Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12357/15
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:09/17/2015
Relator:HELENA CANELAS
Descritores:NACIONALIDADE PORTUGUESA – OPOSIÇÃO – INEXISTÊNCIA DE LIGAÇÃO EFETIVA À COMUNIDADE NACIONAL
Sumário:
I – A Oposição à aquisição de nacionalidade prevista no artigo 9º da Lei da Nacionalidade configura um incidente judicial, sob a forma de oposição, ao processo administrativo de aquisição de nacionalidade, visando-se através dela impedir que o interessado (requerente) obtenha a nacionalidade portuguesa.
II – Os factos integradores das circunstâncias enunciadas nas alíneas a) a d) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade, na sua versão atual, constituem factos impeditivos da aquisição da nacionalidade portuguesa, competindo a sua prova a quem os invoca, nos termos da regra contida no artigo 342º nº 2 do Código Civil.
III – Para que o Tribunal julgue procedente a Oposição à aquisição da nacionalidade com fundamento na alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade tem que concluir pela «inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional».
IV – É ao Ministério Público, a quem cumpre deduzir tal Oposição, que incumbe a alegação de factos concretos integradores de tal fundamento.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO


OPHELIA …………………… (devidamente identificada nos autos), inconformada com a sentença de 09/01/2015 do Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa (Proc. nº 1034/13.0 BELSB) que julgou procedente a Oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa (a que aludem os artigos 9º e 10º da Lei da Nacionalidade e os artigos 56º ss. do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo DL. nº 237-A/2006, de 14, de Dezembro), contra si deduzida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, ordenando em consequência, o arquivamento do processo conducente à concessão da nacionalidade portuguesa, vem dela interpor o presente recurso, pugnando pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que julgue improcedente a Oposição deduzida.

Nas suas alegações formula a recorrente as seguintes conclusões nos seguintes termos:
I. Não pode o tribunal exigir o que a lei deixou de exigir, ou seja, que o menor estrangeiro, filho de nacional português que requeira a aquisição da nacionalidade portuguesa, com fundamento no artº 2º da Lei da Nacionalidade, tenha que fazer prova da ligação efetiva à comunidade nacional.

II. Após a entrada em vigor da Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de abril, deixou de ser exigível aos requerentes da aquisição da nacionalidade por efeito da vontade a apresentação de provas de ligação à comunidade nacional;

III. A prova da inexistência de ligação à comunidade nacional incumbe ao MºPº.

IV. A douta sentença ofende o disposto no artº 9º al. a) da Lei da Nacionalidade.

V. Na linha do acórdão do STA, proferido nos autos com o nº 0103/14, citado na decisão reclamada, os factos dados como provados não são suficientes para concluir que é inexistente a ligação da reclamante à comunidade nacional.

VI. Não pode o Tribunal concluir que pelo fato de a Requerida não ter procedido à junção de outros meios probatórios (que não lhe foram solicitados) não tem ligação efetiva à comunidade portuguesa.

VII. Deve a douta decisão ser revogada, ordenando-se o registo de nascimento da reclamante, como é da melhor Justiça.


O recorrido MINISTÉRIO PÚBLICO veio contra-alegar pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida.
Nas suas contra-alegações formula as seguintes conclusões nos seguintes termos:













Com dispensa de vistos (cfr. artigo 657º nº 4 do CPC novo, ex vi do artigo 140º do CPTA) foram os autos submetidos à Conferência.

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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/ das questões a decidir

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 660º nº 2, 664º, 684º nºs 3 e 4 e 690º do CPC antigo, correspondentes aos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo, aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
No caso em face dos termos em que foram enunciadas pela recorrente as conclusões de recurso, importa a este Tribunal decidir se o Tribunal a quo ao julgar procedente a Oposição à aquisição da nacionalidade incorreu em erro de julgamento, com violação do disposto no artigo 9° alínea a) da Lei da Nacionalidade (Lei nº 37/81, de 3 de Outubro, na redação da Lei nº 2/2006, de 17 de Abril) de modo a que deva ser revogada e substituída por decisão que julgue improcedente a presente Oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa.
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III. FUNDAMENTAÇÃO

A – De facto
O Tribunal a quo deu como provada na sentença recorrida a seguinte factualidade, nos seguintes termos:
A) A Requerida é natural de Bombaim, Índia, onde nasceu em 14.04.1971 (cfr. de fls. 11 dos autos que se dá por reproduzida);

B) Em 03.05.1998, em Bombaím, República da Índia, contraiu casamento com o cidadão português Romeo ………………………, nascido em 16.02.1970, em S.Guirim, Bardez, Goa, República da Índia, cujo nascimento foi registado pelo registo civil português no assento nº ……………….., de 17 de Outubro (cfr. de fls. 40 a 41 ibidem);

C) Em 03.05.2012, foi recebida na Conservatória dos Registos Centrais declaração da Requerida de que pretendia adquirir a nacionalidade portuguesa com base no casamento referido em B)(cfr. de fls. 9 ibidem);

D) Para o efeito declarou que “tem ligação efectiva à comunidade portuguesa” (idem);

E) A Requerida é titular de passaporte canadiano (cfr. de fls. 17 a 19 ibidem);

F) A Requerida e o seu marido são pais de Linus ………………….., nascido em Muscat, Sultanato do Omã, em 04.08.1999, tendo o seu nascimento sido inscrito na Conservatória dos Registos Centrais de Lisboa, pelo assento nº ……………… de 24 de Maio (cfr. de fls. 42 ibidem);

G) A Requerida não tem antecedentes criminais no Sultanato de Omã, na República da Índia, no Canadá e em Portugal (cfr. de fls. 23 e 24, 27 e 66 ibidem);

H) Com base nas referidas declarações foi organizado na Conservatória dos Registos Centrais o processo com o nº Proc.° n° 16391/12, no qual se questionou a existência de facto impeditivo da pretendida aquisição ( cfr. de fls. 97 a 98 ibidem).

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B – De direito

Da decisão recorrida
Pela sentença recorrida de 09/01/2015 do Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa julgou procedente a Oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa (Proc. nº 1034/13.0 BELSB) (a que aludem os artigos 9º e 10º da Lei da Nacionalidade e os artigos 56º ss. do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo DL. nº 237-A/2006, de 14, de Dezembro), deduzida pelo Ministério Público, ordenando em consequência, o arquivo do processo pendente na Conservatória dos Registos Centrais, com vista à concessão da nacionalidade portuguesa à aqui recorrente.
Decisão que tendo por base a matéria de facto que nela foi dada como provada (vertida supra), que não é objeto de impugnação no presente recurso, assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever:
«A Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril, introduziu importantes alterações na Lei nº 37/81, de 3 de Outubro.
Por outro lado, foi, por força do Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro, aprovado o novo Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, sendo revogado o Decreto-Lei nº 322/82 de 12 de Agosto.
Com entrada cm vigor deste diploma, passaram também a vigorar as alterações
introduzidas pela referida Lei Orgânica, ex vi do seu artigo 9º conjugado com o artigo 3º.
No nº 1 do artigo 3º da Lei nº 37/81, prevê-se (redacção que foi mantida pela Lei nº 2/2006) o seguinte: “O estrangeiro casado há mais de três anos com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na constância do matrimónio ”.
Pretende-se com esta solução legal a protecção do interesse da unidade da nacionalidade familiar, que o legislador não impõe mas promove ou facilita sempre que os interessados a queiram requerer. Assim é, na medida em que o facto relevante para a aquisição da nacionalidade não é o casamento mas a declaração de vontade manifestada pelo estrangeiro casado com um português.
Por outro lado, a aquisição da nacionalidade só é possível desde que o Ministério
Público não lhe deduza oposição (ou que, tendo sido deduzida oposição a mesma seja judicialmente considerada improcedente) com algum dos fundamentos previstos no artigo 9º da Lei da Nacionalidade:
“a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional;
b) A condenação, com transito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos, segundo a lei portuguesa;
c) O exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro”.
Pretende-se, deste modo, evitar a aquisição de nacionalidade por indivíduos que não reúnam os requisitos previstos por lei para o efeito e que o casamento não seja usado como um simples meio de penetração de elementos indesejáveis (por terem sido condenados pela prática de crime punível com pena de prisão igual ou superior a três anos pela lei nacional, por exemplo) na comunidade nacional.
No caso em apreço foi deduzida oposição ao pedido de aquisição de nacionalidade formulado pela Requerida nos termos da citada alínea a) do artigo 9º.
Ora, nos termos do art. 57.°, n.ºs 1 e 7.º do actual Regulamento, “quem requeira a aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou por adopção, deve pronunciar -se sobre a existência de ligação efectiva à comunidade nacional e sobre o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo anterior e sempre que o Conservador dos Registos Centrais ou qualquer outra entidade tiver conhecimento de factos susceptíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidade, por efeito da vontade ou por adopção, deve participá-los ao Ministério Público junto do competente tribunal administrativo e fiscal, remetendo-lhe todos os elementos de que dispuser.”
Como se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.12.2006, proc. 7773/06: «Conforme se retira da leitura destes preceitos, antes exigia-se que o interessado comprovasse a sua ligação efectiva à comunidade nacional, sendo fundamento da oposição a “não comprovação” dessa ligação efectiva. Agora, não se faz menção a essa “não comprovação”, mas, tão só, de inexistência de ligação à comunidade nacional, devendo ser feita ao Ministério Público a participação de factos susceptíveis de fundamentarem a oposição. A verdade é que o interessado terá de “pronunciar-se sobre a existência de ligação efectiva à comunidade nacional”, crendo-se que será a partir dessa pronúncia que o Conservador poderá aquilatar da existência/inexistência de ligação à comunidade nacional e, no caso de se indiciar a inexistência, comunicá-la ao Ministério Público para instauração da acção de oposição.
A oposição à aquisição de nacionalidade, no que tange à falta de ligação efectiva à comunidade nacional (que é o que está em causa no presente processo) continua a derivar da existência de um requerimento feito por alguém que pretende adquirir a nacionalidade portuguesa, considerando que lhe assiste esse direito e devendo pronunciar-se sobre a existência daquela ligação. A constatação, face às explicações dadas (a “pronúncia”), que as razões aduzidas serão insuficientes para se concluir pela ligação à comunidade nacional, levará à comunicação ao Ministério Público para a instauração do processo de oposição. […] Sem entrar noutras apreciações sobre a aplicação da lei no tempo, considera-se no que aqui interessa, que a lei não alterou o figurino da oposição à aquisição da nacionalidade como acção de simples apreciação negativa, destinada à demonstração da inexistência de ligação à comunidade nacional, com as consequências daí advindas. Ora, de acordo com o disposto no art. 343.º, nº 1 do C. Civil, nas acções de simples apreciação ou declaração negativa, compete ao réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga.»
A jurisprudência tem vindo, ao longo dos anos, a defender que a ligação efectiva à comunidade nacional há-de ser aferida por todo um conjunto de factores, como o domicílio, a língua, as relações familiares, um conhecimento mínimo da História e da Geografia do Pais, ou seja, de tudo aquilo em que se possa radicar um sentimento de
pertença.
Assim, a ligação efectiva à comunidade nacional não se identifica ou não se basta com a existência de laços familiares com portugueses, sendo algo mais, que pressupõe uma vivência que revela a identificação do indivíduo com a maneira de ser portuguesa, com os seus hábitos, tradições, cultura, história, de molde a poder concluir-se que o interessado se encontra material e espiritualmente integrado no seio dessa comunidade. Impõe-se, pois, uma ligação efectiva, já existente, à comunidade nacional, não bastando uma simples intenção ou possibilidade de a constituir a prazo” (cfr., neste sentido, por todos, Ac. Relação de Lisboa, de 05.12.2006, processo 10635/05-2).
Também no Ac. da Rel. de Lisboa, de 26.09.2001 (in www.dgsi.pt) se alinhou por esse diapasão, ao referir-se que a ligação efectiva à Comunidade Nacional há-de compreender-se “em função de factos relacionados com diversos factores, a saber, e inter alia, o domicílio, a língua, a família, a cultura, as relações de amizade, a integração social e económico-profissional. E tal em ordem a expressar um sentimento de pertença perene à Comunidade Portuguesa.”
Com efeito, decidiu-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.12.2006, proc. 7773/06 o seguinte: «Conforme se retira da leitura destes preceitos, antes exigia-se que o interessado comprovasse a sua ligação efectiva à comunidade nacional, sendo fundamento da oposição a “não comprovação” dessa ligação efectiva. Agora, não se faz menção a essa “não comprovação”, mas, tão só, de inexistência de ligação à comunidade nacional, devendo ser feita ao Ministério Público a participação de factos susceptíveis de fundamentarem a oposição. A verdade é que o interessado terá de “pronunciar-se sobre a existência de ligação efectiva à comunidade nacional”, crendo-se que será a partir dessa pronúncia que o Conservador poderá aquilatar da existência/inexistência de ligação à comunidade nacional e, no caso de se indiciar a inexistência, comunicá-la ao Ministério Público para instauração da acção de oposição.
A oposição à aquisição de nacionalidade, no que tange à falta de ligação efectiva à comunidade nacional (que é o que está em causa no presente processo) continua a derivar da existência de um requerimento feito por alguém que pretende adquirir a nacionalidade portuguesa, considerando que lhe assiste esse direito e devendo pronunciar-se sobre a existência daquela ligação. A constatação, face às explicações dadas (a “pronúncia”), que as razões aduzidas serão insuficientes para se concluir pela ligação à comunidade nacional, levará à comunicação ao Ministério Público para a instauração do processo de oposição. […] Sem entrar noutras apreciações sobre a aplicação da lei no tempo, considera-se no que aqui interessa, que a lei não alterou o figurino da oposição à aquisição da nacionalidade como acção de simples apreciação negativa, destinada à demonstração da inexistência de ligação à comunidade nacional, com as consequências daí advindas.
Ora, de acordo com o disposto no art. 343.º, nº 1 do C. Civil, nas acções de simples apreciação ou declaração negativa, compete ao réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga.»
Ora, face aos elementos constantes dos autos e na ausência de outros, entende-se que se pode concluir pela inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional por parte da Requerida.
Com efeito, a interessada, natural da Índia, declarou ter ligação efectiva à comunidade portuguesa por ser casada com um cidadão português, que nasceu em Goa, República da Índia em 1970 e de um filho, natural de Muscat, Sultanato de Omã, de nacionalidade portuguesa, que só promoveu a inscrição do seu nascimento no Registo Civil Português em 2011, o que é revelador de algum distanciamento da comunidade portuguesa.
E nada mais declarou que permita aferir o que conhece sobre a História, a cultura, os usos e costumes, a música, a culinária, etc., enfim, em que termos se identifica com o que é português, por forma a demonstrar que tem ligação efectiva à comunidade portuguesa.
Não basta, por isso, invocar a existência de um casamento com um cidadão português e de um filho também nacional português, havendo que acrescentar mais declarações, factos que permitam ao Sr. Conservador e, se este invocar fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade e remeter os dados necessários para o efeito ao Ministério Público, a este aquilatar, em função do declarado, da inexistência da ligação efectiva à comunidade portuguesa e instaurar, caso assim conclua, a correspondente acção judicial.
Nesse sentido já pronunciou o Tribunal Central Administrativo Sul, no Acórdão, de
19.11.2009, no processo nº 05367/09 e de 06/11/2014, no processo n.º 11025/14 (in www.dgsi.pt).
Tendo o Ministério Público junto aos autos os documentos que estavam ao seu dispor, impor-se-ia que a Requerida trouxesse ao processo outros elementos que pudessem fundar o direito à aquisição da nacionalidade portuguesa, na sequência do afirmado nas declarações recebidas na Conservatória dos Registos Centrais, o que não aconteceu.
Pois que, dos documentos carreados para os autos pela Requerida, nada se extrai
sobre o que a mesma conhece sobre a identidade histórica, social, cultural, política e gastronómica de Portugal, não se mostrando, por isso, suficientes para servir tal desiderato.
Assim, não há factos nos autos que permitam concluir por um sentimento de pertença, de integração económico-social e de identificação sociológica e cultural à nossa comunidade, exigido, in casu, para que possa ser atribuída a nacionalidade portuguesa.
Em suma: no caso dos autos o acervo factual apurado não é de molde a concluir que entre a Requerida e o nosso país se estabeleceu um laço fundamentador da aquisição da nacionalidade portuguesa nos termos do artigo 3º n.º 1 e 9º, alínea a) da Lei da Nacionalidade.
Deve considerar-se, assim, verificado o fundamento de oposição invocado nos autos.»

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Da tese da recorrente
Pugna a recorrente pela revogação da decisão recorrida, defendendo que a oposição à aquisição de nacionalidade deveria ter sido julgada improcedente, em vez de procedente, como foi.
Sustenta para tanto, nos termos que invoca nas suas alegações de recurso e que reconduz às respetivas conclusões, que o Tribunal a quo incorreu em violação do disposto no artigo 9° alínea a) da Lei da Nacionalidade (Lei nº 37/81, de 3 de Outubro, na redação da Lei nº 2/2006, de 17 de Abril), por, em suma, após a entrada em vigor da Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de abril, ter deixado de ser exigível aos requerente da aquisição da nacionalidade por efeito da vontade a apresentação de provas de ligação à comunidade nacional incumbindo ao Ministério Público a prova da inexistência de ligação à comunidade nacional para que a oposição seja procedente e que na situação dos autos os factos dados como provados não são suficientes para concluir que é inexistente a ligação da reclamante à comunidade nacional, não podendo o Tribunal concluir que pelo facto de a Requerida não ter procedido à junção de outros meios probatórios não tem ligação efetiva à comunidade portuguesa.

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Da análise e apreciação da questão
Tem vindo a ser objeto de dissidiu a questão de saber se na Oposição à aquisição da nacionalidade, fundada na nova redação dada à alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril – “inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional” – é necessário estar demonstrada a inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional ou apenas não estar demonstrada essa ligação efetiva. A qual gera uma outra, umbilicalmente ligada, que é a de saber sobre quem recai o respetivo ónus da prova.
A tese que até agora vinha obtendo maioritariamente vencimento neste Tribunal Central Administrativo Sul entendia que a oposição à aquisição da nacionalidade, fundada na alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade, deve ser qualificada como ação de simples apreciação negativa, por se fundar num fundamento negativo (“inexistência de ligação à comunidade portuguesa”), e que nada se prevendo naquele diploma quanto ao respetivo ónus da prova o mesmo tem que ser encontrado por aplicação das regras gerais, concretamente, do disposto no artigo 343º 1 do Código Civil. Suportando-se tal tese no entendimento de que se justifica que seja atribuído ao réu (requerente da nacionalidade) a “prova dos factos constitutivos do direito que se arroga, dada a dificuldade ou mesmo impossibilidade de provar factos negativos (que, no caso, são também factos pessoais do réu)” e que “este regime de ónus da prova em sede do processo judicial é consentâneo com as exigências de instrução do procedimento administrativo que recaem sobre o requerente do pedido de aquisição da nacionalidade, mormente em face da exigência de “pronúncia” sobre a existência de ligação efetiva à comunidade nacional a qual não pode indiciar a falta dessa ligação, sob pena de recair sobre o Conservador dos Registos Centrais o dever de participar tal facto ao Ministério Público e sobre este o dever de intentar ação de oposição à aquisição de nacionalidade (n.ºs 1, 7 e 8 do artigo 57º do Regulamento da Nacionalidade). Assim, se entendeu, entre outros, nos Acórdãos deste TCA Sul de 06/11/2014, Proc. 11025/14; 20/11/2014, Proc. 10814/14; de 02/04/2014, Proc. 10952/14; de 28/06/2012, Proc. 05214/09; de 02/04/2014, Proc. 10952/14; de 12/03/2015, Proc. 11816/15; de 26/02/2015, Proc. 11791/15, todos in, www.dgsi.pt/jtcas.
Em sentido divergente, entendendo que na ação para oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, incumbe ao Ministério Público o ónus da prova da existência dos factos impeditivos do direito (aquisição da nacionalidade) que o interessado quis fazer valer, pronunciaram-se entre muitos outros os Acórdãos deste TCA Sul de 20/11/2014, Proc. 11590/14; de 10/07/2014, Proc. 11308/14 e de 16/04/2015, Proc. 11964/15, todos in, www.dgsi.pt/jtcas.
Sendo que idêntica posição (de que a «inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional» a que se refere o artigo 9º alínea a) da Lei da Nacionalidade), tem que ser provada pelo Ministério Público, foi tomada pelo Supremo Tribunal Administrativo em sede de recurso de revista, no seu acórdão de 19/06/2014, Proc. 0103/14 (disponível in www.dgsi.pt/jsta). E mais recentemente no seu acórdão de 28/05/2015, Proc. nº 01548/14 (disponível in www.dgsi.pt/jsta), assim sumariado: «I - O efeito da aquisição da nacionalidade não se produz sem mais pela simples verificação do facto constitutivo que a lei refere – a manifestação de vontade do interessado. II - Importa também que ocorra uma condição negativa, ou seja, que não haja sido deduzida pelo Ministério Público ação de oposição à aquisição da nacionalidade ou que, tendo-a sido, ela haja sido considerada judicialmente improcedente. III - Cabe ao MºPº alegar e provar factualidade que demonstre que o requerido não tem uma ligação efetiva, material ou real à nação e sociedade portuguesas (art. 9º da LN), desse modo impedindo que o requerente da aquisição da nacionalidade prossiga no exercício do direito que invoca (art. 3º, nº 1 da LN).» Entendimento que foi reiterado no Acórdão daquele Supremo Tribunal de 18/06/2015, Proc. 01053/14, (disponível in www.dgsi.pt/jsta), assim sumariado: «I – De acordo com a al. a) do artigo 9.º da Lei da Nacionalidade (Lei n.º 37/81, de 03.10, com a redação dada pela LO n.º 2/2006, de 17.04), constitui fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa a inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional. II – Para a procedência da ação de oposição à aquisição de nacionalidade, cabe ao MP alegar e provar factualidade que demonstre que o requerente da nacionalidade não tem qualquer ligação à comunidade portuguesa.».
O Supremo Tribunal Administrativo tem assim recentemente vindo a firmar o entendimento de que para a procedência da oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa é necessário estar demonstrada a inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional. O que já motivou aliás, entretanto, a não admissão de recurso de revista excecional de acórdão deste TCA Sul em que foi seguido tal entendimento (vide o Acórdãos do STA de 25/06/2015, Proc. 0618/15, in, www.dgsi.pt/jsta).
Encontrando-se ainda assim admitidos outros recursos excecionais de revista para aquele Supremo Tribunal para apreciação do problema de saber se para a procedência da oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa é necessário estar demonstrada a «inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional» ou apenas «não estar demonstrada essa ligação efetiva».
Temos para nós, e isso impõe-se desde já evidenciar, que a questão não pode ser resolvida unicamente por apelo às normas substantivas (e procedimentais) constantes da Lei da Nacionalidade e respetivo Regulamento, devendo também convocar-se as normas processuais (adjetivas) a que se encontra sujeita a oposição à aquisição de nacionalidade. De modo que a solução do presente caso não se basta com a tomada de opção por uma ou outra tese.
De qualquer forma antecipe-se desde já que, com o devido respeito por opinião contrária, não subscrevamos o entendimento de que a ação de oposição à aquisição da nacionalidade quando deduzida com fundamento na alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade deva ser qualificada como ação de simples apreciação negativa, nem, concomitantemente, que seja de aplicar a regra (especial) de repartição do ónus da prova prevista no artigo 343º do Código Civil, nos termos do qual “nas ações de simples apreciação ou declaração negativa, compete ao réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga” de modo considerar estar a cargo do requerente da nacionalidade a prova de factos que demonstrem a existência de ligação efetiva à comunidade nacional, tal como já vertemos nas declarações de votos proferidas nos Acórdãos de 06/11/2014, Procs. nº 11283/14 e nº 11025/14 e de 26/02/2015, Proc. nº 11.893/2015 deste TCA Sul, e assumimos nos Acórdãos deste TCA Sul de 28/05/2015, Procs. nº 11.332/14, nº 11.873/15, nº 12.083/15 e nº 12.172/15 de 11/06/2015, Proc. nº 11.790/15 (inéditos), de que fomos relatores.
Eis porquê.
Nos termos do disposto na Lei da Nacionalidade (aprovada pela Lei nº 37/81, de 3 de Outubro) na redação que lhe foi dada pela Lei nº 2/2006, de 17 de Abril, (temporalmente aplicável à situação dos autos) a aquisição da nacionalidade portuguesa pode resultar de uma de três circunstâncias, i) de uma declaração de vontade, ii) da adoção plena e iii) da naturalização (cfr. artigos 3º a 5º), sendo que cada uma dessas formas de aquisição da nacionalidade obedece a requisitos próprios.
No que respeita à aquisição da nacionalidade por declaração de vontade dispõe o artigo 2º da Lei da Nacionalidade, sob a epígrafe “Aquisição por filhos menores ou incapazes” que “os filhos menores ou incapazes de pai ou mãe que adquira a nacionalidade portuguesa podem também adquiri-la, mediante declaração”.
E dispõe o artigo 3º da Lei da Nacionalidade, sob a epígrafe “Aquisição em caso de casamento ou união de facto” que “o estrangeiro casado há mais de três anos com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na constância do matrimónio” (nº 1), não prejudicando a declaração de nulidade ou anulação do casamento a nacionalidade adquirida pelo cônjuge que o contraiu de boa fé (nº 2), e que “o estrangeiro que, à data da declaração, viva em união de facto há mais de três anos com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa, após ação de reconhecimento dessa situação a interpor no tribunal cível” (nº 3).
Em face do assim atualmente disposto a aquisição da nacionalidade em razão da vontade, fundada no casamento há mais de três anos com cidadão nacional depende desde logo de dois pressupostos (positivos): a constância de um casamento por mais de três anos com um cidadão de nacionalidade portuguesa, e a manifestação da vontade de querer ser cidadão português.
Relembre-se que na sua redação original o artigo 3º da Lei da Nacionalidade admitia a aquisição da nacionalidade com base no casamento celebrado com cidadão português sem dependência da duração deste (era assim o então ali disposto: “o estrangeiro casado com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na constância do casamento”).
Tendo sido com a alteração introduzida pela Lei nº 25/94, de 19 de Agosto que passou a exigir-se que o estrangeiro requerente da nacionalidade estivesse casado “há mais de três anos” com cidadão nacional.
Mas a Lei da Nacionalidade prevê no seu Capítulo IV (que integra os seus artigo 9º e 10º), que possa ser deduzida pelo Ministério Público «oposição à aquisição da nacionalidade por efeito da vontade ou da adoção».
O que é feito, nos termos da sua redação atual (que é a resultante da Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril) que é a seguinte:
Artigo 9º
Fundamentos
Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa:
a) A inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional;
b) A condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa;
c) O exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro”.
Artigo 10º
Processo
1 - A oposição é deduzida pelo Ministério Público no prazo de um ano a contar da data do facto de que dependa a aquisição da nacionalidade, em processo a instaurar nos termos do artigo 26.º.
2 - É obrigatória para todas as autoridades a participação ao Ministério Público dos factos a que se refere o artigo anterior.”

Por sua vez o artigo 26º da Lei da Nacionalidade (para que remete o nº 1 do seu artigo 10º) dispõe na sua redação atual (que é a resultante da Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril) o seguinte:
Artigo 26º
Legislação aplicável
Ao contencioso da nacionalidade são aplicáveis, nos termos gerais, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o Código de Processo nos Tribunais Administrativos e demais legislação complementar.

Sendo que na sua redação original (a da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro) este artigo 26º dispunha unicamente, sob a epígrafe “tribunal competente”, que a apreciação dos recursos atinentes ao contencioso da nacionalidade (a que se refere o artigo 25º da Lei da Nacionalidade) “é da competência do Tribunal da Relação de Lisboa”.
O que se compreende, já que no Regulamento da Nacionalidade, aprovado pelo DL. nº 322/82, de 12 de Agosto, se regulava pormenorizadamente no seu Capítulo IV (nos seus artigos 22º a 28º) os termos a seguir na «Oposição à aquisição da nacionalidade por efeito da vontade ou por adoção», cuja respetiva redação original era a seguinte:
Artigo 22º
Todo aquele que requeira registo de aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou por adoção, deve ser ouvido, em auto, acerca da existência de quaisquer factos suscetíveis de fundamentarem a oposição legal a essa aquisição.
2 - Se o conservador dos Registos Centrais tiver conhecimento dos factos a que se refere o número anterior, deve participá-lo ao Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa, remetendo-lhe todos os elementos de que dispuser.”
Artigo 23º
Recebida pelo Ministério Público a participação de quaisquer factos integradores dos fundamentos legais de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, será por ele deduzida oposição no Tribunal da Relação de Lisboa.”
Artigo 24º
1- Apresentada a petição e os documentos que hajam de instruí-la, é o requerido citado para, dentro de 15 dias, contestar, se não houver motivo para indeferimento liminar e a petição estiver em termos de ser recebida.
2 - O requerente pode responder nos 15 dias seguintes à data em que for notificado da apresentação da contestação.”

Artigo 25º
1 - Findos os articulados, é o processo, sem mais, submetido a julgamento, exceto se o relator determinar a realização de quaisquer diligências que tenha por indispensáveis, caso em que o processo será facultado, para alegações, à parte e ao Ministério Público, por 10 dias a cada um.
2 - O julgamento faz-se segundo as regras próprias dos agravos.
3 - Concluindo-se pela procedência da oposição deduzida, será ordenado, no acórdão, o cancelamento do registo de nacionalidade, se tiver sido lavrado.
Artigo 26º
1 - Da decisão do Tribunal da Relação que conheça do mérito da causa cabe recurso de apelação para o Supremo Tribunal de Justiça.
2 - O recurso tem efeito suspensivo e é interposto, expedido e julgado como recurso de revista.
Artigo 27º
A ação de oposição e quaisquer atos e documentos destinados a instruí-la são isentos de selo, emolumentos e custas.”
“Artigo 28º
Em tudo o que se não achar regulado nos artigos anteriores, a ação de oposição rege-se pelas disposições gerais e comuns do Código de Processo Civil; em tudo quanto não estiver prevenido num e noutros, observar-se-á o que se acha estabelecido para o processo ordinário de declaração.”


No que respeita à alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade relembre-se, porque não é inócua, a história do preceito.
Na sua redação original, a da Lei nº 37/81, de 3 de Outubro, referia-se à “manifesta inexistência de qualquer ligação efetiva à comunidade nacional”.
Com as alterações introduzidas pela Lei nº 25/94, de 19 de Agosto, passou a ser a “não comprovação, pelo interessado, de ligação efetiva à comunidade nacional”.
E foi com a Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril que lhe foi dada a redação atual: “a inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional”.

Contemporaneamente com as alterações introduzidas pela Lei nº 25/94, de 19 de Agosto à Lei da Nacionalidade o DL. nº 253/94, de 20 de Outubro alterou a redação do artigo 22º do Regulamento da Nacionalidade, que passou a ser a seguinte:
Artigo 22º
1 - Todo aquele que requeira registo de aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou por adoção, deve:
a) Comprovar por meio documental, testemunhal ou qualquer outro legalmente admissível a ligação efetiva à comunidade nacional;
b) Juntar certificados do registo criminal, passados pelos serviços competentes portugueses e do país de origem;
c) Ser ouvido, em auto, acerca da existência de quaisquer outros factos suscetíveis de fundamentarem a oposição legal a essa aquisição.
2 - O conservador dos Registos Centrais pode, a requerimento do interessado, fundamentado na impossibilidade prática da produção dos documentos a que se refere a alínea b) do número anterior, dispensar a junção deles, desde que não existam indícios de verificação do fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa que esses documentos se destinavam a comprovar.
3 - Se o conservador dos Registos Centrais tiver conhecimento de factos suscetíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, deve participá-lo ao Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa, remetendo-lhe todos os elementos de que dispuser.

Sendo que entretanto, e após as alterações efetuadas pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril à Lei da Nacionalidade o até então vigente Regulamento da Nacionalidade (que havia sido aprovado pelo DL. nº 322/82, de 12 de Agosto), foi revogado pelo DL. nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro (cfr. artigo 3º) que aprovou o novo Regulamento da Nacionalidade, anexo àquele Decreto-Lei.
Sendo que este novo Regulamento da Nacionalidade (aprovado pelo DL. nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro) no seu Título III, Capítulo I, referente à «oposição à aquisição da nacionalidade por efeito da vontade ou da adoção», dispõe nos seus artigos 56º a 60º o seguinte:
Artigo 56º
Fundamento, legitimidade e prazo
1 - O Ministério Público promove nos tribunais administrativos e fiscais a ação judicial para efeito de oposição à aquisição da nacionalidade, por efeito da vontade ou por adoção, no prazo de um ano a contar da data do facto de que depende a aquisição da nacionalidade.
2 - Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou da adoção:
a) A inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional;
b) A condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos, segundo a lei portuguesa;
c) O exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro.
Artigo 57º
Declarações e documentos relativos aos factos
que constituem fundamento de oposição
1 - Quem requeira a aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou por adoção, deve pronunciar-se sobre a existência de ligação efetiva à comunidade nacional e sobre o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo anterior.
2 - Excetua-se do disposto no número anterior a aquisição da nacionalidade por parte de quem a tenha perdido, no domínio do direito anterior, por efeito do casamento ou da aquisição voluntária de nacionalidade estrangeira.
3 - Para efeitos do disposto no n.º 1, o interessado deve:
a) Apresentar certificados do registo criminal, emitidos pelos serviços competentes do país da naturalidade e da nacionalidade, bem como dos países onde tenha tido e tenha residência;
b) Apresentar documentos que comprovem a natureza das funções públicas ou do serviço militar prestados a Estado estrangeiro, sendo caso disso.
4 - A declaração é, ainda, instruída com certificado do registo criminal português sem prejuízo da dispensa da sua apresentação pelo interessado nos termos do n.º 7 do artigo 37.º
5 - O conservador ou o oficial dos registos pode, mediante requerimento do interessado, fundamentado na impossibilidade prática de apresentação dos documentos referidos na alínea a) do n.º 3, dispensar a sua junção, desde que não existam indícios da verificação do fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade, que esses documentos se destinavam a comprovar.
6 - A Conservatória dos Registos Centrais deve solicitar as informações necessárias às entidades referidas no n.º 5 do artigo 27.º, sendo aplicável o disposto nos n.ºs 6 e 7 do mesmo artigo.
7 - Sempre que o conservador dos Registos Centrais ou qualquer outra entidade tiver conhecimento de factos suscetíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidade, por efeito da vontade ou por adoção, deve participá-los ao Ministério Público, junto do competente tribunal administrativo e fiscal, remetendo-lhe todos os elementos de que dispuser.
8 - O Ministério Público deve deduzir oposição nos tribunais administrativos e fiscais quando receba a participação prevista no número anterior.”
Artigo 58º
Tramitação
Apresentada a petição pelo Ministério Público, o réu é citado para contestar, não havendo lugar a mais articulados ou alegações escritas.”
Artigo 59º
Decisão
1 - Findos os articulados, é o processo, sem mais, submetido a julgamento, exceto se o juiz ou relator determinar a realização de quaisquer diligências.
2 - Concluindo-se pela procedência da oposição deduzida, ordena-se o cancelamento do registo da nacionalidade, caso tenha sido lavrado.”

Artigo 60º
Meio processual
Em tudo o que não se achar regulado nos artigos anteriores, a oposição segue os termos da ação administrativa especial, prevista no Código de Processo nos Tribunais Administrativos.”

Assim perscrutados os normativos convocados temos, por um lado que, como se diz no Acórdão do STA de 19/06/2014, Proc. 0103/14, “as apontadas normas visaram, por um lado, promover o valor da unidade familiar e proteger essa unidade e, por outro, dotar o Estado português de mecanismos legais destinados a evitar que cidadãos estrangeiros sem nenhuma ligação afetiva, cultural ou económica a Portugal ou cidadãos tidos por indesejáveis pudessem adquirir a nacionalidade portuguesa”.
E por outro lado, que atualmente, e como se disse no Acórdão de 06/11/2014, Proc. 11025/14, deste TCA Sul (in, www.dgsi.pt/jtcas), “será precisamente com base na «pronúncia», a que alude o artigo 57.º/1 do Regulamento da Nacionalidade, que o Conservador dos Registos Centrais poderá encontrar indícios da inexistência de ligação à comunidade, que poderão justificar a participação ao Ministério Público para que este deduza ação de oposição à aquisição da nacionalidade, nos termos dos n.ºs 7 e 8 do mesmo artigo 57.º”. Daí que “ainda que o interessado não esteja obrigada a comprovar, por meio documental ou outro, a sua ligação efetiva à comunidade nacional (como era exigido pelo anterior Regulamento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322/82, na versão que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 253/94), continua a ser necessário que da «pronúncia» do requerente da nacionalidade não resultem indícios de inexistência de ligação à comunidade nacional, sob pena de, nesse caso, o Conservador dever efetuar a participação acima referida e o Ministério Público dever intentar ação de oposição”.
Mas da contraposição entre as redações que ao longo do tempo foram dadas ao artigo 9º da Lei da Nacionalidade, conjugadas com a concomitante evolução normativa do respetivo Regulamento da Nacionalidade, tem que extrair-se que outra não pode ter sido a intenção do legislador que não fosse a de fazer regressar ao moldes mais permissivos, ou pelo menos facilitadores, da aquisição da nacionalidade pelo casamento com cidadão português, de modo a desonerar o requerente da nacionalidade de demonstrar (provar) possuir ligação efetiva à comunidade nacional, obrigação que lhe cabia nos termos da redação dada pela Lei nº 25/94, de 19 de Agosto à alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade e pelo DL. nº 253/94, de 20 de Outubro ao artigo 22º nº 1 alínea a) do Regulamento da Nacionalidade.
De modo que deixou de ser exigido ao requerente da nacionalidade que comprovasse “por meio documental, testemunhal ou qualquer outro legalmente admissível a ligação efetiva à comunidade nacional” (cfr. artigo 22º nº 1 alínea a) do Regulamento da Nacionalidade), impondo-se-lhe apenas no novo Regulamento da Nacionalidade (aprovado pelo DL. nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro) o “dever pronunciar-se sobre a existência de ligação efetiva à comunidade nacional” (e sobre o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 2 do seu artigo 56º), pronuncia que, como o evidência a epígrafe do artigo, é relativa aos factos que “constituem fundamento de oposição” à aquisição da nacionalidade. – (cfr. artigo 57º nº 1 do Regulamento da Nacionalidade aprovado pelo DL. nº 237-A/2006).
E só quando for do conhecimento do conservador dos Registos Centrais ou qualquer outra entidade a existência de “factos suscetíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidadese impõe a participação desses mesmos factos ao Ministério Público, com remessa dos elementos de que dispuser, para que este deduza a oposição à aquisição da nacionalidadeé o que resulta do disposto nos nºs 7 e 8 do artigo 57º do novo Regulamento da Nacionalidade.
Tem assim que entender-se que só quando perante factos concretos seja de perspetivar que o requerente da nacionalidade não possua ligação efetiva à comunicação nacional é que será de julgar procedente a Oposição à aquisição da nacionalidade fundado na alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade.
E manifestamente essa foi a opção do legislador com as alterações introduzidas à Lei e ao Regulamento da Nacionalidade, pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril e pelo DL. nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro, respetivamente. Colocando assim, (de novo) no lado do Ministério Público o ónus de alegar e provar os factos integradores do fundamento da oposição à aquisição da nacionalidade ali previsto: o da «inexistência de ligação da comunidade nacional» e não o «não estar demonstrada a ligação efetiva», como anteriormente.
Esta é, a nosso ver, a interpretação consentida quer pela sua letra, quer pela história dos normativos em causa, tendo sido esta claramente a intenção do legislador.
Como foi, aliás, entendido no acórdão do STA de 19/06/2014, Proc. 0103/14, já supra referido – a cujos fundamentos também já aderimos nos anteriores acórdãos deste TCA Sul de 28/05/2015, proferidos nos Procs. nº 11.873/15 e nº 12.172/15 e de 11/06/2015, no Proc. nº 11.790/15 (todos inéditos), de que fomos relatores – e que se passam a reproduzir:
De acordo com a redação inicial da Lei 37/81 “o estrangeiro casado com nacional português pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração feita na constância do casamento” (art.º 3.º/1) sendo fundamento de oposição a essa aquisição “a manifesta inexistência de qualquer ligação efetiva à comunidade nacional” [art.º 9.º, al.ª a)]. A jurisprudência posta perante a redação dessas normas, considerou que, tendo em conta os princípios gerais do ónus da prova inscritos no art.º 342.º do CC e tratando-se de factos impeditivos, cabia ao M.P. - na ação a propor a coberto do disposto nos art.ºs 10.º daquela Lei e 56.º do DL 237-A/2006 - provar que o interessado não tinha qualquer ligação a Portugal.
Todavia, o legislador, provavelmente na tentativa de neutralizar os eventuais efeitos negativos decorrentes da facilidade com que se podia adquirir a nacionalidade por ato de vontade, resolveu alterar a redação de tais normas por forma a dificultar essa aquisição pelo que, a partir da entrada em vigor da Lei 25/94, de 19/08, só o estrangeiro casado com nacional português “há mais de três anos” é que podia adquirir a nacionalidade por essa via, passando a ser fundamento de oposição “a não comprovação, pelo interessado, de ligação efetiva à comunidade nacional”. - vd. as novas redações dos citados preceitos – O que significa que a nova redação das apontadas disposições dificultou a aquisição da nacionalidade por ato de vontade na medida em que, por um lado, só a constância do casamento por, pelo menos, três anos dava direito a essa aquisição e, por outro, atribuía ao pretendente da nacionalidade o ónus da prova da sua ligação efetiva a Portugal.
Nesta conformidade, a partir dessa alteração legislativa, ficou claro que cabia ao interessado a obrigação de provar a sua ligação efetiva à comunidade nacional dispensando o M.P. de fazer essa demonstração.

No entanto, o legislador, considerando que o equilíbrio na atribuição da nacionalidade passava por uma previsão de regras que, “garantindo o fator de inclusão que a nacionalidade deve hoje representar em Portugal, não comprometam o rigor e a coerência do sistema, bem como os objetivos gerais da política nacional de imigração, devidamente articulada com os nossos compromissos internacionais e europeus, designadamente os que resultam da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade, que Portugal ratificou em 2000”, resolveu, uma vez mais, alterar a redação da mencionada norma com vista a que no, procedimento de oposição do Estado Português à aquisição da nacionalidade por efeito da vontade, se invertesse “o ónus da prova quanto ao requisito estabelecido na alínea a) do artigo 9.º que passa a caber ao Ministério Público. Regressa-se desse modo ao regime inicial da Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro.” – Exposição de motivos da Proposta de lei n.º 32/X.
E, porque assim, a partir da entrada em vigor da Lei 2/2006 passou a constituir fundamento de oposição à aquisição de nacionalidade “a inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional” (nova redação da al.ª a) do art.º 9.º) a qual tinha de ser provada pelo M.P.

É, pois, claro que à data em que a Recorrente manifestou a sua vontade de adquirir a nacionalidade portuguesa vigorava a nova redação daquele art.º 9.º da Lei 37/81 e que, por força do que nela se dispunha, era ao M.P. que cabia provar que ela não tinha qualquer ligação efetiva à comunidade portuguesa.

Aqui chegados, tem de concluir-se que a Oposição à aquisição de nacionalidade prevista no artigo 9º da Lei da Nacionalidade se configura como um incidente judicial (sob a forma de oposição), ao processo (administrativo) de aquisição de nacionalidade, visando-se através dela impedir que o interessado (requerente) obtenha a nacionalidade portuguesa.
Sendo fundamento de tal oposição a inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional (cfr. alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade). A par da condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei português (cfr. alínea b) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade) e do exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro (cfr. alínea c) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade).
Pelo que são, assim, nos termos da lei, tais circunstâncias (as enunciadas nas alíneas a), b) e c) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade) as únicas que podem servir de fundamento à Oposição à aquisição da nacionalidade, impedindo as mesmas, uma vez verificados, a aquisição de nacionalidade (às quais foi recentemente aditada pela Lei Orgânica nº 8/2015, de 22 de Junho, uma alínea d) àquele artigo 9º, acrescentando como fundamento de oposição à aquisição da nacionalidadea existência de perigo ou ameaça para a segurança ou a defesa nacional, pelo seu envolvimento em atividades relacionadas com a prática do terrorismo, nos termos da respetiva lei.”)
Pelo que os factos integradores de tais circunstâncias constituem factos impeditivos, competindo a sua prova a quem os invoca, nos termos da regra contida no artigo 342º nº 2 do Código Civil. Assim, na esteira do já entendido no Acórdão do STA de 19/06/2014, Proc. 0103/14 e posteriormente no Acórdão do STA de 28/05/2015, Proc. 01548/14, o ónus da prova dos factos integrativos de tal pressuposto («inexistência de ligação da comunidade nacional»), cabe a quem o invoca, no caso o Ministério Público.
E a circunstância de aquele fundamento da oposição integrar uma circunstância negativa («inexistência») não altera a natureza da oposição nem a posição relativa das partes e respetivos ónus.
Importando ainda dizer que não pode confundir-se tal pressuposto (circunstância) negativo, com a alegação (e prova) de factos negativos que o possam integrar. Essa é questão que se colocará num plano diferente.
Será então que foi correto o julgamento de improcedência da oposição feio pelo Tribunal a quo?
É aqui que importa chamar à colação as normas processuais contidas quer no atual Regulamento da Nacionalidade, aprovado pelo DL. nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro (já supra visitadas), quer no que se encontra previsto no Código de Processo nos Tribunais Administrativos para a ação administrativa especial, para que remete o artigo 26º da Lei da Nacionalidade na redação da Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril (ex vi do artigo 10º nº 1) e o artigo 60º do Regulamento da Nacionalidade.
Como já se disse, e se entende, cabe ao Ministério Público invocar, na petição inicial da Oposição à aquisição da nacionalidade, os respetivos fundamentos, incumbindo-lhe alegar os concretos factos que os integram.
No caso foi invocada a verificação do pressuposto de cuja verificação depende a procedência da Oposição à aquisição da nacionalidade fundada na alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade – a “inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional”.
Mas não existe no ordenamento jurídico português presunção legal da ligação efetiva à comunidade nacional, como mera decorrência do casamento com nacional português e da afirmação da sua existência pelo interessado no momento em que declara pretender adquirir a nacionalidade portuguesa. Não contendo a Lei da Nacionalidade, nem o respetivo Regulamento, qualquer normativo que presuma nesse sentido.
Na verdade, e na esteira do já explanado supra, o que decorre da Lei da Nacionalidade, na sua redação atual, conjugada com o respetivo Regulamento, é que o requerente da nacionalidade não precisa de demonstrar aquando do seu pedido, possuir ligação efetiva à comunidade nacional.
Mas tal não permite concluir-se, por presunção legal de que possui tal ligação. Sendo certo que, como se viu esse não é requisito para a obtenção da nacionalidade. Não estabelecendo, assim, concomitantemente, a lei, qualquer presunção nesse sentido.
Ao invés, é fundamento para a negação da concessão da nacionalidade, por procedência do incidente de oposição à aquisição da nacionalidade a que aludem os artigos 10º e 26º da Lei da Nacionalidade, a «inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional» (cfr. alínea a) do artigo 9º).
De modo que, atualmente, a aquisição da nacionalidade em razão da vontade fundada no casamento há mais de três anos com cidadão nacional depende para além dos dois pressupostos positivos, contidos no nº 1 do artigo 3º da Lei da Nacionalidadea constância de um casamento por mais de três anos com um cidadão de nacionalidade portuguesa, e a manifestação da vontade de querer ser cidadão português – da verificação do seguinte pressuposto negativo: não ter sido julgado procedente o incidente judicial de Oposição à aquisição da nacionalidade deduzido com base em algum dos fundamentos previstos nas alíneas a), b), c) ou d) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade. Sentido em que aliás se pronunciou o recente Acórdão do STA de 28/05/2015 já supra citado.
E para que o Tribunal julgue procedente a Oposição à aquisição da nacionalidade com fundamento na alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade tem que concluir pela «inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional».
De modo que como também já se entendeu nos anteriores acórdãos deste TCA Sul de 28/05/2015, proferidos nos Procs. nº 11.873/15 e nº 12.172/15 e de 11/06/2015, no Proc. nº 11.790/15 (todos inéditos), de que fomos relatores, e se havia já defendido nas declarações de voto que vertemos nos Acórdãos de 06/11/2014, Procs. nº 11283/14 e nº 11025/14 e de 26/02/2015, Proc. nº 11.893/2015 deste TCA Sul é ao Ministério Público, a quem cumpre deduzir tal Oposição, que incumbe a alegação de factos concretos integradores de tal fundamento.
Ora na situação dos autos essa alegação factual não foi feita de modo operativo.
Com efeito o Ministério Público para consubstanciar a procedência da presente oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa da requerente com fundamento na alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade o que invocou na sua petição inicial foi que «a Requerida não tem qualquer ligação efetiva ou afetiva à comunidade nacional»; «que nunca cá residiu, viveu ou sequer trabalhou»; que «nunca teve qualquer contacto com a realidade portuguesa, nem através das atividades da comunidade portuguesa na Índia, em Omã e no Canadá, onde está a residir»; que a requerida «não apresentou nenhum documento, nomeadamente de autorização de residência, IRS, boletim de saúde, cartão de contribuinte emitidos pelas autoridades portuguesas ou carimbo de entrada em Portugal no passaporte que indique cá ter estado de passagem» e que «os reconhecimentos notariais dos documentos foram todos efetuados na Índia/Canadá»; que a requerida «nasceu e casou na Índia e ali constituiu família, atualmente reside no Canadá e apesar do seu cônjuge ter a nacionalidade portuguesa por declaração de 17 de Outubro de 2011, não apresentou qualquer documento de que cá resida»; que «todo o processo de crescimento, desenvolvimento e maturação, com a consequente absorção de costumes, referências e valores sociais e culturais se identificam e se integram com a comunidade indicana, eventualmente aculturados pelos valores árabes e/ou canadianos países de acolhimento e não com a portuguesa»; que «nem tão pouco existem indícios que escreva ou fale português, o que implica que desconhece a língua portuguesa, quem são as figuras relevantes da história passada e recente de Portugal, que viva a música e culturas portuguesas conhecendo os seus autores, uma vez que é oriunda de uma país cujos idiomas são o urdo e o inglês»; que «os elementos existentes demonstram sobretudo ligações de índole familiar, obtidas através do casamento com um atual cidadão português e que não são sequer o reflexo da presença de uma vasta comunidade cultural de matriz lusófona»; que «também não demonstram que a R. alguma vez tenha estado ou esteja efetivamente integrada na vida social, cultural e económica portuguesa, ou tenha alguma ideia em que a mesma consiste, ou seja, não provam a sua atual integração na comunidade cultural, social e económica portuguesa». – vide, designadamente, os artigos 8º, 9º, 13º, 14º, 15º, 16º e 17º da Petição Inicial.
Sendo certo que, de todo o modo, citada a requerida apresentou contestação, nela contradizendo a posição defendida pelo Ministério Público, pelo que nem sequer se tem que fazer operar o mecanismo previsto no nº 4 do artigo 83º do CPTA supra referido. E que nem o Ministério Público nem a requerida requereram, com os seus respetivos articulados, a produção de outros meios prova (para além da prova documental que foi junta). Pelo que não antecedeu à sentença qualquer diligência de prova.
Não se retirando, nem tendo que se retirar nos autos, mesmo que oficiosamente, factualidade distinta da que já foi dada como provada pelo Tribunal a quo na sentença recorrida. Nem vindo colocado em crise no presente recurso o julgamento da matéria de facto que nela foi feito pelo Tribunal a quo.
E como é bom de ver da matéria de facto dada como provada (vertida supra) não se pode concluir que a requerente da nacionalidade não possua ligação efetiva à comunidade portuguesa.
É certo que não se demostra que a possua. Mas como já se viu não é requisito para a aquisição da nacionalidade pela vontade fundada no casamento há mais de 3 anos com cidadão português, como é o caso, a existência de ligação efetiva à comunidade nacional.
Não se mostrando-se, por conseguinte, verificado o pressuposto previsto na alínea a) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade (na redação vigente) – inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional – para que proceda a Oposição à aquisição da nacionalidade que com base nela foi deduzida pelo Ministério Público, não podia a oposição proceder, como foi decidido pelo Tribunal a quo na decisão recorrida.
Tendo o Tribunal a quo ao decidir como decidiu na sentença recorrida, incorrido em erro de julgamento, com errada interpretação da alínea c) do artigo 9º da Lei da Nacionalidade tem que conceder-se provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida, julgando-se improcedente a oposição à aquisição de nacionalidade, com as devidas consequências legais.
O que se decide.
**


IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em conceder provimento ao recurso jurisdicional, revogando-se a decisão recorrida, julgando-se improcedente a Oposição à aquisição da nacionalidade, com os devidos efeitos legais.

~
Custas a cargo do recorrido Ministério Público, sem prejuízo da sua isenção – artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), artigo 4º nº 1 alínea a) do RCP e artigo 189º nº 2 do CPTA.
*
Notifique.
D.N.


Lisboa, 17 de Setembro de 2015

______________________________________________________
Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora)



______________________________________________________
António Paulo Esteves Aguiar de Vasconcelos



______________________________________________________
Catarina de Moura Ferreira Ribeiro Gonçalves Jarmela