pormenor porque assim o ajuizamos, chamando à colação o teor da decisão recorrida por forma a demonstrar, com clareza, tal pronúncia. Atentando na decisão arbitral verifica-se que a mesma começa por identificar a questão fática subjacente, e a questão de fundo da seguinte forma: “A questão que vem colocada é a de saber se, na aplicação do método pro rata de dedução de imposto suportado nos bens e serviços de utilização mista, devem ser considerados no numerador e no denominador da fracção de cálculo o valor total da renda e não apenas a parte correspondente aos juros que constitui o proveito ou rendimento do locador.” Para depois, mediante convocação da realidade já dirimida junto do TJUE, relevar, expressamente, que a questão decidenda se coaduna com a indagação e aferição se “a Autoridade Tributária dispõe da possibilidade, no âmbito da aplicação do método do pro rata a um sujeito passivo que exerce actividades de locação financeira, de considerar apenas os juros para efeitos do cálculo de dedução.” Por forma a responder à aludida questão decidenda, começa por fazer o enquadramento do direito à dedução em termos de disciplina comunitária convocando, para o efeito, os três métodos distintos de cálculo da dedução, concretamente, da imputação direta, do pro rata e da afetação real, explicitando, com pormenor, como se processa o direito à dedução no âmbito de custos mistos. Aduzindo, neste particular, que “[h]averá assim de concluir-se que a Directiva IVA contempla três distintos métodos de cálculo da dedução. O método regra de imputação directa, que é aplicável aos custos directos, ou seja, aos custos associados a operações que conferem direito à dedução, e, relativamente aos custos mistos, que estão indistintamente associados a operações que conferem ou não conferem o direito de dedução, o método pro rata e, a título de excepção, o método de afectação real. Não pode deixar de reconhecer-se, por outro lado, que a Directiva, através do referido artigo 173.º, n.º 2, alínea c), confere aos estados alguma margem de liberdade de conformação quanto à definição do critério de afectação real.” Ulteriormente apela à competente regulamentação nacional, convocando, para o efeito, o artigo 23.º do CIVA, com a devida interpretação e densificação, invocando, outrossim, Doutrina Administrativa que reputou de relevo, evidenciando, designadamente, que: “6. Parece não haver dúvidas que o artigo 23.º, n.º 1, alínea b), consagra o método pro rata para a dedução do IVA para sujeitos passivos mistos, estabelecendo no n.º 4 o cálculo da percentagem de dedução. Por outro lado, nos termos do n.º 2, pode o sujeito passivo efetuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, o que corresponde à aplicação de um método de dedução alternativo baseado na afectação real em função da efectiva utilização dos bens. Para esta última hipótese, esse n.º 2 prevê igualmente que a Administração possa impor condições especiais ao método de afectação real – quando o sujeito passivo tenha optado por esse método de dedução – e fazer cessar o procedimento quando se verifiquem distorções significativas na tributação. E nos termos da alínea b) do n.º 3, a Administração pode também obrigar o sujeito passivo a proceder de acordo com o método de afectação real quando a aplicação do método pro rata possa conduzir a distorções significativas na tributação. Por outro lado, o coeficiente específico de dedução que permite calcular a percentagem de dedução apenas com base no montante anual de juros foi somente introduzido pelo Ofício Circulado n.º 30108, de 30 da janeiro de 2009, pelo qual, a Administração Fiscal, tendo concluído, relativamente às instituições de crédito que desenvolvam simultaneamente as actividades de Leasing ou de ALD, que o apuramento do IVA dedutível segundo a aplicação do pro rata geral estabelecido no n.º 4 do artigo 23.º do CIVA pode conduzir a “distorções significativas na tributação”, determinou, no uso da faculdade prevista no artigo 23.º, n.º 3, que esses sujeitos passivos passassem a utilizar a afectação real.” Após convocar o quadro normativo vigente e a doutrina administrativa que reputou de relevo para o caso em contenda, faz expressa menção à Jurisprudência do CAAD e ao entendimento nela veiculado, relevando, no entanto, que a mesma não tem sido seguida pelo STA, chamando à colação e remetendo, primeiramente, para o Aresto do STA, de 4 de março de 2015, prolatado no âmbito do processo n.º 1017/12, em que foi formulado o pedido de reenvio prejudicial que originou a pronúncia pelo TJUE no caso Banco Mais, e depois para a demais jurisprudência consolidada sobre a matéria, mormente a prolatada “nos Acórdãos da Secção de 4 de Março de 2015 (Processo n.º 081/13), 3 de Junho de 2015 (Processo n.º 0970/13), 17 de Junho de 2015 (Processo n.º 01874/13), 27 de Janeiro de 2016 (Processo n.º 0331/14) e 15 de Novembro de 2017 (Processo n.º 0485/17) e confirmada no recente acórdão para uniformização de jurisprudência de 4 de Março de 2020 (Processo n.º 7/19), fundado na contradição existente, quanto à mesma questão fundamental de direito, entre decisão arbitral (decisão recorrida) e o citado acórdão do STA de 15 de Novembro de 2017 (acórdão fundamento).” Fazendo depois expressa remissão e adesão à doutrina vertida no recente Acórdão de Uniformização de Jurisprudência prolatado no âmbito do processo nº 7/19, relevando, expressamente, o seguinte: “Como já se esclareceu no acórdão proferido por este STA a 3 de Junho de 2015 no âmbito do Processo n.º 0970/13, ao interpretar as normas supra referidas o TJUE tomou em consideração que “na interpretação de uma disposição de direito da União, importa ter em conta não apenas os respectivos termos mas também o seu contexto e os objectivos prosseguidos pela regulamentação em que está integrada (acórdão SGAE, C-306/05, EU:C:2006:764, n. 34). E que no caso em apreço, o artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva dispõe que um Estado-Membro pode autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução do IVA com base na afectação da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços e pode prever um regime de dedução que tenha em conta a afectação especial da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços em causa. Sendo que, na inexistência de qualquer outra indicação na Sexta Directiva quanto às regras que podem ser utilizadas nesta situação, incumbe aos Estados-Membros estabelecê-las (v. parágrafos 21 a 24)”. Neste contexto, não só se verifica que o artigo 19.º n.º 1 da Sexta Directiva (intitulado “Cálculo do pro rata de dedução”) remete unicamente para o pro rata previsto no artigo 17.º, n.º 5, primeiro parágrafo, desta Directiva, como se verifica que, “embora o segundo parágrafo do artigo 17.º, n.º 5, da Sexta Directiva preveja que essa regra de cálculo se aplica a todos os bens e serviços de utilização mista adquiridos por um sujeito passivo, o terceiro parágrafo desse artigo 17.º, n.º 5, que também inclui a disposição que figura na alínea c), começa com a conjunção adversativa «todavia», que implica a existência de derrogações à referida regra (acórdão Royal Bank of Scotland, EU:C:2008:750, n.º 23). - parágrafos 25 e 26. Ora, nesta perspectiva a norma do artº 23º nº 2 do CIVA, ao permitir que Administração tributária imponha condições especiais no caso de se verificarem distorções significativas na tributação, reproduz, em substância, a regra de determinação do direito à dedução enunciada na Directiva do IVA – artº 17º, nº 5, terceiro parágrafo, al. c) da sexta directiva, quando ali se estabelece que, «todavia, os Estados-membros podem: autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na utilização da totalidade ou parte dos bens ou serviços»”. Como tal, ao abrigo da legislação europeia transposta para o artigo 23.º n.º 2 do Código do IVA, o legislador nacional pode estabelecer condições especiais para o cálculo pro rata do imposto sempre que se verifiquem distorções significativas na tributação, o que determina, no caso dos autos, que para o cálculo do pro rata apenas sejam considerados os juros, ou seja, apenas seja considerada a parte da remuneração do locador incluída na renda e que é, afinal, o valor que traduz o seu interesse financeiro.” (destaques e sublinhados nossos). Esclarecendo, outrossim, a linha do deficit de instrução que tem sido adotada em determinados casos, pelo STA, levando à anulação das decisões, “[p]ara efeito de ampliação da matéria de facto em vista a apurar se a utilização de bens e serviços mistos “é sobretudo determinada” pelas operações de financiamento e gestão dos contratos de locação financeira, ou, o invés, pela disponibilização dos veículos” afirmando, no entanto, que “[a] questão, todavia, não se coloca no presente processo.” na medida em que não alegou quaisquer factos que permitam ao tribunal apurar, em sede de matéria de facto, se os custos gerais são preponderantemente determinados pelo financiamento e gestão dos contratos de locação financeira ou pela alienação dos bens locados.” Concluindo, assim, que “[a] questão de direito que vem colocada obteve já resposta do acórdão de uniformização de jurisprudência do STA, em termos a que o tribunal arbitral não pode deixar de aderir, ao consignar que a norma do artigo 23.º, n.º 2, do CIVA efectuou a transposição para o direito interno do artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva, e, por conseguinte, a Administração não está impedida de considerar que, no cálculo do pro rata das operações de locação financeira, apenas sejam tidos em conta os juros, ou seja, apenas a parte da remuneração do locador incluída na renda. Assim sendo, na linha da jurisprudência do STA, há que reconhecer que a norma do artigo 23.º, n.º 2, do CIVA procedeu à transposição para o direito interno do artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva, pelo que os actos de liquidação impugnados não enfermam da ilegalidade que lhes é imputada.” Ora, face ao supra expendido, dimana inequívoco que o Tribunal Arbitral não incorreu na aludida omissão de pronúncia, visto que aquilatou a questão essencial coadunada com a legitimação por parte da AT, em ordem ao consignado no artigo 23.º, nº2 e 3, do CIVA, a aplicar um coeficiente de imputação específico que exclua, nos contratos de locação financeira, a componente da amortização, tendo, por remissão e adesão, para Jurisprudência do STA, inclusive, de Uniformização, concluído no sentido afirmativo, na medida em que se encontravam preenchidos os pressupostos atinentes para o efeito, mormente, a arguida “distorção significativa de tributação”. De relevar, neste âmbito, que o Tribunal não está vinculado a rebater e minudenciar todos os argumentos e alegações avançadas pelas partes, sendo suficiente a pronúncia sobre as concretas questões em litígio, demonstrando que as ponderou, como sucede, in casu. Até porque, conforme já evidenciado anteriormente, não é passível de confusão “questões” e “argumentos”. Note-se, aliás, que o Tribunal Arbitral fez questão de enunciar e precisar que como não foram alegados quaisquer factos que permitam apurar e aquilatar se os custos gerais são preponderantemente determinados pelo financiamento e gestão dos contratos de locação financeira ou pela alienação dos bens locados, a questão é de direito, razão pela qual remeteu para a Jurisprudência unânime e consolidada sobre a matéria, sublinhando, perentoriamente, que a “questão de direito que vem colocada obteve já resposta do acórdão de uniformização de jurisprudência do STA, em termos a que o tribunal arbitral não pode deixar de aderir”. Destarte, a decisão impugnada convoca Jurisprudência Comunitária e Jurisprudência Nacional de Uniformização, e adota o que se pode apelidar de uma fundamentação por adesão, sendo que “[n]ada obsta a que a fundamentação se faça por adesão à fundamentação jurídica de anterior acórdão de tribunal superior, sendo que a lei apenas impede que a fundamentação se faça por mera adesão aos fundamentos alegados por uma das partes (2).” Note-se que o aludido Aresto do STA convocado pelo Tribunal Arbitral sustenta de forma inequívoca que,“[n]a apreciação do TJUE, o cálculo do direito à dedução em aplicação do método baseado no volume de negócios (que tem em conta os montantes relativos à parte das rendas que os clientes pagam e que servem para compensar a disponibilização dos veículos), leva a determinar um pro rata de dedução do IVA pago a montante menos preciso do que o resultante do método aplicado pela Fazenda Pública, baseado apenas na parte das rendas correspondente aos juros que constituem a contrapartida dos custos de financiamento e de gestão dos contratos suportados pelo locador financeiro, uma vez que estas duas actividades constituem o essencial da utilização dos bens e serviços de utilização mista destinada à realização das operações de locação financeira para o sector automóvel”. (destaques e sublinhados nossos). Concluindo, nessa medida, que “[a]o abrigo da legislação europeia transposta para o artigo 23.º n.º 2 do Código do IVA, o legislador nacional pode estabelecer condições especiais para o cálculo pro rata do imposto sempre que se verifiquem distorções significativas na tributação o que determina, no caso dos autos, que para o cálculo do pro rata apenas sejam considerados os juros, ou seja, apenas seja considerada a parte da remuneração do locador incluída na renda e que é, afinal, o valor que traduz o seu interesse financeiro.” (destaques e sublinhados nossos). Portanto, é ponto assente, que o Tribunal Arbitral mediante convocação e remissão para a aludida Jurisprudência entendeu não só que a demonstração da “distorção significativa de tributação” é pressuposto basilar, como, in casu, a mesma foi demonstrada pela AT, razão pela qual concluiu pela legalidade da autoliquidação e pela improcedência do valor cuja restituição a, ora Impugnante, reclamava. Ora, face a todo o exposto, e tendo em consideração que a nulidade da decisão com fundamento na omissão de pronúncia apenas se verifica quando uma questão que devia ser conhecida não teve qualquer tratamento, apreciação ou decisão, sem que a sua resolução tenha sido prejudicada pela solução, eventualmente, dada a outras, dimana inequívoco que, in casu, pelos motivos explanados não se verifica a arguida nulidade. De relevar, in fine, que carece de relevância o aduzido em Z) e AA), no sentido de que “caso seja de entender que aquelas “distorções” têm que ser demonstradas pela AT – do que não se prescinde – e que in casu não foram – do que igualmente não se prescinde –, a Decisão Arbitral só poderia ser procedente, sendo a decisão da AT (objecto do PPA) manifestamente ilegal, por vício de violação de lei”, na medida em que tal alegação se reconduz a um erro de julgamento cuja apreciação se encontra vedada a este Tribunal. Com efeito, se a Impugnante, sob a invocação de nulidade por omissão de pronúncia, argui um erro de julgamento, assente numa desconformidade com o sentido jurídico adotado na decisão impugnada, tal questão já radica no mérito e nessa medida está cerceada a este Tribunal no âmbito dos seus poderes de cognição. Em face de todo o exposto, e sem necessidade de outros considerandos, dimana evidente que não padece de nulidade por omissão de pronúncia a decisão arbitral sub judice, visto que conheceu de todas as questões que devia conhecer, resolvendo-as, ainda que a descontento da Impugnante (3). Aqui chegados, subsiste apenas por analisar a questão da dispensa do remanescente do pagamento da taxa de justiça, relevando, desde já, que a decisão de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça somente tem aplicação no âmbito da presente instância de impugnação da decisão arbitral junto deste TCAS, que não na instância arbitral (4). Apreciando. No Aresto do STA, proferido no processo nº 01953/13, de 07 de maio de 2014, doutrina-se que: “A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade”. No caso sub judice, considera-se que o valor de taxa de justiça devida a final, calculado nos termos do tabela I.B., do RCP, é excessivo. Porquanto, ponderadas as circunstâncias do caso vertente à luz dos critérios escolhidos pelo legislador, em especial, o comportamento processual das partes litigantes, sem qualquer reparo negativo a apontar, a complexidade do processo – atendendo a que as questões decidendas, não exigiram do julgador especiais e diversos conhecimentos técnicos e jurídicos, antes se mantiveram dentro de parâmetros normais e comuns – encontra-se preenchido o circunstancialismo do n.º 7, do artigo 6.º do RCP, decretando-se, assim, a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça. *** IV. DECISÃO
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em JULGAR IMPROCEDENTE A PRESENTE IMPUGNAÇÃO. Condena-se a Impugnante em custas, com dispensa, na presente instância de impugnação de decisão arbitral, de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que excede os €275.000,00. Registe. Notifique. Lisboa, 07 de abril de 2022
(Patrícia Manuel Pires)
(Cristina Flora)
(Luísa Soares) (1) Código de Processo Civil anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 143 (2) In Acórdão do STA, proferido no processo nº 050/15, de 20.05.2015. (3) Vide Acórdão do STA, proferido no processo nº 01109/12, de 07 de novembro de 2012 e bem assim Aresto do mesmo Tribunal proferido no processo nº 829/12.7 BELRA. (4) Vide Acórdãos do TCA Sul, proferidos nos processos 9420/16 e 31/17, de 29 de junho de 2016 e 22 de março de 2018, respetivamente. |