Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2139/18.7BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:07/02/2020
Relator:PEDRO NUNO FIGUEIREDO
Descritores:PRINCÍPIO DA ADMINISTRAÇÃO ABERTA
RESTRIÇÃO DE ACESSO A DOCUMENTO
SEGREDO COMERCIAL
Sumário:I. Decorre do princípio da administração aberta, plasmado no artigo 268.º da CRP, e do artigo 6.º, n.º 6, da LADA, que a restrição de acesso a documento que contenha dados sujeitos a segredo comercial não assume um carácter absoluto.
II. Caso o terceiro demonstre interesse direto, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido no acesso, impõe-se ponderação, no quadro do princípio da proporcionalidade, de todos os direitos fundamentais em presença e do princípio da administração aberta, que justifique o acesso à informação.
III. Estando em causa a descrição das características de um produto inovador, criado pela empresa contrainteressada, que lhe proporciona uma vantagem face à concorrência, bem como elementos relativos à sua estratégia de diferenciação concorrencial, respeitantes à vida interna da empresa, o prejuízo que para aquela pode resultar em tal divulgação sobrepõe-se ao direito de acesso por parte de empresa concorrente.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul
I. RELATÓRIO
R….. – Sucursal em Portugal instaurou ação de intimação para a consulta de procedimento contra Compete 2020, indicando como contrainteressada D….. Lda, requerendo a intimação da requerida a facultar a consulta do procedimento de concessão de fundos comunitários à contrainteressada, dando-lhe acesso a peças que permitam conhecer a natureza do incentivo e o caráter inovador da draga, com fixação de sanção pecuniária compulsória se não for cumprida a decisão.
Por sentença de 16/01/2019, o TAC de Lisboa julgou a ação procedente e intimou a entidade demandada a permitir à autora a consulta do processo em causa, expurgado da informação relativa à matéria reservada.
Em 27/02/2019, a autora requereu a aplicação de sanção pecuniária compulsória contra os obrigados a dar execução à decisão transitada em julgado.
Por decisão de 15/05/2019, o TAC de Lisboa concluiu existir justificação aceitável para a não aplicação imediata de sanção pecuniária compulsória, perante a execução parcial do julgado, e concedeu à entidade demandada o prazo de 10 dias para apresentar à autora a fundamentação para cada um dos elementos truncados, sob pena de se vir a decidir pela aplicação da dita sanção.
Em 07/06/2019, a entidade demandada apresentou nova fundamentação.
Em 17/06/2019, a autora requereu a aplicação de sanções pecuniárias compulsórias até à permissão de consulta do processo.
Por decisão de 16/07/2019, o TAC de Lisboa concluiu que o acesso parcial aos documentos com a nova fundamentação traduz o cumprimento do julgado.
A autora interpôs recurso, ao qual foi concedido provimento por acórdão deste TCAS de 21/11/2019, anulando aquela decisão e determinando a baixa dos autos para instrução adicional.
Por decisão de 29/01/2020, o TAC de Lisboa concluiu pelo cumprimento da sentença judicial de 16/01/2019, bem como da decisão de 15/05/2019.
Inconformada, a autora interpôs o presente recurso desta decisão, pugnando pela respetiva revogação, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“I- A recorrente é concorrente da D….., LDA, empresa que recebe/recebeu subsídios concedidos pela demandada e foi-lhe reconhecido interesse legitimo na consulta do processo daquela candidatura.
II- Segundo o anúncio do projecto o seu fundamento é a inovação e consiste na construção de draga com a seguinte performance: a) capacidade para transportar 1000m3 de sedimentos cada vez; b) dragar com menos impacto ambiental;
III- A recorrente, que se debate no mercado com concorrente que é apoiado por fundos comunitários que podem tornar-se não reembolsáveis, pretende conhecer o processo de atribuição de subsídios para perceber se o mesmo cumpre a lei e se não é fonte de concorrência desleal.
IV- A consulta foi negada pelo COMPETE 2020 alegando que o processo continha segredos comerciais.
V- O anúncio torna claro que existe uma candidatura, mas é insuficiente para que os pressupostos do processo sejam conhecidos.
VI- O projecto não é secreto, já que o invocado carácter inovador terá que estar à vista de todos.
VII- A recorrente instaurou o presente processo com vista a assegurar a consulta tendo o seu pedido merecido a oposição da demandada e da D….., LDA.
VIII- Apesar dos argumentos apresentados o tribunal decidiu que o processo deveria ser consultado mas que seria truncada a informação considerada sigilosa:”…. «os aspectos particulares de financiamento, as previsões de viabilidade e de rendibilidade específicas de uma empresa (privada), as estratégias de captação de clientes ou de desenvolvimento futuro, a identificação de modelos ou de técnicas a seguir no desenvolvimento da actividade ” (cfr. Parecer da CADA nº 38/2005)”
IX- Foi ainda decidido que a demanda deveria fundamentar concretamente toda e qualquer expressão que fosse truncada.
X- Marcada a consulta do processo para o dia 18 de Fevereiro de 2019, a recorrente deparou-se com processo no estado documentado nos autos e sem fundamentação que cumprisse o determinado na sentença.
XI- Na prática a consulta foi impedida, razão pela qual foi requerido nos próprios autos que a decisão fosse executada
XII- A demanda e a contrainteressada pronunciaram-se com a particularidade do COMPETE 2020 ter apresentado email trocado com a I….. empresa relacionada com a D…...
XIII- A demandada elaborou documento que enviou ao signatário e onde identifica cada uma das folhas truncadas, fazendo afirmações genéricas, conclusivas e que são o desdobramento da primeira das fundamentações apresentadas, mas agora com outro aspecto gráfico.
XIV- A demandada manteve as escolhas da contrainteressada ou da I….. e desdobrou folha por folha a justificação apresentada em 18 de fevereiro.
XV- Refira-se que em cada folha há mais do que uma informação pelo que difícil se torna de perceber a que parte do texto truncado se destina a fundamentação, o que contribui para a sua obscuridade, ambiguidade e ininteligibilidade.
XVI- A recorrente reagiu alegando ainda que da leitura das folhas se percebe que determinadas frases truncadas se referiam a concorrentes, a características visíveis da draga e nunca a projectos ou modelos usados pela empresa.
XVII- A recorrente pediu que o Tribunal acedesse ao documento sem rasuras para verificar a adequação da fundamentação, para perceber se essa fundamentação se ajustava ao que foi truncado, medida que o tribunal ignorou, o que deu origem a recurso e ao ACORDÃO proferido em 21-11-2019.
XVIII- Em cumprimento do douto Acórdão, o tribunal de primeira instância, teve acesso ao processo sem rasuras podendo confirmar que escondiam alguma informação não enquadrável na definição de segredo comercial indicada na sentença; apesar disso o tribunal considerou que a demanda fundamentou adequadamente, razão pela qual se justifica este novo recurso.
XIX- O tribunal com base nos documentos que teve ao seu dispor, deveria considerar provados os seguintes factos:
A)- As folhas 10, 14, 19, 21, 22, 23, 24, 34 (parte), 35 (parte), 38, 39, 40, 41 (parte), 42 (parte), 46, 47, 48, 59, 61, 63, 69, 75, 77, 78, 81, 82, 89, 91, 93, 95, 96, 97, 99, 100, 101 e 102 não contém dados relativos à vida interna da empresa, pelo menos em parte, e contêm dados relativos aos concorrentes e características da draga que devem ser publicitadas.
B)- As folhas 11, 12, 13, 15, 16, 17, 18, 20, 25, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34 (parte), 35 (parte), 36, 37 e 41 (parte), 42 (parte), 44, 52 e 54 foram rasuradas nas partes que devem ser dadas a conhecer a terceiros.
C)A folha 25 do procedimento não tem rasuras quanto a dados pessoais, mas sim quando a afirmações acerca do concorrente, facto que fica comprovado com a simples leitura do que está visível (linha 11 do segundo quadro: “as melhorias significativas relativamente aos serviços prestados pela concorrência englobam: xxxx”)
D)Nas folhas 10, 14, 21, 22, 25, 78, 92 e 95 há referência a concorrentes, assim como nas folhas 36, 37, 41, 42, 44, 52 e 54 e isso resulta da leitura dessas folhas, pelo que o que é dito a propósito dos concorrentes deve ser lido pela autora.
E)Folhas 41 e 42 contém informações sobre a performance da draga e que não é informação sigilosa, já que não há performance sem se ver o que faz o equipamento.
F)Folhas 69 contém parecer da entidade promotora e que constitui a fundamentação da atribuição do subsidio, pelo que não deve ser ocultado.
G)Folhas 11 e 12, contém referência ao desempenho do barco
H) Folhas 15 e 16 a D….. compara-se com os concorrentes
I)Folhas 18 a 20 têm referências a concursos públicos e concorrentes
J)Folhas 28 a 35 contém informação sobre as características visíveis da draga.
k) Na folha 10 há referência à concorrência;
L) nas folhas 11, 12, 13, 14, há referências a características e funcionalidades da draga e há comparação com os concorrentes;
M)folha 17, contém características da draga e dos concorrentes;
N)folha 18, contém características diferenciadoras da draga;
O)folha 20, contém características inovadoras da draga
P)folhas 20 e 22, faz referência as características da draga em comparação com os projectos da concorrência;
Q)Folha 25, faz referência às características diferenciadas dos serviços da D….. relativamente a concorrência;
R)folhas 28 a 33, 52 e 54, contém características diferenciadoras da draga
XX- provados esses factos o tribunal não poderia sustentar a decisão proferida, já que as folhas truncadas não contêm segredos comerciais ou industriais nem factos relativos à vida interna da empresa.
XXI- Nas folhas 10, 14, 21, 22, 25, 78, 92 e 95 há referências à concorrência e que não são enquadráveis na definição dada na sentença acerca da matéria que deveria ser truncada pois não se enquadra em qualquer das circunstancias referidas na sentença de 16 de Janeiro: «os aspectos particulares de financiamento, as previsões de viabilidade e de rendibilidade específicas de uma empresa (privada), as estratégias de captação de clientes ou de desenvolvimento futuro, a identificação de modelos ou de técnicas a seguir no desenvolvimento da actividade ” (cfr. Parecer da CADA nº 38/2005)”; ora, aqui não cabe o que se pode dizer da concorrência.
XXII- Folha 41(parte)- nessa folha a D….. fundamenta o carácter inovador da D….., o que sendo a causa do procedimento não pode ser matéria sigilosa por não se subsumir à definição do CADA
XXIII-Folha 42-uma vez lida esta folha verifica-se que há referências que vão para lá da vida interna da empresa, pelo que uma vez mais o tribunal não poderia aceitar esta justificação.
XXIV-Folha 81 e 82 – Ao contrário do referido na fundamentação do COMPETE 2020 e aceite na decisão recorrida, aquelas folhas fazem referência a equipamento usado pela D….. e que é standard e não inovador, pelo que o seu conhecimento não é questão do foro interno da empresa e não se enquadra naquele conceito já transcrito.
XXVI- na sentença lê-se ainda: As folhas 11, 12, 13, 15, 16, 17, 18, 20, 25, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34 (parte), 35 (parte), 36, 37 e 41 (parte), 42 (parte), 44, 52 e 54 foram rasuradas na parte corresponde ao segredo comercial da empresa, incluindo da draga em causa, no que tange às suas características diferenciadoras da concorrência.
XXVII- Tal afirmação, sem ler o processo original, é desadequada até porque aquilo que distingue aquela draga das da concorrência tem que ser visto e conhecido.
XXVIII-(FOLHAS 11 e 12, 28 a 35), O Compete 2020 impede a consulta das folhas 11 e 12 e 28 a 35, por alegadamente conter informação sobre o carácter inovador da draga. Por sua vez o tribunal agora afirma que há referencia à draga e à concorrência, pelo que o que está rasurado não é segredo comercial.
XXIX-(FOLHAS 15 e 16) Da mesma forma, e tomando em conta o que o tribunal afirma na pagina 9 da sentença em recurso, essas folhas também não contêm segredos comerciais a proteger, em particular em tudo o que diz respeito às características atribuídas à concorrência que, por dizerem respeito a terceiros, nunca poderão ser segredos comerciais da D…...
XXX. o mesmo sucede nas folhas 18 e 20, que o tribunal também viu e reconheceu que continham informação sobre a concorrência e concursos públicos o que não constitui segredo comercial..
XXXI- (FOLHAS 25)- Nesta folha a D….. afirma: “ ….As melhorias significativas relativamente aos serviços prestados pela concorrência englobam: xxxxx ” . Aqui uma vez mais é feita a referência a terceiros.
XXXII-(Folhas 36, 37, 41, 42, 44, 52 e 54)- Nessas folhas o COMPETE 2020 refere a existência de técnicas diferenciadoras da posição da empresa no desenvolvimento da sua actividade. A verdade é que da leitura do que não foi riscado percebe-se que ali existem informações relativas a terceiros e relativas a qualidades da draga que, como é evidente, não são segredo comercial.
XXXIII- Do exposto resulta que o tribunal, incompreensivelmente, se bastou com afirmações conclusivas usadas pelo COMPETE 2020 e que não são suficientes para cumprir o ónus que foi imposto à demanda e que consistia em : “Ou, dito de outro modo, a Autora terá direito a aceder ao processo com os documentos, apenas truncados nas partes relativas à matéria abrangida pelo segredo; incumbindo ainda sobre a Entidade Demandada o dever de apresentar, caso a caso, as razões para a necessidade de ocultação desses concretos elementos, para que a Autora também possa sindicar essa actuação.”
XXXIV- Mas se a fundamentação é vaga, imprecisa e as expressões usadas são conclusivas, então a autora está impedida – na prática – de sindicar a actuação da demandada.
XXXV- O Tribunal deveria descrito de forma mais precisa o que leu no processo e devia ter concluído que as rasuras excedem o razoável, em particular quando a D….. se refere a terceiros.
XXXVI-A recorrente tem interesse em verificar se o projecto executado corresponde à candidatura, nas partes que não constituem segredo comercial.
XXXVII- A recorrente apenas pretende saber se a DRAGA tem o desempenho anunciado e se se justificou a atribuição de tão chorudo subsídio.
XXXVIII- O tribunal erra ao decidir que os atributos da draga e as referências aos concorrentes são segredo comercial da D….., protegidos da consulta que a autora pretende fazer.
XXXIX-Isto significa que não foi dado cumprimento ao decidido pelo tribunal em 16-1-2019 e que a decisão objecto de recurso viola a lei e a constituição, o que impõe a sua reforma por outra que permita apreender as características da draga assim como o que é dito sobre a concorrência e em particular sobre si.
XXXVIII- EM SUMA , a decisão viola a lei porque:
-A fundamentação não é adequada e está assente em expressões conclusivas
-A escolha das rasuras foi feita pelos interessados
-Não há factos concretos na fundamentação oferecida
-Há frases rasuradas que se referem a concorrentes da D….. e que não podem ser segredo comercial
-As características que podem diferenciar a DRAGA não são segredo comercial, mas o método usado para obter essas características podem ser segredo comercial.
-A decisão proferida permite que qualquer entidade administrativa impeça a consulta de qualquer processo.
XLIV-Foram violadas as seguintes normas:
- 268º Nº1 e 2 da Constituição da República Portuguesa.
- 61º a 64º, 82º a 84º do CPA,
- 17º e 18º da CRP na medida em que viola um direito fundamental
- 2º, 5º, 6º da LADA
- 607º e 615º do C.P.C
XXXIX -A decisão deve ser substituída por outra que permita a consulta das folhas do procedimento identificadas na página 7 a 9 da decisão recorrida”.
O recorrido Ministério do Planeamento e das Infraestruturas apresentou contra-alegações, terminando as mesmas com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem:
“1.ª) O presente recurso versa a impugnação de despacho judicial, datado de 29.01.2020, através do qual o tribunal recorrido, já após a consulta do processo administrativo “integral” ou “íntegro”, decidiu que o COMPETE2020 deu cumprimento ao ordenado na sentença de 15.05.2019;
2.ª) Em especial, nesse despacho judicial decidiu o tribunal recorrido que “é de concluir pelo cumprimento da sentença judicial de 16.01.2019, pela qual foi intimada a Entidade Demandada a “permitir à Autora a consulta do processo em causa, expurgado da informação relativa à matéria reservada.”, bem como da decisão de 15.05.2019, concedendo “à Entidade Demandada o prazo de 10 dias, para que seja apresentada à Autora a fundamentação para cada um dos elementos truncados, sob pena de, caso não seja cumprido o agora ordenado, se venha a decidir pela aplicação da dita sanção.” (pág. 11 do despacho recorrido);
3.ª) A recorrente peticiona, nas suas alegações de recurso, uma reapreciação da matéria de facto, pois defende que devem ser aditados, à matéria de facto fixada no despacho recorrido, um conjunto de outros factos por si elencados;
4.ª) Entende o ora Recorrido que não se justifica qualquer reapreciação da matéria de facto fixada no despacho recorrido;
5.ª) Por um lado, o tribunal a quo procede a uma análise atenta e detalhada das partes rasuradas do processo administrativo em análise nos presentes autos, concluindo acertadamente que estamos perante matéria sujeita a segredo comercial, para efeitos da legislação aplicável.
6.ª) Por outro lado, os factos em causa que a recorrente pretende aditar, face ao seu teor, revelam-se conclusivos, para além de constituírem uma interpretação errónea da informação rasurada;
7.ª) É possível agrupar a informação rasurada impugnada em 4 blocos (que corresponde ao elenco definido no despacho judicial impugnado):
a) Fls. 5 e 25 (dados pessoais da entidade e/ou responsável técnico);
b) Fls. 7, 8, 9 e 90 (dados relativos a recursos humanos da empresa);
c) Fls. 10, 14, 19, 21, 22, 23, 24, 34 (parte), 35 (parte), 38, 39, 40, 41 (parte), 42 (parte), 46, 47, 48, 59, 61, 63, 69, 75, 77, 78, 81, 82, 89, 91, 93, 95, 96, 97, 99, 100, 101 e 102 (dados relativos à vida interna da empresa); e
d) Fls. 11, 12, 15, 16, 18, 20, 25, 28 a 35 e 36, 37, 41, 42, 44, 52 e 54 (segredo comercial da empresa).
8.ª) O 1.º bloco rasurado (fls. 5 e 25) não suscita quaisquer dúvidas quanto à sua natureza de segredo comercial, pois a matéria rasurada de fls. 5 não é contestada pela recorrente e a matéria rasurada de fls. 25 não é especificamente impugnada por esta;
9.ª) O 2.º bloco rasurado (fls. 7, 8, 9 e 90) também não suscita quaisquer dúvidas quanto à sua natureza de segredo comercial, uma vez que a recorrente não impugna a fundamentação justificativa apresentada pelo COMPETE2020;
10.ª) O 3.º bloco rasurado (fls. 10, 14, 19, 21, 22, 23, 24, 34 (parte), 35 (parte), 38, 39, 40, 41 (parte), 42 (parte), 46, 47, 48, 59, 61, 63, 69, 75, 77, 78, 81, 82, 89, 91, 93, 95, 96, 97, 99, 100, 101 e 102) exige uma análise mais atenta e detalhada;
11.ª) O trecho rasurado de fls. 10 reporta-se a informação relativa aos objetivos estratégicos da D….., Lda., enquanto empresa promotora, na qual esta procede à sua contraposição com os prosseguidos pela concorrência portuguesa, como se relata na fundamentação do COMPETE2020;
12.ª) A mera referência à concorrência nacional, contrariamente ao sustentado pela recorrente, não torna a informação “pública”, uma vez que essa referência não pode deixar de ser percecionada no seu contexto, pois esta referência é feita no âmbito da estratégia empresarial da D….., de forma a realçar o carácter diferenciador desta;
13.ª) Quanto ao trecho rasurado de fls. 14, o mesmo contem elementos que permitiriam identificar os tópicos relevantes do “pós-projeto” da D….., sendo que (uma vez mais) a mera referência à concorrência nacional não desvirtua o carácter secreto ou reservado desta informação, pois o que se pretende é caracterizar e classificar a atividade e estratégia comercial da D…..;
14.ª) A informação rasurada de fls. 21 e 22 corresponde a dados relativos à vida interna da empresa, cuja acerto legal é incontestável, face à fundamentação sustentada pelo COMPETE2020 e pelo tribunal recorrido;
15.ª) O 2.º trecho rasurado de fls. 41 respeita ao carácter inovador do equipamento de dragagem, no que respeita à sua eco-eficiência, como se assinala na fundamentação do COMPETE2020 e do despacho recorrido, razão pela qual a mesma não pode ser disponibilizada à concorrência (onde se integra a recorrente), sob pena da contrainteressada perder a vantagem que poderia deter no mercado nacional;
16.ª) Quanto à matéria rasurada de fls. 42, é possível concluir que a matéria reservada reporta-se às vantagens que podem resultar do uso da dragagem na proteção da costa, o que se insere na estratégia empresarial da D….., pelo que estamos perante segredo comercial;
17.ª) Relativamente a fls. 52 e 54, a matéria rasurada reporta-se às caraterísticas diferenciadoras do equipamento (draga) e à política comercial da contrainteressada D…..., pelo que estamos matéria de segredo comercial e vida interna da empresa;
18.ª) A matéria rasurada de fls. 69, pese embora esteja formalmente integrada no “Parecer – Organismo Intermédio – IAPMEI”, contem informação aportada pela D….. para descrever a sua atividade e a draga hidráulica;
19.ª) A impugnação da recorrente quanto à matéria rasurada de fls. 69 não tem qualquer fundamento, pois reporta-se a matéria aportada pela D….. e constitui informação relativa à estratégia empresarial desta empresa;
20.ª) No que respeita à matéria rasurada de fls. 78, esta contém informação relativa à estratégia empresarial da D….. e a mera referência à concorrência não a torna “pública”, pois a mesma é usada para realçar o caráter diferenciador daquela (atenta uma interpretação sistemática e contextual);
21.ª) Quanto à matéria rasurada de fls. 81 e 82, esta reporta-se a aspetos relacionados com potenciais investimentos financeiros e que fazem parte da estratégia empresarial da D….., sendo que a recorrente nunca impugnou o respetivo quadros (que já constava de fls. 46 a 48) e nada induz que estejamos perante equipamento standard;
22.ª) A matéria rasurada de fls. 92 e 95 reporta-se à estratégia comercial da empresa, sendo que a mera referência à concorrência não é a torna pública, uma vez que serve para realçar o caráter diferenciador da estratégia comercial da D…..;
23.ª) O 4.º bloco rasurado (fls. 11, 12, 15, 16, 18, 20, 25, 28 a 35 e 36, 37, 41, 42, 44, 52 e 54), relativo a segredo comercial da empresa D….., exige também uma análise mais atenta e detalhada;
24.ª) Uma análise sistemática da informação rasurada de fls. 11 e 12 corrobora a fundamentação prestada pelo COMPETE2020, isto é, que estamos perante a descrição das características ou o cariz inovador da draga bem como da estratégica comercial da respetiva empresa (D…..), razão pela qual se inserem no conceito de “segredo comercial da empresa”, como se defende no despacho recorrido;
25.ª) A argumentação da recorrente de impugnação da matéria rasurada de fls. 11 e 12 é meramente vaga, genérica e abstrata;
26.ª) Relativamente à informação rasurada de fls. 15 e 16, é possível inferir, face aos tópicos aí descritos, que se está perante informação relativa à estratégia comercial a implementar pela contrainteressada, nomeadamente em contraponto à concorrência (na qual se insere a recorrente);
27.ª) Razão pela qual não pode nem deve ser disponibilizada à recorrente, sob pena de concorrência desleal, causando danos à D….., como justamente salienta o COMPETE2020;
28.ª) No que respeita à informação rasurada de fls. 18 a 20, entendemos que, face aos critérios / tópicos aí descritos (constantes de fls. 18 e 20), é possível inferir que se está perante informação relativa à estratégia comercial da contrainteressada D….. (que se integra no conceito de segredo comercial), razão pela qual se justificava que a mesma fosse objeto de rasura;
29.ª) A argumentação da recorrente, para além de genérica e vaga, não demonstra de que forma é que a mera referência a concursos públicos e à concorrência tornava essa informação de “acesso público”, até porque essas referências servem, uma vez mais, para definir essa política comercial da contrainteressada D…..;
30.ª) No que respeita à impugnação da matéria rasurada de fls. 25, a mesma também não tem fundamento, pois a referência à concorrência serve para realçar o carácter inovatório da draga (que apresenta características singulares ou únicas face às demais dragas produzidas pela concorrência), razão pela qual (acertadamente) salienta o COMPETE2020 que estamos perante “aspetos particulares de desenvolvimento da atividade da empresa e, nessa medida, são reveladores da sua estratégia comercial”;
31.ª) Quanto à matéria rasurada entre as págs. 28 a 35 do processo administrativo, esta reporta-se principal e sucintamente a aspetos inovadores do equipamento, logo segredo comercial da empresa D…..;
32.ª) A matéria rasurada de fls. 36, 37, 41, 42, 44, 52 e 54, reporta-se a aspetos inovadores do equipamento e técnicas a implementar pela D….. na execução e desenvolvimento da atividade da empresa, logo estamos perante matéria sujeita a segredo comercial da empresa D…..;
33.ª) Resulta da análise anteriormente realizada que a fundamentação realizada pelo COMPETE2020 para justificar as partes ou trechos rasurados tem completo enquadramento nos critérios legais e jurisprudenciais que conformam o segredo comercial, segredo industrial ou vida interna da empresa, para efeitos, em especial, do art. 6º n.º 6 da LADA;
34.ª) A fundamentação apresentada pelo COMPETE2020 cumpre com a exigência do dever de fundamentação, para efeitos dos arts. 268º n.º 3 da CRP e 153º n.º 1 do CPA;
35.ª) Este entendimento resulta da análise do ato administrativo em concreto (que se reportava a segredo comercial e que tinha como destinatário um concorrente da contra interessada) e da análise da impugnação judicial da recorrente, pois resulta que esta percecionou os “fundamentos de facto e de direito” subjacentes à fundamentação do COMPETE2020, ainda que discorde da mesma;
36.ª) Em suma, e face ao anteriormente exposto, o douto despacho recorrido não merece qualquer censura jurídica, razão pela qual deve ser rejeitado in fine o presente recurso, interposto pela autora / recorrente;
37.ª) Por último, e no que respeita à junção do processo administrativo integral (peticionada pela recorrente na conclusão XL. das suas alegações de recurso), o ora Recorrido não se opõe a tal diligência probatória;
38.ª) Essa admissibilidade decorre da relevância da análise desse processo administrativo para o teor e fundamentação do despacho recorrido (cfr. págs. 1, 6 e 11 do despacho recorrido), para efeitos do art. 651º n.º 1, parte final do CPC ex vi art. 140º n.º 3 e art. 1 do CPTA; e
39.ª) No entanto, e face ao caráter confidencial dessa documentação (segredo comercial do contrainteressado D….., Lda.), desde já se requer que a nova junção aos autos da pen (que contem o processo administrativo) fique dependente de um despacho judicial proferido para esse efeito (o qual garanta também a confidencialidade dessa mesma informação), nos termos e ao abrigo do disposto no art. 652º n.º 1, alíneas d) e e) do CPC ex vi art. 140º n.º 3 e art. 1º do CPTA”.

Na sequência da sua entrega pelo réu neste TCAS, procedeu-se à análise do processo administrativo, em suporte virtual de dados, pen usb, referente ao Projeto n.º 15055 da D….., Lda., sem qualquer informação truncada ou expurgada.
Na presente fase de recurso, a recorrente veio requerer a admissão de três documentos, dada a sua pertinência para a boa decisão da causa e porque esclarecedores do que está em causa.

*

Perante as conclusões das alegações da recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre:
- aferir da admissibilidade da junção dos documentos, enquanto questão prévia do presente recurso;
- aferir do erro de julgamento da decisão sobre a matéria de facto;
- aferir do erro de julgamento da decisão recorrida, ao considerar satisfeita a permissão de acesso.

Dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.
*
II. FUNDAMENTOS
II.1 DECISÃO DE FACTO
Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
“A. Em 16.01.2019, foi proferida sentença no presente processo judicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e da qual consta o seguinte (cfr. fls. 170 e seguintes do SITAF, que aqui se dão por integralmente reproduzidas):
«(…) Revertendo ao caso dos autos, verifica-se que a Autora pretende consultar o procedimento que culminou com o financiamento do projecto da contra-interessada, no âmbito do programa Compete 2020 e Portugal 2020, com o objectivo de “criação de uma empresa de prestação de serviços de dragagem através de uma draga hidráulica inovadora, com capacidade para dragar 1.000m3 de sedimentos de cada vez e com menor impacto ambiental”.
Para fundamentar o interesse na consulta, a Autora alega, em suma, que é uma empresa concorrente com a contra-interessada, actuando no mesmo sector de actividade e que pretende sindicar a inovação e as reais valências do projecto daquela, que não parecem credíveis, e se dessa forma os valores financiados o foram correctamente, até por desconhecer a natureza do subsídio em causa (se totalmente reembolsável).
Efectivamente, a Entidade Requerida prestou informações à Autora, quanto à natureza do subsídio e, genericamente, quanto ao projecto da contra-interessada, mas não permitiu a consultado do processo, invocando que a Autora não se candidatou ao procedimento em causa, que não demostrou interesse directo na informação e que os documentos do procedimento contém informações protegidas pelo artigo 6.º, n.º6, da LADA. Em suma, da fundamentação utilizada pela Entidade Requerida para não permitir a consulta do processo, resulta que a informação pretendida pela Autora contém aspectos abrangidos pelo segredo comercial, industrial e sobre a vida interna da contra-interessada. Ocorre que o poder da Administração de recusar o acesso à documentação consubstancia um poder vinculado aos princípios e objectivos fixados na lei, e que apenas pode ser exercido de acordo com os princípios da transparência e da proporcionalidade. Portanto, em primeiro lugar, para que a Administração possa recusar o acesso aos documentos, não basta a invocação da existência do dito segredo; esta tem também que fundamentar a sua decisão, explicitando os concretos motivos para entender que os concretos documentos – especificando-os - revelariam dados confidenciais. Incumbindo também à Administração efectuar um juízo de proporcionalidade, como referido no artigo 6.º, n.º 6, da LADA, ponderando os interesses e valores jurídicos em confronto, no caso: o direito de acesso à informação e o direito ao segredo comercial e ao segredo sobre a vida interna de uma empresa.
Veja-se que, de acordo com o referido artigo 6.º, n.º 6, da LADA, aquele que pretenda aceder a documentos administrativos que contenham segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa, só pode ver o respectivo direito reconhecido se demonstrar que o seu interesse na consulta dos documentos é directo, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido, e bem assim, suficientemente relevante após ponderação, no quadro do princípio da proporcionalidade, o que exige que se verifique se o pretendido acesso é necessário, adequado e não excessivo e, portanto, se se verificam os pressupostos que autorizam a pretendida consulta.
Ainda assim, será relativamente a cada um dos documentos, e face à informação que os mesmos detém, que a Entidade Administrativa deverá ponderar os interesses em confronto, e nos termos do disposto no artigo 6.º, n.º 6, da LADA e, bem assim, de acordo com o consignado no artigo 18.º, n.º 2, da CRP, fazer prevalecer o interesse de protecção dos dados abrangidos pelo segredo.
Ademais, não resultou do invocado pela Entidade Administrativa, que toda a informação constante do processo que a Autora pretende consultar, esteja abrangida por segredo, sendo que só relativamente a essa informação é que pode ser limitado o direito à informação; nem bem sabemos quais os concretos documentos que a Entidade Administrativa considera abrangidos pelo segredo – ou que partes -, e porque não pôde facultar a consulta do processo, depurado da informação reservada.
Isto é, não resultou que os documentos em causa contenham informações puramente internas que possam prejudicar gravemente a actividade comercial e concorrencial da contra-interessada, revelando-se tal conclusão evidente, sobretudo, se ponderarmos o facto de aqueles documentos respeitam exclusivamente aos projectos apresentados a concurso.
Impendendo, por isso, sobre a Entidade Demandada permitir a consulta do processo, e nos termos do n.º8 do artigo 6.º da LADA, expurgar a informação relativa à matéria reservada.
Ou, dito de outro modo, a Autora terá direito a aceder ao processo com os documentos, apenas truncados nas partes relativas à matéria abrangia pelo segredo; incumbindo ainda sobre a Entidade Demandada o dever de apresentar, caso a caso, as razões para a necessidade de ocultação desses concretos elementos, para que a Autora também possa sindicar essa actuação. (...)
DECISÃO
Nestes termos, julgo a presente acção procedente e intimo a Entidade Demandada a permitir à Autora a consulta do processo em causa, expurgado da informação relativa à matéria reservada. (…)».
B. Em 15.05.2019, foi proferida sentença no presente processo judicial no que tange à execução de julgados, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e da qual consta o seguinte (cfr. fls. 369 e seguintes do SITAF, que aqui se dão por integralmente reproduzidas):
«(…) Nessa sequência, a Entidade Demandada permitiu que a Autora consultasse o processo em causa, ainda que tendo truncado algumas partes.
Porém, relativamente à fundamentação para as partes truncadas, a Entidade Demandada apenas apresentou uma fundamentação genérica, dizendo que aquelas tinham em vista o cumprimento da sentença proferida nestes autos e que a extensão do direito à informação, continha as restrições constantes do artigo 6.º, n.º s 6 e 8, da Lei n.º 26/2016, da Lei de Acesso aos Documentos da Administração, transcrevendo esses mesmos normativos, os quais preceituam que:
«6 - Um terceiro só tem direito de acesso a documentos administrativos que contenham segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa se estiver munido de autorização escrita desta ou demonstrar fundamentadamente ser titular de um interesse direto, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido suficientemente relevante após ponderação, no quadro do princípio da proporcionalidade, de todos os direitos fundamentais em presença e do princípio da administração aberta, que justifique o acesso à informação.» e
«8 - Os documentos administrativos sujeitos a restrições de acesso são objeto de comunicação parcial sempre que seja possível expurgar a informação relativa à matéria reservada.».
Para além disso, a Entidade Demandada alegou, na resposta apresentada já no âmbito da execução da sentença, que: «23.º Face a um processo de 706 páginas, seria imprudente (se não, mesmo impossível) justificar, caso a caso, a razão para a expurgação devido a título de segredo comercial /vida interna da empresa D….., Lda.».
No entanto, como a própria Entidade Demandada também refere na dita resposta: «19.º Pois, conforme se referiu anteriormente, a parte do processo administrativo mais “visada” ou “atingida” pelo segredo comercial foi a parte inicial do processo administrativo (até a pág. 63) que foi junta pela Autora.».
Ou seja, é a própria Entidade Demandada que admite que as partes truncadas, e que deveriam ser fundamentadas uma a uma, correspondem a aproximadamente 63 páginas das 706.
Nessa medida, e apesar de se reconhecer que a Entidade Demandada atendeu à sentença que fora proferida, e disponibilizou à Autora o processo em causa, impõe-se evidenciar que a fundamentação utilizada foi meramente genérica, e por isso insuficiente para que a Autora, e até o Tribunal, pudesse sindicar as partes truncadas. Considerando-se plenamente exequível a fundamentação que se exigia.
Sendo que, sob pena de violação do princípio da separação dos poderes, não pode ser o Tribunal a substituir-se à Entidade Demandada e a fundamentar caso a caso, com remissão para cada uma das páginas do PA, os elementos que alegadamente constituem matéria reservada.
Saliente-se que, de acordo com a sentença proferida, impendia sobre a Entidade Demandada não só facultar a consulta do processo, mas também lhe competia analisar a diversa informação constante dos documentos, verificar a que se encontrava abrangida pelo segredo, e expurgá-la dos documentos a fornecer à Autora, apresentando, caso a caso, as razões para a necessidade de ocultação desses concretos elementos.
Contudo, na situação em apreço a fundamentação apresentada foi meramente genérica, por remissão para um artigo da Lei e, portanto, insuficiente; não se identificando os concretos elementos que não estão a ser divulgados e os motivos para que tal se verifique.
Donde, face aos factos provados, se impõe concluir que a Requerida cumpriu apenas parcialmente o ordenado na decisão judicial transitada em julgado.
Ainda assim, atento os motivos invocados por aquela, e porquanto foi dado cumprimento parcial à sentença em causa, através da disponibilização do processo e da apresentação de uma fundamentação (ainda que insuficiente), julga-se a existência de uma justificação aceitável para que não seja aplicada, pelo menos para já, uma sanção pecuniária compulsória.
Nesse seguimento, concede-se à Entidade Demandada o prazo de 10 dias, para que seja apresentada à Autora a fundamentação para cada um dos elementos truncados, sob pena de, caso não seja cumprido o agora ordenado, se venha a decidir pela aplicação da dita sanção. (…)».
C. Por ofício datado de 06.06.2019, a Compete 2020 remeteu aos advogados do Autor do proc. n.° 2139/18.7BELSB um anexo, com os alegados fundamentos para cada um dos elementos expurgados no processo administrativo do projecto n.° ….., que se dá aqui por integralmente reproduzida (cfr. fls. 399 e seguintes do SITAF, que aqui se dão por integralmente reproduzidas)”.
D. Em 07.06.2019, o Réu apresentou neste Tribunal a fundamentação que tinha sido disponibilizada ao Autor, com a justificação dos elementos truncados, para cumprimento do ordenado na sentença de 15.05.2019 (cf. fls. dos autos, que se dão aqui por integralmente reproduzidos).
E. Em17.06.2019, o Autor apresentou requerimento, concluindo do seguinte modo (cf. fls. dos autos, que se dão aqui por integralmente reproduzidos):
«67.º
Que a informação foi indevidamente truncada.
68.º
Da leitura do processo percebe-se que o que está truncado é relativo às características da DRAGA que foi a bandeira do projecto e a atribuição de apoios, o que não constitui segredo comercial.
69.º
A capacidade e desempenho ambiental da draga, são características que têm de ser exibidas, nomeadamente em concursos públicos pelo que nunca serão secretas.
70.º
Secreta pode ser a construção de uma peça ou de um equipamento, mas já não será secreto o resultado desse meio.
71.º
E se o que foi truncado não é secreto por não se subsumir ao que na sentença está definido com segredo comercial e industrial, então a decisão proferida não está a ser cumprida. (…)».
F. Em 16.07.2019, este TAC de Lisboa proferiu decisão, anulada por Acórdão do TCA Sul, de 21.11.2019, que determinou “a baixa dos autos para que, no âmbito da execução da sentença que decretou a intimação, se proceda à reabertura da instrução com apresentação ao juiz dos documentos do procedimento, a título confidencial, e no seu teor integral, para análise da invocada restrição de acesso, após o que se decidirá”. (cf. fls. dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas).
G. Em 30.12.2019, o Ministério do Planeamento veio juntar aos autos, a título confidencial, o processo administrativo integral, em suporte “pen”, do projecto da D….., Lda, cujo teor corresponde àquele que fora facultado ao Autor, sem a informação aí truncada (cf. fls. dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas).
*

II.2 APRECIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Conforme supra enunciado, as questões a decidir cingem-se a saber se:
- é de admitir a junção de documentos, enquanto questão prévia do presente recurso;
- ocorre erro de julgamento da decisão sobre a matéria de facto;
- ocorre erro de julgamento da decisão recorrida, ao considerar satisfeita a permissão de acesso.


a) da admissibilidade da junção de documentos

Sustenta aqui a recorrente que deve ser admitida a junção de três documentos, que se reportam ao concurso público para a empreitada de dragagem de manutenção de fundos do porto de Aveiro, entre os quais consta um esclarecimento da contrainteressada D….., Lda., em que refere “o equipamento principal proposto é recente e foi construído e equipado com recurso a técnicas construtivas e sistemas de última geração” e que “a draga está devidamente otimizada sendo publicamente conhecidos as velocidades máxima e operacional e rendimentos de dragagem”. Daí retira a pertinência da junção destes documentos, porquanto neste processo tais características não são conhecidas e foram impedidas, enquanto naquele concurso se reconheça explicitamente que as características da draga são conhecidas publicamente.
Nos termos previstos no artigo 651.º, n.º 1, do CPC, as partes podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º do CPC, ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância. Podendo ainda, nos termos do artigo 651.º, n.º 2, juntar pareceres de jurisconsultos até ao início do prazo para a elaboração do projeto de acórdão.
Como é bom de ver, encontra-se ultrapassado o prazo limite para a junção de documentos, coincidente com a apresentação das alegações de recurso, pelo que a mesma não poderá ser admitida.
Note-se, de qualquer modo, que não se vislumbra a relevância para os presentes autos da referida afirmação da contrainteressada.
Pelo exposto, decide-se não admitir a junção aos autos dos referidos documentos.


b) do erro de julgamento de facto

Sustenta aqui a recorrente que devem ser aditados ao probatório os seguintes factos:
A) As folhas 10, 14, 19, 21, 22, 23, 24, 34 (parte), 35 (parte), 38, 39, 40, 41 (parte), 42 (parte), 46, 47, 48, 59, 61, 63, 69, 75, 77, 78, 81, 82, 89, 91, 93, 95, 96, 97, 99, 100, 101 e 102 não contém dados relativos à vida interna da empresa, pelo menos em parte, e contêm dados relativos aos concorrentes e características da draga que devem ser publicitadas.
B) As folhas 11, 12, 13, 15, 16, 17, 18, 20, 25, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34 (parte), 35 (parte), 36, 37 e 41 (parte), 42 (parte), 44, 52 e 54 foram rasuradas nas partes que devem ser dadas a conhecer a terceiros.
C) A folha 25 do procedimento não tem rasuras quanto a dados pessoais, mas sim quando a afirmações acerca do concorrente, facto que fica comprovado com a simples leitura do que está visível (linha 11 do segundo quadro: “as melhorias significativas relativamente aos serviços prestados pela concorrência englobam: xxxx”)
D) Nas folhas 10, 14, 21, 22, 25, 78, 92 e 95 há referência a concorrentes, assim como nas folhas 36, 37, 41, 42, 44, 52 e 54 e isso resulta da leitura dessas folhas, pelo que o que é dito a propósito dos concorrentes deve ser lido pela autora.
E) Folhas 41 e 42 contém informações sobre a performance da draga e que não é informação sigilosa, já que não há performance sem se ver o que faz o equipamento.
F) Folhas 69 contém parecer da entidade promotora e que constitui a fundamentação da atribuição do subsidio, pelo que não deve ser ocultado.
G) Folhas 11 e 12, contém referência ao desempenho do barco
H) Folhas 15 e 16 a D….. compara-se com os concorrentes
I) Folhas 18 a 20 têm referências a concursos públicos e concorrentes
J) Folhas 28 a 35 contém informação sobre as características visíveis da draga.
K) Na folha 10 há referência à concorrência;
L) Nas folhas 11, 12, 13, 14, há referências a características e funcionalidades da draga e há comparação com os concorrentes;
M) folha 17, contém características da draga e dos concorrentes;
N) folha 18, contém características diferenciadoras da draga;
O) folha 20, contém características inovadoras da draga
P) folhas 20 e 22, faz referência as características da draga em comparação com os projectos da concorrência;
Q) Folha 25, faz referência às características diferenciadas dos serviços da D….. relativamente a concorrência;
R) folhas 28 a 33, 52 e 54, contém características diferenciadoras da draga.
Vejamos.
O artigo 640.º do CPC, sob a epígrafe ‘ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto’, prevê o seguinte:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”
Daqui decorre que, ao impugnar a matéria de facto em sede de recurso, recai sobre o recorrente o ónus de alegar o motivo pelo qual os meios probatórios que indica impõem decisão diversa e também porque motivo os meios probatórios tidos em conta pelo tribunal não permitem se considere provado determinado facto.
Não se pode limitar a questionar a fundamentação da decisão de facto apresentada pelo julgador, mas sim a decisão sobre determinado facto.
Haverá que ter também presente que, de acordo com o artigo 607.º, n.º 5, do CPC, o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; e esta livre apreciação apenas não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.
Por outro lado, é em função da definição do objeto do processo e das questões a resolver nos autos que deve ser apreciada a relevância da matéria fáctica alegada pelas partes. Assim, nem toda a matéria fáctica que se possa considerar provada deve ser levada, sem mais, ao probatório.
E como é consabido, os factos respeitam à ocorrência de acontecimentos históricos, afastando-se de tal qualificação os juízos de natureza valorativa, que comportam antes conclusões sobre factos.
Toda a factualidade que se pretende ver aditada ao probatório, pontos A) a R), comporta somente juízos de natureza valorativa, tratando-se de conclusões que assentam nas interpretações da recorrente quanto ao conteúdo dos documentos objeto do pedido de intimação, o que ela deles retira, pelo que não estamos perante factos. Como tal, terá de improceder o seu aditamento ao probatório.
Improcede, pois, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.


c) do erro de julgamento de direito

Conforme já se assinalou no precedente recurso, estamos perante a execução da intimação, enquadrada no artigo 108.º, n.º 2, do CPTA: “[s]e houver incumprimento da intimação sem justificação aceitável, deve o juiz determinar a aplicação de sanções pecuniárias compulsórias, nos termos do artigo 169.º, sem prejuízo do apuramento da responsabilidade civil, disciplinar e criminal a que haja lugar, segundo o disposto no artigo 159.º”
Cumprindo, como aí já assinalado, partir do direito já aplicado ao caso vertente, na sentença proferida nestes autos, transitada em julgado, na qual se julgou a ação procedente e se decidiu intimar a entidade demandada a permitir à autora a consulta do processo em causa, expurgado da informação relativa à matéria reservada.
Consta da respetiva fundamentação o seguinte: “será relativamente a cada um dos documentos, e face à informação que os mesmos detém, que a Entidade Administrativa deverá ponderar os interesses em confronto, e nos termos do disposto no artigo 6.º, n.º 6, da LADA e, bem assim, de acordo com o consignado no artigo 18.º, n.º 2, da CRP, fazer prevalecer o interesse de proteção dos dados abrangidos pelo segredo.
Ademais, não resultou do invocado pela Entidade Administrativa, que toda a informação constante do processo que a Autora pretende consultar, esteja abrangida por segredo, sendo que só relativamente a essa informação é que pode ser limitado o direito à informação; nem bem sabemos quais os concretos documentos que a Entidade Administrativa considera abrangidos pelo segredo – ou que partes -, e porque não pôde facultar a consulta do processo, depurado da informação reservada.
Isto é, não resultou que os documentos em causa contenham informações puramente internas que possam prejudicar gravemente a atividade comercial e concorrencial da contrainteressada, revelando-se tal conclusão evidente, sobretudo, se ponderarmos o facto de aqueles documentos respeitam exclusivamente aos projetos apresentados a concurso.
Impendendo, por isso, sobre a Entidade Demandada permitir a consulta do processo, e nos termos do n.º 8 do artigo 6.º da LADA, expurgar a informação relativa à matéria reservada.
Ou, dito de outro modo, a Autora terá direito a aceder ao processo com os documentos, apenas truncados nas partes relativas à matéria abrangia pelo segredo; incumbindo ainda sobre a Entidade Demandada o dever de apresentar, caso a caso, as razões para a necessidade de ocultação desses concretos elementos, para que a Autora também possa sindicar essa atuação.
Em sede de execução da sentença, a autora/recorrente suscitou em duas ocasiões o incumprimento do decidido, concluindo o Tribunal a quo, em decisão de 16/07/2019, que a requerida dera cumprimento ao ordenado na decisão judicial transitada em julgado.
Interposto recurso desta decisão, veio este TCAS determinar a baixa dos autos para que, no âmbito da execução da sentença que decretou a intimação, se procedesse à reabertura da instrução com apresentação ao juiz dos documentos do procedimento, a título confidencial e no seu teor integral, para análise da invocada restrição de acesso, após o que se decidirá.
O Tribunal a quo procedeu à análise, a título confidencial, do processo administrativo integral do projeto da contrainteressada D….., Lda, sem qualquer informação truncada.
E proferiu nova decisão, da qual consta a seguinte fundamentação:
Da análise pormenorizada e comparativa entre a fundamentação apresentada pela Entidade Requerida ao Autor, as concretas partes que foram rasuradas e informação constante dessas mesmas, foi possível comprovar, em súmula, o seguinte:
- Na folha 5 foi rasurado o nome, telemóvel e um email, dos dois responsáveis técnicos pela elaboração da candidatura;
- Na folha 7 foi rasurado o n.º de postos de trabalho do beneficiário, por homens e mulheres;
- Na folha 8 foram rasuradas as instituições de ensino onde foram obtidas as habilitações dos titulares das quotas da D….., para além das áreas de ensino, as empresas onde exerceram funções e demais elementos curriculares e profissionais;
- Na folha 9 foi rasurada a informação relativa à concreta estrutura de recursos humanos, por funções e actividades a desempenhar, e a incluir na D…..;
- Na folha 10 foram rasurados os objectivos estratégicos, no qual consta os valores da facturação a alcançar e a estratégia a assumir em ralação aos demais concorrentes;
- Nas folhas 11, 12, 13 e 14, foi rasurada informação relativa à draga da contra-interessada, concretamente as suas características e funcionalidades, e as diferenças das detidas pela concorrência, para além dos correspondentes pontos fortes e fracos e respectivos custos de produção;
- Nas folhas 15 e 16, foi rasurada informação relativa ao percurso seguido pela D….., e a identificação dos seus principais concorrentes, incluindo ainda uma descrição que inclui os seus pontos fortes e diferenciadores e estratégia de actuação relativamente aos seus concorrentes;
- Na folha 17 foi rasurada informação da descrição da estratégia de diferenciação concorrencial que a D….. pretende adoptar, contendo também as características da draga;
- Na folha 18, foi rasurada informação com a identificação dos tipos de clientes e das características diferenciadoras da draga, relativamente aos seus concorrentes e formas de actuação daqueles, bem como estratégia a seguir para a angariação de clientela;
- Da folha 19, foi expurgada a tabela correspondente à actividade económica, por serviço, mercado, quantidade e valor, antes e após o projecto;
- Na folha 20, foi rasurada informação sobre o percurso da D….., e sobre a direcção de crescimento do mercado, para além das características inovadoras da draga;
- Nas folhas 21 e 22, foram rasuradas informações relativa às características diferenciadoras da draga da D….., em relação aos projectos da concorrência;
- Nas folhas 22 e 24 foi rasurada informação relativamente aos valores relativos a vendas, fornecimentos e serviços externos, gastos com o pessoal, impostos, resultados antes das depreciações, resultados operacionais, resultado líquido do exercício, juros, activos, capital próprio e passivo relativamente aos diversos exercícios económicos da D…..;
- Da folha 25 foi rasurada informação relativa às características diferenciados dos serviços da D…..relativamente à concorrência e a identificação, função, e contactos do responsável técnico do projecto;
- Da folha 26, foi rasurada a percentagem referente à actividade económica do projecto;
- Das folhas 28 a 33, foi rasurada informação relativa às características inovadoras da draga, do projecto em causa, e estratégias comerciais e marketing da empresa;
- Das folhas 34 a 39 foi rasurada informação sobre o plano de investimento da empresa, com a respectiva calendarização, e quanto à prestação dos serviços, vantagens competitivas e qualificação dos mercados internacionais;
- Da folhas 40 a 45 foi rasurada informação relativa aos CAES da empresa, ao n.º de postos de trabalho a criar, e as características dos recursos humanos, da draga e do projecto;
- Das folhas 46 a 48, foi rasurada informação relativamente a software e tipo de equipamento utilizado e localização de serviços prestados;
- Da folha 52 e 54 foi rasurada a informação relativa às características diferenciadoras da draga;
- Da folha 60 e 61 foi rasurada o valor relativo ao financiamento e suas fontes;
Donde, resulta que:
- Das folhas 5 e 25 foram rasuradas na parte correspondente a dados pessoais, contacto e telefone, da entidade consultora, responsável pela elaboração da candidatura e/ou do responsável técnico pelo projecto;
- As folhas 7, 8, 9 e 90 foram rasuradas nas partes respectivas aos recursos humanos da empresa, incluindo identificação e percursos profissionais, o que se inclui nos dados pessoais e da vida interna da empresa;
- As folhas 10, 14, 19, 21, 22, 23, 24, 34 (parte), 35 (parte), 38, 39, 40, 41 (parte), 42 (parte), 46, 47, 48, 59, 61, 63, 69, 75, 77, 78, 81, 82, 89, 91, 93, 95, 96, 97, 99, 100, 101 e 102 foram rasuradas por conterem dados relativos à vida interna da empresa;
- As folhas 11, 12, 13, 15, 16, 17, 18, 20, 25, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34 (parte), 35 (parte), 36, 37 e 41 (parte), 42 (parte), 44, 52 e 54 foram rasuradas na parte corresponde ao segredo comercial da empresa, incluindo da draga em causa, no que tange às suas características diferenciadoras da concorrência;
- Apesar de inicialmente rasurada a informação constante das folhas 26, 45, e 70 fora posteriormente disponibilizada ao Autor.
*
Ora, tal qual já constava da sentença proferida em 16.01.2019, o direito à informação não é absoluto, competindo à Entidade Requerida efectuar um juízo de proporcionalidade, como referido no artigo 6.º, n.º 6, da LADA, ponderando os interesses e valores jurídicos em confronto, no caso: o direito de acesso à informação e o direito ao segredo comercial e o segredo sobre a vida interna de uma empresa e, bem assim, de acordo com o consignado no artigo 18.º, n.º 2, da CRP, fazer prevalecer o interesse na protecção dos dados abrangidos pelo segredo.
Nessa sequência, competia à Entidade Administrativa analisar a diversa informação constante dos documentos, verificar a que se encontrava abrangida pelo segredo, e expurgá-la dos documentos a fornecer ao Requerente. Ainda lhe cabendo o dever de apresentar, caso a caso, as razões para a necessidade de ocultação desses concretos elementos.
Por isso mesmo, na missiva da Entidade Administrativa, esclarece-se quais os elementos expurgados, relativamente a um conjunto de páginas e as razões para que tais informações não possam ser divulgadas.
Ou seja, a Entidade Requerida identifica os elementos que não estão a ser divulgados e os motivos para que tal se verifique.
Como tal, analisados os documentos juntos, se obtém que alguns dos elementos expurgados correspondem a dados pessoais dos recursos humanos da empresa em causa, outros a dados relativos à vida interna da empresa, outros ainda a dados financeiros e, por último, alguns deles respeitam às características diferenciadoras da draga e às suas potencialidades.
Nessa medida, e uma vez que o Autor é concorrente da empresa em causa, dedicando-se à realização de dragagens, compreende-se o interesse na obtenção das características diferenciados da draga da contra-interessada; contudo, e até por isso, compete à Entidade Demandada especial cautela na disponibilização das informações solicitadas, de modo a que não estejam abrangidas pelo segredo comercial.
Ademais, como já evidenciado, a propósito dos conceitos de segredo comercial, industrial ou sobre a vida interna de uma empresa, a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) já se pronunciou por diversas vezes. Veja-se, a título de exemplo, o seu parecer n.º 81/2008, disponível em www.cada.pt, no qual a mesma entendeu que integram o conceito de segredo comercial, industrial ou sobre a vida interna de uma empresa, «os aspectos particulares de financiamento, as previsões de viabilidade e de rendibilidade específicas de uma empresa (privada), as estratégias de captação de clientes ou de desenvolvimento futuro, a identificação de modelos ou de técnicas a seguir no desenvolvimento da actividade” (cfr. Parecer da CADA nº 38/2005)».
Por todo o referido, se impõe concluir que a Requerida deu cumprimento ao ordenado na decisão judicial transitada em julgado, porquanto forneceu os documentos, sem os elementos que reputou abrangidos pelo segredo, indicando ainda os concretos elementos que considerou não divulgáveis nos termos dos preceitos legais aplicáveis, dos quais emerge clara restrição legal de acesso.
Com estes fundamentos, concluiu-se estar cumprida a sentença proferida em 16/01/2019.
O dissídio da recorrente assenta, essencialmente, no seguinte:
- as referências à concorrência não são enquadráveis na definição dada na sentença acerca da matéria que deveria ser truncada;
- o carácter inovador da draga é causa do procedimento e não matéria sigilosa;
- há referências truncadas que não respeitam à vida interna da empresa, designadamente quanto a equipamento usado pela contrainteressada;
- é desadequado afirmar que está em causa segredo comercial da empresa, quando deve ser conhecido o que distingue aquela draga das da concorrência;
- as características atribuídas à concorrência e concursos públicos dizem respeito a terceiros, não constituindo segredos comerciais;
- o tribunal bastou-se com afirmações conclusivas e insuficientes para cumprir o ónus imposto à demandada, impedindo a recorrente de sindicar a sua atuação;
- cabia ao tribunal descrever de forma mais precisa o que leu no processo e concluir que as rasuras excedem o razoável, pois deve ter acesso às características da draga e ao que é dito sobre a concorrência e em particular sobre si.

Aquando da precedente apreciação da presente execução da intimação, constatou-se que os elementos truncados no âmbito do procedimento em questão, em particular os respeitantes ao invocado segredo comercial, não permitiam discernir que tipo de informação se encontrava ocultada.
O que já não sucede, posto que o Tribunal a quo procedeu à análise do procedimento sem quaisquer cortes, sindicando a adequação da fundamentação apresentada pela entidade demandada, em contraponto com o interesse daquela.
Tal análise foi entretanto repetida por este tribunal de recurso, levando a concluir que as seguintes observações da decisão do Tribunal a quo são acertadas e por isso de manter:
- na folha 5 foi rasurado o nome, telemóvel e um email, dos dois responsáveis técnicos pela elaboração da candidatura;
- na folha 7 foi rasurado o n.º de postos de trabalho do beneficiário, por homens e mulheres;
- na folha 8 foram rasuradas as instituições de ensino onde foram obtidas as habilitações dos titulares das quotas da D….., para além das áreas de ensino, as empresas onde exerceram funções e demais elementos curriculares e profissionais;
- na folha 9 foi rasurada a informação relativa à concreta estrutura de recursos humanos, por funções e atividades a desempenhar, e a incluir na D…..;
- na folha 10 foram rasurados os objectivos estratégicos, no qual consta os valores da faturação a alcançar e a estratégia a assumir em ralação aos demais concorrentes;
- nas folhas 11, 12, 13 e 14 foi rasurada informação relativa à draga da contrainteressada, concretamente as suas características e funcionalidades, e as diferenças das detidas pela concorrência, para além dos correspondentes pontos fortes e fracos e respectivos custos de produção;
- nas folhas 15 e 16 foi rasurada informação relativa ao percurso seguido pela D….., e a identificação dos seus principais concorrentes, incluindo ainda uma descrição que inclui os seus pontos fortes e diferenciadores e estratégia de atuação relativamente aos seus concorrentes;
- na folha 17 foi rasurada informação da descrição da estratégia de diferenciação concorrencial que a D….. pretende adotar, contendo também as características da draga;
- na folha 18 foi rasurada informação com a identificação dos tipos de clientes e das características diferenciadoras da draga, relativamente aos seus concorrentes e formas de actuação daqueles, bem como estratégia a seguir para a angariação de clientela;
- na folha 19 foi expurgada a tabela correspondente à atividade económica, por serviço, mercado, quantidade e valor, antes e após o projeto;
- na folha 20 foi rasurada informação sobre o percurso da D….., e sobre a direção de crescimento do mercado, para além das características inovadoras da draga;
- nas folhas 21 e 22 foram rasuradas informações relativa às características diferenciadoras da draga da ….., em relação aos projetos da concorrência;
- nas folhas 22 e 24 foi rasurada informação relativamente aos valores relativos a vendas, fornecimentos e serviços externos, gastos com o pessoal, impostos, resultados antes das depreciações, resultados operacionais, resultado líquido do exercício, juros, ativos, capital próprio e passivo relativamente aos diversos exercícios económicos da D…..;
- na folha 25 foi rasurada informação relativa às características diferenciados dos serviços da D….. relativamente à concorrência e a identificação, função, e contactos do responsável técnico do projeto;
- na folha 26, foi rasurada a percentagem referente à atividade económica do projeto;
- nas folhas 28 a 33 foi rasurada informação relativa às características inovadoras da draga, do projeto em causa, e estratégias comerciais e marketing da empresa;
- nas folhas 34 a 39 foi rasurada informação sobre o plano de investimento da empresa, com a respectiva calendarização, e quanto à prestação dos serviços, vantagens competitivas e qualificação dos mercados internacionais;
- nas folhas 40 a 45 foi rasurada informação relativa aos CAES da empresa, ao n.º de postos de trabalho a criar, e as características dos recursos humanos, da draga e do projeto;
- nas folhas 46 a 48 foi rasurada informação relativamente a software e tipo de equipamento utilizado e localização de serviços prestados;
- nas folhas 52 e 54 foi rasurada a informação relativa às características diferenciadoras da draga;
- nas folhas 60 e 61 foi rasurada o valor relativo ao financiamento e suas fontes.
Perante isto, o presente recurso necessariamente claudica.
Vejamos porquê.
Aponta a recorrente à decisão sob recurso que as referências à concorrência não são enquadráveis na definição dada na anterior sentença acerca da matéria que deveria ser truncada.
Não se vê que assim seja, pois que ali se ressalvou que o acesso aos documentos administrativos apenas podia ser concretizado quanto aos elementos não abrangidos pelo segredo, que abrange as vertentes do segredo comercial e do segredo sobre a vida interna da empresa, conforme claramente assinalado na decisão sob recurso.
Em particular, insiste a recorrente que tem direito a aceder às características do equipamento da contrainteressada e do seu caráter inovador, bem como às considerações que aquela expressou no procedimento quanto à concorrência.
Sem razão, contudo.
Repise-se, antes do mais, o enquadramento aqui efetuado aquando do precedente recurso:
“A pretensão da autora/recorrente, plasmada na petição inicial e repetida nas subsequentes peças processuais que apresentou, consiste em aceder às peças do procedimento que permitam conhecer o caráter inovador da draga da contrainteressada, conhecida que está a natureza do incentivo.
Consta do seu recurso estar em causa a consulta das folhas 10 a 18, 20 a 22, 25, 28 a 37, 41, 42, 44, 52, 54, 78, 81, 82, 92 e 95.
Contudo, o âmbito da intimação encontra-se definido nos estritos termos da apontada pretensão, ou seja, a consulta dos documentos que respeitem ao caráter inovador da draga da contrainteressada.
Que, de acordo com as próprias alegações da autora/recorrente, implicarão acesso às folhas 11 a 13, 15 a 18, 20, 25, 28 a 37, 41, 42, 44, 52 e 54.
Haverá então que apurar se lhe assiste o direito de acesso à informação aí contida.
O princípio estruturante do regime legal de acesso a documentos elaborados ou na posse da administração haverá de ser encontrado desde logo na nossa lei fundamental.
Assim, consagra o artigo 268.º, n.os 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), o princípio da administração aberta, erigindo como direito dos administrados o de serem informados pela Administração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sejam diretamente interessados, o de conhecer as resoluções definitivas que sobre eles forem tomadas, bem como terem acesso aos arquivos e registos administrativos, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal e à intimidade das pessoas.
Por aqui se vê que temos constitucionalmente consagrados dois direitos de acesso à informação distintos: o direito à informação procedimental, n.º 1 do referido preceito, e o direito à informação não procedimental, n.º 2 do referido preceito.
Pressupondo naturalmente o primeiro que exista um procedimento administrativo em curso, o que não ocorre no segundo.
Nas palavras de Raquel Carvalho, “o direito à informação administrativa procedimental visa a tutela de interesses e posições subjetivas diretas, enquanto o direito de acesso a arquivos e registos administrativos está configurado como um dos instrumentos de proteção de interesses mais objetivos partilhados pela comunidade jurídica, designadamente o da transparência da ação administrativa” (O direito à informação administrativa procedimental, Porto, 1999, págs. 160 e 161).
Concretizando tais direitos e o apontado princípio da administração aberta, o artigo 17.º, n.º 1, do CPA, prevê que todas as pessoas têm o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, mesmo quando nenhum procedimento que lhes diga diretamente respeito esteja em curso, sem prejuízo do disposto na lei em matérias relativas à segurança interna e externa, à investigação criminal, ao sigilo fiscal e à privacidade das pessoas. Já o n.º 2 prevê, quanto ao direito de acesso à informação não procedimental, que o acesso aos arquivos e registos administrativos é regulado por lei própria.
Este propósito é presentemente concretizado através da Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, que regula o acesso aos documentos administrativos e à informação administrativa (LADA).
O artigo 5.º, n.º 1, da LADA, reforça o assinalado princípio da administração aberta, prevendo que todos, sem necessidade de enunciar qualquer interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a sua existência e conteúdo.
As restrições ao direito de acesso encontram-se previstas no artigo 6.º da LADA, relevando aqui essencialmente o respetivo n.º 6: “[u]m terceiro só tem direito de acesso a documentos administrativos que contenham segredos comerciais, industriais ou sobre a vida interna de uma empresa se estiver munido de autorização escrita desta ou demonstrar fundamentadamente ser titular de um interesse direto, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido suficientemente relevante após ponderação, no quadro do princípio da proporcionalidade, de todos os direitos fundamentais em presença e do princípio da administração aberta, que justifique o acesso à informação.”
E segundo o respetivo n.º 8, “[o]s documentos administrativos sujeitos a restrições de acesso são objeto de comunicação parcial sempre que seja possível expurgar a informação relativa à matéria reservada.”
Encontra-se reconhecida, por sentença transitada, a titularidade por parte da autora/recorrente de um interesse direto, pessoal, legítimo e constitucionalmente protegido suficientemente relevante, pelo que a restrição ao direito de acesso da recorrente à informação pretendida apenas será de admitir caso o conteúdo do documento esteja sujeito a segredo comercial, ou diga respeito à vida interna da empresa.
O segredo comercial englobará “todas as informações não indiferentes à concorrência, segredos de dados económicos e financeiros ou das estratégias comerciais, segredos dos agentes do fisco sobre a situação económico–financeira das empresas, segredos de negócios, procedimentos e técnicas de fabrico, operações e métodos de trabalho, dados estatísticos confidenciais, ficheiros de clientes, informações sobre lucros e encargos, inventários, resultados de investigação, relações comerciais, relatórios sobre ocupação de mercado, etc.” (Fernando Condesso, O direito à informação administrativa, in Legislação: Cadernos de Ciência de Legislação, 1996, p. 93). Bem como as “técnicas específicas de captação de clientes, os modelos de projeção de rendimentos ou de lucros, aspetos particulares das atividades desenvolvidas por uma empresa (...) as fórmulas ou receitas para preparação de certos produtos intermediários ou finais, (...) os avanços obtidos por uma entidade em qualquer sector económico e que não se encontrem ainda compreendidos nos conhecimentos comuns entre os especialistas da área (...), os desenhos e outras representações de novos produtos ou protótipos” (José Renato Gonçalves, Acesso à Informação das Entidades Públicas, 2002, p. 137).
Ponto é que, da divulgação da informação possa resultar prejuízo para a empresa (cf. Nuno Ruiz, Lei da Concorrência – Comentário Conimbricense, 2013, p. 326; e Lei da Concorrência Anotada, Coord. Carlos Botelho Moniz, 2016, p. 313 ss).
Quanto à vida interna da empresa, relevará “ter adotado este ou aquele modelo de organização, modelos em si, e em abstrato que podem ser mesmo banais, só não sendo público o facto de que uma empresa concreta adotou este ou aquele modelo” (Alexandre Brandão da Veiga, Acesso à informação da administração pública pelos particulares, 2007, p. 110/111).”
De atentar, ainda que posterior ao caso, a relevância do que a propósito da questão do segredo comercial se assinala no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 110/2018, de 10 de dezembro, que designadamente procedeu à transposição da Diretiva (UE) 2016/943, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2016, relativa à proteção de know-how e de informações comerciais confidenciais (segredos comerciais) contra a sua aquisição, utilização e divulgação ilegais. Aí se refere que “[a] Diretiva dos Segredos Comerciais procura harmonizar entre os vários Estados-Membros os níveis de proteção de que deve beneficiar um conjunto diversificado de know-how ou informações de natureza confidencial que hoje assumem uma importância crescente no quadro de uma economia do conhecimento, que faz assentar nas atividades de inovação e investigação um dos motores para o crescimento económico, para o progresso científico e tecnológico, para o emprego e para a competitividade das empresas.
Os segredos comerciais são, hoje em dia, uma das formas mais comummente utilizadas pelas empresas para proteção da sua criação intelectual, sendo valorizados ao ponto de estas os utilizarem muitas vezes como complemento aos direitos de propriedade industrial.
Esta importância que o recurso aos segredos comerciais hoje assume para as empresas de perfil inovador, em particular para as pequenas e médias empresas, contrasta, porém, com um quadro jurídico ainda insuficiente ao nível da União Europeia para proteção do acesso e da exploração desses segredos contra a sua obtenção, utilização ou divulgação ilegal por terceiros, deixando muitas vezes os agentes económicos expostos à utilização indevida do seu capital intelectual.
A Diretiva dos Segredos Comerciais procura dar resposta a esta insuficiência do ordenamento jurídico em vigor, instituindo um conjunto de mecanismos de natureza civil que, sem pôr em causa os direitos e as liberdades fundamentais ou o interesse público, permita prevenir e reprimir práticas ilícitas neste domínio. Seguramente que um quadro legal reforçado, dotado de mecanismos jurídicos equilibrados e eficazes, servirá como um incentivo para que as empresas continuem a utilizar e a explorar com maior segurança os segredos comerciais, encorajando-as a prosseguir as suas atividades de inovação tão necessárias ao bom desempenho das economias e ao progresso social.”
Sem prejuízo do que ficou dito, já se salientou que a restrição ao direito de acesso não assume um carácter absoluto, impondo-se, nos termos previstos no artigo 6.º, n.º 6, da LADA, a ponderação no quadro do princípio da proporcionalidade de todos os direitos fundamentais em presença e do princípio da administração aberta.
Como já anteriormente assinalado, no âmbito desta ponderação estamos perante um poder da Administração vinculado aos princípios e objetivos fixados por lei, que deve ser exercido segundo o princípio da transparência, com explicitação das razões pelas quais a decisão da Administração se orienta num sentido ou noutro (acórdão do TCAS de 05/03/2009, proc. n.º 04256/08, e parecer da CADA n.º 44/2002).
Ora, os elementos respeitantes ao caráter inovador da draga encontram-se sujeitos a segredo comercial, na medida em que respeitam à descrição das características de um produto inovador, criado pela contrainteressada, que lhe proporciona uma vantagem face à concorrência.
No caso vertente, temos a recorrente, enquanto concorrente direta da contrainteressada, a pretender aceder às características de um produto que a contrainteressada criou.
No quadro do princípio da proporcionalidade, resulta evidente que, perante o prejuízo que pode resultar para a contrainteressada em tal divulgação, tem de relevar o seu interesse em manter sujeitos a segredo elementos que lhe permitam manter a referida vantagem face à concorrência.
Já quanto às considerações sobre a concorrência que constam da candidatura da contrainteressada, no âmbito do procedimento em questão, igualmente não procede a argumentação convocada pela recorrente.
Está em causa a estratégia de diferenciação concorrencial da contrainteressada, que respeita à vida interna da empresa, sendo que o seu conhecimento por parte da recorrente acarreta um evidente prejuízo para aquela, enquanto sua concorrente direta.
Como se vê, em todos os elementos truncados a que se pretende aceder estão em causa informações não indiferentes à concorrência.
Neste quadro, o direito de acesso da recorrente necessariamente não assume a relevância a que se reporta o artigo 6.º, n.º 6, da LADA.
Não se vislumbrando em que medida se mostram violados os normativos legais convocados pela recorrente.
Cumpre, pois, concluir que bem andou a decisão sob recurso ao entender que foi dado cumprimento ao ordenado na sentença da intimação.

Em suma, será de negar provimento ao recurso.
*

III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 2 de julho de 2020

(Pedro Nuno Figueiredo)

(Ana Cristina Lameira)

(Paulo Pereira Gouveia)