Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1220/19.0BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:07/13/2023
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO
NOMEAÇÃO DE PATRONO
Sumário:I - O prazo para deduzir oposição à execução fiscal é de 30 dias (cfr. artigo 203.º, n.º 1, alínea a) do CPPT). Este prazo interrompe-se com o pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e inicia-se com a notificação ao patrono da sua designação (cfr. artigos 24.º, n.ºs 4 e 5, da Lei n.º 34/2004, de 20 de Julho).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I - RELATÓRIO

1. C......., LDA, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, proferida em 04/01/2023, que julgou procedente a excepção de caducidade do direito de deduzir Oposição no âmbito do processo de execução fiscal n.º 31......., instaurado pelo serviço de finanças de Sintra – 4 (Queluz), para cobrança coerciva de dívidas provenientes de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) do mês de janeiro de 2014, no valor de € 11.600,23 e, consequentemente, absolveu a Fazenda Pública do pedido.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«I.

O Recorrente apresentou factos novos

II.

Quando os pode apresentar

III.

Quando teve a decisão de um tribunal transitada em julgado

IV.

Não tendo esta culpa da demora da justiça

V.

A recorrente apresentou a ação em 2019, quando foi nomeado defensor

VI.

Ou seja o prazo de caducidade ainda não tinha precludido

VII.

O recorrente esta mais uma vez a ser injustiçado

VIII.

Pois mesmo volvido o prazo a verdade é que não é por culpa do recorre

X.

E é documento é autentico e isso deveria aceite e validado e cessar-se esta injustiça tributária ao cliente

Em face do exposto, formula-se o seguinte

PEDIDO:

Deverá conceder-se provimento ao presente Recurso, julgando procedente o pedido feito e em consequência ser anulado todos atos praticados, incluindo a decisão recorrida e reenviado o processo tribunal superior por forma a que se apure.»

3. A Recorrida, Fazenda Pública, não apresentou contra-alegações.

4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista à Exma. Procuradora–Geral Adjunta, foi apresentado parecer no sentido da improcedência do recurso.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.


*

II – QUESTÕES A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença enferma de erro de julgamento de direito por ter julgado procedente a excepção da caducidade do direito de acção.


*

III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida proferiu a seguinte decisão relativa à matéria de facto:

«a) Em 18.12.2014 a Oponente foi declarada insolvente no âmbito do processo n.º 1609/14.0TBSNT que correu termos no Juízo-2 do Comércio de Sintra, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste (cfr. documento 1 junto com a petição inicial e informação do órgão de execução elaborada nos termos do artigo 208.º do CPPT);

b) Em 30.08.2016 foi instaurado pelo serviço de finanças de Sintra-4, contra a Oponente, o processo de execução fiscal n.º 31....... para cobrança coerciva de dívidas provenientes de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) de janeiro de 2014, no valor de € 11.600,23 (cfr. informação do órgão de execução elaborada nos termos do artigo 208.º do CPPT);

c) Em 21.06.2018, C........, na qualidade de administrador de insolvência da Oponente, recebeu ofício elaborado para efeitos de citação no âmbito do processo fiscal n.º 31....... (cfr. documento junto com a petição inicial, AR RC925119155PT assinado Documentos da PI (352476) Documentos da PI (006111353) Pág. 1 de 26/10/2019 07:57:44 e informação do órgão de execução elaborada nos termos do artigo 208.º do CPPT);

d) Em 20.07.2018 deu entrada nos serviços do Instituto de Segurança Social, I.P. pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, apresentado pela Oponente (cfr. documento junto com a petição inicial, Apoio Judiciário - Documento comprovativo (384538) Apoio Judiciário - Documento comprovativo (006365068) de 30/06/2021 13:44:21);

e) Em 17.05.2019 foi emitido, pelo Instituto de Segurança Social, I.P., ofício elaborado para efeitos de notificação do deferimento de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, o qual foi recebido em 22.05.2019, pela Oponente (cfr. documento junto com a petição inicial, Apoio Judiciário - Documento comprovativo (384538) Apoio Judiciário - Documento comprovativo (006365068) de 30/06/2021 13:44:21 e Documentos da PI (352476) Petição Inicial (006111355) Pág. 21 de 26/10/2019 07:57:44);

f) Em 02.09.2019 foi nomeado patrono da Oponente o Dr. R........, e na mesma data, o Conselho Regional de Lisboa, da Ordem dos Advogados procedeu-se à comunicação dessa nomeação, através de e-mail (cfr. Ofício (408997) Ofício (006561610) de 07/10/2022 08:48:16);

g) Em 19.10.2019, a Oponente apresentou petição inicial subscrita pelo Dr. R........, via fax, junto do órgão de execução fiscal, dirigida a este Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (cfr. Documentos da PI (352476) Petição Inicial (006111355) Pág. 22 de 26/10/2019 07:57:44).

Face à prova produzida inexistem outros factos sobre que o Tribunal se deva pronunciar, já que as demais asserções aduzidas integram, no mais, meras considerações pessoais e conclusões de facto e/ou de direito das partes.

A decisão da matéria de facto assenta na análise dos documentos constantes dos autos e do processo de execução fiscal nomeadamente das informações oficiais, conforme referido a propósito de cada alínea da matéria de facto provada.»


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2. DE DIREITO

A única questão a apreciar e decidir é a de saber se o Tribunal a quo fez correcto julgamento quando julgou caducado o direito de deduzir oposição à execução fiscal.

A Recorrente insurge-se contra a sentença sustentando que o prazo de caducidade não se mostra precludido por a Recorrente ter pedido apoio judiciário e que apresentou acção depois de lhe ter sido nomeado patrono.

A sentença para julgar caducado o direito de acção, ponderou o seguinte:

«Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 203.º do CPPT “A oposição deve ser deduzida no prazo de 30 dias a contar: a) Da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora; b) Da data em que tiver ocorrido o facto superveniente ou do seu conhecimento pelo executado”.

No caso dos autos, a Oponente foi citada no âmbito do processo de execução fiscal n.º 31......., em 21.06.2018, pelo que o prazo de trinta (30) dias para deduzir a Oposição se conta a partir daquela data [cfr. alínea c) supra].

Como resulta do n.º 1 do artigo 103.º da Lei Geral Tributária (LGT), o processo de execução fiscal tem natureza judicial na sua totalidade, pelo que de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 20.º do CPPT, o prazo para deduzir oposição conta-se nos termos do Código de Processo Civil (CPC), o qual, de acordo com o disposto no artigo 138.º do CPC, corre continuamente, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, transferindo-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto.

Retornando ao caso dos autos e como resulta do probatório, a Oponente foi citada para o processo de execução fiscal em 21.06.2018 tendo requerido proteção jurídica na modalidade de nomeação e pagamento da compensação de patrono em 20.07.2018, isto é, antes do decurso do prazo de trinta (30) dias que tinha para apresentar oposição à execução [cfr. alíneas c) e d) supra].

Com relevância para o apuramento da tempestividade da presente ação, temos que relevar o determinado na Lei n.º 34/2004 que alterou o regime de acesso ao direito e aos tribunais e transpõe para a ordem jurídica nacional a Diretiva n.º 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de janeiro.

Nos termos do n.º 4 da referida Lei n.º 34/2004, de 29 de julho “Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo”, determinando ainda o seu n.º 5 que “o prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se, conforme os casos: a) A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação; b) A partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono.

Em conformidade com as normas acima transcritas, importa aferir em que data se deve considerar feita a notificação ao patrono nomeado da sua designação.

Nos termos do artigo 29.º da Portaria n.º 10/2008, de 03 de janeiro, que procedeu à regulamentação da Lei n.º 34/2004, de 29/07, “Todas as notificações, pedidos de nomeação e outras comunicações entre a Ordem dos Advogados e os tribunais, as secretarias ou serviços do Ministério Público, os órgãos de polícia criminal, os profissionais forenses participantes no sistema de acesso ao direito, os serviços da segurança social e o IGFIJ, I.P., devem realizar-se por via eletrónica, através de sistema gerido pela Ordem dos Advogados”.

O Tribunal da Relação de Lisboa, chamado a pronunciar-se sobre tal questão decidiu no acórdão de 16.04.2013, processo n.º 1470/11.7TJLSB.L1 que “A citada Portaria não prevê expressamente em que data é que a notificação electrónica se presume feita, no entanto, o Código de Processo Civil prevê presunções de notificação nos nºs 3 e 5, do art.254º, respectivamente no âmbito da notificação postal e da notificação por transmissão electrónica de dados. (…) No 2º caso, a notificação por transmissão electrónica de dados presume-se feita na data da expedição. Sendo que, em ambos casos, por força do disposto no nº 6, do citado art.254º, as presunções só podem ser ilididas pelo notificado provando que a notificação não foi efectuada ou ocorreu em data posterior à presumida, por razões que lhe não sejam imputáveis. (…)”. Concluindo que “Deste modo, conjugando o disposto nos citados arts.254º, nº5, do C.P.C. e 21º-A, nº5, da Portaria nº114/2008, haverá que presumir que a notificação por transmissão electrónica de dados se tem por feita na data da expedição, ou seja, no 3º dia posterior ao da sua elaboração.” (disponível em http://www.dgsi.pt).

Retornando ao caso dos autos e como resulta do probatório, 02.09.2019 foi remetido, via correio eletrónico ao Dr. R........, signatário da petição inicial, o ofício n.º 6869389-A a comunicar-lhe a nomeação para patrocinar a ora Oponente pelo que o patrono nomeado deverá considerar-se notificado em 05.09.2019

[cfr. alíneas f) e g) supra].

Como tal, a partir desta data dispunha o patrono do prazo de 30 dias (cfr. alínea a) do n.º 1 do artigo 203.º do CPPT) para deduzir Oposição, isto é, até ao dia 04.10.2019, ao qual ainda era aplicável a faculdade prevista no n.º 5 do artigo 139.º e seguintes do CPC, que permite a prática do ato nos três dias úteis posteriores ao seu termo, mediante o pagamento de uma multa, pelo que a presente ação podia ainda ser apresentada até ao dia 09.10.2019 [cfr. alíneas f) e g) supra].

Tendo os presentes autos sido apresentados apenas em 19.10.2019 nessa data já tinha decorrido o prazo que a lei estatui para deduzir Oposição, imperando concluir pela intempestividade dos mesmos [cfr. alíneas f) e g) supra].

Termos em que, se considera procedente a suscitada exceção de caducidade do direito de deduzir Oposição.»

O assim decidido merece a nossa concordância.

O prazo para deduzir oposição à execução fiscal é de 30 dias (cfr. artigo 203.º, n.º 1, alínea a) do CPPT). Este prazo interrompe-se com o pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e inicia-se com a notificação ao patrono da sua designação (cfr. artigos 24.º, n.ºs 4 e 5, da Lei n.º 34/2004, de 20 de Julho).

A Recorrente não impugnou a matéria de facto e nós não vislumbramos razões para oficiosamente, ao abrigo do artigo 662.º do CPC, alterar a decisão sobre a matéria de facto fixada pela sentença recorrida que, assim, se considera assente.

Na verdade, a Oponente/Recorrente não alicerça de forma eficaz o erro de julgamento que imputa à sentença por ter entendido que devendo considerando-se o patrono nomeado em 05/09/2019, dispunha a partir desta data do prazo de 30 dias para deduzir oposição, isto é até ao dia 04/10/2019, e, assim, na data em que a petição inicial foi apresentada - em 19/10/2019 -, já tinha decorrido o prazo para deduzir oposição.

A Recorrente limita-se a invocar que a acção foi apresentada em 2019 depois da nomeação do defensor e daqui concluiu que o prazo de caducidade não se mostrava precludido à data da apresentação da petição inicial e que anda a ser injustiçado.

Analisadas as conclusões em conjugação com a alegação de recurso constata-se que a Recorrente pretende vir discutir a sua “inocência fiscal”, invocando falta de culpa mesmo que volvido o prazo, e refere-se a um documento que só agora pode apresentar sem, contudo, identificar o documento e em que fase o juntou, referindo-se indistintamente a prazo para interposição de recurso e prazo para deduzir acção.

Sempre se dirá que no caso de o documento a que a Recorrente se refere ter sido junto com a petição inicial, não é fundamento para apresentar a petição inicial depois de decorrido o prazo de 30 dias de que dispunha, uma vez que podia e devia ter protestado juntar o documento.

Por outro lado, nunca os documentos juntos com a petição inicial dariam lugar à remessa para o tribunal superior, como parece pretender a Recorrente no ponto 22 da alegação de recurso, nem à sua apreciação, visto que o Tribunal a quo deu como procedente uma excepção que impediu o conhecimento do mérito da oposição.

Não relevando para a apreciação do recurso o entendimento do Ministério Público, nem da Fazenda Pública, por o objecto do recurso ser a decisão judicial.

A Recorrente juntou com a alegação de recurso o parecer dado pelo Ministério Público na primeira instância, que não nos merece qualquer pronuncia, uma vez que a Recorrente limitou-se a proceder à sua junção, sem justificar, nem esclarecer o motivo, sendo que tal parecer consta dos autos e sobre o mesmo teve a Recorrente oportunidade de se pronunciar (cfr. artigo 651.º do CPC).

Concluindo, nenhuma censura merece o modo como a sentença contou o prazo, fixando o seu termo inicial na data em que o Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados comunicou ao Advogado a sua nomeação como patrono (cfr. artigo 24.º, n.ºs 4 e 5 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho e 29.º da Portaria n.º 10/2008, de 3 de Janeiro), e aplicando-lhe as regras de contagem do CPC ex vi artigo 20.º, n.º 2 do CPPT.

Pelo exposto, o recurso não merece provimento, devendo confirmar-se a sentença que julgou verificada a excepção de caducidade do direito de acção.


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Conclusões/Sumário:

I. O prazo para deduzir oposição à execução fiscal é de 30 dias (cfr. artigo 203.º, n.º 1, alínea a) do CPPT). Este prazo interrompe-se com o pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono e inicia-se com a notificação ao patrono da sua designação (cfr. artigos 24.º, n.ºs 4 e 5, da Lei n.º 34/2004, de 20 de Julho).


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em conferência, em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente

Notifique.

Lisboa, 13 de Julho de 2023.


Maria Cardoso - Relatora
Patrícia Manuel Pires – 1.ª Adjunta
Catarina Almeida e Sousa– 2.ª Adjunta

(assinaturas digitais)