Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 594/07.0BEALM |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 06/25/2020 |
Relator: | VITAL LOPES |
Descritores: | EXECUÇÃO FISCAL; TÍTULO EXECUTIVO; DÍVIDA DA RESPONSABILIDADE DE AMBOS OS CÔNJUGES. |
Sumário: | 1. Quer a nulidade insanável por falta de requisitos essenciais do título, quer a nulidade da citação não podem ser conhecidas em processo de oposição à execução. 2. Porque, nos termos do disposto no art. 1691.º, n.º 1, alínea d), do CC, são da responsabilidade de ambos os cônjuges as dívidas contraídas por qualquer um deles no exercício do comércio, a menos que se prove que não foram contraídas em proveito comum do casal, ou se vigorar entre ambos o regime de separação de bens, não pode proceder a oposição deduzida pelo cônjuge daquele que consta do título executivo como devedor e que foi citado como co–executado se o fundamento da sua invocada ilegitimidade consiste em não constar do título executivo. 3. Provando-se que entre a devedora que figura do título e o Recorrente seu cônjuge (tornado co–executado pela citação) vigorava à data do facto que originou a dívida (art.º 1690.º, n.º 2 do CC) o regime de comunhão de adquiridos compete ao Recorrente elidir a presunção legal de comunicabilidade das dívidas derivada do artigo 1691 nº 1 alínea d) do Código Civil. 4. Não logrando o Recorrente fazer prova de que a dívida não foi contraída em proveito comum do casal, pela mesma são responsáveis ambos os cônjuges, nos termos do citado preceito do Código Civil. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL 1 – RELATÓRIO A......................... recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada que julgou improcedente a oposição deduzida ao processo de execução fiscal n.º ........................., instaurado contra I ......................... para cobrança de dívida proveniente do Instituto do Emprego e Formação Profissional, do ano de 2000, no valor global de 66.095,11 Euros, respeitando 41.087,78 Euros à quantia exequenda e 25.007,33 a acrescidos. O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo (fls.133). O Recorrente termina as alegações com as seguintes e doutas conclusões: « A O princípio da economia processual e o direito à tutela judicial efectiva possibilitando ao interessado o acesso aos tribunais lançam por terra a posição defendida na sentença recorrida a propósito da falta de idoneidade do meio utilizado pelo Opoente para fazer valer os seus direitos, e determinam a convolação da Oposição no meio adequado.B À data do conhecimento da constituição da dívida exequenda, entre A ......................... e I ........................., sua cônjuge, já não vigorava o regime de comunhão de adquiridos, uma vez que se encontravam Separados Judicialmente de Pessoas e bens, havendo por isso o regime da incomunicabilidade das dívidas derivada do artigo 1788º ex vi 1794° ambos do C. Civil.C A Citação do Oponente é Nula e a dívida exequenda é-lhe incomunicável, pelo que deve a execução contra o mesmo requerida ser extinta com os legais efeitos.D A decisão recorrida viola entre outras normas que V. exas suprirão, as que sura se deixaram alegadas e que aqui se reproduzem para todos os legais efeitos.Termos em que, Com o douto suprimento de V. Exas deve proceder o presente Recurso e em consequência revogada aa decisão recorrida com o legais efeitos, como é de esperada JUSTIÇA!». O Recorrido IEFP apresentou contra-alegações, que culmina com as seguintes e doutas conclusões: 1. – Mantêm-se e dão-se por reproduzidos os factos, as alegações e considerandos invocados na nossa contestação, constante nos autos; 2. – Os factos são claros e estão devidamente provados e não podem deixar de corroborar a interpretação e aplicação da lei feita pela douta Sentença; 3. – Salvo o devido respeito, não podia ocorrer a convolação pretendida pelo Recorrente, pois resulta claramente de todo o processo que, no momento em que foi instaurada a presente Oposição, já o prazo para impugnação judicial do ato que determinou a conversão do subsídio não reembolsável em reembolsável, de 5 de novembro de 2002, há muito estava ultrapassado. Assim sendo não se vislumbra, nem o Recorrente refere, qualquer tipo de convolação da presente Oposição em qualquer outro meio adequado; 4. – Até porque, tal como bem refere a douta Sentença, o Oponente não colocou em causa a ilegalidade da dívida por entender que a mesmo não é devida, apenas sindica a exigibilidade da dívida, invocando a sua ilegitimidade; 5. – Razão também tem a Sentença ao entender que o Recorrente foi citado no âmbito da execução fiscal por ser considerado como (co)responsável e (co)devedor da dívida, ao abrigo do disposto no artº 1691, nº 1 alínea b) do Código Civil (CC). Efetivamente, resulta dos factos que a questão em causa é prévia e anterior à declaração de separação de pessoas e bens, pois trata-se de uma (co) responsabilidade resultante de uma dívida contraída no exercício de uma atividade comercial, anterior à referida separação, para proveito comum do casal; 6. Efetivamente a questão nada tem a ver com o regime de incomunicabilidade das dívidas contraídas por pessoas separadas judicialmente. Pura e simplesmente, resulta inequívoco dos factos que a 5 de novembro de 2002 foi proferido despacho de conversão do subsídio não reembolsável em reembolsável, que por ofício de 27 de novembro foi a promotora notificada de tal decisão, a 18 de novembro de 2003 o IEFP,I.P. emitiu a certidão de dívida, em 16 de abril de 2004 foi instaurado o processo de execução fiscal contra a promotora, casada sob o regime de comunhão de adquiridos com o Recorrente, a 22 de setembro de 2004 foi emitido o mandado de penhora e a 16 de novembro de 2004 foi proferida decisão que declarou a separação de pessoas e bens entre a promotora e o Recorrente; 7. Resulta também clara e fundamentadamente dos factos provados que a dívida foi contraída e declarada durante o exercício da atividade comercial da esposa do Recorrente, em proveito do casal, presunção que este não conseguiu ilidir, sendo inquestionável (salvo o devido respeito sem necessidade de recorrer à “meditação transcendental”) a (co)responsabilidade do Recorrente, não obstando a essa responsabilidade a posterior separação judicial de pessoas e bens; 8. Como bem julgou a douta Sentença, não foi afastada a responsabilidade que a lei atribui a ambos os cônjuges, pelo que não pode pretender o Recorrente fazer-se valer da declaração de separação de pessoas e bens, emitida em momento muito posterior à constituição da dívida, à interpelação para pagamento, à instauração da execução fiscal e à emissão do mandado de penhora!! Nestes termos, e pelo muito que Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, mui doutamente suprirão, deverá a douta sentença recorrida ser mantida na íntegra, fazendo- se, assim, a costumada JUSTIÇA!». A Exma. Senhora Procuradora-Geral-Adjunta emitiu mui douto parecer concluindo pela improcedência do recurso. Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão. 2 – DO OBJECTO DO RECURSO Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), são estas as questões a decidir: (i) se a oposição é o meio processual próprio para se conhecer da nulidade por falta dos requisitos essenciais do título que serve de base à execução e da nulidade da citação; (ii) não o sendo, se deveria ter sido ordenada a convolação dos autos para a forma de processo adequada ao seu conhecimento; (iii) se a sentença erro na apreciação que fez da legitimidade do oponente para a execução fiscal. 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Na sentença recorrida deixou-se consignado factualmente: « Com relevância para a decisão, considera-se provada a seguinte factualidade constante dos autos: A. Em 19 de dezembro de 1992, foi celebrado casamento civil entre A ......................... e I ......................... , no regime legal de comunhão de adquiridos (cfr. assento de nascimento com correspondentes averbamentos a fls. 8 dos autos; quanto ao regime legal atento o teor do registo de nascimento e bem assim do ulterior pedido de separação de pessoas e bens infere-se que foi o regime legal supletivo, donde, regime de comunhão de adquiridos; facto que extrai do parecer do DMMP e não impugnado); B. A 22 de abril de 1998, I ......................... , apresentou candidatura no âmbito de um programa denominado “Iniciativa Local de Criação de Emprego- ILE”, para implementar um projeto de emprego mediante a criação de uma atividade de Acompanhamento de Tempos Livres (ATL), a implementar na freguesia do Barreiro (cfr. fls. 5 a 33 do PA apenso); C) A 17 de setembro de 1998, a Junta de freguesia de Santo André, no Município do Barreiro, emitiu escrito denominado “ATESTADO” com o seguinte teor: «imagem no original» (cfr. fls. 17 do PA apenso); D) Por despacho da Diretora do Centro de Emprego do Barreiro, datado de 30 de junho de 2000, foi concedido a I ......................... apoio financeiro destinado a implementar o projeto de emprego referido na alínea B), no montante de global de €40.637,71, constando do seu teor, designadamente, o seguinte: “(…) autorizo a concessão do apoio financeiro para 4 postos trabalho incluindo a promotora, no valor de 8.146.527$00, sendo a verba de 5.088.960$00 sob a forma de subsídio não reembolsável incluindo a majoração e o montante de 3.057.576$00 sob a forma de empréstimo sem juros a reembolsar em 20 prestações trimestrais, após 18 meses de carência. Notifique-se a promotora.” (cfr. informação a fls. 60 a 75 e despacho a fls. 76 todos juntos ao PA apenso ); E) A 5 de julho de 2000, o Instituto de Emprego e Formação Profissional, emitiu escrito denominado de “termo de responsabilidade” com o seguinte teor: «imagem no original» (cfr. fls. 77 a 80 do PA apenso); F) A 13 de julho de 2000, o Centro Infantil “ ………….”, de I…………………., emitiu o recibo nº 001, no valor de €20.317,35 (4.073.263$50) proveniente da primeira prestação ao apoio financeiro atribuído e melhor descrito nas alíneas antecedentes, sendo €15.251,08 (3.057.567$00) a título de empréstimo e €5.066,27 (1.015.696$00) de subsídio não reembolsável (cfr. fls. 81 do PA apenso); G) A 27 de setembro de 2000, I ......................... , apresentou junto do órgão da execução fiscal, declaração “de inscrição no registo/início de atividade” constando no quadro 05 com a epígrafe “tipo de sujeito passivo”, a opção “Empresário em nome individual Cat. C”, no quadro 08 intitulado “Atividades efetivamente exercidas” a menção “atividade principal CAE 85321-descrição infantário”, e como data de início de atividade, o dia 03 de agosto de 2000 (cfr. fls. 112 do PA apenso); H) A 5 de novembro de 2002, face ao incumprimento do termo de responsabilidade referido na alínea E), foi proferido despacho pela Diretora do Centro de Emprego do Barreiro onde consta, designadamente, o seguinte: “ Face ao incumprimento do disposto na alínea f) do ponto 8 e ponto 12 do termo de responsabilidade assinado com I ......................... no âmbito do D. Lei 189/96-Iniciativas locais de emprego concordo com o proposto e autorizo que seja convertido em reembolsável o subsídio no valor de 25.383,63 Euros- se declare o vencimento imediato da totalidade da dívida no montante de 40.634,71 no prazo de 60 dias a contar da data da notificação. Caso se verifique o não pagamento seja desencadeado processo de cobrança coerciva nos termos do D. Lei 437/78 de 26 de dezembro envie-se à DRLVT para emissão de I) De ofício nº 19825, datado de 27 de novembro de 2002, endereçado para I ........................., foi a mesma notificada do despacho referido na alínea antecedente, constando do seu teor, designadamente, o seguinte: “ Assunto: Notificação de Despacho e Interpelação para Pagamento Para conhecimento e cumprimento do artº 66º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo, comunica-se a V. Exa que, por despacho de 2002/11/05 da Sra Diretora do Centro de Emprego do Barreiro, foi decidido obter a devolução do apoio concedido quer como subsídio quer como empréstimo e respetiva cobrança coerciva, ao abrigo do nº1 do artº 6º do Decreto-Lei nº 437/78 de 28 de Dezembro, caso não proceda ao reembolso voluntário no prazo de 60 dias, a contar da data desta notificação, em virtude de não ter procedido ao reembolso do empréstimo obtido junto do Instituto do Emprego e Formação Profissional nas condições acordadas, nem ter entregue a documentação que lhe foi solicitada. (cfr. fls. 130 do PA apenso); J. A 18 de novembro de 2003, o Instituto de Emprego e Formação Profissional, emitiu certidão de dívida com o seguinte teor: «imagem no original» (cfr. fls. 137 e 138 do PA apenso); K) Na sequência da interpelação para pagamento e da extração da certidão de dívida referidas nas alíneas I) e J), o Serviço de Finanças do Barreiro instaurou, em 16 de abril de 2004, o processo de execução fiscal nº ........................., contra I ......................... para cobrança coerciva das dívidas de apoio financeiro do Instituto de Emprego e Formação Profissional, do ano de 2000, cuja quantia exequenda ascendia a €41.087,78 (cfr. autuação e certidão de dívida a fls. 1 a 4 do Processo de Execução Fiscal-PEF apenso; facto confirmado pelo teor do depoimento das testemunhas arroladas pela Exequente: D.........................; C......................... e C.........................); “(…) a fim de proceder à penhora ordenada no processo de execução fiscal que a Fazenda Nacional exequente move a I ......................... , por dívida de IEFP, do(s) ano(s) de 2003, na importância de €41.087,78, não pude efetuar a diligência a que me propunha em virtude de não ter aqui encontrado, em nome da executada, quaisquer bens móveis suscetíveis de serem penhorados, nem constando que possua bens imóveis inscritos nas matrizes prediais deste Serviço de Finanças…” M) A 16 de novembro de 2004, foi proferida decisão pela Conservatória da Baixa da Banheira, que declarou a separação de pessoas e bens entre A ......................... e I ......................... (cfr. assento de nascimento com correspondentes averbamentos a fls. 8 dos autos); N) A 23 de abril de 2007, o Oponente A ........................., foi citado do processo de execução fiscal nº ........................., para cobrança coerciva das dívidas de apoio financeiro ao Instituto de Emprego e Formação Profissional, contraídas por I ......................... , do ano de 2000, cuja quantia exequenda ascendia a €41.087,78, e acrescidos no valor de €25.007,33, tudo no valor global de €66.092,11, constando do teor da citação, designadamente, o seguinte: «imagem no original» cfr. citação a fls.51 do PEF apenso); K. A petição inicial da presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças do Barreiro, em 22 de maio de 2007 (cfr. fls. 2 dos autos); *** FACTOS NÃO PROVADOS Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir, designadamente, não está provado, com relevo para a decisão de mérito, que a dívida objeto de cobrança coerciva no processo de execução fiscal nº ........................., melhor identificado em K) e N), não tenha sido contraída em benefício comum do casal (O Tribunal entende que não foi elidida a presunção de que a dívida contraída por um dos cônjuges no exercício do comércio não tenha sido contraída em proveito comum do casal. O depoimento da testemunha I ......................... não se afigurou credível porque muito genérico e desacompanhado de circunstâncias factuais. É certo que a testemunha I ......................... , referiu que se encontra separada do *** MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO A convicção do tribunal baseou-se no teor da documentação junta aos autos pelas partes, das informações oficiais e do processo de execução fiscal apenso. Quanto ao depoimento das testemunhas arroladas pela Exequente D…………. , C......................... E C........................., todos eles funcionários do IEFP, testemunharam de forma isenta e clara e demonstraram conhecer o trâmite dos processos de candidatura e corroboram o incumprimento da promotora e subsequente instauração e cobrança coerciva da dívida, tendo o seu depoimento relevado apenas para alicerçar a factualidade constante na alínea K) da factualidade assente. Quanto ao facto não provado, remete-se para a fundamentação nele constante. »
4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO |