Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:124/04.5BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:12/13/2019
Relator:MÁRIO REBELO
Descritores:COIMA ÚNICA E COIMAS PARCELARES.
Sumário:1. A exigência da alínea da alínea c) do n.º do art.º 212º do CPT, [correspondente à alínea c) do nº 1 do artigo 79º do RGIT], de que a decisão contenha a coima e sanções acessórias com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação, refere-se a cada uma das contra-ordenações punidas.

2. Aplicando coima única sem individualizar e aplicar a cada facto ilícito a respetiva coima, a decisão administrativa não satisfaz os requisitos legais previstos no art.º 212º CPT, o que fere com nulidade o processo de contra ordenação fiscal, constituindo um vício de conhecimento oficioso [Art.º 195º/5 CPT.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

RECORRENTE: Autoridade Tributária e Aduaneira
RECORRIDO: F...... - F........, SA.
OBJECTO DO RECURSO: Despacho decisório proferido pela MMª juiz do TAF de Almada que determinou a revogação da decisão administrativa de aplicação da coima proferida em 29.07.2003.
CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:

1.ª

O douto Despacho Decisório - embora não acompanhando esta linha de pensamento, devido ao recurso apresentado, em 16/3/2005, do 1.º Despacho Decisório, pelo Ministério Público, para o Supremo Tribunal Administrativo, na sequência do qual foi proferido o Acórdão, no qual foi decidido que o prazo de prescrição de sete anos e meio, ainda não havia decorrido – ainda assim decidiu pela procedência do Recurso de Contraordenação, nos seguintes termos:

1- “Contudo, por Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, foi revogada grande parte da liquidação adicional de IRC, subjacente à decisão de aplicação de coima, designadamente no que se refere às provisões sobre os encargos bancários com o desconto de letras o que corresponde a mais de 50% da liquidação adicional de IRC que originou a decisão de aplicação de coima.

A decisão ora recorrida (…), tendo fixado a mesma no valor de EUR 12.469,95 (…) revela-se completamente desajustada à redução de imposto em falta decidida pelo TCA Sul (…).

Face ao exposto, sem necessidade de mais amplas considerações (…), deve proceder o presente recurso de contra-ordenação e revogada a decisão de aplicação da contra-ordenação impugnada.” Sublinhado, nosso.

2 – “IV. DECISÃO

Pelo exposto:

I. Julgo o presente recurso «procedente e determino a revogação da decisão de aplicação da coima.

II. Sem custas, por delas estar isento o MP […].

III. Registe e notifique.


*

Almada, 23 de Janeiro de 2019.”

2.ª

Decisão com que não se podem concordar.

3.ª

Com efeito, decorre do (primeiro) Acórdão, do Supremo Tribunal Administrativo (STA), que não se verifica a alegada prescrição do processo contra-ordenacional.

4.º

E, ainda, agora do segundo Acórdão – TCA-Sul, de 3-12-2015, Processo n.º 01108/16, consultável em www.dgsi.pt – que, ao conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, decide “i). Manter a sentença recorrida na parte em que julga improcedente a impugnação e mantêm a correcção relativa à tributação autónoma e correspondentes juros compensatórios;”.

5.ª

Por conseguinte, no caso trazido a juízo, na sequência do sobredito Acórdão, haveria igualmente que determinar o quantum, relativamente ao decaimento da coima, condenando, a ora recorrida, no remanescente do valor, da coima, assim apurado ou calculado.

6.ª

Desde logo, não somente por resultar implícito do Acórdão que, paralelamente, assim decidiu.

7.ª

Como, ainda, a obediência, ao mesmo, a isso obriga.

8.ª

Porém, ao invés, no douto Despacho Decisório tal foi desvalorizado, na medida em que este entendimento ali não se encontra reflectido, em prejuízo, desde logo, do Erário público.

9.ª

O qual, com o devido respeito, se nada fosse feito, sairia defraudado desta demanda.

10.ª

Daí que, ao omitir-se este passo, o decidido no douto Acórdão do TCA-Sul, acabou por ser, de forma similar, ignorado.

11.ª

Assim sendo, e salvo o devido respeito, este entendimento não pode deixar de se justificar sendo, em consequência, nulo o Despacho Decisório em questão, cuja nulidade desde já se requer.

12.º

Isto porque, como jurisprudencialmente consolidado, o dever de fundamentação da Sentença tem assento, desde logo constitucional, tal como se extrai, designadamente, do sumário do douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte – TCA-Norte, de 2016-05-25, Proc.º 00724/04.3BEVIS - Descritores: ANÁLISE CRÍTICA DA PROVA; NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO – Sumário - "1- O dever de fundamentação da sentença tem assento constitucional e constitui uma garantia integrante do próprio conceito de Estado de direito democrático, como instrumento de ponderação e legitimação da própria decisão judicial e de garantia do direito ao recurso.

2. Este dever abrange realidades distintas (mas conexas) que incluem a fixação dos factos provados e não provados, a respectiva fundamentação de direito e a explicitação das razões pelas quais o julgador considerou provado determinado facto.

3. Esta parte da fundamentação tem sido designada por motivação da decisão de facto e consiste no exame crítico da prova.

4. O juiz deve esclarecer quais foram os elementos probatórios que o levaram a decidir como decidiu e não de outra forma. Deve indicar os fundamentos suficientes para que através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado.

5. E no caso de haver elementos probatórios divergentes, deve explicar (fundamentar) as razões porque deu prevalência a uns sobre os outros.

6. O exame crítico da prova não precisa ser exaustivo.

7. Importante é que, tendo presente o dever de fundamentação e os objectivos que a mesma visa alcançar, o julgador se empenhe na sua explicitação e não se escude em fórmulas vazias destituídas de qualquer densidade que nada dizem e por isso nada fundamentam.

8. (…)”. - Sublinhado, nosso.


13.ª

Assim ao decidir como decidiu, o douto Despacho Decisório violou, designadamente, o disposto nos artigos 122.º e ss., do CPPT, bem como nos artigos 607.º e ss, do Novo Código do Processo Civil (NCPC), aplicáveis ex vi alínea d), do artigo 2.º do CPPT.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a Vs. Exas. se dignem julgar procedente por provado o presente recurso e revogar a decisão proferida em 1ª instância, substituindo-a por douto Acórdão que declare improcedente o aí decidido.

CONTRA ALEGAÇÕES.

Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela prescrição da decisão de aplicação da coima.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso consiste em saber se o despacho decisório errou ao revogar a decisão de aplicação da coima. Previamente há que averiguar se o procedimento por contra ordenação se encontra prescrito como defende o Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:

Em 3/9/1997, o Serviço de Fiscalização Tributária emitiu o auto de notícia constante de fls. 2 e seguintes dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, onde consta que da análise da declaração modelo 22, e anexos, referente ao exercício de 1994, foram verificadas, em síntese as seguintes omissões:

“ (…)

a) o sujeito passivo constituiu provisões sobre os encargos bancários com o desconto de letras, que habitualmente debita aos seus clientes. Como os encargos bancários não resultam da actividade normal da empresa, não podem ser aceites como custos nos termos da alínea a) do n" 1 do artigo 33° do CIRC. O montante a corrigir é de 20.591.621$00 (vinte milhões quinhentos e noventa e um mil seiscentos e vinte e um escudos), conforme anexo n.º 1

b) O sujeito passivo constituiu provisões pela totalidade, dos créditos de cobrança duvidosa cuja antiguidade não é superior a 24 meses, não respeitando a mora dos créditos estipulada na alínea c) do n° 1 do artigo 34° do CIRC, segundo a qual, as provisões deviam ser constituídas a 25%, 50% ou 75% do valor dos créditos, a partir da data do vencimento das facturas ou letras. Não é aceite como custo fiscal a importância de 18.084.186$00 (dezoito milhões e oitenta e quatro mil cento e oitenta e seis escudos), por ultrapassar aqueles limites, nos termos do n" 2 do artigo 34° e por não respeitar o princípio da especialização dos exercícios previsto no n" 1 do artigo 18°, ambos do CIRC, conforme anexo n° 1.

c) A F...... deduziu no quadro 17 linha 28 da declaração de rendimentos do exercício de 1994, a importância de 3.629.837$00 (três milhões seiscentos e vinte e nove mil oitocentos e trinta e sete escudos), a qual diz respeito à utilização da provisão do cliente A........ Não é de aceitar a dedução efectuada pois as provisões constituídas para a A....... sempre foram aceites fiscalmente, não tendo sido tributadas anteriormente.

d) O contribuinte contabilizou como custos do exercício na conta despesas como combustíveis, a compra de cheques-auto que apenas apresentam como suporte documental o talão de venda emitido pelo banco, conforme anexo n" 2. O referido documento não comprova o consumo efectivo pelo que se considera que este custo não se encontra devidamente documentado, sendo a correcção efectuada a favor do Estado, nos termos da alínea h) do n" 1 do artigo 41 ° do CIRC, na importância de 7.225.000$00 (sete milhões duzentos e vinte e cinco mil escudos). As despesas confidenciais ou não documentadas são ainda tributadas autonomamente à taxa de 10%, nos termos do artigo 4° do D.L. n° 192/90, de 9 de Junho na sua redacção inicial.

e) Os encargos suportados pela empresa com a aquisição de roupa por parte de alguns dos empregados não são aceites como custos por não serem indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a impostos, nos termos do artigo 23° do CIRC. A correcção fiscal a efectuar é de 2.777.798$00 (dois milhões setecentos e setenta e sete mil setecentos e noventa e oito escudos), conforme anexo nº2.

f) A F...... evidenciou no mapa de mais e menos-valias (mapa 31) o montante da alienação das acções próprias tendo procedido à dedução e posterior acréscimo no quadro 17 da declaração m/22 da mais-valia contabilística de 6.252.918$00 (seis milhões duzentos e cinquenta e dois mil novecentos e dezoito escudos) e mais- valia fiscal de 3.988.244$00 (três milhões novecentos e oitenta e oito mil e duzentos e quarenta e quatro escudos), respectivamente, conforme anexo n" 3.

As acções próprias não são consideradas imobilizações financeiras face ao D.L. 410/89 de 21 de Novembro, pelo que a sua transmissão não é susceptível de beneficiar do regime previsto no artigo 44° do CIRC, desta forma procede-se à anulação da mais-valia contabilística e mais-valia fiscal anteriormente referidas e consideradas pelo s.p. no quadro 17 da declaração m/22.

As referidas omissões ou inexactidões constituem infracção prevista e punida pelo artigo 34° do Regime Jurídico das Infracções Fiscais Não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto de Lei n° 20-A/90, de 15 de Janeiro.

(…)

Para determinação da responsabilidade e graduação da coima, de acordo com o artigo 185.º, n.º 2 alínea e) do Código de Processo Tributário indicam-se os seguintes factos.

As correcções efectuadas dão origem a imposto em falta na importância de 20.368.822$00 (vinte milhões trezentos e sessenta e oito mil oitocentos e vinte e dois escudos). As correcções referidas na alínea a), d) e e), já se verificaram no exercício anterior. A empresa no ano anterior apresentou lucro

(…)”

2. Em 11/5/1998, o Adjunto do Chefe de Repartição proferiu o despacho constante a fls. 8 dos autos, no qual determinou a suspensão da contra-ordenação até que ocorresse qualquer das circunstâncias previstas nas alíneas a) a c) do artigo 182.º do CPT.

3. Em 20/7/1998, a recorrente recepcionou o aviso de recepção que acompanhou o envio do auto de notícia (cf. docs. a fls. 9 e 10 dos autos).

4. Em 28/9/1998, a ora recorrente apresentou reclamação graciosa da liquidação adicional de IRC n.º 8310005..., de 7 de Maio de 1998, relativa ao exercício de 1994, no valor de ESC 32.490.891, sendo ESC 19.646,321 de IRC, ESC 1964.632 de derrama e 722.500 de tributação autónoma de despesas confidenciais e ESC 10.157.438 de juros compensatórios (cf. reclamação a fls. 21 a 29 dos autos).

5. Em 29/9/1998, a recorrente requereu o pagamento voluntário da coima que vier a ser fixada, conforme documento de fls. 23.

6. Em 17/8/2001, o Chefe de Finanças proferiu o despacho de indeferimento da reclamação apresentada (cf. despacho a fls. 65 a fls. 67).

7. Em 7/12/2001, a ora recorrente deduziu impugnação judicial contra a liquidação de IRC relativa ao exercício de 1994, autuada no Tribunal Tributário de 1.ª Instância de Setúbal com o n.º 34.../2001 (cf. fls. 1 do Processo Administrativo junto aos autos, de ora em diante designado abreviadamente de PA).

8. Em 14/2/2003, a recorrente assinou o aviso de recepção que acompanhou o envio postal registado do ofício emitido nos termos do artigo 70.º do RGIT, no âmbito do processo de contra-ordenação n.º 216098/6010... (cf. docs. a fls. 35 e 36 dos autos).

9. Em 25/3/2003, a recorrente apresentou defesa e requereu o pagamento voluntário subsidiariamente, nos termos do documento constante de fls. 37 a 42 dos autos.

10. Em 29/7/2003, o Chede de Divisão, por delegação de competências proferiu a decisão de aplicação de coima, constante a fls. 53 a 55 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido, na qual foi fixada uma coima no valor de EUR 12.469.95, da qual consta em síntese o seguinte:

“ (…)

No âmbito do Processo de Contra-Ordenação n." 2160-98/6010…, o Sujeito Passivo F...... F……. SA, com o NIPC 500116…, sujeito a IRC, vem acusado, no Auto de Notícia que serviu de base à instauração dos presentes autos (fls. 2 a 4), de, em sede de IRC, e no que respeita ao exercício de 1994, ter praticado as seguintes inexactidões, na declaração Mod. 22 respectiva:

- Constituiu provisões sobre os encargos bancários com o desconto de letras, que habitualmente debita aos seus clientes, originando uma correcção de 20.591,621$00$00, uma vez que tais encargos não resultam da actividade normal da empresa; constituiu provisões pela totalidade, dos créditos de cobrança duvidosa, cuja antiguidade não é superior a 24 meses, não respeitando a mora dos créditos estipulada no n.º 1 alínea c) do Art.° 34 CIRC- A ser assim, não é aceite o como custos a importância de 18.084.186$00;

- Deduziu indevidamente no quadro 17, linha 28, da referida declaração, a importância de 3.629.837$00, a qual diz respeito à utilização da provisão do cliente "A.......". Tal dedução não é aceite, pois as provisões constituídas para a "A......." sempre foram aceites fiscalmente, não tendo sido tributadas anteriormente;

- As despesas de combustíveis não se encontram devidamente documentadas, uma vez que, os "cheques-auto" apresentam como suporte documental o talão de venda emitido pelo banco - resultando uma correcção a favor do Estado no valor de 7.225.000$00;

- Os encargos suportados pela empresa, no valor de 2.777.798$00, com a aquisição de roupa por parte de alguns empregados, não são aceites como custos, uma vez que não são indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos; e

- Considerou indevidamente menos-valias e mais-valias, nos valores respectivamente de, 6.252.918$00 e 3.988.244$00, uma vez que as acções próprias não são consideradas imobilizações financeiras face ao D.L. 410/89 de 21 de Novembro.

Inexactidões que originaram imposto em falta no montante de 32.490.891$00 (162.063,88 Euros).

A.2. - Notificação da acusação

(…)

C.3. - Motivação de direito

Sem dúvida que a conduta descrita no Auto de Notícia viola, em especial, o n.º 1 alínea a) do Art. 33.º n.º1 alínea c) Art..º 34 CIRC, o n.º 3 alínea a) do Art.° 98, o n.º1 do Art. 23 e o Art. 44 todos do CIRC sendo por demais evidente que, observando o disposto no Art. 8.° n.ºs 1 e 2 d) da LGT, é, por isso mesmo, punível pela conjugação dos n.ºs 1, 4 e 5 do Art. 34.° do RJIFNA (aprovado pelo D.L. n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro) - diploma que, ainda que revogado (excepto o Art.º 58.°) pela alínea b) do n.º I do Art. 2.º da Lei n.º 15/2001, de 05 de Junho, se aplica àquele facto, atento o Art.º 3.º do RGCO (aprovado pelo D.L. n.º 433/82, de 27 de Outubro).

(…)

C.3.1 - Determinação da medida concreta a aplicar

Feito, pela forma descrita, o enquadramento jurídico da conduta da arguida, importa determinar a medida da sanção principal e a natureza da sanção acessória a aplicar, tendo presente os critérios vertidos no Art.º 27.º do RGIT (Art.º 190 do RJIFNA), e que se reconduzem à gravidade da infracção, à culpa do agente, à sua situação económica e ao tempo decorrido desde a sua prática. Assim, a coima concreta a aplicar à infracção, há-de ser encontrada dentro da moldura da coima respectiva, ou seja, entre 49,88 Euros e o dobro do imposto em falta.

(…)

D.1 - Decisão

Pelo exposto, julgo ajustado, aplicar à identificada contra-ordenação fiscal, a coima no montante de 12.469.95 Euros, deduzida através dos n.ºs 1, 4 e 5 do Art.° 34.º do RJIFNA, e assim condenar a arguida, como autora material daquele ilícito fiscal, no seu pagamento e bem ainda nas custas que se mostrarem devidas no processo.

Porém, em observância ao pedido formulado em A4., e até porque, como até aqui se demonstrou, inexistem quaisquer motivos para a sua recusa (Vide in fine do n.º 1 do Art.º 209.º e n." 1 do Art.° 210.", ambos do CPT), sob condição da infractora se apresentar a pagar a coima, de pronto, nos 15 dias seguintes à notificação da presente Decisão, defiro-o, e consequentemente determino a sua redução para 75% do montante fixado (9.352,46 Euros), sem prejuízo de se manter a obrigação de pagar as anteditas custas.

(…)”

11. Em 12/11/2003, a recorrente recepcionou o aviso de recepção que acompanhou o envio da decisão descrita no ponto que antecede (cf. docs. de fls. 52 e 53).

12. Em 3/12/2003, a ora recorrente apresentou recurso da decisão de aplicação de coima descrita (cf. carimbo a fls. 58 dos autos em suporte de papel).

13. Em 6/12/2005, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada proferiu a decisão de improcedência no âmbito da Impugnação n.º 34…/2001 (f. decisão a fls. 94 a 105 do PA).

14. Em 3/12/2015 o Tribunal Central Administrativo Sul proferiu o Acórdão no proc. n. 01108/06, relativo à impugnação n. º 34.../200, no qual foi decidido proceder a impugnação na parte relativa às “provisões constituídas para encargos com descontos de letras” e no que respeita “as correcções relativas às provisões ao abrigo do Código da Contribuição Industrial” e decidiu improceder a impugnação na parte relativa “às tributações autónomas derivadas dos cheques Auto”, nos seguintes termos (cf. acórdão constante a fls. 222 a 255 do PA):

“ (…)

i) Manter a sentença recorrida na parte em que julga improcedente a impugnação e mantêm a correcção relativa às tributações autónomas e correspondentes juros compensatórios;

ii) Revogar a sentença recorrida na parte em que decide julgar improcedente a impugnação no segmento relativo à correcção de provisões e reposição de saldos e correspondentes juros compensatórios;

(…)”

15. Em 21/12/2015, o Acórdão descrito no ponto anterior transitou em julgado (cf. certidão a fls. 163 dos autos em suporte de papel).

16. Em 26/4/2017 foi ordenada a notificação das partes do termo da suspensão dos autos de contra ordenação (cf. despacho a fls. 238 do PA e ofícios de fls. 241 e seguintes dos autos em suporte de papel).


*

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

No dia 3 de novembro de 1997, no âmbito da análise da declaração modelo 22 anexos e demais documentos que dela fazem parte, apresentada pela Recorrida relativa ao exercício de 1994, foi lavrado auto dando notícia da prática de várias omissões ou inexatidões que constituem infração p.e p. pelo art.º 34º do RJIFNA

Por despacho de 11/5/1998, foi ordenada a suspensão dos autos até que ocorra qualquer das circunstâncias previstas nas alíneas a) a c) do art.º 182º do Código do Processo Tributário, com fundamento em que a presente contra ordenação fiscal implica facto (s) pelo (s) qual (is) é devido imposto, cuja liquidação não transitou em julgado.

Por se ter verificado a circunstância prevista na alínea b) do n.º 1 art.º 182º do CPT, foi proferido despacho de 10/9/1998, ordenando a notificação da arguida nos termos do art.º 199º do CPT (fls. 17), tendo a arguida informado de que tinha apresentado reclamação graciosa contra a liquidação, a qual foi indeferida por despacho de 17/8/2001.

E foi a arguida notificada nos termos e para efeitos do art.º 70º RGIT (fls. 38 e 39).

A arguida apresentou defesa pedindo a extinção do processo por prescrição e subsidiariamente, o pagamento voluntário da coima com redução para 75% do montante que vier a ser fixado.

Por despacho de 29 de julho de 2003 foi aplicada coima no montante de € 12.469,95, com redução para 75% do montante fixado, ou seja 9.352,46 (fls. 51).

Inconformada, a arguida recorreu para o TAF de Setúbal pedindo a extinção do processo por contraordenação (fls. 58 e segs.).

Por sentença de 17/5/2004 foi ordenada a extinção do procedimento por prescrição (fls. 96 e segs.)

O Exmo. Magistrado do MP interpôs recurso para o STA.

Por acórdão de 16/3/2005 decidiu o STA que a prescrição [sete anos e seis meses] ainda não ocorrera devido ao lapso de tempo relativo aos períodos de suspensão, em especial a “segunda” suspensão que a sentença não contabilizara, precisamente aquela que resultou da apresentação da reclamação graciosa -29 de setembro de 1998- e sua decisão – 17 de agosto de 2001.

Por requerimento de 7/4/2005 foi informado os autos de que em 7/12/2001 tinha sido interposta impugnação judicial contra a liquidação, em vista do que foi ordenada a suspensão do processo de contraordenação nos termos do art.º 55º/1-c) RGIT (fls. 132 a 139).

Por acórdão deste TCA de 3/12/2015 foi concedido parcial provimento ao recurso, mantendo-se no entanto a sentença recorrida na parte em que julgou improcedente a impugnação e a correção relativa à tributação autónoma e juros compensatórios (fls. 146 a 162).

Por despacho de 26/4/2017 foi ordenada o termo da suspensão dos autos, como consequência do trânsito em julgado do acórdão do TCAS (fls. 238).

Por despacho decisório de 23/1/2019, a MMª juiz do TAF de Almada julgou procedente o recurso de aplicação da coima, com fundamento em que o montante da coima aplicada estaria desajustado em função da “revogação de grande parte da liquidação” adicional de IRC que originou a aplicação da coima.

Deste despacho decisório vem o presente recurso. Entende o Exmo. Representante da Fazenda Pública que a sentença deveria ter fixado o “quantum relativamente ao decaimento da coima, condenando a ora recorrida no remanescente do valor do valor da coima assim apurado ou calculado”.

Neste TCA o Exmo. Sr. PGA emitiu douto parecer defendendo que o procedimento se encontra prescrito.

Notificadas, as partes nada disseram.

Nestas circunstâncias, antes de entrarmos na análise das questões que o recorrente nos submete, vejamos se o procedimento se encontra prescrito.

Tratando-se de uma infração contra ordenacional praticada em 1 de junho de 1995, e sendo entendimento pacífico da jurisprudência que em matéria de direito sancionatório tem aplicação o regime globalmente mais favorável ao infractor, a questão da prescrição deve ser ajuizada face ao regime legal contemporâneo daquela prática, uma vez que o regime actual (RGIT) não alterou a dimensão do prazo de prescrição nem o regime da sua suspensão, como também decidiu o acórdão do STA junto a fls. 121 e segs. dos autos.

Por conseguinte, a infração deverá considerar-se praticada em 31/5/1995, correspondente à data limite de entrega da declaração de rendimentos, para efeitos de IRC (art. 96º/1 CIRC, na redação do Decreto-Lei n.º 251-A/91, de 16 de julho).

O procedimento por contra ordenação extingue-se, por efeito da prescrição, logo que sobre a prática do facto sejam decorridos cinco anos [Art.º 35º/1 CPT].

O prazo de prescrição do procedimento interrompe-se com qualquer notificação ou comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados, com a realização de quaisquer diligências de prova ou com quaisquer declarações que o arguido tenha proferido no exercício do direito de audição e defesa [Art.º 35º/4 CPT]

E suspende-se até verificar-se o trânsito em julgado da decisão proferida em processo de impugnação ou o fim do processo de reclamação [Art.º 182º/1-c) CPT].

A interrupção anula o prazo prescricional decorrido. A suspensão impede que o prazo de prescrição decorra enquanto se mantiver a causa que a determinou (a suspensão).

Como decidiu o acórdão do STA, é aplicável subsidiariamente às contra ordenação fiscais não aduaneiras o art.º 121º n.º 3 do Código Penal: a prescrição ocorre sempre que, ressalvado o período de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade.

De facto, desde 31/5/1995 até ao presente [13.12.2019] decorreram 24 anos, seis meses e doze dias.

Precisamos então conhecer as suspensões ocorridas nos autos, para saber se decorreram mais de sete anos e meio para assim se completar o prazo prescricional.

A primeira suspensão ocorreu entre 11 de maio e 10 de setembro de 1998 (factos provados n.º2).

a) Ou seja, 3 meses e 29 dias.

A segunda ocorreu com a interposição da reclamação graciosa, o que ocorreu entre 29 de setembro de 1998 até à decisão de 17 de agosto de 2001 (factos provados n.º 4 e 6).

b) Soma 2 anos 10 meses e 18 dias.

E a terceira ocorreu com a suspensão resultante da apresentação da petição inicial de impugnação em 7/12/2001 cessando com o trânsito em julgado do acórdão do TCAS em 21/12/2015 (fls. 13).

c) Ou seja, 14 anos e 14 dias.

Tudo somado, temos que:

3M 29D

2A 10M 18D

14A 14D

=16 A 13M 61D.

O que equivale a 17 anos, 3 meses e 1 dia de suspensão.

Subtraindo ao período de 24 anos, seis meses e 12 dias, resulta que excluindo o período de suspensão, decorreram 7 anos, 3 meses e 11 dias.

Portanto, a contraordenação não está prescrita e devemos prosseguir com a apreciação do recurso.

O Exmo. Representante da Fazenda Pública defende que perante a anulação parcial determinada no acórdão do TCAS, deveria o tribunal "a quo" condenar o recorrente no remanescente do valor da coima.

Ou seja, o RECORRENTE entende que tendo sido anulada parcialmente a liquidação, deveria o tribunal "a quo" reduzir a coima total aplicada à coima correspondente à liquidação mantida pelo acórdão do TCAS.

Não tem razão, porém. Desde logo, a decisão administrativa não identificou nem separou cada uma das “inexactidões”[1] contra ordenacionais aplicando a cada uma a respetiva coima. Pelo contrário, aplicou uma coima única sem individualizar e aplicar a cada facto ilícito a respetiva coima concluindo, a final, pela aplicação de coima única.

Ora, a exigência da alínea da alínea c) do n.º do art.º 212º do CPT, [correspondente à alínea c) do nº 1 do artigo 79º do RGIT], de que a decisão contenha a coima e sanções acessórias com indicação dos elementos que contribuíram para a sua fixação, não pode deixar de se referir a cada uma das contra-ordenações punidas, tanto mais que a lei impõe que se considerem, ao quantificar a coima, a gravidade da infração (cada uma delas), a culpa do agente (em cada uma das suas condutas punidas), e que a punição exceda, quando possível, o benefício económico obtido com cada uma delas [Art.º 190º/4 CPT, correspondente ao artigo 27º nº 1 do RGIT][2].

Ou seja, a decisão administrativa não satisfaz os requisitos legais previstos no art.º 212º CPT, o que fere com nulidade o processo de contra ordenação fiscal, constituindo um vício de conhecimento oficioso [Art.º 195º/5 CPT - correspondente aos artigos 63º/1-d) RGIT e art.º 79º/1-c) do RGIT] implicando a anulação dos termos subsequentes do processo que deles dependam absolutamente.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAS:

a) Negar provimento ao recurso.

b) Anular a decisão recorrida.

c) Determinar a anulação da decisão administrativa anulando-se os termos subsequentes do processo que dela dependam absolutamente.

Sem custas por delas a AT estar dispensada.

Lisboa, 13 de dezembro de 2019.


(Mário Rebelo)


(Patrícia Manuel Pires)

(José Vital Brito Lopes)

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[1] Assim referido na decisão administrativa.
[2] Ac. do STA n.º 0979/06 de 20-12-2006 Relator: BAETA DE QUEIROZ