Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:631/21.5BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:12/19/2023
Relator:HÉLIA GAMEIRO SILVA
Descritores:INTIMAÇÃO PARA UM COMPORTAMENTO
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
Sumário:A intimação para um comportamento não tem como fim a definição da existência de direitos ou interesses em matéria tributária, mas, sim e apenas a de determinar/impor a realização de atos, desde que tais atos e direitos sejam evidentes e legalmente previstos.
Votação:Voto de vencido
Indicações Eventuais:Subsecção de execução fiscal e de recursos contra-ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção da Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenação do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

l – RELATÓRIO

J........, com os demais sinais nos autos, veio requerer a intimação para um comportamento da AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT), pedindo, a final e, em suma, que a condenação da AT (i) a pronunciar-se em relação aos pedidos que, por si, lhe foram dirigidos (ii) a declarar que os créditos reclamados estão e encontram-se prescritos.

O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada, por sentença de 20 de junho de 2023, julgou extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, por concluir que aquilo que o requerente pretendia/poderia obter, por via da presente intimação para um comportamento, já terá sido obtido por outro meio, pelo que a decisão a proferir, neste, já não terá qualquer efeito útil.

Inconformado, J........, vem recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

«A) douta sentença recorrida não fez a boa aplicação do direito competente, que imporia decisão diferente; como o recorrente peticiona, este o meio processual mais adequado e devido para assegurar a tutela plena, eficaz e devida do direito do recorrente,

H) Do que exara e resulta dos autos, apenas figura uma resposta, datada de 9 de Dezembro de 2021, em que a autoridade tributária, requereu a junção aos mesmos de dois ofícios, os ofícios N°s 2898 e 2899, contendo a notificação ao recorrente e mandatário de uma resposta parcial aos requerimentos apresentados, como resulta de fls 32 s 48 dos autos.

I) Nesta resposta, como legal e imperativamente estava e está obrigada, o que não cumpriu, a Autoridade Tributária (AT), recorrida, tinha de demonstrar e provar nestes autos, com documentação e suportes bastantes, devidamente fundamentados, de que o recorrente, alias conforme impõe o Art. 45 da LGT que o mesmo tinha sido validamente notificado ou citado dentro do respectivo prazo de caducidade e de acordo com o determinado no artigo 5° da LGT, com o pormenor de indicar as respectivas datas, com a inclusão da assinatura do recorrente.

J) Tal foi expresso no requerimento que o recorrente apresentou no dia 10.3.2022, em que o mesmo, no que alega e aduz, informa e reporta ter apurado que « destinado a si, não havia conhecimento, registo ou nota da recepção de qualquer missiva, ofício ou comunicação», e que, que «no que foi alegado e considerado nos suportes entretanto juntos a estes autos pela requerida autoridade tributária, não houve nem se verificou qualquer acto ou facto suspensivo» e de que «verifica-se a caducidade, não se tendo verificado nenhuma causa de suspensão da mesma» (cf. fls. 56 a 58 dos autos).

K) A recorrida, a autoridade tributaria, não apresentou nem juntou cópia de alguma ou qualquer notificação validamente efectuada ao recorrente, porque a mesma bem sabe, na pessoa do seu alto responsável, o Ex.mo Sr. Chefe das Finanças de Oeiras -2 (Algés) que esses suporte e provas não existem, sendo inexistentes;
março), razão e motivo pelo qual não podem ser aplicadas a factos ocorridos anteriormente (antes de 2009), sob pena de se questionar a segurança jurídica que tem um caracter fundamental, atribuindo-se aos cidadãos a confiança que permite a planificação das defesa dos seus interesses,

R) Este princípio que tem aplicação directa perante a autoridade tributária, devendo esta no exercício da sua actividade respeitar os parâmetros constitucionalmente definidos, que tem assento constitucional no N° 3 do Art. 103 da CRP.

S) Com o presente procedimento veio o recorrente peticionar que a recorrida fosse e seja condenada “ não só a pronunciar-se em relação aos pedidos apresentados e formalizados pelo A. como, nesta pronuncia, ser condenada a declarar que os créditos reclamados estão e encontram-se prescritos», o que significa que, atendendo ao concreto pedido formulado, poder- se-á, desde logo afirmar que, por via da presente intimação, o recorrente pretende que a recorrida fosse e seja intimada à adoção de um determinado comportamento, concretamente, «pronunciar-se em relação aos pedidos apresentados e formalizados», reconhecendo que «os créditos reclamados estão e encontram-se prescritos»,

T) Resulta assim do teor do respetivo articulado inicial que a ausência de resposta aos requerimentos apresentados consubstancia, uma omissão de um dever suscetível de lesar direitos ou interesses legítimos em matéria tributária.

U) Este meio processual só seja aplicável quando «for o meio mais adequado para assegurar a tutela plena, eficaz e efetiva dos direitos ou interesses em causa» (cf. artigo 147.°, n.° 2 do CPPT), sendo que assim a intimação para um comportamento é o meio processual adequado a compelir a Administração ao cumprimento de um determinado dever

V) A intimação para um comportamento visa reagir contra omissões ilegais do dever de determinadas prestações jurídicas lesivas de direitos ou interesses legítimos em matéria dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, nãe havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito», pelo que ao ser decidido como foi decidido foi-o erradamente

A.3 Quando a instância se extinguir por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, estabelece o artigo 536.° do CPC que a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou do recorrente, salvo se tal impossibilidade for imputável ao réu ou recorrido, caso em que é este responsável pela totalidade das custas» (n.° 3), considerando-se, designadamente, que é imputável ao réu, e não ao recorrente, a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou do recorrente

A.4.Considerando que a demanda era fundada no momento em que foi requerida a presente intimação para um comportamento, uma vez que a pretensão parcial do recorrente apenas foi satisfeita, apenas em termos de julgamento, num momento posterior à propositura da presente ação (28.10.2021) - por via do despacho da Chefe de Finanças Adjunta de 2.12.2021 -, devem as custas ser suportadas pela recorrida, por lhe ser imputável a inutilidade superveniente da presente lide (cf. artigo 536.°, n.° 3, in fine e n.° 4 do CPC, ex vi do artigo 2.°, alínea e) do CPPT), sem olvidar que a recorrida não deduziu qualquer oposição,

Termos em que, nos demais de direito que V.Ex.a., muito doutamente proverão, deve o presente recurso ser julgado procedente e provado, revogando- se a decisão recorrida, assim se fazendo a costumada

Justiça.»


»«

Notificadas das alegações de recurso interposto, a Recorrida veio apresentar contra-alegações, tendo ali formulando as seguintes conclusões:

«A. Não assiste qualquer razão ao Recorrente, não enfermando a douta sentença dos erros de julgamento que o mesmo lhe assaca, antes pelo contrário, o douto Tribunal a quo aplicou corretamente o acervo jurídico vigente e aplicável aos autos, fazendo a legal interpretação e aplicação do mesmo.

B. As alegações de recurso do Recorrente estão eivadas de erro sobre os pressupostos de facto e direito.

C. A decisão recorrida não é merecedora de qualquer reparo, sendo a sua interpretação e conclusão a única juridicamente possível, atento os factos em causa e o quadro legal vigente, sendo que a argumentação e a interpretação vertida nas alegações de recurso não podem proceder.

D. As alegações de recurso não inquinam a conclusão retirada pela douta sentença, de que: “(...) o Requerente apenas poderia obter a intimação da Entidade Requerida para a prolação de uma decisão (expressa) sobre os requerimentos que dirigiu ao Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras-2 (Algés)”.

E. A decisão recorrida analisou a pretensão do ora Recorrente, bem como a interpretação perfilhada pelo mesmo, sucede é que a mesma não pode proceder, conforme aí exposto.

F. A posição defendida pelo Recorrente assenta em manifesto erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

G. A Recorrida demonstrou que cumpriu o dever de decisão e resposta, tendo se pronunciado quanto aos requerimentos apresentados pelo Recorrente, em obediência ao dever de informação e ao princípio da colaboração.

H. A lei e a jurisprudência são claras que “Em caso de omissão, por parte da administração tributária, do dever de qualquer prestação jurídica suscetível de lesar direito ou interesse legítimo em matéria tributária, poderá o interessado requerer a sua intimação para o cumprimento desse dever junto do tribunal tributário competente (artigo 147°, n° 1 do CPPT).”

I. Mas, este meio processual só é aplicável quando, face aos restantes meios processuais contenciosos, ele for o mais adequado para assegurar a tutela plena, eficaz e efetiva dos direitos ou interesses em causa (artigo 147°, n° 2 do CPPT).

J. O pedido de intimação para um comportamento visa obter o cumprimento de um dever pela administração tributária, pressupondo sempre que esteja previamente definida a existência do direito, pois não se inclui no processo de intimação uma fase declarativa.

K. Não poderia a Recorrida ser condenada como pedido.

L. O Recorrente não demonstra a existência de outro direito nem a omissão de outro dever por parte da AT, pelo que não é a Intimação o meio processual adequado para determinar a existência ou não de outros direitos daquele.

M. A intimação para um comportamento é o meio adequado para a obtenção da prática de um ato de decisão, não se podendo confundir com a intimação para a decisão de acordo com a pretensão do Requerente.

N. In casu, o meio processual utilizado é adequado para o primeiro pedido e impróprio para o segundo pedido, uma vez que é adequado para obter uma decisão sobre um requerimento, mas não se para impor o conteúdo e sentido da decisão a proferir sobre tal requerimento.

O. No caso concreto, estando pendentes processos de execução fiscal, é nos mesmos que o ora Recorrente deve intervir e usar os meios de reação que tem ao seu dispor, pois são esses os meios adequados e legalmente previstos para tal, nomeadamente para invocar “a prescrição dos créditos reclamados”.

P. De facto, a prescrição da dívida deve ser invocada mediante oposição à execução fiscal, prevista nos artigos 203° e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, sendo subsumível ao fundamento previsto na alínea d), do n.° 1, do artigo 204° do mesmo Código;

Q. Ou pode ser arguida em requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal, sendo que só após proferida decisão pelo órgão de execução fiscal sobre tal pedido, e no caso de o executado não concordar com a mesma, poderá deduzir reclamação, nos termos previstos nos artigos 276° a 278° do CPPT.

R. Portanto, todo o demais pedido, para além do voluntariamente cumprido pela Recorrida, não pode ser objeto da presente lide/intimação, por impropriedade do meio processual para o efeito.

S. Face a todo o exposto, a sentença recorrida não merece qualquer reparo, e a argumentação do recorrente não belisca qualquer conclusão da mesma, sendo legalmente inadmissível a interpretação nela defendida, por falta de suporte legal e por violar o disposto no artigo 147.°, artigos 203.° e ss, e artigos 276.° a 278.°, do CPPT.

T. Conclui-se pela improcedência total da argumentação expendida pelo Recorrente no requerimento de interposição de recurso, e pela inexistência de qualquer erro de julgamento que inquine a douta sentença do Tribunal a quo, pelo que deve manter-se.

U. Maxime, poderia a sentença ter determinado a nulidade parcial do processo quanto ao demais pedido pelo Intimante.

Nestes termos e com o douto suprimento de V. Exas. deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se a Douta sentença recorrida, na sua totalidade».


»«


O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal, veio oferecer o seu parecer no sentido da improcedência do recurso e da manutenção da sentença recorrida.

»«

Com dispensa dos vistos, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.

Objeto do recurso

Como é sabido, são as conclusões das alegações do recurso que definem o seu objeto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, não obstante a ressalva para as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (artigo 639.º n.º 1 do CPC aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA e artigo 97.º n. 1 al. q) e 2.º al. c) do CPPT).

No caso sub judice, importa aferir se a sentença recorrida incorreu em erro quer ao julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, quer na condenação que ali se fez quanto a custas.

II - FUNDAMENTAÇÃO

A sentença recorrida considerou os seguintes factos provados:

«A) Em 29.4.2021, o Requerente dirigiu ao Diretor de Finanças de Oeiras-2 (Algés), comunicação, remetida por correio postal registado sob o n.° RF 5681 3401 8 PT, de cujo teor se extrai o seguinte:

«(…)

Assunto: Prescrição de Dívida
J........, contribuinte n° ……….90, com morada fiscal na Rua A……, n° 14-7°C, 2725-….., Mem Martins, tendo tido conhecimento que estão pendentes os Processos:
n°……..90
n°……04G
n°…….20
n°……90
n°…….70
n°……40
n°…….40
n°…….70
n°……50
n°…….00
n°……80
de reclamação de créditos fiscais em relação ao qual já está decorrido o prazo prescricional, vem invocar e suscitar a prescrição dos mesmos para os devidos efeitos legais e de facto (Artigo 48.° da LGT). É de salientar ainda a caducidade do direito à liquidação, por o contribuinte não ter sido validamente notificado (Artigo 45.° da LGT).
Assim, requer-se pelo princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2° da Constituição da República Portuguesa, que seja declarada a extinção das obrigações tributárias em execução.» (cf. documento junto como doc. 2 da petição inicial «p.i.» a fls. 11 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

B) Em 20.5.2021, o Requerente dirigiu ao Diretor de Finanças de Oeiras-2 (Algés), comunicação, remetida por correio postal registado sob o n.° RF 5681 3397 5 PT, de cujo teor se extrai o seguinte:

«(…)
Assunto: Prescrição de Dívida
J........, contribuinte n° ……..90, com morada fiscal na Rua A……., n° 14-7°C, 2725-…., Mem Martins, tendo tido conhecimento que está pendente os Processos:
n°……50
n°……70
n°……90
n° …..40
n° …..50
n° …..10
n° …..20
n° ……90
n° ……10
n° ……50
n° ……90
n° …….50
n° …….30
de reclamação de créditos fiscais em relação ao qual já está decorrido o prazo prescricional, vem invocar e suscitar a prescrição dos mesmos para os devidos efeitos legais e de facto (Artigo 48.° da LGT). É de salientar ainda a caducidade do direito à liquidação, por o contribuinte não ter sido validamente notificado (Artigo 45.° da LGT).
Considerando ainda este pressuposto entendo que para além do mais com esta injunção tem no mínimo de se suspender qualquer procedimento pendente.
Assim, requer-se pelo princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.° da Constituição da República Portuguesa, que seja declarada a extinção das obrigações tributárias em execução.» (cf. documento junto como doc. 3 da p.i. a fls. 12 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

C) Em 20.5.2021, o Requerente dirigiu ao Diretor de Finanças de Oeiras-2 (Algés), comunicação, remetida por correio postal registado sob o n.° RF 5681 3396 7 PT, de cujo teor se extrai o seguinte:
«(…)
Assunto: Prescrição de Dívida
J........, contribuinte n° ……..90, com morada fiscal na Rua A……, n° 14-7°C, 2725-….., Mem Martins, tendo tido conhecimento que está pendente um Processo n° …….60 de reclamação de créditos fiscais em relação ao qual já está decorrido o prazo prescricional, vem invocar e suscitar a prescrição dos mesmos para os devidos efeitos legais e de facto (Artigo 48.° da LGT). É de salientar ainda a caducidade do direito à liquidação, por o contribuinte não ter sido validamente notificado (Artigo 45.° da LGT).
Considerando ainda este pressuposto entendo que para além do mais com esta injunção tem no mínimo de se suspender qualquer procedimento pendente.
Assim, requer-se pelo princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.° da Constituição da República Portuguesa, que seja declarada a extinção das obrigações tributárias em execução.» (cf. documento junto como doc. 4 da p.i. a fls. 13 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

D) Em 20.5.2021, o Requerente dirigiu ao Diretor de Finanças de Oeiras-2 (Algés), comunicação, remetida por correio postal registado sob o n.° RF 5681 3405 2 PT, de cujo teor se extrai o seguinte:

«…-)

Assunto: Prescrição de Dívida

J........, contribuinte n° ……..90, com morada fiscal na Rua A……, n° 14-7°C, 2725-……, Mem Martins, tendo tido conhecimento que está pendente um Processo n° …….50 de reclamação de créditos fiscais em relação ao qual já está decorrido o prazo prescricional, vem invocar e suscitar a prescrição dos mesmos para os devidos efeitos legais e de facto (Artigo 48.° da LGT). É de salientar ainda a caducidade do direito à liquidação, por o contribuinte não ter sido validamente notificado (Artigo 45.° da LGT).

Considerando ainda este pressuposto entendo que para além do mais com esta injunção tem no mínimo de se suspender qualquer procedimento pendente.

Assim, requer-se pelo princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.° da Constituição da República Portuguesa, que seja declarada a extinção das obrigações tributárias em execução.» (cf. documento junto como doc. 5 da p.i. a fls. 14 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

E) Em 28.10.2021 deu entrada em Tribunal a petição inicial dos presentes autos (cf. «Comprovativo de Entrega» de fls. 1 a 3dos autos).

F) Em 2.12.2021, o Serviço de Finanças de Oeiras-2 (Algés), pronunciando-se sobre os requerimentos acima referidos, elaborou «INFORMAÇÃO» com o seguinte teor:

«(…)

INTRODUÇÃO

Veio o executado acima identificado em vários requerimentos solicitar resumidamente a prescrição das dívidas em seu nome nos PEF's supra, no qual é revertido da firma D........ LDa. Veio igualmente o mandatário do executado solicitar o mesmo noutro requerimento.

ANÁLISE analisando os autos, verifica-se que o executado encontra-se em dívida como revertido da firma acima identificada nos seguintes PEF's cuja origem e valor da Q.E. se discrimina:


“(texto integral no original; imagem)”

Relativamente à prescrição Determina os artigos 48° e 49° da LGT Artigo 48°
Prescrição
1 - As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.
(Red.Lei n°55-B/2004, de 30 de Dezembro)
2 - As causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou subsidiários.
3 - A interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efectuada após
0 5.° ano posterior ao da liquidação.
4 - No caso de dívidas tributárias em que o respectivo direito à liquidação esteja abrangido pelo disposto no n.° 7 do artigo 45.°, o prazo referido no n.° 1 é alargado para 15 anos. (Aditado pela Lei n.° 64-B/2011, de 30 de Dezembro)
Artigo 49°
Interrupção e suspensão da prescrição
1 - A citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição.
2 - (Revogado pelo artigo 90° da Lei n.° 53-A/2006, de 29/12) (*)
3 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar. (Redacção dada pela Lei n.° 53-A/2006, de 29/12)
4 - O prazo de prescrição legal suspende-se:(Redacção da Lei n.° 7-A/2016 de 30 de março)(**)
a) Em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizados; (Aditada pela Lei n.° 7- A/2016 de 30 de março)
b) Enquanto não houver decisão definitiva ou transitada em julgado, que ponha termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida; (Aditada pela Lei n.° 7-A/2016 de 30 de março)
c) Desde a instauração até ao trânsito em julgado da ação de impugnação pauliana intentada pelo Ministério Público. (Aditada pela Lei n.° 7-A/2016 de 30 de março)
Durante o período de impedimento legal à realização da venda de imóvel afeto a habitação própria e permanente. (Aditada pela Lei n.° 13/2016, de 23 de maio)
5- O prazo de prescrição legal suspende-se, ainda, desde a instauração de inquérito criminal até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença. (Aditado pela Lei n.° 66-B/2012, de 31 de dezembro)
Assim, os prazos de prescrição começam a contar no seguinte:
- …….50 a 2003-01-01,2004-01-01 e 2005-01-01.
- ……..70, …….90, …….49, ……..17, …..84 e …..23 a 2006-01-01.
- …..56 a 2005-01-01.
- ……97, ……14 e …..92 a 2007-01-01.
- ……10 e ……61 a 2008-01-01.
- …….47, …….52, ……50, ……34, ……06 e ………03 a 2009-01-01.
- ……57 a 2008-01-01,2009-01-01 e 2010-01-01.
- ……68 a 2008-01-01,2009-01-01 e 2010-01-01.
- …….92,…… 40, …….19,
……27,….. 35 e ……57 a 2010-01-01.
- ……53 e ……30 a 2011-01-01.
- …..20 e …..42 a 2012-01-01.
- …..68, ……18, …..90, …..45, …..21, …..91, …..76, …..45, ……41, …..78 e …..54 a 2013-01-01.
- …….03 e ……80 a 2014-01-01.
Verifiquemos os factos interruptivos nos PEF's.
A citação ocorreu nas seguintes datas
- …….50 Citação postal em 2004-10-15, citação pessoal em 2008-06-05, citação do revertido em 2014-06-10.
- ……70 citação postal em 2005-09-23, citação pessoal em 2008-06-05, citação do revertido em 2014-06-10.
- ……..90 citação postal em 2005-10-24, citação pessoal em 2008-06-05, citação do revertido em 2014-06-10.
- …….49 citação postal em 2005-10-20, citação pessoal em 2008-06-05, citação do revertido em 2014-06-10.
- ……17citação postal em 2007-02-21, citação pessoal em 2008-06-05, citação do revertido em 2014-06-10.
- ........84 citação postal em 2007-02-28, citação pessoal em 2008-06-05, citação do revertido em 2014-06-10.
- ........69 citação postal em 2006-03-27, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........56 citação postal em 2006-11-22, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........23 citação postal em 2007-04-15, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........97 citação postal em 2008-04-12, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........14 citação postal em 2008-02-16, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........92 citação postal em 2008-03-28, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........10 citação postal em 2009-05-23, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........47 citação postal em 2010-02-12, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........52 citação postal em 2010-11-27, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........92 citação postal em 2010-12-27, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........61 citação postal em 2011-11-11, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........50 citação postal em 2011-11-11, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........40 citação postal em 2011-11-11, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........57 citação do revertido em 2014-06-10.
- .........68 citação do revertido em 2014-06-10.
- .........20 citação postal em 2012-08-13, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........53 citação postal em 2012-10-03, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........42 citação postal em 2012-11-22, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........68 citação postal em 2012-11-22, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........30 citação postal em 2012-11-22, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........18 citação postal em 2012-12-31 citação do revertido em 2014-06-10.
- .........90 citação postal em 2013-01-26, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........45 citação postal em 2013-01-28, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........21 citação postal em 2013-02-11, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........91 citação postal em 2013-05-11, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........76 citação postal em 2013-05-11, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........45 citação postal em 2013-06-15, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........41 citação postal em 2013-07-26, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........78 citação postal em 2013-08-18, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........54 citação postal em 2013-09-13, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........03 citação postal em 2013-10-12, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........80 citação postal em 2013-11-18, citação do revertido em 2014-06-10.
- .........34 citação do revertido em 2014-06-10.
- .........06 citação do revertido em 2014-06-10.
- .........03 citação do revertido em 2014-06-10.
- .........19 citação postal em 2014-01-30, citação do revertido em 2014-09-08.
- .........27 citação postal em 2014-01-30, citação do revertido em 2014-09-08.
- .........35 citação postal em 2014-01-30, citação do revertido em 2014-09-08.
- .........57citação postal em 2014-02-28, citação do revertido em 2014-09-08.
Sobre a matéria em análise, importa ainda fazer alusão ao Acórdão do STA - 2a Secção n.° 0895/14 de 18/01/2017, no qual se encontra definidas a seguintes orientações:
I - De acordo com o disposto no art.0 48°, n° 3 da LGT, a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efetuada após o 5.° ano posterior ao da liquidação.
II - Mas, no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5. ° Ano, se ele for citado até ao fim do 8. ° ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele.
III - A aplicação conjugada das regras constantes do disposto nos artigos 48°, n.° 3 e 49°, n.° 3, ambos da LGT, não implica que a interrupção da prescrição só possa ocorrer uma única vez relativamente ao conjunto de todos os devedores, originais, solidários e subsidiários, antes pelo contrário, a citação de cada um deles para o processo de execução constitui uma causa interruptiva própria e singular, que se repercute de forma negativa na sua esfera jurídica, iniciando-se novo prazo apenas nos termos do disposto no artigo 327°, n.° 1 do CC.
Deste modo, a redação da LGT, a interrupção da prescrição decorrente da citação do executado, bem como a decorrente dos demais factos interruptivos previstos no n.° 1 do artigo 49.° da LGT, não apenas inutiliza para a prescrição o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo (Art.0 326°, n.° 1, do Código Civil), como obsta ao inicio da contagem do novo prazo de prescrição (efeito interruptivo) enquanto o processo executivo não findar (Artigo 327.°, n.° 1 do Código Civil).
Tem sido este entendimento na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, a exemplo, acórdão 0823/16 de 05-07-2017, consultável em www.dgsi.pt, após a interrupção por citação, o novo prazo de oito anos só começará a correr de novo quando transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo executivo, nos termos do disposto nos art. 326° e 327°, n° 1 do Código Civil aqui aplicável por força do n° 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário visto que este diploma não contém a definição dos efeitos nem a duração da interrupção.
Ora, não existe decisão de termo dos processos executivos, pois os mesmo mantém-se activos, estendo todos citados, sendo este o facto interruptivo, pelo que se conclui que nenhum processo se encontra prescrito.
Em relação ao revertido, nos PEF's .........50, .........70,
.........90, .........49 , .........17, ........84,
.........23 e .........56, como a citação do revertido como ocorreu após os oito anos da prescrição, estes PEF's deverão ser extinta a reversão contra o revertido.
CONCLUSÕES
Face ao exposto, julgo que nenhum PEF se encontra prescrito por existir o facto interruptivo por citação, o novo prazo de oito anos só começará a correr de novo quando transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo executivo, nos termos do disposto nos art. 326° e 327°, n° 1 do Código Civil aqui aplicável por força do n° 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário visto que este diploma não contém a definição dos efeitos nem a duração da interrupção.
Quanto ao revertido julgo que deverá se extinguir a reversão para este nos PEF's …….50, .........70, .........90, .........49
.........17, ........84, .........23 e .........56, visto que a citação ocorreu após os oito anos da prescrição.
Nos restantes PEF's como a citação do responsável subsidiário foi efectuado até ao fim do 8. ° ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele.
(...)» (cf. «Informação» de fls. 39 a 48 dos autos, que se dá por integralmente reproduzida);

G) Em 2.12.2021, a Chefe de Finanças Adjunta exarou despacho de concordância com a «INFORMAÇÃO» a que se refere a alínea anterior, nos seguintes termos:
«(…)
Concordo
Com os fundamentos constantes da informação, INDEFIRO o pedido por os processos não se encontrarem prescritos face ao disposto nos art. 326° e 327°, n° 1 do Código Civil aqui aplicável por força do n° 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e DEFIRO o pedido em relação à reversão efectuada para os PEF's ……50, .........70, .........90, .........49 .........17, ........84, .........23 e .........56, devendo a mesma ser extinta uma vez que a citação ocorreu após os oito anos da prescrição.
(...)» (cf. despacho exarado na «Informação» de fls. 39 a 48 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);

H) Em data não concretamente apurada, o Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras 2 (Algés) dirigiu ao Requerente o ofício n.° 2898, remetido por correio postal registado sob o n.° RH 6101 5761 9PT, por via do qual comunica o teor do despacho a que se refere a alínea anterior (cf. ofício e talão de registo a fls. 35 e 36 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);

I) Em data não concretamente apurada, o Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras 2 (Algés) dirigiu aos Mandatários do Requerente o ofício n.° 2899, remetido por correio postal registado sob o n.° RH 6101 5762 2PT, por via do qual comunica o teor do despacho a que se refere a alínea G) supra (cf. ofício e talão de registo a fls. 37 e 38 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos);


*

Não se provaram outros factos com relevo para a decisão da causa.

*

A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto baseou-se na análise da prova documental produzida nos autos, concretamente nos documentos juntos com a petição inicial e nos documentos juntos pela AT, que não foram impugnados, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.»

»«

De Direito

Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida declarou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide e fê-lo sustentando, em síntese, que “por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do Requerente não se pode manter, por já ter sido satisfeita”.

Para assim decidir o TAF de Almada alicerçou o seguinte discurso fundamentador:

“(…)

Por via da presente intimação para um comportamento, veio o Requerente peticionar que fosse a Entidade Requerida «condenada não só a pronunciar-se em relação aos pedidos apresentados e formalizados pelo A. como, nesta pronuncia, ser condenada a declarar que os créditos reclamados estão e encontram-se prescritos».

Atendendo ao concreto pedido formulado, poder-se-á, desde logo, afirmar que, por via da presente intimação, o Requerente pretende que a Entidade Requerida seja intimada à adoção de um determinado comportamento, concretamente, «pronunciar-se em relação aos pedidos apresentados e formalizados», reconhecendo que «os créditos reclamados estão e encontram-se prescritos».

Resultando do teor do respetivo articulado inicial que a ausência de resposta aos requerimentos apresentados consubstancia, em si mesma, no entender do Requerente, uma omissão de um dever suscetível de lesar direitos ou interesses legítimos em matéria tributária.

Vejamos.

Determina o artigo 147.° do CPPT, sob a epígrafe «intimação para um comportamento», que, «em caso de omissão, por parte da administração tributária, do dever de qualquer prestação jurídica suscetível de lesar direito ou interesse legítimo em matéria tributária», poderá «o interessado requerer a sua intimação para o cumprimento desse dever» (cf. artigo 147.°, n.° 1 do CPPT), ainda que este meio processual só seja aplicável quando «for o meio mais adequado para assegurar a tutela plena, eficaz e efetiva dos direitos ou interesses em causa» (cf. artigo 147.°, n.° 2 do CPPT).

Como resulta do referido preceito legal, a intimação para um comportamento é o meio processual adequado a compelir a Administração ao cumprimento de um determinado dever, exigindo-se, como seus requisitos cumulativos, por um lado, a omissão de um dever jurídico, por parte da Administração, suscetível de lesar direito ou interesse legítimo em matéria tributária (n.° 1) - pressupondo aquela omissão a prévia definição da existência desse dever - e, por outro, ser este o meio processual mais adequado para assegurar a tutela plena, eficaz e efetiva dos direitos ou interesses em causa (n.° 2).

Assim, a intimação para um comportamento visa reagir contra omissões ilegais do dever de determinadas prestações jurídicas lesivas de direitos ou interesses legítimos em matéria tributária, o que pressupõe, necessariamente, em face da inexistência de fase declarativa deste meio processual, a “evidência do direito” que se invoca como tendo sido lesado pela conduta omitida.

Neste sentido, sublinha JORGE LOPES DE SOUSA que «[a] utilização deste procedimento, visando obter o cumprimento de um dever pela administração tributária, supõe que esteja definida previamente a existência deste, uma vez que, ao contrário do que sucede com a acção administrativa especial para condenação à prática de acto devido, não se inclui no processo de intimação uma fase declarativa», sendo que a «definição da existência de um dever pode resultar directamente da lei, quando se esteja em face de direitos cuja existência não necessite de actos de aplicação ou decorra necessariamente de determinada situação fáctica» (in “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado”, II Volume, Áreas Editora, 6.â ed., 2011, p. 584).

Cumpre, assim, verificar, se se encontra preenchido o primeiro requisito legal para a utilização deste meio processual, isto é, se se pode considerar verificada a omissão, pela Administração Tributária, de um dever jurídico suscetível de lesar direito ou interesse legítimo em matéria tributária.

Dito de outro modo, é necessário apurar a evidência do direito que o Requerente pretende efetivar, isto é, o direito a que sejam apreciados os requerimentos, por si apresentados, com vista ao reconhecimento da prescrição das dívidas.

Para o efeito, importa convocar o disposto no artigo 56.° da LGT, que, sob a epígrafe «princípio da decisão», determina o seguinte:
«1 - A administração tributária está obrigada a pronunciar-se sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados por meio de reclamações, recursos, representações, exposições, queixas ou quaisquer outros meios previstos na lei pelos sujeitos passivos ou quem tiver interesse legítimo.
2 - Não existe dever de decisão quando:
a) A administração tributária se tiver pronunciado há menos de dois anos sobre pedido do mesmo autor com idênticos objeto e fundamentos;
b) Tiver sido ultrapassado o prazo legal de revisão do ato tributário».

Como resulta do referido preceito legal, sobre a Administração Tributária impende não só um "dever de pronúncia" - que obriga a Administração a tomar posição sobre qualquer petição formulada por um interessado no procedimento tributário -, mas, também, um "dever de decisão" - derivado da exigência de conclusão de um qualquer procedimento tributário - (n.° 1), ainda que existam situações em que o dever de pronúncia não implica um dever de decisão (n.° 2).

Sendo que, «desencadeado um procedimento tributário (...) tem a administração tributária o dever de decidir o mesmo (...)» e «não o fazendo, estamos perante a existência de uma omissão por parte da administração tributária, ou seja, omissão da conclusão do procedimento tributário no prazo legal, conclusão que consiste num dever de uma prestação jurídica, sendo tal omissão susceptível de lesar direitos ou interesses legítimos da recorrente, direito a ver decidido o seu pedido no prazo legal, por forma a ver definida a sua situação relativamente ao seu alegado direito (...)» (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 20.10.2009, processo n.2 02338/08, igualmente disponível em www.dgsi.pt).

Tendo presente o que antecede, vejamos o caso em apreço.

Como resulta da factualidade dos autos, o Requerente dirigiu ao Diretor de Finanças de Oeiras-2 (Algés) vários requerimentos por via dos quais solicitou fosse reconhecida a prescrição das dívidas referentes aos processos de execução fiscal aí mencionados (cf. alínea A) a D) do probatório).

Não tendo obtido resposta aos aludidos requerimentos, veio o Requerente requerer a intimação da Entidade Requerida a pronunciar-se sobre o requerido.

Sucede, porém, que, por despacho da Chefe de Finanças Adjunta de 2.12.2021, exarado na Informação elaborada pelo Serviço de Finanças dessa mesma data, foram tais requerimentos apreciados, tendo sido consideradas prescritas as dívidas referentes aos processos de execução fiscal n.° …….50, .........70, .........90, .........49 .........17, ........84, .........23 e …….95 e, em consequência determinada a extinção das execuções fiscais na parte revertida, e não prescritas as dívidas referentes aos demais processos de execução fiscal (cf. alíneas F) e G) do probatório).

Donde, poder-se-á concluir que, na pendência da presente ação, a Administração Tributária, não só se pronunciou, como decidiu, deferindo parcialmente, os pedidos de prescrição das dívidas e que, nessa medida, o Requerente obteve o efeito jurídico que pretendia/poderia obter por via da presente intimação.

Com efeito, o Requerente encontrava-se legitimado a lançar mão deste meio processual - a intimação para um comportamento -, a fim de obter uma decisão sobre o pedido de reconhecimento da prescrição das dívidas em causa (decisão, essa, que poderia ser, ou não, conforme à pretensão formulada).

Não lhe assistindo, porém, o direito a obter, nesta sede, uma decisão (totalmente) favorável à pretensão deduzida, nem podendo o tribunal, através deste meio processual, sindicar o mérito da decisão proferida.

Ou seja, por via da presente intimação, o Requerente apenas poderia obter a intimação da Entidade Requerida para a prolação de uma decisão (expressa) sobre os requerimentos que dirigiu ao Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras-2 (Algés).

Sendo que a procedência do pedido de intimação formulado na petição inicial significaria apenas ser evidente a existência do direito do Requerente à obtenção de uma decisão, não constituindo um qualquer juízo no sentido do deferimento ou indeferimento da concreta pretensão.

Nesta senda, após a prolação do despacho de deferimento parcial dos requerimentos apresentados, a pretensão do Requerente encontra-se satisfeita.

Com efeito, e como supra se referiu, a utilização deste meio processual, previsto como corolário do direito à tutela jurisdicional efetiva, visa compelir a Administração ao cumprimento de um determinado dever, o que pressupõe que esteja previamente definida a existência desse dever, podendo este resultar diretamente da lei ou decorrer de determinada situação fáctica.

Sendo que o pressuposto «dever de prestação jurídica violado», consubstanciado, in casu, na preterição do dever de decisão, plasmado no artigo 56.° da LGT, deixou de se verificar tão logo foi proferida a decisão, até então, omitida, independentemente do seu conteúdo e sentido decisório (cf., neste sentido, acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 29.4.2021, processo n.° 2245/18.8BELRS, disponível em www.dgsi.pt).

Verifica-se, assim, a inutilidade superveniente da presente lide, na medida em que aquilo que o Requerente pretendia/poderia obter, por via da presente intimação para um comportamento, já foi obtido por outro meio, pelo que a decisão a proferir já não terá qualquer efeito útil.

Com efeito, a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide ocorre quando «por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar - além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui por ele já ter sido atingido por outro meio» (cf. JOSÉ LEBRE DE FREITAS E OUTROS, in “Código de Processo Civil Anotado”, volume I, Coimbra Editora, p. 512).” - fim de citação – destacado e sublinhado são nossos

Inconformado o recorrente, J........, SA., vem alegar que a sentença recorrida não fez a boa aplicação do direito competente. – concl. A)

Considera que o conteúdo dos ofícios n.ºs 2898 e 2899, que lhes foram dirigidos (a si e ao seu mandatário) apenas contém a notificação de uma resposta parcial aos referidos requerimentos – concl. H

Advoga que a Autoridade Tributária (AT), não cumpriu o que estava e está legal e imperativamente obrigada, não tendo demonstrado nos autos que o recorrente tenha sido validamente notificado ou citado dentro do respetivo prazo de caducidade e de acordo com o determinado no n.º 5 do artigo 45° da LGT – concl. I)

Mas não tem razão

Na verdade, decorre das conclusões citadas e das subsequentes que a dissidência com o decidido se encontra fundada não na falta de resposta por parte da AT ao solicitado em 29/04/2021 e 20/05/2021, (pontos A) a D) do probatório), mas antes no conteúdo da mesma como claramente resulta da conclusão S), onde o recorrente assume que: “[C]com o presente procedimento veio (…) peticionar que a recorrida fosse e seja condenada “ não só a pronunciar-se em relação aos pedidos apresentados e formalizados pelo A. como, nesta pronuncia, ser condenada a declarar que os créditos reclamados estão e encontram-se prescritos», o que significa que, atendendo ao concreto pedido formulado, poder-se-á, desde logo afirmar que, por via da presente intimação, o recorrente pretende que a recorrida fosse e seja intimada à adoção de um determinado comportamento, concretamente, «pronunciar-se em relação aos pedidos apresentados e formalizados», reconhecendo que «os créditos reclamados estão e encontram-se prescritos»,” – o destacado é nosso

Ora, como sabemos, a intimação para um comportamento encontra o seu abrigo legal no artigo 147.º do CPPT donde decorre que:
“1 - Em caso de omissão, por parte da administração tributária, do dever de qualquer prestação jurídica suscetível de lesar direito ou interesse legítimo em matéria tributária, poderá o interessado requerer a sua intimação para o cumprimento desse dever junto do tribunal tributário competente.
2 - O presente meio só é aplicável quando, vistos os restantes meios contenciosos previstos no presente Código, ele for o meio mais adequado para assegurar a tutela plena, eficaz e efetiva dos direitos ou interesses em causa.
3 - No requerimento dirigido ao tribunal tributário de 1.ª instância deve o requerente identificar a omissão, o direito ou interesse legítimo violado ou lesado ou suscetível de violação ou lesão e o procedimento ou procedimentos a praticar pela administração tributária para os efeitos previstos no n.º 1.
4 - A administração tributária pronunciar-se-á sobre o requerimento do contribuinte no prazo de 15 dias, findos os quais o juiz resolverá, intimando, se for caso disso, a administração tributária a reintegrar o direito, reparar a lesão ou adotar a conduta que se revelar necessária, que poderá incluir a prática de atos administrativos, no prazo que considerar razoável, que não poderá ser inferior a 30 nem superior a 120 dias.
5 – (…)” – o sublinhado é nosso

A este propósito ensina Jorge Lopes de Sousa(1), também citado na sentença recorrida, que “[A]a utilização deste procedimento, visando obter o cumprimento de um dever pela administração tributária, supõe que esteja definida previamente a existência deste, uma vez que, ao contrário do que sucede com a acção administrativa especial para condenação à prática de acto devido, não se inclui no processo de intimação uma fase declarativa. (…).”
Refere ainda o ilustre Conselheiro que “… a primacial utilidade deste meio processual (…) é a de permitir a assegurar de forma muito mais rápida a efectivação de direitos cuja existência é evidente e, nesta medida, é um meio relevante de assegurar a tutela judicial efectiva, que tem como componente importante um factor temporal (art. 20.°, nºs 1 e 4, da CRP).”
E, acrescenta, que
“[S]se não for possível concluir com segurança pela existência do direito ou interesse invocado terá de entender-se que este não é o meio processual adequado para a satisfação da pretensão do requerente, o que obstará à sua utilização, por força do disposto no n.º 2 deste art. 147.°”
Donde se retira que este meio processual não tem como fim a definição da existência de direitos ou interesses em matéria tributária, mas, sim e apenas a de determinar/impor a realização de atos, desde que tais atos e direitos sejam evidentes e legalmente previstos.

Deste modo, se é verdade que, como bem se epilogou no texto recorrido, o impetrante tinha o direito de obter uma resposta por parte da AT ao solicitado nos aludidos requerimentos (direito esse que lhe é conferido, desde logo no n.º 1 do artigo 56.º da LGT e que lhe deveria ter sido concedido no prazo de 8 dias - n.º 2 do artigo 57.º do mesmo diploma legal)(2), também é verdade, que não lhe assiste o direito a obter da entidade a quem se dirige, neste caso da AT, uma decisão favorável à pretensão deduzida.

Do mesmo modo se encontra vedado ao tribunal, neste meio processual a sindicância do mérito da decisão proferida pela entidade administrativa, devendo, para este efeito, o impetrante fazer uso de um meio processual que comporte uma fase declarativa, definidora da respetiva situação jurídica.

Dito isto, importa reter que quanto ao pedido formulado a Administração veio a pronunciar-se após a interposição desta ação (pontos E) e F) do probatório), tendo procedido á verificação da prescrição das dividas exequendas e declarado prescritas apenas aquelas em que considerou que a prescrição se verifica e deu disso conta ao impetrante e é o que basta para dar por satisfeita a pretensão que com este meio processual se visava obter.

Como é obvio, se ao Tribunal vem pedida a intimação para um comportamento consubstanciado na preterição do dever de decisão, esse dever ficou cumprido e a legalidade reempossada por força da prolação, da decisão omitida, independentemente do seu conteúdo, alcance e sentido decisório(3), deixando, assim, sem objeto a presente Intimação.

O que implica a inutilidade superveniente da lide e consequente extinção da instância, nos termos do disposto nos artigos 277.º, al. e) do Código de Processo Civil e 2º.al. e) do Código de Procedimento e Processo Tributário, como, bem concluiu a Mma. Juíza a quo.

Termos em que, sem mais, improcede as conclusões recursivas que vimos de analisar, mantendo-se, nesta parte, a sentença recorrida.

Quanto à condenação em custas.

Neste segmento decisório a sentença concluiu que sendo a demanda fundada “… no momento em que foi requerida a presente intimação para um comportamento, uma vez que a pretensão do Requerente apenas foi satisfeita num momento posterior à propositura da presente ação (28.10.2021) - por via do despacho da Chefe de Finanças Adjunta de 2.12.2021 -, devem as custas ser suportadas pela Entidade Requerida, por lhe ser imputável a inutilidade superveniente da presente lide (cf. artigo 536.°, n.° 3, in fine e n.° 4 do CPC, ex vi do artigo 2.°, alínea e) do CPPT).”

Acrescenta, porém citando jurisprudência firmada, que por não ter deduzido contestação, não é exigível à AT a liquidação de taxa de justiça por atividade processual própria, porque a não teve, apenas lhe é exigível o pagamento das custas, por se ter concluído que a necessidade da intervenção do Tribunal e posterior inutilidade da lide se deveu a facto exclusivo seu.

E culmina com a decisão de condenação da entidade requerida nas custas devidas.

Da argumentação do recorrente, ínsita nas conclusões de A.3 a final do salvatério não se retira nada para além do decidido, requerendo-se, ali afinal que “… devem as custas ser suportadas pela recorrida, por lhe ser imputável a inutilidade superveniente da presente lide (cf. artigo 536.°, n.° 3, in fine e n.° 4 do CPC, ex vi do artigo 2.°, alínea e) do CPPT), sem olvidar que a recorrida não deduziu qualquer oposição.”

Tendo sido essa, como se viu, a decisão recorrida, nada há a apreciar ou decidir, nesta sede, por este Tribunal.

Termos em que, sem mais, improcede in totum o recurso que vimos de apreciar, ao que se provirá na parte do dispositivo deste acórdão.

III - Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais deste Tribunal Administrativo Sul em negar provimento ao recurso mantendo a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 19 de dezembro de 2023



Hélia Gameiro Silva – Relatora
Maria de Lurdes Toscano – 1.º Adjunto
Catarina Almeida e Sousa – 2.ª Ajunta
(Com assinatura digital)

Voto de vencida

Não acompanho o sentido da decisão que obteve vencimento no acórdão.

Do meu ponto de vista, haveria, antes do mais, que equacionar o erro na forma processual.

Com efeito, entendo que a intimação para um comportamento não é o meio próprio no caso, sabido que estamos no âmbito do contencioso relativo à execução fiscal, pelo que se me afigura que a forma de fazer o juiz intervir nos autos era através da reclamação judicial prevista no artigo 276º do CPPT. Isto é assim para quem defenda que é possível reagir contra um ato silente do órgão da execução fiscal ou, diferentemente, ainda que se defenda que, perante o silêncio, deve ser arguida a nulidade perante o órgão da execução fiscal e da decisão deste que não satisfaça a pretensão reclamar judicialmente.

Catarina Almeida e Sousa

(1)In Código de Procedimento e de Processo Tributário – Anotado e Comentado, 6.ª Edição 2011, Vol. II, Áreas Editora, em anotação 3 ao artigo 147 - pag. 584 e 585.
(2)Os atos do procedimento tributário devem ser praticados no prazo de oito dias, salvo disposição legal em sentido contrário
(3)Vide neste sentido o Acórdão deste TCAS proferido em 14/03/2019 no processo n.º 543/18.0BELRA