Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05834/12
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/10/2015
Relator:BÁRBARA TAVARES TELES
Descritores:IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO; IRS; CATEGORIA G
Sumário:1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.art.s.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do CPC, e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do CPPT); Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa.

2. Da subsunção dos factos dados como provados à norma contida na alínea a) do artigo 51º do C.IRS. Para o caso importa saber se as despesas que constam dos autos e trazidas ao probatório, podem ser interpretadas como “as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO
Maria …………………….. e Jurgen …………. , inconformados com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a impugnação judicial por si instaurada visando a liquidação de IRS, relativa aos anos de 2001, no valor de total €34.734,76, vieram dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Os Recorrentes terminam as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer, defendendo a improcedência do recurso, por a decisão não padecer de quaisquer vícios.
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Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.
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Objecto do recurso - Questão a apreciar e decidir:
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
As questões suscitadas consistem em apreciar se a sentença recorrida a sentença recorrida fez uma errada apreciação dos elementos de prova constantes dos autos e se errou na apreciação do vício de violação de lei por errónea quantificação do rendimento tributável.

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II.FUNDAMENTAÇÃO
II. 1. Da Matéria de Facto
Com interesse para a decisão da causa resulta apurada a factualidade que se passa a subordinar por alíneas:
a) Em 28.08.1989, por escritura pública lavrada no 15º Cartório Notarial de Lisboa, os Impugnantes adquiriram mediante compra o imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …………… sob o n.º ……….., pelo valo de € 134.675,43. (Doc. n.º 1A junto à p.i.)
b) Em 05.01.2001, por escritura pública lavrada no 13º Cartório Notarial de Lisboa, os Impugnantes venderam o imóvel a que alude a al.A) do probatório pelo valor de € 613.521,41.( Doc. n.º 7 A junto à p.i.)
c) Em 11.01.2001, os Impugnantes adquiriram o imóvel, destinado a habitação própria e permanente, pelo valor de € 119.711,50, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …….. sob o artigo n.º 5878. ( Doc. nº 9B junto á p.i.)
d) Os Impugnante apresentaram a declaração de rendimentos modelo 3 de IRS do ano de 2001, em 30.04.2002, declarando no anexo G a alienação a que alude a al. B) do probatório, pelo valor de € 613.521,41 e encargos realizados com a aquisição e alienação do mesmo no valor € 207.001,13. ( Doc. n.º 18 A junto à p.i.)
e) Na sequência da entrega da declaração de rendimentos a que alude a al. D) do probatório, foi emitida a liquidação de IRS n.º ……………….. datada de 18.08.2002, tendo sido apurado imposto a pagar no montante de € 22.774,53. (Doc. n.º 19 junto á p.i.)
f) Em 11.09.2002, os Impugnantes deduziram reclamação graciosa da liquidação a que alude a al. E) do probatório com os seguintes fundamentos: “ Por lapso dos requerentes foi omitida no duplicado do Anexo G apresentado em 30 de Abril de 2002, a informação relativa ao reinvestimento de parte do valor recebido pela venda da sua casa em 2001.(…) Assim, pretendem os requerentes declarar o valor reinvestido noutro imóvel para a sua habitação, bem como os encargos relacionados com a sua aquisição e melhoramento, conforme consta dos seguintes documentos que se anexam:

E. escritura de aquisição de imóvel a 11de Janeiro de 2001;

F. cópia do termos de declaração de Sisa;

G. recibo relativo a escritura notarial;

H. recibos relativos à Conservatória do Registo Predial;

I. facturas recibos aos melhoramentos introduzidos no imóvel adquirido.( Doc. n.º 20 A junto à p.i.)

g) Em 18.03.2003, no âmbito da reclamação graciosa a que alude a al.F) do probatório a Técnica da Administração Tributária Adjunta do Serviço de Finanças de Sintra – 1 emitiu informação da qual se destaca:
“ 9- Dos documentos junto aos autos, são apresentados justificativos de valores dispendidos com a aquisição do novo imóvel, (folhas 11 a 20 destes autos), situação que não é relevante para o apuramento da mais valia sujeita a tributação. (…) Assim, e em face dos documentos apresentados, sou de parecer de se entender o pedido, no tocante ao reinvestimento efectuada na aquisição do novo imóvel (…)

12- Relativamente aos encargos que protesta deduzir, sou de parecer de não merecer provimento, por falta de suporte legal, nos termos do art. 51º do CIRS, poderão os mesmos ser eventualmente considerados, no apuramento da mais valia a tributara aquando da alienação do imove ora adquirido” .( Doc. fls. 76/76 do processo de reclamação graciosa em apenso)

h) Em 19.03.2003, exarou na informação a que alude a al. G) do probatório o seguinte despacho: “ Concordo. Defiro parcialmente o pedido nos termos e com os fundamentos expressos na informação e parecer que antecedem a fls. 76/77. Notifique-se.” (Doc. fls. 78 do processo de reclamação graciosa apenso)
i) Na sequência da decisão a que alude a al. H) do probatório foi emitida EM 26.06.2004 a liquidação n.º ………………. no montante de € 49.623,48.( Doc. fls. 133 do processo administrativo tributário apenso)
j) Os Impugnante deduziram impugnação judicial contra a decisão de indeferimento parcial a que alude a al. H) do probatório que correu termos neste TAF de Sintra sob o n.º 1/05.2BESNT.
L) Em 08.03.2005, os Impugnantes foram notificados para se pronunciarem, em sede de audição prévia sobre as correcções oficiosas propostas, aos valores declarados na sua declaração Modelo 3, referente ao ano de 2001. ( Doc. n.º 30 junto à p.i.)

M) Os Impugnantes foram notificados da demonstração da acerto de contas Id. Doc: …………………, de 7 de Novembro de 2005, decorrente da liquidação de IRS n.º ………………., de 31 de Outubro de 2005, e da Demonstração de Liquidação de Juros decorrente da compensação n.º ……………………, de 7 de Novembro de 2005, com data limite de pagamento voluntário a 14.12.2005. (Docs. n.ºs 31, 32 e 33 junto à p.i.)
N) Os Impugnantes procederam a obras de reconstrução, remodelação e ampliação do imóvel a que alude a al. A) do probatório. (Doc. n.º2 junto á p.i., e n.º2 junto ao requerimento apresentado em 28.05.2008) em confronto com o depoimento das testemunhas inquiridas)
O) O valor patrimonial do imóvel a que alude a al. A) do probatório foi fixado no valor de € 219.080,16 em 1999.
P) Em 13.03.2006, deu entrada via correio electrónico a petição inicial que originou os presentes autos. (Cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos)



FACTOS NÃO PROVADOS

Dos factos constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.

As testemunhas inquiridas não indicaram o valor dispendido pelo Impugnante com a realização das obras a que alude a al. N) do probatório.

MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada um dos números do probatório.”





Da impugnação da matéria de facto
Os Recorrentes, nas suas alegações e respectivas conclusões de recurso, impugnam os factos vertidos na sentença a quo dizendo o seguinte:
Quanto à matéria de facto, ao arrepio da prova produzida nos autos, não foram fixados os seguintes factos:
- No ano 2000, ocorreu uma inundação na cave da habitação dos Impugnantes, que destruiu os documentos ai guardados – (Acordo das partes - artigo 19º da Pl não impugnado e Depoimentos de Marinela ………, Carlos ………e Burgahard …..)
- Entre os documentos destruídos encontravam-se os documentos comprovativos das obras realizadas no imóvel identificado na alínea A) – (Acordo das partes- artigo 19º da Pl não impugnado)
- As obras supra descritas na alínea terminaram em Setembro de 1998. (Acordo das partes - artigo 2 da Pl não impugnado e Doc. 3A - Declaração Modelo 129, da Contribuição Predial)
- Antes da realização das obras descritas na alínea N), o valor patrimonial do imóvel a que alude a alínea A) era 3.134 € (Doc. 4 -liquidação de Contribuição Autárquica, referente a 2000, antes da avaliação do imóvel)
- Os Impugnantes realizaram no imóvel identificado na alínea C), as seguintes obras:
Arranjos de exterior e construção do jardim, no valor de 800.000 PTE/ 3.990,38€;
Instalação de um sistema de segurança, no valor de 373.862 PIE I 1.864 ,82 €;
Instalação de móveis de Cozinha, no valor de 430.911 PTE I 2.149.38 €;
Instalação de uma antena de televisão, no valor de 58.500 PIE I 291,80 €;
Instalação de um forno de encastrar, no valor de 39.529 PTE / 197,12 EUR. - (Acordo das partes- artigo 10º da Pl não impugnado, e Doc. 13-Factura/Recibo n.007, de ……………., Doc. 14- Recibo n.º141 de A........ XXI Lda; Doc. 15- Recibo n.º 208, da M……-Móveis ………., Lda.; Doc. 16- Factura ………….da PT C.......... SA; Doc. 17-Venda a Dinheiro 2236/1)”

Vejamos.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do CPC, e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do CPPT).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida. Tal ónus rigoroso deve considerar-se mais vincado no actual art.640, nº.1, do CPC que dispõe o seguinte:

Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”:
1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa -se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; (…)


Posto isto importa, em primeiro lugar, indagar os factos supra referidos são relevantes para a decisão da causa, face ao pedido e à causa de pedir.
Ora, sendo um dos pedidos, e aquele que está aqui em causa, a errónea quantificação do rendimento tributável referente ao ano 2001 face à desconsideração das despesas e encargos dedutíveis pelos impugnantes, por alienação e posterior adquisição de um imóvel, os factos que vêem agora impugnados são, nesta perspectiva e quanto a este pedido, relevantes para decisão da causa.

Vejamos agora se o ónus que recai sobre os Recorrentes de especificar, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, se mostra cumprido.
Da leitura das várias alíneas da conclusão D) supra transcritas, verifica-se que, a maior parte dos factos aí invocados e que os Recorrentes entendem que deveriam ter sido levados ao probatório, tal ónus não está cumprido.
Quanto aos factos que os Recorrentes entendem que se mostram provados por acordo face à não impugnação de certos artigos da p.i., importa dizer que no processo tributário a falta de contestação especificada de factos articulados pelos impugnantes não importam a sua confissão por parte da Fazenda Publica – art. 110º nº 6 do CPPT – veja-se o diz a este propósito Jorge Lopes de Sousa in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 6ª Edição, 2011, pag. 236 e 237 em anotação ao referido artigo,
“No nº 6 deste artigo, estabelece-se a regra da livre apreciação da falta de contestação especificada dos factos alegados pelo impugnante. Este preceito relaciona-se com o ónus de impugnação previsto no art. 490º do CPC, em que se estabelece que ao contestar o reu deve tomar posição definida perante os factos articulados na petição e que se consideram admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, se não for admissível confissão sobre eles ou só puderem ser provados por documento escrito. Por força do preceituado neste nº 6, no processo de impugnação judicial, o representante da Fazenda publica não tem este ónus, não se tendo por confessados os factos alegados pelo impugnante apenas pelo facto de o representante da Fazenda publica não os contestar. (…)”
Assim sendo, resta concluir que tendo os Recorrentes optado por considerar provados determinados factos por acordo, não cumpriram o ónus de especificação a que estava obrigado.

Relativamente ao facto em que alegam estar provado por depoimento de testemunhas, tal especificação singela do meio de prova não é suficiente, senão vejamos.

Na sua decisão da matéria de facto a Mm. Juiz a quo diz que:

As testemunhas inquiridas não indicaram o valor dispendido pelo Impugnante com a realização das obras a que alude a al. N) do probatório.”

Confrontados com esta afirmação feita pelo Tribunal a quo caberia aos Recorrentes demonstrar o alegado desacerto da valoração da prova efectuada, avançando, para tanto, os concretos motivos susceptíveis de fundar a sua divergência, no respeito, claro está, pelo ónus adjectivo que neste domínio sobre ela impende. O regime que, no que aqui releva e no essencial, é mantido pelo actual Código de Processo Civil, como decorre do disposto nos artigos 640.º (ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto), 662.º (modificabilidade da decisão de facto) e 607.º, n.º 5 (princípio da livre apreciação da prova). Necessário para o Tribunal ad quem proceder à reavaliação da prova é que, sendo a decisão do Tribunal a quo o resultado da valoração de meios de prova sujeitos à livre apreciação, parte interessada cumpra o ónus de impugnação prescrito pelo art. 640º do CPC.

O necessário é ter presente que nos termos do artigo 640.º do CPC, incumbe ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto o ónus de especificar, sob pena de rejeição, para além dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

Mais lhe sendo exigido, sob pena de rejeição do recurso na respectiva parte, que no caso de os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas terem sido gravados, a indicação exacta das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos considerados relevantes.

Resulta pois do citado artigo 640.º do CPC a consagração de um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, o qual impende sobre os aqui Recorrentes e que os mesmos de forma manifesta, não satisfez. Com efeito, os Recorrentes não indicaram as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, nem procedeu à transcrição de qualquer excerto.

É sabido que a este tribunal de recurso assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal a quo, desde que ocorram os pressupostos previstos no art. 662.º do CPC, incumbindo-lhe reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos. Porém, considerando que os Recorrentes não deram cumprimento aos normativos legais aplicáveis, está vedado a este tribunal de recurso conhecer do eventual erro de julgamento da matéria de facto, nesta parte. (veja-se sobre este assunto, entre outros o douto acórdão deste TCAS nº 07809/14 de 10/07/2014.

Posto isto, resta concluir que não pode este tribunal recursivo reapreciar a prova e os factos relativos à invocada inundação e valor das obras relativas ao imóvel identificado em A).

Finalmente os restantes factos cuja prova invocada pelos Recorrentes resulta de documentos, essa sim, por ser relevante estar documentada e estarem especificados os respectivos documentos e as folhas dos autos onde este se encontram, importa reapreciar e se for caso disso aditar ao probatório.



Assim sendo, ao abrigo do disposto no artigo 662, nº 1, do CPC, aditam-se ao probatório os seguintes factos, os quais resultam provados por documentos constantes dos autos.
Q). No ano 2000 o valor patrimonial do imóvel a que alude a alínea A) era €3.134, 00, cf. documento de fls. 41 dos autos.
R) A sociedade ………… emitiu uma factura/recibo, em nome dos Recorrentes referente a trabalhos de jardinagem, construção de jardim com plantações, colocação de terra, seixo e construção de sistema de rega, no valor de €3.990,38, cf. factura/recibo de fls. 57 cuja data se mostra rasurada.
S). A sociedade …………… XXI – Sistemas ………….., Lda. emitiu um recibo em 09/01/2001, onde atesta ter recebido o cheque nº ……….. do Banco B………, emitido pelo Recorrente, no valor de €1.864,82, cf. fls. 58 dos autos.
T). A sociedade M………., Moveis …………, Lda. emitiu um recibo em nome da Recorrente referente a uma factura 575, datada de 22/12/2000, no valor de €2.149.38, cf. fls. 15 dos autos.
U). A sociedade P……………., S.A. emitiu uma factura em nome do Recorrente, relativa à instalação de “PPCAE Gama 1”, datada de 15701/2001, no valor €291,80, cf. fls. 60 dos autos.
V). A sociedade P…….. – Imp. Exp. Mat. Ele. Elec., Lda. emitiu uma “venda a dinheiro” com data de 10/01/2001, relativa a “Mag Sw 51N/8out no valor de €197,12, cf. fls. 17 dos autos.

Não se mostra provado, através dos documentos referidos pelos Recorrentes, a data de inicio e de conclusão das obras efectuadas ao imóvel referido em A) e, em consequência disso, também não se está provado o valor patrimonial do imóvel antes das obras.

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Estabilizada a matéria de facto, avancemos para a questão que nos vêm colocadas.
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II.2. Do Direito
O que importa aqui apreciar é se andou bem a Juiz a quo ao entender que certas despesas suportadas pelos Recorrentes não se enquadram no artigo 51º nº1 a) do C.IRS e, como tal, não podem ser deduzidas ao valor de aquisição do imóvel para efeitos de mais-valias.
Vejamos.
Os Recorrentes alegam que “quanto ao conhecimento do vício de errónea quantificação do rendimento tributável de 2001", o Tribunal a quo decidiu mal, ao ignorar a evidência dos autos quanto à existência de "encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos", relevantes para determinação da mais-valia, ao abrigo do disposto na alínea a) do artigo 51º do CIRS. E, consequentemente, ao não concluir pela existência de "fundada dúvida sobre a (...) quantificação do facto tributário", não tendo, determinando a anulação do acto impugnado, em cumprimento do disposto no artigo 100º do CPPT.
Mais invocam que o Tribunal a quo decidiu mal ao desconsiderar os melhoramentos introduzidos no imóvel adquirido, para efeito de determinação do valor de reinvestimento e que resulta evidente na douta sentença recorrida, ter ocorrido um erro grosseiro na aplicação do direito ao facto em apreciação. As despesas de melhoramento (artigo 10º n.º 5 alínea a) do CIRS), relevantes para o apuramento da mais-valia, não se podem confundir com as despesas de valorização do imóvel, relevantes para determinar os encargos a considerar na venda do imóvel (artigo 51º alínea a) do CIRS).

Com base matéria de facto por si apurada supra descritos entendeu a Mmª Juiz que proferiu decisão em 1ª instância que:
Pretendem os Impugnantes que sejam considerados para o cálculo do apuramento de mais-valias o montante de € 192.037,19, correspondente ao custo estimado com a execução de obras.
Contudo, não apresentaram em sede graciosa e contenciosa qualquer documento comprovativo com tal despesa, justificando com a ocorrência de uma inundação ocorrida na cave da habitação onde se encontravam guardadas as pastas com tais documentos.
O ónus de prova, no caso, cabe aos Impugnante, pois pretendem prevalecer-se da dedutibilidade dos encargos suportados com a valorização do imóvel, sendo pois seu ónus declarar o seu valor, comprovar o pagamento e justificar a origem desse pagamento. É o que resulta aliás do n. 1 do art. 74º da LGT.
No caso em apreço, resultou provado que os Impugnantes procederam a obras de reconstrução, remodelação e ampliação o imóvel a que alude a al. A) do probatório, porém não lograram provar por qualquer meio de prova o montante efectivamente gasto com essas despesas.
Com efeito, pese embora o disposto no art. 128º, n.º3 do CIRS, os documentos juntos pelos Impugnantes somente provam a factualidade descrita na al. N) do probatório, não logrando contudo, comprovar o quantitativo dos gastos suportados com a execução das obras.
O que era necessário, como bem reconhecem os Impugnantes no art.6º das doutas Alegações.
Cientes da fraca argumentação que desenvolvem, refugiam-se os Impugnares no valor patrimonial fixado ao imóvel no ano de 1999, porém, o rendimento colectável dos imoveis, é reportado ao valor locativo, que é dado em função no valor da venda do imóvel mas em função do valor da respectiva renda anual dos prédios semelhantes na mesma área geográfica.
Por último, nem se diga, a Administração Fiscal tinha a possibilidade de proceder a uma inspecção á escrita do empreiteiro que efectuou as referidas obras, em ordem a apurar a prova do pagamento, pois que em momento algum os Impugnantes o identificaram.
Quando aos demais encargos pretendidos deduzir, por os mesmos não respeitarem ao imóvel alienado não ponderam ser considerados, pois que para efeitos de determinação das mais-valias sujeitas a imposto não podem ser considerados despesas ou encargos que não sejam relativas ao imóvel gerador da mais valia tributável (Cfr, art. 10º, n.º1, al.a) e art. 51º, al.a) ambos do CIRS).”

Posto isto, avancemos.
Segundo o disposto no art. 10º nº 1 a) do CIRS:
“1-Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
a)Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário;
(…)
4-O ganho sujeito a IRS é constituído:
a) Pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais, sendo caso disso, no casos previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 1;”

Por sua vez o Artigo 51º do mesmo diploma legal dispõe o seguinte:
“Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem:
a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º;
b) As despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à alienação, nas situações previstas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 10.”

A questão que é objecto do presente recurso jurisdicional prende-se com a subsunção dos factos dados como provados à norma contida na alínea a) do artigo 51º do C.IRS. Importa por isso saber se, as despesas que constam dos autos e trazidas ao probatório, podem ser interpretadas como “as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação.
Na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, na pressuposição (imposta pelo n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil, que vale até que se demonstre que não é correcta) de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados. (Neste sentido, BAPTISTA MACHADO, Introdução ao direito e ao discurso legitimador, página 182.)
No caso em apreço não há elementos que justifiquem que se faça uma interpretação diferente da que resulta imediatamente do texto legal.
Do texto legal resulta a expressão despesas “necessárias” e “inerentes” pelo que devem ser interpretadas conforme a necessidade e a inerência da despesa face à aquisição e posterior alienação do imóvel, pelo que se coloca a questão de saber se tal “assumpção”, com os gastos inerentes, constitui despesa enquadrada naquele normativo, a considerar para efeitos de tributação da mais-valia respectiva. E, aí, a subordinante é, sem dúvida, “a inerência” da despesa à aquisição e alienação.
No critério legal, só as despesas inerentes são necessárias, pelo que só elas são relevantes. Tal critério contém uma ideia de inseparabilidade, uma relação intrínseca - que não meramente extrínseca - com a alienação: para ser considerada relevante, a despesa há-de sê-lo pela sua posição relativamente à alienação, há-de, em suma, ser dela indissociável.
De outro modo: a despesa há-de ser integrante da própria alienação.
Não se vê, efectivamente, que outro sentido se possa atribuir à expressão “inerentes à alienação”.

Não basta, pois, que as despesas sejam conexas à obtenção do rendimento, é necessário que elas dele sejam indissociáveis.
Segundo a doutrina mais recente são exemplos de “despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação”, são os registos e as escrituras-publicas – leia-se Rui Duarte Morais in Sobre o IRS, 2ª Edição, pag. 141 e Paula Rosado Pereira in Estudos sobre o IRS, Rendimentos de Capitais e Mais-valias, Cadernos IDEFF, nº 2.
Poder-se-á também considerar as despesas de mediação mobiliária, mais concretamente a comissão de intermediação, como despesas necessárias e inerente à venda do imóvel para efeitos no nº 1 alínea a) do art. 51º C.IRS.
Ora, não é a hipótese das despesas em causa.
Quanto as despesas que alegadamente efectuaram em obras de valorização do imóvel referido em A) adquirido em 28/08/1989, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ………. sob o n.º …….., pelo valor de € 134.675,43 e alienado em 05.01.2001, pelo valor de € 613.521,41, invocam os Recorrentes que os documentos comprovativos das mesmas foram destruídos numa inundação. A verdade é que não resulta provado nos autos, a sua ocorrência e se efectivamente foi a causa directa da destruição dos referidos documentos, além do que, embora esteja demonstrado que realizaram as obras não está provada a data das mesmas, em que consistiram e mais importante do que isso, o seu valor.

Finalmente quanto aos encargos de melhoramento do imóvel que os Recorrentes vieram a adquirir para habitação própria e permanente como reinvestimento do valor realizado conforme alínea C) do probatório, a saber instalação de um sistema de segurança, instalação de móveis de cozinha, instalação de uma antena de televisão, instalação de um forno de encastrar, como facilmente se retira do aditamento que fizemos ao probatório, os documentos trazidos aos autos não são suficientes para demostrar de forma inequívoca que melhoramentos foram feitos, quando onde e se efectivamente foram pagos pelos recorrentes, assim como, ainda que assim não fosse, não se enquadram no supra referido conceito de obras necessárias e indispensáveis à aquisição.
Face a tudo que vem exposto, conclui-se que andou bem a decisão agora apreciada quando considerou improcedente o invocado erro na quantificação do rendimento tributável.

III. DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso e em consequência manter a sentença recorrida.
Custas pelos Recorrentes.
Lisboa, 10 de Julho de 2015.

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(Barbara Tavares Teles)

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(Pereira Gameiro)
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(Anabela Russo)