Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04087/10
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/06/2010
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE IVA.
ALTERAÇÃO DO PROBATÓRIO.
REQUISITOS E CONDIÇÕES CONSTANTES DO N° 1, DO ART° 2° DO DECRETO-LEI N° 261/93, DE 24 DE JULHO, PARA O EXERCÍCIO DE TRATAMENTOS DE FISIOTERAPIA COM BENEFÍCIO DE ISENÇÃO EM SEDE DE IVA, TAL COMO CONSAGRADO NO ART° 9°, AL. B), DO CIVA
Sumário:I) -Não é de atender a alteração e ampliação da factualidade pretendida pela recorrente quando a sentença recorrida fez uma rigorosa apreciação e análise da matéria de facto, fixando toda a factualidade com interesse para a decisão causa.

II) Para o exercício de actividades paramédicas foi fixada na legislação aplicável ao caso dos autos (Decreto-Lei n°261/93, de 24 de Julho) a necessidade/obrigatoriedade da verificação das condições referidas naquele preceito legal; esta necessidade inscreve-se na salvaguarda dos superiores interesses constitucionais de protecção da saúde dos cidadãos quando são assistidos por profissionais que exercem essas actividades paramédicas.

III) Daí que seja exigida a titularidade de um curso ministrado em estabelecimento de ensino oficial ou do ensino particular ou cooperativo desde que reconhecido nos termos legais - al. a) do n°1 do art. 2° do DL 261/93 de 24 de Julho.

IV) De igual modo o ensino da actividade da medicina ou da enfermagem mostra-se devidamente regulamentado e os respectivos cursos têm de ser oficialmente reconhecidos para que os diplomas possam ser aceites e os profissionais que os utilizam possam preencher os requisitos impostos por lei.

V) Por esse prisma, é correcta a interpretação feita na sentença recorrida pois não pode a actividade de fisioterapia e a sua execução ser entregue a profissionais não habilitados com cursos que obedeçam aos requisitos fixados por lei.

VI) Isso porque os objectivos da regulação do exercício das actividades profissionais de saúde designadas por "paramédicas" encontram-se perspectivados no art. 1° do referido 261/93 de 24 de Julho, mostrando-se no respectivo anexo a explicitação da actividade de "fisioterapia" sendo certo que dos autos resulta que a recorrida nos anos de 2003 a 2005 não tinha ao seu serviço profissionais que preenchessem os requisitos do art. 2° do DL 261/93 de 24.07.

VII) Assim, ao oferecer aos clientes serviços que pretende ser de "fisioterapia" tinha a recorrida de contratar profissionais habilitados com diplomas que preenchessem os requisitos exigidos por lei; quando não o faz não pode vir pretender usar da isenção de IVA nos termos referidos nos autos.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo:
1. -MARIA ................, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Sintra que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra a liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios que lhe foi efectuada com referência aos anos de 2003 a 2005, concluindo assim as suas alegações:
“D. CONCLUSÕES:
D.l) DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO:
I. Com base na documentação constante dos autos o Tribunal a quo considerou como provados os factos descritos nas páginas 2 (in fine) e 3, da sentença de fls...
II. A sentença recorrida deu como provado que "(...) o sujeito passivo exerce operações sujeitas a imposto relativo a duas actividades paramédicas de dietética e de fisioterapia, por serem efectuados por profissionais que não estão contemplados na lista das actividades anexas à Lei nº 261/93, de 24.7 (...)".
III. As liquidações sub judicio resultaram de correcções aritméticas aos tratamentos de fisioterapia levados à prática pela aqui recorrente que podem beneficiar da isenção prevista na alínea b) do nº l do artº 9º do CIVA, se forem prestados por profissionais de saúde que preencham as condições enumeradas no artº 2º do nº l do Decreto-lei nº 261/93, de 4 de Julho, o que, implicitamente, parece vir aceite pelo Mº Juiz o quo.
IV. Assim sendo, a parte da prestação (complexa) realizada pelo nutricionista (consubstanciada na realização da consulta e acompanhamento e supervisão dos tratamentos) habilitado com licenciatura em ciências da nutrição e inequivocamente paramédico, aproveita da isenção prevista no artº 9º do CIVA aplicável às actividades de assistência.
V. Nesta conformidade, não se aceita o facto dado como provado na alínea B) do probatório, na parte acima transcrita a itálico, já que a aqui recorrente exerce efectivamente a sua actividade societária no domínio das actividades paramédicas de dietética e de fisioterapia, mas, na parte principal da prestação, efectuadas por profissionais que estão contemplados na lista das actividades anexas ao Decreto-Lei nº 261/93, de 24.7 (Nutricionista) e só na parte relativa à execução do tratamento, realizadas por quem não é paramédico.
VI. Deve, por isso, alterar-se o probatório retirando-se o segmento acima transcrito e substituindo-o por outro que reproduza o que vem de ser aduzido. Apesar de tal facto não constar da matéria de facto provada, a sentença, a fls. 5, parte do conhecimento da supervisão dos tratamentos por médico ou paramédico, dizendo que tal circunstancialismo não releva para a decisão da causa no sentido preconizado pela aqui recorrente " (...) porquanto aqueles tratamentos não se inserem naqueloutras actividades isentas prestadas pela impugnante." Aceitando a supervisão dos tratamentos executados por quem não é paramédico, deduz-se que o Mº juiz o quo considera que, revestindo as condições de exercício da paramedicina, enumeradas no nº1 do artº 2º do DL nº 261/93, de 24 de Julho, natureza pessoal, intuito personae, deve falecer todo o argumentário esgrimido pela aqui recorrente na p.i. de impugnação, o que manifestamente se não aceita.
VIII. Assim sendo e em aditamento ao excerto constante da alínea B) do Probatório, revendo a matéria de facto assente, deve o tribunal ad quem dar como provada a permanente supervisão dos tratamentos de fisioterapia por paramédico – nutricionista - que obviamente reúne as condições de exercício da sua profissão enumeradas no nº1 do artº 2º do DL nº 261/93, de 24 de Julho.
IX. Tal como e mais uma vez em aditamento ao excerto constante da alínea B) do Probatório e revendo-se a matéria de facto assente, deve o tribunal ad quem dar como provada (até na decorrência da aceitação da supervisão das prestações de serviços), a realização de prestações de serviços complexas, levadas à prática nas clínicas PERSONA, mas unas e únicas, de assistência médica, afastando a cisão daquelas prestações em duas prestações distintas, ou seja: i) por um lado, as consultas de nutrição e análise corporal e os exames médicos; ii) e, por outro, os tratamentos de fisioterapia.
X. Ora, tal facto - a existência de duas prestações distintas e autónomas - não só não está provado como é, atento o que vem de ser dito, um dos aspectos fundamentais em que existe divergência entre a Administração Fiscal e a aqui recorrente.
XI. É à luz deste enquadramento fáctico que o presente recurso deve ser apreciado.
D.2) DO DIREITO:
XII. A sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quanto à interpretação e aplicação do acervo normativo aqui em equação, como doravante se demonstrará.
XIII. Da prova produzida não pode deixar de resultar demonstrado que as prestações de serviços de execução dos tratamentos (realizadas por técnicas massagistas e esteticistas) são sempre supervisionadas por médico ou paramédico.
XIV. Resultou ainda daquela prova que não obstante as técnicas massagistas e esteticistas não poderem levar à prática (executar sob sua responsabilidade) actos médicos ou paramédicos (por falta de habilitação adequada) que os actos de execução do tratamento, desde que supervisionados por médico ou paramédico (como, in casu, eram), devem poder continuar a ser configurados como actos médicos ou paramédicos.
XV. Emergindo a questão: "Ainda é acto paramédico o acto de execução do tratamento prescrito?"
XVI. As técnicas massagistas e esteticistas, admita-se, não realizam, sob sua responsabilidade, (porque não estão habilitadas para o efeito) actos médicos ou paramédicos (até porque, como visto, a prestação que realizam está integrada num todo, complexo, configurável como prestação una e única de serviços de assistência médica ou paramédica). No entanto, ao executarem o tratamento que é prescrito, supervisionado, analisado e interpretado em contínuo pelo médico ou paramédico, contribuem, com o seu labor, para a realização de um conjunto de actos que em parte são executados por médico ou paramédico e noutra parte por quem não exibe aquelas habilitações, mas, actos esses, que não podem ser cindidos nomeadamente para efeitos de aplicação (ou não) das normas de isenção do IVA.
XVII. O conceito de una ou única prestação de serviços, para efeitos do IVA, pode buscar-se na jurisprudência comunitária já firmada na decisão do TJCE, Acórdão de 25 de Fevereiro de 1999, processo C-349/96.
XVIII. Ancorados naquela jurisprudência comunitária poder-se-á dizer que, in casu, no plano económico (e até no plano terapêutico), só há uma e una prestação de serviços clínicos, não obstante executada em parte por médico ou paramédico e noutra parte realizada por técnicas massagistas e esteticistas, tal como, aliás, resultou sobejamente da prova produzida.
XIX. Quanto à pretendida (e operada) decomposição (concretizada pelos Serviços da Administração Tributária) fica demonstrada a sua artificialidade na busca dos aludidos elementos característicos das prestações realizadas no universo das CLÍNICAS ..............
XX. É que, aí, e em função da sua adequada configuração, tão-só encontramos elementos característicos da prestação (composta) de serviços clínicos, não obstante em parte executados por técnicas massagistas e esteticistas, mas sempre supervisionados por médico ou paramédico.
XXI. Aquele arresto, no considerando 30, prossegue com os elementos de interpretação determinantes a ter em conta quando se pretende sustentar que estamos perante uma única prestação para efeitos de IVA ou perante prestações acessórias, mostrando-se adequado chamar aqui tais elementos à colação.
XXII. Ali se refere que "Importa sublinhar que se está perante uma prestação única, designadamente neste caso, em que um ou vários elementos devem ser considerados a prestação principal, ao passo que, inversamente, um ou vários elementos devem ser considerados prestações acessórias que partilham do tratamento fiscal da prestação principal. Uma prestação deve ser considerada acessória em relação a uma prestação principal quando não constitua para a clientela um fim em si, mas um meio de beneficiar nas melhores condições do serviço principal do prestador (acórdão de 22 de Outubro de 1998, Madgett e Baldwin, C-308/96 e C-94/97, Colect., p. 1-0000, n."24)."
XXIII. O circunstancialismo que rodeia a prestação (i.e., no dizer do Acórdão, "os elementos característicos da operação em causa") é determinante para se concluir se o prestador fornece à sua contraparte diversas prestações principais distintas ou uma prestação única.
XXIV. E esse circunstancialismo consta desenvolvidamente da pi e dele resulta, inequivocamente, que não há forma de vislumbrar a existência in casu de duas prestações principais distintas: i) a prestação de serviços de assistência médica; e ii) a suposta prestação de serviços de execução do tratamento prescrito.
XXV. Donde, quod erat demonstrandum, da boa hermenêutica terá de se inferir que a parte dos serviços de assistência executada por técnicas massagistas e esteticistas, atenta a impossibilidade de cisão das operações que a compõem e desde que supervisionadas, é ainda prestação de serviços de assistência médica ou paramédica, entendida como una e única e portanto não cindível.
XXVI. Mais não seja porque tais operações constituem o prolongamento directo de uma e única actividade isenta de imposto que é a assistência médica ou paramédica e, por isso, não são para a clientela, no dizer da jurisprudência citada, um fim em si mesmo, mas um meio de beneficiar, nas melhores condições, do serviço principal que, esse sim, consubstancia o serviço de assistência médica.
XXVII. Pelo que se lhes deve aplicar o mesmo regime de IVA que à parte "principal" das operações de assistência médica ou paramédica se aplica.
XXVIII. Poder-se-á dizer que à actividade "coadjuvante" que consubstancia a execução do tratamento (efectuada pelas técnicas massagistas e esteticistas), se aplica o enquadramento jurídico-tributário da actividade "principal" de consulta, prescrição e supervisão e que se materializa na análise e interpretação continuada dos tratamentos.
XXIX. Assim, já que aquela actividade principal é inequivocamente beneficiária da isenção de IVA, se, em relação à parte da actividade coadjuvante que se consubstancia na execução do tratamento, for viável apreendê-la como o prolongamento directo daquela actividade principal não cindível, então, do ponto de vista do enquadramento em sede de IVA, ela não pode deixar de ser igualmente beneficiária daqueloutra (e mesma) isenção de imposto.
XXX. Nesta conformidade e em face de tudo quanto antecede, pode concluir-se, ao contrário do que a douta decisão recorrida parece sustentar (só assim se percebendo o afastamento da aplicabilidade isenção ali propugnado), que não há duas prestações de serviços de assistência médica, mas uma (e una) só prestação realizada, em parte, por quem reúne as condições de exercício firmadas no nº l do artº 2º do DL nº 261/93, de 24 Julho, e, noutra parte, por quem não é paramédico, sendo certo, no entanto, que sempre supervisionados por aqueles - os paramédicos.
XXXI. Acrescendo que sendo ente colectivo a levar a efeito as actividades que se podem subsumir na alínea b) do nº l do artº 9º do CIVA e por força da aplicabilidade daquela isenção aos entes colectivos (ou da aplicabilidade autónoma da isenção prevista no nº 2 daquela mesma isenção, prevista no artº 9º e que isenta de imposto as prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estritamente conexas, levadas à prática por hospitais, casas de saúde e similares, na linha, aliás, daqueloutra isenção), consideramos, tal como aduzido na pi de impugnação e aqui se reitera, que algumas das actividades realizadas nas CLÍNICAS ............(as coadjuvantes), mesmo que não realizadas integralmente por médicos ou paramédicos que sirvam tal ente colectivo, não podem deixar de se considerar igualmente isentas ao abrigo de qualquer uma daquelas disposições, já que hermenêutica contraria levaria ao absurdo interpretativo tal como exemplificado.
XXXII. Donde, sustentamos, estão feridos de ilegalidade os actos tributários sub judice, pelo que emerge o imperioso direito que assiste à aqui recorrente de ver anuladas as liquidações concretizadas em sede de IVA, firmando-se enquadramento jurídico-tributário divergente do que vem sendo sustentado pela Administração Tributária e acolhido na douta sentença de que ora se recorre.
XXXIII. De tudo quanto fica exposto não pode deixar de se inferir a nossa discordância com a decisão recorrida, pelo que, com o devido respeito, que é muito, não podíamos deixar de a controverter, almejando-se, em sede de recurso, se conclua exactamente em sentido contrário ao que foi a decisão do tribunal a quo, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que conceda provimento ao que adiante se peticionará.
XXXIV. Encontrando-se, pois, reunidos os pressupostos de procedibilidade da indeferida impugnação judicial, pelo que deve ser revogada a decisão recorrida.
E. DO PEDIDO:
termos em que, nos melhores de direito e com o douto suprimento de V. Exa, se requer:
A) SEJA ALTERADA A DECISÃO RECORRIDA QUANTO À MATÉRIA DE FACTO, NA MEDIDA EM QUE o tribunal ad quem vier a dispor de todos os elementos probatórios necessários PARA O EFEITO;
b) SEJA DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE A DECISÃO RECORRIDA, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE DECLARE A PROCEDÊNCIA DO PEDIDO QUE SUSTENTAVA ilegal as liquidações controvertidas, fundamentando-se, tal ilegalidade, em violação de lei, tudo com as legais consequências, assim fazendo v. exªs., venerandos desembargadores, a tão costumada JUSTIÇA!
Não houve contra -alegações.
A EPGA pronunciou-se no sentido de que o recurso não merece ser provido na consideração de que a questão decidenda já foi tratada recentemente em Acórdão do TCAS no recurso nº 03816/10 onde foi doutamente decidido que ficou provado não estarem os profissionais que faziam os trabalhos de “fisioterapia” habilitados profissionalmente para tal, de acordo com o disposto no DL nº 262/93, de 24.07, e o caso colocado para apreciação no presente recurso apresenta contornos idênticos aos que mereceram a referida decisão, quer de facto, quer de direito.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
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2. -Na sentença fixou-se o seguinte probatório com base nos elementos junto aos autos:
Factos Provados
A) Em 20.07.06 foi efectuado a liquidação adicional de IVA e de juros compensatórios respeitante aos anos de 2003 a 2005, devidamente notificados ao contribuinte, as quais foram pagas em 29.09.06. - cfr "D.C", de fls 45 a 60, dos autos.
B) As liquidações mencionadas supra resultaram das correcções aritméticas à matéria tributável de imposto efectuadas com base no relatório elaborado pela I.T., cujo conteúdo se dá por reproduzido, do qual consta que o sujeito passivo exerce operações sujeitas a imposto relativo a actividades paramédicas de fisioterapia, por serem efectuados por profissionais que não estão contemplados na lista de actividades anexas ao Dec.-Lei n° 261/93, de 24.07., sendo assinalados os serviços prestados sujeitos a imposto, e efectuado o recalculo do valor do pró rata de dedução, resultando as correcções do total das operações sujeitas e das operações isentas e determinado o IVA a liquidar e o IVA a deduzir por correcção do pró -rata, e elaborados os DUC respectivos -cfr Relatório de fls 44 a 259, e DUC, de fls 259 a 322, do P.A. apenso.
C) Da liquidação mencionada em A) o contribuinte apresentou uma reclamação graciosa que veio a ser expressamente indeferida em 24.04.08- cfr processo gracioso apenso aos autos.
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Factos Não Provados
Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
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Motivação da decisão de facto
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
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3. - Atenta a ordem do julgamento estabelecida no artº 660º do CPC, aplicável ao recurso por força das disposições combinadas dos artºs. 713º nº 2 e 749º, ambos daquele Código, vemos que a questão sob recurso, suscitadas e delimitadas pelas conclusões da Recorrente, é de saber se deve ser alterado o probatório (conclusões I) a X)-) e se a impugnante pode beneficiar do regime de isenção consagrado no art.° 9. n.° 1 al. b) do CIVA relativamente às operações corrigidas pela administração tributária.
Quanto ao errado julgamento da matéria de facto, funda-a a recorrente em que deveria ser alterado o probatório já que:
-a sentença recorrida deu como provado que "(...) o sujeito passivo exerce operações sujeitas a imposto relativo a duas actividades paramédicas de dietética e de fisioterapia, por serem efectuados por profissionais que não estão contemplados na lista das actividades anexas à Lei nº 261/93, de 24.7 (...)".
-as liquidações sub judicio resultaram de correcções aritméticas aos tratamentos de fisioterapia levados à prática pela aqui recorrente que podem beneficiar da isenção prevista na alínea b) do nº 1 do artº9º do CIVA, se forem prestados por profissionais de saúde que preencham as condições enumeradas no artº 2º do nº l do Decreto-lei nº 261/93, de 4 de Julho, o que, implicitamente, parece vir aceite pelo Mº Juiz o quo.
-significando isso que a parte da prestação (complexa) realizada pelo nutricionista (consubstanciada na realização da consulta e acompanhamento e supervisão dos tratamentos) habilitado com licenciatura em ciências da nutrição e inequivocamente paramédico, aproveita da isenção prevista no artº9º do CIVA aplicável às actividades de assistência.
-donde que não aceita o facto dado como provado na alínea B) do probatório, na parte acima transcrita a itálico, já que a aqui recorrente exerce efectivamente a sua actividade societária no domínio das actividades paramédicas de dietética e de fisioterapia, mas, na parte principal da prestação, efectuadas por profissionais que estão contemplados na lista das actividades anexas ao Decreto-Lei nº 261/93, de 24.7 (Nutricionista) e só na parte relativa à execução do tratamento, realizadas por quem não é paramédico.
-assim, segundo a recorrente, deverá alterar-se o probatório retirando-se o segmento acima transcrito e substituindo-o por outro que reproduza o que vem de ser aduzido. Apesar de tal facto não constar da matéria de facto provada, a sentença, a fls. 5, parte do conhecimento da supervisão dos tratamentos por médico ou paramédico, dizendo que tal circunstancialismo não releva para a decisão da causa no sentido preconizado pela aqui recorrente "(...) porquanto aqueles tratamentos não se inserem naqueloutras actividades isentas prestadas pela impugnante."
Do exposto resulta que a recorrente sustenta uma interpretação dos factos que pretende seja contemplada no probatório, quando é certo que a questão decidenda é tão só a de saber, em termos fácticos, se os profissionais que faziam os trabalhos de fisioterapia estavam ou não habilitados profissionalmente para tal, de acordo com o disposto no DL. 261/94, de 24-07.
Saber se os factos em relação aos quais a Recorrente considera que houve omissão no probatório deviam ou não ter sido objecto de apreciação na sentença, designadamente para serem julgados provados ou não provados, por serem relevantes para o enquadramento jurídico das questões a apreciar e decidir, é matéria que se coloca claramente no âmbito da validade substancial da sentença, que não no da sua validade formal. Ou seja, o facto de na sentença não ter sido considerada a factualidade – provada e não provada – no sentido sustentado referida pela Recorrente em abono da sua tese de que tais profissionais beneficiariam da pretendida isenção desde que a supervisão fosse assumida por profissionais habilitados, poderá constituir erro de julgamento.
Mesmo que se considere que a alegação da Recorrente é no sentido de que na sentença não foi apreciada a questão de saber se dados factos – provados e não provados - de que partiu correspondem à realidade e imporiam a procedência da impugnação, sempre haverá que ter em conta que, em relação às questões suscitadas pelo contribuinte, só há obrigação de conhecer daquelas cuja apreciação não tenha ficado prejudicada pela resposta dada a outras (cfr. art. 660.º, n.º 2, do CPC).
Todavia, a nosso ver, os factos essenciais, e com interesse para a decisão da causa, foram, provados uns e não provados outros, analisados na sentença aos quais, depois, se aplicou o direito.
Com efeito, na sentença expende-se que:
“A questão decidenda limita-se em saber se aquelas operações consideradas sujeitas a imposto e dele não isentas poderiam ser consideradas no âmbito de operações abrangidas pelas alíneas b), do n°1 e n°2, do art°9° do I.V.A. Considerando que tais serviços prestados por pessoas sem habilitação profissional para exercerem as actividades paramédicas não podem por si beneficiar da isenção de imposto vertido naquela 1a norma, entendimento esse não questionado pela impte, ainda assim poderiam ser consideradas no âmbito de actividades dirigidas por médicos e/ou por outros profissionais, ou inseridos em estabelecimento que presta serviços médicos, conforme pretende o A. Ora, Quanto à alegação de que tais serviços são unos e indivisíveis não podendo ser desassociados daquela prestação de serviços isentos, com isso pretendendo-se significar que se trata de uma prestação única de serviços clínicos efectuada no exercício de actividades médicas ou paramédicas. Assim colocado o problema suscitado pelo impugnante, não resultando qualquer vício formal do acto tributário quanto à falta de fundamentação legal da decisão final do procedimento de liquidação, por a mesma resultar suficientemente densificada nas razões daquelas correcções de imposto, importa discorrer sobre aquela incindibilidade da operação.
Em 1° lugar para se dizer que não se acompanha o entendimento expresso pelo impugnante quando pretende invocar aquela jurisprudência do Tribunal das Comunidades porquanto não se trata aqui de discernir uma actividade principal, de uma actividade acessória que se integre naquela, não porque tal situação não possa relevar para a economia do imposto em determinadas situações, mas sim porque se terá de verificar em concreto se tal actividade se insere no âmbito daquelas operações isentas (que a esse propósito aquele entendimento jurisprudencial manda atender); Ora,
A isenção contemplada no n°1, do art°9° do C.I.V.A. relativo a determinadas prestações de serviços, pretende por um lado, que tais operações sejam prestadas a consumidores finais, e por outro, são estabelecidas para actividades de interesse geral e social relativa à saúde.- cfr alínea b), do n°1, do art°9° do CIVA. Assim sendo, a actividade desenvolvida, podendo ser considerada no domínio da saúde, impunha que sejam prestadas por determinados profissionais devidamente habilitados para o efeito, o que não se verificava no caso concreto - vd. Relatório da I.T mencionado em B), do probatório. ; e a tal consideração igualmente não releva a circunstância de aqueles serviços serem supervisionados e orientados por tais profissionais porquanto aqueles tratamentos não se inserem naqueloutras actividades isentas prestadas pela impugnante. Quanto ao enquadramento no n°2, do art°9°, importa dizer que os mesmos também resultam limitados à prestação de serviços médicos e sanitários quando efectuados por entidades colectivas que prestam esses serviços, o que não descaracteriza aquelas considerações tecidas quanto à habilitação para o exercício daquelas actividades paramédicas.” (sublinhado nosso).
Vê-se, pois, que todas as questões pertinentes, quer de facto quer de direito, foram objecto de apreciação, sendo que na hipótese de erro de julgamento em virtude de os factos indicados pela recorrente como tendo sido desconsiderados (melhor diríamos, interpretados) na sentença e que se verificaram como decorrerá, segundo alega, dos documentos juntos aos autos (erro de julgamento da matéria de facto) só nesse âmbito cabendo apreciar se foram preteridos os principio da verdade material que afastaram o principio da objectividade.
É que a questão dos meios probatórios é uma questão processual, prévia e instrumental em relação à decisão final, pelo que a omissão na sentença do de­ferimento ou indeferimento de um meio probatório e/ou a sua insuficiente fundamentação ou errada fixação/interpretação dos factos, sendo nossa inabalável convicção que não assiste qualquer razão à recorrente porquanto no probatório da sentença se vê que o Mº Juiz «a quo» julgou com base nos autos valorando e interpretando os factos apurados no julgamento à luz dos interesses e finalidades que o legislador quis defender, presentes nas normas jurídicas aplicáveis a cada hipótese.
Essa indagação foi feita pelo MºJuiz «a quo» mediante a apreciação crítica da prova com base nas normas que regulam nesta jurisdição o direito probatório material e o princípio da aquisição processual diz-nos que o material necessário à decisão e aduzido ao processo por uma das partes - sejam alegações, sejam motivos de prova pode ser tomado em conta mesmo a favor da parte contrária àquela que o aduziu. Reputa-se adquirido para o processo; pertence à comunidade dos sujeitos processuais. (Castro Mendes, Dir. Proc. Civil, 1980, III-209. No mesmo sentido veja-se, do mesmo autor Do Conceito de Prova em Processo Civil. l 66).
Ora, tudo isto foi respeitado na sentença recorrida em que se ponderaram todos os elementos de prova, não procedendo a questão do erro de julgamento sobre a matéria de facto/insuficiência probatória, fundada na existência de profissionais supervisores, o que envolve, necessariamente, a discussão sobre a boa ou má fixação dos respectivos conteúdos no probatório.
Nesse sentido, diga-se que o ónus de prova incumbe, por via de regra, à parte que toma a iniciativa de peticionar a concessão da providência jurisdicional no caso concreto que submete a juízo.
Seguindo Anselmo de Castro, in "Direito Processual Civil Declaratório", Vol-III, Almedina/1982, págs, 352/353, temos que "[...] o ónus de prova aparece sempre como inerente à própria norma jurídica a aplicar, devidamente interpretada, circunstância que igualmente tem que ser tomada em conta na aplicação, no tempo e no espaço, da lei reguladora do mesmo ónus. Assim, será aplicada em cada caso a lei vigente ao tempo do nascimento da relação jurídica controvertida [...] O que para um direito ou no domínio de uma relação jurídica é facto impeditivo, para outro bem pode ser facto constitutivo. É, pois, à respectiva norma ou normas aplicáveis e só a elas, que há que recorrer."
O ónus de alegação e, portanto, a causa de pedir em sede de impugnação judicial do acto tributário por erro de facto sobre os pressupostos e quantificação do facto tributário é consequência do regime de ónus de prova a cargo do impugnante que, por sua vez, se determina pelo regime substantivo que enforma a relação jurídica controvertida e a que se reporta o pedido de anulação da liquidação de imposto no caso concreto.
Rege aqui o princípio geral estatuído no artº 342º nº 1 C. Civil - a parte que invoca o direito é onerada com a prova dos respectivos factos constitutivos - na medida em que a reacção contra o acto tributário para apreciação da sua correspondência com a lei no momento em que foi praticado é da iniciativa de quem exerce o direito de acção, ou seja, do autor da causa.
Consequentemente, a parte que deve exercer a actividade probatória relativamente aos factos que servem de fundamento à acção, de acordo com o princípio do dispositivo e sob pena de correr o risco de ver repelida a pretensão que deduziu em juízo (artº 516º CPC) é, precisamente, a parte que exerce esse direito de acção, no caso, de impugnação do acto tributário.
Assim, corria pela impugnante, ora recorrente, o encargo de demonstrar a realidade do facto alegado, melhor dizendo, o encargo de produzir prova de modo a atingir o grau de verosimilhança suficiente para formar a convicção de existência do facto que fundamenta a decisão de direito peticionada em Tribunal.
Ónus subjectivo que não preclude, atento o princípio da aquisição processual e do inquisitório (artº 515º CPC) C), que o impugnante beneficie da actividade probatória alheia, seja da parte contrária, seja do Tribunal. Com os critérios legais da repartição do ónus de prova importa conjugar os critérios legais da eficácia probatória (regras probatórias fixadas em abstracto), na medida em que o ónus de contraprova ou carece de prova principal, a chamada prova do contrário em oposição à prova legal plena nos termos do artº 347º C. Civil, ou de simples contra-prova indirecta, nos termos do artº 346º C. Civil, bastando, neste caso, que a parte não sujeita ao ónus subjectivo lance a dúvida sobre os factos que ao outro incumbe provar.
De acordo com estes princípios, e sendo seguro que o ónus de prova da factualidade alegada na petição em vista da anulação da liquidação incumbia à Recorrente, a força probatória da documentação que ela agora suscita nas conclusões sob análise para peticionar a alteração/correcção do probatório, torna questionável a relevância e, por isso, a utilidade da indagação sobre as questões factuais que atrás se apontaram em resultado das alegações da recorrente.
Destarte, sobre a alegada alteração e ampliação da factualidade pretendida pela recorrente, a mesma não é de atender, uma vez que a sentença recorrida fez uma correcta apreciação e análise da matéria de facto, fixando toda a factualidade com interesse para a decisão causa segundo as várias soluções de direito plausíveis.
Termos em que improcedem as conclusões sob análise.
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Quanto ao errado julgamento sobre a matéria de direito:
A recorrente afirma, em substância, que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quanto à interpretação e aplicação do acervo normativo aqui em equação, já que, aa prova produzida não pode deixar de resultar demonstrado que as prestações de serviços de execução dos tratamentos (realizadas por técnicas massagistas e esteticistas) são sempre supervisionadas por médico ou paramédico.
No ponto, seguiremos a fundamentação do acórdão deste TCAS de 23-03-2010, tirado no recurso nº 3816/10, por esta mesma formação, adaptando-a ao caso concreto.
Assim:
Inicialmente, a impugnante considerou certas operações activas como estando isentas de IVA.
Já os serviços de inspecção consideraram, adversamente, que tais operações deveriam ter sido tributadas à taxa normal vigente.
O Mº Juiz recorrido, como vimos, inclinou-se para a visão de que a liquidação não enferma do vício de violação de lei por, no fundamental, entender que o não reconhecimento oficial dos cursos detidos pelos prestadores daqueles serviços era obstáculo ao beneficio da isenção.
Vejamos.
O artº9° n°1 al. b) do CIVA refere "As prestações de serviços efectuadas no exercícios das (...) profissões de "Médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas", falando o nº 2 do mesmo preceito legal que "As prestações de serviços médicos e sanitários e as operações com elas estritamente conexas efectuadas por estabelecimentos hospitalares, clínicas, dispensários e similares."
Assim, o CIVA refere expressamente as actividades paramédicas, como subsumíveis na isenção consagrada na alínea b) do n°1 do art°9°.
Todavia, aquele lei não delimita o respectivo conceito, pelo que, como bem se refere na sentença, há que recorrer ao DL n°261/93 de 24/07, diploma regulador do exercício das actividades profissionais de saúde designadas por paramédicas, e que estão elencadas na Lista Anexa do referido diploma.
Neste contexto, há que chamar à colação o art. 13°-A nº1 da 6.a Directiva que estabelece que "Sem prejuízo de outras disposições comunitárias, os Estados Membros isentarão, nas condições por eles fixadas com o fim de assegurar a aplicação correcta e simples das isenções a seguir enunciadas e de evitar qualquer possível fraude, evasão e abuso:
(...)
b) A hospitalização e a assistência médica, e bem assim as operações com elas estreitamente conexas, asseguradas por organismos de direito público ou, em condições sociais análogas às que vigoram para estes últimos, por estabelecimentos hospitalares, centros de assistência méedica e de diagnostico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos;
c) As prestações de serviços de assistência efectuadas no âmbito do exercício das actividades médicas e paramédicas, tal como são definidas pelo Estado - Membro em causa."
De tal normação decorre que, teleologicamente, o seu objectivo é isentar de imposto aquelas actividades desde esteja em causa a prestação de serviços de assistência e que esta seja fornecida por uma pessoa que possua as qualificações profissionais exigidas para uma actividade médica e paramédica.
Assim, é pacífico que a isenção nos termos do art° 9° do CIVA abrange o exercício da actividade de médico, odontologista, parteiro, enfermeiro e outras profissões paramédicas.
Mas, já no que se refere às situações sobre que incidiram as correcções em apreço e que envolvem técnicos massagistas e massagistas esteticistas são profissionais, a AT considerou que estes não se encontram contemplados na lista das actividades paramédicas definidas pelo DL nº 261/93 de 24/07,por isso não podendo beneficiar da isenção do art° 9° n°1 al. b) do CIVA.
É aqui que reside o dissídio entre as partes, inclinando-se o MP para o lado da Fazenda.
De acordo com a sentença, a interpretação adoptada pela AT não é a mais consentânea com o direito interno e comunitário.
Isso porque, em primeiro lugar, a actividade da impugnante é exercida através de clínicas, e situa-se na área da nutrição, fisioterapia, estética e cirurgia estética, sendo que as consultas na área da nutrição são conduzidas por médicos ou nutricionistas e a execução dos tratamentos disponibilizados pela impugnante, depois de prescritos pelo médico é levada a cabo por massagistas, massagistas esteticistas e auxiliares de fisioterapia, directamente supervisionadas por médico ou paramédico, uma vez que a prova testemunhal foi esclarecedora a esse respeito.
Depois, porque as prestações de serviços são efectivadas por um ente colectivo e as pessoas a quem incumbe a direcção técnica e a directa supervisão das prestações realizadas terem a habilitação que permite o exercício das actividades médicas e paramédicas, pelo que se enquadram nas prestações de serviços de assistência, subsumindo-se na isenção prevista na alínea b) do nº1 do artº9° do CIVA.
Quanto ao facto de os serviços de inspecção terem considerado que os técnicos auxiliares de fisioterapia não reuniam as condições enumeradas no art° 2° do DL n° 261/93 de 24/07 em virtude de os cursos não estarem reconhecidos por entidades oficiais, conforme a declaração emitida pela "A............ - Formação, ................ Lda" quando da inspecção aos exercícios de 2001 e 2002, sendo que sobre o reconhecimento dos cursos, os serviços de inspecção foram informados, que não existem, em, Portugal cursos para técnicos auxiliares de fisioterapia reconhecidos, sendo este o motivo da não passagem aos formandos e carteira profissional que os habilite para o exercício de actividade de fisioterapia.
Por assim ser, os serviços de inspecção consideraram que pelo facto de os auxiliares terem apresentado o curso mas o mesmo não estar reconhecido, era suficiente para que a isenção deixasse de operar.
E, então, a solução do litígio passa por saber se, como considerou a sentença recorrida, as correcções efectuadas com tal fundamento não devem subsistir, pois, uma coisa é não ter qualquer curso que os habilite outra é ter os cursos mas estes não serem reconhecidos em Portugal, devendo entender-se que estão reunidas as condições para a impugnante beneficiar da isenção prevista na alínea b) do n°1 do art°9º, até porque a isenção referida no artigo 13°, A, n°1, alínea c) da Sexta Directiva não depende de forma jurídica do sujeito passivo que fornece as prestações médicas ou paramédicas nele mencionadas, nesse sentido, vide Ac. do TJCE, de 10/09/2002, Kugler, C-141/00.
Conforme declaração de princípios ínsita neste diploma legal, “A protecção da saúde dos cidadãos, constitucionalmente consagrada como um direito social, impõe ao Estado a adopção das medidas indispensáveis à sua efectiva realização, nas diversas vertentes que com ele se prendem.
Neste domínio, assume, sem dúvida, relevância o conhecimento de que aquele bem jurídico essencial deve ser protegido contra possíveis lesões praticadas por causa do exercício inqualificado de certas funções.
De tal conhecimento decorre, directamente, a necessidade de condicionar o exercício de actividades ligadas à prestação de cuidados de saúde, por forma a conseguir-se aquela protecção.
E esta necessidade é tanto mais sentida quanto é certo que a evolução científica e tecnológica, com reflexos na área das ciências médicas, funciona como factor determinante de maiores exigências ao nível da formação e da diferenciação de profissionais de saúde.
No âmbito dos serviços públicos de saúde, aquele objectivo encontra-se, de algum modo, reflectido na disciplina que, para os técnicos de diagnóstico e terapêutica, foi criada pelo Decreto-Lei n.º 384-B/85, de 30 de Setembro, bem como em diversa legislação que lhe é complementar.
Outro é, porém, o panorama fora dos serviços públicos. Aí, na verdade, por ausência de enquadramento legal específico, nos domínios da formação e do exercício profissional, não se encontra devidamente assegurada a protecção da saúde.
Impõe-se, por isso, a intervenção do Estado, em obediência aos imperativos constitucionais relativos à saúde, promovendo as medidas que garantam a maior qualidade dos cuidados a prestar, pela adequada formação técnica dos agentes de saúde e pela sua dignificação do ponto de vista deontológico.
O Governo, reconhecendo a urgência de tomar medidas disciplinadoras neste sector, decidiu solicitar autorização para legislar na matéria, tendo sido publicada a
Lei n.º 31/92, de 30 de Dezembro.
O presente diploma condiciona desde já, genericamente, o exercício de actividades profissionais de saúde, condicionando igualmente a criação de cursos de formação profissional de saúde e perspectivando os elementos que deverão consubstanciar a regulamentação das profissões, a aprovar por decreto regulamentar.
Finalmente, importa referir que não se optou, nesta matéria, pela sujeição automática ao regime jurídico das carteiras profissionais, aprovado pelo Decreto-Lei
n.º 358/84, de 13 de Novembro, porquanto se admitiu que, em sede da regulamentação profissional específica, venha a considerar-se não ser aquele regime o mais adequado, tendo em vista, designadamente, que ele poderá comportar normas de carácter deontológico com um elevado nível de exigibilidade.”
Com base nessa principiologia, o artº 1º desse diploma, definindo o respectivo âmbito estabelece que o mesmo regula o exercício das actividades profissionais de saúde, adiante designadas por actividades paramédicas, que compreendem a utilização de técnicas de base científica com fins de promoção da saúde e de prevenção, diagnóstico e tratamento da doença, ou de reabilitação (nº 1), não ficando põe ele abrangidas as actividades exercidas, no âmbito de competências próprias, por profissionais com inscrição obrigatória em associação de natureza pública e ainda por odontologistas, enfermeiros e parteiras (nº2), sendo as actividades paramédicas a que se refere o n.º 1 são as constantes da lista anexa ao diploma, do qual faz parte integrante (nº 3).
Dispondo sobre as condições de exercício profissional o artº 2º determina que, sem prejuízo de regulamentação específica de profissões abrangidas pelo artigo anterior, o exercício de actividades paramédicas depende da verificação das seguintes condições:
a) Titularidade de curso ministrado em estabelecimento de ensino oficial ou do ensino particular ou cooperativo desde que reconhecido nos termos legais;
b) Titularidade de diploma ou certificado reconhecido como equivalente aos referidos na alínea anterior por despacho conjunto dos Ministros da Educação e da Saúde;
c) Titularidade de carteira profissional, ou título equivalente, emitido ou validado por entidade pública.
E nº 2 do mesmo preceito legal estatui que o grau de autonomia específico do exercício de cada uma das actividades paramédicas, bem como as normas específicas das profissões, incluindo as regras deontológicas, constam de decreto regulamentar.
Por fim, n artº 3º do dito diploma legal comina que o contrato pelo qual alguém se obriga a exercer actividades paramédicas mediante retribuição, sem observância do disposto no artigo anterior, é nulo (nº 1) sendo que o regime previsto no presente diploma não pode ser afastado por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
Extrai-se do regime legal exposto, como enfatiza a EPGA no seu douto parecer, que os profissionais que exerciam ao serviço da recorrida, as funções de "técnico massagista " e "auxiliar de fisioterapia", não preenchiam os requisitos previstos no n°1 do art. 2° do DL 261/93 de 24 de Julho pois para o exercício de actividades paramédicas foi fixada na legislação aplicável ao caso dos autos, a necessidade/obrigatoriedade da verificação das condições referidas naquele preceito legal; esta necessidade inscreve-se na salvaguarda dos superiores interesses constitucionais de protecção da saúde dos cidadãos quando são assistidos por profissionais que exercem essas actividades paramédicas.
Daí que seja exigida a titularidade de um curso ministrado em estabelecimento de ensino oficial ou do ensino particular ou cooperativo desde que reconhecido nos termos legais - al. a) do n°i do art. 2° do DL 261/93 de 24 de Julho.
De igual modo o ensino da actividade da medicina ou da enfermagem mostra-se devidamente regulamentado e os respectivos cursos têm de ser oficialmente reconhecidos para que os diplomas possam ser aceites e os profissionais que os utilizam possam preencher os requisitos impostos por lei.
A essa luz, é errónea a hermenêutica feita na sentença recorrida daquele preceito legal e a sua adequação à análise do caso dos autos, pois não podia a actividade de fisioterapia e a sua execução ser entregue a profissionais não habilitados com cursos que obedeçam aos requisitos fixados por lei.
Os objectivos da regulação do exercício das actividades profissionais de saúde designadas por "paramédicas" encontram-se perspectivados no art. 1° do referido diploma, mostrando-se no respectivo anexo a explicitação da actividade de "fisioterapia" sendo certo que dos autos resulta que a recorrida nos anos de 2003 a 2005 não tinha ao seu serviço profissionais que preenchessem os requisitos do art. 2° do DL 261/93 de 24.07.
Donde se conclui pela legalidade do acto tributário impugnado porquanto o regime a que estão sujeitas asa actividades abarcadas pelo diploma legal em referência, impõe que, ao oferecer aos clientes serviços que pretende ser de "fisioterapia", tinha a recorrida de contratar profissionais habilitados com diplomas que preenchessem os requisitos exigidos por lei.
Não o tendo feito, não pode vir pretender usar da isenção de IVA nos termos referidos nos autos.
Improcedem, por isso, as conclusões recursórias, devendo confirmar-se a sentença.

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3. -Termos em que acordam os juízes deste tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.
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Lisboa, 06/07/ 2010
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Aníbal Ferraz) Votei a decisão.