Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03012/09
Secção:Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/20/2009
Relator:Eugénio Sequeira
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL. IVA. OMISSÃO DE PRONÚNCIA. ÓNUS DA PROVA.
Sumário:1. Não pode padecer do vício de omissão de pronúncia a sentença recorrida, quando o recorrente lhe aponta tal vício formal, não por referência a qualquer questão invocada pelas partes que a mesma tenha deixado de conhecer, mas sim por não terem sido inquiridas as testemunhas arroladas na petição inicial;
2. Em sede de IVA para provar o direito à dedução do imposto apurado em certo período, ou para provar que certas operações (vendas) beneficiam do imposto à taxa zero, a mesma só pode ser efectuada pelas pertinentes facturas ou documentos equivalentes, passadas na forma legal, emitidas pelos vendedores dos bens ou prestadores dos serviços;
3. E tal ónus probatório cabe ao sujeito passivo do imposto quando é este que invoca os factos neles evidenciados como constitutivos do seu direito à anulação da liquidação, atendo o critério da disponibilidade e da facilidade probatória em que tal ónus assenta.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. T ... S.A., identificada nos autos, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa - 2.ª Unidade Orgânica - que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


1. a recorrente arrolou duas testemunhas para prova de alguns factos articulados no processo de impugnação;
2. O Tribunal recorrido não procedeu à inquirição dessas duas testemunhas;
3. a audição das testemunhas arroladas é um dever vinculado e de observância obrigatória, quando se está perante o apuramento de factualidade essencial para a decisão do conflito;
4. por isso, essa omissão influiu, de modo relevante, no exame e decisão da causa, pelo que a decisão do tribunal recorrido é nula;
5. no acto de liquidação adicional do IVA do exercício do ano de 1999 houve preterição de formalidades essenciais, que implicou a quantificação excessiva do imposto desse ano;
6. no ano de 1999, e em particular no mês de Dezembro, a recorrente fez várias vendas para países africanos de expressão portuguesa;
7. essas vendas estavam, e estão, documentadas pelas correspondentes facturas, apesar de não figurarem no Anexo L da declaração anual de imposto;
8. essa falta de menção no Anexo L resultava de uma impossibilidade técnica do sistema informático da recorrente;
9. a Senhora Inspectora foi informada, e alertada, para esses factos, mas desatendeu o legítimo direito e pretensão do contribuinte;
10. agiu, por isso, com discricionariedade ilegítima e sem fundamento legal, com desrespeito pelas regras ínsitas nos princípios do procedimento tributário e da decisão;
11. o excesso de liquidação do imposto prova-se, directa e inequivocamente, por documentos existentes na contabilidade da recorrente, que o agente fiscalizador não quis consultar;
12. por isso, o acto administrativo impugnado é nulo por preterição de formalidades essenciais e por ter quantificado em excesso o imposto em dívida, aquando da liquidação adicional;
13. mostram-se violados, entre outras as disposições dos art°s. 265, do C.P.C., 14, n.º1 do CIVA e art.ºs. 55 e 56, n°.1 da L.G.T..


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por a recorrente não ter junto aos autos quaisquer documentos comprovativos dos movimentos que pretende que estejam isentos de IVA, sendo certo que a AT apresentou justificação bem fundamentada para a liquidação adicional em causa.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Juízes Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se a sentença recorrida padece do vício formal de omissão de pronúncia conducente à declaração da sua nulidade; E não padecendo, se a recorrente logrou fazer a pertinente prova das operações em que invoca encontrarem-se isentas de IVA.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A) A impugnante exerce a actividade de "Importação e Comércio de Máquinas e Acessórios" CAE 51140 (cfr. documento a fls 20 do Processo Administrativo).
B) A impugnante para efeitos de IVA encontra-se enquadrada no regime Normal/Mensal (cfr. documento a fls 25 do Processo Administrativo).
C) Na sequência de uma acção de inspecção realizada entre 23/07/2002 e 25/11/2002 à contabilidade da impugnante ao exercício de 1999 foi elaborado o respectivo relatório de inspecção no âmbito do qual se propõe correcções à matéria colectável em sede de IVA com recurso a correcções técnicas, apurando-se IVA em falta no montante de € 48.644,31 (cfr. documento a fls 21 e 24 do Processo Administrativo).
D) Os serviços de inspecção consideraram os seguintes elementos para proporem correcções que aqui se dão por provados (cfr. documento a fls 28, do Processo Administrativo):
a. No sistema de informação de trocas intracomunitárias, VIES, verificam-se divergências entre as vendas declaradas pelos fornecedores comunitários e as compras declaradas pela impugnante (cfr. documento a fls 28 e 29 do Processo Administrativo);
a.1 - A impugnante declarou compras no montante de 700.826$00 e a "K..." declarou vendas no valor de 226.365$00 (cfr. documento a fls 28 do Processo Administrativo);
a.2 - O valor da diferença declarada na alínea anterior é de 474.461$00 (cfr. documento a fls 28 do Processo Administrativo);
a.3 – Solicitou-se a conta corrente da "K..." e constatou-se que o valor das vendas à impugnante foi de 354.000$00 (cfr. documento a fls 29 do Processo Administrativo);
a.3 - A impugnante comprou à "H..." na Coreia, máquinas no valor de 102.378.790$00, tendo sido as mesmas consideradas na declaração periódica do IVA, no Campo 10, tendo liquidado e deduzido IVA porque o navio que transportou a mercadoria fez escala em Roterdão (cfr. documento a fls 29 do Processo Administrativo);
a.4 - No sistema VIES a transmissão citada em a.4 não foi declarada (cfr. documento a fls 29 do Processo Administrativo);
b. Da análise à sequência numérica das facturas e venda a dinheiro, algumas facturas não foram contabilizadas, o que resultou IVA liquidado e entregue ao Estado fora do prazo legal (cfr. documento a fls 31 do Processo Administrativo);
c. As facturas n.º 50184/5 e 50221/2/3 emitidas em Maio foram contabilizadas em Julho (cfr. documento a fls 32 do Processo Administrativo);
d. A factura n.º 50267 datada de Julho foi contabilizada em Setembro (cfr. documento a fls 32 do Processo Administrativo);
e. Em Dezembro não foi liquidado nem entregue o IVA relativo às facturas de prestação de serviços, (parte) e facturas e vendas a dinheiro de peças de todos os centros de assistência (cfr. documento a fls 37 do Processo Administrativo);
f. Em Dezembro a conta 7110599 Vendas a classificar ficou por saldar e apresenta um saldo de 67.118.826$00 (cfr. documento a fls 37 e 145 a 171 do Processo Administrativo);
g. No montante descrito em f) está incluído o valor do IVA não entregue no montante de 9.752.308$00 (cfr. documento a fls 37 do Processo Administrativo);
h. Nos documentos das fls 145 a 171 do Processo Administrativo, não constam quaisquer vendas para África ou para o mercado comunitário (cfr. documento a fls 42 do Processo Administrativo);
i. Na declaração anual entregue relativa ao exercício de 1999 as operações activas, designadamente as das linhas de transmissão intracomunitárias e exportações encontram-se a zeros (cfr. documento a fls 269 do Processo Administrativo);
E) Em 23/12/2002 foi proferido parecer pelo coordenador dos serviços de inspecção que confirmou as correcções propostas no relatório de inspecção (cfr. documento a fls 19 do Processo Administrativo).
F) Em 17/01/2003 foi proferido despacho de concordância com o parecer e com o relatório de inspecção do Chefe de Divisão, no uso de poderes delegados, que fixou o lucro tributável de € 124.580,63 para € 247.979,70 com recurso a correcções técnicas (cfr. documento a fls 19 do Processo Administrativo).
G) Na sequência da fixação do lucro tributável nos termos na alínea anterior foi efectuada a liquidação adicional de IVA n.º 03021361 e 03021355 relativa a juros compensatórios, referentes ao exercício de 1999 no montante de € 48.644,31 e de € 9.674,22 (cfr. documento a f1s 260 a 261 do Processo Administrativo).
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Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos, no processo administrativo em apenso e, em concreto, no teor dos documentos indicados em cada uma das alíneas supra.

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.


4. Tendo sido imputada à sentença recorrida o vício de omissão de pronúncia, a existir, conducente à declaração da sua nulidade - cfr. matéria das suas quatro primeiras conclusões do recurso – embora a final se tenha “esquecido” de formular o correspondente pedido, nenhum, aliás, tendo mesmo vindo a formular - porque a mesma a ocorrer gerar, na realidade, a nulidade desta que não só a sua anulação, nos termos do disposto nos art.ºs 668.º n.º1 alíneas b) e d), 660.º n.º2 e 713.º n.º2 do Código de Processo Civil (CPC), 143.º e 144.º do Código de Processo Tributário (CPT), e hoje dos art.ºs 124.º e 125.º do CPT, importa por isso conhecer em primeiro lugar desta invocada nulidade.

Tal nulidade só ocorre, nos termos daquelas normas citadas em primeiro lugar, quando o Juiz deixe de pronunciar-se em absoluto de questão que deva conhecer, que por isso tenha sido submetida à sua apreciação e da qual não conheça, nem o seu conhecimento tenha sido considerado prejudicado pela solução dada a outra(s), como constitui jurisprudência abundante (1.

Como sabiamente invocava o Professor Alberto dos Reis - Código de Processo Civil Anotado, volume V, (Reimpressão), pág. 142 e segs - «Esta nulidade está em correspondência directa com o 1.º período da 2.ª alínea do art.º 660.º. Impõe-se aí ao juiz o dever de resolver todas as questões que as partes tiverem submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras....
São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão».

No caso, invoca a recorrente, na matéria daquelas primeiras quatro conclusões do seu recurso, que no Tribunal “a quo”, se omitiu a inquirição das duas testemunhas arroladas o que constituía um dever vinculado, cuja falta influiu no exame e na decisão da causa, sendo assim tal decisão nula.

Desde logo, não se pode dizer como pretende a recorrente, que o Tribunal “a quo” se tenha “esquecido” de inquirir as testemunhas em causa, quando as não inquiriu mas justificou por que não o fazia, no seu despacho de fls 50 dos autos, que notificado à ora recorrente nada sobre ele veio dizer, tendo aí a M. Juiz do mesmo Tribunal expendido as razões por que entendia desnecessária tal inquirição de testemunhas – por entender não conter a petição inicial factualidade relevante susceptível de demonstração pela produção de prova testemunhal - como a lei lhe impõe pela norma do art.º 113.º, n.º1 do CPPT, com o conhecimento imediato do pedido, pelo que nunca poderia ocorrer a invocada omissão de pronúncia, quando a juiz em juízo fundamentado vazado em tal despacho, conclui pela desnecessidade de inquirição de tais testemunhas.

Já se tal juízo formulado pela M. Juiz do Tribunal “a quo”, dessa desnecessidade da inquirição das testemunhas se vier a revelar errado, sempre o vício subjacente a tal decisão não é o vício formal de omissão de pronúncia, mas sim o vício substancial, de errado julgamento.

Por outro lado, a invocada omissão de pronúncia apenas pode ocorrer quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões colocadas pelas partes ao tribunal (art.º 660.º, n.º2 do CPC), que não sobre a falta de realização de diligências instrutórias ou falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas (2), que é o que a recorrente invoca para integrar tal omissão de pronúncia, pelo que também por aqui nunca poderia ter ocorrido a invocada omissão de pronúncia.


Assim, não pode a sentença recorrida ter incorrido no invocado vício formal de omissão de pronúncia conducente à declaração da sua nulidade (art.º 125.º n.º1 do mesmo CPPT), por a sentença recorrida não ter deixado de emitir pronúncia sobre as alegadas questões discutidas nos autos, nos termos supra.


Improcede assim da matéria das citadas conclusões das alegações do recurso, não sendo de declarar nula a sentença recorrida.


4.1. Para julgar improcedente a impugnação judicial deduzida considerou a M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que a impugnante e ora recorrente não logrou provar as invocadas vendas de produtos e serviços para os países lusófonos e para os países da UE, de molde a justificar a diferença dos valores apurados entre os constantes na sua contabilidade e os apurados pelo sistema VIES, extraídos das contabilidades das suas vendedoras da mesma UE, “K...NV/SA” e “M...”, designadamente das respectivas contas correntes e ainda, quanto a uma aquisição transportada de navio, adquirida na Coreia, na empresa “H...”, que não se mostrava inscrito no sistema VIES, que contudo, efectuou a liquidação e dedução do IVA nas respectivas declarações periódicas como se de mercadoria comunitária se tratasse, pelo que não logrou provar, como lhe cabia, que o saldo da sua conta-corrente em sede de IVA, fosse o por si pretendido, enquanto que a AT justificou plenamente os pressupostos da liquidação impugnada.

Para a impugnante e ora recorrente, de acordo com a matéria constante das restantes conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto – conclusões 5. e segs. – continua a pugnar que neste exercício de 1999, no seu mês de Dezembro, fez várias vendas para países africanos, que estão documentadas com as respectivas facturas, que não constavam do seu sistema informático por uma impossibilidade técnica, que a senhora inspectora não quis consultar, apesar de para tal alertada e informada (argumentação nesta parte, relativa à Exma Inspectora, que não havia invocado na sua petição inicial de impugnação judicial, como da mesma se pode colher), ocorrendo um excesso de quantificação na liquidação desse imposto.

Vejamos então.
A ora recorrente não coloca em causa os dados recolhidos pela Exma Inspectora com os quais se procedeu à liquidação impugnada de IVA retirados do sistema VIES, por confronto com os retirados da sua contabilidade, nem a repartição do ónus da prova que cabe a cada uma das partes no processo judicial tributário, mas sim as vendas realizadas com países em que a taxa de IVA era de zero, neste mesmo mês de Dezembro, e que a sua contabilidade não reflectia, em virtude do «bug» do ano de 2000, que avariou o seu sistema informático, como melhor explica nos art.ºs 11.º e segs da sua petição inicial de impugnação, mas que tais vendas figuram nas respectivas facturas passadas pelos seus adquirentes – cfr. matéria da sua conclusão 7. – facturas que, contudo, não fez juntar aos autos, quer com a sua petição inicial de impugnação judicial, nos termos do disposto no art.º 108.º n.º3 do CPPT (oferecerá este os documentos de que dispuser), quer posteriormente.

Aliás, a própria ora recorrente, na sua declaração anual entregue na AT, relativa a IVA, no Anexo L, relativa a tal período, nas operações passivas, no quadro das operações com o exterior, só declarou compras, estando as linhas de transmissões intracomunitárias e as das exportações, ou seja, as operações activas, as vendas, a zeros, sendo que tais declarações e presumem verdadeiras e de boa fé, nos termos do disposto no art.º 75.º, n.º1 da LGT, como bem se observa na sentença recorrida.

O imposto sobre o valor acrescentado, abreviadamente IVA, tal como é praticado nos países que o adoptam é um imposto geral sobre o consumo. É um imposto plurifásico: aplica-se em várias fases do processo produtivo. O que caracteriza o IVA é o método de cálculo da dívida fiscal de cada operador, conhecido por método do crédito do imposto(indirecto, subtractivo ou das facturas): cada operador económico liquida imposto à taxa legal, sobre as transacções que efectua, mas em cada período de imposto recebe crédito do imposto que suportou nesse mesmo período nas aquisições dos "inputs" da sua produção. O imposto a entregar ao Estado é assim o que resulta da diferença entre o IVA liquidado nas facturas de venda e o IVA suportado, constante das facturas de compra(tudo referido a um determinado período de imposto). Não existem efeitos cumulativos, apesar de se tributarem todos os estádios produtivos: o imposto liquidado num estádio é deduzido pelo estádio seguinte. A taxa do imposto é a que gravar as transacções fiscais, no caso de serem de montantes diversos aos vários estádios de produção. A neutralidade do tributo apenas é afectada quando se prevêem isenções para certos operadores, ou certas transacções, e quando a concessão dessas isenções implica a não possibilidade legal de deduzir o imposto que o operador isento suportou na aquisição de "inputs" produtivos.
A génese do moderno IVA deve buscar-se nos sucessivos ajustamentos introduzidos nos impostos de tipo cumulativo, com a finalidade de minorar distorções fiscais que lhes eram próprias. A evolução mais característica verificou-se em França, a justo título considerado o País em que nasceu o IVA actualmente em vigor - cfr. POLIS - Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado - Tomo 5, pág. 1478 e segs.

Em Portugal, o IVA começou a vigorar em 1.1.1986, tendo o respectivo Código sido aprovado pelo Dec-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro.
Do seu preâmbulo, designadamente do seu ponto 4, quanto à incidência do imposto, o mesmo visa tributar todo o consumo em bens materiais e serviços, abrangendo todas as fases do circuito económico, desde a produção ao retalho, sendo, porém, a base tributável limitada ao valor acrescentado em cada fase. A dívida tributária de cada operador económico é calculada pelo método do crédito de imposto, traduzindo-se na seguinte operação: aplicada a taxa ao valor global das transacções da empresa, em determinado período, deduz-se ao montante assim obtido o imposto por ela suportado nas compras desse mesmo período revelado nas respectivas facturas de aquisição. O resultado corresponde ao montante a entregar ao Estado.

Nos termos do disposto no art.º 1.º do respectivo Código, estão sujeitas a IVA:
a)As transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal;
b)As importações de bens;
c)As operações intracomunitárias efectuadas no território nacional, tal como são definidas e reguladas no Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias.
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E são sujeitos passivos do imposto as pessoas singulares ou colectivas que, de um modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões livres e bem assim as que, do mesmo modo independente, pratiquem uma só operação tributável, desde que essa operação seja conexa com o exercício das referidas actividades, onde quer que este ocorra, ou quando, independentemente dessa conexão, tal operação preencha os pressupostos da incidência real de IRS e de IRC, seu art.º 2.º.

Tendo em conta o método de apuramento do imposto vazado em diversas das suas normas do CIVA, como nas dos art.ºs 19.º, 2.º e 22.º, só confere direito à dedução o imposto mencionado em facturas e documentos equivalentes passados na forma legal, bem como o recibo de pagamento de IVA que faz parte das declarações de importação, em nome e na posse do sujeito passivo, constituindo tais facturas ou documentos equivalentes um verdadeiro requisito substancial em ordem à dedução do IVA (3), pelo que na falta da junção das mesmas pela ora recorrente e não constando as mesmas dos autos, não pode lograr obter o desiderato de ver deduzido no imposto a pagar o imposto nelas suportado ou, eventualmente, o imposto que nessas supostas vendas a países africanos em que o imposto fosse zero, desconsiderado na base tributária da incidência do mesmo, já que as facturas ou documentos equivalentes deverão conter, sob pena de não serem como tais aceites, os requisitos constantes no art.º 35.º, n.º5 do CIVA, entre eles, o motivo justificativo da não aplicação do imposto, quando seja caso disso – cfr. sua alínea e) – e que tais documentos, para efeitos de IVA, não podem ser substituídos por outros meios de prova, nos termos do disposto nos art.ºs 19.º, n.º2 do CIVA e 655.º, n.º2 do CPC, irrelevando por isso, no caso, proceder à inquirição das testemunhas arroladas em ordem a obter essa prova.

E tal prova cabia à ora recorrente ter efectuado (4) , como bem se pronunciou a sentença recorrida, ao abrigo do disposto no art.º 74.º, n.º1 da LGT, como facto constitutivo do direito à anulação da liquidação do IVA, na parte correspondente, ou seja a prova dos factos expostos e as razões de direito invocadas na sua petição inicial de impugnação judicial que fundamentam o pedido, nos termos do disposto no n.º1, do art.º 108.º do CPPT, a causa de pedir concretamente pretendida fazer valer nesta acção e com base na mesma a causa teria de ser decidida a seu favor, por a lei lhe conferir tal tutela judicial, com a procedência da impugnação e a consequente anulação da liquidação em causa.

É que, previamente, por sua banda, a AT, ao abrigo da mesma norma do art.º 74.º, n.º1 da LGT, logrou trazer para os autos a prova suficiente constitutiva do seu direito à liquidação adicional do IVA, recolhida aliás, sobretudo, da contabilidade da ora recorrente, o que de resto nem vem colocado em causa no presente recurso, como bem se pronuncia a M. Juiz do Tribunal “a quo” na sentença recorrida.


Improcedem assim todas as conclusões do recurso, sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.


Custas pela recorrente.


Lisboa,20 de Outubro de 2009

(1) Cfr. entre outros, os acórdãos do STA de 2.10.1996 (ambos), recursos n.ºs 20472 e 20491.
(2) Cfr. neste sentido Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 2.ª edição, revista e aumentada, 2000, Vislis, pág. 572, nota 10.
(3) Cfr. neste sentido, entre outros, o acórdão do STA de 15.4.2009, recurso n.º 951/08-30.
(4) Ónus da prova que assenta no critério de disponibilidade e facilidade probatório – cfr. neste sentido o acórdão do TCAN de 28.6.2007, recurso n.º 247/01.