Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:305/13.0BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:05/18/2023
Relator:ISABEL FERNANDES
Descritores:COIMA
ATENUAÇÃO ESPECIAL DA COIMA
REQUISITOS
Sumário:I – O requisito do reconhecimento da responsabilidade pelo arguido previsto no nº2 do artigo 32º do RGIT poderá ter-se como verificado a partir dos actos e declarações que o arguido pratique no processo e da conduta que com eles evidencie concretamente assumir.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

G… – G… (PORTUGAL) SA, melhor identificada nos autos, deduziu recurso de contra-ordenação contra a decisão de aplicação de coima no montante de €23.389,18, acrescida das custas processuais, proferida em sede do processo de contra-ordenação n.º 3611201206065643, que correu termos no Serviço de Finanças da Amadora-3 pela prática de três infrações ao Código do IVA.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, por decisão de 29 de Maio de 2015, julgou procedente o recurso, mais determinando, em substituição, a aplicação da coima no montante €11.656,34, nos termos do artigo 32.º n.º 2 do RGIT.

Não concordando com a decisão, a FAZENDA PÚBLICA veio interpor recurso da mesma, tendo nas suas alegações, formulado as seguintes conclusões:

«I. O Tribunal a quo julgou o recurso interposto procedente pela recorrente, com revogação da decisão recorrida e aplicação, em substituição, da coima no valor de €11.656,34 decorrente da aplicação ao caso vertente da atenuação especial da coima nos termos do n.º 2 do artigo 32. do RGIT.

II. Diverge a Fazenda Pública do entendimento sufragado pelo Tribunal a quo vertido na douta sentença, de acordo com o qual à luz dos elementos vertidos nos autos resultam verificados os pressupostos legais de que depende a aplicação ao caso da atenuação especial da coima – al. B e E dos factos assentes e reconhecimento da falta – nos termos do n.º2 do artigo 32.º do RGIT, “atenuação essa que, nos termos do artigo 18º do RGCO, aplicável por força do artº 3º, alínea b) do RGIT, acarreta a diminuição para metade dos montantes mínimo e máximo, abstractamente aplicáveis e que, no caso, correspondiam ao dobro de 10% do imposto em falta até dobro desse mesmo imposto nos termos do disposto nos artigos 114º e 26º, ambos do RGIT”.

III. Porque se entende não resultar da factualidade assente o preenchimento dos requisitos ao abrigo dos quais se mostraria positivamente pertinente a atenuação especial da coima aplicada em sede procedimento contra-ordenacional, pois que são exigidos dois requisitos cumulativos pelo n.º2 do artigo 32.º do RGIT: o reconhecimento da responsabilidade do infractor e a regularização da situação tributária até à decisão do processo, e um deles não está presente.

IV. Se resulta das alíneas B) e E) do probatório o preenchimento do segundo dos requisitos, já o primeiro (reconhecimento da responsabilidade) não se retira nem do probatório nem do dispositivo, não se podendo concluir pelo reconhecimento da falta pelo infractor como o faz a douta sentença recorrida, sendo que o requisito atinente ao reconhecimento da responsabilidade reconduzir-se-á a elemento diferenciado da regularização da situação tributária, consubstanciando-se num efectivo reconhecimento da responsabilidade contra-ordenacional.

V. Ora, tendo em consideração que o a infracção tributaria obedece aos princípios da legalidade e da tipicidade, de acordo com os quais ao arguido apenas poderá ser imputada infracção tributária prevista em lei anterior à prática dos factos, cingindo-se tal imputação a comportamento ilícito que se subsuma aos concretos factos objectivos enunciados no tipo objectivo e a uma necessária imputação a titulo de dolo ou de negligência no que se refere ao tipo subjectivo, não se poderá olvidar o elemento concernente à culpa expresso na censurabilidade de que é alvo a conduta do agente, como dispõe o n.º1 do artigo 2.º do RGIT quando afirma, “Constitui infracção tributária todo o facto típico, ilícito e culposo declarado punível por lei tributária anterior”.

VI. Pelo que o ponto de partida para a atenuação especial da coima será a convicção fáctica e jurídica da prática pelo arguido da infracção tributária contra-ordenacional que lhe é imputada, enquanto facto ilícito, típico, doloso/negligente e culposo, pois que se considerarmos a culpa como elemento ausente estaremos perante conduta não culposa, e, consequentemente, não passível de aplicação de coima (o que acontece no caso de estarmos na presença de uma qualquer causa de desculpação, o que no caso em apreço não é de todo defensável).

VII. Face ao exposto, o reconhecimento da responsabilidade do infractor vertido na norma do nº 2 do artigo 32.° do RGIT importa uma necessária auto-censurabilidade da conduta, uma especial admissão, pelo infractor, da prática da infracção tributária em todas as suas vertentes, objectiva e subjectiva, não se mostrando, pois, suficiente e adequada uma mera aproximação aos factos vertidos na norma, aproximação essa não traduzível em efectiva assunção da adopção, no circunstancialismo de tempo e de lugar de que vem acusado, de comportamento contrário à lei e censurável porquanto se encontrava o agente em condições de agir em conformidade com as normas jurídicas tendo optado por não o fazer.

VIII. E assente a culpabilidade da recorrente pela douta sentença de que se recorre, como não poderia deixar de ser, a formulação de um juízo de auto-censurabilidade da sua conduta, expresso numa natural e espontânea adesão à reprovação do comportamento adoptado não é, definitivamente, demonstrável no caso dos autos, nem resulta de quaisquer factos vertidos na douta sentença recorrida.

IX. Esgrime a recorrente em sede de recurso judicial de aplicação da coima argumentos pretensamente reconduzíveis à ausência de culpa, referindo-se a uma responsabilidade objectiva contra-ordenacional em clara alusão à sua culpa ausente, argumentos de que deu conta o Tribunal a quo pois que os apreciou na sentença, com subsequente afirmação do juízo de censurabilidade da conduta e, portanto, da culpa no caso sub judice.

X. A defesa da recorrente, reconduzível a uma mera afirmação objectiva dos factos imputados, com divergente enquadramento jurídico inclusive, sem a necessária autocensurabilidade a que nos referimos não pode, conforme explanado, ter a virtualidade de admitir a atenuação especial da pena a que se reporta o n.° 2 do artigo 32.° do RGIT, na medida em que se mostra de todo incompatível com um reconhecimento que milita afinal em sentido diametralmente antagónico (o tal reconhecimento da responsabilidade pelo infractor) — neste sentido JORGE LOPES DE SOUSA e SIMAS SANTOS em anotação ao artigo 32°, n.° 2, do RGIT, in Regime Geral das lnfracçôes Tributarias, Áreas Editora, 4 Edição 2010, p.322 e Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2 de Julho de 2007, proferido no rec. n.° 331/08.

XI. Constatamos, em conformidade com o exposto, que não refere em qualquer momento a douta sentença recorrida factos que fundamentem o reconhecimento da responsabilidade pelo infractor, de molde a permitir no caso em concreto a aplicação do instituto vertido no n.° 2 do artigo 32.° do RGIT, sendo que, pelo contrário, antes resulta da mesma a verificação de que a recorrente se demite da assunção de qualquer culpa na prática da infracção tributária contra-ordenacional, pelo que forçoso seria concluir pela não verificação do pressuposto relativo ao reconhecimento da responsabilidade pelo infractor.

XII. Atento o exposto, não se verificam, no caso em apreço, os requisitos impostos por lei para que a coima possa ser especialmente atenuada, violando dessa forma a douta sentença o disposto no n.° 2 do artigo 32.° do RGIT, em conjugação com o disposto no n.° 1 do artigo 2.° do RGIT, e o n.° 3 do artigo 18.° do Regime Geral das Contraordenações.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso deve a decisão recorrida ser revogada e o recurso interposto da decisão de aplicação da colma ser julgado improcedente


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A Recorrida, G… – G… (Portugal) SA, notificada do recurso interposto, apresentou as seguintes contra-alegações:
«A. A AT entende que a sentença recorrida deve ser revogada, pois aplicou o instituto da atenuação especial da coima, previsto no artigo 32°, n.° 2 do RGIT, quando um dos dois requisitos cumulativos estipulados no mesmo — o reconhecimento da responsabilidade pelo infractor — não se encontrava preenchido.

B. Todavia, como se pode ver pela actuação da GI II ao longo de todo este processo — assim que o lapso foi detectado, entregou de imediato as declarações de substituição e pagou o imposto respectivo e solicitou a redução da coima fixada -, desde o início que a ora RECORRIDA reconheceu a sua responsabilidade.

C. Com efeito, a divergência entre a G… e a AT reconduziu-se, tão só, ao enquadramento jurídico dos factos que deram origem à aplicação da contra-ordenação: a AT considerava que era aplicável o artigo 114.º do RGIT e a GI II não.

D. Ora, a RECORRIDA entende que não se pode identificar uma qualquer divergência relativamente ao Direito aplicável com a recusa em assumir a responsabilidade pelos factos em causa.

E. Aceitar este raciocínio faria com que o contribuinte não pudesse colocar em causa o enquadramento jurídico dado pela AT a determinados factos, sob pena de, com isso, abdicar da aplicação do artigo 32. °, n.° 2 do RGIT.

F. No limite, ficaríamos colocados perante uma situação em que a aplicação do Direito pela AT, em matéria de contra-ordenações, não fosse prática sindicável pelos tribunais, já que os contribuintes deixariam de recorrer aos mesmos por receio de não puderem simultaneamente invocar o instituto da atenuação especial das coimas previstas no artigo 32.º, n. º2 do RGIT.

TERMOS EM QUE A SENTENÇA RECORRIDA NÃO MERECE QUALQUER CENSURA, DEVENDO SER INTEGRALMENTE MANTIDA


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A Exma. Procuradora-Geral Adjunta do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificada para o efeito, ofereceu aos autos o seu parecer da improcedência do recurso.
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Vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«A). No âmbito da acção de inspecção realizada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), com vista à apreciação de pedido de reembolso de IVA solicitado pela recorrente, foi esta notificada do teor do projecto de correção do Relatório de Inspecção, onde foram propostas correcções no montante de €116.563,42 [controvertido].

B). A recorrente procedeu à entrega de três declarações periódicas de IVA de substituição, para os períodos onde as correcções foram detectadas – Janeiro, Junho e Julho, tendo pago o imposto correspondente no montante de €116.563,42 [cf. fls. 23 a 31 dos autos].

C). Pela recorrente foi efectuado pedido de redução da coima, tendo sido notificada para pagar coima fixada em €5.828,17 [cf. Fls 35 a 36 dos autos].

D). Pela recorrente foi apresentado pedido de reapreciação da coima fixada, pedido que foi indeferido [cf. Fls. 38 a 46 dos autos].

E). A 15.10.2012, foi levantado à recorrente o auto de notícia n. 763, pela prática de infracção ao disposto no artigo 19.°, n. 1 e 2, do OVA, por dedução indevida de imposto, relativo aos períodos de 2011.01, 2011.06 e 2011.07, cujo prazo terminou em 10.03.2011, 10.08.2011 e 12.09.2011, no montante de €15.504,30, €78.744,52 e €22.314,60, respectivamente, punível nos termos dos artigos 114º, n.º 2 e 26º, n.° 4, ambos do RGIT [cf. fls. 2 dos autos].

F). Com base no auto de notícia indicado em E) dos factos assentes, foi instaurado contra a recorrente, a 15.12.2012, processo de contra-ordenação n.° 3611201206065643, a correr termos no Serviço de Finanças de Amadora 3 [cf. fls. 1 dos autos].

G). Por ofício n.° 7598, de 15.10.2012, foi a recorrente notificada para o exercício do direito de defesa e pagamento com redução, nos termos do artigo 70. do RGIT, [cf. fls. 4 a 6 dos autos].

H). Por despacho de 24.01.2013, foi aplicada à arguida a coima de €23.389,18 (acto recorrido), que aqui consideramos integralmente reproduzido, onde consta, nomeadamente:

“(…)

Descrição Sumária dos Factos
Ao (À) arguido(a) foi levantado Auto de Notícia pelos seguintes factos: Art. 19º n.s 1 e 2 (M) CIVA — Dedução indevida de imposto; Período de Tributação: 201101. Data do termo da Obrigação: 2011-03-10; Art. 19.° n.s 1 e 2 (M) CIVA — Dedução indevida de imposto; Período de Tributação: 201106. Data do termo da Obrigação: 2011-08-10; Art. 19. n.°s 1 e 2 (M) CIVA — Dedução indevida de imposto; Período de Tributação: 201107. Data do termo da Obrigação: 2011-09-12;
Ordem de serviço n. 0120106673 da inspeção tributária; Pedido de redução de coima nos termos da alínea c) do n. 1 d art° 29 do RGIT, apresentado pelo sujeito passivo através de e-mail em 23-07-2012 e posteriormente em mão no dia 25-07-2012; O sujeito passivo apresentou defesa alegando em síntese, que não obstante ter deduzido IVA indevidamente nos períodos em causa (Janeiro, Junho e Julho de 2011), ainda assim se manteve numa situação de crédito de imposto, facto pelo qual não se poder concluir que houve efetiva falta de entrega de imposto nos termos do n.° 1 e 2 do art. 114.° do RGIT.
As infrações em causa foram detetadas no âmbito da ação de inspeção tributária, que visou legitimidade do pedido de reembolso do IVA no valor de 163.736,39, tendo a empresa sido notificada do projeto de correções do relatório de inspeção, propondo correções ao IVA deduzido no montante e 116.563,42.
O referido valor resulta do somatório do IVA deduzido pela requerente com base em 3 faturas que lhe foram emitidas, e que as autoridades fiscais entenderam não cumprirem o disposto no n.° 5 do art. 36.° do CIVA, facto pelo qual não foi aceite, atendendo ao previsto no art. 19.° do citado diploma.
O IVA deduzido indevidamente nos referidos períodos, foi regularizado através da submissão de declarações, ainda assim, o SP ficou numa situação de crédito.
Independentemente da situação de crédito se manter, é certo, que o contribuinte sem dedução, teve um imposto menor a receber, logo, o legislador equiparar a dedução indevida de imposto à falta de liquidação ou entrega de imposto.
Neste sentido, a dedução indevida de IVA por violação ao disposto nos n.°(s) 1 e 2 do art.° 19.º do CIVA é uma infração prevista no art.° 114°, n.° 5 al. a) e punida pelo seu n.° 2.
Assim, a infração imputada à arguida está especificada do art.° 114.° do RGIT, e não, como é versado pelo SP, o artº 119.° do mesmo diploma, visto que as omissões e/ou inexatidões que são puníveis nos termos deste artigo determinam-se por exclusão, ou seja, afastando-se do âmbito deste artigo todas as que se reconhecem expressamente enquadráveis em outro normativo, como é o caso, os quais se dão como provados.
Normas Infringidas e Punitivas
Os factos relatados constituem violação do(s) artigo(s) abaixo indicado(s), punidos pelo(s) artigo(s) do RGlT referidos no quadro, aprovado pela Lei n.° 15/2001, de 05/07, constituindo contra-ordenação.


Responsabilidade contra-ordenacional
A responsabilidade própria do(s) arguido(s) deriva do Art. 7 do Dec.Lei n.° 433/82, de 27/10, aplicável por força do Art. 32 do RGIT concluindo-se dos autos a prática, pelo(s) arguido(s) e como autor(es) da(s) contra-ordenação(ões) identificada(s) supra.
Medida da coima
Para fixação da(s) coima(s) em concreto deve ter-se em conta a gravidade objectiva e subjectiva da(s) contra-ordenação(ões) praticada(s), para tanto importa ter presente e considerar o(s) seguinte(s) quadro(s) (art.°27.° do RGIT).
«Imagem em texto no original»


Despacho
Assim, tendo em conta estes elementos para a graduação da coima e de acordo com o disposto no Art. 79.º do RGIT aplico ao(s) arguidos(s) a coima única de Eur. 23.312,68, cominada no art. 114 n.º2 e 26.º n.º4 do RGIT, com respeito pelos limites do Art. 26.º do RGIT, sendo ainda devidas custas (Eur. 46,50), nos termos do nº2 do Dec-Lei n.º 29/96, de 11 de Fevereiro.
Notifique-se o arguido nos termos da presente decisão, juntando-se cópia, para efectuar o pagamento da coima com benefício da redução no prazo de 15 dias (78.º/2RGIT) ou sem benefício de redução no prazo de 15 dias (79.º/2RGIT), sob pena de cobrança coerciva, advertindo-o de que vigora o Princípio de “Reformatio in Pejus” (em caso de recurso não é susceptivel de agravemento, excepto se a situação económica e financeira tiver melhorado de forma sensível). (…) [cf. Fls. 49 a 51 dos autos].
I) A decisão identificada no ponto anterior foi notificada à arguida a 25.01.2013, através do ofício n.º 1096, de 24.01.2023 do Serviço de Finanças da Amadora 3 [cf. Fls. 52 e 53 dos autos].

J). O presente recurso foi apresentado a 22.02.2013 [cf. fis. 54 dos autos].»


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Factos não provados

«Nada mais se provou com interesse para a decisão a proferir


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Motivação da decisão de facto

«Assenta a convicção deste Tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos, não impugnados, referidos a propósito de cada alínea do probatório.»


- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Ora, lidas as conclusões das alegações de recurso, resulta que está em causa saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento por errónea apreciação dos pressupostos de facto e de direito, quanto à verificação dos pressupostos previstos para a atenuação especial da coima nos termos do no n.º 2 do artigo 32.º do RGIT.

Vejamos então.

Dissente a Fazenda Pública, ora Recorrente, do entendimento preconizado na sentença recorrida no sentido de se encontrarem reunidos os pressupostos previstos na lei para a atenuação especial da coima, previstos no nº2 do artigo 32º do RGIT.

Afirma não resultar da factualidade assente o preenchimento dos requisitos ao abrigo dos quais se mostraria positivamente pertinente a atenuação especial da coima aplicada em sede procedimento contra-ordenacional, pois que são exigidos dois requisitos cumulativos pelo n.º2 do artigo 32.º do RGIT: o reconhecimento da responsabilidade do infractor e a regularização da situação tributária até à decisão do processo, e um deles não está presente.

Entende não estar verificado o requisito do reconhecimento da responsabilidade do infractor.

A questão a apreciar é a de saber se estão reunidos os pressupostos previstos no artigo 32º do RGIT para a redução da coima aplicada, concretamente, o reconhecimento de responsabilidade por parte da Recorrida.

A sentença recorrida entendeu estarem reunidos os pressupostos exigidos na lei e, nessa medida, procedeu à atenuação especial da coima para o mínimo legal.

Para tanto, considerou o seguinte:

“(…) Por último vejamos a questão da aplicação do artigo 32.º , n.º 2 do RGIT, relativo à atenuação especial da coima, onde se prevê a sua aplicação quando estejam reunidos os seguintes requisitos: (1) o infractor reconheceu a sua responsabilidade e (2) regularizou a situação tributária até à decisão do processo.

À luz dos elementos coligidos para os autos, maxime das aludidas circunstâncias, em virtude do imposto em causa haver sido já pago, antes mesmo do auto de notícia ter sido levantado [cf. al. B) e E) dos factos assentes], e que a mesma reconheceu a sua falta, embora considere que a moldura penal aplicável ao caso em concreto seja diferente da aplicada, conclui-se pela verificação dos pressupostos legais à atenuação especial da coima, nos termos do n.° 2 do referido artigo 32.° do RGIT, atenuação essa que, nos termos do artigo 18.° do RGCO, aplicável por força do art.° 3.°, alínea b) do RGIT, acarreta a diminuição para metade dos montantes mínimo e máximo, abstractamente aplicáveis e que, no caso, correspondiam ao dobro de 10% do imposto em falta até dobro desse mesmo imposto nos termos do disposto nos artigos 114.° e 26.°, ambos do RGIT.

Assim, porque no caso a arguida é uma pessoa colectiva e o imposto em falta ascendeu ao total de €116.563,42, como se fez constar do probatório, a coima mínima aplicável seria, por princípio e nos termos acima aludidos, de €11.656,34, correspondente ao dobro de 10% do imposto em falta, valor da coima que lhe foi aplicada.

Por isso, em caso de atenuação especial, como se verifica "in casu", nos termos já acima referenciados, aquele limite mínimo, que se entende como adequado à gravidade da infracção, vem a corresponder a aproximadamente 10% do imposto em falta, ou seja, €11.656,34.

Assim, será de aplicar à arguida a coima mínima, nos termos acima aludidos, de €11.656,34, que se entende como adequada à gravidade da infracção.(…)”

Entendemos que a sentença decidiu com acerto.

Dispunha o artigo 32º do RGIT, na redacção à data aplicável:

Dispensa e atenuação especial das coimas

1 - Para além dos casos especialmente previstos na lei, pode não ser aplicada coima, desde que se verifiquem cumulativamente as seguintes circunstâncias:

a) A prática da infracção não ocasione prejuízo efectivo à receita tributária;

b) Estar regularizada a falta cometida;

c) A falta revelar um diminuto grau de culpa.

2 - Independentemente do disposto no n.º 1, a coima pode ser especialmente atenuada no caso de o infractor reconhecer a sua responsabilidade e regularizar a situação tributária até à decisão do processo.”

Acompanhamos o sentido do parecer emitido pela DMMP junto deste TCAS, que nos permitimos transcrever parcialmente:

“(…) A atenuação especial da coima prevista no nº2 deste normativo, exige, pois, a verificação cumulativa de dois pressupostos: o reconhecimento por parte do infractor, da sua responsabilidade e a regularização da situação tributária até à decisão do processo.

No caso vertente, e face à factualidade, é inquestionável que se verifica o segundo dos aludidos pressupostos, já no que concerne ao primeiro daqueles pressupostos entende a Fazenda Publica que este não se verifica, mas em nosso entendimento, sem razão, senão vejamos.

Sendo certo que a lei não indica os modos por que poderá demonstrar-se a verificação deste pressuposto “reconhecimento da responsabilidade”, na doutrina, sobre este conceito entendeu que esse requisito se poderá ter como evidenciado: “a partir dos atos e declarações que o arguido pratique no processo e da conduta que com elas evidencie concretamente assumir.” Assim sendo, e usando as doutas palavras do acórdão deste TCA Sul, proferido no processo 02183/06 em 03/07/2007, “justifica-se em nosso entender, o uso da faculdade prevista no nº2 desde normativo consistente na atenuação especial da coima (…), considerando a culpa diminuta da arguida e o seu reconhecimento da mesma bem como o curto prazo que decorreu entre o momento da falta e o da sua regularização antes de se aplicada a coima em causa nos autos.”

Neste sentido vai também a doutrina, João Ricardo Catarino e Nuno Vitorino (Regime Geral das Infrações Tributárias, anotado, Vislis, 2002, anotação 7 ao art. 32º, p. 192) que entendem que esse requisito se poderá ter como evidenciado “a partir dos atos e declarações que o arguido pratique no processo e da conduta que com elas evidencie concretamente assumir”.

Ora, lançando mão dos requisitos do direito de redução de coima, art. 30º do RGIT, nomeadamente o seu nº4, verifica-se que a prestação tributária, foi cumprida antes da instauração do processo de contra ordenação, foi-o também antes do levantamento do auto de notícia, o que, por si, constitui o direito à redução da coima.

Para além, de que tais factos vertidos nas als. B) e E) do probatório, constitui a aceitação por parte do infractor, da sua responsabilidade.

Assim, ao contrário do alegado pela recorrente, face à factualidade provada, bem como dos atos praticados pelo arguido no processo e a conduta que assumiu, não podia o Tribunal recorrido deixar de subsumir a verificação do apontado requisito.

Assim, em face de todo o exposto e em conclusão, emito parecer no sentido da improcedência do recurso, mantendo-se a sentença recorrida.(…)”

Concordamos com o entendimento vertido no parecer do DMMP, que acolhemos, pelo que, se tem como verificado o requisito previsto no nº2 do artigo 32º do RGIT, a saber, o reconhecimento, por parte da Recorrida, da sua responsabilidade, pelo que será de negar provimento ao recurso, assim se mantendo a sentença recorrida, que bem decidiu.


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III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Sem custas.

Registe e notifique.

Lisboa, 18 de Maio de 2023

(Isabel Fernandes)

(Catarina Almeida e Sousa)

(Lurdes Toscano)