Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07916/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:12/18/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:SENTENÇA NULA É A QUE ESTÁ INQUINADA POR VÍCIOS DE ACTIVIDADE.
VÍCIOS DE ACTIVIDADE CONTRAPÕEM-SE AOS VÍCIOS DE JULGAMENTO.
EXCESSO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “ULTRA PETITA”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL.
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
PARÂMETROS LEGAIS DA ACTUAÇÃO DA A. FISCAL NO EXERCÍCIO DA SUA COMPETÊNCIA DE FISCALIZAÇÃO.
NATUREZA SUBSTANTIVA E SUBSIDIÁRIA DO MÉTODO DE AVALIAÇÃO INDIRECTA DA MATÉRIA COLECTÁVEL.
DEVER DE CUIDADA FUNDAMENTAÇÃO QUANTO À OPÇÃO PELA SUA UTILIZAÇÃO POR PARTE DA A. FISCAL.
ESPECIFICIDADE DO I.V.A.
ARTº.87, AL.B), DA L.G.TRIBUTÁRIA.
ARTº.88, AL.C), DA L.G.TRIBUTÁRIA.
Sumário:1. A sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso.
2. Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença, além do mais, quando o juiz conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, o excesso de pronúncia pressupõe que o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes. Por outras palavras, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “ultra petita”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido).
3. No processo judicial tributário o vício de excesso de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no último segmento da norma.
4. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
5. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
6. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
7. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
8. A A. Fiscal no exercício da sua competência de fiscalização da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei, actua no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabendo-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação adicional, designadamente, a prova da verificação dos pressupostos que a determinaram à aplicação dos métodos indirectos de avaliação que suportam a liquidação. Mais devendo chamar-se à colação que a Administração Fiscal, no âmbito do procedimento tributário, está sujeita ao princípio do inquisitório (cfr.artº.58, da L.G.T.), o qual é um corolário do dever de imparcialidade que deve nortear a sua actuação. Este dever de imparcialidade reclama que a Fazenda Pública procure trazer ao procedimento todas as provas relativas à situação fáctica em que vai assentar a decisão, mesmo que elas tenham em vista demonstrar factos cuja revelação seja contrária aos interesses patrimoniais da Administração. Mais se deve realçar que o órgão instrutor pode utilizar, para conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento, todos os meios de prova admitidos em direito (cfr.artº.72, da L.G.T.).
9. A avaliação indirecta reveste natureza substantiva, dado que através dela se pode determinar o essencial do facto tributário, isto é, a sua quantificação. Por outro lado, a mesma avaliação indirecta tem carácter subsidiário (cfr.artº.85, nº.1, da L.G.T.), visto que o respectivo regime só se aplica em casos em que exista uma impossibilidade ou uma dificuldade grave em determinar a matéria tributável através da avaliação directa ou objectiva, não se devendo a ela recorrer sem a verificação plena desse requisito. Isto significa que, mesmo quando o sujeito passivo viole os deveres de cooperação, a primeira forma a que se deve recorrer para fixar a matéria colectável é a avaliação directa (v.g.correcções técnicas), mais devendo ser efectuada a devida fundamentação relativamente à inviabilidade desta, antes de se recorrer à avaliação indirecta. Por outras palavras, a Administração Fiscal deve justificar, motivar e comprovar a relação de causa/efeito entre a acção/omissão do contribuinte e a impossibilidade de aplicar o método de avaliação directa (cfr.artº.77, nº.4, da L.G.T.).
10. O recurso ao método de avaliação indirecta só é legalmente possível quando o apuramento da matéria colectável através de correcções técnicas se revele, de todo, impraticável, pois que a fixação da matéria tributável por tais métodos deve revestir a natureza de “ultima ratio fisci” e exigir uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização (cfr.artº.81, nº.1, da L.G. Tributária).
11. Atendendo à especificidade do I.V.A., não pode a A. Fiscal operar alterações à quantificação da base tributável deste imposto, sem que fique demonstrado terem sido praticadas omissões ou inexactidões no registo de compras ou no registo de vendas do sujeito passivo em causa.
12. O artº.87, al.b), da L.G.Tributária, cuja redacção foi estabelecida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12, prevê a possibilidade de avaliação indirecta da matéria tributável quando se verifica a falta dos elementos necessários para comprovar e quantificar directa e exactamente a matéria tributável, pelo que a avaliação directa é impossível. Esta impossibilidade, porém, só pode resultar das anomalias e incorrecções taxativamente indicadas nas várias alíneas do artº.88, da L. G. Tributária (cfr.artº.81, nº.1, da L.G.Tributária). Nestes casos, a avaliação da matéria tributável é feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a Administração Tributária dispuser, de entre os indicados no artº.90, nº.1, do mesmo diploma. Como se constata pelas situações descritas no preceito, o que releva para determinar o impedimento não é uma impossibilidade absoluta de avaliação directa da matéria tributável, mas sim a impossibilidade de tal avaliação no momento em que ela deve ser efectuada (impossibilidade relativa). Já o artº.88, al.c), da L. G. Tributária, consagra um dos casos em que pode ser impossível a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Castelo Branco, exarada a fls.166 a 179 do presente processo, através da qual julgou procedente a presente impugnação tendo por objecto liquidações adicionais de I.V.A. e juros compensatórios, relativas aos anos de 1996, 1997 e 1998 e no montante total de € 12.551,41.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.212 a 225 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-A douta sentença violou os artigos 661/1 do CPC, 668/1 alíneas d) e e) do CPC (actuais artigos 609 e 615 do CPC), e o artigo 125 do CPPT. Violação também pela douta sentença do artigo 51 do CIRC à data vigente, dos artigos 87 alínea b) e 88 alínea c), ambos da LGT, do artigo 90/1 alínea a) da LGT, do artigo 74/1 e 3 da LGT e dos artigos 342/1 e 344/2 do Código Civil, do artigo 668/1 alínea c) e 669/1 alínea a) do CPC (actual artigo 615/1 alínea c) do CPC), violação do princípio da capacidade contributiva manifestada pela impugnante patenteada no relatório de inspecção tributária ora em causa;
2-Não foram concretamente impugnadas, não invocando a impugnante/recorrida qualquer fundamento de ilegalidade, e logo aceites, as correcções à matéria tributável em sede de IVA aos anos de 1996, 1997 e 1998 a seguir identificadas: Ponto III-2.1.2 do relatório de inspecção, (fls. 5 do relatório de inspecção) - tendo sido efectuada uma liquidação adicional de IVA, por correcções meramente aritméticas, ao ano de 1997 no valor de 37,11€ (7.440$00); Ponto V.1 e V.2 do relatório de inspecção, (fls. 6 a 9 do relatório de inspecção) - tendo sido efectuadas liquidações adicionais de IVA, por presunção, para os anos de 1996, 1997 e 1998, respectivamente, nos valores de 702.20€ (140.780$00), 665.36€ (133.394$00) e 806.94€ (161.777$00);
3-Ora, ao não terem sido concretamente impugnadas, e logo aceites, as correcções à matéria tributável em sede de IVA supra evidenciadas, o tribunal "a quo", ao anular a liquidações de IVA/1996, 1997 e 1998 ora em causa (julgando a impugnação totalmente procedente), violou o artigo 661/1 do CPC e o artigo 668/1 alíneas d) e) do CPC (actuais artigos 609 e 615 do CPC), aplicáveis ex vi artigo 2 do CPPT, em virtude de ter condenado a administração fiscal "em quantidade superior" e "em objecto diverso do pedido", e pronunciando-se "sobre questões" que não devia conhecer ou "de que não podia tomar conhecimento" nos termos do artigo 125/1 do CPPT e do artigo 668/1 alínea d) do CPC (actual artigo 615 do CPC), violando também, assim, a douta sentença o princípio da capacidade contributiva;
4-Violação também pela douta sentença do artigo 51 do CIRC à data vigente, dos artigos 87 alínea b) e 88 alínea c), ambos da LGT, do artigo 90/1 alínea a) da LGT, do artigo 74/1 e 3 da LGT e dos artigos 342/1 e 344/2 do Código Civil, do artigo 668/1 alínea c) e 669/1 alínea a) do CPC (actual artigo 615/1 alínea c) do CPC), violação do princípio da capacidade contributiva manifestada pela impugnante patenteada no relatório de inspecção tributária ora em causa;
5-Quanto ao fundamento para aplicação de métodos indirectos, "margens brutas de comercialização reduzidas em relação à amostragem realizada e a suspeita a ele associado de que o sujeito passivo omitiu na declaração valores relativos a prestações de serviços", refere a douta sentença, no sentido de o rebater, que "... o método de amostragem é susceptível de levar ao apuramento de margens que não são as reais. E a este propósito, faz-se notar, que não resulta do relatório de inspecção ou dos seus anexos que no apuramento das margens médias de lucro, por via do método de amostragem, tenha sido ponderado na amostra o peso relativo dos produtos na facturação da impugnante, o que retira consistência aos resultados obtidos.";
6-Conforme relatório de inspecção e evidenciado em sede de alegações, a inspecção tributária, para além de ter ponderado na amostra o peso relativo dos produtos na facturação da impugnante, foi ainda mais longe. Assim, foi tida em conta a mercadoria adquirida discriminada em custos na contabilidade (apenas e só), os valores de custo unitário dos bens vendidos no estabelecimento constantes da contabilidade e os valores de venda unitários constantes dos talões diários de venda e expressos na contabilidade; e foram utilizados na amostragem os artigos mais vendidos e todas as famílias de artigos constantes dos talões de venda - café, cerveja, sumos, licores, bebidas espirituosas e whisky - e para preços de aquisição utilizaram-se os artigos com preço intermédio ou superior para cada artigo (ou seja, não foram utilizados os preços de aquisição dos artigos mais baratos);
7-Tendo ainda sido desconsiderada qualquer oferta recebida pela impugnante fosse a que título fosse, tendo-se tido em conta o desperdício de 10% para apuramento da margem média de lucro bruto, e tendo-se abatido os valores de autoconsumos aos valores declarados como CMVMC, obteve-se o valor do CMVMC (custo das mercadorias vendidas e matérias consumidas) relativo às prestações de serviços efectuadas, sobre o qual foi aplicada a margem de lucro obtida por amostragem para determinação das vendas estimadas para cada exercício;
8-Por outro lado, o Tribunal "a quo" na matéria de facto desconsiderou a análise efectuada às demonstrações financeiras e documentos subjacentes e sobretudo à comparação entre as demonstrações de resultados em que se verificou, com referência aos exercícios em análise, uma evolução positiva no volume de prestações de serviços e que, apesar da evolução verificada, apurou-se que a margem de lucro bruto relativa às mesmas prestações de serviços diminuiu de exercício para exercício, sendo de 133%, 115% e 97%, respectivamente, em 1996, 1997 e 1998, tendo estes valores sido apurados a partir do valor das prestações de serviços e do custo das mercadorias e das matérias consumidas;
9-Mais ainda, desconsiderou o facto de se ter verificado que, apesar do aumento das prestações de serviços, não fora a celebração do contrato de compra exclusiva de mercadorias com a " ................., S.A.", pelo qual a impugnante recebeu a importância de 5.000.000$00, que distribuiu na proporção de 1/3 como proveito nos anos de 1996, 1997 e 1998, a ora impugnante tinha apresentado resultado líquido negativo nos exercícios de 1997 e 1998, demonstrando claramente a omissão de proveitos na contabilidade;
10-Por outro lado ainda, e no concernente ao fundamento não contabilização da totalidade das operações realizadas, nomeadamente a não contabilização das amortizações de capital relativas ao empréstimo bancário constante da contabilidade, foi evidenciado que a não contabilização dos encargos bancários na sua totalidade teve em vista "compor", adulterar o resultado líquido de cada exercício, adulterar a contabilidade, uma vez que, caso fossem contabilizados, o resultado líquido seria ainda menor;
11-Verificou-se ainda, quanto à conta sócios e apesar da diminuição reflectida no balanço, que esta é movimentada várias vezes no decorrer dos exercícios, mas sempre com base em documento interno, sem qualquer documento subjacente ao movimento e sem que seja feita qualquer prova de entrada (depósitos) ou saída (cheques emitidos em nome dos sócios), girando sempre tais valores entre a "conta 11 - caixa" e a "conta 255 - sócios", demonstrando a adulteração das entradas de dinheiro e, desta forma, a evasão fiscal ostensiva perpetrada através da omissão de proveitos;
12-Sendo também de evidenciar que estes factos nunca foram infirmados pela impugnante com qualquer prova documental ou outra, nem os colocou em causa em sede de pedido de revisão da matéria tributável ou em sede de inquirição de testemunhas, momentos processuais em que a impugnante apenas procurou colocar em causa a quantificação da matéria tributável;
13-Ainda, é de referir que para além de cada um dos fundamentos de "per si", a concatenação de todos eles evidencia à saciedade a procura ostensiva de evasão fiscal levada a cabo pela impugnante;
14-No que se refere aos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, eles constam dos autos, tendo sido juntos quer pela impugnante/recorrida, quer pela Fazenda. Sendo relevante o pedido de revisão da matéria tributável e os anexos ao relatório de inspecção tributária como fundamentadores da necessidade inelutável do recurso a métodos indirectos, sendo de importância relevante no sentido de determinar a revogação da douta sentença, como supra evidenciado;
15-Pelo que, com o mais que Vossas Excelências se dignarão suprir, deve ser dado provimento ao recurso e em consequência ser revogada a decisão recorrida.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.236 e 237 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.239 e 240 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.168 a 172 dos autos - numeração nossa):
1-A impugnante dedica-se à actividade de snack-bar/café, CAE - 55 302 (cfr.relatório de inspecção tributária junto a fls.3 a 20 do processo administrativo apenso, em especial fls.3);
2-Em cumprimento da Ordem de Serviço n° ............... de 3/11/1999, durante o ano de 2000 foi efectuada uma acção de inspecção externa à contabilidade da impugnante, em sede de IRS e IVA, incidente sobre os exercícios de 1996, 1997 e 1998, tendo a final sido elaborado o competente relatório de inspecção tributária, constante a fls.3 a 20 do processo administrativo apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
3-No âmbito da mencionada acção de inspecção, e tal como melhor resulta do teor do respectivo relatório final, os serviços de inspecção tributária efectuaram correcções à matéria colectável, em sede de IRC e IVA, com recurso a correcções técnicas e com recurso a métodos indirectos (cfr.relatório de inspecção tributária junto a fls.3 a 20 do processo administrativo apenso);
4-No âmbito daquela acção inspectiva, os serviços de inspecção tributária efectuaram testes por amostragem a diversos artigos vendidos pela impugnante, tendo por base os preços de venda e de aquisição constantes da contabilidade, tendo apurado margens médias de lucro bruto para os exercícios de 1996, 1997 e 1998, respectivamente, de 205%, 214% e 209% (cfr.anexos III, IV e V do relatório de inspecção tributária junto a fls.3 a 20 do processo administrativo apenso, em especial fls.17 a 19);
5-Do Capitulo II do relatório de inspecção tributária, com o subtítulo de "Verificações efectuadas" consta que os serviços de inspecção tributária apuraram que «...a margem de lucro bruto relativa às mesmas prestações de serviço diminui de exercício para exercício, sendo de 133%, 115% e 97%, respectivamente, em 1996, 1997 e 1998.» (cfr.relatório de inspecção tributária junto a fls.3 a 20 do processo administrativo apenso, em especial fls.6);
6-Do relatório final da inspecção tributária consta um capítulo IV, sob o título "Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos" com o seguinte teor:
"(...)
No seguimento do já referido nos pontos do capítulo anterior, somos de indicar que existem indícios fundados de que a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, impossibilitando a comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável em face do seguinte:
- Apuramento de resultados muito reduzidos nos exercícios em análise;
- Margens brutas de comercialização reduzidas em relação à amostragem realizada e variação acentuada de 1996 para 1998;
- Empréstimos elevados de sócios não devidamente comprovados;
- Erros de contabilização da totalidade das operações realizadas, nomeadamente a não contabilização das amortizações de capital relativas ao empréstimo bancário constante da contabilidade;
- Alteração do valor contabilístico da conta bancos, com base em movimentos de regularização anual, de montantes elevados, não devidamente comprovados.
Em face de todos os factos relatados e apurados, somos de considerar que existem indícios fundados de que a contabilidade não reflecte a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, pelo que somos de propor, que a determinação da matéria tributável seja efectuada por avaliação indirecta nos termos do artigo 51 do Código do IRC (CIRC) e artigos 87 e 88 ambos da Lei Geral Tributável (LGT).
(...).
(cfr.relatório de inspecção tributária junto a fls.3 a 20 do processo administrativo apenso, em especial fls.9 e 10);
7-Do mesmo relatório de inspecção tributária consta ainda um Capítulo V, sob o título de "Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos", no qual se pode ler, além do mais o seguinte:
"(...)
1.IRC
Exercícios de 1996, 1997 e 1998
Pelos motivos invocados nos capítulos anteriores, propõe-se que o volume de prestações de serviços dos exercícios em análise, sejam determinados com recurso a métodos indirectos, nos termos do artigo 51° do CIRC e alínea b) do artigo 87° e alínea c) do artigo 88° ambos da LGT aprovada pelo artigo 1° do Dec. Lei n° 398/98 de 17 de Dezembro, com base nos critérios admitidos pela alínea a) do n°1 do artigo 90° da Lei Geral Tributária aprovada pelo artigo 1° do Dec. Lei n° 398/98 de 17 de Dezembro.
Como já foi referido, apurou-se que a margem de lucro tributável declarada é inferior à margem de lucro bruto resultante da amostragem efectuada (anexos III, IV e V).
Na referida amostragem foram utilizados os valores de vendas unitários, constantes dos talões diários de vendas e os valores de custo unitário dos bens vendidos no estabelecimento do sujeito passivo em análise.
O valor proposto como volume de prestação de serviços e o apurado nos termos do parágrafo anterior, corresponde ao valor a acrescer para determinação do matéria tributável, pois admite-se que o sujeito passivo contabilizou a totalidade das aquisições de mercadorias e matérias primas, mas omitiu valores relativos a prestações de serviços, que são de considerar como proveitos nos termos do artigo 20° do CIRC e relevantes para a determinação do resultado tributável de cada exercício.
(…)
2. IVA
Em virtude das correcções propostas para efeitos de IRC no ponto anterior, com recurso a métodos indirectos, resultou imposto em falta para efeitos de IVA, nos termos do n°1 do artigo 84° do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), nos montantes de 383.434$00, 600.970$00 e 871.738$00, com referência respectivamente aos exercícios de 1996, 1997 e 1998 (...)"
(cfr.relatório de inspecção tributária junto a fls.3 a 20 do processo administrativo apenso, em especial fls.10 a 12);
8-A impugnante foi notificada do relatório de inspecção tributária e da fixação de IVA em falta com recurso a métodos indirectos nos valores de 383.434$00, 600.970$00 e 871.738$00, com referência, respectivamente, aos exercícios de 1996, 1997 e 1998, tendo apresentado, em 19/03/2001, pedido de revisão da matéria colectável, ao abrigo do disposto no artigo 91 da LGT (cfr.requerimento junto a fls.22 e seguintes do processo administrativo apenso);
9-Em 4/07/2001 reuniu a Comissão de Revisão, constituída pelos peritos designados pela Fazenda Pública e pelo impugnante, e não tendo sido possível o acordo entre os peritos foram anexados à acta os respectivos pareceres [cfr.acta e pareceres juntos a fls. 77 a 82 do processo administrativo apenso);
10-Por despacho proferido em 4/09/2001, o Director de Finanças da Guarda manteve a fixação da matéria colectável a que se refere o nº.8 (cfr.despacho junto a fls.83 e 84 do processo administrativo apenso);
11-Na sequência do despacho a que se refere o número anterior, foram emitidas as seguintes liquidações:

Liquidação n°
Natureza
Valor Esc.
Período
................Juros Compensatórios-IVA 68.785$00 9606T
.................Juros Compensatórios-IVA 45.933$00 9609T
.................Juros Compensatórios-IVA 39.174$00 9612T
.................Juros Compensatórios-IVA 64.793$00 9703T
.................Juros Compensatórios-IVA 60.492$00 9706T
.................Juros Compensatórios-IVA 56.372$00 9709T
.................Juros Compensatórios-IVA 52.252$00 9712T
.................Juros Compensatórios-IVA 63.649$00 9803T
.............. Juros Compensatórios-IVA 58.036$00 9806T
.............. Juros Compensatórios-IVA 48.658$00 9809T
.............. Liquidação Adicional-IVA 600.970$00 1997
.............. Liquidação Adicional-IVA 383.434$00 1996
............... Liquidação Adicional-IVA 871.738$00 1998
............... Juros Compensatórios-IVA 29.466$00 9812T
...............Juros Compensatórios-IVA 72.579$00 9603T
(cfr.acordo das partes; intróito da petição inicial; artigo 1º. da contestação);
12-A presente impugnação deu entrada Tribunal em 4/06/2003, na sequência de decisão de indeferimento liminar, notificada à impugnante por ofício de 22/05/2003 (cfr.documentos juntos a fls.2 a 4 dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no acordo das partes, nos documentos juntos aos autos e no Processo Administrativo (PA) apenso, conforme discriminado em cada alínea do probatório…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar procedente a presente impugnação tendo por objecto liquidações adicionais de I.V.A. e juros compensatórios derivadas do recurso a métodos indirectos de tributação, relativas aos anos de 1996, 1997 e 1998 e no montante total de € 12.551,41, mais anulando os actos tributários objecto do presente processo (cfr.nº.11 do probatório), tudo devido a falta de fundamentação da aplicação dos ditos métodos indirectos de tributação e consequente existência de vício de violação de lei devido a erro sobre os pressupostos de facto.
X
Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O apelante discorda do decidido aduzindo, em primeiro lugar e conforme supra se alude, que não foram concretamente impugnadas, não invocando a impugnante/recorrida qualquer fundamento de ilegalidade, e logo aceites, a correcção meramente aritmética, em sede de I.V.A., ao ano de 1997 e no valor de 37,11€ (7.440$00). Igualmente as correcções com recurso a métodos indirectos constantes do Ponto V.1 e V.2 do relatório de inspecção, das quais resultaram as liquidações adicionais de I.V.A., por presunção, para os anos de 1996, 1997 e 1998, respectivamente, nos valores de 702.20€ (140.780$00), 665.36€ (133.394$00) e 806.94€ (161.777$00). Que ao não terem sido concretamente impugnadas, e logo aceites, as correcções à matéria tributável em sede de I.V.A. supra evidenciadas, o Tribunal "a quo", ao anular a liquidações de IVA/1996, 1997 e 1998 ora em causa (julgando a impugnação totalmente procedente), violou os artºs.661, nº.1, e 668, nº.1, als.d) e), do C.P.C. (actuais artºs.609 e 615, do CPC), em virtude de ter condenado a Administração Fiscal "em quantidade superior" e "em objecto diverso do pedido", e pronunciando-se "sobre questões" que não devia conhecer ou "de que não podia tomar conhecimento" nos termos do artº.125, nº.1, do C.P.P.T., e do artº.668, nº.1, al.d), do C.P.C. (cfr.conclusões 2 e 3 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo percebemos, um vício de nulidade da sentença recorrida, devido a excesso de pronúncia.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
A sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, o excesso de pronúncia pressupõe que o julgador vai além do conhecimento que lhe foi pedido pelas partes. Por outras palavras, haverá excesso de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “ultra petita”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 143 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690 e seg.; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o excesso de pronúncia (vício de “ultra petita”), como causa de nulidade da sentença, está este previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no último segmento da norma (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 10/3/2011, rec.998/10; ac.S.T.A-2ª.Secção, 15/9/2010, rec.1149/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/1/2012, proc.5265/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc.6817/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6832/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.366 e seg.).
No caso “sub judice”, desde logo, se devem fazer as seguintes constatações:
1-O recorrente chama à colação uma correcção meramente aritmética, em sede de I.V.A., ao ano de 1997 e no valor de 37,11€ (7.440$00), sendo que tal correcção não constitui objecto do presente processo, o qual somente incide sobre as liquidações identificadas no nº.11 do probatório e derivadas da aplicação de métodos indirectos de tributação;
2-Igualmente faz o apelante referência a alegadas liquidações adicionais de I.V.A., por presunção, para os anos de 1996, 1997 e 1998, respectivamente, nos valores de 702.20€ (140.780$00), 665.36€ (133.394$00) e 806.94€ (161.777$00). Ora, tais actos tributários também não constituem objecto do presente processo, não constando as correcções respectivas do relatório da inspecção identificado nos nºs.3 a 7 do probatório, nomeadamente dos Ponto V.1 e V.2 da mesma peça processual.
Efectuadas estas certificações, mais se dirá que do exame da decisão recorrida, facilmente se conclui que o Tribunal "a quo" não excede a análise da causa de pedir formulada pelo impugnante/recorrido (falta de fundamentação da aplicação de métodos indirectos de tributação relativamente às liquidações de I.V.A. identificadas no nº.11 do probatório) e que delimitava o âmbito do conhecimento judicial do objecto dos autos, tanto em relação à matéria de facto, como relativamente ao enquadramento jurídico.
Concluindo, o Mmº. Juiz “a quo” moveu-se dentro dos parâmetros da questão posta ao Tribunal, pelo que a sentença não incorreu em pronúncia excessiva, assim se julgando improcedente este esteio do recurso.
Aduz o apelante, também, que o Tribunal "a quo", na matéria de facto, desconsiderou a análise efectuada às demonstrações financeiras e documentos subjacentes e sobretudo à comparação entre as demonstrações de resultados em que se verificou, com referência aos exercícios em análise, uma evolução positiva no volume de prestações de serviços e que, apesar da evolução verificada, apurou-se que a margem de lucro bruto relativa às mesmas prestações de serviços diminuiu de exercício para exercício, sendo de 133%, 115% e 97%, respectivamente, em 1996, 1997 e 1998, tendo estes valores sido apurados a partir do valor das prestações de serviços e do custo das mercadorias e das matérias consumidas. Que desconsiderou o facto de se ter verificado que, apesar do aumento das prestações de serviços, não fora a celebração do contrato de compra exclusiva de mercadorias com a " ................, S.A.", pelo qual a impugnante recebeu a importância de 5.000.000$00, que distribuiu na proporção de 1/3 como proveito nos anos de 1996, 1997 e 1998, e esta tinha apresentado resultado líquido negativo nos exercícios de 1997 e 1998, demonstrando claramente a omissão de proveitos na contabilidade (cfr.conclusões 8 e 9 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo percebemos, erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181).
Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 10/04/2014, proc.7396/14).
No caso concreto, se bem percebemos, o recorrente defende que o Tribunal "a quo" não terá levado em consideração excertos do relatório de inspecção fundamentadores da opção pelo recurso a métodos indirectos de tributação. Tal alegação não é verdadeira, pois que do exame dos nºs.2 a 7 do probatório se deve chegar à conclusão que foi levado em apreciação, pela decisão recorrida, todo o conteúdo do relatório de inspecção (recorde-se que o mesmo se dá por totalmente reproduzido logo no nº.2 da factualidade provada).
Arrematando, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente também este fundamento do recurso.
Alega, por último e em síntese, o apelante que se verificam os pressupostos de aplicação de métodos indirectos de tributação no caso "sub judice", contrariamente ao que foi decidido pelo Tribunal "a quo". Que a decisão recorrida violou o artº.51, do C.I.R.C., à data vigente, os artºs.87, al.b), e 88, al.c), ambos da L.G.T., o artº.90, nº.1, al.a), da L.G.T., o artº.74, nºs.1 e 3, da L.G.T., e os artºs.342, nº.1, e 344, nº.2, do C. Civil (cfr.conclusões 1, 4 a 7 e 10 a 13 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, supomos, consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal vício.
A A. Fiscal no exercício da sua competência de fiscalização da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei, actua no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabendo-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação adicional. Mais deve chamar-se à colação que a Administração Fiscal, no âmbito do procedimento tributário, está sujeita ao princípio do inquisitório (cfr.artº.58, da L.G.T.), o qual é um corolário do dever de imparcialidade que deve nortear a sua actuação. Este dever de imparcialidade reclama que a Fazenda Pública procure trazer ao procedimento todas as provas relativas à situação fáctica em que vai assentar a decisão, mesmo que elas tenham em vista demonstrar factos cuja revelação seja contrária aos interesses patrimoniais da Administração. Mais se deve realçar que o órgão instrutor pode utilizar, para conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento, todos os meios de prova admitidos em direito (cfr.artº.72, da L.G.T.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/5/2012, proc.2956/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/3/2014, proc.3216/09).
"In casu", examinemos, então, se a A. Fiscal fez prova dos pressupostos para recurso ao método de avaliação indirecta da matéria colectável do impugnante/recorrido, na cédula de I.V.A. e relativamente aos anos de 1996, 1997 e 1998.
A avaliação indirecta reveste natureza substantiva, dado que através dela se pode determinar o essencial do facto tributário, isto é, a sua quantificação. Mais se dirá que a avaliação indirecta tem carácter subsidiário (cfr.artº.85, nº.1, da L.G.T.), visto que o respectivo regime só se aplica em casos em que exista uma impossibilidade ou uma dificuldade grave em determinar a matéria tributável através da avaliação directa ou objectiva, não se devendo a ela recorrer sem a verificação plena desse requisito. Isto significa que, mesmo quando o sujeito passivo viole os deveres de cooperação, a primeira forma a que é mester recorrer para fixar a matéria colectável é a avaliação directa (v.g.correcções técnicas), mais devendo ser efectuada a devida fundamentação relativamente à inviabilidade desta, antes de se recorrer à avaliação indirecta. Por outras palavras, a Administração Fiscal deve justificar, motivar e comprovar a relação de causa/efeito entre a acção/omissão do contribuinte e a impossibilidade de aplicar o método de avaliação directa (cfr.artº.77, nº.4, da L.G.T.; João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um contributo para reequacionar os métodos indirectos de determinação da matéria tributável, Almedina, 2010, pág.201 e seg.).
A tributação por métodos indirectos não só não constitui o meio normal, como a possibilidade do seu uso está restringida aos casos em que a lei expressamente a admite, verificados que estejam determinados pressupostos (cfr.artºs.81, nº.1, 87 e 88, da L.G. Tributária). O que vale por dizer que nem a Fazenda Pública, nem o contribuinte, podem, de seu livre alvedrio, optar pela tributação indiciária, ainda que aquela cuide assim arrecadar receita maior, ou este acredite furtar-se a uma tributação mais pesada. Por outras palavras, o apuramento alternativo pela A. Fiscal deve ser feito, sempre que possível, com recurso a métodos directos ou correcções técnicas, isto é, pela determinação da matéria colectável através dos elementos da própria contabilidade do sujeito passivo, e só pode haver recurso a métodos presuntivos quando aquele apuramento directo se mostre de todo inviável, não gozando a Fazenda Pública de qualquer margem de discricionariedade relativamente à opção do método (directo ou indirecto) de avaliação da matéria tributável. Em suma, o recurso aos métodos indiciários só é legalmente possível quando o apuramento da matéria colectável através de correcções técnicas se revele, de todo, impraticável, pois que a fixação da matéria tributável por tais métodos deve revestir a natureza de “ultima ratio fisci” e exigir uma cuidada fundamentação quanto à opção pela sua utilização (cfr.artº.81, nº.1, da L.G.Tributária; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/2/2006, rec.1011/05; ac.T.C.A.Sul, 15/5/2012, proc.2956/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2014, proc.7546/14; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, 2ª.edição, Lex, 2000, pág.303).
O recurso ao método indirecto está legitimado por força do princípio da capacidade contributiva que só se respeita fielmente quando se mede directamente a matéria tributável e sendo, por isso, uma faculdade da A. Fiscal (cfr.artº.82, nº.2, da L.G.T.) no exercício do seu poder/dever de liquidar impostos quando, comprovadamente, demonstre não poder, por via directa, calcular o rendimento tributável/matéria colectável do sujeito passivo em causa.
As situações em que a matéria colectável é fixada por métodos indirectos são as taxativamente indicadas no actual artº.87, da L. G. Tributária. Subjacente a todas elas encontra-se uma de duas situações: ou a inexistência de elementos de escrituração ou a sua não idoneidade para comprovarem o lucro revelado pela escrita do contribuinte. De notar a preocupação do legislador em objectivar as aludidas situações, por forma a evitar valorações subjectivas por parte da A. Fiscal (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/7/2012, proc.4397/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2014, proc.7546/14).
No que diz respeito ao específico regime do I.V.A., o legislador socorre-se de presunções que estabelecem a prova legal para alguns factos particulares, as quais implicam uma verdadeira inversão do ónus da prova e se explicam pela natureza deste tributo (cfr.v.g.artº.80, do C.I.V.A.; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, 2ª.edição, Lex, 2000, pág.314 e seg.). Por outro lado, atendendo também à especificidade do I.V.A., mais se refere que não pode a A. Fiscal operar alterações à quantificação da base tributável deste imposto, sem que fique demonstrado terem sido praticadas omissões ou inexactidões no registo de compras ou no registo de vendas do sujeito passivo em causa (cfr.ac.S.T.A.-2ª. Secção, 26/11/97, rec.21676, Ap.Dr., 30/3/2001, pág.3108 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/10/98, rec.20568, Ap. Dr., 21/1/2002, pág.2964 e seg.; ac.T.C.A.-2ª.Secção, 16/3/1999, proc.280/97, Antologia de Acórdãos, ano II, nº.2, pág.288 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/3/2014, proc.3216/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2014, proc.7546/14).
Relativamente à possibilidade de recurso à aplicação de métodos indiciários, com vista à determinação da matéria colectável no âmbito do I.V.A., faz-se esta de acordo com os vectores consagrados nos citados artºs.87 e seg. da L.G.Tributária, "ex vi" do artº.84, do C.I.V.A.
Revertendo ao caso dos autos, do probatório se retira que a determinação do resultado tributável do impugnante/recorrido, nos exercícios de 1996, 1997 e 1998, foi efectuada por recurso a métodos indirectos ao abrigo dos vectores constantes dos artºs.87, al.b), e 88, al.c), ambos da Lei Geral Tributária ("ex vi" do artº.84, do C.I.V.A.), tendo como fundamentos os seguintes elementos constatados no exame à contabilidade da sociedade impugnante e ora recorrente (cfr.nº.6 do probatório):
- Apuramento de resultados muito reduzidos nos exercícios em análise;
- Margens brutas de comercialização reduzidas em relação à amostragem realizada e variação acentuada de 1996 para 1998;
- Empréstimos elevados de sócios não devidamente comprovados;
- Erros de contabilização da totalidade das operações realizadas, nomeadamente a não contabilização das amortizações de capital relativas ao empréstimo bancário constante da contabilidade;
- Alteração do valor contabilístico da conta bancos, com base em movimentos de regularização anual, de montantes elevados, não devidamente comprovados.
O artº.87, al.b), da L.G.Tributária, prevê a possibilidade de avaliação indirecta da matéria tributável quando se verifica a falta dos elementos necessários para comprovar e quantificar directa e exactamente a matéria tributável, pelo que a avaliação directa é impossível. Esta impossibilidade, porém, só pode resultar das anomalias e incorrecções taxativamente indicadas nas várias alíneas do artº.88, da L. G. Tributária (cfr.artº.81, nº.1, da L.G.Tributária). Nestes casos, a avaliação da matéria tributável é feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a Administração Tributária dispuser, de entre os indicados no artº.90, nº.1, do mesmo diploma. Como se constata pelas situações descritas no preceito, o que releva para determinar o impedimento não é uma impossibilidade absoluta de avaliação directa da matéria tributável, mas sim a impossibilidade de tal avaliação no momento em que ela deve ser efectuada (impossibilidade relativa). Já o artº.88, al.c), da L. G. Tributária, consagra um dos casos em que pode ser impossível a comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Encontro da Escrita, 4ª. edição, 2012, págs.757 e seg.; João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um contributo para reequacionar os métodos indirectos de determinação da matéria tributável, Almedina, 2010, pág.247 e seg.).
"In casu", entende o recorrente que a Administração Tributária, no exercício da sua competência de fiscalização, cumpriu o ónus de demonstrar a existência de todos os pressupostos do recurso necessário à avaliação indirecta, conforme disposto no artº.74, nº.3, da L.G.T.
O Tribunal "a quo" julgou em sentido contrário, concluindo pela não verificação dos pressupostos do recurso a métodos indirectos de tributação.
Vejamos quem tem razão.
Impõe-se, portanto, indagar se os identificados vectores são adequados e suficientes para justificar a tributação por métodos indirectos.
Quanto ao vector referido em primeiro lugar "apuramento de resultados muito reduzidos nos exercícios", não consubstancia o mesmo uma anomalia ou incorrecção da contabilidade, não se integrando em nenhumas das hipóteses de violação do dever de colaboração do sujeito passivo para com a A. Fiscal previstas no artº.88, da L.G.T., não constituindo um indício fundado que inviabilize o apuramento da matéria tributável através da quantificação directa e exacta da matéria tributável.
Passando ao segundo fundamento, "margens brutas de comercialização reduzidas em relação à amostragem realizada e variação acentuada de 1996 para 1998", a Fazenda Pública associa ao mesmo a suspeita de que o sujeito passivo omitiu na declaração valores relativos a prestações de serviços. Embora os serviços de inspecção tributária tenham concluído, igualmente, que o sujeito passivo contabilizou a totalidade das aquisições de mercadorias e matérias-primas. Foi com base neste fundamento que foram aplicados métodos indirectos, de cuja aplicação resultou o apuramento do I.V.A. em falta correspondente às vendas, presumidamente, omitidas.
Todavia, na nossa perspectiva, o facto de a contabilidade revelar margens de lucro reduzidas em relação à amostragem realizada pelos serviços de inspecção tributária não constitui, por si só, um indício suficientemente sólido e seguro que permita concluir que as vendas declaradas e registadas na contabilidade não reflectem a exacta situação contabilística concreta e real do sujeito passivo. É que o método de amostragem é susceptível de levar ao apuramento de margens que não são as reais. E a este propósito, faz-se notar, que não resulta do relatório de inspecção ou dos seus anexos que no apuramento das margens médias de lucro, por via do método de amostragem, tenha sido ponderado na amostra o peso relativo dos produtos na facturação da impugnante/ recorrida, o que retira consistência aos resultados obtidos. Por outras palavras, a A. Fiscal tinha que apurar outras irregularidades da escrita contabilística do sujeito passivo, as quais complementassem esses (possíveis) indícios, nomeadamente, a análise dos inventários ou as facturas de compras dos fornecedores, por exemplo, donde se pudesse concluir com um grau de certeza avançado, a existência de erros, omissões ou inexactidões na contabilidade, cuja prova lhe cabia efectuar (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 21/11/2006, proc.1327/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/5/2012, proc.2956/09).
Passando ao vector "empréstimos elevados de sócios não devidamente comprovados", à parte o seu carácter conclusivo, não releva para efeitos de determinação da matéria tributável, sendo completamente inócuo para descredibilizar a contabilidade e os resultados declarados, pelo que inadequado para justificar a tributação por métodos indirectos, igualmente não se enquadrando no citado artº.88, da L.G.T.
Quanto ao fundamento "erros de contabilização da totalidade das operações realizadas, nomeadamente a não contabilização das amortizações de capital relativas ao empréstimo bancário constante da contabilidade", apesar do seu carácter conclusivo (mais uma vez), estamos, claramente, perante vector passível de fazer operar correcções técnicas no âmbito da avaliação directa da matéria tributável do sujeito passivo.
Por último, o alicerce "alteração do valor contabilístico da conta bancos, com base em movimentos de regularização anual, de montantes elevados, não devidamente comprovados", também não consubstancia uma anomalia ou incorrecção da contabilidade, não se integrando em nenhumas das hipóteses de violação do dever de colaboração do sujeito passivo para com a A. Fiscal previstas no artº.88, da L.G.T.
Assim sendo, concluímos, com o Tribunal "a quo", que a verificação de margens brutas de comercialização reduzidas em relação à amostragem, desacompanhada da demonstração de erros ou irregularidades da contabilidade, não é susceptível de afastar a presunção de veracidade de que beneficia a contabilidade da sociedade recorrida e de legitimar a aplicação de métodos indirectos.
Por consequência se impõe concluir que, no caso vertente, não se encontravam verificados os necessários pressupostos legais para que a A. Fiscal lançasse mão da metodologia indirecta com base na factualidade constante do probatório e supra compilada.
Por último, não vislumbra este Tribunal que a decisão recorrida tenha violado o disposto no artº.51, do C.I.R.C., à data vigente, nos artºs.87, al.b), e 88, al.c), ambos da L.G.T., no artº.90, nº.1, al.a), da L.G.T., no artº.74, nºs.1 e 3, da L.G.T., e nos artºs.342, nº.1, e 344, nº.2, ambos do C.Civil, sendo que o recorrente igualmente não consubstancia tais violações.
Pelo que, sem mais delongas, se julga improcedente também este fundamento do recurso.
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 18 de Dezembro de 2014



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)