Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:854/12.8BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:05/07/2020
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
2.ª AVALIAÇÃO
COEFICIENTE DE QUALIDADE E CONFORTO
Sumário:I.Nos prédios urbanos destinados a comércio, indústria e serviços, o elemento majorativo “sistema central de climatização”, pressupõe que o mesmo sistema se encontre instalado e em condições efectivas de proporcionar tal qualidade e conforto.
II. Se tal sistema, apesar de instalado no prédio, se encontrar desligado há vários anos, por diversas razões técnicas, tendo sido substituído nas suas funções, por vários aparelhos individuais de ar condicionado, não se lhe deve atribuir o correspondente efeito majorativo de elemento de qualidade e conforto.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I.RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA recorre para este Tribunal Central Administrativo da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a impugnação deduzida pela A........., S.A. [A.........S.A.] contra o acto de fixação do valor patrimonial tributário do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1802 A, da freguesia com o código 110644, de S. Jorge de Arroios, o qual considerou ilegalmente fixado.

A Fazenda Pública, terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

« A) Incide o presente recurso sobre a aliás douta sentença que julgou procedente a presente impugnação e, em consequência, determinou “… a anulação do acto de avaliação para efeitos de determinação do valor patrimonial tributário da fracção autónoma designada pela letra “A”, composta por rés-do-chão e 1º andar do prédio urbano, situado em Lisboa, na Rua……………., freguesia de São Jorge de Arroios, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº ….. e inscrito na matriz predial da Freguesia de São Jorge de Arroios com o artigo….., com todas as consequências legais.”

B) Para decidir como decidiu, considerou o Julgador do Tribunal a quo, verificar-se a existência, no ato de avaliação que vinha sindicado, de erro sobre os pressupostos de facto, mercê da ponderação nessa avaliação do coeficiente majorativo de 0,10, correspondente à existência, no prédio em crise nos autos, do elemento de qualidade e conforto “sistema central de climatização”.

C) A sentença sob recurso padece de erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação do estatuído nos art.ºs 43º do CIMI, 11º da LGT e 9º do Código Civil, por o ato de segunda avaliação, para efeitos de determinação do valor patrimonial tributário do prédio identificado supra, e em crise nos autos, não padecer, a nosso ver, de qualquer erro nos seus pressupostos de facto, máxime, do que lhe vem apontado pela sentença recorrida.

D) Da matéria de facto dada como provada, nos pontos 10 a 14 da sentença recorrida, não pode, a nosso ver, extrair-se a conclusão retirada pelo Tribunal a quo, de que o prédio urbano que foi objeto da avaliação impugnada “… não possui um equipamento que se possa considerar como configurando um sistema central de climatização”. E dessa forma, concluir-se pela existência, no ato de avaliação sindicado, de erro sobre os pressupostos de facto relativo à consideração da existência de sistema central de climatização para efeitos de aplicação da majoração do coeficiente de qualidade e conforto.

E) Com efeito, o sistema de avaliações do IMI consta dos art.ºs 38º a 70º, do respetivo Código e tem como objetivo determinar o valor de mercado dos imóveis urbanos, a partir de uma fórmula matemática enunciada no art.º 38º, do CIMI, com a seguinte expressão: Vt = Vc x A x Ca x CL x Cq x Cv

em que:

Vt = valor patrimonial tributário;

Vc = valor base dos prédios edificados;

A = área bruta de construção mais a área excedente à área de implantação;

Ca = coeficiente de afectação;

CL = coeficiente de localização;

Cq = coeficiente de qualidade e conforto;

Cv = coeficiente de vetustez.

F) A avaliação assenta nestes seis coeficientes, todos eles de carácter objetivo que se podem agregar em dois conjuntos: i) Os coeficientes macro, de enquadramento ou de contexto – trata-se dos coeficientes que não dependem especificamente de cada prédio individual que vai ser avaliado, mas do contexto económico e urbanístico em que se insere. São fatores de variação do valor que não são intrínsecos a cada prédio, mas exteriores, apesar de serem sempre dele indissociáveis. Estes coeficientes aplicam-se, por natureza, a vários prédios e não apenas a um. São eles o valor base dos prédios edificados (Vc) e o coeficiente de localização (CL). ii) Os coeficientes específicos ou individuais - são os que respeitam a características intrínsecas dos próprios imóveis concretamente avaliados. Estamos a falar da área (A), do coeficiente de afectação (Ca), do coeficiente de qualidade e conforto (Cq) e do coeficiente de vetustez (Cv).

G) Concretamente, o coeficiente de qualidade e conforto tem por função relevar o aumento ou diminuição do valor que o mercado incorpora nos prédios em função da presença ou ausência de determinados elementos ou características que estão associados ao próprio imóvel. Estamos perante elementos que melhoram ou reduzem a funcionalidade e comodidade do prédio, ou a qualidade de gozo que proporcionam ao seu utilizador.

H) Os indicadores de qualidade e conforto consagrados na lei podem ter carácter positivo, dado contribuírem para uma maior eficiência e comodidade da utilização do imóvel (factores majorativos) ou, pelo contrário, diminuírem o valor do prédio, por se tratar de situações que restringem as condições básicas da utilização do mesmo (factores minorativos).

I) Os vetores de qualidade e conforto, a levar em consideração na avaliação de um imóvel, como o dos presentes autos, destinado a comércio, indústria e serviços, constam da tabela II, que faz parte integrante do art.º 43º do CIMI.

J) Como vetor majorativo de qualidade e conforto vamos encontrar o sistema central de climatização – coeficiente 0,10 – conforme consta da tabela II supra exposta.

K) Na avaliação, para efeitos de determinação do VPT do prédio urbano em crise nos autos, foi considerado o elemento de qualidade e conforto “sistema central de climatização”.

L) A LGT prevê no seu art.º 11º, n.º 2, que, “Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, alvo se outro decorrer diretamente da lei.”

M) Consta do “Regulamento dos Sistemas Energéticos de Climatização em Edifícios, (Decreto-lei nº 79/2006, de 4 de Abril, que revogou o Decreto-lei nº 118/98 de 07 de maio), que se considera sistema central de climatização o conjunto de equipamentos combinados de forma coerente com vista a satisfazer um ou mais dos objetivos da climatização (ventilação, aquecimento, arrefecimento, humidificação, desumidificação e purificação de ar) situado ou concentrado numa instalação e num local distinto dos locais a climatizar, sendo o frio ou calor (e humidade), no todo ou em parte, transportado por um fluido térmico aos diferentes locais a climatizar.

N) O Manual de Avaliação de Prédios Urbanos, da Direção de Serviços de Avaliação, de Setembro de 2004, dos serviços da AT, na sua página 17, define o que se deve considerar como sistema central de climatização, que passamos a citar:

III. Sistema central de climatização: Para efeitos de aplicação do CIMI e de acordo com o Regulamento dos Sistemas Energéticos de Climatização em Edifícios (Decreto - Lei n.° 118/98 de 7 de Maio), considera-se sistema central de climatização, o conjunto de equipamentos combinados de forma coerente com vista a satisfazer um ou mais dos objectivos da climatização (ventilação, aquecimento, arrefecimento, humidificação, desumidificação e purificação de ar), situado ou concentrado numa instalação e num local distinto dos locais a climatizar, sendo o frio ou calor (e humidade) no todo ou em parte, transportado por um fluído térmico aos diferentes locais a climatizar.”

O) Face ao disposto supra, como sendo a noção de “Sistema Central de Climatização”, somos em crer, contrariamente ao entendimento preconizado na sentença recorrida, que o sistema de ventilação, assinalado pela Impugnante e pelas testemunhas ouvidas em sede de audiência de inquirição de testemunhas, como existindo no prédio que foi objeto de avaliação nos presentes autos – “O sistema que se encontrava instalado era muito antigo e não cumpria as funções de ar condicionado; antes se tratava de um simples sistema de renovação de ar (insuflação de ar);

O prédio referido em 1. possuía um sistema de ventilação de ar que procedia à renovação do ar situado na parte de armazém; O sistema de ventilação referido em 11. era composto por uma máquina que empreendia a acção de insuflação e extracção de ar, localizada no terraço do prédio referido em 1., que se conectava com o espaço de armazém através de condutas de ar do próprio prédio; – pode ser considerado um “sistema de climatização”.

P) Com efeito, um sistema de ventilação de ar que, conforme resulta dos factos 11 e 12 dados como provados na sentença recorrida, assegura a extração do ar e, simultaneamente, assegura a insuflação de ar novo, pode ser considerado um equipamento que satisfaz, a nosso ver, alguns daqueles que são os objetivos da climatização, quais sejam, a ventilação e a purificação do ar.

Q) Pelo que, possuindo, a nosso ver, o imóvel em apreço, um equipamento que pode ser considerado como sendo um sistema de climatização, só o facto de possuir tal sistema, já é por si só, um fator de beneficiação, que suporta a aplicação do coeficiente majorativo previsto na tabela II, do art.º 43º do CIMI.

R) Assim, é de considerar correta a majoração que foi feita no ato de avaliação que vinha impugnado, do coeficiente de qualidade e conforto, aplicada em virtude da consideração da existência no prédio avaliado de um sistema de climatização.

S) Na verdade, é a existência “tout court” de um sistema central de climatização, por se destinar a tornar o prédio urbano mais confortável, que justifica ou fundamenta a aplicação, de acordo com a lei, do coeficiente majorativo de “0,10”.

T) Desde logo, porque o elemento de qualidade e conforto, que se prende com o denominado “sistema central de climatização”, referido na tabela II, do art.º 43º do CIMI, a que é aplicável o coeficiente majorativo de 0,10, ou existe, e aplica-se, ou não existindo, não se aplica.

U) Assim, a atribuição de tal coeficiente não está dependente do funcionamento ou não de tal sistema de climatização, de o mesmo se encontrar, ou não, operacional, bastando para tanto, que o mesmo se encontre instalado, como acontece no caso dos autos.

V) Ora, na realidade e como admitiu a Impugnante, nos pontos 52 a 69 da P.I., de impugnação judicial, o prédio urbano em crise nos autos, possui um sistema de climatização, ainda que, nas sua palavras, “velho e sem cumprir a função a que se destina”:

“(…)

52. O sistema que se encontrava instalado era muito antigo e não cumpria as funções de ar condicionado; antes se tratava de um simples sistema de renovação de ar (insuflação de ar).

53. Os aparelhos obsoletos limitavam-se a renovar o ar, não aquecendo no Inverno, nem arrefecendo no Verão; não forneciam conteúdos térmico, em qualidade e quantidade suficientes, para possível apreensão e utilização individualizada.

(…)

69. É plausível que um “SISTEMA CENTRAL DE CLIMATIZAÇÃO”, velho e sem cumprir a função a que se destina, ou seja, sem existir de facto, possa valer cerca de 87.000,00€?”

W) Contudo e conforme aduzimos supra, só o facto de o prédio urbano, que foi objeto da avaliação sindicada, possuir tal sistema, só por si, já é um factor de beneficiação, que majora o próprio imóvel. Se tal equipamento não funciona por razões de instalação ou outras, tal facto não deve ser considerado para efeitos de tal majoração.

X) Na verdade, se o proprietário assim o quiser pode sempre encontrar soluções em empresas da especialidade a fim de encontrar a resolução para tal problema de funcionalidade do sistema. Ou seja, embora tal sistema de climatização não se encontre em funcionamento, o mesmo poderá ser reparado em ordem à sua entrada em funcionamento.

Y) Acolhendo-se tal entendimento, somos a concluir pela legal aplicação no ato de avaliação do prédio urbano em crise nos autos, daquela majoração de 0,10, relativa à existência de sistema central de climatização. Pelo que, a douta sentença recorrida, ao determinar a anulação do ato de avaliação que vinha impugnado, sustentada na argumentação de que a mesma padecia de erro nos pressupostos de facto, mercê da consideração, (errónea a seu ver), da existência de um sistema central de climatização, para efeitos de aplicação da majoração do coeficiente de qualidade e conforto, fez uma errónea interpretação e aplicação do disposto no art.º 43º do CIMI.

Z) Razão pela qual, deve ser anulada e substituída por outra, que considerando legal a aplicação, in casu, daquela majoração de 0,10, atenta a existência, no prédio objeto de avaliação, de um equipamento que pode ser considerado como sendo um sistema central de climatização, mantenha na ordem jurídico-tributária o ato de avaliação do prédio urbano identificado supra, que vinha impugnado, com as demais consequências legais.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser admitido e julgado procedente o presente recurso e revogada a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que julgue improcedente a impugnação judicial, com as legais consequências.

Todavia, Decidindo, Vossas Excelências farão, como sempre, a costumada Justiça!»


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A recorrida termina as suas contra-alegações com o seguinte o quadro conclusivo:

« A) A Autoridade Tributária e Aduaneira, aqui no papel de Recorrente, pretende que seja revogada a, aliás, douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa que, concluindo pela existência de erro nos pressupostos de facto relativo à consideração da existência de sistema central de climatização para efeitos de aplicação da majoração do coeficiente de qualidade e conforto, julgou totalmente procedente a impugnação judicial apresentada pela Recorrida, outrora Impugnante A………S.A.., mas sem razão.

B) O Tribunal recorrido apreciou e decidiu correctamente a questão que lhe foi apresentada pela aqui Recorrida, pois entendeu - e bem - que o prédio objecto de avaliação não possuía um equipamento que se pudesse considerar como configurando um sistema central de climatização.

C) Para a apreciação do presente recurso são relevantes os seguintes factos provados (factos provados n.º 10 a n.º 14):

o O prédio era composto por duas partes: uma de armazém e outra de escritórios.

o A parte de armazém possuía um sistema de ventilação de ar que procedia à renovação do mesmo (insuflava e extraía o ar, não tinha capacidade para aquecer nem arrefecer o ar).

o A parte de escritórios possuía 3 máquinas de ar-condicionado, também conhecidos por splits, máquinas individuais.

D) Possuindo o prédio sub iudice um equipamento de ventilação cuja função era o de renovar o ar do armazém, sem que o mesmo estivesse apto a aquecer ou a arrefecer o ar (que é o mesmo que dizer sem que estivesse apto a “climatizar”) e que fazia apenas circular o ar e possuindo ainda três máquinas individuais de ar-condicionado que somente serviam a zona de escritórios do prédio em causa nos presentes autos, bem andou o Tribunal quando decidiu que o mesmo não tinha um “sistema central de climatização”.

E) O vício de erro de julgamento que a Recorrente imputa à sentença recorrida não pode ser sufragado por este Tribunal, não tendo sido violados o artigo 43.º do CIMI, nem o 11.º da LGT ou o artigo 9.º do Código Civil.

F) Não é de aceitar que a noção de sistema central de climatização que deva ser seguida pelos tribunais nas suas decisões seja a que a Recorrente propugna na “Conclusão M)” das suas alegações [REGULAMENTO DOS SISTEMAS ENERGÉTICOS DE CLIMATIZAÇÃO EM EDIFÍCIOS”, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 79/2006, DE 04/ DE ABRIL] e, muito menos, a que resulta do “Manual de Avaliação de Prédios Urbanos da Direcção de Serviços de Avaliação” dos Serviços da Recorrente.

Isto porque:

G) O REGULAMENTO DOS SISTEMAS ENERGÉTICOS DE CLIMATIZAÇÃO EM EDIFÍCIOS entrou em vigor em 2006 e o prédio sub iudice tinha, à data da avaliação, 30 anos de idade, ou seja, é uma construção dos anos 1980 [fls. 73 do processo administrativo] - neste sentido, cfr. Acórdão do TCA Sul de 17/09/201, processo n.º 06262/13.

H) A noção de “sistema central de climatização” que a Recorrente refere na Conclusão M) não é a que resulta do mencionado Regulamento, pois aquela adultera o texto da lei, misturando duas das alíneas do ANEXO I do diploma, concretamente, a alínea vv) e a xx).

I) O Regulamento não apresenta uma noção directa de “sistema central de climatização”, antes contendo na alínea vv) a definição de “Sistema de Climatização” e na alínea xx) a noção de “Sistema Centralizado”, sendo que, para efeitos deste diploma, um sistema centralizado tem de ser um sistema que produza frio ou calor e que se situe num local distinto dos locais a climatizar, sendo que o frio ou o calor (e humidade) é transportado por um fluido térmico aos diferentes locais a climatizar - que não se verifica no caso em discussão nos autos.

J) A conjugação das acima referidas definições não tem aplicação no caso concreto, porquanto o sistema de ventilação referido no facto provado 11. não era susceptível, nem tinha potencialidade de aquecer e/ou arrefecer o ar que fazia circular e os aparelhos de ar condicionado, situados na parte de escritório, embora produzissem calor ou frio, tratavam-se de máquinas individuais, de splits individuais - facto provado 14. [se eram máquinas individuais, quando muito, subsumir-se-iam à noção de “unidade individual”, cfr. alínea aaa) do Anexo I.

K) Complementarmente sempre se diga que, à data da aprovação do Código do IMI, em Novembro de 2003, já o legislador se referia ao “sistema central de climatização” como elemento de qualidade e conforto, na tabela do artigo 43.º do Código, sendo que ainda não existia o Regulamento dos Sistemas Energéticos aprovado pelo Decreto-Lei 79/2006, pelo que não se tem forçosamente de aplicar o regime resultante deste diploma à avaliação dos prédios urbanos.

L) A ser necessário fazer uso do artigo 11.º da LGT, sempre se imporia aplicar o regime resultante do seu número 3: atender à substância económica dos factos tributários.

M) Do cotejo da matéria de facto dada como provada, resulta inequívoco que o sistema de ventilação só servia uma parte do prédio (a parte de armazém) e que este sistema de ventilação não aquecia nem arrefecia o ar; ou seja, nem era central, no sentido em que não se destinava a servir a totalidade do prédio urbano objecto de avaliação, como também não climatizava.

N) Não é de aceitar a referência que a Recorrente faz na sua conclusão S), pois nunca bastaria a “existência ‘tout court’ de um sistema central de climatização por se destinar a tornar o prédio urbano mais confortável, que justifica ou fundamenta a aplicação do coeficiente majorativo; sempre seria necessário que estivesse apto às suas finalidades (a este propósito, cfr. Acórdão do TCA Sul de 17/09/201, processo n.º 06262/13).

O) Não merece provimento o presente recurso, devendo ser mantida, na íntegra, a aliás douta sentença recorrida.

Termos em que o recurso interposto pela Autoridade Tributária deve ser JULGADO IMPROCEDENTE, mantendo-se o sentido da decisão do tribunal de primeira instância


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Os autos foram com vista ao MINISTÉRIO PÚBLICO, e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.


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Colhidos os vistos dos Desembargadores adjuntos, cumpre decidir.


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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, vistas as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que, no caso concreto, a questão a decidir é a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação do estatuído nos artigos 43.º do CIMI, 11.º da LGT e 9.º do Código Civil.


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III. FUNDAMENTAÇÃO

A.DOS FACTOS

Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:

«1. Em 01/03/2011 a Impugnante vendeu a fracção autónoma designada pela letra “A”, composta por rés-do-chão e 1º andar do prédio urbano, situado em Lisboa, na Rua………………, freguesia de São Jorge de Arroios, descrito na conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º ….. e inscrito na matriz predial da Freguesia de São Jorge de Arroios com o artigo….., por 870.000,00€ – cfr. docs. n.º 1 e 4 juntos com a petição inicial a fls. 25 a 33 dos presentes autos e fls. 74 do processo administrativo junto aos presentes autos.

2. Na sequência da transacção referida em 1., o prédio aí identificado foi objecto de procedimento de avaliação para efeitos de determinação de valor patrimonial tributário – cfr. fls. 75 a 77 do processo administrativo junto aos presentes autos.

3. No final da avaliação referida em 2. foi determinado ao prédio referido em 1. o valor patrimonial tributário de 950.780.00€ - cfr. fls. 75 do processo administrativo junto aos presentes autos.

4. Notificada da determinação do valor patrimonial tributário referido em 3., a Impugnante requereu a realização de segunda avaliação do prédio em causa – cfr. fls. 83 do processo administrativo junto aos presentes autos.

5. Foi realizada segunda avaliação do prédio referido em 1 – cfr. fls. 84 e 73 do processo administrativo junto aos presentes autos.

6. No termo de avaliação da segunda avaliação do prédio referido em 1. consta o seguinte: “Aos vinte e dois dias do mês de Novembro de dois mil e onze… compareceram os peritos regionais… e o(s) sujeito(s) passivo(s) ou seu(s) representante(s) e declaram que (tendo visto e examinado, por inspecção directa o prédio descrito na relação que lhes foi entregue: Sim, Não), o avaliaram, com inteira observância de todas as formalidades legais, conforme está descrito na ficha de avaliação n.º……., do prédio com o artigo de matriz……,, fracção A, da freguesia de S. Jorge de Arroios. Para constar se lavrou este termo, que vai por todos assinado, depois de lido por mim…Foi aprovado por maioria em manter o valora da primeira avaliação. O representante do requerente não concordou com a avaliação por não considerar que o sistema de renovação de ar pode ser considerado um sistema de climatização…” – cfr. fls. 84 do processo administrativo junto aos presentes autos.

7. Na sequência da segunda avaliação referida em 5. foi ao prédio referido em 1. determinado o valor patrimonial tributário de 950.780.00€ - cfr. fls. 73 do processo administrativo junto aos presentes autos.

8. Na determinação do valor patrimonial tributário do prédio referido em 1. foi aplicado um coeficiente de localização de “2,60 zonamento” e considerado o elemento de qualidade e conforto “9. Sistema central de climatização” – cfr. doc. 2 junto com a petição inicial a fls. 34 dos presentes autos e fls. 73 do processo administrativo junto aos presentes autos.

9. A decisão da segunda avaliação referida em 7. foi remetida à Impugnante, através de notificação datada de 06/12/2011 e recebida por esta em 12/12/2011 – cfr. doc. 2 junto com a petição inicial a fls. 34 dos presentes autos.

10. O prédio referido em 1. estava dividido numa parte de armazém, numa divisão situado no entre-piso e uma parte de escritórios.

11. O prédio referido em 1. possuía um sistema de ventilação de ar que procedia à renovação do ar situado na parte de armazém.

12. O sistema de ventilação referido em 11. era composto por uma máquina que empreendia a acção de insuflação e extracção de ar, localizada no terraço do prédio referido em 1., que se conectava com o espaço de armazém através de condutas de ar do próprio prédio.

13. O sistema de ventilação referido em 11. não era susceptível, nem tinha potencialidade de aquecer e/ou arrefecer o ar que fazia circular.

14. Prédio referido em 1. tinha 3 máquinas de ar-condicionado que serviam a parte de trás da sua área de escritórios.

15. A presente acção foi apresentada em 12/03/2012.

Factos não provados.

Com relevância para a pronúncia a emitir nos presentes autos, inexistem factos que importe dar como não provados.

Motivação da decisão sobre a matéria de facto.

A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes dos autos e no processo de administrativo apenso, referidos em cada uma das alíneas do elenco dos factos provados, os quais não foram impugnados, merecendo a credibilidade do tribunal, em conjugação com o princípio da livre apreciação da prova.

Quanto aos factos provados 10. a 14. os mesmos assim foram dados na decorrência da prova testemunhal produzida nos presentes autos.

Como já se deixou referido na parte da presente pronúncia dedicada ao Relatório, no presente processo foi realizada diligência de inquirição de testemunhas.

E para dar como provados os factos 10. A 14. Foram especialmente tidos em consideração e relevados os depoimentos prestados pelas testemunhas J........ e J......... Isto porque ambas as testemunhas demonstraram ter conhecimento directo tanto do prédio, como das máquinas de ar-condicionado e de ventilação e sua respectiva função, assim como da forma como as mesmas se enquadravam no plano estrutural do prédio de modo a que pudessem desempenhar as funções para que são aptas. Também não foi despicienda a circunstância de ambas as testemunhas serem engenheiros, categoria profissional especialmente apta em termos técnicos a conhecer o concreto modus operandi e capacidade funcional da maquinaria aqui em causa.

Para além do supra referido ambas as testemunhas apresentaram um discurso coerente, seguro e assertivo relativamente à factualidade incidente sobre as funções das máquinas de ar- condicionado e da de ventilação, não se retirando de tal discurso a verificação de uma postura de parcialidade nos factos relatados, o que sustenta o juízo de credibilidade que o presente Tribunal atribui ao depoimento prestado pelas testemunhas J........ e J........, daí que os factos 10. a 14. se dêem como provados com base nos seus depoimentos.

A remanescente testemunha, embora o Tribunal ficasse convencido que a mesma respondeu com verdade ao que lhe foi questionado, o conteúdo do depoimento não se mostrou apto a dar como provado ou não provado algum facto relevante para a pronúncia a emitir nos presentes autos.»


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B.DE DIREITO

O Tribunal Tributário de Lisboa entendeu face a factualidade dada como assente que a segunda avaliação para determinação do valor patrimonial tributário do prédio identificado no ponto 1. do probatório, padecia do erro quanto aos pressupostos de facto, dada a inexistência de sistema central de climatização que fundamentou a majoração do coeficiente de qualidade e conforto aplicado, e consequentemente anulou o acto avaliação objecto nos presentes autos.

A Fazenda Pública insurge-se contra o decidido, alegando em síntese que é de considerar correta a majoração que foi feita no acto de avaliação que vinha impugnado - coeficiente de qualidade e conforto - aplicada em virtude da consideração da existência no prédio avaliado de um sistema de climatização.

Como deu nota a sentença recorrida, resulta da matéria assente (10. a 14. dos factos provados) que « (…) o prédio avaliado – prédio identificado em 1. dos factos provados – não possui um equipamento que se possa considerar como configurando um sistema central de climatização. Possuindo, isso sim, um equipamento de ventilação cuja função era o de renovar o ar do armazém existente no prédio, sem que o mesmo estivesse apto a aquecer ou a arrefecer o ar (que é o mesmo que dizer “climatizar”) que fazia circular, e de três máquinas de ar-condicionado que somente servia a zona de escritórios do prédio em causa nos presentes autos.».

E, na aplicação do direito aos factos apurados, o Tribunal « a quo» concluiu nos seguintes termos: «Daí que se evidencie no prédio avaliado em causa nos presentes autos inexistisse sistema central de climatização, razão pela qual inexiste razão/fundamento para que a avaliação ora impugnada considerasse a existência de factor de majoração do coeficiente de qualidade e conforto sustentado na existência de um sistema central de climatização.

Na decorrência da inexistência de sistema central de climatização que fundamentou a majoração do coeficiente de qualidade e conforto que influenciou o procedimento de avaliação que determinou a avaliação do valor patrimonial tributário do prédio em causa nos presentes autos, a avaliação incorre em erro quanto aos pressupostos de facto, o que determinará a sua anulação.».

Nada há a apontar quanto ao decidido, tendo sido efetuada uma correta interpretação dos factos e da legislação aplicável ao caso, com aconchego jurisprudencial, mormente na jurisprudência deste Tribunal Central Administrativo - Acórdão de 13.02.2014, proferido no processo n.º 7223/13-.

Efectivamente, o elemento majorativo “sistema central de climatização”, pressupõe que o mesmo sistema se encontre instalado e em condições efectivas de proporcionar tal qualidade e conforto. Acresce que: « O facto de um imóvel dispondo de pré-instalação de sistema central de climatização ser mais valioso que um outro que não disponha de tal pré-instalação não é, aqui, argumento decisivo, pois que exactamente o mesmo se pode afirmar relativamente a um imóvel que disponha de sistema central de climatização relativamente a um outro que apenas disponha da pré-instalação do sistema. Aliás, o que torna a habitação mais confortável é a existência do sistema central de climatização apto a funcionar, e não a mera pré-instalação de tal sistema, pois que esta, por si mesma, não permitindo, antes da instalação, a climatização da habitação, em nada contribui para o aumento do conforto desta. Não há, pois, qualquer razão para entender que o legislador quando se refere a “sistema central de climatização” quer igualmente abranger a pré-instalação de tais sistemas. Se assim fosse, não teria, aliás, deixado de o dizer, pois que a interpretação mais idónea da expressão que utilizou restringe a majoração à existência actual, e não meramente potencial e futura, de sistemas centrais de climatização. Por outras palavras, o elemento majorativo “sistema central de climatização”, pressupõe que o mesmo sistema se encontre instalado e em condições efectivas de proporcionar tal qualidade e conforto (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 7/9/2011, rec.170/11; ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 21/11/2012, rec.557/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/9/2013, proc.6262/13).» ( Acordão deste Tribunal Central Administrativo de 13.02.2014, proferido no processo n.º 07223/13, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Termos em que, sem necessidade de outros considerandos, merece a sentença inteira confirmação.

IV.CONCLUSÕES

I.Nos prédios urbanos destinados a comércio, indústria e serviços, o elemento majorativo “sistema central de climatização”, pressupõe que o mesmo sistema se encontre instalado e em condições efectivas de proporcionar tal qualidade e conforto.

II. Se tal sistema, apesar de instalado no prédio, se encontrar desligado há vários anos, por diversas razões técnicas, tendo sido substituído nas suas funções, por vários aparelhos individuais de ar condicionado, não se lhe deve atribuir o correspondente efeito majorativo de elemento de qualidade e conforto.

V.DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.


Lisboa, 7 de Maio de 2020.

[Ana Pinhol]

[Isabel Fernandes]

[Jorge Cortês]