Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
A....., Lda. e A....., Lda., devidamente identificadas como Autoras nos autos de acção de contencioso pré-contratual, instaurados contra o Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E. e R....., Lda., B....., Lda., I..... (I.....), S.A. e S....., Lda., na qualidade de contra-interessadas, inconformadas, vieram interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 14.8.2020, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que decidiu julgar a acção improcedente e, em consequência, absolveu a entidade demandada dos pedidos.
Na acção as ora Recorrentes peticionaram:
«a) ser declarado nulo, ou caso assim não se entenda, anulado o Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E. (Doc. 1).
b) ser a Entidade Demandada condenada a praticar ato administrativo consubstanciado na declaração de caducidade da adjudicação da proposta das Contrainteressadas R....., B..... e I.....;
c) ser a Entidade Demandada condenada a praticar ato administrativo, no qual, simultaneamente i) determine a exclusão da proposta da Contrainteressada S..... e ii) adjudique a proposta das Autoras.
d) ser fixado o prazo de 10 dias para o cumprimento das condenações determinadas em b) e c).».
Nas alegações de recurso as Recorrentes formularam as conclusões que seguidamente se reproduzem:
“1.ª Os presentes autos respeitam a um concurso para a aquisição de “Reagentes para a Realização de Química Clínica e Imunoquímica”, desencadeado pelo CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO DO ALGARVE, EPE., em que foi adjudicatário o agrupamento constituído pelas Contrainteressadas R....., B..... e I.....;
2.ª Não obstante, no “Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E”, celebrado a 11/11/2019 na sequência dessa adjudicação, figura como contraente público o CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO DO ALGARVE, EPE e como cocontratante, exclusivamente, a R....., LDA. (cfr. Doc. 1 junto com a petição inicial);
3.ª Na sua contestação, as Contrainteressadas R....., B..... E I..... vieram juntar aos autos um contrato – o “Aditamento a Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E” (cfr. Doc. 2 junto com a contestação), celebrado em 19/02/2020 - através do qual a B..... E A I..... “declaram, para todos os efeitos legais, que se consideram vinculados a todos os termos do Contrato [“Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E”, celebrado a 11/11/2019] desde a data da sua celebração”;
4.ª Na sentença recorrida, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra veio reconhecer que o “contrato para fornecimento de bens teria de ser assinado por todos os membros do consórcio, vinculando todos e cada um às prestações a efectuar ao Centro Hospitalar do Algarve no âmbito da execução contratual”;
5.ª Entendeu, contudo, que a invalidade daí resultante ficou sanada com o “Aditamento a Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E”, que representa “a aplicação do instituto da ratificação, previsto no artigo 268.º do Código Civil”, considerando que esta norma é aplicável ao caso em apreço porque “o regime previsto no Código Civil é transversal ao ordenamento jurídico e nessa ordem aplicável a todos os negócios, desde que não expressamente afastado por regime especial”;
6.ª Assim, defendendo que o referido Aditamento configura uma ratificação do “Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E”, celebrado a 11/11/2019, o Tribunal “a quo” concluiu que “não subsistem assim motivos para considerar que o adjudicatário não tenha comparecido no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato, atendendo, desde logo, aos efeitos retroactivos da ratificação”;
7.ª Neste quadro, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra decidiu “que não subsistem fundamentos para a invalidação do contrato que, ratificado, é válido e, consequentemente, a adjudicação não caducou” e que “mantendo-se a adjudicação, ficam prejudicadas as questões referentes à exclusão da proposta apresentada pela S..... e à condenação no acto que adjudique a proposta apresentada pelas autoras”.
8.ª Sucede que esta decisão – e os pressupostos em que assenta – padecem de um conjunto de erros de julgamento, que justificam que este Tribunal revogue a decisão recorrida;
9.ª Em primeiro lugar, a decisão recorrida erra ao considerar que a circunstância de o “Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E” ter sido celebrado apenas pela Contrainteressada R..... – e não pode todos os membros do agrupamento de pessoas coletivas que apresentou a proposta adjudicada – configura um vício que pode ser sanado por aplicação do instituto da ratificação do negócio jurídico, previsto no artigo 268.º do Código Civil.
10.ª A questão do direito aplicável aos contratos que configurem relações jurídicas contratuais administrativas – como é o caso do contrato que é objeto dos presentes autos – é regulada nos artigos 279.º e 280.º do CCP, dos quais resulta que:
i) Os contratos administrativos são regidos, em primeiro lugar, “pelas cláusulas e demais integrantes do contrato que sejam conformes com a Constituição e a lei” (artigo 279.º);
ii) Quando as cláusulas contratuais não resolvam a questão colocada, será aplicável o regime administrativo geral e, eventualmente, o regime administrativo especial que esteja previsto na Parte III do CCP (artigo 280.º, n.º 1);
iii) Se estiverem em causa aspectos não regulados nesses regimes, será então convocada a “demais legislação administrativa ou lei especial” (cfr. artigo 280.º, n.º 4);
iv) Se inexistirem outras normas administrativas aplicáveis, haverá que proceder à “aplicação dos princípios gerais de direito administrativo” (cfr. artigo 280.º, n.º 4); e
v) Só por fim, num último escalão, de aplicação subsidiária, poderá haver lugar à aplicação, com as necessárias adaptações, do “direito civil” (cfr. artigo 280.º, n.º 4).
11.ª Não é verdade, portanto, que, como referiu o Tribunal “a quo” o “regime previsto no Código Civil” seja “transversal ao ordenamento jurídico e nessa ordem aplicável a todos os negócios, desde que não expressamente afastado por regime especial”: as normas do direito civil não são aplicáveis primariamente aos contratos administrativos, no sentido em que só deixam de disciplinar estes contratos se existir alguma norma administrativa que expressamente o proíba ou afaste; as normas de direito civil são normas subsidiárias, que ocupam um último patamar de direito regulatório dos contratos administrativos, e que só devem ser convocadas se inexistir, em absoluto, qualquer regra de direito público – seja ele contratual ou geral – que possa ser aplicada;
12.ª Ora, no caso em apreço, essa regra claramente existe: com efeito, a situação jurídica que carece de regulação na situação vertente é, simplesmente, a de saber o que sucede quando, sendo o adjudicatário um agrupamento de pessoas coletivas, no momento da celebração de um contrato administrativo não comparecem todos os membros desse agrupamento (ou um deles com poderes para vincular os restantes);
13.ª Com efeito, a solução jurídica para esta situação está expressamente regulada no direito público, mais propriamente no artigo 105.º, n.º 1, alínea a) do CCP: se o adjudicatário não comparecer no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato, por facto que lhe seja imputável (como é o caso), a adjudicação caduca;
14.ª Esta norma afasta em absoluto a possibilidade prevista no artigo 268.º, n.º 1 do Código Civil, que é a de alguém sem poderes de representação celebrar um negócio jurídico em nome de outrem, podendo esse outrem mais tarde ratificar esse negócio para que ele produza efeitos;
15.ª Sabendo a entidade adjudicante que a pessoa que comparece para celebrar o contrato não é o adjudicatário – como sabia o Centro Hospitalar no caso em apreço, pois só a R..... compareceu no dia 11/11/2019 para celebrar o “Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E” e não invocou estar a representar os restantes membros do agrupamento (cfr. Doc. 1 junto à petição inicial) – aquela entidade adjudicante não podia fazer outra coisa que não declarar a caducidade da adjudicação;
16.ª O que certamente não podia – face ao disposto no artigo 105.º, n.º 1, alínea a) do CCP – era celebrar o contrato com a pessoa que não é adjudicatário – porque este é formado por várias pessoas e a que compareceu não representa todos os membros do agrupamento - e ficar dependente de os restantes membros virem posteriormente (se assim o pretenderem) ratificar o negócio;
17.ª Neste quadro jurídico, o instituto da ratificação – que serve, no direito civil, como uma legitimação superveniente do representante – é evidentemente inaplicável à celebração de contratos administrativos neste contexto, pela simples razão de que a lei não admite que o contraente público (e a prossecução do interesse coletivo prosseguido pelo contrato) fiquem submetidos a essa eventual legitimação superveniente, ou seja, não admite que esses contratos sejam celebrados vinculando apenas parte dos membros do adjudicatário, quando o adjudicatário seja um agrupamento de pessoas coletivas;
18.ª Em suma, o Tribunal “a quo” considerou, e bem, que o “contrato para fornecimento de bens teria de ser assinado por todos os membros do consórcio, vinculando todos e cada um às prestações a efectuar ao Centro Hospitalar do Algarve no âmbito da execução contratual”, mas errou claramente ao admitir que, no caso em apreço, o vício decorrente da ausência na data de celebração e falta de assinatura do contrato por todos os membros do agrupamento foi sanado por ratificação através do “Aditamento a Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E”, celebrado em 19/02/2020;
19.ª Não sendo aplicável o instituto da ratificação, este Tribunal não poderá deixar de concluir que (i) o “Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E” é inválido e que (ii) a Recorrida deve ser condenada a praticar o ato administrativo consubstanciado na declaração de caducidade da adjudicação da proposta das Contrainteressadas R....., B..... E I....., como exige o artigo 105.º, n.º 1, alínea a) do CCP;
20.ª Mas ainda que se admitisse que o instituto privatístico da ratificação pudesse ser aplicado ao caso em apreço – o que por mera cautela de patrocínio se admite -, a decisão recorrida não deixaria de incorrer num erro de julgamento no que respeita aos efeitos que o Tribunal “a quo” atribuiu a essa ratificação;
21.ª Com efeito, sustenta-se na sentença recorrida que “não subsistem assim motivos para considerar que o adjudicatário não tenha comparecido no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato, atendendo, desde logo, aos efeitos retroactivos da ratificação”; é com base neste entendimento sobre os efeitos da ratificação que o Tribunal “a quo”, logo em seguida, conclui que “não subsistem fundamentos para a invalidação do contrato que, ratificado, é válido e, consequentemente, a adjudicação não caducou”;
23.ª Ora, a ratificação só tem um efeito jurídico: tornar eficaz o negócio jurídico ineficaz por ter sido celebrado sem poderes de representação; de facto, nos termos do n.º 1 do artigo 268.º do Código Civil, a regra é a de que “o negócio jurídico que uma pessoa, sem poderes de representação, celebre em nome de outrem é ineficaz em relação a este”; só assim não sucederá se, de acordo com parte final do mesmo preceito, o negócio for ratificado;
24.ª Como é evidente, o efeito do ato jurídico ratificação não é o de se considerar – como erradamente entende o Tribunal “a quo” – que os membros do agrupamento que não compareceram na data da assinatura (a B..... E A I.....) na verdade estiverem presentes nessa assinatura; caso a ratificação fosse aplicável à situação vertente (o que já se explicou não ser possível), ela teria como única consequência a de conferir eficácia a um contrato – o “Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E” – que o Código Civil, no n.º 1 do artigo 268.º, sancionava com a ineficácia;
25.ª Ao contrário do que se defende na decisão recorrida, a ratificação não tem por efeito – nem nunca poderia ter – o de criar ou ficcionar uma realidade – a de que os representantes da B..... E I..... estavam presentes na data (11/11/2019) fixada para a celebração do contrato – que na verdade não se verificou;
26.ª Ora, se, mesmo aplicando o instituto da ratificação, não existe forma de alterar a realidade – factual e juridicamente imutável - de que os representantes da B..... E I..... não estiveram presentes nessa data, então não se poderá deixar de aplicar a consequência prevista na ordem jurídica para esse facto: a caducidade da adjudicação porque o adjudicatário, por facto que unicamente lhe é imputável, não compareceu no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato;
27.ª Se a caducidade da adjudicação se impõe, então, ao contrário do que entendeu o Tribunal “a quo”, “subsistem fundamentos para a invalidação do contrato”;
28.ª Comprovados os erros de julgamento da decisão recorrida, não poderá deixar de concluir-se que o “Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E” foi celebrado exclusivamente com a Contrainteressada R....., que não é adjudicatária, porquanto a proposta adjudicada fora apresentada por um agrupamento; essa falta de identidade subjetiva entre o adjudicatário e o co-contratante implica, necessariamente, a invalidade do contrato celebrado;
29.ª Deve entender-se que esse contrato foi celebrado com preterição total do procedimento legalmente exigido, pelo que padece de nulidade, nos termos conjugados do artigo 284.º, n.º 2 do CCP e 161.º, n.º 2, alínea l) do CPA;
30.ª Mesmo que se entendesse que inexiste fundamento para nulidade, a norma prevista no artigo 20.º do CCP determina, de forma injuntiva, a necessidade de adotar um procedimento de concurso público para escolha do co-contratante, pelo que a celebração do contrato em causa nos autos com a Contrainteressada R..... sem que tal procedimento haja sido percorrido implica a violação daquela norma, bem como de todas as restantes normas do CCP que regulam a referida forma procedimental.
31.ª Por outro lado, as normas conjugadas dos artigos 54.º, n.º 4, 77.º e 105.º, n.º 1 do CCP e 11.º do Programa do Procedimento determinam, injuntivamente, que quando o adjudicatário seja um agrupamento de concorrentes o contrato seja celebrado não apenas com um dos seus membros, individualmente considerado, mas com o agrupamento complementar de empresas ou o consórcio externo constituído por todos eles;
32.ª Deste modo, o contrato será sempre e em qualquer caso, pelo menos, anulável, nos termos do artigo 284.º, n.º 1 do CCP;
33.ª Impõe-se, assim, que sejam declarados procedentes os pedidos de (i) declaração de nulidade ou anulação do “Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E” e (ii) condenação da Recorrida a praticar o ato administrativo consubstanciado na declaração de caducidade da adjudicação da proposta das Contrainteressadas R....., B..... E I.....; mas esta não devem ser as únicas decisões a tomar por este Tribunal que, no exercício dos poderes conferidos pelo artigo 149.º do CPTA, deve decidir a causa, apreciando os restantes pedidos formulados pelos Recorrentes na petição inicial (cuja apreciação o Tribunal “a quo” considerou prejudicada);
34.ª Ora, por força da declaração de caducidade da adjudicação, impõe-se à Entidade Demandada que proceda à exclusão da proposta da Contrainteressada S....., porquanto esta viola aspetos subtraídos à concorrência pelo Caderno de Encargos e não integra documentos obrigatórios;
35.ª Com efeito, a proposta apresentada pela Contrainteressada S..... viola o disposto no n.º 1 do artigo 4.º das disposições técnicas do Caderno de Encargos, de acordo com a qual “os concorrentes deverão apresentar obrigatoriamente os equipamentos adequados à boa execução dos testes, de modo a realizar no mínimo 70% dos testes colocados a concurso. Os restantes testes, que não possam ser realizados nesses equipamentos, serão realizados a cargo do adjudicatário”;
36.ª Tal proposta incumpre igualmente as disposições técnicas do Caderno de Encargos que exigiam que os sistemas automáticos de processamento préanalítico da Unidade de Faro e da Unidade de Portimão permitissem “processar amostras de vários tipos (soro, plasma e urina)” (cfr. a alínea j) do n.º 4 do artigo 5.º do Caderno de Encargos e a alínea g) do n.º 5 do artigo 5.º das respetivas disposições técnicas);
37.ª A proposta da Contrainteressada S..... não indica ainda a disposição dos sistemas de tratamento de água e das centrífugas nas unidades de Faro e Portimão, conforme exigido pelo ponto x) da alínea c) do n.º 1 do artigo 5.º do Programa de Procedimento, conjugado com os artigos 11.º e 12.º das disposições técnicas do Caderno de Encargos;
38.ª E por fim um outro fundamento para a exclusão da proposta da Contrainteressada S..... reside no facto de a mesma não incluir o plano de disposição de equipamentos previsto no ponto x da alínea c) do n.º 1 do artigo 5.º do Programa de Procedimento, relativamente à Unidade de Lagos;
39.ª Excluída a proposta da Contrainteressada S....., a proposta das Autoras ficará ordenada em 1.º lugar, razão pela qual a Entidade Demandada se encontra legalmente vinculada a adjudicá-la, nos termos do artigo 105.º, n.º 2 do CCP, devendo este Tribunal determinar a prática desse ato.».
Requerendo a final:
«Nestes termos, e nos melhores de Direito, sempre com o douto suprimento de V. Ex.as, deve o recurso interposto julgado procedente, por provado, sendo revogada a sentença recorrida e substituída por outra que:
a) Declare nulo, ou caso assim não se entenda, anule o Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve E.P.E. (Doc. 1 junto com a petição inicial);
b) Condene a Entidade Demandada a praticar ato administrativo consubstanciado na declaração de caducidade da adjudicação da proposta das Contrainteressadas R....., B..... E I.....;
c) Condene a Entidade Demandada a praticar ato administrativo, no qual, simultaneamente i) determine a exclusão da proposta da Contrainteressada S..... e ii) adjudique a proposta das Recorrentes.».
O Recorrido, apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:
“A) A douta sentença proferida pelo TAF de Sintra não merece uma qualquer censura, sendo que, deverá ser mantida e melhor conservada na nossa OJ.
B) Interessantemente, essa versada decisão jurisdicional esvaziou, de forma absolutamente adequada e, sábia, todos os sonhados vícios que são repetidos neste “novo” recurso, decretando que, inexiste uma qualquer caducidade da Adjudicação, com todas as consequências jurídicas que daí resultam para a fraca narrativa das recorrentes e, que está votada a mais um fracasso como tantos outros. Enfim…
C) Taxativamente, reconhecer que, o Aditamento carreado para os presentes autos e que foi apresentado pela entidade demandada tem toda a capacidade legal de afastar a ensaiada caducidade da Adjudicação injustamente pretendida pelas recorrentes, sendo que, a fundamentação do Tribunal a quo está em perfeita linha com a LEX.
D) Isto sem nunca olvidar que, “in casu” da própria e vasta documentação que compõe o p.a.i. resulta e claro que, preexistem dois instrumentos de Mandato designando, como Representante Comum desse Agrupamento Adjudicatário a empresa “R..... Lda,”.
E) Também, não descuramos que, no ofício datado de 23 de dezembro de 2019, o aqui Recorrido expediu realmente o contrato que foi celebrado para essa Representante Comum na justa sequência do procedimento CP n.º 21/2370/2015 fazendo aí e logo uma alusão expressa, pelo que, a outorgante R..... surge na veste de Representante desse Agrupamento Vencedor, como aliás, um qualquer homem médio não duvidará.
F) Além de que, o Recorrido CHUA diligenciou e, obteve logo a total e a retroactiva ratificação das outras duas empresas que integram esse Agrupamento Adjudicatário, pelo que, esse documento confirmativo teve efetivamente a cabal virtualidade de certificar e, de ainda, melhor atestar que o contrato foi celebrado em 11/11/2019 com todo o Agrupamento Vencedor do procedimento concursal em causa liderado “ab initio” e, sempre com a empresa R......
G) Sendo assim como o foi, fácil é de alcançar que, pela acrescida força jurídica deste Aditamento ficou totalmente desmontada toda a ambição das Recorrentes e, paralelamente, fica plenamente descartada a inopinada cobiça de voltar a pôr em causa o que ficou já bem assente e, melhor julgado (nesse CPI de 2015) até por esse Colendo TCAS.
H) O recorrido CHUA, considera que, o Exmo. TAF de Sintra sentenciou e, bem que, tudo ficou sanada com o “Aditamento a Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar Universitário do Algarve E.P.E”, que representa “a aplicação do instituto da ratificação, previsto no artigo 268.º do Código Civil”.
I) Até porque, é para nós incontornável talqualmente o foi para o Exmo. TAF que “esta norma é aplicável ao caso em apreço, na medida em que, “o regime previsto no Código Civil é transversal ao ordenamento jurídico e nessa ordem aplicável a todos os negócios, desde que não expressamente afastado por regime especial”.
J) Dito de um outro jeito: o mencionado Aditamento configurou uma genuína e bem energética ratificação do “Contrato para Fornecimento de Reagentes ao Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E”, celebrado a 11/11/2019, pelo que, não subsistem assim motivos para considerar que o adjudicatário não tenho comparecido no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato, atendendo, desde logo, aos efeitos retroativos da ratificação como consta aliás, da muito boa decisão de primeira instância que fazemos nossa e das regras da normalidade e da experiencia comum.
K) Secundando essa quão acertada sentença, recapitulamos que, por força do disposto no elencado artigo 268.º, do Código Civil, os efeitos da presença isolada e da assinatura do contrato somente pela empresa R..... no dia, hora e local inicialmente fixados, foram colmatados à posteriori pela firme e pronta ratificação dos restantes dois membros do consórcio, havendo uma verdadeira eficácia retroactiva apta a sanar a irregularidade do negócio decorrente da insuficiência da representação como aliás, será bom de concluir.
L) Doutro passo, teremos que, sufragar “in totum” “que não podem subsistir fundamentos juridicamente sérios para a invalidação deste contrato final que, ratificado, é válido e, consequentemente, a adjudicação não caducou de todo como as recorrentes deviam saber, rectius, sabem.
M) Sendo, assim, muito seguro que, mantendo-se a adjudicação como bem decidiu o TAF, então, ficam irremediavelmente prejudicadas todas as outras ultrapassadas questões atinentes à exclusão da proposta apresentada pela S..... e à condenação do CHUA no acto que adjudique a proposta apresentada pelas recorrentes como é bem perfilhado na douta decisão que aliás, já fizemos nossa.
N) Ademais, resta-nos ainda, assinalar que, neste Centro Hospitalar Público (CH) optamos, por regra, por procedimentos absolutamente abertos e não discriminatórios como foi justamente o caso, sendo que, a adjudicação ao agrupamento liderado pela “R.....” deve ser rigorosamente conservada, pelo que, a interposição deste novo e extenso recurso impede que seja conseguida uma poupança de montantes pecuniários estatais nesta importante área.».
As Recorridas R....., B..... e I..... apresentaram contra-alegações, invocando que as Recorrentes não cumpriram o ónus de alegação e de conclusão, e pugnando pela improcedência do recurso.
O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, não emitiu parecer.
Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. o nº 2 do artigo 36º do CPTA), o processo vem à Conferência para julgamento.
As questões suscitadas pelas Recorrentes, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consistem, no essencial, em saber se a sentença recorrida padece de erros de julgamento de direito ao entender que a invalidade resultante de o Contrato de fornecimento, celebrado na sequência do acto de adjudicação a favor do Consórcio formado pela R....., B..... e I....., ter como co-contratante privado apenas a R....., ficou sanada com o Aditamento a esse Contrato, por ratificação, nos termos do artigo 268º do CC.
E se, pelo contrário, se concluir que a adjudicação caducou e o contrato celebrado é inválido, é de conhecer dos restantes pedidos formulados na petição inicial, cuja apreciação o tribunal recorrido considerou prejudicada, que passam por excluir a proposta da contra-interessada S..... por violadora das disposições técnicas do Caderno de Encargos e ordenar a proposta das Recorrentes em 1º lugar, com direito à adjudicação.
A título prévio, é de apreciar se, como alegam as Recorridas, as Recorrentes se limitaram a repetir argumentos já esgrimidos em 1ª instância, não cumprindo com o ónus previsto no nº 2 do artigo 639º do CPC, ex vi o artigo 140º do CPTA.
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
«A) O Centro Hospitalar do Algarve publicitou a abertura de um concurso público para “aquisição de reagentes para a realização de química clínica e imunoquímica”, em 25.06.2015 (cf. anúncio n.º 3892/2015, publicado em DR, II série, n.º 122);
B) O artigo 11.º do programa do procedimento estabeleceu o seguinte: «Em caso de adjudicação, todos os membros do agrupamento, e apenas estes, devem associar-se, antes da celebração do contrato, na modalidade jurídica de Agrupamento Complementar de Empresas» (cf. p. 29 do proc. instrutor, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163836);
C) O artigo 4.º, n.º 1, das disposições técnicas do caderno de encargos do procedimento dispunha o seguinte: «os concorrentes deverão apresentar obrigatoriamente os equipamentos adequados à boa execução dos testes, de modo a realizar no mínimo 70% dos testes colocados a concurso. Os restantes testes, que não possam ser realizados nesses equipamentos, serão realizados a cargo do adjudicatário» (processo instrutor – a p. 10 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163837);
D) O artigo 5.º, n.º 4, al. J) e n.º 5, al. g), das disposições técnicas do Caderno de Encargos dispunham o seguinte:
«(…) Artigo 5.º
Características técnicas dos equipamentos e reagentes (…)
4 – As características técnicas mínimas do sistema automático de processamento pré-analítico da Unidade de Faro são as seguintes:
(…)
j) Possibilidade de processar amostras de vários tipos (soro, plasma e urina)
(…).
5 – As características técnicas mínimas do sistema automático de processamento pré-analítico da Unidade de Portimão são as seguintes:
(…)
g) Possibilidade de processar amostras de vários tipos (soro, plasma e urina)
(…)»
(cf. a p. 13 e 14 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163837);
E) O artigo 11.º e 12.º das disposições técnicas do caderno de encargos dispunham o seguinte:
«(…) Artigo 11.º
Características das Unidades de Portimão e Lagos (…)Artigo 12.º
Características das Unidades de Faro (cf. a p. 17 e 18 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163837);
F) O artigo 5.º, n.º 1, al. c), ponto x), do programa do procedimento, dispunha o seguinte:
«(…) Artigo 5.º
Documentos que constituem a proposta 1. As propostas devem ser constituídas com os seguintes documentos:
(…)
c) Documento exigidos pelo programa do procedimento que contenham os termos ou condições, relativos a aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule, designadamente:
x) Plano de disposição de equipamentos analíticos, pré-analíticos e de suporte (quando aplicável) e das bancadas das áreas de Química Clínca e Imunoquímica para o Centro Hospitalar do Algarve, EPE, Unidade de Faro, de Portimão e Lagos de acordo com as plantas em anexo.
(…)»
(cf. a p. 26 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163836);
G) Em anexo às peças do procedimento constam as plantas da Unidade de Faro e da Unidade de Portimão (cf. a p. 24, 25 e 26 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163837);
H) A A....., Lda. e a A....., apresentaram proposta no procedimento (processo instrutor – a p. 1 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177102);
I) As empresas R....., B..... e I..... apresentaram uma proposta conjunta no procedimento concursal referido (cf. processo instrutor);
J) A S....., Lda. apresentou proposta no procedimento (processo instrutor – a p. 1 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177113);
K) A S..... integrou na sua proposta uma grelha, “de acordo com o artigo 5.º, n.º 1, alínea c), xiii, do programa”, onde consta que os testes correspondentes às posições 5, 6, 10, 27, 32, 40, 42, 57, 79, 90 e 108 serão realizados em laboratório externo seleccionado pelo Centro Hospitalar (cf. a p. 1, 2, 3, 4, 5 e 6, do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177116);
L) A proposta da S..... referiu ainda, em nota 1 à grelha referida anteriormente, que a «selecção do laboratório externo deverá ser efectuada recorrendo a listagem e laboratórios que preencham todos os requisitos de qualidade e tempos de resposta, os quais sejam adequados à necessidade do Centro Hospitalar do Algarve» e que se comprometia a «assumir todos os custos associados ao seu envio e execução» (cf. Nota 1 da grelha apresentada nos termos do artigo 5.º, n.º 1, al. c), xiii, do programa, a p. 6 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177116);
M) A S..... disse ainda na proposta que «o custo do material inerente ao envio de testes para o exterior será por conta da S....., conforme estipulado no n.º 1 do artigo 4.º das disposições técnicas do Caderno de Encargos» (cf. a p. 30 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177113);
N) A grelha apresentada pela S..... apresenta «preços unitários para a realização desses testes», ou seja, dos testes externos (cf. a p. 11 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163830);
O) No requerimento apresentado em 26.11.2015 pela S..... junto ao concurso, vinha referido que «os testes assinalados com “Ver Nota 1 e 2”, como serão realizados em laboratório externo seleccionado pelo Centro Hospitalar, o seu custo será por teste e não existirá lugar à facturação por embalagem» (acordo – artigo 67.º da petição e não impugnado, nem resulta contrária à posição assumida nas contestações da entidade demandada ou da contra-interessada);
P) A S..... propôs no procedimento o preço total para dois anos de €1.200.000,02 (cf. relatório preliminar, a p. 11 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163832);
Q) A S..... não apresentou no procedimento um esclarecimento justificativo de preço anormalmente baixo (cf. proposta da S..... - doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177113);
R) A S..... propôs o equipamento Aqua 7000 para a função de estação pré-analítica (cf. a p. 13 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177113);
S) De acordo com a proposta da S....., o equipamento Aqua 7000 «permite a utilização de tubo primário, e de vários tipos de amostra, com orientação automática do tubo para leitura do código de barras na fase de carga, permitindo a identificação rápida e automática de códigos de barras com erro de leitura para uma área dedicada (…)» (cf. a p. 13 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177113);
T) A proposta da S..... não indica a disposição técnica dos sistemas de tratamento de água e das centrífugas nas unidades de Faro e Portimão (cf. acordo – artigo 107.º da petição, não impugnado, nem resulta contrária à posição assumida nas contestações da entidade demandada ou da contra-interessada; resposta do júri no relatório final a p. 3 do relatório final);
U) A proposta da S..... inclui o plano/planta de disposição dos equipamentos na unidade de Faro e de Portimão e não inclui na unidade de Lagos (cf. a p. 33 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177113);
V) A proposta da S..... inclui ainda a descrição do «sistema integrado de química e imunoquímica – Dimension Xpand Plus» (cf. a p. 11 e 12 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006177117);
W) O júri emitiu o seguinte esclarecimento: «Esclarecimento 18 - Sim, a modalidade jurídica de Consórcio Externo também é admitida no âmbito deste concurso» (cf. a p. 4 do processo instrutor, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163835);
X) Em 17.02.2016 o júri proferiu relatório final no procedimento (processo instrutor – a p. 5 do registo sitaf n.º 006163830);
Y) Pode ler-se no relatório final do procedimento, designadamente, o seguinte:
«(…)
1- Respostas às alegações da Firma A..... à firma R..... e S.....
A) Violação.do artigo 11.° e 12.° das disposições técnicas do Caderno de Encargos e do ponto x) da alínea c) do artigo 5° do Programa de Procedimento (ausência de indicação da disposição das centrífugas e dos sistemas de abastecimento de água)
Por ter conhecimento prático dos processos de instalação de laboratórios, o Júri sabe que é comum e faz todo o sentido que os fornecedores deixam à disposição dos técnicos de laboratório e dos responsáveis do Hospital a instalação dos equipamentos de reduzida dimensão e carácter acessório (como é o caso das centrifugas), que por serem facilmente amovíveis ou deslocáveis, podem ser facilmente adaptados ao espaço que estiver disponível depois da instalação dos equipamentos de maior porte e à sua adaptação aos demais equipamentos e mobiliário que também existem no laboratório (computadores, impressoras, monitores, servidores, etc.) e cuja localização não resulta, como é normal das plantas apresentadas no Concurso.
Neste contexto, é inútil a apresentação da disposição destes equipamentos secundários, já que, na prática, os mesmos terão que ser decididos pelos técnicos que irão operar no laboratório.
Pelo que é evidente que a proposta do concorrente R..... não configura, neste particular, qualquer violação das regras do Concurso.
(…)
d) Violação das alíneas g) eh) do n.° 1 en,°7en.° 8 do artigo 5.°das disposições técnicas do Caderno de Encargos e do ponto ix) da alínea c) do n.° 1 do artigo 5.” do Programa de Procedimento (ausência de indicação das especificações técnicas das centrífugas
Tal como referido na resposta à alegação anterior, o mencionado nas alíneas g) e h) do n,° 1 e n.° 7 e n.° 8 do artigo 5.° das disposições técnicas do Caderno de Encargos diz respeito a um equipamento acessório ou auxiliar (no caso, preliminar) do funcionamento dos equipamentos de diagnóstico a concurso.
Daí que, tal como referido anteriormente em relação ao sistema de tratamento de água, o Júri considera que os concorrentes não tinham que apresentar documentação técnica correspondente a estes equipamentos secundários, cuja função é apenas acessória.
Não existe assim violação das normas em causa.
(…)
Resposta às alegações à firma S.....
a) Violação do n° 1 do artigo 4º das disposições técnicas do Caderno de Encargos (os testes externos)
O concorrente A..... alega que a proposta apresentada pelo concorrente S..... não respeitaria o disposto no artigo acima referido, oque deveria motivar a exclusão dessa proposta.
Na referida norma estabelece-se que “os concorrentes deverão apresentar obrigatoriamente os equipamentos adequados à boa execução dos testes, de modo a realizar no mínimo 70% dos testes colocados a concurso. Os restantes testes, que não possam ser realizados nesses equipamentos, serão realizados a cargo do adjudicatário”
Na visão do concorrente A....., a proposta da S..... não respeita o texto acima transcrito, já que entende que “não pode ser cobrado à entidade adjudicante qualquer preço como contrapartida pela realização dos testes que sejam realizados externamente.
A este respeito, há que salientar que a proposta do concorrente em causa refere expressamente que a “S..... compromete-se a assumir todos os custos associados ao seu envio e execução”.
Perante esta declaração de teor assertivo e inequívoco, não restam dúvidas de que a proposta da S..... não irá cobrar os testes a realizar fora dos equipamentos consolidados adicionais, pelo que a sua proposta não encerra, neste particular, qualquer ilegalidade.
Quanto ao facto de a tabela da S..... propor “preços unitários para a realização desses testes” trata-se apenas de uma discriminação e explicitação do custo real associado à realização desses testes.
A este propósito a posição assumida pela A..... chega a ser desconcertante, na medida em que parece pressupor que os custos inerentes à realização dos testes realizados extemamente não acabam por ser suportados pela entidade adjudicante, quando é evidente que o são.
Com efeito, os custos com esses testes serão sempre refletidos no preço global constante da proposta, que por sua vez subirá de modo a acomodar o custo associado a essa externalização.
É assim que se passa com todos os concorrentes, tratando-se de custos da proposta que têm que ser acomodados no respetivo preço. No fundo, é uma situação idêntica à regra segundo a qual os concorrentes devem colocar os equipamentos necessários à realização dos testes sem custos adicionais para a entidade adjudicante. Obviamente que a colocação desses equipamentos tem um custo real para o concorrente, o que acontece é que esse custo será repercutido no preço cobrado pelos reagentes, não sendo normalmente explicitado.
Nesta situação passa-se exatamente o mesmo. Há um custo real, que normalmente é incluído e não discriminado no preço final, mas que a S..... entendeu destrinçar.
Isso não significa “um custo acrescido”, como aliás resulta da declaração do concorrente, mas apenas a clarificação do mesmo.
A explicitação do custo unitário por teste que consta da proposta da S..... tem por efeito apenas uma melhor perceção do real custo desses testes, que em nada viola a regra do artigo 4.°, n.° 1 das disposições técnicas do Caderno de Encargos.
Sobre a alegação final da A....., que tem por objeto uma situação hipotética (“se o preço daqueles teste não estivesse incluído no preço total”) em que o preço da proposta seria inferior ao limite do preço anormalmente baixo, fica prejudicada pela resposta acima dada.
É que, como vimos, entendemos que os testes a realizar extemamente estão incluídos no preço global, pelo que não faz sentido ponderar situações hipotéticas.
Assim sendo, consideramos não assistir razão ao pedido de exclusão da proposta, formulada na pronúncia em audiência prévia do concorrente A......
b) Violação da alínea j) do n° 4 do artigo 5° e da alínea g) do n° 5 do artigo 5o, das disposições técnicas do Caderno de Encargos (processamento de amostras de vários tipos)
O júri entende que o aliquotador Aqua 7000 ao admitir tubos primários de diferentes tamanhos, quer em altura quer em diâmetro, permite processar amostras de vários tipos como mencionado na memória descritiva e nas especificações técnicas do equipamento /"■ proposto»
c) Violação do artigo 1 Io e 12° das disposições técnicas do caderno de Encargos e do ponto x) da alínea c) do n° 1 do artigo 5o do Programa de Procedimento (ausência de indicação das disposição das centrifugas e dos sistemas de tratamento de água)
O júri remete para a resposta dada na alínea a) nas alegações feitas á firma R......
d) Violação do artigo 11 das disposições técnicas do caderno de Encargos e do ponto x) da alínea c) do tí° 1 do artigo 5o do Programa de Procedimento (plano de disposição de equipamentos relativo á Unidade de de Lagos).
e) Sucede que não foi disponibilizada qualquer planta do laboratório de Lagos porque o júri entendeu não ser necessário um plano de disposição de equipamentos relativos à Unidade de Lagos.
f) Violação do n.° 3 do artigo 12.° das disposições técnicas do Caderno de Encargos (os equipamentos propostos não cabem no espaço disponível em Faro e Portimão)
O júri remete para a resposta dada na alínea a) nas alegações feitas á firma R.....
g) Violação do artigo S° das disposições técnicas do Caderno de Encargos (indicação dos reagentes nas posições.25 e 62)
Nas posições 25 e 62, não são apresentados dois reagentes para cada uma das posições, apenas apresentam duas referências, uma para codificação CDM e outra referência interna para efeitos de facturação.
A análise da proposta S..... não demostra nenhuma situação que coloque em causa as garantias de boa execução do contrato, pelo que o Júri reitera a aceitação da mesma.
(…)»
(cf. a p. 14 e seguintes do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163830);
Z) O contrato foi adjudicado ao agrupamento constituído pelas empresas R....., B..... e I..... (cf. processo instrutor – relatório final);
AA) No procedimento, foi ordenada em 2.º lugar a proposta apresentada pela empresa S..... (cf. processo instrutor – a p. 11 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163832 e relatório final);
BB) Foi ainda ordenado em 3.º lugar a proposta apresentada pelas autoras (cf. processo instrutor – a p. 11 do doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163832 e relatório final);
CC) Na informação n.º 9/2016, datada de 23.02.2016, submeteu-se ao Conselho de Administração da Entidade Demandada a autorização da despesa e a adjudicação da proposta apresentada pela R....., nos termos do Relatório Final elaborada pelo Júri do concurso (cf. processo instrutor);
DD) Em 25.02.2016 o Conselho de Administração da Entidade Demandada adoptou deliberação com o seguinte teor: «[o] C.A. acompanha e revê-se na proposta do júri pelo que considera ser de adjudicar este concurso. Dado o benefício para o erário público que esta adjudicação implica é entendimento do C.A. que deverá ser efectiva no dia em que se receber autorização para encargos plurianuais que se aguarda desde 25.06.2015» (cf. processo instrutor);
EE) A despesa foi autorizada através do despacho 736/2016/SEO, de 04.11.2016 (cf. processo instrutor);
FF) O acto de adjudicação foi impugnado através de acção judicial que correu termos no processo n.º 257/17.8BESNT no tribunal administrativo e fiscal de Sintra (cf. sentença proferida no proc. 257/17.8BESNT – incorporado no sitaf sob o registo n.º 006176825);
GG) Em 26.01.2017, as empresas R....., B..... e I....., celebraram um negócio que designaram como “consórcio externo‟, cujo o objecto foi definido da forma seguinte: «(…) destina-se a reger o relacionamento entre as consorciadas durante o período de vigência do presente e na pendência do contrato a celebrar com o Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E, que supletiva e complementarmente se regerá nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de Julho (…)» (cf. a p. 13 e 14, do contrato incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163827);
HH) No negócio referido, as empresas definiram como chefe do consórcio a R..... e definiram que externamente cabe ao chefe do consórcio, através dos directores nomeados, representar os interesses dos membros do consórcio no âmbito do projecto, sendo-lhe conferidos pelas consortes os seguintes poderes:
«(…)
a) Representação do Consórcio nas relações com as entidades contratantes (Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E), sendo interlocutor privilegiado enquanto chefe do Consórcio, tendo em vista a articulação e a colaboração entre as partes para a boa execução do contrato;
b) Os membros do Consórcio concederão ao chefe do Consórcio os poderes que, em cada caso, se mostrem necessários ao exercício das suas funções, mediante instrumento legal apropriado.
(…)»
(cf. a p. 16 do contrato incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163827);
II) Em 11.11.2019 foi celebrado um negócio entre o “Centro Hospitalar Universitário do Algarve, E.P.E.”, como 1.º outorgante e a empresa “R....., Lda.”, como 2.ª outorgante, que designaram como “contrato para fornecimento de reagentes ao centro hospitalar do algarve, E.PE.” (cf. a p. 1 do contrato, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163827);
JJ) Consta no documento referido na al. anterior o seguinte: «(…) Se lavrou a presente contrato, na sequência do processo n.º 21/2370/2015, que se rege pelas cláusulas seguintes» (cf. a p. 1 do contrato, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163827);
KK) Pode ainda ler-se no documento, designadamente, o seguinte:
«(…)
Cláusula 1.ª
Objeto e local do fornecimento
1-O presente contrato tem por objecto o fornecimento de reagentes para a realização de Química Clínica e Imunoquímica conforme mapa em anexo.
(…)
Cláusula 3.ª
Preço
O valor do presente contrato é de €1.121.997,01 (um milhão cento e vinte e um mil novecentos e noventa e sete euros e um cêntimo), acrescido de IVA à taxa legal em vigor de 23% no valor €258.059,31 (duzentos e cinquenta e oito mil e cinquenta e nove euros e trinta e um cêntimo) o que totaliza o valor de €1.380.056,32 (um milhão trezentos e oitenta mil e cinquenta e seis euros e trinta e dois cêntimos).
(…)
Cláusula 11.ª
Disposições finais
1 – O procedimento relativo ao presente contrato foi autorizado por despacho da Exma. Vogal Executiva do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E. de 22/06/2015 e posteriormente ratificado pelo mesmo Conselho de 23/06/2015.
(…)
(cf. p. 6 do contrato, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163827);
LL) O documento referido foi assinado pela Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE e pelos representantes da R....., Lda., J..... e M..... (cf. p. 6 do contrato, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163827);
MM) Em 19.02.2020 foi celebrado um novo negócio, designado como “aditamento ao contrato para o fornecimento de reagentes ao centro hospitalar universitário do Algarve, E.P.E.‟ (cf. a p. 1 do aditamento, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163825);
NN) O negócio foi celebrado entre o Centro Hospitalar Universitário do Algarve, EPE, R....., Lda., I..... (I.....), S.A. e B....., Lda. (cf. a p. 1 e 2, do aditamento, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163825);
OO) Pode ler-se no “aditamento ao contrato”, designadamente, o seguinte:
«(…)
Considerando que:
A) O Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E., atualmente designado por Centro Hospitalar Universitário do Algarve, E.P.E. (“CHUA”) lançou o concurso público n.° 21 2370/2015, tendo por objeto “A aquisição de reagentes, controlos, calibradores e consumíreis para realização de testes de química clínica líquida, imunoquímica, com instalação de sistemas automáticos analíticos e pré-analíticos para o Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E. - Unidades de Faro, Portimão e Lagos tendo a R....., I..... e B....., em agrupamento, apresentado proposta;
B) Nos termos do Artigo 6º do Programa de Procedimento, e uma vez que a sua proposta mereceu adjudicação, a R....., I..... e B..... associaram-se em Consórcio Externo, nos termos e para os efeitos do Decreto-Lei n° 231/81, de 28 de Julho e a I..... e B..... concederam mandato à R..... para fins de proceder à celebração do contrato;
C) A R....., na qualidade de Líder do Consórcio Externo veio a celebrar o Contrato com o Centro Hospitalar Universitário do Algarve, E.P.E. em 11 de Novembro de 2019 (adiante “CONTRATO”);
D) Os membros do Consórcio R..... não expressamente mencionados no CONTRATO, isto é, I..... e B..... pretendem, pelo presente Aditamento ao CONTRATO (adiante “ADITAMENTO”) afirmar a sua vinculação ao mesmo e obrigação aos termos desse com efeitos desde data da celebração do mesmo.
(…)»
(cf. a p. 2, do aditamento, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163825);
PP) Foi ainda definido no “aditamento” referido, o seguinte:
«(…) Cláusula 1ª
Vinculação 1. Os membros do Consórcio R....., I..... e B..... declaram, pelo presente ADITAMENTO e para todos os efeitos legais, que se consideram vinculados a todos os termos do CONTRATO desde a data da sua celebração.
2. Os membros do Consórcio R....., I..... e B..... expressam, para todos os efeitos legais que conferiram mandato (sem representação) em favor do líder de Consórcio R....., para fins de celebração do CONTRATO e cumprimento dos demais deveres ou exercício de direitos relativos à vinculação a esse.Cláusula 2ª
Aceitação e Ratificação Em decorrência dos efeitos resultante do previsto na Cláusula anterior e com o intuito de afirmar a sua aceitação ao conteúdo do CONTRATO, os membros do Consórcio R....., I..... e B..... declaram expressamente que todos os atos praticados pelo líder de Consórcio R..... ao abrigo do referido CONTRATO e para efeitos de vinculação ao mesmo se consideram aceites e ratificados sem reservasCláusula 3ª
Execução do Contrato Sem prejuízo do previsto nas cláusulas anteriores, os membros do Consórcio R..... asseguram que para fins de execução do CONTRATO, cada uma dessas assume o cumprimento das obrigações que para si são advenientes de modo individual, excepto cumprimento por outro membro do Consórcio nos termos admitidos na lei e no Contrato de Consórcio.
(…)»
(cf. a p. 3, do aditamento, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163825);
QQ) No aditamento ao contrato estão apostas as assinaturas de Ana Paula Pereira Gonçalves, enquanto Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Algarve, EPE (cf. p. 3 do aditamento ao contrato, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163825);
RR) Estão ainda apostas no aditamento ao contrato as assinaturas de J..... e de M....., enquanto procuradores da R....., Lda. (cf. p. 3 e 4 do aditamento ao contrato, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163825);
SS) Está também aposta no aditamento a assinatura de M....., enquanto Presidente do Conselho de Administração da I..... (I.....), SA (cf. p. 4 do aditamento ao contrato, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163825);
TT) No aditamento está também aposta a assinatura de M....., enquanto gerente da B....., Lda. (cf. p. 3 do aditamento ao contrato, incorporado no sitaf sob o registo n.º 006163825).
*
Motivação
A motivação do tribunal quanto aos factos provados assenta na prova documental constante dos autos, tendo em conta o teor dos documentos indicados em cada um dos pontos do probatório e tendo presente a posição assumida pelas partes nos respectivos articulados.
Os factos provados nas GG), HH), II) a al. LL) foram assim considerados por falta de impugnação.
Os factos provados nas al. PP), QQ), RR), SS) e TT), foram assim considerados por apreciação e comparação entre as assinaturas que constam no contrato dado como provado nas al. II) a LL), que por sua vez foram levados ao probatório com base em documento e assinaturas não impugnados, e ainda com base no original do “aditamento ao contrato” e em face dos documentos de identificação civil dos outorgantes juntos aos autos (cf. doc. incorporado no sitaf sob o registo n.º 006182355), julgando-se suficientes para ter-se a autoria como atribuída.».
Da questão prévia – do ónus de formular conclusões:
Entendem as Recorridas que as Recorrentes se limitaram a reiterar os fundamentos constantes da petição inicial, sem cuidarem de demonstrar quais os pretensos erros de julgamento que impendem sobre a sentença recorrida, pelo que não se pode considerar cumprido o ónus de alegar e formular conclusões, previsto no artigo 639º, nº 2, do CPC.
De acordo com o disposto no nº 2 do artigo 144º do CPTA o requerimento de recurso inclui ou junta a respectiva alegação, enunciando os vícios imputados à decisão recorrida.
A alínea b) do nº 2 do artigo 145º do mesmo Código, prevê o indeferimento do requerimento de recurso quando o mesmo não contenha ou junte alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões, sem prejuízo do disposto no nº 4 do artigo 146º, idem.
O mencionado nº 4 do artigo 146º estatui que: “Quando o recorrente, na alegação de recurso contra sentença proferida em processo impugnatório, se tenha limitado a reafirmar os vícios imputados ao ato impugnado, sem formular conclusões ou sem que delas seja possível deduzir quais os concretos aspetos de facto que considera incorretamente julgados ou as normas jurídicas que considera terem sido violadas pelo tribunal recorrido, o relator deve convidá-lo a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de não se conhecer do recurso na parte afetada.” [sublinhado nosso].
Já o artigo 639º do CPC com a epígrafe “Ónus de alegar e formular conclusões”, aplicável supletivamente por força do nº 3 do artigo 140º do CPTA, dispõe que:
“1 - O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2 - Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.
3 - Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada.
(…)”.
Em face do que nas alegações de recurso, quer em direito processual administrativo quer em direito processual civil, deve o recorrente indicar as razões de facto e de direito pelas quais discorda da decisão recorrida, considera que não observou as formalidades legais na sua elaboração ou incorreu em erros de julgamento, que constituam os fundamentos para a sua anulação, revogação ou modificação, terminando com as conclusões, em que resume, sintetiza os fundamentos da discordância alegada.
Por serem uma súmula das alegações de recurso está vedado o alargamento nas conclusões do âmbito das alegações. O mesmo é dizer que as conclusões de recurso que versem sobre matéria não tratada nas alegações são totalmente irrelevantes (no mesmo sentido v. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 8.6.2018, no proc. nº 1840/16.4T8FIG-A.C1, in www.dgsi.pt).
Por outro lado, como resulta do disposto no artigo 635º do CPC, a delimitação do objecto do recurso, das questões que cumprem ao tribunal superior conhecer, é efectuada pelas conclusões, significando que se estas não sumariarem todas as questões vertidas nas alegações de recurso, só as constantes das conclusões e nos termos em que o forem, serão apreciadas pelo tribunal de recurso, para além das que forem de conhecimento oficioso.
Em suma, o recurso visa alterar a decisão judicial com a qual o recorrente não concorda pelo que deve consistir num ataque dirigido aos respectivos fundamentos de facto e de direito e não numa repetição dos argumentos deduzidos no/s articulados apresentados ou atinentes à causa. Dito de outro modo, o objecto do recurso é a decisão recorrida e não a pretensão deduzida na acção em que aquela foi proferida.
O presente recurso pode ser dividido em duas grandes partes: a primeira as Recorrentes reagem contra a sentença recorrida, por ter errado ao decidir julgar a acção improcedente, considerando legais e válidos o acto de adjudicação e o contrato celebrado; a segunda em que pretende que este tribunal aprecie a sua pretensão de exclusão da proposta da concorrente S..... e de condenação na adjudicação à sua proposta, cujo conhecimento foi dado por prejudicado pela 1ª instância.
No que respeita à primeira parte do recurso, nas alegações e conclusões agora em apreciação as Recorrentes ainda que possam sustentar alguns dos argumentos já esgrimidos na 1ª instância, não deixaram de invocar as normas que entendem violadas e como deveriam ter sido interpretadas por forma a que o pedido impugnatório deduzido fosse julgado procedente.
Assim, porque se encontram identificados os concretos erros que as Recorrentes imputam à sentença, entendemos que se mostra observado o ónus de alegar e concluir, inexistindo fundamento para proferir despacho de aperfeiçoamento ou mesmo para rejeitar o recurso.
No concerne à segunda parte do recurso, porque a sua apreciação dependerá da procedência dos fundamentos enunciados na primeira, relegaremos para então a apreciação do alegado. Ou, se improcederem, desde já, consideramos a apreciação desta questão prévia, nesta parte, prejudicada.
Importa, agora, entrar na análise dos fundamentos expendidos na primeira parte do recurso.
Contesta o Recorrente o acerto da decisão recorrida ao considerar sanada por ratificação a invalidade resultante da outorga do Contrato de fornecimento apenas pela R....., em vez de pelo Consórcio de que faz parte com a I..... e a B....., sem procuração destas ou qualquer indicação de que se encontrava em sua representação, porquanto: está em causa um vício que não pode ser sanado por aplicação do instituto da ratificação do negócio jurídico, previsto no artigo 268º do CC, de aplicação subsidiária, face ao disposto nos artigos 279º, 280º e à norma especial que regula a situação, a prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 105º, do CCP; ainda que se admitisse a ratificação, o tribunal recorrido errou também nos efeitos que lhe atribuiu, quando apenas visa tornar eficaz um negócio jurídico ineficaz por ter sido celebrado sem poderes de representação, e não fazer com que quem não esteve presente no momento da assinatura do contrato afinal até esteve (presente messe momento); se a caducidade da adjudicação se impõe, existem fundamentos para a invalidação do contrato; o contrato foi celebrado por quem não é o adjudicatário, essa falta de identidade subjectiva entre o adjudicatário e a co-contratante, implica, necessariamente, a invalidade do contrato; o qual foi celebrado com preterição total do procedimento legal exigido, padecendo de nulidade nos termos conjugados dos artigos 284º, nº 2 do CCP e 161º, nº 2, alínea l) do CPA; se assim não se entender, existe fundamento para que seja anulável, nos termos do artigo 284º, nº 1 do CCP.
Vejamos.
O artigo 105º do CCP, com a epígrafe “Não outorga do contrato” dispõe:
«1 - A adjudicação caduca nos seguintes casos:
a) Se, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não comparecer no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato;
b) Se, por facto que lhe seja imputável, o adjudicatário não remeter o contrato assinado eletronicamente, no prazo fixado pelo órgão competente para a decisão de contratar;
c) Se, no caso de o adjudicatário ser um agrupamento, os seus membros não se tiverem associado nos termos previstos no n.º 4 do artigo 54.º
2 - Nos casos previstos no número anterior, o adjudicatário perde a caução prestada a favor da entidade adjudicante, devendo o órgão competente para a decisão de contratar adjudicar a proposta ordenada em lugar subsequente.
(…).».
A saber, estão em causa situações, imputáveis ao adjudicatário, que obstam à outorga do contrato - por falta de comparência física no dia, hora e local marcados para o efeito ou por não devolução do contrato assinado electronicamente ou por não associação prévia do agrupamento concorrente na modalidade jurídica prevista no programa do procedimento.
No caso em apreciação o adjudicatário é um agrupamento de empresas, concretamente formado pelas empresas R....., I..... e B..... que, previamente à outorga do contrato, se associaram em consórcio externo, designando a R..... como líder desse consórcio e, nessa qualidade, interlocutora junto do Recorrido, e foi esta consorciada líder que na data, local e hora designados compareceu perante o Recorrido, que não tendo dúvidas sobre a sua qualidade para intervir no negócio jurídico em causa, com ela celebrou o contrato.
Contudo, o que consta do teor do contrato é que o mesmo foi outorgado pela R..... e assinado pelos seus representantes legais, sem referência à sua qualidade de consorciada, líder ou representante do consórcio adjudicatário, ou sequer à junção do contrato de consórcio externo celebrado.
A Recorrente defende que a R..... não é o agrupamento/consórcio adjudicatário e, por isso, o adjudicatário não compareceu para outorgar o contrato, pelo que o Recorrido deve declarar a caducidade da adjudicação e adjudicar a proposta ordenada em lugar subsequente.
No entanto, a caducidade da adjudicação, de acordo com o disposto na alínea a) do nº 1 do indicado artigo 105º, resulta da impossibilidade de outorga do contrato por não comparência do adjudicatário, por motivos imputáveis a este.
Mas o contrato em referência nos autos foi outorgado, esgotando os efeitos do acto de adjudicação.
E a necessidade de confirmar que a invocada falta de comparência se deveu a motivos imputáveis ao adjudicatário, sempre implicaria [se suscitada a dúvida no Recorrido/adjudicante, o que não sucedeu] a notificação do adjudicatário para se pronunciar sobre os motivos da sua não comparência e da intenção de declarar a caducidade da adjudicação, em cumprimento do disposto no artigo 121º do CPA [na falta de disposição no referido artigo 105º como a do nº 2 do artigo 86º, também do CCP].
No exercício do direito de audiência prévia, certamente, teria sido prestado esclarecimento sobre a qualidade do outorgante, sem poderes especiais de representação, como líder do consórcio, em que a R..... compareceu para celebrar o contrato, e/ou proposta uma adenda ou aditamento a este, tendo como outorgantes para além do Recorrido, as demais consorciadas que se vinculariam a cumprir os seus termos, com efeitos reportados à data da respectiva celebração – tudo de acordo com o alegado pelos Recorridos na acção e no recurso, e a factualidade superveniente ao contrato considerada assente.
Antes do que, o Recorrido chegaria à conclusão de que toda esta situação foi motivada pelos termos da minuta do contrato, elaborada por si e não revista (de forma adequada, como se afigura evidente), onde consta como 2ª outorgante apenas a R..... e não as empresas agrupadas ou consorciadas cuja proposta foi adjudicada, a qual deveria ter sido elaborada com todo o cuidado e rigor até por ser de perspectivar a hipótese de os concorrentes ordenados nos lugares subsequentes, entre os quais figura em 3º lugar o agrupamento composto pelas aqui Recorrentes - que já tinham impugnado o acto de adjudicação na acção de contencioso pré-contratual tramitada sob o nº 257/17.8BESNT, instaurada contra o mesmo Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E, a R..... e a S....., pedindo a anulação da decisão de adjudicação por: “a.1) Não se ter excluído e se ter adjudicado a proposta apresentada pelo Agrupamento liderado pela R.....; // a.2) Não se ter excluído a proposta apresentada pela S.....”, que foi julgada improcedente e confirmada neste Tribunal que negou provimento ao recurso, e pelo STA que não admitiu a revista], pudessem reagir contenciosamente, pondo em causa a validade do contrato e do acto de adjudicação.
O mesmo é dizer, que o Recorrido teria concluído não ser por facto exclusivamente imputável ao adjudicatário toda esta situação de dúvida sobre se o adjudicatário esteve (ou não) no dia, hora e local da outorga do contrato e, consequentemente, abster-se-ia de declarar a caducidade do acto de adjudicação e de chamar a S..... a celebrar o contrato.
Equacionada a situação hipotética em que o contrato não teria chegado a ser outorgado por dúvidas sobre se a R..... o poderia outorgar, importa agora aferir da validade e eficácia do contrato efectivamente celebrado.
Alegam as Recorrentes que o contrato é nulo por ter sido celebrado com preterição total do procedimento legal exigido para a R..... poder outorgá-lo como adjudicatária, padecendo de nulidade nos termos conjugados dos artigos 284º, nº 2 do CCP e 161º, nº 2, alínea l) do CPA.
Em função da factualidade considerada assente é manifesto que não lhe assiste qualquer razão.
Efectivamente, contrato foi celebrado no termo do/e por referência ao procedimento concursal aberto pelo Recorrido para aquisição de reagentes para a realização química clínica e imunoquímica [com o nº 21/2370/2015 – v. factos II), JJ) e KK)], que culminou no acto de adjudicação ao agrupamento R....., I..... e B....., cuja legalidade e validade foi, inclusive, confirmada contenciosamente, na acção de contencioso pré-contratual nº 257/17.8BESNT, e foi outorgado pela primeira daquelas empresas, já depois de associadas em consórcio externo, pelo que o que está em causa é saber se e em que termos aquela pode representar este na outorga do contrato de fornecimento em referência nos autos.
No contrato de consórcio externo celebrado, em 26.1.2017, pelas referidas empresas, em cumprimento do disposto no nº 4 do artigo 54º do CCP e para “(…) reger o relacionamento entre as consorciadas durante o período de vigência do presente e na pendência do contrato a celebrar com o Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E, que supletiva e complementarmente se regerá nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de Julho (…)”, ficou definido que: “Para fins do presente Contrato de Consórcio, será líder do Consórcio a R....., a quem são conferidos, entre outros, os poderes mencionados n.º 1 do artigo 14º do Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de Julho” [cfr. pontos 1 e 2 da Cláusula Primeira], cabendo-lhe, “enquanto líder do projecto” “[e]xternamente representar os interesses dos membros do consórcio no âmbito do projecto, sendo-lhe conferidos pelas Consortes os seguintes poderes: // a) Representação do Consórcio nas relações com as entidades contratantes (Centro Hospitalar do Algarve, E.P.E), sendo interlocutor privilegiado enquanto chefe do Consórcio, tendo em vista a articulação e a colaboração entre as partes para a boa execução do contrato; // b) Os membros do Consórcio concederão ao chefe do Consórcio os poderes que, em cada cado, se mostrem necessários ao exercício das suas funções, mediante instrumento legal apropriado.” [cfr. pontos 1 e 4 da Cláusula Quinta – v. factos GG) e HH)].
De entre os poderes do líder indicados no referido nº 1 do artigo 14º do Decreto-Lei nº 231/81, consta o de “(…) negociar quaisquer contratos a celebrar com terceiros no âmbito do contrato de consórcio, ou as suas modificações” [v. alínea a)].
Contudo, como resulta do nº 2 desse mesmo artigo, “Apenas por procuração especial, podem ser conferidos poderes para celebração, modificação ou resolução de contratos com terceiros no âmbito do contrato de consórcio”, acrescentando o nº 3 que “Os poderes de representação referidos nos números anteriores, quando não possam ser especificamente relacionados com algum ou alguns dos membros do consórcio, consideram-se exercidos no interesse e no nome de todos.”.
Assim, a R....., líder do consórcio adjudicatário deveria ter obtido das outras consorciadas procuração especial com poderes para contratar em representação do consórcio/adjudicatário com o Recorrido. Ou o contrato deveria ter tido como outorgantes todas as empresas do consórcio.
Não aconteceu nem uma coisa nem outra.
Apesar do que, porque a R..... foi sempre identificada no procedimento como concorrente empresa agrupada/consorciada e não de per si, a sua presença no dia, hora e local da outorga do contrato ocorreu na qualidade de líder e de interlocutora do consórcio - facto do conhecimento do Recorrido e até das Recorrentes, como expressamente admitiram na referida acção nº 257/17.8BESNT ao demandarem, inicialmente, apenas a R..... e não todas as consorciadas, e ao reflectirem essa qualidade de líder no texto do pedido a.1) -, pelo que o contrato foi celebrado apenas com a R....., sem poderes de representação, mas no interesse e em nome de todas as consorciadas. O que foi expressamente assumido pelas I..... e a B..... no Aditamento ao contrato, celebrado em 19.2.2020.
Donde, o contrato celebrado é válido, mas ineficaz para a I..... e a B....., até à sua ratificação por estas, de acordo com o disposto no artigo 268º do CC, o que veio a suceder mediante o tal Aditamento ao contrato.
E esta norma e o seu regime é aplicável ao presente contrato supletivamente, de acordo com o estatuído no nº 4 do artigo 280º do CCP por inexistir norma especial de direito administrativo que regule a representação de pessoas colectivas privadas na outorga de contrato, no âmbito da contratação pública.
Com efeito, o artigo 106º do CCP com a epígrafe “Representação na outorga do contrato”, respeita apenas à representação das entidades adjudicantes e não à das adjudicatárias, de natureza privada, como é o caso do consórcio.
Pelo Aditamento ao contrato, celebrado entre o Recorrido e todas as consorciadas, foi aceite e ratificada, com efeitos retroactivos, por reportados à data da celebração do contrato aditado, a intervenção no mesmo da R....., ou seja, a outorga do contrato como líder do consórcio em representação das consorciadas que tal como a aquela, outorgante inicial, se vinculam, cada uma, aos termos e obrigações do contrato celebrado.
Alegam as Recorrentes que o juiz a quo errou ao atribuir efeitos à ratificação não consentidos pelo norma aplicável, considerando que os representantes da I..... e da B..... estiveram presentes no dia 11.11.2019, data fixada para a outorga do contrato, quando não estiveram.
O que se extrai a este propósito da sentença recorrida é o seguinte:
«Não subsistem assim motivos para considerar que o adjudicatário não tenha comparecido no dia, hora e local fixados para a outorga do contrato, atendendo, desde logo, aos efeitos retroactivos da ratificação. Por força do disposto no artigo 268.º, do Código Civil, os efeitos da presença isolada e da assinatura do contrato somente pela empresa R..... no dia, hora e local fixados, foram colmatados a posteriori pela ratificação pelos restantes membros do consórcio, havendo uma verdadeira eficácia retroactiva apta a sanar a irregularidade do negócio decorrente da insuficiência da representação.».
Do que está escrito retira-se que o adjudicatário compareceu no dia, hora e local fixados através da R....., sem poderes de representação, irregularidade que foi colmatada, sanada pela ratificação da sua actuação/intervenção por parte dos restantes membros do consórcio, com efeitos retroactivos.
O tribunal recorrido sabe, como se extrai da fundamentação de direito da decisão recorrida, de que o excerto reproduzido faz parte, que os efeitos da ratificação ocorrem no plano jurídico e não no físico ou da realidade.
“Consórcio é o contrato pelo qual duas ou mais pessoas, singulares ou colectivas, que exercem uma actividade económica se obrigam entre si a, de forma concertada, realizar certa actividade ou efectuar certa contribuição com o fim de prosseguir qualquer dos objectos referidos no artigo seguinte.” – cfr. o artigo 1º do Decreto-Lei nº 231/81.
Sendo o consórcio o adjudicatário, esperava-se a presença física no dia, hora e local dos representantes legais da empresa consorciada líder, com poderes especiais de representação das demais empresas do consórcio. Na falta de procuração especial para o efeito, a ratificação opera como se os referidos representantes legais estivessem munidos dos poderes especiais para contratar ou estivessem presentes os representantes de todas as empresas consorciadas. Trata-se de uma ficção jurídica e não da alteração de uma realidade.
Pelo que não procede, nesta parte, o recurso.
Face ao que, não havendo fundamento legal para determinar o Recorrido a declarar a caducidade do acto de adjudicação e sendo válido e eficaz o contrato celebrado com o consórcio formado pelas Recorridas, fica prejudicada a apreciação dos fundamentos do recurso para considerar que a proposta da S....., graduada em 2º lugar, devia ter sido excluída e o Recorrido condenado a adjudicar a proposta das Recorrentes.
Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida na ordem jurídica.
Custas pelas Recorrentes.
Registe e Notifique.
Lisboa, 18 de Março de 2021.
(Lina Costa – relatora que consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores Carlos Araújo e Ana Paula Martins). |