Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:112/17.1BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:12/03/2020
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:IVA – PRORATA
ANULAÇÃO PARCIAL DA LIQUIDAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO POR GARANTIA INDEVIDA
Sumário:I – Não pode a AT, não obstante reconhecer na fundamentação vertida no relatório de inspeção que o valor em causa se refere, de facto, a reembolsos de despesas efetuadas por conta das restantes empresas do grupo, ou seja, redébitos de operações tributáveis no âmbito do IVA, vir depois tratá-lo como se em causa estivesse a dedução do imposto suportado em aquisições de bens e serviços afetos conjuntamente às atividades exercidas, isentas e tributadas, tendo em consideração a justiça fiscal, e em respeito dos princípios que norteiam o imposto em causa, nomeadamente, o da neutralidade, constante da Sexta Directiva do IVA 77/388.
II - No caso dos autos a anulação da liquidação foi parcial. Assim sendo, o valor a considerar para efeitos da percentagem da indemnização pela prestação de garantia indevida terá que ser, forçosamente, respeitante ao montante da liquidação resultante dessas correcções e respectivo acrescido, e cuja ilegalidade, por erro sobre pressupostos, imputado à AT, constitui o fundamento para a sua anulação e responsabilidade desta pelos custos suportados com a garantia.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO
A Fazenda Pública, com os sinais nos autos, veio, em conformidade com o n.º 3, do artigo 282.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, de 16 de fevereiro de 2017, a qual julgou parcialmente procedente a impugnação judicial, deduzida por A….., SA, com os sinais nos autos, relativamente à liquidação adicional n.º ….. referente a IVA do ano de 1996, no montante de €377.588,52 e às liquidações n.ºs ….. a ….., referentes a juros compensatórios, no valor de € 115.638,37. Mais aquela sentença anulou parcialmente a liquidação adicional de IVA n.º ….., relativa ao período de 1996, bem como, na proporção devida, as respetivas liquidações de juros compensatórios e condenou a Fazenda Pública no pagamento à Impugnante das quantias por estas suportadas a título de despesas com a prestação da garantia bancária, com o limite previsto no n.º 3 do art. 53.º da LGT. Mais ainda condenou a Fazenda Pública nas custas e fixou à causa o valor de € 352.088,96.

Cumpre, ainda referir, que a Fazenda Pública interpôs recurso para este Tribunal Central Administrativo (ao abrigo dos artigos 280.º a 282.º do CPPT) e, em simultâneo, requereu a reforma da sentença no que respeita à condenação em custas, porquanto, considerada a data da instauração dos autos a Fazenda Pública beneficia de isenção de custas.

A Impugnante interpôs recurso para a Secção do Contenciso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do previsto n.º 1, do artigo 280.º, e do n.º 1, do artigo 282.º, ambos do CPPT.

Por despacho de 30 de março de 2017, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra deferiu a pretensão da Fazenda Pública quanto à reforma da decisão no segmento em que condenou a Fazenda Pública em custas, conferindo-lhe nova redação (ao abrigo dos n.ºs 1 e 2, do artigo 613.º, e dos artigos 614.º a 616.º, todos do Código do Processo Civil aplicáveis ex vi a alínea e), do art. 2.º do CPPT), de acordo com a qual não existem custas atenta o Regulamento das Custas dos Processos Tributários vigente (e aplicável) à altura da instauração do processo tributário de impugnação judicial.

Pelo mesmo despacho, o Tribunal a quo admitiu ambos os recursos, por legais e tempestivos, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. Artigo 281.º, e n.º 2, do artigo 286.º do CPPT), mas identificou como competente para a apreciação de ambos este Tribunal Central Administrativo do Sul (na esteira do previsto no n.º 5, do artigo 12.º, na alínea b), do artigo 26.º, e no artigo 38.º, todos do ETAF).

Notificada, a Fazenda Pública apresentou as suas alegações recurso, sendo que a Impugnante nada veio a acrescentar aos autos. Uma vez decorrido o prazo legal aplicável, o Tribunal a quo, por despacho de 19 de junho de 2017, admitiu o recurso da Fazenda Pública, declarou a deserção do recurso interposto pela Impugnante e ordenou a subida dos autos para este Tribunal Central Administrativo.

A Fazenda Pública, aqui Recorrente, termina as alegações de recurso formulando as conclusões seguintes:

i. Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença que julgou procedente a impugnação judicial, deduzida por A….., SA, contra o acto de liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios, relativos ao ano de 1996, no montante de €377.587,84 e 115.638,16, respectivamente.

ii. Entendeu a douta sentença que a forma de cálculo da percentagem de dedução a que se refere o n.º 1 do artigo 23.º do CIVA utilizada pelos serviços de inspecção tributária padece de ilegalidades, imputadas pelo Impugnante, por referência às respectivas contas.

iii. Os Serviços de Inspecção Tributaria detectaram que o Impugnante no exercício da sua actividade efectuava prestações de serviços, parte das quais não conferiam direito à redução que obrigava à utilização, à data, do regime previsto no artigo 23.º do CIVA, ou seja, a utilização do regime do prorata.

iv. Entendeu a douta sentença que, perante a constatação de que o sujeito passivo deduziu, na sua totalidade, o IVA suportado em documentos de custos comuns de operações sujeitas e isentas, que não conferem direito à dedução, não podia, desviar-se da regra geral do n.º 1 do artigo 23.º do CIVA, seguindo o método da afectação real no apuramento do montante que o sujeito passivo tem direito a deduzir, como pretendia a Impugnante.

v. Contudo, veio a douta sentença concluir que a forma de cálculo da percentagem de dedução a que se refere o n.º 1 do artigo 23.º do CIVA utilizada pelos serviços de inspecção tributária padece de ilegalidades, imputadas pelo Impugnante, por referência às respectivas contas.
Ora, com o devido respeito, não podemos concordar com tal conclusão.
Vejamos,

vi. Em relação aos Custos Diferidos (conta 272), entende a douta sentença que o montante de €143.925,66, havido nesta conta, diz respeito a reembolsos de despesas efectuadas por conta das restantes empresas do grupo A….., em Portugal, e, por conseguinte, redébitos de operações totalmente tributadas, em sede de IVA, a Administração Tributária, tratou erradamente, como se em causa estivesse a dedução de imposto suportado em aquisições de bens e serviços afectos conjuntamente às actividades exercidas, isentas e tibutas, como se se tratasse de inputs promíscuos, conforme terminologia utilizada na doutrina fiscal italiana, pelo que, deverá ser expurgado do calculo do prorata, quer a nível do numerador, quer do denominador.

vii. A douta sentença ao dar razão ao Impugnante, pretendendo excluir do cálculo do prorata, tanto no numerador como no denominador o valor referente a redébitos das despesas às suas participadas, no valor de €143.925,66, com o devido respeito, está a ofuscar as restantes consequências que advém da equiparação deste tipo de redébitos face ao referido na alínea c) do n.º 6 do artigo 16. do CIVA.

viii. Ou seja, seu registo contabilístico aquando da aquisição dos serviços deveria ter sido efectuado numa conta de terceiros, conforme estipula o preceito supra referido, situação não verificada pela impugnante, uma vez que foram levadas a uma conta de custos diferidos, que compreende os custos que devam ser reconhecidos em exercícios seguintes.

ix. E, se tais redébitos se traduzissem em despesas pagas em nome e por conta de terceiros, a estas operações não lhes é conferida o direito a dedução, por força do n.º 2 do artigo 19º do CIVA.

x. Assim sendo, constata-se que se está perante operações tributáveis resultantes de prestações de serviços efectuados por terceiros, mas sendo registadas e pagas pela Impugnante, por serem resultantes da actividade por ela exercida, no âmbito da sua prestação de serviços técnicos de administração e gestão as sociedades participadas, logo, devendo estas operações serem incluídas no cálculo do prorata.

xi. Até porque, mesmo que fosse utilizado o método de afectação real para efeitos de dedução de imposto relativo aos redébitos supra referidos, não poderiam os mesmos valores serem excluídos da fracção do prorata, pelo facto de existirem custos comuns relativos a esses redébitos e à restante actividade da impugnante.

xii. No mesmo seguimento também não concordamos com a douta sentença ao concluir que “Então, sendo certo que no denominador da fracção determinante do prorata foram incluídos elementos que o não deveriam ter sido e viciaram o respectivo quociente, as liquidações subjacentes encontram-se também, viciadas por ofensa no artigo 23.º, n.º 4 do CIVA"

xiii. Acontece que relativamente a estas contas, entende a Impugnante, que o valor dos juros recebidos dos empréstimos concedidos as sociedades participadas, empréstimos efectuados através do aproveitamento de excessos de tesouraria de umas participadas para suprir insuficiências de outras, e que o valor dos dividendos recebidos pelas participações sociais havidas, devem ser excluídas do denominador do calculo do prorata, caso contrario contraria o disposto na Sexta Directiva e restante doutrina emanada através dos acórdãos do TJCE.

xiv. E ainda entende, que no que concerne às operações de cash pooling, que resulta em juros recebidos, deve ser aplicado o método de afectação real, por ser o método mais adequado.

xv. Ou seja, que os valores inerentes às colocações temporárias de "pequenas participações" das suas disponibilidades de tesouraria, embora tendo um caracter acessório na actividade das SGPS, são no entanto, considerada como forma indirecta do exercício de actividades económicas e assim abrangidas no âmbito da actividade fundamental das SGPS, e que assim sendo, desta forma, considera a AT não aplicar às SGPS, o estabelecido no n.º 5 do artigo 23.º do CIVA, na parte respeitante as operações financeiras referidas.

xvi. In casu, e porque tais juros de empréstimos resultam de excedentes de tesouraria, mantém a Administração Tributária a opinião, que também para estes valores não se deve aplicar o n.º 5 do artigo 23.º do CIVA, logo os respectivos valores devem integrar o denominador da fracção para cálculo do prorata.

xvii. Ou seja, os dividendos das participações constituem uma operação financeira enquadrada no âmbito da sua actividade, e como tal isenta nos termos do n.º 28 do artigo 9.º do CIVA.

xviii. No mesmo seguimento também não concordamos com a douta sentença no sentido de que devem, ser excluídos do denominador da fracção que serve de base ao cálculo do prorata de dedução os dividendos distribuídos pelas filias a uma holding que está sujeita ao IVA relativamente a outras actividades e fornece a estas filias serviços de gestão.

xix. No que concerne aos dividendos das participações, estes foram considerados pela Administração Tributária, como um dos rendimentos possíveis resultantes da actividade da SGPS, não tendo caracter acessório, estes rendimentos são intrínsecos à actividade exercida pela Impugnante.

xx. Assim sendo, saem fora do âmbito do n.º 5 do artigo 23.º do CIVA, devendo fazer parte do denominador da fracção para cálculo do prorata.

xxi. Ao decidir como decidiu, a douta sentença incorreu em erro de julgamento ao considerar que se encontram violados os artigos 19.º, n.º 1, 20.º, 21.º, e 23.º, do CIVA e, em consequência, anular o acto de liquidação impugnado. 

xxii. Deste modo, e tendo presente a realidade em análise e de todos os elementos constantes do probatório, considera a Fazenda Pública, contrariamente ao doutamente decidido, que a actuação da Administração Tributária foi no estrito cumprimento dos artigos 19.º, n.º 1, 20.º, 21.º, e 23.º, do CIVA.

xxiii. Da mesma forma, a Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal a quo ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante no que concerne à indemnização pelos custos incorridos com a prestação de garantia bancária.

Vejamos,

xxiv. Vem a douta sentença dizer que "a indemnização de tais despesas, necessariamente assumidas pela ora Impugnante para obter a suspensão de eficácia do acto que, como se viu, vai ser eliminado da ordem jurídica, por anulação, atenta a sua ilegalidade, traduz-se em operação necessária à reconstituição da situação económica em, que aquela estaria se não tivesse praticado o acto ilegal, conforme disposto no artigo 100.º da LGT"

xxv. Ora a douta sentença conclui, que o acto vai ser eliminado da ordem jurídica, por anulação, acontece que, a liquidação em causa não vai ser anulada, mas sim corrigida na parte do seu decaimento, ou seja, na parte parcialmente anulada.

xxvi. Isto é, a decisão da douta sentença foi no sentido de julgar parcialmente procedente a presente impugnação anulado parcialmente a liquidação adicional de IVA, salvo o devido respeito, entendemos que não poderia a Mma Juiz do Tribunal “a quo" concluir desta forma.

xxvii. Tanto que, a Impugnante não logrou provar que, a prestação da garantia em ordem à suspensão do processo de execução fiscal, tenha causado danos, sendo que, o sujeito passivo tem sempre que comprovar a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia, consequentemente, o pedido formulado pela Impugnante teria, desde logo, que improceder.

xxviii. Aqui chegados, e tendo presente a realidade em análise e de todos os elementos constantes do probatório, considera a Fazenda Pública, contrariamente ao doutamente decidido, que não foi demonstrado dos prejuízos emergentes da prestação dessa garantia, pelo que, não pode, também por esta via, ser atribuído à Impugnante qualquer indemnização por prestação de garantia indevida, nos referidos termos.

xxix. Assim sendo, ao decidir como decidiu, a douta sentença incorreu em erro de julgamento ao considerar que se encontram violados os artigos dos artigos 19.º, n.º 1, 20.º, 21.º, e 23.º, do CIVA e, em consequência, anular o acto de liquidação impugnado.

xxx. Deste modo, e tendo presente a realidade em análíseê de todos os elementos constantes do probatório, considera a Fazenda Pública, contrariamente aó doutamente decidido, que a actuação da Administração Tributária foi no estrito cumprimento dos artigos 19.º, n.º 1, 20.º, 21.º, e 23.º, do CIVA.

xxxi. Face ao exposto, salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida ao julgar procedente a presente impugnação judicial, enferma de erro de apreciação da prova, de erro de interpretação de lei.


Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser provido e, consequentemente ser revogada a sentença proferida pelo douto Tribunal a quo assim se fazendo a costumada justiça.”

****
A Impugnante, aqui Recorrida, notificada, não apresentou contra-alegações.
****
Notificado, o Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, com manutenção do julgado porquanto a sentença recorrida não padece de quaisquer vícios, nomeadamente os imputados.

****
Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a recorrente remate a sua alegação (art. 639º do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.
De outro modo, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.
Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, as questões fundamentais a decidir são as de saber se a sentença recorrida errou no seu julgamento:
- quando decidiu anular parcialmente a liquidação de IVA por padecer de ilegalidade por violação de lei, decorrente da aplicação do método prorata no que respeita aos saldos das contas 272, 727 e 784;
- quando condenou a Fazenda Pública no pagamento à impugnante das quantias por esta suportadas a título de despesas com a prestação de garantia bancária.
****
II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. De facto
A sentença recorrida deu por provados os seguintes factos:

A) A ora impugnante é uma sociedade comercial que exerce a acitividade de detenção e gestão de participações sociais noutras sociedades como forma indireta do exercício de atividades económicas e presta serviços técnicos às sociedades por si participadas – por acordo e cfr. fls 195 e dos autos.
B) Ao abrigo da ordem de serviço n.º …..de 22.10.1998, na sequência de um pedido de reembolso de IVA, a Administração Fiscal levou a cabo uma ação inspetiva à Impugnante com vista a “[proceder] ao apuramento dos valores para a aplicação dos pro-ratas nos anos de 1995, 1996 e 1997 e efectuar as respectivas correcções dado já ter sido constatado em fiscalização anterior que o sujeito passivo deduziu indevidamente todo o IVA dos inputs, sem atender ao método da percentagem, tal como está definido no art.º 23.º do CIVA” – cfr. o Relatório de Inspecção Tributária (RIT) a fls. 29 e seguintes do Processo Administrativo Tributário apenso (PAT).
C) No procedimento de inspeção que antecede foi elaborado, em 07.04.199, o Relatório da Inspecção Tributária que consta do PAT apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:
«[…] 3.2 – Apuramento dos Pro-rata
A metodologia utilizada foi por recurso aos extractos das contas de proveitos da empresaa referentes aos anos de 1995, 1996 e 1997, bem como os valores constantes dos anexos 5 a 14, procedendo-se assim ao apuramento da percentagem de dedução por aplicação da fórmula estabelecida no n.º 4 do referido art.º 23.º, sendo as fracções assim constituídas:
[…] ANO DE 1996


[…]
3.3 - A percentagem de dedução para os anos em análise (N.° 8 do Art.° 23.° CIVA)
[...] Ano de 1996
Pro-rata definitivo: 1) /2) = 547 661293$50/5 074 190 575$00
=0,10793, ou seja 11%, por força do n.° 8 do art.° 23.° do CIVA
[...]
3.5 - Cálculo do Imposto em falta - Aplicação dos n.°s 4 e 6 do art.°23. °
Para o ano de 1996 foi calculado o imposto em falta utilizando um pro-rata provisório de 61%, ou seja, o definitivo em 1995.
Com o apuramento do pro-rata definitivo procedeu-se às correcções a efectuar na declaração periódica referente ao mês de Dezembro, de acordo com o que se encontra estabelecido pelo n.° 6 do art.° 23.° pela diferença entre o imposto dedutível com um pro-rata provisório de 61% e o definitivo de 11%, originando uma correcção de 75.182.091$00, conforme explicado no mapa (Anexo 22)
[...]» — cfr. o RIT a fls. 29 e seguintes do PAT.
D) Ato impugnado: Na sequência das correções a que se refere o RIT foi emitida em 07.07.1999, em relação ao período de 1996, a liquidação de IVA n.° ….., no valor de € 377.588,52 (Esc.: 75.699.701), com data limite de pagamento voluntário em 30.09.1999 - cfr. fls. 55 do processo de Reclamação Graciosa apenso (RG).
E) Atos impugnados: Relativamente ao período de 1996 foram ainda emitidas as seguintes liquidações de juros compensatórios, com data limite de pagamento voluntário em 30.09.1999:
    N.° Liquidação
Período
    Valor em €
Valor em ESC
…..
    96.01
3.426,98
687.048,00
…..
    96.02
2.181,89
437.430,00
…..
    96.03
8.694,22
1.743.035,00
…..
    96.04
4.698,46
941.957,00
…..
    96.05
4.291,20
860.309,00
…..
    96.06
4.111,14
824.209,00
…..
    96.07
2.792,35
559.815,00
…..
    96.08
3.638,51
729.455,00
…..
    96.09
3.150,16
631.550,00
…..
    96.10
2.252,23
451.531,00
…..
    96.11
14.644,53
2.935.965,00
…..
    96.12
61.756,71
12.381.108,00
Total
115.63838
23.183.412,00

- cfr. fls. 56 a 64 da RG.

F) Em 29.12.1999 a Impugnante apresentou reclamação graciosa das liquidações identificadas em D) e E), nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 2 a 36 da RG apensa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pedindo a final, a anulação parcial da liquidação de IVA para o valor de Esc. 25.846.321 e respetiva anulação parcial dos juros compensatórios – cfr. fls. 56 a 64 da RG.
G) Em 24.05.2000 a Impugnante prestou garantia bancária através do B….., S.A., até ao montante de 79.878.889$00, com vista à suspensão do processo de execução fiscal n.º ….., instaurando para cobrança da dívida a que se referem as liquidações identificadas em D) e E) – cfr. fls. 228 e 229 dos autos.
H) Por despacho de 26.08.20002 a reclamação graciosa foi parcialmente deferida com fundamentos constantes do respetivo projeto de decisão, de fls. 511 a 534 da RG, e da informação final de fls. 561/562, cujos teores aqui se dão por integralmente reproduzidos, e de que se retira, em síntese o seguinte:

a) Relativamente à informação que constitui o projeto de decisão:
«[…]
5.1 --- Conta 272 – Custos diferidos
[…]
Verificou-se que na composição dos valores da conta 272 Custos diferidos, uma parte (Esc: 28.854.504$00) se refere a reembolsos de despesas efectuadas por conta das restantes empresas do grupo A….., ou seja redébitos de operações tributáveis no âmbito do IVA.
Acontece porém que o contribuinte contabilizou em contas de custos as despesas no montante de Esc: 28.854.504$00, suportou e deduziu imposto dessas despesas, e pelo seu redébito às empresas do Grupo liquidou imposto, por se tratarem de operações tributáveis nos termos CIVA.
Se a A….. dedudizou e liquidou IVA sobre aquelas despesas, é mais que evidente que as mesmas têm de fazer parte do numerador e do denominador da fracção.
[…]
A reclamante pretende que o IVA suportado nos custos que geraram esses redébitos sejam considerados dedutíveis segundo o método da afectação real.
De acordo com o Art. 23º do CIVA são previstas duas modalidades para determinação do direito à dedução: o método de percentagem de dedução ou prorata, como regra geral, e o método de afectação real por opção do sujeito passivo ou por imposição da Administração Fiscal.
A aplicação do método da afectação real carece de comunicação prévia, até Outubro de 1998. Refira-se que o exercício em análise é o de 1996.
Tendo a empresa procedido à dedução total do imposto suportado como se fosse um sujeito passivo integral e não tendo comunicado, previamente à DGCI que optava pelo método de afectação real, o método a aplicar só pode ser o regime geral, ou seja o prorata.
[…]
5.3 --- 727 – Gestão conjunta de fundos
Esta conta de resultados subdivide-se em:
- Juros compensatórios cobrados às empresas A…..……………Esc: 603.560.503$00
O aproveitamento dos excessos de tesouraria numa empresa participada aplicando-o em outra empresa participada quando a segunda tem insuficiências desse tipo, faz parte da actividade das empresas SGPS financeiras.
A reclamante alega que conhece o valor do IVA suportado para a prossecução dessa actividade e pretende que o valor em causa seja retirado do denominador da fracção para cálculo do prorata, e seja utilizado relativamente a esta parcela o método de afectação real.
Sobre a utilização simultânea dos dois regimes de dedução, remetemo-nos para o que foi dito em 5.1 desta informação Assim não é de aceitar a pretensão da reclamante, devendo a mesma ser indeferida.

- Imputação interna de juros ……………………………………...Esc: 390596.444$00
De acordo com os Aenxos à petição a folhas 484 a 486 dos autos, verifica-se que o acumulado a crédio da conta 727 – Gestão de Fundos, são movimentações internas entre centros de custo da própria reclamante, com o objectivo de apurar o nível de utilização interna dos fundos, não correspondendo à contraprestação de uma operação praticada pela reclamante.
Não se tratando de transmissões de bens ou prestações de serviços abrangidos pelo nº 1 do Art. 23º do CIVA, o montante de Esc: 39.596.44$00, não deve ser incluído no denominador da fracção para cálculo da percentagem de dedução do IVA, dando-se razão à reclamante e atendendo-se à sua pretensão.
[…]
5.7 --- Conta 784 – Rendimentos de Participação de capital
Na conta 784 do POC – Rendimentos de Participações de capital, a reclamante contabilizou os dividendos recebidos das suas participadas, no valor de Esc: 3.380.045.249$00.
Face ao objecto social das empresas “SGPS”, que consiste na gestão das participações sociais que detêm um outras empresas (forma indirecta do exercício das actividades comerciais e industriais das participadas), os dividendos constituem o principal rendimento dessa mesma actividade.
No ponto 6 da Informação n.º …..de 27/06/89 da DSCA do SAIVA, vem referido que face ao objecto social das “SGPS”, os rendimentos são constituídos principalmente por dividendos, juros de obrigações e outras aplicações financeiras; e o nº 7, da mesma informação diz que o facto desse tipo de operações se enquadrar no nº 28 do Art. 9º do CIVa (Isenção de IVA), implica que não se poderá deduzir imposto que tenha recaído sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados para o exercício dessa mesma actividade – operações insentas não incluídas na alínea b) do nº 1 do Art. 20º do diploma legal citado.
Nunca a petição da reclamante pode ser atendida, no sentido de se retirar do denominador da fracção a verba de Esc: 3.380.045.249$00 referente a dividendos recebidos.

6- PARECER
6.1 --- De acordo com o descrito no ponto 5, e tendo em atenção o nº 1 do Art. 23º do CIVA e ainda a informação n” ….., de 27/06/89, da DSCA do SAIVA, o numerador e o denominador da fracção ficam os seguintes valores:
(Valores em Escudos)

Daqui resulta, e não se propondo alterações para o numerador, que a percentagem de dedução de Iva passa para 11,38%.

Nos termos do nº 8 do Art. 23º do CIVA, a percentagem de dedução deve ser arredondada para a centésima imediatamente superior, ou seja, 11,40% apurando-se como IVA indevidamente dedudizo o de Esc: 78.844.194$00, e que é o somatório do IVA apurado em falta de Janeiro a Dezembro (Esc: 32.944.962$00) e do IVA apurado p/Dez em função do prorata definitivo (Esc: 41.899.232$00), conforme abaixo:

[…]
6.5 --- Alterando-se para menos o IVA indevidamente deduzido, os juros compensatórios respectivos, deverão ser reajustados.

7 – CONCLUSÃO e PROPOSTA DE DECISÃO
7.1 – Em face do exposto concluímos que o pedido merecer ser parcialmente deferido, sendo de anular o imposto (IVA) a mais liquidado no valor de Esc: 337.897$00 (75.699.701$00 – 75.361.804$00) = € 1.685,42, conforme pormenor:



7.2 – Deverão também ser anulados os juros compensatórios correspondentes ao imposto a mais liquidado.» - cfr. fls. 511 a 534 da RG apensa.

b) Relativamente à informação sobre a qual foi exarado o despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa:
Daqui resulta, e não se propondo alterações para o numerador, que a percentagem de dedução de IVA passa para 12%, em vez dos 11,40% indicados no Projecto de Decisão.

Nos termos do nº 8 do Art. 23º do CIVA, a percentagem de dedução deve ser arredondada para a centésima imediatamente superior, ou seja, 12%, apurando-se como IVA imediatamente deduzido o de Esc: 74.337.349$00, e que é o somatório do IVA apurado em falta de Janeiro a Dezembro ( Esc: 32.944.962$00 ) e do IVA apurado p/Dez em função do prorata definitivo (Esc: 41.392.387$00), conforme abaixo:

2.2 --- Alterando-se para menos o IVA indevidamente deduzido, os juros compensatórios respectivos, deverão ser reajustados.

3- CONCLUSÃO e PROPOSTA DE DECISÃO
3.1 – Em face do exposto concluímos que o pedido merece ser parcialmente deferido, sendo de anular o imposto (IVA) a mais liquidado no valor de Esc: 844.742$00 (75.699.701$00 – 74.854.959$00) = € 4.213,56, conforme pormenor


3.2 – Deverão também ser anluados os juros compensatórios correspondentes ao imposto a mais liquidado.
– cfr. fls. 560 a 562 da RG apensa.

I) Em 30.08.2002 a Impugnante foi notificada da decisão que antecede – cfr. fls. 563 a 565 do PAT, vol. 3/3,
J) Relativamente ao ano de 1996 a Impugnante não comunicou previamente à Direção Geral de Contribuições e Impostos (DGCI) a aplicação do método da afetação real – por acordo (cfr. art.º 49.º da P.I. e ponto “5.1” do projeto de decisão da reclamação graciosa).
K) Em 17.09.2002 a presente Impugnação deu entrada no Serviço de Finanças – cfr. fls. 1 dos autos.
L) L) em 12.12.2008 foi judicialmente declarada a caducidade da garantia bancária identificada em G) – cfr fls. 241 a 244 dos autos.”
****
No que respeita a factos não provados, refere a sentença o seguinte: “Não resultam dos autos outros factos, com relevo para a decisão do mérito da causa, que importe dar como provados ou não provados.”
****
A convicção do Tribunal assentou “no exame dos documentos que constam dos autos e dos processos administrativos apenso (RG e PAT), referenciados em cada uma das alíneas do probatório, bem como da posição assumida pelas partes nos respectivos articulados e nos demais elementos que compõem os autos.
*****
II.2. De Direito
Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida julgou parcialmente procedente a presente impugnação judicial e, em consequência:
a) Anulou parcialmente a liquidação de IVA nº ….., relativa ao período de 1996, bem como, na proporção devida, as respectivas liquidações de juros compensatórios, e
b) Condenou a Fazenda Pública no pagamento à impugnante das quantias por esta suportadas a título de despesas com a prestação da garantia bancária, com o limite previsto no nº 3 do art. 53º da LGT.

Inconformada, a Fazenda Pública veio interpor recurso da referida decisão invocando [conclusões de recurso vii. a xiii.] que em relação aos Custos Diferidos (conta 272) a sentença recorrida ao dar razão ao impugnante, pretendendo excluir do cálculo do prorata, tanto no numerador como no denominador o valor referente a redébitos das despesas às suas participadas, no valor de €143.925,66, com o devido respeito, está a ofuscar as restantes consequências que advém da equiparação deste tipo de redébitos face ao referido na alínea c) do n.º 6 do artigo 16. do CIVA. Ou seja, seu registo contabilístico aquando da aquisição dos serviços deveria ter sido efectuado numa conta de terceiros, conforme estipula o preceito supra referido, situação não verificada pela impugnante, uma vez que foram levadas a uma conta de custos diferidos, que compreende os custos que devam ser reconhecidos em exercícios seguintes. E, se tais redébitos se traduzissem em despesas pagas em nome e por conta de terceiros, a estas operações não lhes é conferida o direito a dedução, por força do n.º 2 do artigo 19º do CIVA. Assim sendo, constata-se que se está perante operações tributáveis resultantes de prestações de serviços efectuados por terceiros, mas sendo registadas e pagas pela Impugnante, por serem resultantes da actividade por ela exercida, no âmbito da sua prestação de serviços técnicos de administração e gestão as sociedades participadas, logo, devendo estas operações serem incluídas no cálculo do prorata. Até porque, mesmo que fosse utilizado o método de afectação real para efeitos de dedução de imposto relativo aos redébitos supra referidos, não poderiam os mesmos valores serem excluídos da fracção do prorata, pelo facto de existirem custos comuns relativos a esses redébitos e à restante actividade da impugnante.

Vejamos.


*

Conta 272 – Custos diferidos

Estes montantes respeitam a reembolsos de despesas efectuadas por conta das restantes empresas do grupo A….. em Portugal e, por isso, redébitos de operações totalmente tributadas em sede de IVA.

E tal como se escreveu na sentença recorrida «No caso, a AT, não obstante reconhecer na fundamentação vertida no relatório de inspeção que o valor em causa (28.854.504$00) se refere, de facto, a reembolsos de despesas efetuadas por conta das restantes empresas do grupo A….., ou seja, redébitos de operações tributáveis no âmbito do IVA, acabou por tratá-lo como se em causa estivesse a dedução do imposto suportado em aquisições de bens e serviços afetos conjuntamente às atividades exercidas, isentas e tributadas — como se se tratasse inputs promíscuos, conforme terminologia utilizada na doutrina fiscal italiana — cfr. JOSÉ GUILHERME XAVIER DE BASTO e MARIA ODETE OLIVEIRA, ob.cit págs. 35 a 71.).»
Vem, agora a recorrente invocar que a sentença recorrida está a ofuscar as restantes consequências que advém da equiparação deste tipo de redébitos face ao referido na alínea c) do n.º 6 do artigo 16. do CIVA. Ou seja, seu registo contabilístico aquando da aquisição dos serviços deveria ter sido efectuado numa conta de terceiros, conforme estipula o preceito supra referido, situação não verificada pela impugnante, uma vez que foram levadas a uma conta de custos diferidos, que compreende os custos que devam ser reconhecidos em exercícios seguintes.

Julgamos, assim, que embora a recorrente reconheça que se tratam de redébitos de operações tributadas em sede de IVA, assim não o considerou em virtude do seu registo contabilístico aquando da aquisição dos serviços não ter sido efectuado numa conta de terceiros, quando deveria sê-lo, nos termos previstos na alínea c) do n.º 6 do artigo 16. do CIVA.

Tal alegação vai ao encontro do RIT onde no ponto 3.1 se escreveu sobre esta matéria: «Os pagamentos por conta que nos termos da alínea c) nº 6 do art. 16º do CIVA, são excluídos da tributação, tem como condição necessária os documentos serem emitidos em nome e contabilizados em contas de terceiros, o que não se verificou, pelo que, se vai proceder à correcção liquidando o imposto em falta.»

Verificamos, assim, que a recorrente procedeu às referidas correcções pelo facto do registo contabilístico não ter sido efectuado numa conta de terceiros.
Ora, é a própria impugnante (nos arts. 45º a 48º da p.i.) que reconhece apenas não ter cumprido o requisito de o pagamento ser realizado em nome de outrem, mas que no mais nada faz diferir a situação em apreço daquela que se pretendeu salvaguardar na citada alínea c) do nº 6 do artigo 16º do Código do IVA, pelo que, não sendo aceitável a aplicação de um regime que traduza um resultado diverso, se impõe a utilização do método da afectação real.
Ora, se por um lado, há uma não observância do disposto no citado art. 16º, nº 6, alínea c), do Código do IVA como invoca a recorrente, por outro lado, competia à impugnante, nos termos do art. 74º da LGT, demonstrar que os referidos montantes respeitavam a meros reembolsos de despesas efectuadas por conta das restantes empresas do grupo A….., em Portugal, o que conseguiu.
Vejamos.
O artigo 17.º, n.ºs 2 e 5, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, deve ser interpretado no sentido de que uma sociedade holding que acessoriamente à sua actividade principal de gestão das participações sociais das sociedades de que detém a totalidade ou parte do capital social, adquire bens e serviços que factura em seguida às referidas sociedades, está autorizada a deduzir o imposto sobre o valor acrescentado pago a montante, na condição de os serviços adquiridos a montante apresentarem um nexo directo e imediato com operações económicas a jusante com direito a dedução. Quando os referidos serviços são utilizados pela sociedade holding para realizar simultaneamente operações económicas com direito a dedução e operações económicas sem direito a dedução, a dedução só é admitida para a parte do imposto sobre o valor acrescentado que seja proporcional ao montante relativo às primeiras operações e a Administração Tributária nacional está autorizada a prever um dos métodos de determinação do direito a dedução enumerados no dito artigo 17.º, n.º 5. Quando os referidos bens e serviços são utilizados simultaneamente para actividades económicas e para actividades não económicas, o artigo 17.º, n.º 5, da Sexta Directiva 77/388 não é aplicável e os métodos de dedução e de repartição são definidos pelos Estados-Membros, que, no exercício deste poder, devem ter em conta a finalidade e a economia da Sexta Directiva 77/388 e, a esse título, prever um modo de cálculo que reflicta objectivamente a parte de imputação real das despesas a montante a cada uma destas duas actividades.
Resulta, pois, claro que a AT deve ter em conta a finalidade e a economia da Sexta Directiva 77/388 e, a esse título, prever um modo de cálculo que reflicta objectivamente a parte de imputação real das despesas a montante a cada uma destas duas actividades.
Assim, não pode a AT, não obstante reconhecer na fundamentação vertida no relatório de inspeção que o valor em causa se refere, de facto, a reembolsos de despesas efetuadas por conta das restantes empresas do grupo A….., ou seja, redébitos de operações tributáveis no âmbito do IVA, vir depois tratá-lo como se em causa estivesse a dedução do imposto suportado em aquisições de bens e serviços afetos conjuntamente às atividades exercidas, isentas e tributadas, tendo em consideração a justiça fiscal, e em respeito dos princípios que norteiam o imposto em causa, nomeadamente, o da neutralidade, constante da Sexta Directiva do IVA 77/388.
Pelo que improcede este fundamento de recurso.

Conta 727 – Gestão conjunta de fundos

(Juros resultantes de operações de “cash-pooling”)

Vem, também, a recorrente alegar [conclusões de recurso xii. a xvii.] que In casu, e porque tais juros de empréstimos resultam de excedentes de tesouraria, mantém a Administração Tributária a opinião, que também para estes valores não se deve aplicar o n.º 5 do artigo 23.º do CIVA, logo os respectivos valores devem integrar o denominador da fracção para cálculo do prorata. Ou seja, os dividendos das participações constituem uma operação financeira enquadrada no âmbito da sua actividade, e como tal isenta nos termos do n.º 28 do artigo 9.º do CIVA.

Adiantamos, desde já, que não concordamos com a recorrente.

Estão em causa juros cobrados às empresas do grupo A….., em Portugal resultantes de operações “cashpooling” (gestão de financiamento usando os excessos de tesouraria de umas empresas para suprir a insuficiência de outras).

Ora, nestes casos o que está em causa não é a rentabilização dos capitais emprestados às sociedades participadas, mas sim a satisfação das necessidades financeiras destas, pelo que o facto de a recorrida ter recebido juros não pode influir no cálculo do IVA dedutível, pelo que deverá ser excluído do denominador do prorata.

No mesmo sentido, veja-se o Acórdão TJUE proferido no caso C-142/99 – Floridienne, SA & Berginvest, SA, de 14 de Novembro de 2000 – de onde se extrai a seguinte Conclusão:

«Os dividendos de acções deverão ser sempre excluídos do denominador da fracção que serve para o cálculo do pro rata de dedução previsto no artigo 19.°, n.° 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, sempre que as relações económicas entre a sociedade que possui as acções e a sociedade em que essas acções são detidas obedecem a regras legais incluindo contratos de prestação de serviços e a nomeação pela sociedade-mãe de pessoas que gerem as actividades da filial. Além disso, se uma sociedade de um grupo fornece, ainda que de forma continuada, empréstimos financeiros destinados a satisfazer necessidades financeiras regulares de outras empresas do mesmo grupo, essa actividade não constitui uma actividade económica e o rendimento resultante desse financiamento deverá também ser excluído do denominador da fracção.»

De qualquer modo, sempre seria à recorrente que cabia fazer a prova de que os juros provinham de uma actividade económica para poder efectuar a liquidação adicional, o que não aconteceu.
Pelo que improcede este fundamento de recurso.

*
Conta 784 – Rendimentos de participações de capital

Alega, também, a recorrente [conclusões de recurso xviii. a xx.] que No mesmo seguimento também não concordamos com a douta sentença no sentido de que devem, ser excluídos do denominador da fracção que serve de base ao cálculo do prorata de dedução os dividendos distribuídos pelas filias a uma holding que está sujeita ao IVA relativamente a outras actividades e fornece a estas filias serviços de gestão. No que concerne aos dividendos das participações, estes foram considerados pela Administração Tributária, como um dos rendimentos possíveis resultantes da actividade da SGPS, não tendo caracter acessório, estes rendimentos são intrínsecos à actividade exercida pela Impugnante. Assim sendo, saem fora do âmbito do n.º 5 do artigo 23.º do CIVA, devendo fazer parte do denominador da fracção para cálculo do prorata.

Não tem razão, sendo que esta posição da recorrente consubstancia uma violação da Sexta Directiva.
Vejamos.
A percepção de dividendos não configura a contraprestação de qualquer actividade económica da recorrida não se encontrando por isso no âmbito dos artigos 17º e 19º da Sexta Directiva e artigo 23º, nº 4, do Código do IVA.
No caso em apreço, os referidos dividendos não derivaram do exercício de uma actividade económica da recorrida, bastando para o efeito a simples titularidade das participações sociais.
Sobre esta matéria e no mesmo sentido, veja-se o Acórdão do TJC, Processo C-142/99, de 14/11/2000, Floridienne SA e Berginvest SA contra Estado belga, onde se declarou:
«O artigo 19.° da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, deve ser interpretado no sentido de que devem ser excluídos do denominador da fracção que serve de base ao cálculo do pro rata de dedução:
— por um lado, os dividendos distribuídos pelas filiais a uma holding que está sujeita ao IVA relativamente a outras actividades e fornece a estas filiais serviços de gestão e, — por outro, os juros pagos por estas últimas a esta holding relativos a empréstimos que esta lhes concedeu, quando estas operações de empréstimos não constituem, na acepção do artigo 4.°, n.° 2, da Sexta Directiva, uma actividade económica da referida holding.»

Por outro lado, importa referir que no RIT não se analisou ou suscitou a questão da conexão dos referidos dividendos com o exercício de uma atividade económica da impugnante, tendo-se limitado a proceder à inclusão dos mesmos para efeitos de cálculo do prorata.
Termos em que improcede o presente fundamento de recurso.


*
- Da indemnização por garantia indevida
Por último, alega a recorrente [conclusões de recurso xxiii. a xxviii] que Da mesma forma, a Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal a quo ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante no que concerne à indemnização pelos custos incorridos com a prestação de garantia bancária. Ora a douta sentença conclui, que o acto vai ser eliminado da ordem jurídica, por anulação, acontece que, a liquidação em causa não vai ser anulada, mas sim corrigida na parte do seu decaimento, ou seja, na parte parcialmente anulada. Isto é, a decisão da douta sentença foi no sentido de julgar parcialmente procedente a presente impugnação anulado parcialmente a liquidação adicional de IVA, salvo o devido respeito, entendemos que não poderia a Mma Juiz do Tribunal “a quo" concluir desta forma. Tanto que, a Impugnante não logrou provar que, a prestação da garantia em ordem à suspensão do processo de execução fiscal, tenha causado danos, sendo que, o sujeito passivo tem sempre que comprovar a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia, consequentemente, o pedido formulado pela Impugnante teria, desde logo, que improceder. Aqui chegados, e tendo presente a realidade em análise e de todos os elementos constantes do probatório, considera a Fazenda Pública, contrariamente ao doutamente decidido, que não foi demonstrado dos prejuízos emergentes da prestação dessa garantia, pelo que, não pode, também por esta via, ser atribuído à Impugnante qualquer indemnização por prestação de garantia indevida, nos referidos termos.

Vejamos.
O art. 53.º da LGT consagra o direito de indemnização do devedor pelos prejuízos resultantes da prestação de garantia bancária ou equivalente que tenha oferecido para obter a suspensão da execução fiscal, no caso de a dívida exequenda vir a revelar-se indevida por força do vencimento do procedimento ou processo tributário em que era controvertida a respectiva legalidade, podendo o pedido de indemnização ser formulado tanto nesse procedimento ou processo tributário, como autonomamente.
Invoca a recorrente que a sentença conclui, que o acto vai ser eliminado da ordem jurídica, por anulação, e o que acontece é que a liquidação em causa não vai ser anulada, mas sim corrigida na parte do seu decaimento, ou seja, na parte parcialmente anulada. Isto é, a decisão da sentença foi no sentido de julgar parcialmente procedente a presente impugnação anulando parcialmente a liquidação adicional de IVA.
Vejamos.
Conforme consta do art. 17º da p.i., de acordo com o relatório de conclusões, a liquidação adicional sub judice teve origem em correcções de três naturezas distintas, a saber:
a) Falta de liquidação e de pagamento de IVA - € 1.455,54;
b) Dedução indevida de IVA - € 684,12;
c) Aplicação do prorata de 11% ao IVA deduzido, já expurgado das correcções supra - € 375.448,86, posteriormente reduzido para € 373.374,96, nos termos do Despacho de deferimento parcial, de 26 de Agosto de 2002.
Conforme a impugnante reconheceu no art. 18º da p.i., no tocante às duas primeiras correcções, a impugnante reconheceu razão à Administração Tributária, em sede de reclamação graciosa.
No entanto, não se conformou com a terceira correcção (art. 19º da p.i.) relacionada com a fixação de um prorata de 12% e respectiva liquidação adicional de IVA, bem como dos respectivos juros compensatórios, sendo que as veio colocar em crise na presente impugnação judicial.
Assim, bem andou a sentença recorrida quando anulou parcialmente a liquidação adicional em causa e respectivos juros compensatórios porque, como já vimos, as correcções referidas em a) e b) supra, foram reconhecidas e aceites pela impugnante.
Já não andou bem a sentença recorrida quando considerou que a impugnação judicial era parcialmente procedente, isto porque procederam na íntegra as correcções impugnadas na presente impugnação judicial, pelo que a mesma foi totalmente procedente.
Aqui chegados, importa retornar à indemnização por garantia indevida.
Como resulta do disposto no artigo 53º da LGT, supra citado, ali se reconhece ao devedor, que ofereça garantia bancária ou equivalente, uma indemnização total ou parcial pelos prejuízos resultantes da sua prestação, em proporção do vencimento na acção(1), (destaque nosso) caso a tenha mantido por período superior a três anos ou independentemente desse prazo caso, ocorra erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.
No caso dos autos a anulação da liquidação, como vimos, só foi parcial. Assim sendo, o valor a considerar para efeitos da percentagem da indemnização pela prestação de garantia indevida terá que ser, forçosamente, respeitante ao montante da liquidação resultante dessas correcções e respectivo acrescido, e cuja ilegalidade, por erro sobre pressupostos, imputado à AT, constitui o fundamento para a sua anulação e responsabilidade desta pelos custos suportados com a garantia.(2)
Deste modo, não se pode manter na totalidade, o decidido na sentença recorrida quanto à condenação da Fazenda Pública no pagamento à impugnante das quantias por esta suportadas a título de despesas com a prestação da garantia, uma vez que, como supra vimos, a liquidação só foi anulada parcialmente. Assim, a referida indemnização deverá ser paga na proporção da anulação da liquidação.

Como se disse no acórdão do STA de 09/04/2014, Proc. 0332/14, disponível em
www.dgsi.pt:
«Do art. 53.º da LGT resulta que o direito à indemnização pela garantia indevidamente prestada, a atribuir sem dependência do prazo a que alude o n.º 1 do artigo supra citado, depende da verificação, dos seguintes pressupostos de facto: a) a prestação da garantia bancária ou equivalente (com vista à suspensão da execução fiscal que tenha por objecto a cobrança de dívida emergente da liquidação impugnada, ainda que a execução fiscal seja questionada através de oposição. b) a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia; c) o vencimento na reclamação graciosa, impugnação judicial, ou oposição onde seja verificado o erro imputável aos serviços.
(…)»

Invoca, ainda, a recorrente que a impugnante não logrou provar que a prestação da garantia em ordem à execução fiscal, tenha causado danos, sendo que o sujeito passivo tem sempre que comprovar a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia.
Vejamos.
Conforme alínea G) do probatório, em 24/05/2000 a impugnante prestou garantia através do B….., SA até ao montante de 79.878.889$00, com vista à suspensão do processo de execução fiscal nº ….., instaurado para cobrança da dívida a que se referem as liquidações identificadas em D) e E).
Assim, terá que se indemnizar o contribuinte pelos prejuízos que teve com a prestação de uma garantia que não teria que prestar se a Administração não tivesse actuado ilegalmente.

Verificam-se pois os pressupostos de reconhecimento do direito da recorrida à indemnização pela prestação de garantia, já que, por via daquela indevida liquidação e errada actuação dos serviços, a mesma foi forçada a prestá-la e, consequentemente, a incorrer em despesas.

Daí que tenha direito a ser indemnizada pelos prejuízos resultantes dessa prestação independentemente do período de tempo durante o qual a garantia tivesse sido mantida (artº 53º, n.º 2 da LGT).

Destarte, bem andou a sentença recorrida quando condenou a Recorrente a pagar indemnização pela prestação de garantia indevida - e acrescentamos nós - que deverá ser paga na proporção da anulação da liquidação, e no montante que se vier a apurar ter sido despendido pela Recorrida com a sua prestação.
Termos em que procede parcialmente o presente fundamento de recurso.


****


III – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder parcial provimento ao recurso, e em consequência:
- revogar a sentença recorrida na parte em que condena a Fazenda Pública ao pagamento à Impugnante de indemnização pela prestação de garantia indevida no segmento em que contempla os prejuízos que respeitam ao imposto e acrescido não anulado;
- no mais manter a sentença recorrida, com a rectificação de que a presente impugnação judicial procedeu na sua totalidade.

Custas pelas partes na proporção do decaímento, sendo que a Recorrente Fazenda Pública beneficia de isenção subjectiva (cfr. art. 3º do Regulamento das Custas dos Processos Tributários – DL 29/98, de 11.02).

Registe e notifique.

Lisboa, 3 de Dezembro de 2020


--------------------------------------

[Lurdes Toscano]

--------------------------------------

[Maria Cardoso]

--------------------------------------

[Catarina Almeida e Sousa]


________________
(1) Vencimento na reclamação graciosa, impugnação judicial ou oposição, onde seja verificado o erro imputável aos serviços.
(2) Veja-se o Acórdão do STA de 22/02/2017, Proc. 0468/16, disponível em www.dgsi.pt