Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:3/18.9BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:05/12/2022
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE DECISÃO ARBITRAL.
PRONÚNCIA INDEVIDA.
Sumário:Não incorre em pronúncia indevida por incompetência material do tribunal a decisão arbitral que aprecia da legalidade do despacho de indeferimento do pedido de revisão de liquidações de IMI, que apreciou do bem fundado do mesmo.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO
I- Relatório
A……………………….., S.A., solicitou a constituição de tribunal arbitral e procedeu a um pedido de pronúncia arbitral para que declare a nulidade das decisões de indeferimento expresso dos pedidos de revisão oficiosa dos actos tributários nº …………………, ……………….. ………………. e a consequente declaração de nulidade dos actos tributários de liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), referentes aos anos de 2012 a 2014, no montante total de €6.560,57 e respeitante ao prédio urbano, em propriedade total, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo matricial nº……….. (extinto ……) da actual União de Freguesias de ……………, ………………., …, …., ………….. e ……………, concelho (extinta Freguesia da …..), concelho do Porto. Na resposta, a Fazenda Pública, arguiu além do mais, a excepção dilatória da incompetência do tribunal em razão da matéria. O Tribunal Arbitral em 21 de Dezembro de 2017 decidiu, singularmente, julgar improcedente a excepção suscitada pela Requerida e procedente o pedido formulado pela Requerente, bem assim como o pedido de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar a Requerente o valor do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios nos termos legais.
Inconformada, a Autoridade Tributária e Aduaneira veio deduzir impugnação contra a referida decisão arbitral, tendo nas alegações apresentadas de fls. 1 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), formulado as seguintes conclusões:
«1.ª A decisão proferida pelo Tribunal Arbitral Singular constituído no CAAD que julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral, distribuído e autuado sob o nº…../2017-T, padece de nulidade pelo facto de ter emitido pronúncia sobre questão sobre a qual não se deveria pronunciar (artigo 28º/1-c), 1ª parte, do RJAT) e, subsidiariamente, pela circunstância de ter omitiu pronúncia relativamente duas questões sobre a qual se deveria pronunciar [artigo 28.º/1-c), 2.ª parte, do RJAT].
2.ª A questão da incompetência material do Tribunal Arbitral Singular subsume-se no fundamento de impugnação de pronúncia indevida, conforme propende a Doutrina e a Jurisprudência.
3.ª O Tribunal Arbitral Singular ao pronunciar-se sobre a legalidade dos indeferimentos em torno dos pedidos de Revisão Oficiosa de Ato Tributário sub judice acabou por emitir pronúncia sobre questões sobre a qual não se deveria pronunciar, porquanto a apreciação de tal matéria extravasa as competências que lhe estão reservadas por lei.
4.ª O artigo 2.º-a) Portaria 112-A/2011, de 22 de março, exclui, literalmente, do âmbito da vinculação da Impugnante à jurisdição arbitral, «(...) as pretensões relativas à declaração da ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», sem que aí seja mencionado o mecanismo de Revisão Oficiosa previsto no artigo 78.º da LGT.
5.ª Da redação do citado preceito legal, constata-se que o legislador optou por restringir o conhecimento na jurisdição arbitral às pretensões que, sendo relativas à declaração de ilegalidade de atos de liquidação, tenham sido precedidas de reclamação.
6.ª Dos elementos interpretativos não se alcança outra solução a de que a Impugnante apenas se vinculou, nos termos da Portaria 112-A/2011, à jurisdição dos tribunais arbitrais se o pedido de declaração de ilegalidade de ato de liquidação tiver sido precedido de recurso à via administrativa de Reclamação Graciosa, conforme, aliás, propende diversa jurisprudência arbitral.
7.ª O legislador não previu no artigo 2º daquela portaria o procedimento de Revisão Oficiosa como equiparável ao recurso à via administrativa, maxime à Reclamação Graciosa, para efeitos de aceder ao pedido de pronúncia arbitral.
8.ª É um entendimento forçado querer conjeturar que o legislador legislou de forma imperfeita, olvidando-se desta referência, quando já existia vasta jurisprudência e quando essa já era reiteradamente seguida pela atuação da Impugnante.
9.ª A exclusão dos procedimentos de Revisão Oficiosa da competência material dos tribunais arbitrais impõe-se igualmente por força dos princípios constitucionais do Estado de Direito e da Separação dos Poderes, bem como da Legalidade, como corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários.
10.ª O intérprete não pode amplificar o objeto fixado pelo legislador no que concerne à vinculação da Impugnante à jurisdição arbitral, dado que o legislador está a dispor sobre interesses gerais. Delimitando previamente a defesa do interesse público na vertente da indisponibilidade dos créditos tributários, sob pena de manifesta inconstitucionalidade que desde já se suscita para todos os efeitos legais;
11.ª Subsidiariamente, a decisão arbitral ora colocada em crise padece de nulidade pelo facto de não ter conhecido da questão da dependência do funcionamento do benefício fiscal sobre o recorte do conceito fiscal de prédio;
12.ª Por via do pedido de pronúncia arbitral, visou a Impugnada colocar em crise liquidações de IMI e os subsequentes pedidos de Revisão Oficiosa de Ato Tributário que lhe foram desfavoráveis;
13.ª A Impugnante deduziu Resposta ao pedido de pronúncia arbitral no qual sustentou a legalidade daqueles atos, tendo: (i) explanado a evolução do conceito de Classificação ao longo do tempo; (ii) efetuado a distinção dos diversos conceitos patentes no artigo 15.º da Lei 107/2011; (iii) demonstrado a real natureza jurídica da "classificação Património Mundial da UNESCO", (iv) defendido que o funcionamento do benefício fiscal em causa estava indissociavelmente recortado sobre o conceito fiscal de prédio (artigo 2º do CIMI), sendo que o Centro Histórico do Porto não constitui um prédio fiscal, mas antes uma universalidade; (v) e suscitando a inconstitucionalidade da interpretação feita pela Impugnada.
14.ª Cada uma destas questões (i) foi devidamente desenvolvida pela Impugnante ao longo do seu articulado, (ii) encontrava-se inequivocamente inserida em capítulos autonomizados e, por conseguinte, (iii) era perfeitamente identificável por parte de qualquer leitor medianamente atento.
15.ª O Tribunal Arbitral Singular entendeu que as questões a decidir se limitavam ao seguinte: «Nos autos, a questão principal que se coloca reconduz-se a saber se os prédios inseridos nos Centros Históricos Classificados como Património Mundial da UNESCO (como é o caso do Centro Histórico do Porto), beneficiam de isenção de IMI, ao abrigo do disposto no artigo 44º, nº 1 alínea n) do EBF».
16.ª Contudo, este "elenco de questões" fixado pelo Tribunal Arbitral Singular veio a omitir a questão da dependência do funcionamento do benefício fiscal sobre o recorte do conceito fiscal de prédio;
17.ª Mais importante ainda, a própria fundamentação da decisão não dedicou uma palavra sequer àquela questão não despicienda.
18.ª A problemática em torno da questão da dependência do funcionamento do benefício fiscal sobre o recorte do conceito fiscal de prédio constitui uma verdadeira questão e não um mero argumento.
19.ª Tão-pouco o Tribunal Arbitral Singular justificou - como se lhe impunha - a razão ou as razões que o levaram a não conhecer daquela questão suscitada pela Impugnante, tendo-se limitado exclusivamente a resolver a questão suscitada pela Impugnada.
20.ª A problemática em torno da questão da dependência do funcionamento do benefício fiscal sobre o recorte do conceito fiscal de prédio não era (nem é) uma questão cuja resolução tivesse ficado prejudicada pela resolução das demais questões.
21.ª Ainda que o Tribunal Arbitral Singular tenha aderido à tese propalada pela Impugnada, permanece por conhecer se a interpretação sobre o benefício fiscal aqui em causa poderá ser aplicada a uma universalidade de prédios, quando bem se sabe que uma universalidade não se subsume no conceito fiscal de prédio patente no artigo 2º do Código do IMI.
22.ª Pelo que a decisão arbitral colocada em crise não padece de uma "mera" fundamentação lacónica ou deficiente, antes configura uma "decisão surpresa";
23.ª Subsidiariamente ainda, a decisão arbitral ora colocada em crise padece de nulidade pelo facto de não ter conhecido da questão referente às inconstitucionalidades da interpretação feita pela Impugnante em torno do artigo 44º/1-n) do EBF;
24.ª Como referido, a Impugnante deduziu Resposta ao pedido de pronúncia arbitral na qual suscitou a inconstitucionalidade da interpretação feita pela Impugnada, defendendo que a interpretação veiculada por aquela era ainda desconforme aos princípios da igualdade tributária, da justiça fiscal, da capacidade contributiva, da autonomia local e da participação na decisão, a par da inconstitucionalidade orgânica.
25.ª Apesar de o Tribunal Arbitral Singular ter feito referência àquela questão no "Relatório" da decisão arbitral, certo é que verdadeiramente não a apreciou uma vez que limitou-se a afirmar o seguinte: «(… não se vislumbrando qualquer inconstitucionalidade decorrente da aplicação do artigo 44º, nºl, alínea n) ao caso em análise»;
26.ª Tal afirmação por parte do Tribunal Arbitral Singular não pode ser considerada como uma efetiva pronúncia face às questões constitucionais colocadas;
27.ª Do teor da decisão arbitral apenas resulta uma referência mínima e teórica ao princípio da capacidade contributiva, mas nenhuma palavra se encontra em torno dos princípios constitucionais da igualdade tributária, da justiça fiscal, da autonomia local e da participação na decisão, a par da inconstitucionalidade orgânica suscitada pela Impugnante;
28.ª A afirmação segundo a qual «(... não se vislumbrando qualquer inconstitucionalidade decorrente da aplicação do artigo 44º, nº l, alínea n) ao caso em análise», não só não constitui verdadeira pronúncia sobre a questão, como nem sequer equivale a "fundamentação pobre", representando, antes, uma clara violação do acesso ao direito e aos tribunais (o que desde já se invoca para todos os efeitos legais);
29.ª Ainda que o Tribunal Arbitral Singular tenha aderido à tese propalada pela Impugnada, permanece por conhecer se a interpretação veiculada pela Impugnada é ainda conforme aos princípios da igualdade tributária, da justiça fiscal, da capacidade contributiva, da autonomia local e da participação na decisão, a par de constitucionalmente orgânica;
30.ª No caso sub judice a Impugnante: (i) atacou a afirmação inicial da Impugnada segundo a qual o artigo 44º/1-n) do EBF não exige a classificação individual dos prédios classificados como Monumento Nacional: (ii) e apresentou ainda como razão contrária para atacar aquela afirmação inicial da Impugnada a desconformidade daquela mesma afirmação/interpretação com os princípios constitucionais da igualdade tributária, da justiça fiscal, da capacidade contributiva, da autonomia local e da participação na decisão, a par de uma inconstitucionalidade orgânica;
31.ª A razão contrária apresentada pela Impugnante não redundava num mero argumento e, menos ainda, prejudicado face à afirmação inicial, uma vez que, perante uma razão contrária assente na desconformidade constitucional da afirmação inicial dos Impugnados, se impunha ao Tribunal Arbitral Singular que sujeitasse aquela afirmação inicial ao crivo dos cinco aludidos princípios constitucionais invocados e desenvolvidos pela Impugnante, a par da inconstitucionalidade orgânica;
32.ª A razão contrária apresentada pela Impugnante assumia a forma de verdadeiras questões, a saber: (i) Uma classificação generalizada de 'Monumento Nacional' é um princípio absoluto! (ii) Uma classificação generalizada de 'Monumento Nacional' sobrepõe-se sempre ao princípio da igualdade tributária? (iii) Uma classificação generalizada de 'Monumento Nacional' violará o princípio da justiça fiscal? (iv) Uma classificação generalizada de 'Monumento Nacional' sobrepor-se-á á capacidade contributiva revelada pelo património imobiliário? (v) Poderá falar-se de uma efetiva violação dos princípios da autonomia local e da participação da decisão perante uma classificação generalizada de 'Monumento Nacional'? (vi) Registar-se-â aqui uma situação de inconstitucionalidade orgânica?:
33.ª A alegada desconformidade da afirmação inicial dos Impugnados com os cinco princípios constitucionais invocados pela Impugnante, a par da inconstitucionalidade orgânica, configura(va) um fundamento que pode(ria) conduzir à improcedência do pedido formulado pelos primeiros;
34.ª Também aqui a decisão arbitral não padece de uma "mera" fundamentação lacónica ou deficiente, antes configura uma "decisão surpresa", conforme já se entendeu no acórdão do Tribunal Central, Administrativo Sul proferido a 2015-04-23 no âmbito do processo n.º 08224/14;
35.ª Acresce que, ao não cumprir um dos requisitos essenciais inerentes a uma decisão - i.e., a de convencer os seus destinatários - o Tribunal Arbitral Singular coartou irremediável e incompreensivelmente um dos poucos mecanismos de controlo que assistem à Impugnante: o recurso para o Tribunal Constitucional [artigo 70º/1-b) da Lei 28/82, de 15 de novembro];
36.ª Motivos pelos quais não deve ser mantida na ordem jurídica a decisão arbitral ora colocada em crise, devendo antes ser aquela declarada nula.
X
Nas contra-alegações de fls. 59 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), a recorrida, A………………… ………….., S.A., formulou as conclusões seguintes:
«A) A decisão arbitral impugnada julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Recorrida, relativo à anulação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa dos atos de liquidação de IMI dos anos de 2011, 2012 e 2013 e à anulação dessas liquidações, e, em consequência, condenou a Recorrente ao reembolso do IMI indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal.
B) A douta decisão arbitral que a Recorrente impugna apresenta-se como justa e inequívoca, atendendo aos princípios processuais que devem ser observados.
C) Face à argumentação supra apresentada, não procede qualquer dos fundamentos de impugnação invocados pela Recorrente.
D) De facto, o Tribunal a quo apreciou todas as questões que lhe foram submetidas pelas partes (excetuadas aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras) e não se pronunciou sobre questões que não devesse conhecer.
E) A Recorrida não pode deixar de discordar da argumentação apresentada pela Recorrente, no que diz respeito à questão da incompetência material invocada, já que resulta de inúmeras decisões arbitrais que os tribunais arbitrais têm competência para apreciar decisões de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa de atos tributários.
F) De facto, sendo o pedido de revisão oficiosa equiparável à reclamação graciosa, a alínea a) do artigo 2º da Portaria nº112-A/2011, devidamente interpretada com base nos critérios de interpretação da lei viabiliza a apresentação de pedidos de pronúncia arbitral relativamente a atos tributários que tenham sido precedidos de pedido de revisão oficiosa.
G) A este propósito, resulta claro do Acórdão do TCA do Sul, de 27 de abril de 2017, no processo nº08599/15, que «[...] não se verifica o fundamento "pronúncia indevida", previsto na 1.ª parte da alínea c) do art.28º, nº1 do RJAT, porquanto o tribunal arbitral tem competência em razão da matéria para conhecer da ilegalidade de acto de auto-liquidação que tenham sido precedidos de pedido de revisão oficiosa.».
H) Nesta conformidade, conclui a Recorrida que embora em tese a incompetência do tribunal redunde numa pronúncia indevida, a verdade é que no caso em análise não se verifica qualquer pronúncia indevida de que padeça a decisão arbitral impugnada, uma vez que o Tribunal Arbitral era materialmente competente para apreciar o pedido de pronúncia arbitral relativo à anulação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa dos atos de liquidação de IMI dos anos de 2011, 2012 e 2013.
I) A confirmar o entendimento da Requerida - a competência material do tribunal arbitral para apreciar a legalidade das decisões de indeferimento dos pedidos de revisão oficiosa de ato tributário - encontra-se quer jurisprudência do STA, em concreto o Acórdão proferido no processo n.º0402/2006, quer recente jurisprudência do TCA do Sul, nomeadamente o Acórdão proferido no processo n.º08599/15, quer ainda a maioria da jurisprudência arbitral nesta matéria, nomeadamente as Decisões Arbitrais proferidas nos processos nºs 405/2017, 381/2017-T, 134/2017-T, 639/2017-T, 68/2016-T, 638/2016-T, 627/2016-T, 602/2016-T, 576/2016-T7 432/2016-T, 221/2016-T, 212/2016-T, 143/2016-T, 123/2016-T, 122/2016-T, 20/2016-T, 9/2016-T, 4/2016-T, 754/2015-T, 746/2015-T, 704/2015-T, 670/2015-T,630/2015-T, 617/2015-T, 592/2015-T, 320/2015-T, 203/2015-T, 64/2015-T, 846/2014-T, 843/2014-T, 799/2014-T, 742/2014-T, 630/2014-T, 613/2014-T, 251/2014-T, 148/2014-T, 299/2013-T, 117/2013-T, 47/2012-T.
J) Quanto ao fundamento de impugnação relativo à alegada omissão de pronúncia quanto à questão da dependência do funcionamento do benefício fiscal em causa sobre o recorte do conceito fiscal de prédio, não colhe também a argumentação expendida pela Recorrente.
K) A Recorrida reconhece que o julgador tem o dever de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, sob pena de nulidade - cfr. artigo 608º, nº2, 1.ª parte do CPC, aplicável ex vi artigo 29º, nº1, alínea e) do RJAT, e artigo 28º, nº1, alínea c), 2.ª parte do RJAT é necessário delimitar a amplitude deste dever.
L) Neste âmbito, resulta de inúmera jurisprudência do TCA do Sul que «[...] não devem confundir-se questões com as razões (de facto e de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão.», bem como que, «[...] só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das "questões") integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das "razões" ou "argumentos" invocados para concluir sobre as questões» - cfr. Acórdãos do TCA do Sul nos processos n.os 09569/16, 9499/16, 09420/16, 08981/15 e 08233/14.
M) Na senda desta jurisprudência, entende a Recorrida que a delimitação do conceito fiscal de prédio não constitui verdadeiramente uma questão, razão pela qual não se pode considerar que exista uma omissão de pronúncia.
N) Mais se acrescenta que, caso se entendesse que a análise do conceito fiscal de prédio era uma verdadeira questão e não um argumento que fundamentava a posição da ora Recorrente - o que se coloca em tese e sem se conceder ainda assim não existiria omissão de pronúncia, uma vez que existem exceções ao dever de pronúncia do tribunal.
O) O tribunal não tem o dever de resolver as questões cuja decisão seja prejudicada pela solução dada a outras - cfr. artigo 608º, nº2, 1.ª parte do CPC, aplicável ex vi artigo 29º, nº1, alínea e) do RJ AT, e artigo 28º, nº1, alínea c), 2.ª parte do RJAT.
P) Ora, tendo o Tribunal a quo declarado expressamente que a apreciação dessa "questão" tinha ficado prejudicada pela solução dada a outras, não existe qualquer omissão de pronúncia, mas, quando muito, um erro de julgamento, que não é fundamento de impugnação.
Q) Com efeito, o que a Recorrente pretende com a presente impugnação não é a análise da validade intrínseca da decisão arbitral, mas antes uma reapreciação do mérito da questão decidida pelo Tribunal a quo, que não é admissível e está, aliás, vedada ao TCA do Sul neste âmbito.
R) O entendimento da Recorrida quanto à inexistência de omissão de pronúncia relativamente à delimitação do conceito fiscal de prédio é corroborado por inúmera e recente jurisprudência do TCA do Sul, nomeadamente pelos Acórdãos proferidos nos processos n.os 09569/16, 9499/16, 09421/16, 09420/16 08981/15,08233/14608065/14.
S) Por fim, quando ao fundamento de impugnação relativo à alegada omissão de pronúncia quanto às questões de constitucionalidade, não colhe igualmente a argumentação apresentada pela Recorrente.
T) Apesar de no trecho citado pela Recorrente o Tribunal a quo se ter limitado a referir que não se vislumbrava qualquer inconstitucionalidade decorrente da aplicação do artigo 44º, nº1, alínea n) ao caso em análise, a verdade é que, como foi supra demonstrado, ao longo da sua decisão, o Tribunal desenvolveu os motivos que o levaram a chegar a tal conclusão.
U) Como tal, não se pode entender que exista uma omissão de pronúncia quanto às questões de constitucionalidade suscitadas pela Recorrente e, portanto, não existe fundamento de impugnação.
V) Quando muito, existiria um erro de julgamento se - como entende a Recorrente - se considerasse que a interpretação feita do referido preceito era efetivamente inconstitucional, caso em que o meio processual adequado era o recurso para o Tribunal Constitucional.
W) Neste âmbito, a Recorrente em invocar que a alegada omissão de pronúncia relativamente às questões de constitucionalidade lhe vedou o acesso ao recurso para o Tribunal Constitucional, o que não corresponde à verdade.
X) Ainda que se entendesse que existe uma omissão de pronúncia relativamente às questões de constitucionalidade - o que se coloca em tese e sem se conceder -, a possibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional não foi coartada.
Y) Nos termos do nº1 do artigo 25º do RJAT, decisões arbitrais são suscetíveis de recurso para o Tribunal Constitucional na parte em que apliquem norma cuja inconstitucionalidade tenha sido suscitada.
Z) Ora, tendo a Recorrente suscitado questões de constitucionalidade relativamente à interpretação que é feita da alínea n) do nºl do artigo 44º do EBF e tendo sido precisamente essa a norma que o Tribunal a quo aplicou na sua decisão, a Recorrente teria legitimidade para interpor recurso para o Tribunal Constitucional com base nesse fundamento.
AA) Em suma, é manifestamente improcedente a alegação da Recorrente de que lhe foi vedada a possibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional com fundamento numa omissão de pronúncia que, aliás, como se viu supra, não existe.
BB) Face a todo o enquadramento exposto, não colhe a argumentação expendida pela Recorrente e, como tal, não se verificam quaisquer dos fundamentos de impugnação da decisão arbitral invocados.
CC) Nesta conformidade, deve negar-se provimento à Impugnação e manter-se a decisão do Tribunal a quo.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal foi notificado nos termos do artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, mas nada disse.
X
II- Fundamentação
1. De Facto.
A decisão arbitral recorrida considerou provados os factos seguintes:
«6.1.1. A Requerente é proprietária do prédio urbano em propriedade total sito na Rua ………………, nº1, V …………….., nºs 28 a 30 e Rua …………………, nºs 61 a 65, da União de Freguesias de ……………., ……………….., ………….., ……………., S. ……….. e ………… (extinta Freguesia da …….), Concelho do Porto, Distrito do Porto, descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº ……….. e inscrito sob o artigo matricial nº …………. (extinto ………..).
6.1.2. O “Centro Histórico do Porto” está classificado, desde 1996, como Património Mundial da UNESCO [tendo sido integrado na respectiva Lista indicativa, com fundamento “(…) no valor universal excepcional do tecido urbano do seu centro histórico (…)”], conforme declarado pelo Aviso nº15173/2010, publicado no Diário da República, II Série, de 30 de Julho de 2010.
6.1.3. O imóvel acima identificado no ponto 6.1.1. faz parte integrante do conjunto denominado “Centro Histórico do Porto” e está classificado como Monumento Nacional (por estar inscrito na Lista do Património Mundial da UNESCO), de acordo com o disposto nos nºs 3 e 7 do artigo 15º da Lei nº 107/2001, de 8 de Setembro.
6.1.4. A Requerente foi notificada das seguintes notas de cobrança de IMI, relativas às liquidações de imposto respeitantes ao imóvel descrito no ponto 6.1.1., supra, referentes aos anos de 2012 a 2014, datadas de 16 de Março de 2013, de 9 de Março e de 26 de Abril de 2014 e de 28 de Fevereiro de 2015, respectivamente:
ANO
DOCUMENTO
    MONTANTE
    DATA LIMITE PAGAMENTO
DATA
PAGAMENTO
……………
761,46
Abril/2013
26/04/2013
2012
……………….
761,46
Julho/2013
10/07/2013
…………….
761,45
    Novembro/2013
10/10/2013
…………….
685,31
Abri 1/2014
10/04/2014
2013
……………..
685,31
Agosto/2014
18/07/2014
……………..
708,10
    Novembro/2014
27/10/2014
……………..
740,09
Abril/2015
15/04/2015
2014
    …………..
740,09
Julho/2015
10/07/2015
………………
740,09
Novembro/2015
22/10/2015
TOTAL
6.58336 (*)

(*)Este montante total difere do valor do pedido arbitral(EUR 6.560,57) em EUR 22 79 que corresponde à diferença existente ente o valor da primeira e segunda de IMI relativo ao ano 2013 (EUR 685 31) e o valor da terceira prestação do IMI relativo ao ano 2013 (EUR 708,10). Anda assim, manteremos o valor económico atribuído ao pedido (ou seja EUR 650,57), pois aquela diferença deverá resultar de lapso da Requerente, não afectando a decisão arbitral porque o que está em causa, no pedido arbitral, são as liquidações de IMI dos anos 2012, 2013 e 2014, e não as notas de cobrança associadas com as referidas liquidações.
6.1.5. A Requerente apresentou, em 18 de Março de 2016, pedido de Revisão Oficiosa de Acto Tributário (nº…………………, …………………… e ………………..) relativo às liquidações de IMI dos anos de 2012 a 2014.
6.1.6. A Requerente foi notificada do Ofício nº …………………., de 1 de Março de 2017, relativo ao projecto de indeferimento do pedido de Revisão Oficiosa identificado no ponto anterior e para, querendo, no prazo de 15 dias, exercer o direito de participação na decisão (audição prévia).
6.1.7. A Requerente exerceu o seu direito de audição prévia, reiterando a argumentação apresentada no pedido de Revisão Oficiosa dos actos de liquidação de IMI identificados.
6.1.8.A Requerente foi notificada do Ofício nº ……………………, de 5 de Abril de 2017, respeitante ao despacho de indeferimento do referido pedido de Revisão Oficiosa dos actos de liquidação de IMI dos anos 2012, 2013 e 2014.
*
6.2. Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito do pedido.
*
Motivação quanto à matéria de facto
6.3. No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes (em sede de facto), no teor dos documentos juntos, por ambas as Partes, aos autos.
*
Dos factos não provados
6.4. Não se verificaram quaisquer factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.»
X
2.2. De Direito.
2.2.1. A presente pretensão impugnatória centra-se sobre os alegados vícios da sentença arbitral seguintes:
i) Pronúncia indevida, dado que o tribunal arbitral é materialmente incompetente para apreciar a validade do acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto tributário em apreço [conclusões 1.ª) a 10.ª)].
ii) Omissão de pronúncia no que se refere à questão relativa à dependência do funcionamento do benefício fiscal sobre o recorte do conceito fiscal de prédio [conclusões 11.ª) a 22.ª)].
ii) Omissão de pronúncia no que se refere à questão relativa inconstitucionalidade da interpretação feita pela impugnada em torno do artigo 44.º/1/n), do EBF [demais conclusões].
A sentença julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, determinou o seguinte:
a) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela requerente, mandando-se revogar a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação de IMI dos anos de 2011, 2012 e 2013 (porque contrária à lei), bem como mandando-se anular as liquidações de IMI subjacentes, por enfermarem de vício de ilegalidade.
b) Condenar, em consequência, a requerida no reembolso do IMI indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios à taxa legal, contados nos termos legais;
c) Condenar a requerida no pagamento das custas do presente processo.
2.2.2. No que respeita ao fundamento da impugnação referido em i), a impugnante invoca que o tribunal arbitral não tem competência para conhecer da ilegalidade de decisão incidente sobre o pedido de revisão oficiosa do acto tributário. Defende que a competência do tribunal arbitral não incide sobre o pedido de declaração de ilegalidade de actos secundários emitidos pela Administração Tributária no âmbito de procedimentos administrativos instaurados pelo contribuinte com vista a aferir da legalidade do acto tributário, como sucede com o acto de indeferimento do pedido de revisão em apreço.
Apreciação. A competência dos tribunais arbitrais decorre do disposto no preceito do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20.01, diploma que estabelece o regime jurídico da arbitragem tributária [RJAT]. Aí se consigna que «[a] competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões: // a) A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta; (…)». Por seu turno o artigo 2.º(1) da Portaria que regula a vinculação da DGCI à “jurisdição” dos tribunais arbitrais (Portaria n.º 112-A/2011, de 22.03), determina que «[o]s serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção das seguintes: // a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário».
Suscita-se a questão de saber se o facto de o pedido de pronúncia arbitral incidir sobre o acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa das liquidações de IMI contestadas constitui fundamento da exclusão do carácter arbitral da pretensão impugnatória in judicio, o que determinaria a ocorrência de pronúncia arbitral indevida, passível de justificar a anulação da decisão arbitral (artigo 28.º/1/c), do RJAT). Por outras palavras, estando em causa decisão negativa incidente sobre pedido de revisão do acto tributário, por meio da qual foi dirimida a questão da legalidade do mesmo (2), a falta de ataque directo ao acto de liquidação teria como efeito a preclusão da competência do tribunal arbitral para dirimir a questão.
A interpretação do disposto no artigo 2.º/a), da Portaria n.º 112-A/2011, de 22.03, no sentido da exclusão da competência arbitral para conhecer de pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de indeferimento de pedidos de impugnação administrativa (incluindo a revisão do acto tributário) de actos tributários não possui na lei e no ordenamento jurídico suporte (3). A Lei de autorização legislativa do regime jurídico da arbitragem tributária [RJAT] (4) determinou que «[o] processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária» e que «[a] delimitação do objecto do processo arbitral tributário [inclui] os actos de liquidação de tributos (…), de indeferimento total ou parcial de reclamações graciosas ou de pedidos de revisão de actos tributários, os actos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação (…)». Mais se refere que a referência do artigo 2.º/a), da Portaria n.º 112-A/2011 à «declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta» «não restringe o âmbito da jurisdição arbitral aos casos em que é impugnado directamente um acto de um daqueles tipos, pois a ilegalidade de actos de liquidação pode ser declarada jurisdicionalmente como corolário da ilegalidade de um acto de segundo grau, que confirme um acto de liquidação, incorporando com essa confirmação a sua ilegalidade» (5). Simetricamente, apenas se incluirão nessa competência, os actos de indeferimento dos meios impugnatórios administrativos que apreciem da legalidade dos actos tribuários (6). E sendo a impugnação arbitral um meio alternativo à impugnação judicial, cumpre convocar a directiva segundo a qual «[o] objecto real da impugnação é o acto de liquidação e não o acto que decidiu a reclamação, pelo que são os vícios daquela e não deste despacho que estão verdadeiramente em crise», pelo que a mesma «não está, por isso, limitada pelos fundamentos invocados na reclamação graciosa, podendo ter como fundamento qualquer ilegalidade do acto tributário» (7).
No caso em exame, do probatório resulta que a requerente apresentou pedido de revisão oficiosa de acto tributário relativo às liquidações de IMI dos anos de 2012 a 2014, tendo sido proferido despacho de indeferimento do mesmo, confirmando a legalidade daquelas. Pelo que o pedido de pronúncia arbitral tendente à declaração de legalidade do despacho negativo em referência integra a esfera de competência do tribunal arbitral (artigo 2.º/1/a), do RJAT).
Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente alegação.
2.2.3. No que respeita ao fundamento da impugnação arbitral referido em ii), a impugnante invoca que a decisão sob escrutínio incorreu no vício de omissão de pronúncia, dado que não apreciou a questão relativa à asserção segundo a qual o reconhecimento do benefício fiscal em apreço depende do conceito fiscal de prédio.
Apreciação.
A omissão de pronúncia sobre questões de que devesse tomar conhecimento é fundamento da nulidade da sentença (artigo 615.º/1/d), CPC). «O conceito de questões abrange tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem» (8).
Para justificar a asserção de que as liquidações de IMI contestadas são ilegais, o tribunal arbitral ponderou, em síntese, que, «estando em causa prédio integrado na Zona Histórica do Porto, legalmente qualificada como monumento nacional, é forçoso concluir que: // "Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis: os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável - cfr. artigo 44.º, n.º 1, alínea n) do Estatuto dos Benefícios Fiscais”. // "Os imóveis situados nos Centros Históricos incluídos na Lista do Património Mundial da UNESCO classificam-se como sendo de interesse nacional, inserindo-se na categoria de monumentos nacionais - cfr. Artigo 15.º n.º 3 e n.º 7 da Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro”. // "Os prédios inseridos nos Centros Históricos Classificados beneficiam de isenção de imposto municipal sobre imóveis”. // (…) // [P]arece-nos claro que a alínea n) do artigo 44° do EBF prevê duas realidades elegíveis para isenção de 1MI: (i) os prédios classificados como monumentos nacionais e os (ii) prédios individualmente classificados como de interesse público ou interesse municipal”, sendo que "só estes últimos requerem a classificação para beneficiarem da isenção. Para os outros basta a comunicação da classificação como monumentos nacionais (...) para que os imóveis nele integrados assumam esta classificação”».
A impugnante sustenta a asserção da omissão de pronúncia na alegada falta de ponderação do argumento segundo o qual o benefício fiscal de isenção de IMI, previsto no artigo 44.º/1/n), do EBF, pressupõe a delimitação de um prédio, tal com o mesmo é definido no artigo 2.º do CIMI. Sucede que a presente asserção rejeitada pelo entendimento que fez vencimento na decisão arbitral sob escrutínio. Pelo que a alegada omissão de pronúncia sobre questão de que cumpre ao tribunal conhecer não se comprova nos autos.
Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente imputação.
2.2.4. No que respeita ao fundamento da pretensão impugnatória referida em iii), a impugnante afirma que invocou contra a interpretação defendida pela impugnada - segundo a qual o prédio dos autos está isento de IMI - a sua inconstitucionalidade, por violação dos princípios constitucionais da igualdade tributária, da justiça fiscal, da capacidade tributária, da autonomia local e da participação na decisão, para além da inconstitucionalidade orgânica.
Na resposta ao pedido de pronúncia arbitral, a impugnante defendeu que a aplicação do beneficio fiscal de isenção de IMI, previsto no artigo 44.º/1/n), do EBF, configura preterição dos princípios constitucionais da igualdade tributária, da capacidade contributiva, da autonomia local, da participação na decisão, bem como enferma de inconstitucionalidade orgânica, porquanto a equiparação dos actos de classificação previstos no Decreto n.º 203985 de 1932 com os actos de classificação previstos na Lei de Bases da protecção do património cultural (Lei n.º 107/2001, de 08.09), implicaria a adopção de um acto com força de lei, o que até à data não sucedeu.
Por seu turno, a decisão arbitral sustentou a conformidade da solução encontrada com o princípio da capacidade contributiva nos pontos 7.21. a 7.27., para concluir, no ponto 7.75. da sua fundamentação no sentido de que «[n]o caso, … face às características apontadas aos Benefícios Fiscais (ponto 7.23. a 7.27. e 7.44. e 7.45. supra), não assiste razão à Requerida quando invoca que “(...) a interpretação veiculada pela Requerente se mostra contrária à Constituição da República Portuguesa - na medida em que viola os constitucionais princípios (i) da igualdade tributária, (ii) da justiça fiscal, (iii) da capacidade contributiva, (iv) e (v) da participação na decisão”, não se vislumbrando qualquer inconstitucionalidade decorrente da aplicação do artigo 44°, n° 1. alínea n) ao caso em análise». Fê-lo, depois de proceder ao enquadramento da questão no quadro do regime do IMI e do regime geral dos benefícios fiscais, para o qual remete [“ponto 7.23. a 7.27. e 7.44. e 7.45. supra”]. Invoca a jurisprudência fiscal assente, para a qual remete [v.g. Acórdão do TCAN de 07.12.2016, P. 00134/14.4BEPPRT e Acórdão do TCAN de 01.06.2017, P. 00693/14.1BEPRT].
A este propósito, este TCAS teve ocasião de referir que «[é] uma verdadeira questão, e não um mero argumento, a alegação de que uma determinada disposição legal, interpretada num determinado sentido é inconstitucional. // Tendo a Administração Tributária suscitado no seu articulado a questão enunciada em III, e não tendo o Tribunal Arbitral - que perfilhou na sua decisão a interpretação do normativo no sentido reputado de inconstitucional - apreciado expressamente essa questão, há que concluir que a sentença arbitral impugnada padece de nulidade por omissão de pronúncia» (9).
No caso em exame, verifica-se que as questões de inconstitucionalidade suscitadas quanto à interpretação do disposto no artigo 44.º/1/n), do EBF veiculada pela impugnada, foram apreciadas e rejeitadas pelo tribunal arbitral, louvando-se na jurisprudência fiscal assente (10). Pelo que a alegada omissão de pronúncia sobre as referidas questões de inconstitucionalidade não se comprova nos autos. Motivo porque se impõe julgar improcedente a presente imputação.
Termos em que se julga improcedente aa presente intenção impugnatória.
Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em julgar improcedente a presente impugnação de decisão arbitral, confirmando a decisão arbitral impugnada.

Custas pela impugnante.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)

(1.ª Adjunto- Hélia Gameiro Silva)

(2.ª Adjunto –Ana Cristina Carvalho)

(1) “Objecto da vinculação”.
(2) V. processo arbitral apenso.
(3) Neste sentido, v. Acórdão do TCASul, de 27/04/2017, P. 08599/15 e Acórdão do CAAD, de 15/01/2022, P. 510/2021-T.
(4) Artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2011, de 18 de Abril – Orçamento geral do Estado para 2010.
(5) Jorge Lopes de Sousa, “Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária”, in Guia da Arbitragem Tributária, Coord. Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira, Almedina, 2013, pp. 121/122.
(6) Neste sentido, v. Jorge Lopes de Sousa, Comentário… cit., p. 123.
(7) Acórdão do STA, de 18/05/2011, P. 0156/11.
(8) Jorge Lopes Sousa, CPPT Anotado, 6.º Ed., vol. II, p. 363.
(9) Acórdão de 31.10.2019, P. 95/17.8BCLSB
(10) No mesmo sentido, v. Acórdão do STA, de 10.11.2021, P. 01011/14.4BEPRT.