Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:827/14.6BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:12/16/2020
Relator:ANA PINHOL
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO;
GERÊNCIA DE FACTO.
Sumário:I. O n.º 1 do artigo 24.º da LGT exigem para responsabilização subsidiária a gerência efetiva ou de facto, ou seja, o efetivo exercício de funções de gerência, não se satisfazendo com a mera a gerência nominal ou de direito.
II. Por força do artigo 24.º da LGT, compete à Fazenda Pública, o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, o que significa que deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efetivo exercício da gerência.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO



I.RELATÓRIO
O INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL recorreu da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, datada de 26 de Outubro de 2019, que julgou procedente a oposição judicial deduzida por C............. contra a execução fiscal n°............., que contra ela revertida para cobrança coerciva de dívidas referentes a contribuições e cotizações de janeiro a abril de 2012, de dezembro de 2012 e de janeiro e fevereiro de 2013, no valor total de € 1.492,46, e originariamente instaurado contra a sociedade D............., Lda.

O recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

« 1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida a fls dos presentes, nos termos do qual o Tribunal a quo decidiu que a Oponente não pode ser responsabilizada pelo pagamento da dívida exequenda, motivo pelo qual é parte ilegítima na execução.

2. Foi declarada a total procedência da oposição, com a consequente extinção do PEF n.° ............. e respetivos apensos quanto à Oponente.

3. Entendeu-se que, não constando dos autos qualquer elemento que permita sequer a determinação da gerência de direito, há que considerar que a Administração Tributária incumpriu o ónus probatório que sobre si recaía.

4. É evidente o exercício da gerência pela Oponente ao ser dado como provado que em 16.07.2009 a oponente apresentou junto da SPE de Leiria do IGFSS, pedido de isenção de prestação de garantia no âmbito dos PEF n.° ............. e ............., "na qualidade de representante legal da sociedade" D............., LDA.

5. É evidente o exercício da gerência pela Oponente ao ser dado como provado que, em 04.08.2009 a sociedade D…………., LDA apresentou, junto da SPE de Leiria do IGFSS, um requerimento para pagamento em prestações no âmbito do PEF n.° ............. e apensos, assinado pela oponente.

6. É evidente o exercício da gerência pela Oponente ao ser dado como provado que, em 01.02.2010, no âmbito do processo de execução fiscal n.° ............., foi apresentado, junto da entidade exequente, um requerimento para pagamento em prestações, assinado pela oponente enquanto "gerência".

7. Aliás, ao ser dado como provado que foram entregues requerimentos prestacionais assinados pelo Oponente, na qualidade de gerente da sociedade devedora originária, terá que concluir-se que tais requerimentos constituem uma prova inequívoca de que este exercia a gerência de facto e representava a sociedade perante terceiros.

8. A apresentação de requerimentos prestacionais demonstra um compromisso assumido perante terceiros - Segurança Social, não podendo premiar-se a lógica das sociedades serem representadas por gerentes que, a final, nunca são responsáveis pela gestão das mesmas.

9. Para integral o conceito de gerência de facto, não será necessária a comprovação de atos diários e contínuos de gestão, bastando a prática de atos de relevo, como seja a apresentação de requerimentos prestacionais.

10. A responsabilidade subsidiária dos gerentes, tem por pressuposto o exercício efetivo do cargo, ou seja, desempenha funções gerente de facto quem exterioriza a vontade das sociedades nos seus negócios jurídicos, quem manifesta a capacidade de exercício de direitos da sociedade, praticando atos que produzem efeitos na sua esfera jurídica, como seja, a apresentação de requerimento prestacional para pagamento da dívida à segurança social de modo faseado.

11. Quando o tribunal interpreta o conceito de "exercício do seu cargo" previsto da al. b) do n.° 1 do art. 24.° da Lei Geral Tributária, no sentido de nele não incluir os atos praticados pela oponente tem subjacente uma inconstitucionalidade na sua interpretação.

12. O Estado de direito tem subjacente todo um conjunto de regras e princípios que contribuem para uma melhor ordenação das estruturas do Estado, através das suas regras e procedimentos, que permitem quer a proteção da segurança jurídica, quer a proteção da confiança dos cidadãos.

13. Ao interpretar-se a al. b) do n.° 1 do art. 24.° da Lei Geral Tributária no sentido da douta sentença, ao desconsiderar a entrega de requerimentos prestacionais e de isenção de garantia (em sentido amplo, outros atos de representação) assinados pela Oponente como atos de gestão que permitem atribuir à mesma o exercício de funções de gerência, está-se a fazer uma interpretação inconstitucional, por violação do art. 2.° Constituição da República Portuguesa.

Nestes termos, e nos que mais V. Exc.ªs doutamente suprirão, deve se
concedido provimento ao presente recurso, e consequentemente revogada a sentença recorrida, e substituída por outra no sentido de julgar a oposição judicial improcedente, com o que se fará a necessária e costumada JUSTIÇA.»

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Decorrido o prazo, não foram apresentadas contra-alegações.
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O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão incorporado no SITAF sob a ref. ª 003952509, julgou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do recurso, mais declarando ser o Tribunal Central Administrativo Sul o competente para apreciar do seu mérito.
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Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo, os autos foram com vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os «Vistos» dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora,
decidir.
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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Assim, vistas as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que, no caso concreto, a questão a decidir é a de saber se a sentença recorrida incorre em erro de julgamento de facto e de direito ao decidir que a Oponente não exerceu a gerência efectiva ou de facto da sociedade originária devedora, no período em que nasceram e foram colocadas em pagamento as quantias exequendas.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:
«1. Em 16.07.2009 a Oponente apresentou, junto da SPE de Leiria do IGFSS, pedido de isenção de prestação de garantia no âmbito dos PEF n.° ............. e ............., "na qualidade de representante legal da sociedade" D............., Ld.a, NIPC ............. (cf. requerimento de fls. 47 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
2. Em 04.08.2009 a sociedade D............., Ld.a apresentou, junto da SPE de Leiria do IGFSS, um requerimento para pagamento em prestações no âmbito do PEF n.° ............. e apensos, assinado pela Oponente (cf. requerimento de fls. 49 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
3. Em 01.02.2010 a sociedade D............., Ld.a apresentou, junto da SPE de Leiria do IGFSS, um requerimento para pagamento em prestações no âmbito do PEF n.° ............., assinado pela Oponente enquanto "gerência" (cf. requerimento de fls. 48 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
4. Em 09.05.2013 a SPE de Leiria do IGFSS instaurou contra a sociedade D............., Ld.a o PEF n.° ............. para cobrança coerciva de dívidas referentes a contribuições e cotizações devidas ao Instituto da Segurança Social, I. P. de janeiro a abril de 2012, dezembro de 2012, e janeiro e fevereiro de 2013, no valor total de €1.492,46 (cf. auto e certidões de fls. 10 a 12 do processo físico);
5. Em 24.05.2013 a SPE de Leiria do IGFSS emitiu ofício "Citação" no âmbito do PEF n.° ............. e apensos, dirigido à sociedade D............., Ld.a (cf. ofício de fls. 13 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
6. Em 17.03.2014 a SPE de Leiria do IGFSS emitiu "Notificação para exercício de audição prévia em sede de reversão do responsável subsidiário" no âmbito do PEF n.° ............. e apensos, dirigida à Oponente (cf. notificação de fls. 17 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
7. Em 28.04.2014 a SPE de Leiria do IGFSS emitiu despacho de reversão no âmbito do PEF n.° ............. e apensos, no qual pode ler-se, com relevo, o seguinte (cf. despacho de fls. 25 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
"(…)
2. DOS FUNDAMENTOS
Não existe motivo para suspender a execução, conforme o disposto no art° 169° do Código de Procedimento e Processo Tributário (C.P.P.T.), pelo que deve a mesma prosseguir a sua normal tramitação, nos termos e para os efeitos do disposto no art° 153° do C.P.P.T e art° 23° e art° 24°, n° 1, alínea b) da Lei Geral Tributária (L.G.T.).
Na sequência das diligências levadas a cabo por esta secção de processo executivo de Leiria do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, no âmbito do processo de execução referido em epígrafe, foi proposta a reversão da execução fiscal em relação ao gerente/administrador C..............
Procedeu-se a audiência de interessados, através de carta registada, nos termos constantes do artigo 23°, n° 4, e artigo 60° da Lei Geral Tributária, fixando-se o prazo de 15 dias úteis para o exercício do direito de participação.
Terminado o prazo concedido para o efeito não veio o gerente/administrador, ora interessado(s), responder ou trazer ao processo qualquer elemento.
Assim sendo, parece de manter a decisão proposta no projeto de decisão, procedendo-se à reversão da execução fiscal em relação ao(s) mencionado(s) gerente(s)/administrador(s), dado que:
- Em resultado das diligências efetuadas no proc. n° ............. concluiu-se pela inexistência/ insuficiência de bens na titularidade da executada, uma vez que das penhoras ordenadas às contas bancárias da devedora originária e aos créditos dos respetivos clientes não resultaram valores penhorados suficientes para a cobrança da dívida exequenda e dos acrescidos legais; por outro lado, também de acordo com a informação disponível nos autos, a devedora originária não é proprietária de qualquer bem imóvel, nem são conhecidos quaisquer outros tipos de bens penhoráveis, nem sequer indicados á penhora pela própria devedora originária no uso da prerrogativa prevista no artigo 215.° n.° 4 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
- De acordo com informação constante da base de dados da Segurança Social, verifica-se que é responsável subsidiário pelo pagamento da dívida, C............., porquanto era gerente/administrador da executada nos períodos a que a dívida se refere.
3. CONCLUSÃO
Em conclusão, e atendendo aos elementos constantes no processo encontram-se preenchidos os requisitos exigidos no n° 2 do art. 23° da L.G.T., em conjugação com o art. 153° do C.P.P.T., para efetivação da reversão contra o (os) responsável (eis) subsidiário (os) de acordo com o definido artigo 24.° n.° 1 alínea b) da L.G.T., devendo a presente execução fiscal ser revertida para C............. (…)"
8. Em 30.04.2014 a SPE de Leiria do IGFSS emitiu ofício "Citação (Reversão)" no âmbito do PEF n.° ............. e apensos, dirigido à Oponente (cf. ofício de fls. 23 do processo físico, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Mais se provou, com interesse para a presente decisão, a seguinte factualidade:
9. Entre finais de 2010 e inícios de 2011, dois dos clientes da sociedade D............., Ld.a não pagaram duas encomendas, num valor global próximo de €17.000,00 (cf. depoimentos prestados em sede de audiência de inquirição de testemunhas);
10. A partir de data concretamente não determinada, a sociedade D............., Ld.a começou a sentir diversas dificuldades financeiras, o que fez com que tivessem deixado de pagar os salários dos seus funcionários (cf. depoimentos prestados em sede de audiência de inquirição de testemunhas).
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De acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 607.º do Código de Processo Civil (CPC), que aqui tem aplicação por força da al. e) do artigo 2.º do CPPT, na fundamentação da sentença “o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência”.

No que concerne à prova dos factos acima elencados sob os números 1. a 8., foi determinante a análise da prova documental que foi remetida ao Tribunal pelo órgão da execução fiscal com a entrega da oposição, bem como daquela que foi remetida pelo IGFSS com a sua contestação, conforme supra se encontra devidamente identificado em frente a cada um dos pontos do probatório – cf. artigos 374.º e 376.º do Código Civil.


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No que especificamente diz respeito aos factos acima elencados sob os números 9. e 10., foi determinante a inquirição das testemunhas ouvidas em sede de audiência realizada no âmbito do Proc. n.º 1629/14.5BELRA, com especial relevo para o depoimento da testemunha B............., que aos costumes afirmou ter sido funcionária da devedora originária entre os anos de 2005 e 2012, tendo portanto revelado conhecimento direto dos facto que ora se discutem.

A testemunha prestou o seu depoimento com clareza, transparência e espontaneidade, não tendo demonstrado qualquer relação de especial proximidade com a executada originária ou com a Oponente, o que fez com que, de acordo com os ditames do princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal tivesse fundado a sua convicção no depoimento prestado, no sentido que naqueles pontos se encontra vertido.

Tal não sucedeu com o depoimento da testemunha J............., que referiu aos costumes frequentar a casa da Oponente por ser amiga do filho desta, não revelando portanto qualquer conhecimento direto dos factos que permitisse ao Tribunal fundar a sua convicção nas declarações prestadas pela testemunha.


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Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.


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B.DE DIREITO
A sentença recorrida julgou improcedente a oposição por ter concluído que o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. (doravante recorrente) não lograra demonstrar a legitimidade substantiva da Oponente (doravante recorrida) para a execução que contra si revertera para cobrança de referentes a contribuições e cotizações de Janeiro a Abril de 2012, de Dezembro de 2012 e de Janeiro e Fevereiro de 2013, e originariamente instaurada contra a sociedade «D……….., Ld.ª».
Para assim decidir a sentença utilizou o seguinte discurso fundamentador: «[A] sentença recorrida julgou procedente a oposição com a seguinte fundamentação: como resulta do probatório, estamos perante dívidas de contribuições e cotizações referentes aos exercícios de 2012 e 2013, sendo que os requerimentos apresentados pelo IGFSS datam de 2009 e 2010.
Não consta dos autos, bem assim, a certidão permanente da devedora originária nem qualquer extrato de remunerações auferido pela Oponente do qual resultem quantias pagas pela executada originária, elementos que sempre serviriam, apenas, para comprovar a gerência de direito. Significa isto que não resultam dos autos quaisquer diligências levadas a cabo pelo órgão da execução fiscal que permitam concluir pelo exercício da gerência por parte da Oponente, sendo necessário para esses efeitos que se encontre devidamente comprovado que a Oponente estabeleceu, nos períodos relevantes, e em representação da devedora originária, contactos significativos com terceiros, como sejam a assinatura de cheques, letras, contratos, escrituras e outros documentos, ou a realização de compras e vendas, admissão ou despedimento de trabalhadores, recebimento de quantias de clientes ou pagamentos a fornecedores, entre outros (veja-se o acórdão do TCAN de 12.06.2014, Proc. n.º 01942/10.0BEBRG, disponível em www.dgsi.pt).».
Nas suas conclusões o recorrente pretende extrair da matéria assente as seguintes ilações:
- que a recorrida praticou atos em representação da sociedade Devedora Principal, pouco antes da formação das dívidas à Segurança Social;
- que a prática de tais atos a qualificam, consequentemente, como gerente de facto.
Neste contexto, a questão objecto do presente recurso consiste em saber se a recorrida pode ou não ser subsidiariamente responsabilizada pelo pagamento das dívidas exequendas com referência ao quadro factual inscrito pelo Tribunal «a quo».
Vejamos, então.
No caso não vem questionado o regime de responsabilidade aplicado na sentença recorrida (o previsto no artigo 24.º da Lei Geral Tributária - LGT-), vejamos então se assiste razão à Recorrente, analisando o regime de responsabilidade subsidiária instituído nesse preceito legal.
O regime legal da responsabilidade subsidiária aplicável é, pois, o que decorre do artigo 24.º da LGT, nos termos do qual:
« a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período do exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.».
À luz do regime da responsabilidade subsidiária descrito em qualquer uma das suas alíneas a possibilidade de reversão não se basta com a gerência de direito, exigindo-se o exercício de facto da gerência (Neste sentido, entre muitos outros, vide o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02.03.2011, proferido no processo n.º 944/10, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
No que respeita ao ónus da prova, como bem salienta a sentença recorrida, é ao exequente, como titular do direito de reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário, que compete fazer a prova da gerência como pressuposto da obrigação de responsabilidade subsidiária.
Afirmando, nesta matéria o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Pleno da Secção do Contencioso Tributário) de 28.02.2007, proferido no processo n.º 1132/06, que a prova da gerência de direito não permite presumir, nem legal nem judicialmente, a gerência de facto, impondo-se ao exequente fazer a respectiva alegação e subsequente prova, sob pena de contra si ser valorada a falta sobre o efectivo exercício da gerência. (No mesmo sentido ver também o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário de 21.11.2012, proferido no processo n.º 0474/12)
Sabido que são os gerentes de facto quem exterioriza a vontade da sociedade nos respectivos negócios jurídicos, que são eles quem manifesta a capacidade de exercício de direitos da sociedade, quem toma decisões sobre o destino das suas receitas e quem dá ordens de pagamento em nome e no interesse dela, exteriorizando, por essa via, a vontade da sociedade e vinculando-a com a sua assinatura perante terceiros (conforme estipula o artigo 260.º nº 4 do Código das Sociedades Comerciais -CSC-).
A gerência nominal (de direito) da Oponente quer no período em que as dívidas se constituíram, quer no período em que se venceram não vem questionada, contudo, como já afirmamos, não há uma disposição legal que estabeleça que a titularidade da qualidade de gerente faz presumir o exercício efectivo do respectivo cargo. Na verdade, há presunções legais e presunções judiciais (cfr. artigos 350º e 351º do Cód. Civil). As presunções legais são as que estão previstas na própria lei.
A este propósito, escreveu-se no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10.12.2008, proferido no processo n.º 861/08, «[o] facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência comum.
E, eventualmente, com base na prova de que o revertido tinha a qualidade de gerente de direito e demais circunstâncias do caso, nomeadamente as posições assumidas no processo e provas produzidas ou não pela revertida e pela Fazenda Pública, o Tribunal que julga a matéria de facto pode concluir que um gerente de direito exerceu a gerência de facto, se entender que isso, nas circunstâncias do caso, há uma probabilidade forte (certeza jurídica) de essa gerência ter ocorrido e não haver razões para duvidar que ela tenha acontecido. (Sobre esta «certeza» a que conduz a prova, pode ver-se MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, páginas 191-192.). Mas, se o Tribunal chegar a esta conclusão, será com base num juízo de facto, baseado nas regras da experiência comum e não em qualquer norma legal.
Isto é, se o Tribunal fizer tal juízo, será com base numa presunção judicial e não com base numa presunção legal.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Revertendo ao caso concreto dos presentes autos, tendo em conta a factualidade provada, não se pode concluir que assista razão ao recorrente, na medida em que os elementos factuais são, em nosso entender, irrelevantes e insuficientes para a decisão, relativamente ao pressuposto da gerência de facto.
Com efeito, analisada a matéria de facto provada, constata-se que ficou por provar uma realidade susceptível de evidenciar um tal exercício efectivo dos poderes de gerência por parte da recorrida, sendo que, repete-se, quem estava onerado com o peso da prova era o recorrente, por isso que, como já referimos, o exercício efectivo da administração é facto constitutivo de um pressuposto da responsabilidade subsidiária que se pretende efectivar através da reversão e a lei não estabelece, nesse domínio, qualquer presunção que inverta o ónus da prova.
Na realidade, a circunstância da recorrida ter assinado em 16.07.2009 (pedido de isenção de prestação de garantia no âmbito dos PEF n.º ............. e ............., “na qualidade de representante legal da sociedade” D…………..), em 04.08.2009 e 01.02.2010 (requerimentos para pagamento em prestações no âmbito do PEF n.º .............) não se pode inferir da prática destes actos que nos anos posteriores (2012 e 2013), aquela tenha efectivamente exercido a gerência da sociedade devedora originária.
Perante o que vem dito e provado não é viável, à luz das regras de experiência comum, extrair a conclusão de que a recorrida tenha exercido, de facto, a gerência da dita sociedade. E repete-se, como acima dissemos, que era à Fazenda Pública que competia a prova da gerência de facto enquanto pressuposto da responsabilidade subsidiária.
Com o que, e em conclusão, não se provando o exercício efectivo da gerência, improcede o recurso, mantendo-se a sentença recorrida que julgou verificado o fundamento de oposição previsto no artigo 204.º, nº1, alínea b) do CPPT.
IV. CONCLUSÕES
I.O n.º 1 do artigo 24.º da LGT exigem para responsabilização subsidiária a gerência efetiva ou de facto, ou seja, o efetivo exercício de funções de gerência, não se satisfazendo com a mera a gerência nominal ou de direito.
II.Por força do artigo 24.º da LGT, compete à Fazenda Pública, o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, o que significa que deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efetivo exercício da gerência.
V.DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes que integram a 1ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo do Recorrente.

[Ana Pinhol]

[Isabel Fernandes]

[Jorge Cortês]