Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06226/13
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:02/13/2014
Relator:BENJAMIM BARBOSA
Descritores:IVA – DEDUÇÃO – SUBVENÇÕES
Sumário:(i). No processo judicial tributário os recursos jurisdicionais têm em regra efeito devolutivo, com excepção dos casos em que seja possível e se mostre prestada garantia, ou quando o efeito devolutivo possa prejudicar a utilidade dos recursos.
(ii). A estes casos pode ainda acrescentar-se o efeito suspensivo do próprio processo, quando legalmente previsto, que produz efeitos sobre o recurso jurisdicional que nele venha a ser interposto.
(iii). Bem como o que resulta da aplicação subsidiária da regra geral prevista no art.º 740.º, n.º 1, do CPC, na versão do CPC anterior ao Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, caso se entenda que as referências ao processo civil constantes do CPPT são estáticas, no sentido de constituírem uma aquisição material das normas processuais civis vigentes no momento em que a remissão entrou em vigor, constituindo essas normas processuais civis (ainda que posteriormente revogadas), parte material do acervo normativo do CPPT.
(iv). E por fim o efeito suspensivo deve ser fixado nos casos em que é inútil a fixação do efeito devolutivo perante os efeitos que a suspensão de um processo provoca noutro que dependa ou esteja intimamente relacionado com aquele, como sucede nos casos das impugnações conexionadas com execuções onde tenha sido prestada garantia.
(v). Os sujeitos passivos integrais praticam operações económicas, na acepção do art.º 4.º, n.º 2 da Sexta Directiva [(77/388/CEE),] e art.º 2.º, n.º 1, da Directiva IVA (2006/112/CE) sujeitas a IVA, seja a montante, seja a jusante, e por isso têm direito à dedução do IVA na exacta medida do imposto que suportaram.
(vi). Os sujeitos passivos que beneficiam de uma isenção incompleta não liquidam o IVA nas suas operações económicas a jusante (outputs), encontrando-se impedidos de deduzir o IVA em que incorreram nas operações a montante (inputs), distintamente dos sujeitos passivos que exercem operações abrangidas por isenções completas, em que o exercício do direito à dedução é concedido.
(vii). Os sujeitos passivos mistos praticam em simultâneo operações que lhes conferem o direito à dedução do IVA em que incorrem nas suas aquisições e outras operações que não conferem direito a tal dedução, por beneficiarem de isenção incompleta de IVA.
(viii). Estes sujeitos apenas têm direito à dedução do IVA que suportaram nos seus inputs na percentagem correspondente ao peso relativo ou fracção que as operações sujeitas a IVA têm no conjunto das operações isentas e não isentas que praticam, calculada de acordo com o método do pro rata.
(ix). Os subsídios ou subvenções são tratados no âmbito do sistema do IVA essencialmente em torno de duas vertentes: a inclusão da subvenção na base tributável do imposto ou no denominador da fracção para efeitos de cálculo do pro rata de dedução da entidade subvencionada.
(x). Assim, a questão essencial consiste em determinar quando é que uma subvenção se consubstancia na contrapartida de uma operação abrangida pelo âmbito de incidência do imposto, só depois se suscitando a questão de saber se faz ou não parte da base tributável e se é susceptível de influenciar o pro rata de dedução do imposto.
(xi). Todavia, no caso dos sujeitos passivos mistos, desde que se conclua que as subvenções representam a contrapartida de operações dentro do âmbito de aplicação do imposto, tal significa que, dependentemente da operação (isenta ou não), vão ser tomadas em consideração apenas no denominador do pro rata (operações que não conferem direito à dedução) ou no numerador e no denominador (conjunto das operações tributadas e isentas).
(xii). Os subsídios podem ser à exploração ou ao investimento. Os subsídios à exploração são, em regra, atribuídos para cobertura de défices, como forma de financiamento de parte das despesas gerais ou como participação à forfait em certas despesas de exploração.
(xiii). Os subsídios ao investimento destinam-se a financiar capital fixo, como sucede com os subsídios ao equipamento (activos fixos tangíveis) e não são tributados.
(xiv). As subvenções à exploração são subvenções não tributadas que só poderão influenciar a determinação do pro rata relativamente aos sujeitos passivos mistos.
(xv). O ordenamento jurídico europeu relacionado com os subsídios e subvenções impõe que a limitação do direito à dedução do IVA suportado só é aceitável se existir a percepção de subsídios que não se conexionam com o preço das operações por parte de sujeitos passivos que, antes de as receberem, já eram sujeitos passivos parciais ou mistos, i.e., com inputs utilizados indistintamente na realização de operações com e sem direito a dedução.
(xvi). Assim, a Lei n.º 67-A/2007, quando dá nova redacção ao art.º 23.º do CIVA, não inovou no plano jurídico, antes constituiu verdadeira interpretação autêntica de um normativo que já devia ser interpretado em conformidade com os princípios comunitários que a referida Lei se limitou a reconhecer.
(xvii). O artigo 23º do Código do IVA, seja antes ou depois da alteração da sua redacção em 2007, assim como todo o corpo normativo do IVA que permite determinar o montante dedutível do imposto, deve ser interpretado à luz da Directiva IVA, que manteve o regime que já vinha da Sexta Directiva.
(xviii). Neste contexto, em caso algum um Estado membro pode dificultar e ou restringir o direito à dedução por referência ao âmbito com que este é acolhido pelas Sexta Directiva e Directiva IVA.
(xix). A jurisprudência europeia sobre o regime do direito à dedução é ampla e uniforme no sentido de que este constituiu um mecanismo essencial à prossecução dos princípios da neutralidade do imposto e do tratamento fiscal igualitário, cujas derrogações, tendo em conta essa especificidade, são de interpretação restrita.
(xx). Essa jurisprudência entende também que a limitação do direito à dedução pelo método do pro rata apenas pode abranger os sujeitos passivos que, auferindo subsídios não tributados, realizam operações que não conferem direito à dedução conjuntamente com operações que conferem tal direito, não podendo essa limitação ser estendida aos sujeitos passivos que pratiquem exclusivamente operações que permitam deduzir o IVA suportado a montante.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:

1 - Relatório

a) - As partes e o objecto do recurso

Inconformada com a sentença do TT de Lisboa que considerou parcialmente improcedente a impugnação judicial, veio a Recorrente P……………………………………………………………………..., interpor recurso jurisdicional relativo ao segmento em que decaiu, cujas alegações rematou desta forma:

- Vem o presente recurso interposto da douta decisão de fls ... e ss na parte em que julgou improcedente a impugnação deduzida pela ora Recorrente;

- Tendo sido fixado ao mesmo efeito meramente devolutivo, nos termos do disposto no nº 2 do art9 286º do CPPT, que estipula que Os recursos tem efeito meramente devolutivo, salvo se for prestada garantia nos termos do presente Código ou o efeito devolutivo afectar o efeito útil dos recursos.;

- A recorrente prestou garantia bancária (doc. 1) para pagamento dos montantes liquidados adicionalmente, quer em sede de IVA, quer em sede de IRC, na sequência da acção inspectiva, no âmbito da qual foi elaborado o relatório junto à impugnação;

- Consequentemente, porque prestada garantia, deve ser atribuído ao recurso efeito suspensivo;

- Como decorre das razões de facto e de direito aduzidas no relatório, génese das liquidações impugnadas, a questão em apreço gravita em torno da atribuição de subsídios ou subvenções concedidos à recorrente ao abrigo do Despacho nº 663/SET/02, datado de 11 de Dezembro de 2011, proferido pelo Secretário de Estado do Turismo, subsídios esses que visaram apoiar a realização do Grande Prémio de Motociclismo de Portugal em 2002 e 2003 que a Administração Tributaria considerou como ... subsídios ou subvenções “à exploração” destinados a cobrir despesas gerais e consequentemente a melhorar a sua posição económica…” e integrando, assim, “ ... a categoria de “subvenções não tributadas” que não se destinam a custear o capital fixo, vulgarmente designado por investimento.” (Cfr pág. 10 do Relatório);

- Consequentemente, a Inspecção Tributária considerou que, “Não tendo a “SGA” optado pela sujeição dos referidos subsídios ou subvenções a IVA e como os mesmos, por si só, quando integrados no denominador da fracção a que se refere o n.º 4 do art.º 23.º do CIVA dão origem a um prorata que ascende a 65%, 60%, 67% e 72%, nos exercícios de 2001, 2002, 2003 e 2004, respectivamente,...” e, por isso mesmo, procedeu às liquidações adicionais;

- A Administração Fiscal, relativamente às operações isentas de IVA que referiu terem sido executadas pela recorrente, considerou que, “Face ao disposto no n.º 8 do art.º 23 do CIVA e tendo em conta o facto de as referidas rendas, «nos exercícios de 2002 a 2004, representarem um pequena percentagem do volume de negócios tributados em sede de IVA, que não ultrapassa 0,5%, a percentagem do prorata ascende a 100%. Nestes termos, em nossa opinião, enquanto essa percentagem se mantiver não existe necessidade, em relação ao imposto deduzido a 100% com suporte a documentos que formalizam, designadamente, aquisição de bens e serviços do Técnico Oficial de Contas, do Revisor Oficial de Contas, consumo de electricidade, consumo de água, equipamentos e despesas administrativas e de escritório, ser precedido de pedido formulado, nos termos do n.º 9 do artigo 23.º do CIVA, no sentido de serem consideradas como inexistentes as operações isentas que não conferem direito à dedução.”;

- Isto é, no exercício dos seus poderes, a Administração Tributária considerou como inexistentes as operações isentas donde, as mesmas, nunca poderão relevar para a qualificação da recorrente como sujeito passivo misto. Daí, e bem, a Administração Fiscal sempre haver considerado a recorrente como sujeito passivo integral;

- As liquidações adicionais foram, única e exclusivamente, efectuadas por a Administração Tributária haver entendido que os subsídios em causa, considerados em si mesmos como operações económicas, se integraram no conceito de subvenções a incluir na base tributável do IVA, sendo indiferente a qualidade do sujeito (integral ou misto) que as recebeu; tout court;

10ª - Pese a Administração Fiscal entender que a recorrente não é um sujeito passivo misto, ainda assim, considerou que as subvenções em apreço deveriam se incluídas na base tributável do IVA, procedendo à liquidação adicional por entender aplicável o disposto nos art.ºs 16.º n.º 7 e 23.º n.º 4, ambos do CIVA, em clara violação da 6ª directiva IVA;

11ª - No entanto, na decisão recorrida considerou-se como assente que a recorrente, por executar, no exercício da sua actividade, operações tributáveis em sede de IVA e operações isentas, é um sujeito passivo misto, para, a partir daí, concluir pela bondade das liquidações adicionais efectuadas;

12ª - Isto é, considerou o tribunal recorrido valorar, para efeitos de qualificação da recorrente como sujeito passivo misto, a execução de operações isentas que a própria Administração Fiscal considerou, dado seu carácter perfeitamente irrisório e desprezível, como inexistentes;

13ª - O tribunal recorrido invocou e valorou, nomeadamente uma razão de facto, - (execução de operações isentas que a própria Administração Fiscal não invocou, antes pelo contrário, expressamente desprezou considerando-as inexistentes) -, para julgar parcialmente improcedente a impugnação. Tal circunstância inquina, em definitivo, a decisão recorrida;

14ª - É que o tribunal não pode valorar razões que não foram invocadas pela Administração Tributária, – (no caso dos autos até foram expressamente ignoradas por esta, repete-se.) - para justificar e fundamentar a prática do acto, sob pena da violação do princípio da separação de poderes constitucionalmente consagrado;

15ª - Mas, ainda que assim se não entendesse, – o que se coloca por mera necessidade de raciocínio, mas não se concede –, sempre se dirá que, em face do enquadramento factual, a recorrente nunca poderia ser qualificada como sujeito passivo misto em sede de IVA pelo simples facto de, no exercício da sua actividade, executar operações isentas, pois importa aferir o peso que tais operações assumam no volume de negócios tributados;

16ª - No caso, resulta expressamente do Relatório da inspecção tributária que, as operações isentas representam ... uma pequena percentagem do volume de negócios tributados em sede de IVA, que não ultrapassa 0,5%, a percentagem do prorata ascende a 100%.;

17ª - Ora, porque assim é, a Administração Tributária considerou-as como inexistentes, e bem. Nesta medida, a Administração Tributária considerou a recorrente como sujeito passivo integral e não misto, como considerou a decisão recorrida em clara violação do art.º 23º do CIVA;

18ª - É que, se prevalecesse a qualificação decidida pelo tribunal recorrido, a tributação produzida pela Administração Fiscal seria feita em termos perfeitamente desadequados e proporcionais aos objectivos a realizar, em clara violação dos princípios da proporcionalidade e da justiça, plasmados no art.º 266º n.º 2 da constituição e art.º 55º da LGT;

19ª - Como se afirmou no ponto 65º da p.i., o que se afirmou foi que a Administração Fiscal, do ponto de vista tributário, excluiu as rendas, considerando-as inexistentes, não podendo, por isso, produzir quaisquer efeitos, tanto mais que é duvidosa a sua qualificação como contrapartidas de contratos de locação, atendendo à materialidade das situações em que se baseia. Ora, de tal materialidade o tribunal recorrido não curou sequer de apurar, pese a circunstância de a recorrente haver indicado prova, nomeadamente testemunhal, para o efeito. Assim, para além dos já invocados vícios que inquinam a decisão recorrida, esta, também, padece de défice instrutório.…

Conclui peticionando pela procedência do recurso, e consequentemente pela revogação da decisão recorrida na parte em que decaiu, ou pela remessa dos autos ao Tribunal a quo para produção de prova.

A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Mº Juiz a quo proferiu despacho de sustentação a fls. 1050 dos autos.

A EMMP emitiu parecer no sentido de negado provimento ao recurso, em virtude da decisão não padecer, no seu entender, de défice instrutório nem violar o princípio da separação de poderes.


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Colhidos vistos vem o processo à Conferência.

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b) As questões essenciais a decidir:

Saber:
a. se o recurso tem efeito suspensivo ou devolutivo;
b. se a sentença recorrida viola o princípio da separação de poderes.
c. se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento.


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2 - Fundamentação

a) De facto:

a.1 - Factos que a sentença considerou provados:

A) A impugnante é uma sociedade anónima cujo objecto social consistia na gestão e exploração da infra-estrutura desportiva Autódromo …………………………………, incluindo a promoção de eventos e provas desportivas de qualquer tipo, bem como a prestação de serviços conexos, complementares e acessórios (cfr. certidão permanente de fls. 957 a 959 dos autos);

B) Em 31/12/2007 a “…………………………………………S.A., na qualidade de accionista única da impugnante, deliberou, nos termos do n.º 1 do art.º 54° do CSC, iniciar o processo de dissolução e liquidação da Sociedade Gestora do Autódromo ………………………, S.A. (cfr. fls. 829 a 830);

C) Pela ap. 27/20090602 foi inscrita na Conservatória do Registo Comercial de Cascais o encerramento da liquidação da impugnante (cfr. fls. 958);

D) A impugnante foi submetida a acções de fiscalização externas que incidiram sobre os exercícios de 2002, 2003 e 2004, na sequência do que foi elaborado o relatório de inspecção junto ao processo administrativo apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr. fls. 25 e segs. dos autos);

E) As acções inspectivas de âmbito geral tiveram inicio em 17/05/2006, 04/04/2006 e 10/07/2006 (cfr. ponto 3 da p.i.; e RIT de fls. 34 e 35 dos autos);

F) Em resultado das acções de inspecção, levada a cabo pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, aos exercícios de 2002 a 2004, foram propostas correcções às declarações de IVA apresentadas pela impugnante dos períodos Janeiro a Dezembro de 2002 a 2004, respectivamente de € 436.210,18, € 383.783,13 e € 330.586,34, no valor total de € 1.150.579,65 (cfr. ponto 7 da p.i., fls. 507 a 530 e 569 a 570);

G) Tais correcções basearam-se nos seguintes factos e entendimento:

«2.3.1.4. - Actividades desenvolvidas

2.3.1.4.3. - Actividades principais

No âmbito do seu objecto social a “S.G.S.” tem centrado a sua actividade na organização e realização do designado “Grande Prémio de Portugal” em Motociclismo e em prestações de serviços, incluindo o aluguer do circuito do Autódromo, a clientes internacionais e nacionais, designadamente para testes, treinos e apresentações, e a clientes nacionais, na realização de provas e troféus de automobilismo e de motociclismo.

2.3.1.4.2. Actividades Acessórias

Durante os exercícios de 2002, 2003 e 2004 a “S.G.A.” exerceu, em ligação com as actividades indicadas no ponto anterior, o arrendamento e/ou cessão de exploração de instalações afectas a bar(es) e discoteca, à locação de espaços no circuito do Autódromo para publicidade fixa e à venda de artigos em “merchandising”.

(…)

2.3.1.6.- Enquadramento fiscal das actividades desenvolvidas.

2.3.1.6.1.- Enquadramento fiscal declarado e constante na base de dados da DGCI

De acordo com as bases de dados da DGCI, “cadastro do IRC” e “cadastro do IVA, o Contribuinte está inscrito no registo de Sujeitos Passivos de IRC (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas), regime geral de tributação, e relativamente ao IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado), esteve enquadrado no regime normal de periodicidade trimestral até 31/12/2004. A partir de 01/01/2005 passou a estar enquadrado no regime normal de periodicidade mensal.

2.3.1.6.2.- Alteração oficiosa do enquadramento em sede de IVA

Como se referiu no ponto 2.3.1.4.2. o sujeito passivo, no âmbito das actividades acessórias, rendas provenientes de arrendamento de parte de imóveis.

(...)

Pelo exposto constata-se que o sujeito passivo pratica simultaneamente operações isentas que não conferem o direito à dedução e operações que conferem este direito, devendo, para efeitos do exercício do mesmo, atender ao disposto no artigo 23° do CIVA podendo para tal optar pelo método da percentagem de dedução (prorata) ou pelo método da afectação real.

(...)

Porém, ao sujeito passivo, têm sido atribuídos subsídios ou subvenções ''à exploração” destinados a cobrir despesas gerais e consequente a melhorar a sua posição económica. Como os referidos subsídios ou subvenções não são calculados com referência a preços ou quantidades vendidas, não se ajustam aos limites estabelecidos na alínea c) do n° 5 do Artigo 16° do CIVA. Assim, integram a categoria de “subvenções não tributadas” que não se destinam a custear capital fixo, vulgarmente designado por investimento.

(…)

Não tendo a “SGA” optado pela sujeição dos referidos subsídios ou subvenções a IVA e como os mesmos, por si só, quando integrados no denominador da fracção a que se refere o nº4 do artigo 23° do IVA dão origem a um prorata que ascende a 65%, 60% e 72%, nos exercícios de 2001 , 2002, 2003 e 2004, respectivamente, o sujeito passivo devia ter apresentado uma declaração de alterações na qual devia fazer referência à existência simultânea de operações que conferem o direito à dedução e operações isentas que não conferem esse direito - rendas subsídios ou subvenções - indicando a percentagem de dedução.

Não tendo procedido em conformidade infringiu o disposto no artigo 31º do CIVA. Pelo exposto, e dado que o exercício de 2001 já havia prescrito, vamos propor, através de Boletim de Alterações Oficiosas, o seu enquadramento no regime misto a partir de 01 de Janeiro de 2002.

(…)

3 Descrição dos factos e fundamentação das correcções meramente aritméticas

3.1. - Faltas identificadas em sede de IVA - Exercícios de 2002 a 2004

3.1.1. - IVA deduzido e não regularizado - artigo 23°, n° 1 do CIVA

Das análises efectuada aos documentos e registos contabilísticos verificámos que nos exercícios de 2002 2004 foram atribuídos os seguintes subsídios à “S.G.A.”:

Da referida análise constatámos que os subsídios ou subvenções tiveram como finalidade comparticipar as despesas dos eventos identificados na coluna (2) do quadro acima apresentado. Tal facto está relevado nos Relatório de Gestão, na rubrica “Actividade Comercial e Desportiva elaborados pela Administração da “S.G.A” com referência a 31 de Dezembro de cada um dos anos de 2002 a 2004 (ver páginas 15719 a 19/19 do Anexo I - Relatório de 2003 e páginas 44/54 a 54/54 do Anexo 3 - facturas de 2004 e relatórios 2002 a 2004).

Porque os referidos subsídios ou subvenções se destinam “à exploração”, isto é, a cobrir despesas gerais e consequentemente a melhorar a posição económica da “S.G.A. e não são calculados com referência a preços ou quantidades vendidas não se ajustam aos limites estabelecidos na alínea c) do nº 5 do artigo 6° do CIVA. Assim, integram a categoria de “subvenções não tributadas” que não se destinam a custear capital fixo, vulgarmente designado por Investimento.

Dado que os referidos subsídios ou subvenções têm todos a mesma aplicação, ou seja cobertura de despesas gerais e melhoria da situação económica da empresa, seleccionámos os que foram atribuídos ao evento “Grande prémio de Portugal Motociclismo” por serem os mais representativos em termos de valores, e efectuamos pedido de esclarecimento formal à Direcção de Serviços de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (DSIVA) para se prenunciar sobre o enquadramento legal, em sede de IVA (ver páginas 7/19 a 19/19 do Anexo l).

Em resposta, superiormente sancionada, foi entendido que “(...) , ou a SGA optava pela sua sujeição a imposto nos termos do n° 7 do artigo 16° do CIVA, ou, não tendo procedido dessa forma, aqueles montantes influenciam o exercício do direito à dedução, uma vez que integram o denominador da fracção a que se refere o n° 4 do artigo 23°, ainda do CIVA” (ver Anexo I, páginas 1/19 a 6/19).

Face ao entendimento dado pela DSIVA e tendo em conta que a “S.G.A. sempre deduziu a 100% o IVA que lhe foi debitado, ou autoliquidado, nos bens e serviços necessários à concretização dos referidos eventos, e não tendo, o contribuinte, optado pela sujeição dos referidos subsídios ou subvenções a IVA, procedemos ao apuramento dos valores do imposto a regularizar seguindo a metodologia:
a) Identificámos os subsídios ou subvenções de igual natureza, atribuídos no exercício de 2001;
b) Apurámos a percentagem de prorata anual, para cada um dos anos de 2001 a 2004, nos termos previstos no nº 4 do Artigo 23° do CIVA com observância do disposto nos números 5 e 8 do mesmo, dispositivo legal (ver páginas 3/54, 5/54, 7/54 e 9/54 do Anexo 3);
c) Não apurámos uma percentagem de prorata para cada evento porque, face ao disposto no n° 1 do artigo 23° CIVA, “( ... ) o imposto suportado nas aquisições é dedutível apenas na percentagem correspondente ao montante anual de operações que dêem lugar a dedução”. Por outro lado, o facto de, em cada ano, serem realizados pelo menos dois eventos em períodos diferenciados que incorporam despesas, com IVA deduzido, cuja imputação, à parte tributada e à parte isenta, é difícil, ou mesmo impossível, aplicação, toma impraticável o apuramento de proratas naqueles termos. Damos como exemplo despesas administrativas tais como as relativas a consumos de água e electricidade, telefone, encargos com o Técnico Oficial de Contas, bem como do imobilizado utilizado naqueles eventos ou nos serviços administrativos cujo IVA também foi objecto de dedução;
d) As percentagens apuradas nos termos referidos na alínea b) deste ponto, com observância do disposto no n° 6 do Artigo 23° do CIVA, foram, trimestralmente, aplicadas com os valores de IVA deduzidos e declarados pelo Sujeito Passivo conforme referenciado nos pontos 2.3.3.1., 2.3.4.1.2. e 2.3.4.1.3. deste relatório;
e) A diferença entre os valores deduzidos e declarados em cada um dos trimestre de 2002 a 2004 e os correspondentes valores apurados como indicado na alínea anterior respeitam aos montantes de IVA que o Sujeito Passivo devia ter regularizado a favor do Estado. (...)» [cfr. RIT a fls. 55 a 57)

H) Com base nas correcções efectuada pelos Serviços de Inspecção Tributária foram emitidas as liquidações adicionais de IVA referentes aos períodos 200203, 200206,200209, 200212, 200303, 200306, 200309, 200312, 200403, 200406, 200409, 200412 e respectivos juros compensatórios, no montante total de € 1.293.194,87, com data limite de pagamento voluntário em 30/11/2006 (cfr. pontos 6 a 8 da p.i.; e fls. 507 a 530 dos autos);

I) Em 04/04/2007, “………………………………………… S.A., na qualidade de detentora da titularidade do capital social da aqui impugnante, requereu ao Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais a ponderação de a Administração Tributária rever oficiosamente os actos tributários em crise na presente impugnação (cfr. fls. 873 a 876 dos autos);

J) O requerimento referido na alínea anterior foi analisado em Nota do Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, nos seguintes termos: “(…) à alegada discrepância face ao direito comunitário da orientação administrativa subjacente à actuação da DGCI foi entretanto, diagnosticada, em termos gerais, pelos próprios serviços da DGCI em relatório de um Grupo de Trabalho criado por despacho do Director-Geral dos Impostos versando sobre a dedução do IVA pelos sujeitos passivos que exercem actividades que conferem direito à dedução e actividades que não conferem esse direito (in Informação do Centro de Estados Fiscais, n° 15/2007, de 18 de Janeiro de 2007, cuja divulgação foi expressamente determinada por despacho superior).

4. Com efeito, no âmbito da extensa análise feita às consequências na legislação interna portuguesa da jurisprudência produzida pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE) relativa ao direito à dedução do IVA por parte de «sujeitos passivos mistos”, o relatório supra-citado:

Faz expressa referência (vd. ponto: nº 34) à orientação decorrente do acórdão de 06.10.2005 relativo ao processo C-204/03 (Comissão/Espanha) no sentido de que “a possibilidade de limitar a medida do direito à dedução dos sujeitos passivos que aufiram subvenções não tributadas limita-se àqueles que pratiquem operações que não conferem direito à dedução a par de operações que conferem esse direito, não podendo ser aplicada aos sujeitos passivos que pratiquem exclusivamente operações que permitam deduzir o IVA suportado a montante”;

Reconhece (vd. ponto IX, nº 75) que a posição que administração fiscal tem vindo a adoptar ao considerar que a circunstância de um sujeito passivo (que pratica exclusivamente operações que conferem direito à dedução) “receber subvenções o colocaria perante a necessidade de apuramento de um prorata de dedução”, embora visando salvaguardar a igualdade de tratamento entre sujeitos passivos integrais e mistos beneficiários de subvenções desta natureza “ tem necessariamente de ser alterada”.

Propõe (vd. ponto XI, conclusão 9.”) que “a adaptação de tal doutrina à jurisprudência comunitária seja imediata e objecto de divulgação generalizada, não exigindo qualquer alteração legislativa.

5. Perante o exposto, propõe-se a remessa do presente requerimento à DGCI, tendo em vista a transposição desta recente clarificação interpretativa para a situação tributária concreta exposta pela Parpública.» (cfr. fls. 870 a 872 dos autos);

L) Em 19/04/2007 o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais exarou na Nota referida na alínea anterior o despacho Concordo (cfr. fls. 870 dos autos);

M) O pedido de revisão Oficiosa apresentado pelo accionista maioritário da impugnante, referido na alínea i) supra, foi apreciado na informação n° 2351 de 31/08/2009 da Divisão de Administração II, da Direcção de Serviços do IVA, na qual se concluiu «Face a tudo anteriormente exposto, renovam-se as conclusões já indiciariamente transcritas e que, objectivamente se concretizam na razão e suas inerentes consequências que devem ser reconhecidas à requerente, subsumível na respectiva anulação das correcções propostas pelos serviços de Inspecção da Direcção de Finanças de Lisboa no valor total de € 1.293.194,78.

Por último, propõe-se, e em nossa opinião é indispensável, que seja dado conhecimento imediato, e com carácter de urgência, ao TAF de Sintra, de todo o conteúdo da presente informação afim de contribuir para formar um melhor juízo e ditar a sentença que entender mais justa sobre a impugnação em curso já mencionada.» (cfr. fls. 835 a 845);

N) Na informação referida na alínea anterior o Subdirector-Geral de Impostos exarou o seguinte despacho, em 02/09/2009 «Visto. Remeta-se o presente processo para apensação à impugnação judicial do TAF de Sintra.» (cfr. fls.835 dos autos);

O) A impugnante nos exercícios de 2002, 2003 e 2004, efectuou operações que conferem o direito à dedução de IVA e operações isentas (cfr. relatório de inspecção tributária);

P) Em 28/02/2008 a impugnante apresentou a presente impugnação (cfr. carimbo fls. 3).


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a.2 - Factos que se aditam, nos termos do art.º 662.º, n.º 1, do CPC:

Q) As rendas recebidas pela recorrente na actividade de arrendamento de imóveis representaram, nos exercícios de 2002 a 2004, uma percentagem do volume de negócios tributados em sede de IVA que não ultrapassa os 0,5%;

R) Com base no referido na alínea anterior, a Administração Tributária considerou que tais operações deviam ser consideradas como inexistentes, por o pro rata ascender a 100% e não conferirem direito à dedução.


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b) De Direito

b.1 - Do efeito do recurso:

Importará antes de mais sindicar a questão prévia suscitada, em sede de alegações pela recorrente e que se traduz na circunstância do presente recurso ter sido recebido com efeito devolutivo, o que acarretará o prosseguimento dos autos de execução fiscal.

Se atentarmos ao teor do n.º 4 do art.º 687.º do C.P.C., na redacção aplicável à data em que o recurso foi recebido, verificamos que o despacho que admitiu o recurso não vincula o Tribunal superior, pelo que nada obsta que se aprecie e decida neste momento se o efeito do recurso deve, ou não, ser o suspensivo.

Constitui jurisprudência pacífica a de que a decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie, ou determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior (cfr. art. 687°, n.° 4, do C.P.C., na anterior redacção), do mesmo modo que o despacho do relator no tribunal superior é também ele provisório, por ser modificável pela conferência por iniciativa do próprio relator, dos seus adjuntos e até das próprias partes.

No caso trazido à colação há que ter presente o comando do artigo 281.º do CPPT, que determina que “os recursos serão interpostos processados e julgados como os agravos em processo cível”. A referência aos agravos deve considerar-se hoje ultrapassada, face à eliminação desta figura recursiva por parte da Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, designadamente para as causas iniciadas depois de 01-01-2008, devendo actualmente entender-se essa referência como sendo feita para o regime do recurso de apelação previsto no CPC no que concerne aos recursos de decisões da 1.ª instância(1). Isto para quem tiver das referências ao processo civil constantes do CPPT uma visão dinâmica, isto é, que acolhe as diferentes alterações da lei subsidiária, mas não para quem das mesma tem uma visão estática, ou seja, quem interpreta tais referências no sentido de constituírem uma aquisição material das normas processuais civis vigentes no momento em que a remissão entrou em vigor, que assim se manteriam imutáveis face a qualquer alteração posterior. Dito de outro modo, tudo se passa para os segundos como se as normas processuais civis passassem a fazer parte do acervo normativo do CPPT; para os primeiros a visão é a oposta, pelo que tais normas valem sempre no contexto do seu diploma de origem.

Sem necessidade de entrar nesta contenda, uma vez que a resolução do caso a dispensa, dir-se-á que no domínio do direito processual fiscal o legislador optou em regra pelo efeito devolutivo - certamente sopesando o interesse público em causa - no sentido de que a eficácia meramente devolutiva apenas devolve ao tribunal ad quem a composição final do litígio, mantendo-se provisoriamente em vigor a composição definida pelo tribunal a quo.

Mas esta orientação regra comporta desde logo duas excepções (cfr. art.º 286.º, n.º 2, do CPPT):
¾ Quando seja possível e se mostre prestada garantia, nos termos do CPTT, ou
¾ Quando o efeito devolutivo possa prejudicar o efeito útil dos recursos.

Nestes casos o efeito devolutivo cede perante o efeito suspensivo.

Assim, o recorrente para obter o efeito suspensivo deve prestar ou demonstrar a existência de garantia ou então alegar e demonstrar que o efeito devolutivo põe em causa o efeito útil do recurso(2).

Mas além destas duas situações pode ainda conjecturar-se ainda uma outra: quando é a própria lei que atribui efeito suspensivo do processo a um determinado meio processual, independentemente de prestação de garantia: nesta hipótese a suspensão abrange também os recursos jurisdicionais que nele sejam interpostos.

Uma outra hipótese será também a resultante da aplicação subsidiária da regra geral prevista no art.º 740.º, n.º 1, do CPC, como defendia Jorge Lopes de Sousa(3), desde que se tenha das remissões constantes do processo tributário para a lei processual civil aquela visão estática a que atrás se fez referência.

E a estas hipóteses pode ainda acrescentar-se uma outra: a da inutilidade da fixação do efeito face às consequências legalmente impostas que a suspensão de um processo provoca noutro que dependa ou esteja intimamente relacionado com aquele, como sucede nos casos das impugnações conexionadas com execuções onde tenha sido prestada garantia

Nos termos do art.º 103.º, n.º 4, do CPPT, “a impugnação tem efeito suspensivo quando, a requerimento do contribuinte, for prestada garantia adequada, no prazo de 10 dias após a notificação para o efeito pelo tribunal, com respeito pelos critérios e termos referidos nos números 1 a 5 e 9 do artigo 199.º”. Este efeito suspensivo impede que a execução seja instaurada ou tendo-o já sido, que prossiga, ficando por isso a aguardar o desfecho final na impugnação(4).

Neste contexto é intuitivo que a fixação do efeito devolutivo à sentença que decidir a impugnação não tem qualquer efeito útil na execução: a suspensão desta mantém-se porque o efeito suspensivo da impugnação não está relacionado com a decisão mas com o próprio processo, à semelhança do que se verifica no processo civil com a regra geral da apelação, prevista no art.º 647.º, n.º 2, do CPC, produzindo por isso efeitos independentemente da decisão transitória que seja proferida na lide impugnatória (cfr. art.º 169.º, n.º 1, do CPPT).

Assim, uma vez que a fixação do efeito devolutivo é portanto inútil, ao efeito suspensivo do processo de execução provocado pela interposição da impugnação (com a prestação de garantia nos moldes legais) deve ser associado o efeito suspensivo do recurso da sentença que nela seja proferida, de modo a compatibilizar os efeitos que a impugnação provoca na execução e aqueles que a garantia prestada nesta ocasiona na primeira.

No caso sub judice, pese embora a recorrente não tenha solicitado que fosse atribuído o efeito suspensivo ao recurso, procedeu, nos termos do n.º 2 in fine do art.º 286.º e n.º 1 do art.º 199.º, ambos do CPPT, à prestação de garantia idónea susceptível de assegurar de assegurar os créditos do requerido conforme podemos constatar a fls. 1041 a 1043 dos autos.

Nesta perspectiva a execução terá necessariamente de suspender-se; assim sendo mostra-se contraditória com essa suspensão a fixação de feito meramente devolutivo ao recurso jurisdicional da impugnação, na medida em que os efeitos são incompatíveis em relação a dois processos que, embora formalmente distintos, estão umbilical e materialmente ligados entre si.

Em face do exposto e tendo ainda presente o núcleo das garantias constitucionais que o regime de suspensão obrigatória da execução visa proteger, fixa-se ao presente recurso efeito suspensivo.


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b.2 - Da violação do princípio da separação de poderes

Como é sabido são as conclusões das alegações do recurso que definem e delimitam o respectivo objecto e consequentemente os poderes e o âmbito de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr. art.º 684.º e 690.º do CPC, então em vigor).

Em sede de alegações a recorrente invoca que o Tribunal a quo valorou uma razão de facto – execução de operações isentas que a próprio Administração Fiscal não invocou, antes pelo contrário, expressamente desprezou considerando-as inexistentes. Actuando deste modo, na opinião da recorrente, a sentença do Tribunal a quo não respeita o princípio da separação de poderes, constitucionalmente consagrado.

Quanto a esta questão a EMMP emitiu parecer, no qual não acompanha a argumentação expendida pela recorrente.

A violação do princípio da separação de poderes traduz uma incompetência absoluta que fulmina a sentença de irreparável nulidade, por conhecimento de questão de que o juiz não podia tomar conhecimento [cfr. art.º 615.º, n.º 1, al. d), do CPC].

A separação de poderes é violada quando o tribunal invade um espaço próprio de outro órgão se soberania, por exemplo, quando se intromete em área que apenas à Administração Fiscal diga respeito. Ora, no caso em apreço nada disso sucede. Conforme resulta do relatório da Direcção de Finanças de Lisboa da Direcção Geral dos Impostos, a fls. 39 dos autos, as operações isentas da recorrente representam “uma pequena percentagem do volume de negócios tributados em sede de IVA, que não ultrapassa os 0,5% a percentagem de prorata ascende a 100%. Nestes termos enquanto esta prorata se mantiver não existe necessidade, em relação ao imposto deduzido a 100% (…) ser precedido do pedido formulado, nos termos do n.º 9 do artigo 23.º do CIVA, no sentido de serem consideradas como inexistentes as operações isentas que não conferem o direito à dedução.

Nesta ordem de ideias a reflexão do tribunal sobre esta asserção da Administração Tributária - que desconsidera as operações isentas face ao pouco impacto que as mesmas têm no volume de negócios, não lhes conferindo qualquer importância face à sua pouca representatividade - não representa a invasão de qualquer espaço em que o juiz não se possa mover, outrossim é emanação do poder jurisdicional de resolução de litígios e de definição das questões cuja solução seja judicialmente demandada.

Não há, pois, qualquer nulidade por violação do princípio da separação de poderes.


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b.3 - Do défice instrutório

Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou parcialmente improcedente a impugnação deduzida pela recorrente, tendo mantido as liquidações de IVA referentes ao período de 2002, a partir de 18-05-2002, 2003 e 2004.

O recorrente alega a existência de défice instrutório em virtude de não constar do probatório a exclusão das rendas.

Se atentarmos ao probatório da sentença, verificamos que a mesma não fez referência à tomada de posição da Administração Tributária face às rendas em apreço, pelo que o Mm.º Juiz a quo não levou em consideração uma questão factual de extrema relevância que se reporta à posição da própria Administração Tributária, que no uso dos seus poderes proferiu sobre a matéria controvertida. Mas essa deficiência foi suprida através do aditamento ao probatório do facto pertinente, razão pela qual se deve considerar tal deficiência sanada.


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b.4 - Da natureza do sujeito passivo da relação jurídico-tributária

A tese vertida na sentença assentou na qualificação da recorrente como sujeito passivo misto, por executar, no exercício da sua actividade, operações tributáveis em sede de IVA e operações isentas. Com efeito, considerou que tratando-se de um sujeito passivo misto e revestindo os subsídios ou subvenções, recepcionados por esta, o carácter do tipo à exploração e não de investimento, os mesmos influenciam o cálculo de percentagem de dedução do imposto suportado a montante pelo beneficiário das mesmas .

O enquadramento rigoroso da questão exige que se precise os conceitos de sujeito passivo misto, sujeito passivo isento e sujeito passivo não isento ou integral.

Os sujeitos passivos integrais praticam operações económicas sujeitas a IVA, na acepção do art.º 4.º, n.º 2 da Sexta Directiva(5) e art.º 2.º, n.º 1, da Directiva IVA(6), seja a montante, seja a jusante, e por isso têm direito à dedução do IVA na exacta medida do imposto que suportaram.

Os sujeitos passivos isentos que beneficiam de uma isenção incompleta não liquidam o IVA nas suas operações económicas a jusante (outputs), o que os impede de deduzir o IVA em que incorreram nas operações a montante (inputs), distintamente dos sujeitos passivos que exercem operações abrangidas por isenções completas, em que o exercício do direito à dedução é concedido.

Os sujeitos passivos mistos praticam, em simultâneo, operações que lhe conferem o direito à dedução do IVA em que incorrem nas suas aquisições (inputs), e outras operações que não conferem direito a tal dedução, por beneficiarem de isenção incompleta de IVA.

Para efeitos do exercício do direito à dedução do imposto suportado estes sujeitos passivos podem recorrer ao método da afectação real ou ao método do pro rata. Em conformidade com este último, têm direito à dedução de IVA que suportaram nos seus inputs na percentagem correspondente ao peso relativo ou fracção que as operações sujeitas a IVA têm no conjunto das operações isentas e não isentas que praticam.

Qualquer uma destas figuras assenta a sua definição no princípio da neutralidade do IVA, principio que se abordará com detalhe mais adiante.


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b.5 - Das subvenções e do direito à dedução

Está em causa sindicar a actuação da AT no domínio da aplicação do método do pro rata, por referência às subvenções recebidas pela recorrente, as quais se devem qualificar como subsídios à exploração, não tributáveis em IVA nos termos do disposto na alínea c) do n.º 5 do artigo 16.º do Código do IVA (CIVA).

A apreciação desta questão envolve uma prévia determinação das características essenciais do IVA, com especial enfoque no que concerne à sua neutralidade na cadeia económica.


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b.5.1 - Características essenciais do IVA

A matriz europeia do IVA conduziu a que este se tornasse no paradigma do imposto da União Europeia(7), construído em torno de uma ideia de mecanismo tributário indirecto e plurifásico, na medida em que se aplica às várias fases do circuito económico, desde o produtor ao retalhista, mas não é cumulativo, pois o seu pagamento é fragmentado pelos vários sujeitos desse circuito económico, através do método do crédito do imposto. Daí que seja encarado como um imposto geral sobre o consumo(8).

Tendencialmente, o IVA visa a tributação de todos os actos de consumo, pelo que em regra incide sobre todas as transacções económicas onerosas(9).

De acordo com o disposto no artigo 1.º, n.º 1, do CIVA, estão sujeitas a IVA as transmissões de bens e as prestações de serviços, efectuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal, as operações intracomunitárias e as importações de bens.

A matriz comunitária do IVA resulta também de constituir um acquis communautaire, já que todos os Estados que aderem à União Europeia são obrigado a adoptar o modelo europeu de imposto sobre o volume de negócios, tal como este é definido pelo ordenamento jurídico europeu.

Essa obrigatoriedade foi imposta pela Primeira Directiva IVA(10), tendo a Segunda Directiva IVA(11) precisado os seus contornos essenciais, dando origem ao primeiro modelo de IVA, substituído em 1977 por um segundo modelo consagrado na Sexta Directiva IVA, que por sua vez foi revogada pela Directiva n.º 2006/112/CE, de 28 de Novembro, habitualmente denominada Directiva IVA(12).

O apertado espartilho do regime europeu do IVA tem reflexos negativos na actuação dos diversos Estados membros, que vêem tolhida a sua margem de liberdade neste domínio(13), o que os impede, por exemplo, de distorcer a legislação europeia em benefício dos seus interesses nacionais, sob pena de violação do direito da União Europeia. Esta limitação tem, porém, um efeito benéfico, já que propicia a manutenção de um padrão comum de aplicação do imposto em todo o espaço europeu ao mesmo tempo que delimita com rigor o campo das pretensões dos contribuintes e o âmbito de actuação das diversas Administrações Fiscais. Mas, por outro lado, acarreta exigências suplementares: à correcta aplicação do IVA é incontornável um amplo conhecimento das várias legislações envolvidas e, sobretudo, o domínio cabal da legislação, jurisprudência e doutrinas europeias(14).

Há um princípio que é transversal a todo o sistema comum do IVA: trata-se do princípio da neutralidade, que emerge dos art.os 2.º e 17.º da Primeira e Sexta Directivas e do art.º 1.º da actual Directiva IVA, segundo o qual o imposto é aplicável a toda a cadeia económica, ou seja, a todas as transacções, sejam elas de produção ou retalho, mas conferindo o direito à dedução do IVA que incidiu directamente nas operações efectuadas a montante quando estejam em causa sujeitos passivos do imposto (método subtractivo indirecto, das facturas ou do crédito de imposto, ou sistema dos pagamento fraccionados).

Isto é, o sujeito passivo tem o direito de deduzir do imposto devido a jusante o IVA suportado na aquisição de bens ou serviços a montante; este método subtractivo permite assim assegurar a neutralidade do IVA em todas as fases do processo produtivo, seja a nível interno ou internacional.

Note-se, contudo, que a neutralidade dos impostos de transacções diferencia-se dos efeitos sobre o consumo e sobre a produção(15). Assim, só se verifica uma neutralidade do imposto relativamente ao consumo quando aquele não influencia as escolhas dos consumidores. Como sublinha Xavier de Basto, “a neutralidade relativamente ao consumo depende exclusivamente do grau de cobertura objectiva do imposto e da estrutura das taxas, estando fora de questão delinear um imposto de consumo totalmente neutro. Sempre terão de ser concedidas algumas isenções (.....) e, provavelmente, existirão diferenciações na taxa aplicável às diferentes transacções de bens e prestações de serviços”(16).

Do mesmo modo, um imposto será neutral para a produção se não induzir nos produtores alterações na organização do respectivo processo produtivo.


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b.5.2 - O que são subvenções?

Conforme refere Clotilde Celorico Palma “os subsídios ou subvenções constituem “uma das “zonas cinzentas” deste imposto [IVA], sendo os distintos enquadramentos que lhe são conferidos nos Estados membros geradores de muitos problemas”(17).

Desde logo porque a legislação comunitária não contém uma definição de subvenção, limitando-se a prever a regra sobre a respectiva inclusão no valor tributável das operações e a possibilidade da respectiva inclusão no cálculo do pro rata. Acresce que o tratamento das subvenções em IVA não é uma matéria totalmente harmonizada ao nível dos diversos Estados membros, pondo-se em causa uma aplicação uniforme do sistema comum e o respeito pela neutralidade do imposto, podendo causar-se distorções de concorrência”(18).

Na legislação portuguesa os subsídios são invariavelmente apelidados de subvenções, diferentemente do que sucede na jurisprudência do TJCE/TJUE, que à própria designação de subsídios acrescenta outras como prémios, ajudas, compensações, incentivos, etc.. Se bem que, sublinhe-se, para o TJCE/TJUE as diferentes designações representem também diversas perspectivas da figura em termos de IVA(19). O que importa reter é que, independentemente das qualificações que lhe possam ser dadas, os subsídios ou subvenções podem representar a contraprestação de uma operação económica enquadrável nos conceitos de transmissão de bens ou prestação de serviços.

Na verdade, por regra o subsídio corresponde a um valor, ajuda ou auxílio pecuniário de natureza pública susceptível de influenciar a contraprestação exigida por uma transmissão de bens ou prestação de serviços. Pode, por isso, representar ele próprio uma contraprestação, constituindo o valor tributável dessa operação (subsídio impróprio); por outro lado, pode consubstanciar um verdadeiro subsídio e estar directamente relacionado com o preço das operações, sendo, como tal, objecto de tributação; doutro passo, pode não ser objecto de tributação mas influenciar o exercício do direito à dedução ou, numa terceira hipótese, ser absolutamente irrelevante para efeitos do IVA. Dito de outro modo, em certas situações os subsídios funcionam como verdadeira parte do custo de certas operações, caindo por isso no âmbito das regras gerais do IVA e saindo fora daquelas que tratam em especial das subvenções.

A razão para os diferentes enquadramentos radica na distorção que a subvenção possa ou não provocar na concorrência. Como observa Clotilde Celorico Palma, “a subvenção tem por efeito uma diminuição do preço final a pagar pelo adquirente e, caso não faça parte do valor tributável das operações, os beneficiários da subvenção serão duplamente beneficiados. Por um lado, serão beneficiados pela diminuição do preço, por outro lado, pelo pagamento de um montante de imposto inferior dado que a base tributável é menor”(20).

Do que fica dito concluiu-se que as subvenções são tratadas no âmbito do sistema do IVA, essencialmente, com base em duas perspectivas: a que inclui a subvenção na base tributável do imposto ou aquela que a engloba no denominador da fracção para efeitos de cálculo do pro rata de dedução da entidade subvencionada(21).

O que leva Clotilde Celorico Palma a sublinhar que “a questão primordial, consiste, antes de mais, em determinar quando é que uma subvenção se consubstancia na contrapartida de uma operação abrangida pelo âmbito de incidência do imposto, só depois se suscitando a questão de saber se faz ou não parte da base tributável e se é susceptível de influenciar o pro rata de dedução do imposto”(22).

Todavia, acrescenta, “no caso dos sujeitos passivos mistos, desde que se conclua que as subvenções representam a contrapartida de operações dentro do âmbito de aplicação do imposto, tal significa que, dependentemente da operação (isenta ou não), vai ser tomada em consideração apenas no denominador do pro rata (operações que não conferem direito à dedução) ou no numerador e no denominador (conjunto das operações tributadas e isentas)”(23).

De harmonia com o ordenamento europeu são incluídos no valor tributável das operações as subvenções ou subsídios directamente relacionados com o preço de cada operação(24).

Os subsídios podem ser à exploração ou ao investimento.

O subsídios à exploração são, em regra, atribuídos para cobertura de défices, como forma de financiamento de parte das despesas gerais ou como participação à forfait em certas despesas de exploração. Nestas hipóteses não são calculados em função de preços ou quantidades vendidas e por isso não são tributados em IVA. Este tem sido também o entendimento da Administração Fiscal(25).

Porém, se conexionados com o preço de cada operação, isto é, quando influenciam a determinação do preço de transmissão de um bem ou o preço de um serviço (seja quando o elemento de conexão entre a subvenção e o preço das operações se relaciona com as quantidades de bens transmitidos ou o volume dos serviços prestados), integram um valor tributável sujeito a imposto, desde que preencham cumulativamente duas condições:
¾ O seu montante seja estabelecido por referência ao número bens transmitidos ou ao volume de serviços prestados;
¾ Sejam fixadas anteriormente à realização dessas operações(26).

É o caso de todos os subsídios que têm por efeito baixar o preço de venda de um bem ou da prestação do serviço (preço inferior ao real).

Isto é, a tributação dos subsídios implica que o respectivo beneficiário preste uma contraprestação a favor do concedente, directamente ou indirectamente, como é o caso das indemnizações compensatórias destinadas a financiar o preço de certas prestações de serviços de interesse geral(27).

Distinguem-se, portanto, das meras transferências que embora tendo aparência de subsídios efectivamente não o são, já que não têm por pano de fundo uma operação ou facto tributário e que por isso não podem ser tributadas.

Já os subsídios ao investimento, que se destinam a financiar capital fixo, como sucede com os subsídios ao equipamento (activos fixos tangíveis), não são tributados.

Ora, como se demonstrará a seguir, o especifico ordenamento jurídico europeu relacionado com os subsídios e subvenções impõe que a limitação do direito à dedução do IVA suportado apenas seja aceitável se existir a percepção de subsídios que não se conexionam com o preço das operações por parte de sujeitos passivos que, antes de as receberem, já eram sujeitos passivos parciais ou mistos, i.e., com inputs utilizados indistintamente na realização de operações com e sem direito a dedução.


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b.6 - Do exercício do direito à dedução

b.6.1 - Das regras comunitárias

O direito à dedução do IVA suportado constitui o pilar central de toda estrutura do imposto, tendo sido desenhado logo no art.º 2.º da Primeira Directiva, que estabelece: “Em cada transacção, o imposto sobre o valor acrescentado, calculado sobre o preço do bem ou do serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto sobre o valor acrescentado que tenha incidido directamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço”.

De harmonia com o estabelecido na Directiva IVA, o Código do IVA determina, como regra geral, a dedutibilidade do imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nas aquisições de bens e serviços feitas a outros sujeitos passivos.

Com efeito, decorre dos artigos 168.º e 169.º da Directiva IVA que o sujeito passivo apenas pode deduzir o imposto suportado quando os bens e serviços sejam utilizados para efeitos das próprias operações tributadas ou isentas que concedam tal direito. Por sua vez, o imposto suportado em inputs destinados à realização de operações não sujeitas não é susceptível de vir a ser deduzido, com excepção das operações transfronteiriças que concederiam o direito à dedução se localizadas exclusivamente no território nacional.

É fundamental, portanto, a distinção entre operações sujeitas e operações não sujeitas. Relativamente às primeiras haverá dedução integral do imposto se à sujeição se seguir efectiva tributação ou isenção com direito a dedução, ao passo que no tocante às segundas o imposto suportado não será deduzido.

Nas situações em que o sujeito passivo, em simultâneo, pratica operações que conferem direito à dedução (tributadas ou isentas com direito a dedução) e operações que não conferem esse direito (não sujeitas ou isentas sem direito a dedução), relativamente ao pro rata de dedução, determina o artigo 173.º da Directiva IVA, o seguinte:

1. No que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo para efectuar tanto operações com direito à dedução, referidas nos artigos 168.º, 169.º e 170.º, como operações sem direito à dedução, a dedução só é admitida relativamente à parte do IVA respeitante à primeira categoria de operações.

O pro rata de dedução é determinado nos termos dos artigos 174.º e 175.º, para o conjunto das operações efectuadas pelo sujeito passivo.

2. Os Estados-membros podem tomar as seguintes medidas:

a) Autorizar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada sector da respectiva actividade, se possuir contabilidades distintas para cada um desses sectores;

b) Obrigar o sujeito passivo a determinar um pro rata para cada sector da respectiva actividade e a manter contabilidades distintas para cada um desses sectores;

c) Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na utilização da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços;

d) Autorizar ou obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução, em conformidade com a regra estabelecida no n.º 1, relativamente a todos os bens e serviços utilizados nas operações aí referidas;

e) Estabelecer que não se tome em consideração o imposto sobre o valor acrescentado que não pode ser deduzido pelo sujeito passivo, quando o montante respectivo for insignificante.

Por sua vez, o artigo 174.º da Directiva IVA estipula que:

1. O pro rata de dedução resulta de uma fracção que inclui os seguintes montantes:

a) No numerador, o montante total do volume de negócios anual, líquido do imposto sobre o valor acrescentado, relativo às operações que conferem direito à dedução em conformidade com os artigos 168.º e 169.º;

b) No denominador, o montante total do volume de negócios anual, líquido do imposto sobre o valor acrescentado, relativo às operações incluídas no numerador e às operações que não conferem direito à dedução.

Os Estados-membros podem incluir no denominador o montante das subvenções que não sejam as directamente ligadas ao preço das entregas de bens ou das prestações de serviços referida no artigo 73.º.”

O método do pro rata ou da percentagem de dedução tem sido consagrado como método geral e supletivo, isto é, será o método utilizado sempre que não deva aplicar-se (por opção do sujeito passivo ou por imposição da Administração Fiscal) ou não possa aplicar-se um outro método, nos termos legalmente estabelecidos.

E compreende-se que assim seja, já que se baseia na relevância que as operações que conferem direito à dedução têm na globalidade de todas as operações, o que pode influenciar a justiça e a razoabilidade da medida da dedução. Daí que a própria Directiva permita aos Estados membros a possibilidade de autorizar ou obrigar os sujeitos passivos à utilização de outros métodos ou procedimentos para apuramento do imposto dedutível.

Assinale-se que este regime é essencialmente idêntico ao regime que vigorava à data dos factos, em que pontificava a Sexta Directiva, que por isso nos dispensamos de escalpelizar.


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b.6.2 - Das regras nacionais

No que respeita às regras nacionais é necessário tomar em consideração dois momentos distintos: antes e depois da entrada em vigor da Lei n.º 67-A/2007, de 10 de Setembro.

Com efeito, antes da Lei n.º 67-A/2007 o art.º 23.º do CIVA dispunha:

1 - Quando o sujeito passivo, no exercício da sua actividade, efectue transmissões de bens e prestações de serviços, parte das quais não confira direito à dedução, o imposto suportado nas aquisições é dedutível apenas na percentagem correspondente ao montante anual de operações que dêem lugar a dedução.

2 - Não obstante o disposto no número anterior, poderá o sujeito passivo efectuar a dedução, segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, sem prejuízo de a Direcção-Geral dos Impostos lhe vir a impor condições especiais ou a fazer cessar esse procedimento no caso de se verificarem distorções significativas na tributação.

3 - A administração fiscal pode obrigar o contribuinte a proceder de acordo com o disposto no número anterior:

a) Quando o sujeito passivo exerça actividades económicas distintas;

b) Quando a aplicação do processo referido no nº 1 conduza a distorções significativas na tributação.

4 - A percentagem de dedução referida no nº 1 resulta de uma fracção que comporta, no numerador, o montante anual, imposto excluído, das transmissões de bens e prestações de serviços que dão lugar a dedução nos termos do artigo 19.º e nº 1 do artigo 20.º e, no denominador, o montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo, incluindo as operações isentas ou fora do campo do imposto, designadamente as subvenções não tributadas que não sejam subsídios de equipamento.

Esta norma, quando comparada com o artigo 173.º, n.º 1, da Directiva IVA (ex artigo 17.º, n.º 5, da Sexta Directiva), denunciava uma perspectiva diferente por parte do legislador nacional que suscitava acrescidas dificuldades interpretativas e não menos embaraços na aplicação concreta, ao mesmo tempo que orientava a actuação da Administração Fiscal num trajecto em rota de colisão com o direito europeu. Com efeito, como referem Xavier de Basto e Odete Oliveira (28) [a] directiva coloca o acento tónico da regulamentação nos bens e serviços utilizados pelo sujeito passivo não só para operações que conferem direito à dedução como também para as que não conferem um tal direito, enquanto o CIVA, na disposição acima citada, acentua, ao invés, o aspecto subjectivo, ou seja os sujeitos passivos que praticam ao mesmo tempo operações com e sem direito à dedução.

Esta diferença de perspectiva, reflectida na redacção das normas, poderia ser fértil em consequências normativas. A nosso ver, dificultou a compreensão das regras do direito à dedução, conduzindo a aplicá-las de modo porventura não conforme ao direito comunitário(29). Na verdade, ao pôr o ênfase na natureza dos sujeitos passivos e não na natureza dos bens utilizados, como faz a directiva europeia, a prática portuguesa tem conduzido a pretender aplicar aos designados sujeitos passivos mistos regras que só se devem impor aos inputs “promíscuos” (para novamente usar uma terminologia da doutrina fiscal italiana), isto é, aqueles que servem indistintamente operações tributáveis e operações isentas Os sujeitos passivos mistos, na verdade, devem, como atrás vimos, ter direito à dedução integral quanto ao imposto contido em bens e serviços que são só utilizados em operações tributadas (e isentas com direito a dedução) e não devem ter qualquer direito a deduzir quanto ao imposto contido em bens e serviços que são só utilizados em operações que não conferem direito à dedução. A disciplina do artigo 23º, interpretado de acordo com a sua fonte comunitária que é o nº 5 da 6ª directiva, não se impõe, sem mais considerações, aos sujeitos passivos mistos, mas apenas aos bens e serviços utilizados pelos sujeitos passivos em que não seja possível separar a utilização respectiva em operações que conferem e operações que não conferem direito à dedução. Só depois de verificada essa impossibilidade de separação tem sentido aplicar a disciplina prevista no artigo 23º (correspondente ao nº 5 do artigo 17º da directiva comunitária). Seja como for, a norma portuguesa tinha sempre, em todo o caso, de ser interpretada em conformidade com o direito comunitário e não podia, como é óbvio, neste domínio dos princípios gerais do direito à dedução em que não são consentidas reservas ou regimes diferenciados, dele afastar-se.”

Com as alterações introduzidas no artigo 23.º do CIVA pela Lei n.º 67-A/2007, a situação alterou-se, passando expressamente a situar-se numa linha de conformidade com o ordenamento jurídico europeu e com a jurisprudência europeia, de que é paradigma o acórdão do TJCE Comissão/ Espanha, adiante referido com mais detalhe.

Por isso e em bom rigor a Lei n.º 67-A/2007, quando dá nova redacção do art.º 23.º do CIVA, não inova no plano jurídico, antes constitui verdadeira interpretação autêntica de um normativo que já devia ser interpretado em conformidade com os princípios comunitários que a referida Lei se limitou a reconhecer.

As alterações introduzidas pelo diploma ao mencionado art.º 23.º do CIVA são estas:

1 - Quando o sujeito passivo, no exercício da sua actividade, efectuar operações que conferem direito a dedução e operações que não conferem esse direito, nos termos do artigo 20.º, a dedução do imposto suportado na aquisição de bens e serviços que sejam utilizados na realização de ambos os tipos de operações é determinada do seguinte modo:

a) Tratando-se de um bem ou serviço parcialmente afecto à realização de operações não decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 2.º, o imposto não dedutível em resultado dessa afectação parcial é determinado nos termos do nº 2;

b) Sem prejuízo do disposto na alínea anterior, tratando-se de um bem ou serviço afecto à realização de operações decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 2.º, parte das quais não confira direito à dedução, o imposto é dedutível na percentagem correspondente ao montante anual das operações que dêem lugar a dedução.

2 - Não obstante o disposto na alínea b) do número anterior, pode o sujeito passivo efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito, sem prejuízo de a Direcção-Geral dos Impostos lhe vir a impor condições especiais ou a fazer cessar esse procedimento no caso de se verificar que provocam ou que podem provocar distorções significativas na tributação.

3 - […].

4 - A percentagem de dedução referida na alínea b) do nº 1 resulta de uma fracção que comporta, no numerador, o montante anual, imposto excluído, das operações que dão lugar a dedução nos termos do nº 1 do artigo 20.º, e, no denominador, o montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do nº 1 do artigo 2.º, bem como as subvenções não tributadas que não sejam subsídios ao equipamento.

5 - […].

6 - A percentagem de dedução referida na alínea b) do nº 1, calculada provisoriamente com base no montante das operações realizadas no ano anterior, assim como a dedução efectuada nos termos do nº 2, calculada provisoriamente com base nos critérios objectivos inicialmente utilizados para aplicação do método da afectação real, são corrigidos de acordo com os valores definitivos referentes ao ano a que se reportam, originando a correspondente regularização das deduções efectuadas, a qual deve constar da declaração do último período do ano a que respeita.

Esta redacção explicitou alguns aspectos controvertidos que vinham de pregresso, especialmente no que concerne à alínea b) do nº 1, que consagra de forma clara e intuitiva a regra da residualidade da percentagem de dedução ou do prorata correspondente ao montante anual das operações que dêem lugar a dedução e que se aplica apenas relativamente aos bens e serviços afectos “à realização de operações decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, parte das quais não confira direito à dedução”.

Por outro lado, a consonância do regime português com o europeu clarificou as regras do exercício do direito à dedução do IVA e que atendem a uma série de exigências, umas atinentes ao tipo de despesa em causa, outras respeitantes ao sujeito passivo em jogo, ou seja, diferenciou entre requisitos objectivos e subjectivos do exercício do direito à dedução, tal como está estatuído na Directiva IVA, que como se disse e reitera, nenhuma alteração de fundo produziu nesta matéria em relação à Sexta Directiva.

Assim, para se exercer o direito à dedução é necessário que se constatem, em simultâneo, os dois requisitos, dos quais o primeiro - requisito objectivo - exige:
¾ O imposto suportado deve constar de factura ou documento equivalente, passado na forma legal, devendo, nomeadamente, referir expressamente o nome do sujeito passivo e estar na sua posse (artigo 36.º, nº 5, do CIVA);
¾ Deverá tratar-se de IVA português, não sendo possível deduzir nas declarações apresentadas à Administração Fiscal portuguesa o IVA de outros Estados membros.
¾ A despesa deve, de per si, conferir o direito à dedução do IVA (isto é, não se deve tratar de uma despesa excluída do direito à dedução, nos termos do disposto no artigo 21.º do CIVA).

Quanto ao segundo - requisito subjectivo - impõe que:
¾ O sujeito passivo tem que ter direito à dedução do IVA;
¾ Só os bens e serviços adquiridos para utilização efectiva na actividade sujeita a tributação do sujeito passivo, com destino à exportação ou adquiridos no âmbito das operações compreendidas no conceito de exportações e dos transportes internacionais previstos no artigo 14.º do CIVA, é que conferem direito à dedução. Dito de outro modo, terá de existir uma correlação directa entre tais bens e ou serviços e o exercício da actividade.

Nos termos do n.º 1 do artigo 19.º do CIVA, confere direito à dedução, nomeadamente, o imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nas aquisições de bens e serviços feitas a outros sujeitos passivos. Já no âmbito da abrangência do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, conferem direito à dedução do IVA, nomeadamente, as transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas, bem como as transmissões de bens e prestações de serviços que consistam em: exportações e operações isentas nos termos do artigo 14.º do CIVA; operações efectuadas no estrangeiro que seriam tributáveis se fossem efectuadas em Portugal; prestações de serviços cujo valor esteja incluído na base tributável de bens importados, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 17.º, do CIVA; operações abrangidas pelas alíneas b), c), d) e e) do n.º 1 e n.os 8 e 10, do artigo 15.º, do CIVA.

Isto é, objectivamente o direito à dedução do IVA apenas é concedido nos casos em que é suportado na aquisição de bens e serviços destinados a operações sujeitas ao imposto e dele não isentas (isenções simples, incompletas ou isenções sem direito a dedução). Ao invés, quando os bens e serviços são adquiridos para a sua aplicação em operações não sujeitas ou para a realização de operações sujeitas mas que beneficiem de uma isenção incompleta, não é conferido o direito à dedução do imposto em que o sujeito passivo incorreu.

Quanto ao exercício do direito à dedução no plano subjectivo importa diferenciar os sujeitos passivos com direito à dedução dos sujeitos passivos sem direito à dedução (que gozam, em exclusivo, de isenções incompletas). No que se refere aos primeiros importa ainda fazer uma outra distinção: entre aqueles que têm direito à dedução integral ou total e os que, exercendo em simultâneo actividades que conferem direito à dedução e actividades que não conferem direito à dedução (sujeitos passivos mistos), têm direito à dedução parcial.

Neste último caso e de harmonia com o regime do CIVA, para efeitos do direito à dedução tais sujeitos passivos mistos podem optar entre o (i) método do pro rata ou da percentagem de dedução, baseado numa relação percentual entre as dimensões de dois volumes: o gerado pelas actividades que permitem a dedução do imposto suportado e o produzido pelas actividades que não possibilitam tal dedução, ou (ii) pelo método da afectação real, um método de separação contabilística em estreita ligação com a efectiva utilização dos bens e serviços adquiridos pelo sujeito passivo na sua actividade económica, separando-os em função de concederem ou não o exercício do direito à dedução do IVA suportado.

Deste regime resulta assim que a afectação exclusiva de um bem ou serviço à realização de operações que conferem o direito à dedução em regra permite a dedução integral do IVA suportado; inversamente, se os bens ou serviços forem afectados, em exclusivo, a operações que não conferem o direito à dedução, então a totalidade do IVA suportado na aquisição desses bens ou serviços não pode ser deduzido. À partida, a utilização exclusiva de um bem ou serviço num ou noutro tipo de operações deve produzir efeitos directos quanto à dedução do IVA, sem que tal dependa do método que o sujeito passivo adopte para calcular a dedução em relação aos demais bens ou serviços(30).


*

b6.3 - A jurisprudência do TJCE/TJUE

A jurisprudência europeia sobre o regime do direito à dedução é ampla e uniforme quanto ao reconhecimento de que este constitui uma peça fundamental no funcionamento do sistema de IVA, tal como este resulta das várias Directivas que o disciplinaram, constituindo um mecanismo essencial à prossecução dos princípios da neutralidade do imposto e do tratamento fiscal igualitário, cujas derrogações, tendo em conta essa especificidade, “são de interpretação restrita”(31).

Cite-se, para mencionar apenas alguma jurisprudência, o caso do Acórdão BP Soupergaz(32), ao referir-se ao método subtractivo indirecto, das facturas, do crédito de imposto ou do sistema dos pagamentos fraccionados. Salienta-se nas conclusões do Acórdão: “A este respeito, o direito à dedução previsto nos artigos 17.º e seguintes da Sexta Directiva, que faz parte integrante do mecanismo do imposto sobre o valor acrescentado, não pode, em princípio, ser limitado e exerce-se imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efectuadas a montante, tem incidência no nível do encargo fiscal e deve aplicar-se similarmente em todos os Estados-Membros, de modo que só são permitidas derrogações nos casos expressamente previstos pela directiva.”

No Acórdão Comissão/França(33) o TJCE considerou que “as características do imposto sobre o valor acrescentado (…) permitem inferir que o regime das deduções visa libertar inteiramente o empresário do ónus do IVA, devido ou pago, no âmbito de todas as suas actividades económicas. O sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado garante, por conseguinte, a perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as actividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas actividades, na condição de as referidas actividades estarem, elas próprias, sujeitas ao IVA».

Por outro lado, o TJCE considerou que não era necessário o início efectivo de actividade para conferir o direito à dedução, podendo o IVA ser deduzido mesmo em relação a acti­vidades preparatórias, como obtemperou no Acórdão D. Rompelman-Van Deelen c. Minister van Financiën(34). E o TJCE foi ainda mais longe: uma vez adquirido o direito à dedução permanece mesmo que a actividade económica projectada não dê origem a operações tributáveis ou o sujeito passivo, por motivos alheios à sua vontade, não tenha podido utilizar os bens ou serviços que deram origem à dedução no âmbito de operações tribu­tá­veis(35).

Isto é, o grau de abrangência do direito à dedução deve «deve ser aplicado de tal forma que o seu âmbito de aplicação corresponda, na medida do possível, ao âmbito das actividades profissionais do sujeito passivo, como se observou no Acórdão de 8 de Março de 1988, Intiem(36), n. 14, tirado no âmbito de aplicação da Sexta Directiva.

Para o caso sub judice têm especial interesse um conjunto de acórdãos constituído pelos Acórdãos Comissão/Espanha(37), Comissão/França, já citado, e o recente acórdão Varzim Sol - Fazenda Pública(38).

No Acórdão Comissão/Espanha o TJCE decidiu acerca da questão relacionada com a possibilidade conferida aos Estados membros de determinarem a inclusão das subvenções não tributadas, desligadas do preço das operações realizadas por um sujeito passivo, no denominador do pro rata de dedução. De harmonia com a doutrina do acórdão, essa possibilidade, contida primeiro parágrafo - segundo travessão - do n.º 1 do artigo 19.º da Sexta Directiva, remete expressamente para o n.º 5 do seu artigo 17.º, o qual apenas se destina a regular a dedução por parte dos sujeitos passivos mistos e não dos sujeitos passivos integrais.

Na economia do acórdão a limitação apenas pode abranger os sujeitos passivos que, auferindo subsídios não tributados, realizam operações que não conferem direito à dedução conjuntamente com operações que conferem tal direito, não podendo essa limitação ser estendida aos sujeitos passivos que pratiquem exclusivamente operações que permitam deduzir o IVA suportado a montante.

No caso Varzim Sol, desencadeado por um pedido de decisão prejudicial do Supremo Tribunal Administrativo relativo à interpretação dos artigos 17.º, n.º 2, e 19.º da Sexta Directiva, o TJUE considerou que tais normas devem ser interpretadas no sentido “de que se opõem a que um Estado-Membro, quando autoriza os sujeitos passivos mistos a efetuar a dedução prevista nas referidas disposições, com base na afetação da totalidade ou de parte dos bens e serviços, calcule o montante dedutível, para os setores em que esses sujeitos passivos apenas efetuem operações tributáveis, incluindo as subvenções não tributáveis no denominador da fração que serve para determinar o pro rata de dedução”.

Saliente-se que a causa foi decidida pelo STA, através do acórdão de 10-10-2012(39), nestes termos:

I - Os artigos 17.º, nºs 2 e 5, e 19.º da Directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17 de Maio de 1977 (Sexta Directiva), devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que um Estado-Membro, quando autoriza os sujeitos passivos mistos a efectuar a dedução prevista nas referidas disposições com base na afectação da totalidade ou de parte dos bens e serviços, calcule o montante dedutível, para os sectores em que esses sujeitos passivos apenas efectuem operações tributáveis, incluindo as «subvenções» não tributáveis, no denominador da fracção que serve para determinar o pro rata de dedução.

II - Dado que a Impugnante optou por autonomizar, nos termos do artigo 23.º do CIVA, os seus sectores de actividade, isentos e tributáveis, pelo método de dedução por afectação real dos bens e serviços utilizados em cada um desses sectores - opção essa que não sofreu oposição nem conheceu quaisquer limitações por parte da Administração Fiscal, e que é conforme à lei comunitária, mormente ao artigo 17.º n.º 5 da 6ª Sexta Directiva - tal autonomia tributária determina ser inadmissível a limitação ao direito à dedução de sectores sujeitos a IVA com dedução integral, por tal contrariar o disposto nos aludidos arts. 17º, nºs. 2 e 5, e 19º, da Sexta Directiva 77/388/CEE.

Deste conjunto de acórdãos do TJCE/TJUE resulta, assim, que, no concerne ao direito à dedução o art.º 23.º do CIVA, mesmo na redacção vigente à data dos factos, deve ser interpretado no sentido que veio a ser acolhido na nova redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 67-A/2007.

Aliás, no relatório do Grupo de Trabalho criado por Despacho do Ministro de Estádio e das Finanças, de 20 de Abril de 2005 para simplificação do Sistema Fiscal, refere-se, a dado passo, o seguinte:

“42. Finalmente, um outro domínio em que a jurisprudência do TJCE deve influenciar decisivamente o modo como a administração fiscal portuguesa vem interpretando e aplicando o n.º 4 do artigo 23.º do CIVA, tem a ver com os casos em que pode haver lugar à consideração do montante das subvenções não tributadas para efeitos do apuramento do pro rata de dedução. Também esta matéria não exige um particular esforço interpretativo do teor daquela disposição, bastando a necessária adequação dos procedimentos adoptados ao sentido das correspondentes decisões do TJCE.

No Acórdão de 6 de Outubro de 2005, relativo ao processo C-204/03 (Comissão/Espanha, Colect. p. I-8420), o TJCE decidiu que a possibilidade dada aos Estados membros no segundo travessão do primeiro parágrafo do n.º 1 do artigo 19.º da Sexta Directiva, no sentido de poderem determinar a inclusão no denominador da fracção para cálculo do pro rata das subvenções não directamente ligadas ao preço das operações, respeita unicamente aos sujeitos passivos mistos, não podendo ser aplicada aos sujeitos passivos integrais.

Sobre esta matéria, a administração fiscal portuguesa vem considerando, mesmo nas situações em que um sujeito passivo pratique exclusivamente operações que conferem direito à dedução do IVA, que a circunstância de esse sujeito passivo receber subvenções o colocaria perante a necessidade de apuramento de um pro rata de dedução, desde que não ligadas ao preço das operações por ele realizadas ou não destinadas à aquisição de bens de investimento.

Esta posição da administração fiscal portuguesa representa uma limitação do direito à dedução do IVA suportado pelos sujeitos passivos integrais, que deveriam, portanto, ter direito à sua completa desoneração.

Todavia, a citada jurisprudência comunitária já definiu que tal limitação do direito à dedução só pode ser aplicada aos sujeitos passivos que realizem operações que conferem direito a dedução a par de operações que não conferem esse direito.

Sendo assim, a doutrina da administração fiscal portuguesa – pese embora ter em vista colocar em condições de igualdade os sujeitos passivos integrais e os sujeitos passivos mistos quando recebam certos tipos de subvenções – tem necessariamente de ser alterada.”

O Relatório concluí pela adaptação da doutrina da Administração Fiscal à jurisprudência comunitária sem necessidade de qualquer alteração legislativa, entendendo que o citado art.º 23.º do CIVA, no qual a referida previsão se insere, diz respeito, incluindo numa interpretação meramente literal, especificamente à situação dos sujeitos passivos mistos.

É também o que concluem Odete Oliveira e Duarte Severino(40), quando perguntam: [s]erá que por mero efeito da percepção de subvenções não conexas com o preço dos bens ou serviços transaccionados nos termos descritos, um sujeito passivo que apenas efectua operações com direito a dedução (tributadas e isentas taxa zero), passa a ter de apurar e utilizar um pro rata ou percentagem de dedução para determinar a parcela dedutível do imposto que suportou nos inputs necessários à sua actividade?

A resposta, dizem, “terá forçosamente de ser negativa”, pois que a regra do prorata só pode aplicar-se quando existam bens e serviços utilizados indistintamente em operações tributadas e isentas, ‘bens de uso promíscuo’, já que os utilizados somente num dos tipos de operações têm o seu regime de dedução bem definido: ou o são em operações tributadas e então conferem direito à dedução integral, ou o são em operações isentas que não conferem de todo esse direito. Nada pois de interferir, através do prorata, no regime do direito à dedução para estes dois tipos de inputs produtivos, distorcendo a tributação.”

Daí que concluam que as subvenções não sujeitas a tributação apenas relevem no casos em que o respectivo beneficiário seja um sujeito passivo que utilize os inputs adquiridos indistintamente em operações com e sem direito a dedução.

À mesma conclusão chegam Xavier de Basto e Odete Oliveira(41), para quem as “subvenções não tributadas que não sejam subsídios de equipamento” já estavam incluídas no denominador previsto na versão anterior do artigo 23º. Trata-se, argumentam, “de uma faculdade que a 6ª Directiva concede aos Estados, no segundo traço do n.º 1 do artigo 19.º, mas cuja aplicação é restrita aos sujeitos passivos “mistos” e não pode ser estendida a sujeitos passivos integrais que recebam subvenções daquele tipo, como já entre nós se tem pretendido e até praticado”.

É indiscutível, portanto, que o artigo 23º do Código do IVA, seja antes ou depois da alteração da sua redacção em 2007, assim como todo o corpo normativo do IVA que permite determinar o montante dedutível do imposto, deve ser interpretado à luz da Directiva IVA, que, como se disse manteve o regime que já vinha da Sexta Directiva, vigente à data dos factos. O que nos permite concluir que em caso algum um Estado membro pode dificultar e ou restringir o direito à dedução por referência ao âmbito com que este é acolhido pelas Sexta Directiva e Directiva IVA.

No caso sub judice estamos perante subsídios à exploração fora do âmbito de incidência do imposto, tal como reconhece a Administração Fiscal.

Em conformidade com as regras comunitárias e nacionais, com a doutrina e com a prática da Administração Fiscal, as subvenções à exploração, são subvenções não tributadas.

Tais subvenções só poderão influenciar a determinação do pro rata relativamente aos sujeitos passivos mistos.

No caso sub judice e tal como resulta da matéria de facto, é a própria AT que, face à baixíssima expressão das operações isentas (0,5%), considerou a impugnante como sujeito passivo integral.

Consequentemente, é indevida a utilização do método pro rata no caso presente.

Sumariando, para concluir:
(i). No processo judicial tributário os recursos jurisdicionais têm em regra efeito devolutivo, com excepção dos casos em que seja possível e se mostre prestada garantia, ou quando o efeito devolutivo possa prejudicar a utilidade dos recursos.
(ii). A estes casos pode ainda acrescentar-se o efeito suspensivo do próprio processo, quando legalmente previsto, que produz efeitos sobre o recurso jurisdicional que nele venha a ser interposto.
(iii). Bem como o que resulta da aplicação subsidiária da regra geral prevista no art.º 740.º, n.º 1, do CPC, na versão do CPC anterior ao Decreto-Lei nº 303/2007, de 24 de Agosto, caso se entenda que as referências ao processo civil constantes do CPPT são estáticas, no sentido de constituírem uma aquisição material das normas processuais civis vigentes no momento em que a remissão entrou em vigor, constituindo essas normas processuais civis (ainda que posteriormente revogadas), parte material do acervo normativo do CPPT.
(iv). E por fim o efeito suspensivo deve ser fixado nos casos em que é inútil a fixação do efeito devolutivo perante os efeitos que a suspensão de um processo provoca noutro que dependa ou esteja intimamente relacionado com aquele, como sucede nos casos das impugnações conexionadas com execuções onde tenha sido prestada garantia.
(v). Os sujeitos passivos integrais praticam operações económicas, na acepção do art.º 4.º, n.º 2 da Sexta Directiva [(77/388/CEE),] e art.º 2.º, n.º 1, da Directiva IVA (2006/112/CE) sujeitas a IVA, seja a montante, seja a jusante, e por isso têm direito à dedução do IVA na exacta medida do imposto que suportaram.
(vi). Os sujeitos passivos que beneficiam de uma isenção incompleta não liquidam o IVA nas suas operações económicas a jusante (outputs), encontrando-se impedidos de deduzir o IVA em que incorreram nas operações a montante (inputs), distintamente dos sujeitos passivos que exercem operações abrangidas por isenções completas, em que o exercício do direito à dedução é concedido.
(vii). Os sujeitos passivos mistos praticam em simultâneo operações que lhes conferem o direito à dedução do IVA em que incorrem nas suas aquisições e outras operações que não conferem direito a tal dedução, por beneficiarem de isenção incompleta de IVA.
(viii). Estes sujeitos apenas têm direito à dedução do IVA que suportaram nos seus inputs na percentagem correspondente ao peso relativo ou fracção que as operações sujeitas a IVA têm no conjunto das operações isentas e não isentas que praticam, calculada de acordo com o método do pro rata.
(ix). Os subsídios ou subvenções são tratados no âmbito do sistema do IVA essencialmente em torno de duas vertentes: a inclusão da subvenção na base tributável do imposto ou no denominador da fracção para efeitos de cálculo do pro rata de dedução da entidade subvencionada.
(x). Assim, a questão essencial consiste em determinar quando é que uma subvenção se consubstancia na contrapartida de uma operação abrangida pelo âmbito de incidência do imposto, só depois se suscitando a questão de saber se faz ou não parte da base tributável e se é susceptível de influenciar o pro rata de dedução do imposto.
(xi). Todavia, no caso dos sujeitos passivos mistos, desde que se conclua que as subvenções representam a contrapartida de operações dentro do âmbito de aplicação do imposto, tal significa que, dependentemente da operação (isenta ou não), vão ser tomadas em consideração apenas no denominador do pro rata (operações que não conferem direito à dedução) ou no numerador e no denominador (conjunto das operações tributadas e isentas).
(xii). Os subsídios podem ser à exploração ou ao investimento. O subsídios à exploração são, em regra, atribuídos para cobertura de défices, como forma de financiamento de parte das despesas gerais ou como participação à forfait em certas despesas de exploração.
(xiii). Os subsídios ao investimento destinam-se a financiar capital fixo, como sucede com os subsídios ao equipamento (activos fixos tangíveis) e não são tributados.
(xiv). As subvenções à exploração são subvenções não tributadas que só poderão influenciar a determinação do pro rata relativamente aos sujeitos passivos mistos.
(xv). O ordenamento jurídico europeu relacionado com os subsídios e subvenções impõe que a limitação do direito à dedução do IVA suportado só é aceitável se existir a percepção de subsídios que não se conexionam com o preço das operações por parte de sujeitos passivos que, antes de as receberem, já eram sujeitos passivos parciais ou mistos, i.e., com inputs utilizados indistintamente na realização de operações com e sem direito a dedução.
(xvi). Assim, a Lei n.º 67-A/2007, quando dá nova redacção do art.º 23.º do CIVA, não inovou no plano jurídico, antes constituiu verdadeira interpretação autêntica de um normativo que já devia ser interpretado em conformidade com os princípios comunitários que a referida Lei se limitou a reconhecer.
(xvii). O artigo 23º do Código do IVA, seja antes ou depois da alteração da sua redacção em 2007, assim como todo o corpo normativo do IVA que permite determinar o montante dedutível do imposto, deve ser interpretado à luz da Directiva IVA, que manteve o regime que já vinha da Sexta Directiva.
(xviii). Neste contexto, em caso algum um Estado membro pode dificultar e ou restringir o direito à dedução por referência ao âmbito com que este é acolhido pelas Sexta Directiva e Directiva IVA.
(xix). A jurisprudência europeia sobre o regime do direito à dedução é ampla e uniforme no sentido de que este constituiu um mecanismo essencial à prossecução dos princípios da neutralidade do imposto e do tratamento fiscal igualitário, cujas derrogações, tendo em conta essa especificidade, são de interpretação restrita.
(xx). Essa jurisprudência entende também que a limitação do direito à dedução pelo método do pro rata apenas pode abranger os sujeitos passivos que, auferindo subsídios não tributados, realizam operações que não conferem direito à dedução conjuntamente com operações que conferem tal direito, não podendo essa limitação ser estendida aos sujeitos passivos que pratiquem exclusivamente operações que permitam deduzir o IVA suportado a montante.

Concluindo, o recurso merece integral provimento, o que implica a revogação da sentença recorrida e a emissão de um segmento decisório que determine a procedência total do pedido impugnatório [art.º 665.º, n.º 1, do CPC, ex vi do art.º 1.º, al. e), do CPPT]


*

3 - Dispositivo:

Em face de todo o exposto acordam em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e em julgar totalmente procedente a impugnação, anulando as liquidações em causa.

Custas pela Fazenda Pública, apenas na primeira instância.

D.n.

Lisboa, 2014-02-13

________________________________________ (Benjamim Barbosa)

____________________________________________ (Anabela Russo)

_____________________________________________ (Aníbal Ferraz)






1- Neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Processo Tributário Anotado e Comentado, IV Vol., 6ª. ed., Áreas Editora, 2011, p. 428.

2- Jorge Lopes de Sousa, op. cit., pp. 508 e ss..

3-Código de Processo Tributário Anotado e Comentado, II Vol., Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, p. 835 e ss..

4- Cfr., neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, op. cit., II Vol., 2011, p. 175 e ss.

5-Directiva n.º 77/388/CEE, do Conselho, de 17 de Maio de 1977, publicada no JO n.º L 145, de 13.06.77

6- Directiva n.º 2006/112/CE, publicada no JO n.º L 347, de 11-12-2006.

7- Imposto que, todavia, não se encontra totalmente harmonizado. Com efeito, embora se esteja perante um sistema comum harmonizado existem várias diferenças entre os regimes IVA dos Estados membros, decorrentes, desde logo, de opções permitidas pelas regras comunitárias, mas também de derrogações, infracções e distintas interpretações.

8- A este propósito cfr. Xavier de Basto, A tributação do consumo e a sua coordenação internacional, CCTF n.º 164, DGCI, Lisboa 1991, pp. 39 a 73 e Clotilde Celorico Palma, Introdução ao Imposto sobre o Valor Acrescentado, 2ª edição, Coimbra, Almedina, Outubro de 2005, pp. 15 a 25.

9- Os conceitos das operações tributáveis em sede deste imposto encontram-se definidos pela positiva no Código e no Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias de Bens (RITI), com excepção do conceito de prestação de serviços. Ora, o conceito de prestação de serviços encontra-se delimitado de forma residual ou negativa no artigo 4.º, n.º 1, do Código do IVA – “São consideradas como prestações de serviços as operações efectuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens”. Através deste conceito, consegue-se, desta forma, tributar todo o acto de consumo.

10-Directiva n.º 67/227/CEE, do Conselho, de 11 de Abril de 1967 (JO L 71, de 14.03.1967).

11- Directiva n.º 67/228/CEE, do Conselho, de 11 de Abril de 1967, que instituiu o primeiro sistema comum do IVA na Comunidade Económica Europeia (JO L 71, de 14.03.1967).

12- No essencial esta Directiva reformulou o texto da Sexta Directiva, que se encontrava excessivamente denso, por força das sucessivas alterações que lhe foram introduzidas desde a sua aprovação, constituindo por isso uma autêntica consolidação legislativa, que operando a revogação de várias directivas de IVA passou a ter 414 artigos (a Sexta Directiva tinha 53). Assim, a nova Directiva (abreviadamente, Directiva IVA), é hoje o tronco comum do sistema vigente.

13- O TJCE no seu Acórdão Svenska staten vs. Stockholm Lindöpark AB e Stockholm Lindöpark AB vs. Svenska staten, de 18 de Janeiro de 2001, Proc. C-150/99, Colect. 2001, p. I –00493, cons. 42, veio confirmar que a adopção de legislação nacional contrária à Sexta Directiva faz o Estado membro incorrer em responsabilidade civil pelos danos causados a particulares.

14- Existem centenas de acórdãos do TJCE/TJUE em matéria de IVA, pelo que qualquer estudo mais aprofundado deste tributo passa, obrigatoriamente, por uma reflexão dos casos analisados pelo tribunal. Sobre a jurisprudência comunitária, veja-se, entre nós, Patrícia Noiret Cunha, Imposto sobre o Valor Acrescentado, Anotações ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado e ao Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias, Instituto Superior de Gestão, 2004 e Rui Laires, “O Tratamento em IVA das Subvenções na Legislação e na Jurisprudência Comunitária”, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 419, Centro de Estudos Fiscais, 2007.

15- A este propósito cfr. Xavier de Basto, “A tributação do consumo e a sua coordenação internacional”, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 164, Lisboa, 1991 n.º 164, pp. 29 a 61. O autor de­mons­tra, através de vários exemplos, que o IVA “resiste bem ao teste da neutralidade”, embora não seja perfeito, devido, nomeadamente, à existência de isenções incompletas, que não conferem direito à dedução do imposto suportado.

16- Xavier de Basto, op. cit., pp. 29 e 30.

17- As entidades Públicas e o Imposto Sobre o Valor Acrescentado. Uma ruptura no Princípio da Neutralidade, Coimbra, Almedina, 2010, pp. 561 e ss.

18- Idem, p. 565.

19- Sobre o enquadramento das subvenções em IVA veja-se Rui Laires, op. cit..

20- Op. cit., p. 567.

21- Assim, Clotilde Celorico Palma, op. cit., p. 571, citando Jiménez Compaired [“VAT and Public Bodies in EC Member States”, Intertax, n.ºs 6/7, Volume 36, June/July 2008, pp. 19 e ss.], o qual identifica ambas as situações como modalidades de correcção do que seria o resultado inicial do resultado entre o IVA liquidado e o IVA dedutível.

22- Op. e loc. cit., referindo em nota de rodapé: «A distinção da Directiva IVA no que se reporta a subvenções directamente ligadas ao preço das operações é muito frágil, tal como se verificava desde logo no Premier rapport de la Commission au Conseil sur le fonctionnement du système commun de la taxe sur la valeur ajoutée présenté conformément à l’article 34 de la sixiéme directive (77/388/CEE du 17 mai 1977), já cit.
A este propósito Xavier de Basto, in A tributação do consumo e a sua coordenação internacional, Lições sobre harmonização fiscal na Comunidade Económica Europeia, p. 212, demonstra que a solução da Directiva está, por outro lado, longe de ser de aplicação fácil pelos Estados membros, dado que implica a distinção entre subvenções “directamente ligadas ao preço” das operações, a incluir na base tributável, e as de outra natureza, que não contam para a determinação daquela base. Ora, atendendo à diversidade de situações que se podem verificar, nem sempre é fácil a distinção. Como nota, quando o montante dos subsídios é determinado quer por referência aos preços de venda quer às quantidades vendidas (“indemnizações compensatórias”), é nítido tratar-se de subvenções directamente ligadas aos preços, bem como não suscitará dúvidas a não inclusão das subvenções de capital. Já todavia se poderá revelar árduo decidir a questão quanto a outros tipos de subsídios de exploração, que são pagos para melhorar a posição económica das empresas, mas que não são calculados com referência a preços ou quantidades vendidas, por exemplo, das chamadas “subvenções de equilíbrio”, calculadas a posteriori para a cobertura de défices de exploração, e das “subvenções de funcionamento”, que constituem complementos de receitas determinados a priori, independentemente dos resultados da exploração».

23- Ibidem.

24- Refere Clotilde Celorico Palma que “a doutrina é unânime em justificar a inclusão dos subsídios directamente relacionados com o preço das operações no valor tributável com o facto de se pretender evitar a existência de consumos não tributados, protegendo-se, assim, a neutralidade do imposto. Note-se que o efeito das subvenções é distinto consoante as mesmas se recebam na última fase da cadeia de produção ou distribuição dos bens e serviços ou em fases anteriores, só fazendo sentido tributar as subvenções no primeiro caso”. Op. cit., p. 566, nota 1127.

25- Emanuel Vidal Lima, IVA – Imposto sobre o Valor Acrescentado, comentado e anotado, 9ª edição, Porto Editora, 2003, p. 336.

26- A alínea c) do n.º 5 do artigo 16.º do CIVA, estabelece que por subvenção ou subsídio directamente conexo com o preço das operações deve entender-se aqueles que, em simultâneo, sejam fixados anteriormente à realização da operação e sejam estabelecidos em função do número de unidades transmitidas ou do volume de serviços prestados.

27- Cfr. Acórdão Keeping Newcastle Warm Limited, de 13-06-2002, Proc. C-353/00, Colect. p. I-5434, e em especial, concl. 36 da advogada-geral Stix-Hackl, Colect. p. I-05419.

28- Desfazendo mal-entendidos em matéria de direito à dedução de imposto sobre o valor acrescentado: as recentes alterações do artigo 23.º do Código do IVA”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 1, número 1, Primavera, Almedina, 2008, pp. 58 e ss.

29- Simplificação do Sistema Fiscal. Relatório do Grupo de Trabalho criado por Despacho do Ministro de Estádio e das Finanças, de 20 de Abril de 2005, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 201, Lisboa, 2007, pp. 252-254.

30- Neste sentido, cfr. Xavier de Basto e Odete Oliveira, op. cit. pp. 48 e ss.

31- Acórdão de 8 de Janeiro de 2002, Metropol, Proc.C-409/99, Colect. 2002, p. I-00081 (n.º 59).

32- Acórdão de 6 de Julho de 1995, BP Soupergaz, Proc.C-62/93, Colect. 1995, p. I-188, n.º16.

33- Acórdão de 21 de Setembro de 1988, Proc.50/87, Colect. p. 04797, n.º15.

34- Acórdão de 14 de Fevereiro de 1985, Rompelman, Proc. 268/83, Recueil 1985, p.00655.

35- Veja-se a este propósito, nomeadamente, os Acds INZO, de 29 de Fevereiro de 1986, Proc. C-110/94, Colect., p. I-857 e Ghent Coal Terminal, de 15 de Janeiro de 1989, Proc. C-37/95, Colect. p.I-1.

36- Acórdão de 8 de Março de 1988, Intiem, Proc. 165/86, Colect., p. 1471.

37- De 6 de Outubro de 2005, Proc. C-204/03, Colet., p. I-8389.

38- Acórdão de 16 de Fevereiro de 2012 (pedido de decisão prejudicial do Supremo Tribunal Administrativo), Varzim Sol/Fazenda Pública, Proc. C-25/11, JO C 98/9, de 31-03-2012.

39- Rec. n.º 0514/10, integralmente disponível in www.dgsi.pt.

40- “O tratamento das subvenções em IVA. Reflexões antes e depois dos Acórdãos de 2005”, Estudos em memória de Teresa Lemos, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal n.º 202, Lisboa 2007, pp. 223-241
41 - Op. cit. p. 70.