Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05290/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:02/28/2012
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:FUNDAMENTAÇÃO DOS ACTOS DE AVALIAÇÃO NOS TERMOS DO C.I.M.I.
SISTEMA DE AVALIAÇÕES DO I.M.I.
COEFICIENTES DE AVALIAÇÃO DE ENQUADRAMENTO E ESPECÍFICOS.
COEFICIENTE DE AFECTAÇÃO.
VALOR PATRIMONIAL TRIBUTÁRIO DOS PRÉDIOS URBANOS EM RUÍNAS.
Sumário:1. Sobre a questão da fundamentação dos actos de avaliação nos termos do C.I.M.I., que se traduzem na aplicação da fórmula matemática constante do artº.38, do C.I.M.I., tem sido entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Administrativo, com o qual inteiramente concordamos, que a fundamentação exigível para a aplicação destes valores apenas se pode circunscrever à identificação geográfica/física dos prédios no concelho e freguesia respectivos, à especificação do coeficiente de localização e dos restantes valores referidos e à invocação do quadro legal que lhes é aplicável, dado que estamos perante parâmetros legais de fixação com base em critérios objectivos e claros, bastando a indicação dos respectivos coeficientes legais, bem como a referência do quadro legal aplicável e da forma e motivo pelos quais são concretamente aplicados, para que se compreenda como foram determinados tais coeficientes.
2. O sistema de avaliações do I.M.I. consta dos artºs.38 a 70, do respectivo Código. O objectivo do sistema é determinar o valor de mercado dos imóveis urbanos, a partir de uma fórmula matemática enunciada no artº.38, do C.I.M.I.
3. A avaliação assenta em seis coeficientes, todos eles de carácter objectivo, os quais se podem agregar em dois conjuntos:
a)Os coeficientes macro, de enquadramento ou de contexto - trata-se dos coeficientes que não dependem especificamente de cada prédio individual que vai ser avaliado, mas do contexto económico e urbanístico em que se insere. São factores de variação do valor que não são intrínsecos a cada prédio, mas exteriores, apesar de serem sempre dele indissociáveis. Estes coeficientes aplicam-se, por natureza, a vários prédios e não apenas a um. São eles o valor base dos prédios edificados (Vc) e o coeficiente de localização (CL);
b)Os coeficientes específicos ou individuais - são os que respeitam a características intrínsecas dos próprios imóveis concretamente avaliados. Estamos a falar da área (A), do coeficiente de afectação (Ca), do coeficiente de qualidade e conforto (Cq) e do coeficiente de vetustez (Cv).
4. O coeficiente de afectação (Ca), corresponde ao valor incorporado no imóvel em função da utilização a que está afecto, conforme resulta do artº.41, do C.I.M.I. A lei assenta no pressuposto de que o valor de mercado de um imóvel também é sensível ao tipo de utilização a que o prédio está afecto. O legislador teve o cuidado de tipificar numa tabela, de forma taxativa e fechada, todos os tipos de afectação a que podem estar sujeitos os imóveis, mais quantificando o coeficiente aplicável a cada uma das afectações, conforme consta do quadro que faz parte integrante do citado artº.41, do C.I.M.I.
5. O valor patrimonial tributário dos prédios urbanos em ruínas é determinado como se de terreno para construção se tratasse, de acordo com deliberação da câmara municipal, tudo nos termos do artº.46, nº.4, do C.I.M.I.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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“A...- DISTRIBUIÇÃO ALIMENTAR, S.A.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mma. Juíza do T.A.F. de Almada, exarada a fls.163 a 170 do presente processo, através da qual julgou improcedente impugnação judicial visando acto de fixação de valor patrimonial do prédio inscrito na matriz predial urbana, sob o artigo 1302, da freguesia de Alhos Vedros, concelho de Moita.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.186 a 216 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Vem o presente recurso interposto contra a sentença proferida em 28 de Setembro de 2011, no âmbito do processo de impugnação judicial que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada sob o nº.64/10.9BEALM;
2-Na referida sentença, a Exma. Senhora Juíza “a quo” julgou totalmente improcedente a impugnação judicial apresentada pela ora recorrente contra o resultado da segunda avaliação efectuada ao prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alhos Vedros, sob o artigo 1302, notificado através do ofício nº.6146767, de 20 de Outubro de 2009, do Serviço de Finanças de Moita, que classificou o imóvel como prédio urbano “industrial” e fixou um valor patrimonial definitivo ao referido imóvel de € 2.028.540,00, considerando tal acto tributário controvertido válido e legal;
3-E tal raciocínio encontra sustentação jurídica, no entender da Exma. Senhora Juíza “a quo”, no facto de, por um lado, não proceder o (alegado) vício de falta de fundamentação do acto tributário controvertido invocado pela ora recorrente e, por outro, inexistir erro na classificação do prédio urbano e fixação do respectivo V.P.T., porquanto a avaliação foi efectuada com base nos dados fornecidos pela recorrente na declaração Modelo 1 de I.M.I. apresentada para o efeito;
4-Todavia, ficou aqui devidamente comprovado que o acto tributário sob sindicância está inquinado de vício de forma, por falta de fundamentação, e consequente violação dos artºs.268, nº.3, da C.R.P., 77, nº.1, da L.G.T., e 125, nº.1, do C.P.A., devendo, desde logo, por esse motivo, a sentença de que ora se recorre ser revogada em conformidade, por erro de julgamento;
5-Com efeito, a avaliação efectuada ao prédio, e ora em crise, é totalmente omissa no que respeita à identificação (i) das normas legais aplicáveis na determinação dos vários coeficientes de avaliação e, bem assim, (ii) do critério utilizado pela Administração Tributária na classificação atribuída ao prédio e na fixação dos referidos coeficientes;
6-Por outro lado, a classificação atribuída ao prédio urbano – “Actividade industrial” – não se encontra em concordância com o disposto nos artºs.6 e 46, nº.4, do Código do I.M.I., os quais determinam que os prédios urbanos em ruínas devem ser qualificados sob a categoria de “Outros”;
7-É que à data da transmissão o prédio controvertido submetido à avaliação encontrava-se em ruínas, totalmente destruído, não sendo possível descortinar uma qualquer realidade material ou física susceptível de ser afecta a uma actividade económica (o que subjaz à necessidade da respectiva demolição);
8-No limite, admite-se, por mera cautela de patrocínio, que o prédio em questão poderia ainda ter sido classificado como “terreno para construção”, nos termos do nº.3, do artº.6, do Código do I.M.I., na medida em que o Alvará de Obras de Demolição nº.A-88/2006 emitido pela Câmara Municipal da Moita, é um Alvará “de construção”;
9-Em razão do que, também por força desta circunstância, deverá o acto de avaliação em crise ser anulado, e, consequentemente, revogada a sentença de que ora se recorre por erro de julgamento;
10-A errónea classificação do prédio urbano levou, consequentemente, a um incorrecto cálculo do V.P.T., uma vez que teve por base a fórmula prevista no artº.38, do Código do I.M.I., utilizado na determinação do V.P.T. dos prédios urbanos para “habitação, comércio, indústria e serviços”, ao invés de recorrer ao método de cálculo do V.P.T. dos prédios da categoria “Outros”, previsto no artº.45, do Código do I.M.I., por remissão do artº.46, nº.4, do mesmo diploma legal;
11-Em razão do que, também por força desta circunstância, deverá o acto de avaliação em crise ser anulado, e, consequentemente, revogada a sentença de que ora se recorre, por erro de julgamento, ao violar o disposto nos artºs.6, 14, 15 e 37 a 46, do Código do I.M.I.;
12-Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser julgado procedente, e, assim, revogada a douta sentença recorrida por erro de julgamento, e, consequentemente, ser promovida a sua substituição por outra que determine a anulação do acto de segunda avaliação efectuada ao prédio em propriedade total sem andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alhos Vedros, sob o artigo 1302, nos termos e com os fundamentos nesta sede amplamente demonstrados.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.226 e 227 dos autos), concluindo pelo não provimento do recurso e consequente manutenção da sentença recorrida, a qual não padece dos vícios que lhe são assacados pelo recorrente.
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Corridos os vistos legais (cfr.fls.229 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.164 a 166 dos autos):
1-Em 22/3/2006, foi apresentada a declaração para inscrição ou actualização de prédios urbanos na matriz (modelo 1) em nome de “B...- Supermercados, L.da.”, com referência ao prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alhos Vedros, sob o artigo 1302, por motivo de 1ª. transmissão na vigência do I.M.I. (cfr. documento junto a fls.94 e 95 dos presentes autos; documento junto a fls.72 do processo administrativo apenso);
2-Na declaração mencionada no ponto anterior foi declarado tratar-se de um prédio em propriedade total sem andares nem divisões susceptíveis de utilização independente, afecto a “armazéns e actividade industrial” tendo ainda sido declarada a idade do prédio de 57 anos e a data de 1/1/1949 como data de conclusão das obras (cfr.documento junto a fls.94 dos presentes autos);
3-Com base nos dados inscritos na mod. 1 referida nos pontos anteriores, foi efectuada a 1ª. avaliação do prédio de que resultou o valor patrimonial tributário de € 2.028.540,00 (cfr.documentos juntos a fls.29 e 30 do processo administrativo apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
4-Em 15/5/2006, foi emitida pela Câmara Municipal da Moita o alvará de obras de demolição nº.A-88/2006 – processo nº.01/2006/240, em nome de “B...- Supermercados, L.da.”, aprovando as obras de demolição sobre o prédio inscrito na matriz 1302, da freguesia de Alhos Vedros (cfr.documento junto a fls.102 dos presentes autos);
5-Em 23/6/2009, foi emitida a notificação da avaliação do prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1302 (cfr.documento junto a fls.50 do processo administrativo apenso);
6-Em 6/8/2009, a ora impugnante (após ter incorporado por fusão a sociedade “B...- Supermercados, L.da.”) apresentou requerimento no qual solicita segunda avaliação do prédio invocando erro na determinação do valor patrimonial tributário do prédio inscrito na matriz, sob o artigo 1302 (cfr.documento junto a fls.46 a 49 do processo administrativo apenso);
7-Em 14/10/2009, foi lavrado o termo de avaliação referente à 2ª. avaliação dele constando que os peritos “declaram que tendo visto e examinado por inspecção directa o prédio descrito na relação que lhes foi entregue (...), o avaliaram com a inteira observância de todas as formalidades legais conforme está descrito na ficha de avaliação nº.2875136, do prédio com o artigo de matriz 1302, da freguesia de Alhos Vedros. (...) A comissão de avaliação reuniu-se e deliberou por maioria.
“Trata-se de uma ruína em muito mau estado de conservação” (cfr.documento junto a fls.43 do processo administrativo apenso);
8-Na ficha de avaliação nº.2875136 referente à 2ª. avaliação consta a afectação “armazéns e actividade industrial” e “estado deficiente de conservação”, “anomalias da estrutura e cobertura em mau estado” e na descrição da avaliação consta “trata-se de ruínas em muito mau estado de conservação” tendo sido fixado o valor patrimonial tributário de € 2.028.540,00 (cfr.documentos juntos a fls.40 a 42 do processo administrativo apenso);
9-Em 20/10/2009 foi emitida a notificação da 2ª. avaliação e dirigida à ora impugnante (cfr.documento junto a fls.86 dos presentes autos).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não existem factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do Tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos ao processo e acima expressamente referidos em cada um dos pontos do probatório…”.
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Dado que revela interesse para a decisão do presente recurso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se adita, por isso, ao probatório nos termos do artº.712, nº.1, al.a), do C. P. Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
10-A 2ª. avaliação do imóvel mencionada nos nºs.7 e 8 supra, levou em consideração os seguintes vectores (cfr.documentos juntos a fls.31, 32, 40 e 41 do processo administrativo apenso):

ELEMENTOS DE PRÉDIO EM PROPRIEDADE TOTAL SEM ANDARES NEM DIVISÕES SUSCEPTÍVEIS DE UTILlZAÇÃO INDEPENDENTE

Afectação - Armazéns e actividade industrial
Nº. de pisos - 2
Tipologia/Divisões - 1
Área total do terreno - 7.178,0000 m2
Área de implantação do edifício - 5.921,0000 m2
Área bruta de construção - 11.842,0000 m2
Área bruta dependente - 0,0000 m2
Área bruta privativa - 11.842,0000 m2
Tipo de coeficiente de localização - Indústria
Coeficiente de localização - 1.22

ELEMENTOS DE QUALIDADE E CONFORTO

Descritivo - Coeficiente Observações
25 - Estado deficiente de conservação - 0,050
1 - Anomalias na estrutura -0,025 em mau estado de conservação
2 - Cobertura em mau estado - 0,025 em mau estado de conservação
VALOR PATRIMONIAL TRIBUTÁRIO

Vt* - € 2.028.540,00 = Vc (615,00) x A (8.624,0250) x Ca (0,60) x Cq (0,950) x Cv (0,55)
A = Aa (7.200,0000) + Ab (1.392,6000) + Ac (31,4250) + Ad (0,0000)

Vt = valor patrimonial triburio. Vc = valor base dos prédios edificados. A = área bruta de construção mais a área excedente à área de implantação. Ca = coeficiente de afectação. Cl = coeficiente de localização. Cq = coeficiente de qualidade e conforto. Cv = coeficiente de vetustez. sendo A = Aa + Ab + Ac + Ad, em que Aa - representa a área bruta privativa. Ab - representa as áreas brutas dependentes. Ac - representa a área do terreno livre até ao limite de duas vezes a área de implantação. Ad - representa a área do terreno livre que excede o limite de duas vezes a área de implantaçao.
Tratando-se de terrenos para construção. A = área bruta de construção integrada de Ab.
* Valor arredondado nos termos do nº.2, do Artº.38, do C.I.M.I.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese, julgar improcedente a impugnação deduzida e, em consequência, manter o acto de 2ª. avaliação do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Alhos Vedros, sob o artigo 1302, e objecto do presente processo.
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O recorrente discorda do decidido sustentando em primeiro lugar, como supra se alude, que o acto tributário sob sindicância está inquinado de vício de forma, por falta de fundamentação, e consequente violação dos artºs.268, nº.3, da C.R.P., 77, nº.1, da L.G.T., e 125, nº.1, do C.P.A., devendo, desde logo e por esse motivo, a sentença de que ora se recorre ser revogada em conformidade, por erro de julgamento. Com efeito, a avaliação efectuada ao prédio, e ora em crise, é totalmente omissa no que respeita à identificação (i) das normas legais aplicáveis na determinação dos vários coeficientes de avaliação e, bem assim, (ii) do critério utilizado pela Administração Tributária na classificação atribuída ao prédio e na fixação dos referidos coeficientes (cfr.conclusões 4 e 5 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, supomos, consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida padece de tal vício.
A fundamentação dos actos tributários ou “praticados em matéria tributária” que “afectem os direitos ou interesses legalmente protegidos dos contribuintes” estava consagrada nos artºs.19, al.b), 21, 81 e 82, do C. P. Tributário (cfr.actualmente o artº.77, da L.G.Tributária).
Tal necessidade de fundamentação decorria já, quer do artº.1, nº.1, al.a) e c), do dec.lei 256-A/77, de 17 de Junho, quer do próprio artº.268, nº.3, da C. R. Portuguesa, na redacção introduzida pela Lei Constitucional nº.1/89 (cfr.Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1993, pág.936 e seg.; Vieira de Andrade, O Dever de Fundamentação Expressa dos Actos Administrativos, 1990, pág.53 e seg.).
A fundamentação é um conceito relativo que pode variar em função do tipo legal de acto administrativo que estamos a examinar.
Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final (cfr.ac.S.T.J.26/4/95, C.J.-S.T.J., 1995, II, pág.57 e seg.; A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª. edição, 1985, pág.687 e seg.; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, V, pág.139 e seg.). Quer dizer. Utilizando a linguagem de diversos acórdãos do S.T.A. (cfr.por todos, ac.S.T.A-1ª.Secção, 6/2/90, A.D., nº.351, pág.339 e seg.) o acto administrativo só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto. Mais se dirá que a fundamentação pode ser expressa ou consistir em mera declaração de concordância de anterior parecer, informação ou proposta, o qual, neste caso, constitui parte integrante do respectivo acto (é a chamada fundamentação “per relationem” - cfr.artº.125, do C.P.Administrativo).
No caso “sub judice”, o acto tributário objecto do presente processo encontra-se devidamente fundamentado, tendo sido levado ao conhecimento do impugnante as razões da sua estruturação (cfr.nºs.5 e 9 da matéria de facto provada). E tanto assim é, que o próprio impugnante aos fundamentos do acto de 2ª. avaliação do imóvel alude na p.i.
Do probatório dimana que a fixação do valor patrimonial na 2ª avaliação resultou da aplicação da fórmula de apuramento do valor patrimonial aos factos declarados pela sociedade adquirente do imóvel (e posteriormente incorporada por fusão na impugnante) na ficha mod. 1, designadamente, que se tratava de um imóvel afecto a armazéns e actividade industrial, que a conclusão das obras ocorreu em 01/01/1949 e que o prédio tinha 57 anos, tendo a comissão de avaliação, por maioria, e após vistoria ao local, fixado o valor patrimonial de € 2.028.540,00, nos termos constantes do termo de avaliação e ficha de avaliação, valor patrimonial esse que é idêntico ao fixado na 1ª. avaliação. Igualmente resulta da matéria de facto provada todos os vectores que foram levados em consideração no cálculo do valor patrimonial do imóvel (cfr.nº.10 da matéria de facto provada). Na verdade a determinação do valor patrimonial dos prédios urbanos resulta da fórmula consagrada no artº.38, do C.I.M.I., tendo sido este normativo que também fundamentou a 2ª. avaliação requerida pelo recorrente.
Sobre a questão da fundamentação dos actos de avaliação nos termos do C.I.M.I., que se traduzem na aplicação da fórmula matemática constante do artº.38, do C.I.M.I., tem sido entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Administrativo, com o qual inteiramente concordamos, que a fundamentação exigível para a aplicação destes valores apenas se pode circunscrever à identificação geográfica/física dos prédios no concelho e freguesia respectivos, à especificação do coeficiente de localização e dos restantes valores referidos e à invocação do quadro legal que lhes é aplicável, dado que estamos perante parâmetros legais de fixação com base em critérios objectivos e claros, bastando a indicação dos respectivos coeficientes legais, bem como a referência do quadro legal aplicável e da forma e motivo pelos quais são concretamente aplicados, para que se compreenda como foram determinados tais coeficientes (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, de 1/7/2009, rec.239/09; ac.S.T.A.-2ª.Secção, de 6/7/2011, rec.307/11).
Por outro lado, se acaso não se considerava devidamente esclarecido da fundamentação do acto tributário objecto do presente processo, deveria o recorrente ter feito uso do dispositivo constante do artº.37, nº.1, do C.P.P.Tributário.
Face ao exposto, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente este fundamento do recurso.
Mais argui o recorrente que a classificação atribuída ao prédio urbano – “Actividade industrial” – não se encontra em concordância com o disposto nos artºs.6 e 46, nº.4, do Código do I.M.I., os quais determinam que os prédios urbanos em ruínas devem ser qualificados sob a categoria de “Outros”. A errónea classificação do prédio urbano levou, consequentemente, a um incorrecto cálculo do V.P.T., uma vez que teve por base a fórmula prevista no artº.38, do Código do I.M.I., utilizado na determinação do V.P.T. dos prédios urbanos para “habitação, comércio, indústria e serviços”, ao invés de recorrer ao método de cálculo do V.P.T. dos prédios da categoria “Outros”, previsto no artº.45, do Código do I.M.I., por remissão do artº.46, nº.4, do mesmo diploma legal (cfr.conclusões 6 a 11 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão objecto do presente recurso sofre de tal pecha.
O Imposto Municipal sobre Imóveis, criado pelo Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (I.M.I. - aprovado pelo dec.lei 287/2003, de 12/11), tributo que substituiu a Contribuição Autárquica, deve considerar-se um imposto sobre o património que incide sobre o valor dos prédios situados no território de cada município, dividindo-se, de harmonia com a classificação dos mesmos prédios, em rústico e urbano. O sujeito passivo da relação jurídico-tributária de I.M.I. é aquele que em 31 de Dezembro do ano a que diz respeito o tributo tenha o uso e fruição do prédio, seja proprietário ou usufrutuário, e a matéria colectável do imposto (pressuposto objectivo genérico de qualquer relação jurídico-tributária) é constituída pelo valor tributável dos prédios, o qual consiste no seu valor patrimonial (cfr.preâmbulo e artºs.1, 2, 7 e 8, do C.I.M.I.; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª. edição, 2007, pág.53 e seg.; Esmeralda Nascimento e Márcia Trabulo, Imposto Municipal sobre Imóveis, Notas práticas, Almedina, 2004, pág.15 e seg.).
O sistema de avaliações do I.M.I. consta dos artºs.38 a 70, do respectivo Código. O objectivo do sistema é determinar o valor de mercado dos imóveis urbanos, a partir de uma fórmula matemática enunciada no artº.38, do C.I.M.I., com a seguinte expressão (cfr. José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2011, pág.45 e seg.; Esmeralda Nascimento e Márcia Trabulo, Imposto Municipal sobre Imóveis, Notas práticas, Almedina, 2004, pág.28 e seg.):
Vt = Vc x A x Ca x CL x Cq x Cv
em que:
Vt = valor patrimonial tributário;
Vc = valor base dos prédios edificados;
A = área bruta de construção mais a área excedente à área de implantação;

Ca = coeficiente de afectação;
CL = coeficiente de localização;
Cq = coeficiente de qualidade e conforto;
Cv = coeficiente de vetustez.
A avaliação assenta nestes seis coeficientes, todos eles de carácter objectivo que se podem agregar em dois conjuntos:
1-Os coeficientes macro, de enquadramento ou de contexto - trata-se dos coeficientes que não dependem especificamente de cada prédio individual que vai ser avaliado, mas do contexto económico e urbanístico em que se insere. São factores de variação do valor que não são intrínsecos a cada prédio, mas exteriores, apesar de serem sempre dele indissociáveis. Estes coeficientes aplicam-se, por natureza, a vários prédios e não apenas a um. São eles o valor base dos prédios edificados (Vc) e o coeficiente de localização (CL).
2-Os coeficientes específicos ou individuais - são os que respeitam a características intrínsecas dos próprios imóveis concretamente avaliados. Estamos a falar da área (A), do coeficiente de afectação (Ca), do coeficiente de qualidade e conforto (Cq) e do coeficiente de vetustez (Cv).
O coeficiente de afectação corresponde ao valor incorporado no imóvel em função da utilização a que está afecto, conforme resulta do artº.41, do C.I.M.I. A lei assenta no pressuposto de que o valor de mercado de um imóvel também é sensível ao tipo de utilização a que o prédio está afecto. O legislador teve o cuidado de tipificar numa tabela, de forma taxativa e fechada, todos os tipos de afectação a que podem estar sujeitos os imóveis, mais quantificando o coeficiente aplicável a cada uma das afectações, conforme consta do quadro que faz parte integrante do citado artº.41, do C.I.M.I. e que infra segue:
(redacção aplicável ao caso “sub judice” que resulta da Lei 53-A/2006, de 29/12).
Na aplicação do coeficiente de afectação deve levar-se em consideração a classificação dos prédios urbanos que resulta do artº.6, nº.2, do C.I.M.I., norma que estabelece como critérios a eleger, tendo em vista a classificação dos prédios, em primeiro lugar, o licenciamento e, em segundo lugar, na falta de licenciamento, o destino normal do imóvel. A lei é relativamente rígida consagrando neste normativo, como critério primeiro de classificação do imóvel, a afectação do mesmo resultante do licenciamento efectuado e, na falta de licenciamento, surgindo o destino normal do imóvel como critério supletivo de aplicação.
Já no artº.41, do C.I.M.I., no que diz respeito à determinação do coeficiente de afectação, o legislador dá relevo ao tipo de utilização do prédio edificado de acordo com o quadro identificado acima. Ou seja, quando o objectivo é determinar o coeficiente de afectação, o legislador chama à colação a efectiva utilização do imóvel ou, com mais rigor, o fim a que está afecto no momento em que se procede à sua avaliação, tudo de acordo com a tipologia identificada supra (cfr.José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2011, pág.81).
“In casu”, conforme resulta da matéria de facto provada, o imóvel avaliado foi identificado pelo sujeito passivo na declaração para inscrição ou actualização de prédios urbanos na matriz (modelo 1) como estando afecto a “armazéns e actividade industrial” (cfr.nºs.1 e 2 da matéria de facto provada), com base em tal utilização se tendo avaliado o mesmo (cfr.nºs.8 e 10 da matéria de facto provada).
Pelo que, para efeitos de atribuição do coeficiente de afectação (Ca), o imóvel em causa há-de classificar-se como destinado a armazéns e actividade industrial, levando em consideração o fim a que estava afecto no momento em que se procedeu à sua avaliação. Portanto o coeficiente a aplicar ao caso concreto será 0,60 (armazéns e actividade industrial), como bem entendeu a sentença recorrida.
Ainda no exame deste fundamento do recurso aduz o recorrente que os artºs.6 e 46, nº.4, do Código do I.M.I., determinam que os prédios urbanos em ruínas devem ser qualificados sob a categoria de “Outros”. No caso concreto, levando em consideração que o imóvel a avaliar se encontrava em ruínas, deveria recorrer-se ao método de cálculo do V.P.T. dos prédios da categoria “Outros”, previsto no artº.45, do Código do I.M.I., por remissão do artº.46, nº.4, do mesmo diploma legal.
Não concordamos com a tese defendida pela recorrente.
Expliquemos porquê.
Antes de mais, dir-se-á que é hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.9, do C. Civil; artº.11, da L.G.Tributária; José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, Editorial Verbo, 4ª. edição, 1987, pág.335 e seg.; J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1989, pág.181 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de C.T.Fiscal, nº.174, 1996, pág.363 e seg.).
O regime de avaliação do valor patrimonial dos terrenos para construção está consagrado no artº.45, do C.I.M.I. O modelo de avaliação é igual ao dos edifícios construídos, embora partindo-se do edifício a construir, tomando por base o respectivo projecto. É que o valor do terreno para construção corresponde, fundamentalmente, a uma expectativa jurídica, consubstanciada num direito de nele se vir a construir um prédio com determinadas características e com determinado valor. Será essa expectativa de produção de uma riqueza materializada num imóvel a construir que faz aumentar o valor do património e a riqueza do proprietário do terreno para construção, logo que o imóvel em causa passa a ser considerado como terreno para construção. Por essa razão, quanto maior for o valor do prédio a construir, maior é o valor do terreno para construção que lhe está subjacente (cfr.artº.6, nº.3, do C.I.M.I.).
Diz-nos o mencionado artº.45, do C.I.M.I., sob a epígrafe:

“Valor patrimonial tributário dos terrenos para construção”

1 - O valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é o somatório do valor da área de implantação do edifício a construir, que é a situada dentro do perímetro de fixação do edifício ao solo, medida pela parte exterior, adicionado do valor do terreno adjacente à implantação.
2 - O valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas.
3 - Na fixação da percentagem do valor do terreno de implantação têm-se em consideração as características referidas no nº.3, do artº.42.
4 - O valor da área adjacente à construção é calculado nos termos do nº.4, do artº.40.

Fazendo a exegese da norma dir-se-á que o legislador, na avaliação dos terrenos para construção, manda separar duas partes do terreno.
Em primeiro lugar a parte do terreno onde vai ser implantado o edifício a construir. A área de implantação do edifício a construir é a que se situa dentro do perímetro previsto de fixação do edifício a construir ao solo. Para se determinar o valor dessa parte do terreno é necessário proceder-se à avaliação do edifício a construir, como se já estivesse construído. Para tal utiliza-se o projecto de construção aprovado e na área não se considera, naturalmente a área do terreno livre nem a área do terreno excedente. Efectuada essa determinação do valor, reduz-se o valor apurado a uma percentagem entre 15% e 45%, como prevê o nº.2 da norma. Esta redução justifica-se pelo facto do prédio não estar ainda construído.
Em segundo lugar, o valor do terreno adjacente à área de implantação. O valor desta parte do terreno é apurado da mesma forma que se determina o valor da área do terreno livre e da área do terreno excedente para efeitos de qualquer imóvel urbano, assim levando em consideração os ditames previstos no artº.40, nº.4, do C.I.M.I. Assim o prevê expressamente o nº.4 da norma.
A determinação da percentagem a aplicar na avaliação dos terrenos para construção, que é aposta para a determinação do valor da área de implantação do edifício, será efectuada nos termos do nº.3 da norma sob exame, para tanto se devendo utilizar a mesma metodologia prevista no artº.42, nº.3, do C.I.M.I.
Tomando em consideração a metodologia antes referida, a administração fiscal utiliza a seguinte fórmula matemática de avaliação dos terrenos para construção:

VPT = Vc x [(Aa + Ab) x % + (Ac + Ad)] x Ca x CL x Cq

Atento o referido, deriva da lei, quando estabelece que o valor da área da implantação é determinado em função do valor das edificações autorizadas ou previstas, e esse só pode ser o que resulta da aplicação do sistema geral de avaliações de prédios urbanos ao projecto de construção em causa na avaliação do valor patrimonial dos terrenos para construção (cfr.José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2011, pág.100 e seg.).
Em conclusão, na avaliação dos terrenos para construção (cfr.artº.45, do C.I.M.I.) o legislador quis que fosse aplicada a metodologia de avaliação dos prédios urbanos em geral, assim se devendo levar em consideração todos os coeficientes supra identificados, nomeadamente o coeficiente de afectação previsto no artº.41, do C.I.M.I., mais resultando tal imposição legal do nº.2, do artº.45, do C.I.M.I., ao remeter para o valor das edificações autorizadas ou previstas no mesmo terreno para construção.
Mais se dirá que o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos em ruínas é determinado como se de terreno para construção se tratasse, de acordo com deliberação da câmara municipal, tudo nos termos do artº.46, nº.4, do C.I.M.I. Assim sendo, mesmo considerando-se que estaríamos perante prédio urbano em ruínas (o que não é o caso, levando em consideração a matéria de facto provada - cfr.nºs.8 e 10 da matéria de facto provada), também o seu valor patrimonial tributário seria determinado de acordo com as regras acima explanadas relativas aos terrenos para construção, com a aplicação subsidiária da metodologia de avaliação dos prédios urbanos em geral.
Face ao exposto, sem necessidade de mais amplas considerações, improcede o vício assacado à sentença objecto de recurso e sob apreciação.
Atento tudo o relatado, deve confirmar-se a sentença recorrida e julgar improcedente o recurso deduzido, embora com a presente fundamentação, ao que se procederá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 28 de Fevereiro de 2012



(Joaquim Condesso - Relator)
(Lucas Martins - 1º. Adjunto)

(Magda Geraldes - 2º. Adjunto)