Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1949/11.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/24/2020
Relator:VITAL LOPES
Descritores: OPOSIÇÃO; REVERSÃO; GERÊNCIA.
Sumário:1. A responsabilidade subsidiária de gerentes de sociedades, prevista no art°24°, n° 1 da LGT, depende do exercício de facto da gerência.
2. São presunções legais as que estão previstas na própria lei e presunções judiciais as que se fundam em regras práticas da experiência.
3. Não há uma presunção legal que imponha a conclusão de que quem tem a qualidade de gerente de direito exerceu a gerência de facto.
4. No entanto, o facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência comum.
5. Não decorrendo dos autos ou da factualidade apurada que o oponente/Recorrido – que não era o único gerente, nem a sua assinatura imprescindível para vincular a SDO – tenha assinado, recebido ou expedido correspondência em nome da SDO, ou que alguma vez tivesse feito menção da qualidade de gerente junto de credores ou devedores, ou instituições bancárias, clientes, fornecedores ou trabalhadores da executada, não se pode formular qualquer juízo, bem que presuntivo, sobre a efectividade da sua gerência.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL



1 – RELATÓRIO

A Exma. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa na parte em que julgou procedente a oposição deduzida por J........ à execução fiscal n.º........................... e apensos contra si revertida e originariamente instaurada contra a sociedade “B..... G......, Lda.” por dívidas provenientes de IMI de 2003 e de IRC de 2003 e 2006.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo.

A Recorrente conclui as alegações assim:
«
CONCLUSÕES:
A. Salvo o devido respeito, por opinião diversa, entende a Fazenda Pública que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, dado que da prova produzida não se podem extrair as conclusões em que se alicerça a decisão proferida.
B. Na presente oposição, considerou o douto Tribunal que o Oponente não exerceu a gerência de facto da devedora originária.
C. Todavia, face à prova produzida deveria o Tribunal a quo ter dado como provado que o oponente foi efetivamente gerente da devedora originária, no período a que respeitam os impostos em dívida.
D. Entende a fazenda Pública que não foi devidamente valorada na douta sentença a declaração emitida pelo sócio gerente D........., datada de 22 de Outubro de 2010.
E. Com efeito, deverá ser acrescentado aos factos provados o seguinte facto:
«Da declaração escrita pelo sócio gerente D........., datada de 22 de Outubro de 2010, consta o seguinte: «Todos os actos de gerência, após escritura supra referida de 24 de Novembro de 2000, foram assinados e realizados, única e exclusivamente por, D........., A........, C........ e J........, pelo que estes assumem toda e qualquer responsabilidade, nomeadamente para com a Administração Fiscal».
F. Da referida declaração resulta sem margem para dúvidas que o oponente exerceu as funções de gerente de facto até, pelo menos, 20-06-2009, data da renúncia à gerência.
G. No mesmo sentido se pronunciou o Ministério Público no seu Parecer constante a fls. 187 do SITAF.
H. Perante tal quadro factual não pode a Fazenda Pública concordar com a desconsideração de tais funções percorrida na sentença em mérito, pois provando-se que o oponente foi nomeado gerente e que no período temporal a que se reportam as dívidas exequendas assinou documentos necessários ao giro comercial da sociedade, vinculando-a perante terceiros e participou nas decisões de gestão da sociedade, tem-se por verificada a gerência de facto.
I. Com o devido respeito, conclui-se não ter razão o Tribunal a quo, pois que o acervo probatório não foi devidamente valorado e a norma que constitui o fundamento jurídico
da decisão a quo não foi devidamente interpretada e aplicada, designadamente a norma prevista no artigo 24.º da LGT.
J. É certo que para além das actas não existem nos autos outros documentos assinados pelo recorrido, no entanto da declaração do sócio gerente resulta evidente que a gerência da sociedade era realizada em conjunto com D........., A........, C........ e J........, o que implica a co-atuação de todos eles nos aspetos fundamentais da vida da empresa.
K. No caso em apreço, resultou provado que o oponente era gerente da sociedade e que, nessa qualidade, praticava actos relevantes para a vida da empresa ou sociedade.
L. Assim e salvo o devido respeito, a prova ínsita nos autos e, as consequências necessárias que dali de aferem sustentam a posição da Fazenda Pública, enquanto titular do direito de reversão da execução fiscal contra a responsável subsidiária, devendo ser considerada legitima a reversão contra a recorrida.
M. Termos em que, tendo a decisão recorrida decidido como decidiu, violou o disposto no artigo 24.º da LGT.
N. Deste modo, deverá determinar-se a improcedência da oposição julgar-se pela legitimidade do Oponente referente à execução fiscal na parte referente às dívidas de IMI de 2005, IRC de 2003 e 2006 pela convicção da gerência de facto do oponente/recorrido, formada a partir do exame crítico das provas.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada parcialmente e substituída por acórdão que julgue a oposição judicial improcedente na parte referente às dívidas de IMI de 2005, IRC de 2003 e 2006.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!».

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Exmo. Senhor Procurador-Geral-Adjunto emitiu mui douto parecer em que conclui, face à prova material produzida, ser de manter na ordem jurídica a sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), a questão controvertida reconduz-se a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir que da prova produzida não resulta demonstrada a efectividade da gerência do oponente.

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida:
«
2. MATÉRIA DE FACTO
2.1 Factos Provados
Compulsados os autos, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos:

A) Entre 21/05/2006 e 05/09/2009, foram instaurados pelo Serviço de Finanças de Loures 1, contra a sociedade B......... Lda., pessoa coletiva n.º .............., os processos de execução fiscal n.º .................. e apensos, para cobrança coerciva de dívidas de IMI do ano de 2005, IRC de 2003 e 2006 e coimas dos anos de 2006, 2007 e 2009, no montante total de € 609 420,64 – cfr. fls. 1, 2 dos processos de execução fiscal em Apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

B) A liquidação de IMI em causa no PEF ................. teve como prazo de pagamento voluntário 30/04/2006 – cfr. fls. 2 do referido PEF em apenso;

C) A liquidação de IMI em causa no PEF ................... teve como prazo de pagamento voluntário 30/09/2006 – cfr. fls. 2 do referido PEF em apenso;

D) A liquidação de IRC, respetivos juros de mora e compensatórios, relativas ao exercício de 2003, em causa no PEF ...................…, tiveram como prazo de pagamento voluntário 25/07/2007 – cfr. fls. 2 do referido PEF em apenso;

E) A liquidação de IRC, respetivos juros de mora e compensatórios, relativas ao exercício de 2006, em causa no PEF ....................., tiveram como prazo de pagamento voluntário 03/06/2009 – cfr. fls. 2 do referido PEF em apenso;

F) A sociedade B...... – G...... LDA. foi constituída em 1998 entre os sócios D........., C……, J........, ora Oponente e A.........– cfr. fls. 12 e 13 do Apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

G) Desde a sua constituição, foram designados gerentes da sociedade B...... – G...... LDA, todos os sócios, referidos em F) e ainda, J......... e A........ – cfr. fls. 13 do Apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

H) Até 14/06/2010, a sociedade B...... – G...... LDA. obrigava-se pela assinatura conjunta do gerente D......... e outro dos gerentes - cfr. fls. 13 e 15 do Apenso;

I) Em 15/01/2009 renunciou à gerência da sociedade B...... – G...... LDA, A........ – cfr. fls. 14 do Apenso;

J) Em 30/01/2009, renunciaram à gerência da sociedade B...... – G...... LDA., J……, J…… – cfr. fls. 14 do Apenso;

K) Em 20/06/2009, renunciaram à gerência da sociedade B...... – G...... LDA, C........ e J........, ora Oponente – cfr. fls. 14 do Apenso;
L) Desde 14/06/2010, foram designados gerentes da sociedade B...... – G...... LDA, os sócios D......... e A........ – cfr. fls. 15 do Apenso;

M) Dão-se por integralmente reproduzidas as atas n.º 11, 12. 13 e 14, datadas de 29/10/2000, 05/12/2000, 31/032001 e 11/05/2009, respetivamente, relativas a assembleias gerais da devedora originária, ora a fls. 29 a 35 do Apenso;

N) Da ata n.º 14, datada de 11/05/2009, e subscrita também pelo ora Oponente, destaca-se que teve como ponto único da ordem de trabalhos, a «redenominação do capital social», tendo o Oponente mantido a sua quota, que passou ao montante de € 7 481,97 – cfr. fls. 34 do apenso;

O) Em 12/07/2010 foi lavrado o auto de diligências, ora a fls. 9 do apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, do qual se destaca o seguinte: «1. Os elementos da contabilidade fornecidos estão bastante desatualizados, referindo-se a junho de 2009. Os valores em dívida na conta “…-Clientes” referem-se a clientes que já não têm qualquer tipo de relação com o executado há vários anos e os valores apresentados já se encontram saldados; 2. As instalações indicadas como sede da executada, sitas na ESTR N…… 11… – PARQUE INDUSTRIAL DO A……, foram impossíveis localizar; (…) – cfr. fls. 9 do Apenso;

P) Através de ofício datado de 14/10/2009, foi o ora Oponente notificado para efeitos de audição prévia da reversão no PEF ...................... – cfr. fls.118 do apenso;

Q) Em 27/10/2010, o Oponente exerceu o direito conferido em P) nos termos do requerimento ora a fls. 119 a 123 do Apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
R) Em 25/10/2010, A........ exerceu o direito de audição prévia sobre a reversão do PEF ...................... contra si, nos termos do requerimento ora a fls. 22 a 28 do Apenso, cujo teor e dos respetivos documentos, a fls. 29 a 41, aqui se dá por integralmente reproduzido;

S) Em 29/10/2010, foi proferido despacho de reversão das dívidas em cobrança coerciva no PEF ........................ e aps, contra o ora Oponente, com o seguinte teor: «Face às diligências de fls. [impercetível] e estando concretizada a audição do(s) responsável(veis) subsidiário(s), prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra J........ contribuinte n.º .............…, morador em LARGO H…… N 6 … C – P….. A….. – 2135-… S….. C….. na qualidade de responsável subsidiário, pela divida abaixo discriminada.
Atenta a fundamentação infra, a qual tem de constar da citação, proceda-se à citação do(s) executado(s) por reversão, nos termos do Art.º 160º do C.P.P.T. para pagar no prazo de 30 (trinta) dias, a quantia que contra si reverteu sem juros de mora nem custas (n.º 5 do Art.º 23º da L.G.T.). D.s. (assinatura)» - cfr. fls. 154 do Apenso;
T) Como fundamentos da reversão referida em S) foi indicado o seguinte: «Dos administradores, diretores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas coletivas e entidades fiscalmente equiparadas, por ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa coletiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o facto constitutivo da dívida se verificou no período de exercício do cargo [art. 24º/n.º 1/a) LGT]
ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa coletiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o prazo legal de pagamento/entrega terminou depois do exercício do cargo [art. 24º/n.º 1/a) LGT]
não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da divida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art. 24º/nº1/b) LGT].
Declaração do próprio, inserida nos Autos, a assumir toda e qualquer responsabilidade da firma executada, para com a Administração Fiscal.» - cfr. fls. 154 do Apenso;

U) O Oponente foi citado no PEF .................... e aps. em 11/11/2010 – cfr. aviso de receção assinado a fls. 158 do Apenso;

V) Em 15/12/2010, foi deduzida a presente Oposição – cfr. fls. 4 dos autos.

2.2 FACTOS NÃO PROVADOS.

1) Que o Serviço de Finanças tenha reconhecido a prescrição das dívidas quanto ao devedor originário, alegado pelo Oponente em sede de alegações, porquanto do teor de fls. 211 e 212 dos autos, resulta que não foi reconhecida a prescrição da dívida na devedora originária.
*

2.3 FUNDAMENTAÇÃO DO JULGAMENTO

A decisão da matéria de facto provada resultou da análise crítica de toda a prova produzida nos autos, nas informações oficiais e documentos constantes dos autos e do processo de execução fiscal, não impugnados, conforme remissão feita a propósito de cada alínea do probatório.

Quanto ao facto não provado, porque o documento junto pelo Oponente ora a fls. 211 e 212 dos autos, refere o contrário do que este alegou, ou seja, que o Serviço de Finanças não reconheceu a prescrição da dívida que reverteu contra o ora Oponente quanto ao devedor originário.».


4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

A Recorrente começa por invocar erro de julgamento de facto na medida em que o probatório omite um facto relevante para a decisão da causa. A seu ver, deverá ser acrescentado aos “factos provados”, o seguinte: «Da declaração escrita pelo sócio-gerente D........., datada de 22 de Outubro de 2010, consta o seguinte: “Todos os actos de gerência, após escritura suporá referida de 24 de Novembro de 2000, foram assinados e realizados, única e exclusivamente, por D........., A……., C........ e J........, pelo que estes assumem toda e qualquer responsabilidade, nomeadamente para com a Administração Fiscal”».

Por tal facto se encontrar materialmente apoiado no documento de fls.94 do apenso de execução e se mostrar pertinente para a matéria controvertida dos autos, adita-se aos factos provados, o seguinte:

X) Consta a fls.94 do apenso de execução uma declaração assinada pelo sócio-gerente D........., datada de 22 de Outubro de 2010, cujo teor se dá por reproduzido e de que se destaca a seguinte passagem: “Todos os actos de gerência, após escritura suporá referida de 24 de Novembro de 2000, foram assinados e realizados, única e exclusivamente, por D........., A……., C........ e J........, pelo que estes assumem toda e qualquer responsabilidade, nomeadamente para com a Administração Fiscal”.

Estabilizado o probatório, é com ele que avançamos para o conhecimento das restantes questões do recurso.

E como já referimos, a questão a decidir reconduz-se a saber se os elementos dos autos permitem concluir pela efectividade da gerência do oponente no período a que respeitam as dívidas de imposto revertidas, tendo a sentença incorrido em erro no julgamento que fez.

Em causa estão dívidas de impostos posteriores a 2003. Aplica-se o regime de responsabilidade subsidiária previsto no art.º24.º da Lei Geral Tributária.

Dispõe o n.º1 daquele art.º24.º da LGT:

«1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento».

De há muito, a jurisprudência do STA, com unanimidade, tem vindo a entender o que, em síntese lapidar, se deixou consignado no sumário doutrinal do Acórdão daquele alto tribunal de 11/03/2009, tirado no proc.º0709/08:
«I – A responsabilidade subsidiária de gerentes de sociedades, prevista no art°24°, n° 1 da LGT, depende do exercício de facto da gerência.
II – São presunções legais as que estão previstas na própria lei e presunções judiciais as que se fundam em regras práticas da experiência.
III – Não há uma presunção legal que imponha a conclusão de que quem tem a qualidade de gerente de direito exerceu a gerência de facto.
IV – No entanto, o facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência comum».
Pois bem, como se alcança da douta contestação, entende a Fazenda Pública, ora Recorrente, que «em sede de oposição, é ao responsável subsidiário que incumbe o ónus da prova de que não exerceu a administração de facto, pois uma vez que se mostre verificada a administração de direito, presume-se naturalmente a administração de facto» (cf. fls.111 dos autos). Coerentemente, nenhum esforço probatório desenvolveu na oposição visando demonstrar a efectividade da gerência do oponente.
Todavia, face à jurisprudência consolidada do STA, já vimos que não é bem assim, pois ainda que se prove a gerência de direito, a Fazenda Pública não está dispensada de provar a gerência de facto.
Por outro lado, como se refere no Acórdão do STJ de 01/19/2017, tirado no proc.º 841/12.6TBMGR.C1.S1, «O uso de presunções não se reconduz a um meio de prova próprio, consistindo antes, como se alcança do art.º 349º do Cód. Civil, em ilações que o julgador extrai a partir de factos conhecidos (factos de base) para dar como provados factos desconhecidos (factos presumidos).
A presunção traduz-se e concretiza-se num juízo de indução ou de inferência extraído do facto de base ou instrumental para o facto essencial presumido, à luz das regras da experiência, sendo admitida nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (art.º 351º do Cód. Civil)» (fim de citação).
Ora, percorrendo o probatório, o que se retira factualmente dele é que o oponente era gerente inscrito da sociedade devedora originária no período de constituição e pagamento das dívidas de imposto (cf. pontos A) a E), F), G) e K)); que a SDO se obrigava com a assinatura conjunta do gerente D......... e de um dos cinco outros, neste se incluindo o oponente, J........ (pontos G) e H)); as actas da assembleia geral da SDO foram subscritas pelos sócios, nomeadamente, o oponente (pontos M) e N); que D......... remeteu à execução uma declaração em que afirma que os actos de gerência da SDO, após a escritura de 24 de Novembro de 2000, foram assinados e realizados por ele, declarante e por A........, C........ e J........, oponente e aqui Recorrido (aditado ponto X)).
Os factos assinalados não permitem que se formule qualquer juízo, bem que presuntivo, quanto à efectividade da gerência do oponente.
E no que em particular se refere ao aditado ponto X) ao probatório, em que a Recorrente parece ver na declaração de D......... um elemento de prova decisivo quanto à efectividade da gerência do oponente, não a podemos acompanhar nesse juízo, a menos que tal declaração, por iniciativa do declarante ou a pedido da Administração tributária – posto que foi dirigida à execução ainda na fase instrutória do procedimento de reversão – viesse a ser substanciada em elementos que minimamente revelassem a concretização dos actos da afirmada gerência do oponente (remunerações/ movimentação de contas bancárias/ contratações/ contactos com clientes, fornecedores, entidades públicas…), salientando-se a circunstância de o oponente nem ser o único gerente da sociedade, nem a sua assinatura ser imprescindível para vincular a sociedade.

Como se assinala no Acórdão do TCAN, de 02/08/2018, tirado no proc.º01027/05.1BEBRG, «A denominada gerência de facto de uma sociedade comercial consiste no efectivo exercício das funções que lhe são inerentes e que passam, nomeadamente, pelas relações com os fornecedores, com os clientes, com as instituições de crédito e com os trabalhadores, tudo em nome, no interesse e em representação dessa sociedade.
Para que se verifique a gerência de facto é indispensável que o gerente use, efectivamente, dos respectivos poderes, que seja um órgão actuante da sociedade, tomando as deliberações consentidas pelo facto, administrando e representando a empresa, realizando negócios e exteriorizando a vontade social perante terceiros - nestes termos, Rúben Anjos de Carvalho, Francisco Rodrigues Pardal, “Código de Processo das Contribuições e Impostos, anotado e comentado”, 2ª Edição, Coimbra, 1969, p. 139 - citado, entre outros, nos acórdãos do TCAN de 18/11/2010 e de 20/12/2011, Processos 00286/07 e 00639/04, respectivamente» (fim de citação).

Do que vimos de dizer resulta que a Fazenda Pública não logrou provar, como era seu ónus, que, para além de deter a qualidade de gerente de direito da SDO, o oponente também exercia de facto a gerência, praticando os actos próprios e típicos inerentes a esse exercício nos anos aqui em causa e, como tal, não poderá ter lugar a respectiva responsabilização a título subsidiário pelo pagamento das dívidas exequendas ao abrigo do disposto no artigo 24.º, n.º 1 da LGT e, nessa medida, é de concluir pela ilegitimidade do oponente para a execução.

É, pois, de negar de provimento ao presente recurso e manter a sentença recorrida.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo da Recorrente, em ambas as instâncias.

Lisboa, 24 de Janeiro de 2020



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Vital Lopes




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Luísa Soares





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Mário Rebelo