Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:880/08.1 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:04/04/2024
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRS.
SOCIEDADE EM TRANSPARÊNCIA FISCAL.
Sumário:Está vedada a tributação em IRS por existência de sociedade em regime de transparência fiscal, com vista ao aproveitamento económico de prédio, quando as comproprietárias do mesmo decidem vendê-lo a terceiro, conferindo-lhe, para o efeito, procuração irrevogável.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais: Subsecção tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
I- Relatório
Maria ……………………… veio deduzir impugnação judicial, na sequência do indeferimento parcial da reclamação graciosa que apresentara contra o acto tributário de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) nº ……………..152, do ano de 2001 e, bem assim do acto de liquidação de juros compensatórios nº …………………….347, bem como a demonstração do acerto de contas nº ……………………405, da qual resultou o valor a pagar de €413.033,20, pedindo a anulação do actos tributários em causa, na parte não anulada, assim como do acto de indeferimento parcial da reclamação graciosa que teve aqueles actos como objecto, e ainda pede o reembolso do valor indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.
O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 630 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), datada de 14/01/2022, julgou a impugnação procedente e, em consequência, anula as liquidações de IRS e juros compensatórios sindicadas “referidas na letra X do probatório”.
Desta sentença foi interposto o presente recurso em cuja alegação inserta a fls. 706 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente, Fazenda Pública., formulou as conclusões seguintes:”
A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a Impugnação Judicial deduzida por MARIA …………………….., com o NIF …………….. (recorrida) e, em consequência, anulou as liquidações de IRS e juros compensatórios do ano de 2001, melhor identificadas nos autos.
B. Pelo elenco de razões acima arroladas, ressalvando-se sempre melhor entendimento e, com o devido respeito, infere-se que a sentença proferida pelo Tribunal a quo julgou procedente o pedido da impugnante (aqui recorrida) escusando-se de melhor analisar a prova constante dos autos, lavrando em erro no que concerne à apreciação da matéria de facto.
C. Todavia, se devidamente analisadas as provas reunidas em sede de ação de inspeção, prevaleceria uma decisão diferente da adotada pelo Tribunal, pois, pese embora determinados factos tenham sido dados como provados, foram objeto de uma análise crítica deficiente.
D. No presente caso foi entendido que a questão controvertida consistiu em analisar o vício/erro sobre os pressupostos fácticos-jurídicos, por inexistência de constituição de sociedade e/ou de desenvolvimento de atividade comercial.
E. Nessa senda, decidiu-se o Tribunal Tributário pela procedência do pedido da impugnante.
F. Ora, decorre do probatório que no âmbito do procedimento de inspeção nº OI200508229, a AT apurou que a recorrida e M …………………… (irmã), exerciam atividade comercial conjunta, e por isso, efetuaram correcções em sede de IRC no montante de € 3.466.024,68, o qual seria imputado em partes iguais às sócias em sede de IRS.
G. E que nesse âmbito foi feita a inscrição oficiosa da sociedade Maria ……………………. e M …………….., com o NIPC ……………… [ cfr. alíneas F) a H) do probatório].
H. E que através do procedimento de inspeção n.º OI200508230 foi feita a respetiva imputação em nome da recorrida (IRS).
I. O RIT é um documento autêntico (artigo 363.º, n.º 2, do CC), que, quando devidamente fundamentado e desde que baseado em critérios objetivos, faz fé pública relativamente aos factos que integra, nos termos do artigo 76.º, n.º 1, da LGT.
J. Neste conspecto, diríamos, num primeiro apontamento que o Tribunal a quo, não atribuiu a relevância devida ao que vem expendido no RIT elaborado no âmbito da Ordem de Serviço n.º OI2005089229 em nome da sociedade inscrita oficiosamente pela recorrente, Maria ………………… e M …………………….., no qual vem fundamentada a aludida correção no valor de €3.466.024,68 que se encontra reproduzida nos pontos 20.º a 23.º das alegações e que por uma questão de economia ora se remete [cfr. ainda alínea H) do probatório].
K. Ora, tal como decorre da factualidade provada, os lotes de terreno advieram sua esfera jurídica da recorrida por mortis causa, e contrariamente ao que a sentença recorrida afirma, ficou demonstrado que a recorrida e sua irmã (co- proprietárias) não se limitaram a fruir estaticamente do bem (terreno rústico), procedendo à sua transformação económica, aumentando-lhe o seu valor através dos trabalhos desenvolvidos, necessários para aprovação do loteamento.
L. A recorrida e a sua irmã desenvolveram em conjunto diversas operações necessárias ao loteamento de terreno para construção, aprovado pela Câmara Municipal da Amadora, praticando atos e incorrido em despesas tais como a obtenção de licenças, a realização de infra- estruturas, com a finalidade de aprovação de um loteamento, entre outras.
M. Para além disso, resulta das escrituras que são mencionadas no quadro I do RIT [que vem reproduzido na alínea H) do probatório], que foram as proprietárias (recorrida e sua irmã) que procederam como outorgantes às alienações dos diversos lotes mencionados no quadro I do RIT, que vem reproduzido na alínea H) do probatório.
N. E no que confere ao contrato promessa de compra e venda da urbanização que vem descrito nos autos, tal como vem descrito no RIT, o mesmo transparece a intenção da recorrida e sua irmã venderem a urbanização a J ……………………… [cfr. alínea EE) do probatório]. No entanto a intenção manifestada nesse documento nunca foi concretizada, pois carecia da celebração de escritura pública para se operar e considerar a transmissão da propriedade dos bens (artigo 875.º do Código Civil).
O. Mais ficou demonstrado que no desencadeamento do processo de loteamento junto da Câmara Municipal da Amadora, foram praticados atos e incorridas despesas em nome da recorrida e da sua irmã (promitentes vendedoras) e nunca em nome de J ……………….. [promitente comprador - alínea H) do probatório].
P. Deste modo, a prova carreada para os autos demonstra que o contrato promessa não passou de uma mera intenção, não se verificando a tradição dos bens em 1998.
Q. Quanto à outorga às procurações que vem expendidas nos autos [cfr. alíneas FF) e GG) do probatório], estas reforçam a ideia de que o contrato promessa de compra e venda não teve qualquer efeito.
R. As procurações permitiram simplesmente a atuação do senhor procurador (J …………………) em desempenhar as tarefas, orientações e procedimentos, em nome da recorrida ( e da sua irmã, enquanto sócias da sociedade irregular).
S. Ainda de salientar que após a conclusão do loteamento os terrenos de construção resultantes da urbanização foram inscritos em partes iguais, nas respetivas matrizes, em nome da recorrida e da sua irmã (sócias da sociedade irregular), sendo por elas pago o imposto devido (contribuição autárquica e IMT e IMI) – [cfr. alínea H) do probatório].
T. De facto, é, no mínimo insólito e, do ponto de vista legal, absolutamente insustentável, que o Tribunal face à prova que resulta do RIT formule a seguinte conclusão:
“(…) Ora, não resulta do probatório qualquer ato ou diligência que permita concluir pela intenção da Impugnante e da sua irmã em ordem à constituição de uma sociedade: da aquisição mortis causa dos terrenos em causa e da outorga das procurações referidas nas letras FF e GG do probatório (e respetivo conteúdo) até se infere o contrario; os pedidos de licenciamento do loteamento em nome da Impugnante e da sua irmã, por si só, não permitem concluir que elas tinham a intenção de se associarem para a exploração de uma atividade económica (…).
U. Ressalvando-se sempre melhor entendimento e, com o devido respeito devidamente analisadas as provas reunidas, prevaleceria uma conclusão diferente da adotada pelo douto Tribunal.
V. Ora, face a todo o expendido anteriormente, e salvo melhor entendimento, dimana inequívoco que, contrariamente, ao decidido pelo douto Tribunal, a recorrida e a sua irmã tiveram intenção, e procederam à transformação económica de bens imóveis (operação de loteamento) efetuando em consequência as alienações dos novos bens produzidos (lotes de terreno), desenvolvendo assim, uma atividade económica (cfr. artigo 2.º do Código Comercial), que não uma mera fruição na medida em que visa a repartição dos lucros, devidamente enquadrado em sede de IRC (correção no montante de 3.466.024,68), o qual seria imputado em partes iguais às sócias em sede de IRS.
W. Não o tendo feito, impõe-se a revogação da douta decisão recorrida e a prolação de acórdão que julgando procedente o presente recurso, julgue totalmente improcedente a presente impugnação judicial.
X. Deste modo, considerando a eventualidade de ser entendido que, no caso em apreço, se verificam os pressupostos suscetíveis de fundamentar a aplicação da faculdade prevista no artigo 6.º, n.º 7 do RCP, requer-se a Vossas Excelências, Venerandos Juízes Desembargadores, se tal for considerado oportuno, se dignem a aferir da suscetibilidade de dispensar o pagamento da taxa de justiça correspondente ao valor que extravasa o montante de €275.000,00.
Pelo exposto, impõe-se a revogação da douta decisão recorrida e a prolação de acórdão que julgando procedente o presente recurso, julgue totalmente improcedente a presente impugnação judicia V/Exas, porém, melhor decidindo, não deixarão de fazer a acostumada justiça.”
X
A recorrida, Maria ………………………., apresentou contra-alegações (requerimento de fls. 738 e ss. numeração do processo em formato digital – sitaf), expendendo conclusivamente o seguinte: “
i. Foi o presente recurso interposto pela Entidade Impugnada da douta Sentença proferida, no processo de impugnação judicial n.º 880/08.1BELRS.
ii. Todavia, a Recorrente não deu cumprimento ao disposto no artigo 640.º do Código de Processo Civil.
iii. Com efeito, contestando o julgamento da matéria de facto não circunstancia os concretos factos que julga incorrectamente julgados.
iv. De todo o modo o acto de liquidação é, como bem decidiu o Tribunal a quo, ilegal por vício de violação de lei dado que já se encontrava caducado o direito à liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e de Juros Compensatórios, do ano de 2001, ora em crise.
v. Com efeito, ao contrário do que pretende a Autoridade Tributária e Aduaneira, ao procedimento de inspecção realizado não pode ser conferido efeito suspensivo porque o mesmo não configurou um verdadeiro procedimento de inspecção, mas apenas um expediente para, com abuso de direito, tentar suspender o decurso do prazo de caducidade.
vi. Não obstante, sendo o prazo de caducidade de quatro anos seguintes ao termo do ano em que, alegadamente, se verificou o facto tributário – 31 de Dezembro do ano de 2001 –, o mesmo terminaria em 31 de Dezembro do ano de 2005.
vii. Sucede que os actos de liquidação objecto de impugnação só foram preaticados em 2006, pelo que já havia caducado o direito à sua liquidação.
viii. Acresce que os actos de liquidação ora contestados padecem, ainda, de erro sobre os pressupostos de direito.
ix. A Autoridade Tributária e Aduaneira fundamenta, na perspectiva legal, o acto de liquidação de IRS que constitui o objecto da presente impugnação com o disposto nos artigos 2.º, n.º 2, e alínea a) do n.º1 do artigo 6.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, e artigo 20.º,n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.
x. Para o efeito, a Autoridade Tributária e Aduaneira alega que a Impugnante teria constituído uma sociedade civil sob a forma não comercial com a Sua Irmã – co-proprietária do bem imóvel.
xi. Conforme se deixou demonstrado nos autos, resulta claro que a Impugnante e a Sua Irmã, não constituíram qualquer sociedade tendo em vista o prosseguimento de uma actividade económica e repartição do lucro.
xii. O que se verificou na realidade, foi a alienação, em 1998, de bens imóveis de que eram coproprietárias, por contrapartida do pagamento do preço estabelecido no contrato-promessa de compra e venda – e essa alienação dos bens era a única intenção da impugnante e da coproprietária.
xiii. Ao contrário do que a Autoridade Tributária e Aduaneira afirmou, em sede de audiência de inquirição de testemunhas, foi a Autoridade Tributária e Aduaneira que ficcionou a existência de uma “sociedade” e promoveu a sua inscrição oficiosa atribuindo-lhe, por sua única e exclusiva iniciativa, um número de contribuinte.
xiv. Em face do exposto, e também por este motivo, é evidente o erro sobre os pressupostos de direito em que incorreu a Autoridade Tributária e Aduaneira na prática do acto que se impugna, o que não podendo ser desconsiderado deverá determinar a anulação do mesmo porque praticado com ofensa das normas e princípios jurídicos aplicáveis (cfr. artigo 135.º do Código de Procedimento Administrativo).
xv. Por seu lado, os actos de liquidação impugnados padecem, ainda, de erro sobre os pressupostos de facto por errada quantificação da matéria tributável.
xvi. Da análise do Relatório de Inspecção Tributária que fundamenta o acto tributário de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares do ano de 2001, resulta que para efeitos de cálculo da respectiva mais-valia consideram que o valor de aquisição corresponde ao valor dos lotes de terrenos à data da sua aquisição originária, ou seja, da sucessão por morte de seu Pai e de sua Mãe.
xvii. Ora, ainda que se aceitasse a legalidade do entendimento defendido pela Autoridade Tributária e Aduaneira – o que não se concede -, o valor de aquisição relevante para efeitos de cálculo do valor tributável resultante das segundas transmissões corresponderá, não ao valor decorrente da sucessão por morte, mas ao valor pelo qual os bens imóveis foram afectos à “esfera profissional” da Impugnante, ou seja, na ausência de outro, ao seu valor de mercado dos bens imóveis pelo qual “entraram” na esfera da (alegada mas inexistente)“sociedade civil constituída sob forma não comercial” denominada Maria ………………………. e M ……………………., alegadamente pessoa colectiva n.º ………………..
xviii. Ainda assim, tais ganhos, não seriam sujeitos a tributação por força do regime constante do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 442-A/88 de 30 de Novembro.
xix. Os actos de liquidação objecto de apreciação nos presentes autos, encontram-se, ainda, inquinados de vício de violação de lei por inexistir, na esfera da Impugnante, a capacidade contributiva e o acréscimo patrimonial pretendidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira, nos termos do disposto no artigo 104.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa;
xx. Com efeito, resultou demonstrado nos autos que o único acréscimo patrimonial relativo aos imóveis em apreço verificado na esfera da Impugnante – e, assim, portanto, susceptível de poder ser qualificado como rendimento para efeitos de tributação em sede de Imposto sobre o Rendimento das pessoas Singulares – é o resultante do efectivo recebimento (em 1998) de 50% do valor acordado com o promitente-comprador, e procurador, para a venda desses mesmos imóveis (ou seja, 50% de mil milhões de escudos), constituindo o valor constante das escrituras de compra e venda em apreço elencadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira no Relatório de Inspecção Tributária, rendimentos, sim, do promitente-comprador/procurador das proprietárias.
xxi. Os actos de liquidação de Juros Compensatórios também se mostram ilegais por vício de violação de forma, por preterição de formalidade essencial porquanto a Impugnante não foi notificada para exercício do direito de audição sobre os mesmos.
xxii. Por último, os actos de liquidação de Juros Compensatórios também se mostram ilegais por falta de fundamentação, nos termos do artigo 35.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária;
Termos em que, e nos mais de direito aplicáveis, sempre com o douto suprimento de Vossa Excelências deverá o presente recurso ser julgado improcedente com as necessárias consequências legais.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal notificado para o efeito, emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.
X
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
X
II- Fundamentação
2.1. De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:”
A. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 88692, de 16 de Dezembro de 2003, foi realizada uma acção inspectiva à Impugnante, em sede de IRS do ano de 2001, podendo ler-se no Relatório de Inspecção Tributária (RIT) respectivo, elaborado em 29 de Março de 2004 (cf. doc. 10, junto com a p. i. a fls. 152 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
«Texto no original»


B. Sobre o RIT, recaíram pareceres e despacho, com o seguinte teor essencial (Idem):
«Texto no original»

C. Dá-se por integralmente reproduzido o teor dos Anexos ao RIT referido na letra anterior;
D. Em 14 de Setembro de 2004, foi emitida a liquidação de IRS n.º ………………074, no valor de € 342.595,06 (cf. fl. 240 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
E. Na sequência de reclamação graciosa, foi prestada informação, emitido parecer e proferido despacho, com o seguinte teor essencial (cf. fls. 409 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
«Texto no original»

F. Dá-se por integralmente reproduzido o teor da documentação junta a fls. 315 e segs., relativa à inscrição oficiosa da sociedade Maria ………………………….. e M ……………….., com o NIPC …………….;
G. Por ofício n.º 080604 de 30 de Novembro de 2005, recebido em mão por R ………………….., foi a referida sociedade notificada “de que, a muito curto prazo, se deslocará(ão) à morada acima referenciada, técnico(s) dos Serviços de Inspecção Tributária”, no âmbito da Ordem de Serviço n.º OI200508229 (cf. fl. 444 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
H. Em cumprimento da referida Ordem de Serviço n.º OI200508229, de 18 de Novembro de 2005, foi realizada uma acção inspectiva à mesma sociedade, podendo ler-se no RIT respectivo, elaborado em 1 de Março de 2006 (cf. doc. 9, junto com a p. i. a fls. 95 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
«Texto no original»

I. Em 7 de Março de 2006, foi emitido ofício n.º 017449, para notificação do RIT à mencionada sociedade (cf. fl. 441 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
J. Em 21 de Março de 2006, foi emitido mandado para que se procedesse à notificação da mesma sociedade “do teor da liquidação n.º …………..129 de 2006/03/13, respeitante a IRC, ano 2001, efectuada nos termos do art.º 82.º do CIRC” (cf. fl. 419 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
K. Em cumprimento do mandado referido na letra anterior, em 22 de Março de 2006, foi emitida “certidão marcando hora certa (art.º 240.º CPC)” (cf. fl. 420 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
L. E, bem assim, em 24 de Março de 2006, foi emitida “Certidão de notificação” nos termos da qual não se conseguiu fazer a notificação da liquidação n.º …………….129, em virtude de a Impugnante “se ter recusado a assinar e receber a cópia da liquidação, tendo-lhe sido dado conhecimento de que os mesmos ficam à sua disposição” e que “tal recusa se deve ao facto de a citanda não se reconhecer sócia da sociedade irregular que tem o seu nome e de sua irmã” (cf. fl. 427 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
M. Por ofício n.º 022386 de 27 de Março de 2006, dirigido à aludida sociedade Maria ……………………… e M ………………, foi dado “conhecimento nos termos do art.º 241.º do CPC da notificação da liquidação n.º …………..129 de 2006/03/13” (cf. fl. 417 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
N. Por ofício n.º 080605 de 30 de Novembro de 2005, recebido em mão por R ……………………, foram Maria ……………………. e S ………………… notificados “de que, a muito curto prazo, se deslocará(ão) à morada acima referenciada, técnico(s) dos Serviços de Inspecção Tributária”, no âmbito da Ordem de Serviço n.º OI200508230 (cf. fl. 210 do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
O. Em 6 de Dezembro de 2005, foi emitido mandado para que se procedesse à “notificação da entrega da carta aviso e do procedimento de inspecção externo, ordem de serviço n.º OI200508230 de 2005/11/18” (cf. fl. 209 do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
P. Em cumprimento do mandado referido na letra anterior, em 6 de Dezembro de 2005, foi emitida certidão de “notificação”, assinada por R ………………… (cf. fl. 208 do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Q. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI200508230, de 18 de Novembro de 2005, foi realizada uma acção inspectiva à Impugnante, em sede de IRS do ano de 2001, podendo ler-se no RIT respectivo, elaborado em 21 de Abril de 2006 (cf. doc. 9, junto com a p. i. a fls. 95 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
«Texto no original»

R. Dá-se por integralmente reproduzido o teor dos Anexos ao RIT referido na letra anterior, em particular do Anexo I, para que remete a inerente fundamentação, transcrito na letra H supra;
S. Sobre o mesmo RIT, recaíram pareceres e despacho de concordância, com o seguinte teor essencial:
«Texto no original»

T. Foi emitido ofício n.º 031872, de 3 de Maio de 2006, dirigido à Impugnante e a S …………………, para notificação do RIT, mas a entrega não foi conseguida (devolvido ao remetente) - cf. fls. 211 e segs. do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
U. Em 10 de Maio de 2006, foi emitido mandado para que se procedesse à notificação do RIT (cf. fl. 273 do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
V. Em cumprimento do mandado referido na letra anterior, em 10 de Maio de 2006, foi emitida “certidão marcando hora certa (art.º 240.º CPC)” (cf. fl. 274 do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
W. E, bem assim, em 11 de Maio de 2006, foi emitida “Certidão de verificação hora certa”, no termos da qual a notificação do RIT foi efectuada na pessoa do notificando (cf. fl. 276 do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
X. Em 18 de Maio de 2006, foi emitida a liquidação de IRS n.º …………………152 e respectiva liquidação de juros compensatórios n.º ……………..121, no valor total de € 792.209,86 – liquidações ora impugnadas (cf. doc. 2, junto com a p. i. a fl. 53, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; cf. ainda fls. 254 e segs. do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Y. Em 22 de Maio de 2006, foi emitida a “Nota de Cobrança – Demonstração de Compensação” n.º ……………..405, da qual resulta o valor a pagar de €413.033,20, com data-limite de pagamento em 28 de Junho de 2006, cujo cômputo tem subjacente um “estorno” da liquidação n.º ……………….074 (cf. fl. 253 do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
Z. As liquidações referidas na letra X supra foram notificadas à Impugnante em 24 de Maio de 2006 (cf. doc. 2, junto com a p. i. a fl. 53);
AA. Em 24 de Outubro de 2006, a Impugnante apresentou reclamação graciosa (cf. doc. 3, junto com a p. i. a fl. 49, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; cf. ainda fls. 3 e segs. do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido)
BB. Em 31 de Março de 2008, a Impugnante efectuou o pagamento do montante de €464.891,54, referente à dívida de IRS do ano de 2001, em cobrança coerciva o processo de execução fiscal n.º ………………..918 (cf. docs. 11 e 12, juntos com a p. i. a fls. 197 e 198, respectivamente, cujo teor se dá por integralmente reproduzido; cf. ainda fl. 258 do PAT apenso, cujo teor se dá igualmente por integralmente reproduzido);
CC. Em 5 de Maio de 2008, a Impugnante foi notificada do despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa, proferido sobre informação com o seguinte teor essencial (cf. doc. 1, junto com a p. i., a fls. 46 e segs.; cf. ainda fls. 330 e segs. do procedimento de reclamação graciosa constante do PAT apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
«Texto no original»

DD. A p. i. da presente impugnação judicial foi enviada a juízo via correio postal registado em 10 de Março de 2008 (cf. carimbo aposto a fl. 48 verso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
EE. Em 7 de Janeiro de 1998, a Impugnante e M …………………. celebraram com J …………………. “contrato-promessa de compra e venda” com o seguinte teor essencial (cf. doc. 4, junto com a p. i., a fls. 59 e segs.):

«Texto no original»

FF. Em 20 de Janeiro de 1998, a Impugnante e M …………………….. outorgaram “procuração” com o seguinte teor essencial (cf. doc. 5, junto com a p. i. a fls. 62 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):
«Texto no original»

GG. Em 23 de Novembro de 1999, a Impugnante e M …………………, outorgaram nova “procuração” com o seguinte teor essencial (cf. doc. 6, junto com a p. i. a fls. 65 e segs., cujo teor se dá por integralmente reproduzido):

«Texto no original»

HH. “Na cabeça” da Impugnante e da sua irmã – que eram domésticas -, limitaram-se a “vender” ao Senhor J …………… – e a “transmitir-lhe a posse” de uns terrenos que haviam herdado dos pais, ficando alheias ao demais, tendo os terrenos sido “trabalhados pelo comprador” (cf. depoimentos das testemunhas inquiridas).”
X
“Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos autos e do PAT apenso, atenta a fé que merecem e o facto de não terem sido impugnados e, bem assim, nos depoimentos das testemunhas inquiridas, que depuseram com isenção e credibilidade e revelando ter conhecimento directo dos factos, dada a sua relação próxima com a Impugnante e os factos (cf. razão de ciência constante da acta referida no ponto I supra), tal como referido em cada letra do probatório.”
X
2.2. De Direito.
2.2.1. A presente intenção recursória centra-se sobre o alegado erro de julgamento quanto à apreciação da matéria de facto.
A sentença julgou procedente a impugnação, determinando a anulação da liquidação adicional de IRS de 2001.
Estruturou, em síntese, argumentação seguinte:
«[S]e a actividade da Impugnante e da sua irmã – comproprietárias dos terrenos herdados por falecimento dos pais – se limitou, em substância, à “venda” e à “transmissão da posse” daqueles terrenos, ficando alheias ao demais, tendo os terrenos sido “trabalhados pelo comprador” (cf. última letra do probatório), não se comprova a realização efectiva, por parte delas, de qualquer actividade visando a criação de uma utilidade nova, orientada para a obtenção de lucro. // (…) // Ora, não resulta do probatório qualquer acto ou diligência que permita concluir pela intenção da Impugnante e da sua irmã em ordem à constituição de uma sociedade; da aquisição mortis causa dos terrenos em causa e da outorga das procurações referidas nas letras FF e GG do probatório (e respectivo conteúdo) até se infere o contrário; os pedidos de licenciamento do loteamento em nome da Impugnante e da sua irmã , por si só, não permitem concluir que elas tinham a intenção de se associarem para a exploração de uma actividade económica. // Note-se que as sociedades podem ser sociedades civis (cf. artigo 980.º do CC), sociedades comerciais (cf. artigo 1º, n.ºs 1, 2 e 3, do CSC) ou sociedades civis sob a forma comercial (cf. artigo 1.º, n.º 4, do CSC). // As sociedades comerciais são as que, além das notas mencionadas no artigo 980.º do CC - existência de duas ou mais pessoas que se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade -, tenham por objecto a prática de actos de comércio e adoptem o tipo de sociedade em nome colectivo, de sociedade por quotas, de sociedade anónima, de sociedade em comandita simples ou de sociedade em comandita por acções (cf. artigo 1.º, n.º 2, do CSC). // É certo que a venda após loteamento pode constituir uma actividade comercial, nos termos do disposto nos artigos 2.º e 463.º do CCom e que o rendimento resultante da venda pode estar sujeito a tributação em sede de IRS, nos termos do disposto no artigo 3.º, n.ºs 1, alínea a) e 2, alínea h) e no artigo 4.º, n.º 1, alínea g), ambos do Código do IRS. // Questão diversa é a de saber se essa actividade comercial foi exercida pela Impugnante e pela sua irmã no âmbito de uma sociedade e, como se viu, não foi. // In casu, tendo a Administração Tributária considerado que foi constituída uma sociedade (ainda que não cumprindo as formalidades na sua constituição) e procedido à tributação ao abrigo do regime da transparência fiscal, a liquidação de IRS e a consequente liquidação de juros compensatórios impugnadas enfermam do invocado vício/erro sobre os pressupostos fáctico-jurídicos, a determinar a respectiva anulação».

2.2.2. A recorrente censura o veredicto que fez vencimento na instância. Alega, em síntese, o seguinte: «[a] recorrida e a sua irmã desenvolveram em conjunto diversas operações necessárias ao loteamento de terreno para construção, aprovado pela Câmara Municipal da Amadora, praticando atos e incorrido em despesas tais como a obtenção de licenças, a realização de infra- estruturas, com a finalidade de aprovação de um loteamento, entre outras»; «Para além disso, resulta das escrituras que são mencionadas no quadro I do RIT [que vem reproduzido na alínea H) do probatório], que foram as proprietárias (recorrida e sua irmã) que procederam como outorgantes às alienações dos diversos lotes mencionados no quadro I do RIT, que vem reproduzido na alínea H) do probatório»; «E no que confere ao contrato promessa de compra e venda da urbanização que vem descrito nos autos, tal como vem descrito no RIT, o mesmo transparece a intenção da recorrida e sua irmã venderem a urbanização a J ……………….. [cfr. alínea EE) do probatório]. No entanto a intenção manifestada nesse documento nunca foi concretizada, pois carecia da celebração de escritura pública para se operar e considerar a transmissão da propriedade dos bens (artigo 875.º do Código Civil)»; «Mais ficou demonstrado que no desencadeamento do processo de loteamento junto da Câmara Municipal da Amadora, foram praticados atos e incorridas despesas em nome da recorrida e da sua irmã (promitentes vendedoras) e nunca em nome de J …………………. [promitente comprador - alínea H) do probatório]; «Deste modo, a prova carreada para os autos demonstra que o contrato promessa não passou de uma mera intenção, não se verificando a tradição dos bens em 1998».
Apreciação. Está em causa a liquidação adicional de IRS de 2001, referida na alínea X), do probatório. A fundamentação da liquidação adicional em apreço é, em síntese, a seguinte (1):
«Dos factos descritos anteriormente resultam as seguintes conclusões: // As co-proprietárias MARIA …………………., e M ………………, desenvolveram em conjunto diversas operações necessárias ao loteamento de terreno para construção, aprovado pela Câmara Municipal da Amadora; // As co-proprietárias não se limitaram a fruir estaticamente o bem terreno rústico, mas procederam à sua transformação económica, aumentando-lhe o seu valor, através dos trabalhos desenvolvidos, necessários para a provação do loteamento; // Os trabalhos desenvolvidos, as diligências efectuadas que possibilitaram o loteamento aprovado foi possível porque as co-proprietárias estabeleceram entre elas um contrato de sociedade, previsto nos termos do art.º 980º do Código Civil, o qual refere o seguinte; “Contrato de sociedade é aquele em que duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade”; // Efectivamente as pessoas contribuíram em conjunto e em partes iguais, com bens, (terrenos rústicos), com serviços, designadamente o desencadeamento do processo de loteamento na Câmara Municipal da Amadora, a obtenção de licenças, a realização de infra-estruturas, com o propósito e finalidade de aprovação de um loteamento; // A actividade desenvolvida integra-se no conceito de acto de comércio, com definição no art.º 2º do Código Comercial, porque resultou da acção dos proprietários uma valorização dos terrenos objecto das operações neles realizadas» // Resulta dos extractos de escrituras que foram as proprietárias que procederam como outorgantes às alienações dos diversos lotes (mencionados no quadro 1 desta informação); // Apesar de se fazer referência a um contrato promessa de compra e venda da urbanização, anexo 7 desta informação, a verdade é que não passou de mera intenção, pois conforme se afirmou anteriormente e agora se reafirma, não tem as assinaturas reconhecidas e tratando-se de bens imóveis sujeitos a registo como é o caso, a transferência teria forçosamente de acontecer no caso em apreciação, através de escritura pública; // Também as procurações outorgadas em que as co-proprietárias constituem seu procurador J ……………………., das quais se extraíram as cópias já constituídas em anexos nº 8 e 9, permitem reforçar a ideia de que o contrato de promessa de compra e venda, não teve qualquer efeito. As procurações foram outorgadas em datas posteriores à do contrato promessa de compra e venda o que por si contraria o mencionado no contrato de promessa de compra e venda; // Resulta do teor das procurações que o procurador estava legitimado a representar as co-proprietárias em todos os procedimentos complementares respeitante à urbanização, designadamente proceder às alienações dos diversos lotes da urbanização. Mesmo a última procuração outorgada em 23 de Novembro de 1999, também outorgada para os efeitos do nº 1 do art.º 261º, não podendo ser revogada sem o acordo da representante, conforme previsto no nº 3 do art.º 265º e nº 2 do art.º 1170º, todos do Código Civil, não confere qualquer direito real, apenas e só lhe confere o direito de vender os lotes a quem quer que seja, inclusive a si próprio; // As procurações são actos voluntários pelos quais as proprietárias atribuíram ao procurador poderes representativos, nº 1 do art.º 262º do Código Civil, e os negócios realizados pelo representante em nome do representado produzem efeitos na esfera jurídica dos representados (art.º 258º do Código Civil); // Assim os lotes dos terrenos foram sempre propriedade dos co-proprietários, até ao momento da realização das escrituras de compra e venda; // A transformação económica exercida de forma conjunta implica que se esteja perante uma sociedade com a consequente sujeição a IRC, nos termos do nº 2 do art.º 2o do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas; // Tratando-se de uma sociedade não constituída sob a forma comercial está abrangida pelo regime de transparência fiscal, por força da alínea a) do nº 1 do art.º 6o do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas».
A recorrente partiu do pressuposto segundo o qual a recorrida e a sua irmã (2) tinham constituído uma sociedade com vista ao loteamento e posterior venda das fracções edificadas nos terrenos que ambas haviam recebido por herança aberta pela morte de seus pais. Pelo que a tributação seria devida enquanto rendimentos da categoria B, imputado em metade a cada uma das sócias da sociedade em transparência fiscal, no exercício de 2001 (alínea Q), do probatório).
Cumpre notar que a recorrente não impugna a matéria de facto assente.
Em 07/01/1998, a recorrida, Maria ……………………… e sua irmã, M …………………….., comproprietárias dos prédios em causa, outorgaram com J ………………, contrato-promessa de compra e venda, em relação ao prédio rústico em causa, “Alto ……………., freguesia da Buraca (3), fixando o preço em 1.000.000.000$00. Em 20/01/1998, as referidas comproprietárias constituíram seu procurador J …………….., com vista à alienação dos prédios urbanos a erigir no prédio já mencionado (4). Em 25/11/1999, as referidas comproprietárias outorgaram, em favor de J ……………………., procuração irrevogável para transmitir os prédios urbanos edificados no prédio em causa(5). Mais se refere que «[n]a cabeça” da Impugnante e da sua irmã – que eram domésticas -, limitaram-se a “vender” ao Senhor J …………. – e a “transmitir-lhe a posse” de uns terrenos que haviam herdado dos pais, ficando alheias ao demais, tendo os terrenos sido “trabalhados pelo comprador” (6). Não é questionado pelas partes o recebimento do preço, contrapartida da transacção em apreço. «[Se a] procuração tiver sido conferida também no interesse do procurador ou de terceiro, não pode ser revogada sem acordo do interessado, salvo ocorrendo justa causa» (7). Ou seja, a emissão de procuração irrevogável em favor de J ……………….., promitente-comprador, associada ao pagamento do preço do terreno, objecto do contrato de promessa, em que figuravam como promitentes-vendedoras, Maria ………………. e M …………………, comproprietárias do mesmo, constitui indício da consumação da transferência económica de tal prédio para a esfera do promitente-comprador (8). Este, por meio da procuração irrevogável, passou a dispor do terreno e das fracções que ali foram edificadas.
Do exposto se infere que os pressupostos em que assenta o acto de liquidação em exame, consistentes na existência de uma sociedade irregular entre as comproprietárias do terreno com vista à exploração económica do prédio em apreço, não se comprovam nos autos.
A este propósito, constitui jurisprudência assente a seguinte:
i) «A nota distintiva entre a compropriedade e a sociedade irregular é que nesta última existe uma atividade comum exercida pelos sócios, que têm em vista a criação de uma utilidade nova, norteada para a obtenção de lucro, inversamente ao que sucede na compropriedade em que os consortes se limitam a usufruir dos simples frutos propiciados pelo património comum, com o mesmo espírito em que se move o proprietário singular. // (…) // O facto de a Recorrida e a comproprietária terem dado entrada a um pedido de licenciamento tal realidade, per se, em nada permite inferir a vontade de exercício, em conjunto, de uma atividade comercial, tendente à formação de uma pessoa coletiva distinta de cada uma delas, quando, de resto, até já tinha sido outorgado o contrato de promessa de compra e venda, no qual tinha sido estipulado o preço do bem e bem assim que o efetivo suporte das despesas incorridas recairia na esfera jurídica da sociedade promitente compradora. // A alegada transformação do bem imóvel, nada permite extrapolar quanto à constituição de uma sociedade irregular, e à tributação em sede de IRC. Com efeito, a assumirem-se tais atos como atos de comércio, tal não legitima a sua tributação em sede de IRC, mas sim em sede de IRS, enquanto atos isolados de comércio, com subsunção na categoria B». (9)
ii) «Se a actividade dos comproprietários de dois prédios rústicos anteriormente à venda dos lotes de terreno resultantes daqueles imóveis se limitou à apresentação do pedido de licenciamento de loteamento (não se comprovando a realização de qualquer actividade de urbanização dos prédios, com a realização de infra-estruturas urbanísticas, que permita inferir a intenção dos comproprietários se associarem em ordem a prosseguirem uma actividade económica), os ganhos resultantes daquela venda dos lotes devem considerar-se como rendimentos obtidos com a prática de acto isolado de comércio e, por isso, a serem tributados na esfera jurídica dos comproprietários, como rendimentos empresariais, subsumíveis à categoria B para efeitos de IRS [cfr. art. 3.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, alínea h), do CIRS]. // Tendo a AT considerado que foi constituída pelos comproprietários uma sociedade irregular e procedido à tributação daqueles ganhos em sede de IRC, a consequente liquidação deste imposto enferma de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, a determinar a sua anulação». (10)
No caso em exame, a verificação dos requisitos subjectivo e objectivo, cuja presença é necessária para comprovar a existência de uma sociedade irregular ordenada ao aproveitamento económico do prédio em causa, não se comprova. Ou seja, a recorrida e sua irmã, comproprietárias do prédio em causa, transferiram o mesmo para terceiro, ao qual atribuíram os poderes de alienação e disposição do mesmo e das fracções que ali fossem construídas. A existência de sociedade não constituída sob forma regular e por isso sujeita ao regime de tributação em IRC da transparência fiscal (artigo 6.º/1/a) e 3, do CIRC), com imputação às invocadas sócias do rendimento obtido com a alienação dos lotes de terreno que do prédio terão emergido não se demonstra. O que determina o socavar dos pressupostos em que assenta a liquidação adicional sob escrutínio.
Ao decidir no sentido apontado, a sentença recorrida deve ser confirmada na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.

2.2.3. No que respeita ao pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça, cumpre referir que, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, «[n]as causas de valor superior a €275000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento». Como decorre da Tabela I do RCP, quando o valor da causa seja superior a €275.000,00, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada €25.000 ou fracção, três unidades de conta, no caso da coluna A, uma e meia unidade de conta no caso da coluna B e quatro e meia unidades de conta no caso da coluna C. «É esse remanescente, ou seja, o valor da taxa de justiça correspondente à diferença entre €275.00,00 e o efectivo superior valor da causa para efeito da determinação daquela taxa, que deve ser considerado na conta final, se o juiz não dispensar o seu pagamento» (11). «A referência à complexidade da causa significa, em concreto, a sua menor complexidade ou simplicidade e a positiva atitude de cooperação das partes» (12). Nos termos do artigo 527.º, n.º 1, do CPC, «[a] decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito». Nos termos do n.º 2 do preceito, «[e]ntende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for». No caso em exame, o valor da causa corresponde a €413.033,20.
Sobre a matéria constitui jurisprudência assente a de que o direito fundamental de acesso aos tribunais (art.º 20.º, n.º 1, da CRP) implica que os custos da prestação do serviço da justiça sejam comportáveis atenta a capacidade contributiva do cidadão médio. Nesta perspetiva, a fixação da taxa de justiça calculada apenas com base no valor da causa, particularmente se estiverem em causa procedimentos de muito elevado valor, pode contender com este direito fundamental, «evidenciando um desfasamento irrazoável entre o custo concreto encontrado e o processado em causa» [Ac. do TCAS, de 13.03.2014, P. 07373/14]. A aferição da complexidade da causa deve ter em conta o disposto no artigo 530.º/7, do CPC, do qual resulta que são especial complexidade as acções que: «a) Contenham articulados ou alegações prolixas; b) Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou // c) Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas».
No caso em exame, os autos não preenchem nenhum dos requisitos enunciados com vista a aferir da especial complexidade dos mesmos. Por outras palavras, a especialidade da causa não é de molde a afastar o limiar do valor de €275.00,00, dado que a complexidade ou especificidade não justificam a imposição de encargos dissuasores do acesso à justiça. O mesmo se diga do comportamento processual das partes, o qual se pautou pelo cumprimento do dever de boa fé processual. Por outras palavras, atendendo à lisura do comportamento processual das partes e considerando a relativa complexidade do processo, afigura-se ser de deferir o pedido quanto à dispensa do pagamento da taxa de justiça na conta final, em relação a ambas as partes.
Pelo exposto, impõe-se deferir o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º/7, do RCP. Termos em que se procederá no dispositivo.

Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da subsecção do juízo comum da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente, sem prejuízo da dispensa do remanescente da taxa de justiça.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)

(1ª. Adjunta – Tânia Meireles da Cunha)

(2 ª. Adjunta - Maria Teresa Costa Alemão)

(1)Relatório inspectivo, emitido em nome da sociedade inscrita oficiosamente, composta por Maria Teresa Costa Canas Vigouroux e Maria Veneranda Costa Canas, Alínea H), do probatório.
(2) Maria Teresa Costa Canas Vigouroux e Maria Veneranda Costa Canas.
(3) Alínea EE), do probatório.
(4) Alínea FF), do probatório.
(5) Alínea GG), do probatório.
(6) Alínea HH), do probatório.
(7) Artigo 265.º, n.º 3, do CC.
(8) Neste sentido, v. Acórdão do STA, de 04-12-2019, P. 0813/05.7BEALM 01192/17
(9) Acórdão do TCAS, de 25-02-2021, P. 441/08.5BEALM
(10) Acórdão do STA, de 13-03-2019, P. 0424/09.8BEALM 068/18
(11) Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, anotado, 4.ª ed., p. 236.
(12)Salvador da Costa, Regulamento das Custas…, cit., p. 236.