Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:327/19.8BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:01/21/2021
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Sumário:i) A determinação da entidade responsável pelo pagamento das despesas originadas pelo acidente em serviço, como as realizadas com transportes para efectuar tratamentos, medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico, depende da atribuição de incapacidade permanente.
ii) O pagamento de tais despesas, desde que as mesmas reúnam as condições legalmente previstas, competirá à Caixa Geral de Aposentações.
iii) No período de faltas ao serviço, em resultado de acidente, o trabalhador mantém o direito à remuneração, incluindo os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidam descontos para o respectivo regime de segurança social, e ao subsídio de refeição (artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro), o que inclui os suplementos de turno e de patrulha.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

B... intentou no TAF de Sintra a presente acção contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA, peticionando a condenação da Entidade demandada a “reconhecer a existência de nexo de causalidade entre a lesão sofrida pelo Autor no joelho esquerdo e o acidente em serviço ocorrido em 3 de Outubro de 2012”, a “pagar as despesas realizadas com consultas, tratamentos e medicamentos, no valor de 192,90 €”, a “pagar os suplementos de turno e de patrulha desde 16 de dezembro de 2016 até à data em que retome as suas funções, cujo montante será apurado em sede de liquidação de sentença”, a “pagar o subsídio de refeição desde 16 de agosto de 2018 até à data em que retome as suas funções, cujo montante será apurado em sede de liquidação de sentença”, bem como ao pagamento de juros à taxa legal, desde a citação até integral pagamento dos valores peticionados.

Pelo despacho saneador de 30.03.2020 foi julgada procedente a excepção de intempestividade da prática do acto processual suscitada e absolvida a Entidade Demandada da instância.

Na sequência do recurso interposto, por decisão sumária de 6.07.2020, foi concedido provimento ao mesmo, revogada a decisão recorrida e ordenada a baixa dos autos ao tribunal a quo para prossecução dos mesmos em ordem ao conhecimento do mérito da causa, se a tal nada mais obstasse.

No TAF de Sintra veio a ser proferido saneador-sentença em 6.10.2020 que julgou parcialmente procedente a acção e, consequentemente, determinou:

A) O reconhecimento “ex lege” da existência de nexo de causalidade entre a lesão sofrida pelo Autor no joelho esquerdo e o acidente em serviço ocorrido em 3 de Outubro de 2012”;

B) Julgo improcedente, por ilegitimidade passiva da Entidade Demandada, o pedido de condenação no pagamento das despesas realizadas com consultas, tratamentos e medicamentos, no valor de € 192,90;

C) Julgo improcedente, por não provado, o pedido de condenação no pagamento dos suplementos de turno e de patrulha desde 16 de Dezembro de 2016;

D) Julgo procedente, por provado, o pedido de condenação no pagamento do subsídio de refeição, após 16 de Agosto de 2018, acrescido dos juros devidos à taxa legal, desde a citação até integral pagamento dos valores ora peticionados.

O Autor, ora Recorrente, vem agora recorrer dos segmentos B) e C) [improcedência, por ilegitimidade passiva da Entidade Demandada, do pedido de condenação no pagamento das despesas realizadas com consultas, tratamentos e medicamentos, no valor de EUR 192,90; improcedência do pedido de condenação no pagamento dos suplementos de turno e de patrulha desde 16 de Dezembro de 2016]. Nas alegações do recurso interposto o ora Recorrente, conclui do seguinte modo:

a. O Meritíssimo Juiz a quo decidiu:

i. - Julgar improcedente, por ilegitimidade passiva da Entidade Demandada, o pedido de condenação no pagamento das despesas realizadas com consultas, tratamentos e medicamentos, no valor de € 192,90;

ii. - Julgar improcedente, por não provado, o pedido de condenação no pagamento dos suplementos de turno e de patrulha desde 16 de Dezembro de 2016;

b. No que respeita à primeira decisão (Julgar improcedente, por ilegitimidade passiva da Entidade Demandada, o pedido de condenação no pagamento das despesas realizadas com consultas, tratamentos e medicamentos, no valor de € 192,90), o Meritíssimo Juiz a quo concluiu que a responsabilidade por tal pagamento é da CGA e não do aqui Recorrido;

c. Mas, com o devido respeito, não é assim;

d. O ressarcimento daquelas despesas é da responsabilidade da Recorrida e não da CGA; e. Com efeito, a qualificação do acidente ocorrido em 3 de Outubro de 2012 como de “serviço” e o consequente reconhecimento de que a lesão sofrida pelo Recorrente no seu joelho esquerdo tem nexo causal com aquele acidente em serviço, confere ao Recorrente o direito, independentemente do respetivo tempo de serviço, à reparação, em espécie (cfr. arts. 4.º, n.º 3, 10.º a 14.º do Decreto-lei n.º 503/99) e em dinheiro (cfr. art. 4.º, n.º 4, 15.º a 18.º do mesmo diploma legal), dos danos resultantes do acidente em serviço, extraindo-se do seu art. 5.º, sob a epígrafe de “responsabilidade pela reparação”, que «[o] empregador ou entidade empregadora é responsável pela aplicação do regime dos acidentes em serviço e doenças profissionais previsto neste diploma» [n.º 1], que «[o] serviço ou organismo da Administração Pública ao serviço do qual ocorreu o acidente ou foi contraída a doença profissional é responsável pelos encargos com a reparação dos danos deles emergentes, nos termos previstos no presente diploma» [n.º 2], e que «[n]os casos em que se verifique incapacidade permanente ou morte, compete à Caixa Geral de Aposentações a avaliação e a reparação, nos termos previstos neste diploma» [n.º 3];

e. Deriva, por seu turno, do art. 34.º, sob a epígrafe de “incapacidade permanente ou morte”, que «[s]e do acidente em serviço ou da doença profissional resultar incapacidade permanente ou morte, haverá direito às pensões e outras prestações previstas no regime geral» [n.º 1] e que «[a]s pensões e outras prestações previstas no n.º 1 são atribuídas e pagas pela Caixa Geral de Aposentações, regulando-se pelo regime nele referido quanto às condições de atribuição, aos beneficiários, ao montante e à fruição» [n.º 4], constituindo uma competência da junta médica da Caixa Geral de Aposentações (CGA) a «confirmação e a graduação da incapacidade permanente» (cfr. art. 38.º);

f. Por força do disposto neste preceito em conjugação com a definição de «regime geral» inserta na al. a) do n.º 1 do art. 3.º e remissão para «o regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais constante da Lei n.º 100/97 (…), e legislação complementar», remissão essa que, hoje, terá de ser feita para a Lei n.º 98/2009, de 04.09 (diploma que veio revogar aquele antecedente quadro normativo - cfr. art. 186.º), temos que importa ainda ter em consideração, mormente, o disposto nos arts. 23.º, 25.º e 47.º daquela Lei;

g. Assim, preceitua-se no art. 23.º da referida Lei que o «direito à reparação compreende as seguintes prestações: a) Em espécie - prestações de natureza médica, cirúrgica, farmacêutica, hospitalar e quaisquer outras, seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado e à sua recuperação para a vida ativa; b) Em dinheiro - indemnizações, pensões, prestações e subsídios previstos na presente lei», concretizando-se, por um lado, as «prestações em espécie» no art. 25.º do mesmo diploma, as quais compreendem «a) A assistência médica e cirúrgica, geral ou especializada, incluindo todos os elementos de diagnóstico e de tratamento que forem necessários, bem como as visitas domiciliárias; b) A assistência medicamentosa e farmacêutica; c) Os cuidados de enfermagem; d) A hospitalização e os tratamentos termais; e) A hospedagem; f) Os transportes para observação, tratamento ou comparência a atos judiciais; g) O fornecimento de ajudas técnicas e outros dispositivos técnicos de compensação das limitações funcionais, bem como a sua renovação e reparação; h) Os serviços de reabilitação e reintegração profissional e social, incluindo a adaptação do posto do trabalho; i) Os serviços de reabilitação médica ou funcional para a vida ativa; j) Apoio psicoterapêutico, sempre que necessário, à família do sinistrado»; e, por outro lado, as «prestações em dinheiro» insertas no seu art. 47.º, e que abarcam «a) A indemnização por incapacidade temporária para o trabalho; b) A pensão provisória; c) A indemnização em capital e pensão por incapacidade permanente para o trabalho; d) O subsídio por situação de elevada incapacidade permanente; e) O subsídio por morte; f) O subsídio por despesas de funeral; g) A pensão por morte; h) A prestação suplementar para assistência de terceira pessoa; i) O subsídio para readaptação de habitação; j) O subsídio para a frequência de ações no âmbito da reabilitação profissional necessárias e adequadas à reintegração do sinistrado no mercado de trabalho»;

h. Retomando o DL em referência do mesmo se extrai que a CGA é responsável, para além do pagamento das indemnizações e pensões correspondentes à redução da capacidade de ganho, pelo pagamento ainda de prestações por incapacidade respeitantes aos subsídios por assistência de terceira pessoa (cfr. art. 35.º, n.º 1), para readaptação de habitação (cfr. art. 35.º, n.º 3) e por situações de elevada incapacidade permanente (cfr. art. 37.º);

i. Deriva do cotejo e da análise ao regime acabado de reproduzir parcialmente que a responsabilidade da CGA ocorre, por um lado, tão-só se do acidente em serviço resultar morte ou incapacidade permanente do sinistrado e mostra-se, quanto à situação de incapacidade, reconduzida apenas à reparação daquilo que correspondem os danos da mesma derivados e reparados em dinheiro, mormente, a indemnização em capital ou pensão vitalícia, os subsídios por assistência a uma terceira pessoa, para readaptação de habitação, e por elevada incapacidade permanente (cfr. arts. 4.º, n.º 4, als. b), c), d) e e), 5.º, n.º 3, 16.º, 17.º, 34.º a 38.º, e arts. 3.º e 14.º do DL n.º 131/2012, de 25.06 (diploma que contém a orgânica da CGA)], não se abrangendo nessa sua responsabilidade aquilo que correspondem às prestações sob a forma de reparação «em espécie»: [i) prestações de natureza médica, cirúrgica, de enfermagem, hospitalar, medicamentosa e quaisquer outras, incluindo tratamentos termais, fisioterapia e o fornecimento de próteses e ortóteses; ii) transporte e estada; iii) com readaptação, reclassificação e reconversão profissional] a cargo do serviço/organismo da Administração pública (cfr., nomeadamente, os arts. 4.º, n.º 2, 5.º, n.º 2, 10.º, 11.º, 13.º e 14.º);

j. Pelo que, inserindo-se – como é o caso – as despesas cujo ressarcimento o Recorrente reclama na acção no âmbito das “prestações em espécie”, a responsabilidade pelo seu pagamento é exclusivamente da Recorrida e não da CGA. (cfr. neste sentido, Ac. do STA, de 22.11.2018, proc. 1682/17.0BESNT, disponível em www.dgsi.pt;

k. Assim, quando na sentença se decidiu a improcedência, por ilegitimidade passiva da Entidade Demandada, do pedido de condenação no pagamento das despesas realizadas com consultas, tratamentos e medicamentos, no valor de € 192,90, fez errado julgamento, por errada interpretação e aplicação do direito;

l. No que respeita à segunda decisão (Julgar improcedente, por não provado, o pedido de condenação no pagamento dos suplementos de turno e de patrulha desde 16 de Dezembro de 2016), o Meritíssimo Juiz a quo concluiu que «fora das situações de baixa clinica decorrente de acidente de serviço, em que é ficcionada a prestação efectiva de serviço por parte do acidentado (a qual nos presentes autos cessou em 16 de Dezembro de 2016: cfr. alíneas K) a R) do probatório), inexiste um direito ao abono de um determinado suplemento remuneratório cujo processamento seja independente da categoria, cargo ou função detida, dado o mesmo exigir ou ser decorrência duma efectiva prestação de serviço»;

m. Cremos, com o devido respeito, que o Meritíssimo Juiz a quo, tendo elencado acertadamente o regime legal aplicável, mormente ao afirmar que «nos termos do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 503/99, os acidentados em serviço mantêm o direito, no período de faltas ao serviço, à remuneração, incluindo os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidam descontos para o respectivo regime de segurança social, e ao subsídio de refeição», erra quando aplica o referido regime à situação factica dos autos;

n. Com efeito, na Petição Inicial o Recorrente reclamou o pagamento dos «suplementos de turno e de patrulha desde 16 de dezembro de 2016 até à data em que retome as suas funções, cujo montante será apurado em sede de liquidação de sentença»;

o. E essa reclamação tem como subjacente o seguinte:

a) O Recorrente aquando da ocorrência do acidente em serviço em 3.10.2012 auferia, para além da remuneração da sua categoria, suplementos de turno e de patrulha. E,

b) esses suplementos, em cumprimento do disposto no artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 503/99, foram-lhe efectivamente pagos até à data da alta clínica (16.12.2018), fixada pela CGA e referida em S) da matéria de facto assente e fls 348 e 351 do Processo Administrativo.

c) Porém, a referida data de 16.12.2018 reporta-se exclusivamente à data da “alta clínica” com referência às lesões constantes do procedimento que foi submetido à CGA para confirmação e graduação da IPP resultante das lesões que, no âmbito daquele processo, foram reconhecidas como emergentes do acidente em serviço ocorrido em 3.10.2012. Ou seja,

d) Exclusivamente da lesão do joelho direito do Recorrente e apenas desta.

e) Aliás, a CGA não se pronunciou – nem podia pronunciar-se – sobre qualquer IPP atinente à lesão no joelho esquerdo, desde logo porque esta lesão, àquela data, não havia sequer sido reconhecida como resultante do aludido acidente em serviço, pois que tal nexo causal só pela sentença sob recurso foi apreciado e decidido.

f) Ora, em relação à lesão do joelho esquerdo do Recorrente, reconhecida que está (pela presente sentença) o nexo causal entre esta e o acidente em serviço, o Recorrente terá que ser futuramente submetido a nova Junta Médica da CGA, não só para determinação da IPP, como para fixação da data da “alta clínica”. E,

g) Dado que o Recorrente, por força desta lesão (joelho esquerdo) e para tratamento da mesma (incluindo intervenção cirúrgica a que foi submetido), esteve ausente do trabalho, ausência que, por força do reconhecimento do referido nexo causal, terá que ser submetida ao regime de faltas por acidente em serviço, tem o Recorrente direito a que, durante a referida ausência, lhe seja paga a retribuição que auferia à data do acidente (incluindo os referidos suplementos);

p. Sem o que, o Recorrente, em relação às ausências para tratamento desta lesão (ao joelho esquerdo), ficaria sujeito a um tratamento desfavorável ao dispensado para tratamento e cura da outra lesão sofrida (lesão do joelho direito); E,

q. Daí o pedido de condenação da Recorrida ao pagamento dos suplementos «desde 16 de dezembro de 2016 até à data em que retome as suas funções, cujo montante será apurado em sede de liquidação de sentença»;

r. Assim, não se trata, quanto ao peticionado, de reclamar o pagamento de suplementos de turno e de patrulha que o Recorrente deixou naturalmente de auferir após o regresso ao serviço, ainda que em serviços melhorados, a partir de 16.12.2018, sem ter prestado serviço de turno ou de patrulha;

s. Trata-se, antes, de reconhecer o direito do Recorrente a auferir o valor de tais suplementos que constituíam a respectiva remuneração à data do acidente, durante os períodos de ausência ao trabalho, para tratamento de uma lesão (a do joelho esquerdo), lesão que a presente sentença expressamente reconheceu ter nexo causal com o aludido acidente, submetendo tais ausências ao regime legal constante do artigo 15.º do Decreto-lei n.º 503/99, de 20 de Novembro;

t. Direito que, a nosso ver e com todo o devido respeito, não pode deixar de ser reconhecido, ainda que a determinação do montante devido apenas possa ser liquidado em execução de sentença, alíás, como peticionado;

u. Razão, pela qual, o segmento decisório agora impugnado se nos afigura configurar erro de julgamento, por errada aplicação do direito. (artigo 15.º do Decreto-lei n.º 503/99, de 20 de Novembro.

O Recorrido não contra-alegou.

O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, não se pronunciou.



Com dispensa de vistos do colectivo, importa apreciar e decidir.



I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar:

- Se o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter considerado que o pagamento da quantia de reclamada de EUR 1.492,49 - a título de despesas resultantes com o acidente em serviço, nomeadamente com transportes, medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico -, impende sobre a CGA, IP (não chamada aos presentes autos); e se

- Se o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter considerado infundado o pedido de condenação no pagamento dos suplementos de turno e de patrulha desde 16.12.2016.



II. Fundamentação

II.1. De facto

Na sentença recorrida foi fixada a seguinte matéria de facto:

A) Em 3 de Outubro de 2012, nas instalações da Unidade Especial de Polícia, sita em Belas, quando se encontrava integrado no 1.º “Curso de Técnicas de Intervenção Policial”, ao fazer um exercício, o Autor sentiu um estalo no joelho direito, ficando com dores _ cfr. relato da «ocorrência» constante a fls. 1 a 3 do processo administrativo instrutor;

B) Em resultado da ocorrência referida em A), em 14 de Outubro de 2012, o Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando Metropolitano de Lisboa da Polícia de Segurança Pública (PSP) iniciou o processo de sanidade n.º 2012LSB00545SAN _ cfr. documento de fls. 10 do processo administrativo instrutor, que se dá por reproduzido;

C) Em 14 de Outubro de 2012, mediante despacho exarado pelo Comandante do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP, o acidente descrito em A) foi qualificado como “acidente de trabalho” _ cfr. documento de fls. 22 do processo administrativo instrutor, que se dá por reproduzido;

D) Em 13 de Fevereiro de 2013, o Autor tomou conhecimento do despacho referido em C) _ cfr. documento de fls. 31 do processo administrativo instrutor, que se dá por reproduzido;

E) Em 8 de Outubro de 2014, o Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP remeteu ao Chefe do Núcleo de Saúde do mesmo Comando uma comunicação de serviço com o seguinte teor: «Assunto: Submissão a Junta Médica do Comando - Acidente de trabalho - Referência: No âmbito do Processo de Sanidade em epígrafe, que correr trâmites neste NDD, relativo ao Agente (…) B..., do efectivo da Divisão da Amadora, deste COMETLIS, foram solicitados os exames médicos com vista à conclusão do Processo, no entanto, em 07/10/2014, o Sinistrado fez chegar cópias de informações da Médica Fisiatra, que referem que o mesmo apresenta dor no joelho esquerdo, na sequência do esforço agravado pela lesão do joelho direito, pelo que, torna-se necessário a que o Sinistrado seja presente a uma Junta Médica do Comando, com vista a pronunciar-se sobre se existe ou não nexo de causalidade entre as duas situações e com vista a emitir uma decisão para que se possa dar continuidade ao Processo. Junto se envia cópia de duas Informações da Médica Fisiatra, para os fins tidos por convenientes» _ cfr. documento de fls. 58 do processo administrativo instrutor;

F) Em 7 de Novembro de 2014, o Presidente da Junta de Saúde remeteu ao Chefe do Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP uma comunicação de serviço com o seguinte teor: «ASSUNTO: Pedido de Submissão à Junta Médica - NEXO CAUSAL Informo V. Exa., que o Agente (…) B... (…) foi presente à Junta de Saúde reunida em 24 de Outubro de 2014, tendo-lhe sido atribuída a seguinte verba: Existe NEXO CAUSAL entre as duas situações, relacionadas com a lesão sofrida no Acidente de Trabalho ocorrido em 03 de Outubro de 2012. Nota: Esta informação não dispensa o EXAME DE SANIDADE» _ cfr. documento de fls. 60 do processo administrativo instrutor;

G) Em 2 de Outubro de 2015, o Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP remeteu ao Chefe do Núcleo de Saúde do mesmo Comando uma comunicação de serviço com o seguinte teor: «No âmbito do Processo de Sanidade em epígrafe, que corre trâmites neste NDD, relativo ao Agente (…) B..., (…) através das CS n.ºs 13976/SAL17/2012 e 13976/SAL17/2014, foram solicitados os exames médicos, no entanto, o Sinistrado declarou que necessita de ser submetido a uma intervenção cirúrgica ao joelho esquerdo e utilização nos dois joelhos de Plasma Antólogo rico em factores de crescimento, atendendo à alteração de procedimentos, entretanto ocorrida, torna-se necessário que o Sinistrado seja presente a uma Junta Médica do Comando, a fim de analisar se existe nexo de casualidade entre a lesão apresentada e o acidente ocorrido em 03/10/2012, pelas 17H00, assim como a necessidade da realização da cirúrgica ao joelho esquerdo e utilização nos dois joelhos de Plasma Antólogo rico em factores de crescimento. Junto se anexa Relatório Médico / Informação Clinica do médico Ortopedista Dr. Z...» _ cfr. documento de fls. 152 do processo administrativo instrutor;

H) Em 16 de Dezembro de 2015, o Presidente da Junta de Saúde remeteu ao Chefe do Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP uma comunicação de serviço com o seguinte teor: «ASSUNTO: Pedido de Submissão à Junta Médica - Informo V. Exa., que o Agente (…) B..., do efectivo da Divisão da Amadora, foi presente à Junta de Saúde reunida em 04 de Dezembro de 2015, tendo-lhe sido atribuída a seguinte verba: Existe NEXO CAUSAL entre a lesão apresentada e o acidente de Trabalho ocorrido em 03 de Outubro de 2012. Concluiu-se, ainda, após a consulta do processo de submissão à Junta Médica, cedido pelo Núcleo de Deontologia e Disciplina, bem como das Informações Clínicas apresentadas, haver a necessidade de efectuar os tratamentos enunciados (Plasma Antológico rico em factores de crescimento), bem como ser necessária correcção Médico-cirúrgica ao joelho esquerdo, conforme se encontra fundamentado pelos Médico Especialista - Ortopedia - Dr. Z... em 02/10/2015 e Fisiatra - Dra. I... na informação clínica de 05 de Novembro de 2015. Nota: Esta informação não dispensa o EXAME DE SANIDADE» _ cfr. documento de fls. 155 do processo administrativo instrutor, que se dá por reproduzido;

I) Em 14 de Março de 2016, o Autor apresentou o seguinte pedido junto do Director Nacional da PSP: «Assunto: PEDIDO DE EMISSÃO DE TERMO DE RESPONSABILIDADE - Eu, B..., Agente Principal (…), segundo Relatório Médico do meu Ortopedista, Dr. Z..., necessito de ser submetido a intervenção cirúrgica, ao joelho esquerdo, bem como, Infiltrações com Plasma Rico em Factores de Crescimento, em ambos os joelhos (…), devido ao acidente sofrido em 03OUT2012, que deu origem ao Processo de Sanidade NUP 2012ISB00545SAN, que se encontra em instrução no NDD. Dado não ter possibilidades financeiras, para suportar as despesas inerentes aos supramencionados atos clínicos, solicito a V. Exa., que se digne autorizar os mesmos, pelo que, e para melhor apreciação, anexo Relatório Médico e Orçamento. (…)» _ cfr. documento de fls. 157 do processo administrativo instrutor;

J) Em 17 de Março de 2016, o Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP remeteu o original do processo de sanidade referido no parágrafo B) acima à Direcção Nacional da PSP, acompanhado de um ofício com o seguinte teor: «Relativamente ao assunto em epígrafe, encarrega-me (…) o Comandante do COMETLIS, de junto enviar a V. Ex.°, a título devolutivo, o Original do Processo de Sanidade, acima mencionado, que se encontra em instrução, neste NDD, respeitante ao Agente (…), B..., (…), onde consta o requerimento (…), apresentado pelo Sinistrado, no qual solicita a emissão da Declaração de Responsabilidade, para assunção das despesas inerentes à intervenção cirúrgica, que necessita de efectuar ao joelho esquerdo (…)» _ cfr. documento de fls. 205 do processo administrativo instrutor;

K) Em 16 de Dezembro de 2016, o Autor foi, por determinação do Director Nacional da PSP, sujeito à Junta Superior de Saúde, cuja decisão foi: «Curado com IPP de 3% - Cap. I 12.1.3 a) 0,01 – 0,03. Atribuição de serviços compatíveis c/ a situação clínica. As lesões/dano do joelho esquerdo não têm nexo de causalidade c/ o evento traumático sofrido a 03.10.12» _ cfr. documento de fls. 208 do processo administrativo;

L) Mediante requerimento de 30 de Dezembro de 2016, o Autor requereu a sua submissão a Junta médica de recurso – cfr. documento de fls. 16 do processo físico;

M) Por despacho de 23 de Janeiro de 2017, o Director Nacional da PSP autorizou a realização de junta médica de recurso do Autor – cfr. documento de fls. 16 dos autos;

N) Em 24 de Fevereiro de 2017, o Autor foi submetido a Junta Médica de Recurso que deliberou o seguinte: «Curado com incapacidade permanente parcial (IPP) 6%, a sancionar por Junta Médica da CGA. Observações 1: Processo para ser averiguado pelo nexo causalidade do joelho esquerdo. Quanto ao joelho direito, aceita-se cap. I 12.1.4 a) 0,03 a 0,06. IPP 0,04 x 1,5 = 6%. Deve ser atribuído serviço compatível com esta desvalorização. Observações 2: Esta situação enquadra-se no Decreto-Lei n.º 503/99 de 20 de Novembro» – cfr. documento de fls. 207 do processo administrativo e de fls. 17 verso dos autos;

O) Em 6 de Março de 2017, a Direcção Nacional da PSP remeteu novamente o processo de sanidade - referido em B) - ao Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando Metropolitano de Lisboa da PSP, acompanhado por um ofício com o seguinte teor: «Encarrega-me Sua Exa. o Director Nacional de junto enviar a V. Exa., depois de homologada, por despacho de 03FEV2017, 1 processo e respectiva ata de JSS, respeitante ao Agente (…) B..., cuja decisão consta da respectiva acta» _ cfr. documento de fls. 206 do processo administrativo;

P) Em data que não foi possível apurar, mas necessariamente anterior a 16 de Março de 2017, o Autor apresentou um requerimento dirigido ao Instrutor do processo de sanidade identificado no parágrafo B) acima, com o seguinte teor: «B..., sinistrado nos autos à margem identificados, tendo sido submetido a Junta Médica de Recurso no passado dia 24 de fevereiro de 2017, vem expor e requerer o seguinte:

“1.°

No passado dia 24 de fevereiro de 2017, a Junta Superior de Saúde deliberou, na sequência do acidente ocorrido em 3 de outubro de 2012, considerar o requerente curado, atribuindo-lhe uma IPP de 6% (documento n.° 1).

2.°

A referida Junta deliberou ainda que fosse aberto processo para se averiguar a existência de nexo de causalidade em relação à lesão que o requerente apresenta no joelho esquerdo.

3.º

O presente requerimento tem por objetivo junta documentação que serve para provar que tal nexo de causalidade existe e que esta existência já foi reconhecida pela Junta de Saúde do COMETLIS, em 24 de outubro de 2014 e confirmada pela mesma Junta em 4 de dezembro de 2015 (documentos n.°s 2 e 3).

4.°

De facto, os relatórios médicos elaborados pela Dra. M..., na qualidade de médica do SAD da PSP, pelo Dr. J..., pela Dra. I..., pela Dra. C... e pelo Dr. B... (documentos n.°s 4 a 8), todos eles constatam a existência de nexo de causalidade entre o sinistro ocorrido e a lesão verificada no joelho esquerdo.

5.º

Lesão essa cuja gravidade tem vindo a aumentar, o que levou o requerente a inscrever-se em lista de espera cirúrgica no polo de Lisboa do Hospital das Forças Armadas (documento n.° 9).

6.°

Assim, com vista à rápida conclusão da averiguação pedida pela Junta Médica de Recurso, solicita-se a V. Exa. que promova as diligências adequadas para que seja reconfirmada a existência do nexo de causalidade em relação ao joelho esquerdo, com as necessárias consequentes. ED, O Requerente.» – cfr. documento de fls. 245 e 246 do processo administrativo;

Q) Por ofício de 16 de Junho de 2017, o Núcleo de Deontologia e Disciplina do Comando Metropolitano da PSP remeteu ao Gabinete de Deontologia e Disciplina da Direcção Nacional da PSP o original do processo de sanidade referido em B), acompanhado por um ofício com o seguinte teor: «Relativamente ao assunto, encarrega-me o Exmo. Sr. Comandante Metropolitano de junto enviar a V. Exa. o original do citado processo constituído por 270 fls., depois de rectificado o BAM - fls. 216 aguardavam neste Núcleo. Aproveito para alertar de que subsiste a dúvida em saber se o alegado nexo de causalidade das lesões referidas pelo sinistrado ao joelho esquerdo já está resolvida (…).» _ cfr. documento de fls. 338 do processo administrativo instrutor;

R) Em 11 de Setembro de 2017, o Director do Gabinete de Assuntos Jurídicos da Direcção Nacional da PSP proferiu despacho com o seguinte teor: «1. Pelo médico assistente/Junta Médica foi dada alta clinica em 16-12-2016 e proposta no Boletim de Acompanhamento Médico (…) a atribuição de 6% de Incapacidade Permanente Parcial (IPP) ao Agente Principal M/135483, B... sem limitações funcionais. 2. Assim, ao abrigo do Despacho de Delegação de Competências n.º 8437/2014, proferido por (…) Director Nacional em 19-06-2014 (…), nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 164.º do Código do Procedimento Administrativo, RATIFICO o despacho do Exm.º. Comandante do Comando Metropolitano de Polícia de Lisboa (…) que qualificou como acidente de trabalho o acidente ocorrido no dia 03-10-2012. 3. Envie-se o processo à Caixa Geral de Aposentações, a fim de o sinistrado ser submetido à Junta Médica para efeitos de confirmação e graduação da proposta de Incapacidade Permanente Parcial (IPP) (…).» _ cfr. documento de fls. 339 do processo administrativo instrutor;

S) Na sequência do envio referido do processo referido em R) supra, a CGA, por deliberação de 22 de Maio de 2018, confirmou e graduou a incapacidade em 4,5% _ cfr. fls. 348 do processo administrativo.

T) Em 20 de Março de 2019, o Autor intentou a presente acção _ cfr. «comprovativo de entrega a fls. 2 dos autos;



II.2. De direito

O presente recurso vem interposto da sentença do TAF de Sintra, na parte em que julgou improcedente, por ilegitimidade passiva da Entidade Demandada, o pedido de condenação no pagamento das despesas realizadas com consultas, tratamentos e medicamentos, no valor de EUR 192,90, e improcedente o pedido de condenação no pagamento dos suplementos de turno e de patrulha desde 16 de Dezembro de 2016, a liquidar posteriormente.

II.2.1. Do pagamento das despesas

Começa o Recorrente alegar neste ponto que a sentença errou ao concluir que a responsabilidade por tal pagamento (despesas com transportes, medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico) era da CGA e não do aqui Recorrido.

Sustenta que o valor das despesas que o Recorrente peticiona e assaca, em termos de responsabilidade pelo respectivo pagamento, à Recorrida (sua entidade empregadora), dizem respeito à reparação conexionada com a lesão sofrida no joelho esquerdo e cujo nexo de causalidade com o acidente em serviço ocorrido em 3 de Outubro de 2012 foi agora reconhecido pela douta sentença recorrida. Pelo que o ressarcimento daquelas despesas é da responsabilidade da Recorrida e não da CGA.

A questão aqui em discussão, como se disse já, consiste em saber se a decisão recorrida errou ao ter entendido que a Caixa Geral de Aposentações era a entidade competente para efectuar o pagamento das despesas que se mostrem decorrentes do acidente de serviço.

Ora, sobre esta matéria existe vasta jurisprudência, concretamente deste TCAS. A determinação da entidade responsável pelo pagamento das despesas originadas pelo acidente em serviço, como as realizadas com transportes para efectuar tratamentos, medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico, depende da atribuição de incapacidade permanente: cfr., i.a., o ac. deste TCAS de 16.01.2018, proc. nº 2694/16.6BELSB.

No que concerne à reparação, os trabalhadores têm direito, independentemente do respectivo tempo de serviço, à reparação, em espécie e em dinheiro, dos danos resultantes de acidentes em serviço e de doenças profissionais.

Conferindo ainda direito à reparação a lesão ou doença que se manifeste durante o tratamento de lesão ou doença resultante de um acidente em serviço ou doença profissional e que seja consequência de tal tratamento, de acordo com o artigo 4º do Decreto-Lei n.º 503/99, de Novembro, que aprova o regime jurídico de acidentes de trabalho e das doenças profissionais ocorridos ao serviço de entidades empregadoras públicas.

Sendo que, o artigo 5º do diploma em apreço tem a seguinte redacção:


Artigo 5.º

Responsabilidade pela reparação


1 - O empregador ou entidade empregadora é responsável pela aplicação do regime dos acidentes em serviço e doenças profissionais previsto neste diploma.

2 - O serviço ou organismo da Administração Pública ao serviço do qual ocorreu o acidente ou foi contraída a doença profissional é responsável pelos encargos com a reparação dos danos deles emergentes, nos termos previstos no presente diploma.

3 - Nos casos em que se verifique incapacidade permanente ou morte, compete à Caixa Geral de Aposentações a avaliação e a reparação, nos termos previstos neste diploma.

Por seu turno, densificando o n.º 3 do preceito acabado descrever, dispõe o artigo 34.º, sob a epígrafe Incapacidade permanente ou morte, inserido no Capítulo IV “Responsabilidade da Caixa Geral de Aposentações”, que:

1 - Se do acidente em serviço ou da doença profissional resultar incapacidade permanente ou morte, haverá direito às pensões e outras prestações previstas no regime geral.

(…)

4 - As pensões e outras prestações previstas no n.º 1 são atribuídas e pagas pela Caixa Geral de Aposentações, regulando-se pelo regime nele referido quanto às condições de atribuição, aos beneficiários, ao montante e à fruição.

Dos normativos acabados de transcrever logo resulta que, pese embora a responsabilidade pela efectivação do direito à reparação pertença, em regra, ao serviço ou organismo da Administração Pública no âmbito do qual ocorrera o acidente em serviço ou contraída a doença profissional, o certo é que sempre que já tenha sido atribuída uma “incapacidade permanente” ao funcionário, essa competência dispositiva e responsabilidade pertencerá à Caixa Geral de Aposentações.

Pois bem, conforme dispõem as alíneas l) e m) do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, a “incapacidade permanente” pode assumir duas modalidades: parcial, quando se traduza numa desvalorização permanente do trabalhador que implica uma redução definitiva na respetiva capacidade geral de ganho e absoluta, quando se verifique a impossibilidade permanente do trabalhador para o exercício das suas funções habituais ou de todo e qualquer trabalho.

Fixada que se encontre qualquer uma destas duas modalidades de incapacidade permanente, cuja confirmação e graduação incumbe à Caixa Geral de Aposentações (artigo 38.º, n.º 1, do citado Decreto-Lei), restará deslindar o âmbito do direito de reparação a cargo desta última entidade administrativa, nos termos do regime geral conforme decorre dos já citados artigos 5.º, n.º 3 e 34.º, n.º 1.

Ora, a este título, a Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, incluindo a reabilitação e reintegração profissionais, nos termos do artigo 284.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, dispõe, no seu artigo 23.º, o seguinte:


Princípio geral

O direito à reparação compreende as seguintes prestações:


a) Em espécie - prestações de natureza médica, cirúrgica, farmacêutica, hospitalar e quaisquer outras, seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado e à sua recuperação para a vida ativa;

b) Em dinheiro - indemnizações, pensões, prestações e subsídios previstos na presente lei.

Em concretização do conceito de prestações em espécie, consagra o seu artigo 25.º, n.º 1, sob a epígrafe “Modalidades das prestações”, que:

(…)

As prestações em espécie previstas na alínea a) do artigo 23.º compreendem:

a) A assistência médica e cirúrgica, geral ou especializada, incluindo todos os elementos de diagnóstico e de tratamento que forem necessários, bem como as visitas domiciliárias;

b) A assistência medicamentosa e farmacêutica;

c) Os cuidados de enfermagem;

d) A hospitalização e os tratamentos termais;

(…)

g) O fornecimento de ajudas técnicas e outros dispositivos técnicos de compensação das limitações funcionais, bem como a sua renovação e reparação; (…) .

Para o efeito, no que diz respeito ao regime jurídico dos acidentes em serviço (Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro), dispõe o artigo 4.º, que o direito à reparação em espécie compreende, nomeadamente:

a) Prestações de natureza médica, cirúrgica, de enfermagem, hospitalar, medicamentosa e quaisquer outras, incluindo tratamentos termais, fisioterapia e o fornecimento de próteses e ortóteses, seja qual for a sua forma, desde que necessárias e adequadas ao diagnóstico ou ao restabelecimento do estado de saúde físico ou mental e da capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado e à sua recuperação para a vida activa;

b) O transporte e estada, designadamente para observação, tratamento, comparência a juntas médicas ou a actos judiciais;

c) A readaptação, reclassificação e reconversão profissional.

E, o direito à reparação em dinheiro compreende:

a) Remuneração, no período das faltas ao serviço motivadas por acidente em serviço ou doença profissional;

b) Indemnização em capital ou pensão vitalícia correspondente à redução na capacidade de trabalho ou de ganho, no caso de incapacidade permanente;

c) Subsídio por assistência de terceira pessoa;

d) Subsídio para readaptação de habitação;

e) Subsídio por situações de elevada incapacidade permanente;

f) Despesas de funeral e subsídio por morte;

g) Pensão aos familiares, no caso de morte.

Deste modo, considerando o teor dos preceitos acabados de transcrever, logo se conclui que o regime geral e o regime previsto para os acidentes em serviço se encontram em estreita consonância no que diz respeito ao conceito de prestações em espécie que, como se viu, se encontram naturalmente englobadas no direito à reparação.

E, se assim é, ou seja, se em caso em que tenha sido atribuída uma incapacidade permanente (parcial ou absoluta), compete à Caixa Geral de Aposentações a reparação nos termos gerais, a qual, como se viu, passa, pelo direito a prestações, quer em dinheiro, quer em espécie (conceito este que abrange, quer no âmbito do regime geral, quer no âmbito do regime dos acidentes de serviço, prestações de natureza médica e cirúrgica).

Aliás é esta a jurisprudência unanime nos Tribunais Superiores ( vide entre outros e para além do ac. deste TCAS já citado, os ac.s do TCAN de 13.09.2019, proferido no processo nº 564/15.4BECBR, de 6.03.2015, proferido no processo n.º 431/13.6BECBR, de 24.03.2017, proferido no processo n.º 2714/14.9BEBRG, os ac.s deste TCAS de 2.02.2012, proc. nº 836211, e de 16 de Janeiro de 2018, processo n.º 2694/16.6BELSB).

Assim resultando da factualidade apurada que foi fixada ao Autor uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 4,5%, consequente de acidente em serviço é a Caixa Geral de Aposentações que será a entidade competente para efectuar o pagamento das despesas que se mostrem decorrentes do acidente de serviço.

O assim decidido é de manter, uma vez que é coincidente com a linha decisória assumida pelo TCAS. Com o que improcede o recurso nesta parte.

II.2.2. Do pedido de condenação no pagamento dos suplementos de turno e de patrulha desde 16.12.2016, a liquidar

Neste capítulo alega o Recorrente que nos termos do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 503/99, “os acidentados em serviço mantêm o direito, no período de faltas ao serviço, à remuneração, incluindo os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidam descontos para o respectivo regime de segurança social, e ao subsídio de refeição”, errando o tribunal a quo ao aplicar o referido regime à situação dos autos.

Na p.i. o Recorrente reclamou o pagamento dos «suplementos de turno e de patrulha desde 16 de dezembro de 2016 até à data em que retome as suas funções, cujo montante será apurado em sede de liquidação de sentença». Ora, em relação à lesão do joelho esquerdo, reconhecida que está agora (pela sentença) o nexo causal entre esta e o acidente em serviço, o Recorrente terá que ser futuramente submetido a nova Junta Médica da CGA, não só para determinação da IPP, como para fixação da data da “alta clínica”. E dado que por força desta lesão (joelho esquerdo) e para tratamento da mesma (incluindo intervenção cirúrgica a que foi submetido), esteve ausente do trabalho, ausência que, por força do reconhecimento do referido nexo causal, terá que ser submetida ao regime de faltas por acidente em serviço, tem o Recorrente direito a que, durante a referida ausência, lhe seja paga a retribuição que auferia à data do acidente (incluindo os referidos suplementos). Daí o pedido de condenação da Recorrida ao pagamento dos suplementos «desde 16 de dezembro de 2016 até à data em que retome as suas funções, cujo montante será apurado em sede de liquidação de sentença».

Ou seja, conclui o Recorrente que não se trata, quanto ao peticionado, de reclamar o pagamento de suplementos de turno e de patrulha que deixou naturalmente de auferir após o regresso ao serviço, ainda que em serviços melhorados, a partir de 16.12.2016, sem ter prestado serviço de turno ou de patrulha. Trata-se, antes, de reconhecer o seu direito a auferir o valor de tais suplementos que constituíam a respectiva remuneração à data do acidente, durante os períodos de ausência ao trabalho, para tratamento de uma lesão (a do joelho esquerdo), lesão que a presente sentença expressamente reconheceu ter nexo causal com o aludido acidente, submetendo tais ausências ao regime legal constante do artigo 15.º do Decreto-lei n.º 503/99, de 20 de Novembro.

Na sentença recorrida afirmou-se o seguinte:

Em qualquer caso, fora das situações de baixa clinica decorrente de acidente de serviço, em que é ficcionada a prestação efectiva de serviço por parte do acidentado (a qual nos presentes autos cessou em 16 de Dezembro de 2016: cfr. alíneas K) a R) do probatório), inexiste um direito ao abono de um determinado suplemento remuneratório cujo processamento seja independente da categoria, cargo ou função detida, dado o mesmo exigir ou ser decorrência duma efectiva prestação de serviço, conforme infra se determinará (neste sentido, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 3 de Dezembro de 2015, in processo n.º 01027/15 e do Tribunal Central Administrativo Norte, de 19 de Junho de 2015, in processo n.º 00029/15.4BEMDL, disponíveis em www.dgsi.pt).

Vejamos.

Foi reconhecido judicialmente ao Autor o direito alegado, isto é, o reconhecimento da existência de nexo de causalidade entre a lesão sofrida pelo Autor no joelho esquerdo e o acidente em serviço ocorrido em 3.10.2012. Tendo o tribunal a quo considerado que a prestação de serviço efectivo, ficcionada nos termos do art. 19.º do Decreto-Lei n.º 503/99, havia cessado em 16.12.2016 (alíneas K) a R) do probatório).

Ora, temos para nós que a sentença recorrida não só não interpretou devidamente o pedido formulado pelo Autor e aqui Recorrente, como não atendeu aos efeitos decorrentes do que decidiu.

Com efeito, tendo o tribunal a quo reconhecido a existência de nexo de causalidade entre a lesão sofrida pelo Autor no joelho esquerdo e o acidente em serviço ocorrido em 3.10.2012 – o que transitou em julgado -, não poderia deixar de reconhecer o seu direito a auferir o valor de tais suplementos que constituíam a respectiva remuneração à data do acidente, durante os períodos de ausência ao trabalho, para tratamento da lesão desse joelho esquerdo. É que a cessação da baixa clínica a que se reporta a alínea K) do probatório (data de 16.12.2016), tem por referência precisamente o facto de “as lesões/dano do joelho esquerdo não têm nexo de causalidade c/ o evento traumático sofrido a 03.10.12”; o que agora foi reconhecido na sentença.

Significa isto que tem razão o Recorrente quando afirma que lhe deve ser reconhecido o direito a auferir o valor daqueles suplementos – suplementos de turno e de patrulha, desde 16.12.2016 – os quais constituíam a respectiva remuneração à data do acidente, durante os períodos de ausência ao trabalho, para tratamento do joelho esquerdo. Lesão que a sentença nos autos expressamente reconheceu ter nexo causal com o aludido acidente. Tais ausências devem ser, pois, submetidas ao regime legal constante do artigo 15.º do Decreto-lei n.º 503/99, de 20 de Novembro.

Procede, assim, o recurso nesta parte, devendo revogar-se a sentença recorrida em conformidade.

E, em consequência, julgar procedente a acção também quanto ao peticionado em iii) do petitório inicial.





III. Conclusões

i) A determinação da entidade responsável pelo pagamento das despesas originadas pelo acidente em serviço, como as realizadas com transportes para efectuar tratamentos, medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico, depende da atribuição de incapacidade permanente.

ii) O pagamento de tais despesas, desde que as mesmas reúnam as condições legalmente previstas, competirá à Caixa Geral de Aposentações.

iii) No período de faltas ao serviço, em resultado de acidente, o trabalhador mantém o direito à remuneração, incluindo os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidam descontos para o respectivo regime de segurança social, e ao subsídio de refeição (artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro), o que inclui os suplementos de turno e de patrulha.



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

- Conceder parcial provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida, na parte em que julgou improcedente o pedido de condenação no pagamento dos suplementos de turno e de patrulha desde 16 de Dezembro de 2016; e,

- Julgar procedente a acção também quanto ao pedido de condenação no pagamento dos suplementos de turno e de patrulha desde 16 de Dezembro de 2016, a apurar em incidente de liquidação de sentença, condenando a Entidade Demandada nesse pedido.

Custas pelo Recorrido e pelo Recorrente, que tem mandatário constituído e portanto não beneficia da isenção de custas prevista no n.º 2 do artigo 48.º do Decreto-lei 503/99, de 20 de Novembro, em razão do respectivo decaimento que se fixa em partes iguais, sem prejuízo da condenação em custas já transitada em julgado.

Notifique.

Lisboa, 21 de Janeiro de 2021



Pedro Marchão Marques

Alda Nunes

Lina Costa


O relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 3.º do DL n.º 20/2020, de 1.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento. Pedro Marchão Marques