Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:10688/13
Secção:CA
Data do Acordão:04/07/2016
Relator:CRISTINA DOS SANTOS
Descritores:CONTRATO DE TRABALHO A TERMO CERTO – CADUCIDADE - COMPENSAÇÃO – ARTº 252 Nº 3 RCTFP (LEI 58/2009)
Sumário:1. O contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo “não está sujeito a renovação automática” e “não se converte, em caso algum, em contrato por tempo indeterminado, caducando no termo do prazo máximo previsto no presente Regime” – cfr. artºs 104º nº 2 e 92º nº 2 do RCTFP, Lei 58/2009 de 11.09.
2. A renovação do contrato a termo certo celebrado com entidade empregadora pública carece de declaração expressa nesse sentido.
3. Ocorrida a caducidade do contrato a termo certo por esgotamento do prazo máximo legal (artº 103º do RCTFP) e não por falta de comunicação da vontade de renovação da entidade empregadora pública, significa que o trabalhador não tem direito à compensação, por a situação de facto não se subsumir na hipótese legal do artº 252º nº 3 RCTFP.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:H. vem requerer a reforma do acórdão deste TCAS, de 26.11.2015 e a fls. 98/99 dos autos, ao abrigo do regime dos artºs. 615º, 616º e 666º do CPC, ex vi artº 140º CPTA, nos termos e pelas razões que, em síntese, se transcrevem:

1. O acórdão sob reforma considerou que da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria não cabia recurso jurisdicional mas antes reclamação para a conferência, ao abrigo do disposto no nº 2 do art.º 27° do CPTA
2. Sucede, porém, que a reclamação para a conferência só tem existência jurídica quando a decisão compete a um tribunal colectivo ou de formação alargada (v. aifs 27° e n° 3 do art° 40° do ETAF), o que pressupõe que a acção tenha um valor superior à alçada do Tribunal, isto é, seja superior a 5000€ (cfr. art.° 6, n° 3 do ETAF e o n" l do art." 44° da Lei n° 62/2013, de 26 de Agosto).
3. Consequentemente, as acções administrativas especiais de valor inferior a 5.000,00€ são julgadas por juiz singular (v., n° l do art° 40° do ETAF), pelo que das suas decisões não pode haver reclamação para a conferência mas apenas recurso jurisdicional.
4. Assim sendo, e uma vez que a presente acção tem um valor inferior a 5.000£ - mais concretamente o valor de l.949,886 -, é inquestionável que dela apenas cabia recurso jurisdicional e não reclamação para uma inexistente conferência, pelo que o aresto cuja reforma se peticiona incorreu em manifesto erro na determinação da norma aplicável.
Nestes termos,
Deve proceder-se à reforma do douto acórdão, mantendo-se a admissão do recurso jurisdicional já anteriormente decidida por este douto Tribunal, com as legais consequências.

***
Assiste inteira razão à Requerente, sendo que importa ao caso o regime processual da rectificação de erros materiais de sentença, prevista no artº 614º nº 1 CPC (ex 667º nº 1) cujos pressupostos são a existência de omissões, que a própria norma especifica, de erro de cálculo ou de escrita, ou “quaisquer inexactidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto”, sendo que a doutrina da especialidade esclarece que estes erros têm que ser “(..) revelados no próprio contexto da sentença ou em peças do processo para que ela remete (..)”, ou seja, nos próprios termos decorrentes do artº 249º C. Civil.(1)
Na circunstância, o lapso manifesto retira-se do contexto do acórdão de fls. 98/99 dos autos, na medida em que foi aplicado o regime do artº 27º nº 1 alínea i) e nº 2 CPTA na doutrina firmada pelos acórdãos do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo tirados nos rec. nºs. 420/12 de 05.06.2012 e 1360/13 de 05.12.2013 e, simultaneamente, afirma-se que no caso concreto o “(..) valor atribuído à causa pelo Autor, de 1 949,88 € (..)” o que significa que sendo a presente acção administrativa especial de valor inferior à alçada dos TAC’s (€ 5 000,00, vd. artº 31º da Lei 52/2008 de 28.08) o julgamento em 1ª Instância é da competência de juiz singular (vd. artº 40º nº 1 ETAF) e não a uma formação alargada de três juízes, pelo que não há lugar à aplicação da reclamação para a conferência prevista no já citado artº 27º nº 2 CPTA.

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De modo que, procedendo à rectificação, passa a conhecer-se do recurso interposto da sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em que é Recorrente H., nele concluindo como segue:

1. O aresto em recurso começa por enfermar de erro de julgamento ao julgar a petição inepta com o argumento da contradição entre a causa de pedir e os pedidos principais formulados, podendo-se dizer que semelhante conclusão só foi possível por o Tribunal a quo ter identificado erradamente a causa de pedir na presente acção.
2. Com efeito, a causa de pedir na presente acção é a cessação do contrato de trabalho celebrado entre a A. e a entidade demandada, sendo justamente esse facto que determinou o recurso à presente acção, pelo que é notório o erro em que incorreu o Tribunal a quo ao considerar que a causa de pedir era a ilicitude da cessação do contrato, uma vez que esta ilicitude é, justamente, um dos pedidos e não a causa de pedir.
3. Ora, sendo a causa de pedir a cessação do contrato, é notório que não há qualquer contradição entre a causa de pedir e os pedidos principais, pela simples razão de que é justamente por o contrato ter cessado que se pediu a anulação do acto que recusou o pagamento da compensação pela cessação de tal contrato, da mesma forma que é pelo facto de o contrato ter cessado que se pediu a declaração da ilicitude de tal cessação e a condenação do Réu a pagar as remunerações desde a data do despedimento.
4. Todos esses pedidos emergem da cessação do contrato, pelo é Inquestionável que não há qualquer contradição entre a causa de pedir e os pedidos formulados a título principal que integrasse a previsão da alínea b) do n° l do artº 193° do CPC. Acresce que.
5. O aresto em recurso também incorreu em flagrante erro de julgamento ao considerar que os três pedidos principais - e só nos referimos a estes pela simples razão de que os pedidos subsidiários só são atendíveis caso os principais não sejam julgados procedentes - eram incompatíveis, podendo-se dizer que, ao assim decidir, violou não só o disposto na alínea c) do n° 2 do art° 193° do CPC como o direito fundamental de acesso à justiça e à tutela judicial efectiva, consagrados nos art°s 20° e 268° da Constituição. Com efeito.
6. E para além de a questão da eventual incompatibilidade só se poder colocar entre o primeiro pedido principal (alínea a) do petitório) e os restantes dois pedidos principais (alíneas b) e c) do pedido), é inegável que peticionar a anulação de um acto (o que nega a compensação) não significa necessariamente que se reconheça ou pretenda ver reconhecido que se tem direito à compensação, antes significando apenas que se pretende arredar do ordenamento jurídico um acto que é desfavorável aos interesses da A
7. Aliás, e ao contrário do que sustenta o Tribunal a quo, dessa anulação não decorre necessariamente que a entidade demandada tenha de pagar qualquer compensação pela cessação do contrato, bastando pensar que, apesar de tal acto ser anulado, poderá não ter de o fazer se a cessação do contrato vier a ser declarada ilícita ou se, mais simplesmente, o fundamento da anulação for um vício de ordem formal, que legitima em sede de execução a renovação do acto expurgado de tal vício. Acresce que,
8. Pedir a anulação do acto que indefere o pedido de pagamento da compensação não significa que se tenha de aceitar essa mesma cessação como lícita, antes significando apenas que, como não se sabe previamente qual vai ser a decisão do Tribunal no tocante à licitude ou ilicitude da cessação, procura-se com o pedido de anulação evitar a formação de caso resolvido, de forma a que, caso o Tribunal concluísse que a cessação do contrato era licita, não perdesse a A. o direito à compensação por não ter eventualmente impugnado atempadamente o indeferimento do pedido de pagamento da compensação.
9. Consequentemente, não só não há qualquer incompatibilidade entre os pedidos principais, como seguramente, no mínimo, sempre se teria de considerar que tais pedidos estavam formulados numa relação de alternatividade.
10. Aliás, o que a A. pretendeu com os pedidos principais foi, no desconhecimento de quat seria a decisão do Tribunal, evitar que qualquer direito ou interesse legalmente protegido que lhe assista não ficasse precludido por ausência atempada de reacção judicial, razão pela qual pediu a anulação do acto que indeferira o pagamento da compensação pela cessação do contrato - pedido esse que teria de ser feito nos três meses imediatamente seguintes, sob pena de caducidade do direito de impugnação — e O declaração da ilicltude da cessação do contrato - que teria de ser formulado dentro do prazo de um ano após o termo da relação contratual.
11. Deste modo, não deixa de ser caricato que quando o A. pretende exercitar e salvaguardar na plenitude o seu direito à tutela judicial efectiva, procurando por cobro a qualquer possível caducidade de direitos que lhe assistem, o Tribunal procure justamente sacrificar esse mesmo direito à tutela judicial efectiva, diminuindo-lhe a sua amplitude com o argumento da incompatibilidade dos pedidos e se recuse sequer a apreciar o mérito da tutela peticionada.
Nestes Termos, Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e revogado o aresto em recurso, com as legais consequências.

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O Município Recorrido contra-alegou, concluindo como segue:

1. O aresto em recurso não enferma de qualquer erro ao julgar a petição inepta, outrossim, a R. vem na sua alegação fazendo prestidigitação, mais não fazendo do que enfatizar a sua conduta errática revelando-se orgulhosamente impenitente.
2. A conclusão 2ª do recurso da A. é um hino à mistificação. Jamais o Sr. Juiz recorrido teve o entendimento que a causa de pedir era a ilicitude da cessação do contrato; outrossim, foi entendido que a causa de pedir é a nulidade do contrato celebrado entre as partes, causa esta adequada aos pedidos b) e c); com tal errada premissa a conclusão não pode sair acertada.
3. As conclusões 3.a e 4.a da recorrente são absurdas; até parece não terem sido escritas com seriedade.
4. A Recorrente na conclusão 5.a não está, seguramente a ver o alcance do pedido fomulado em a) que tem um alcance absolutamente contraditório com o conjunto dos pedidos b) e c), não obstante serem todos feitos cumulativamente.
5. Pela conclusão 6.ª ficamos a saber que a A. queria a compensação, mas, afinal, não queria a compensação; aceitou a caducidade do contrato e por isso queria a compensação mas, afinal, o que queria era manter o vínculo laboral. E depois que a violação da Constituição da República Portuguesa é que é responsável por tal desvario.
6. Na conclusão 7.a a Recorrente entende que pode verificar-se face ao pedido a) a consolidação da caducidade do contrato mas, mesmo assim, entende que pode ser declarada a ilicitude da caducidade. Apre que é demais!
7. A recorrente na conclusão 8.a não quer atinar que faz pedidos cumulativos antagónicos entre si e próprios de causas de pedir absolutamente diferenciadas e também antagónicas; e comete a heresia suprema de fazer o pedido subsidiário que, por ser subsidiário só podia ser apreciado se o pedido a) improcedesse, sendo que procedendo ou improcedendo o pedido a) o pedido subsidiário não teria viabilidade. Ficámos também a saber que a A. fez o pedido a) para valer à condição; ou seja, se procedesse o pedido a) apreciava-se também os pedidos b) e c), apesar destes pressuporem o contrário do pedido a) e depois, declarava-se sem efeito a procedência do pedido a). Parece-nos ser, em síntese, esta a justificação para a formulação da P.I. e é destrambelhada.
8. Aqui na conclusão 9.a a recorrente apela ao dever de adivinhar do julgador; e mesmo assim se procedesse o 1.° pedido o que fazer do 2° e do 3.° e como encaixar neste puzzle o pedido subsidiário? E qual é a causa de pedir, afinal, do 1.° pedido?
9. A conclusão 10a e 11ª são paradigmáticas. A desresponsabilização total perante a ausência de convicção da A. E perante o desvario do conteúdo das anteriores conclusões, a A. tinha que saber que os) fins não justificam os meios. A A. vai ao ponto de alardear que utiliza a acção administrativa especial para evitaria preclusão do direito de obter a declaração da ilicitude da cessação do contrato que ocorre em l ano. E o disposto na ai. b) do n.° 2 do art.° 58.° do CPTA? E o porquê do pedido da compensação feito como subsidiário? A A. não pode clamar pelo direito à tutela judicial efectivo quando Ela age tão frívolamente. A nosso ver o despacho recorrido não merece censura. Pelo exposto. Deve o Recurso improceder.

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Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos. Juízes Desembargadores
Adjuntos, vem para decisão em conferência.


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Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade:

A A Autora celebrou um contrato de trabalho a termo resolutivo certo com a Ré no dia 16 de Outubro de 2006 (v. doc. n° 2).
B Sem que tenha havido quebra ou interrupção de funções, o contrato de trabalho sucessivamente renovado.
C Tendo a A. executado sempre as mesmas funções,
D Fazendo exactamente o mesmo que os demais trabalhadores contratados por tempo indeterminado em idêntica categoria,
E Destinando-se as funções executadas pela A. a fazer face a trabalhos que a Câmara Municipal tem de assegurar diariamente,
F E correspondendo a necessidades próprias e permanentes da Câmara Municipal.
G Em 21 de Agosto de 2012, a A. foi informada pelos serviços camarários que o contrato celebrado em 16 de Outubro de 2006 iria caducar no dia 15 de Outubro de 2012, cessando assim a relação jurídica de emprego público, (v. doc. n° 3)
H Na data de cessação do contrato, a remuneração base da A. era de €487.4 7. (v. doc. n° 4).
I Na data da cessação, não foi paga à A. qualquer compensação pela cessação do contrato.
J Em 22 de Outubro de 2012, a A. requereu ao Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras o pagamento da compensação devida (v. doc. n° 5).
K Tendo sido notificada em 11 de Dezembro de 2012 do Despacho do Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, de 26-11-2012, que indeferiu o pedido de compensação supra referido, (v. doc. n° 1).


DO DIREITO


a) ineptidão da petição inicial;

Em sede de sentença foi julgado nulo todo o processado ao abrigo do regime do artº 193º nºs. 1 e 2 b) e c) CPC (contradição entre os pedidos principais e respectivas causa de pedir e cumulação substancialmente incompatível, tanto de pedidos principais como de pedidos subsidiários) com a consequente absolvição da instância do Município demandado, ex vi artº 288º nº 1 b) CPC.
Os pedidos principais são:
(i) declaração de nulidade ou anulação do despacho do Presidente da Câmara de 26.11.2012 que indeferiu o pedido de compensação pela caducidade do contrato a termo;
(ii) declaração da ilicitude da cessação em 15.10.2012 da relação jurídica de emprego;
(iii) condenação do Município a pagar à ora Recorrente 1949,88 € desde o despedimento ilícito até ao presente e demais remunerações até ao trânsito em julgado da sentença.
A título subsidiário peticiona:
(i) condenação do Município a pagar uma indemnização em 30 dias de remuneração por cada ano de antiguidade, no montante de 2 924, 82 €, caso o Município invoque a nulidade do contrato, que lhe é imputável;
(ii) condenação do Município a pagar 1 950 € a título de compensação pela cessação do contrato a termo.

Nos termos do artº 193º nº 2 c) CPC a petição inicial é nula quando deduzidos vários pedidos cumulativos, estes sejam entre si substancialmente incompatíveis em face do direito material, compatibilidade que deixa de ser exigida quando a dedução é feita não em termos cumulativos mas em relação de subsidiariedade, isto é, quando o A. apenas pretende um dos efeitos jurídicos peticionados para o caso de o outro efeito jurídico não ser acolhido pelo Tribunal.
Em termos cumulativos é evidente a incompatibilidade entre o pedido de invalidade do indeferimento da compensação por caducidade do contrato de trabalho e, ao mesmo tempo, cumulado com a declaração de despedimento ilícito no âmbito do mesmo contrato de trabalho, o que implica contradição no objecto do processo.
Todavia, se entendermos que a ora Recorrente não deduziu pedidos cumulados mas que os apresentou numa relação de subsidiariedade, deixa de ser exigida a compatibilidade de substanciação dos ditos pedidos e a petição salva-se.
Aplicando o exposto ao caso concreto, o pedido deduzido de declaração jurisdicional da invalidade do despacho de 26.11.2012 que indeferiu a requerida compensação pecuniária por cessação do contrato de trabalho a termo da Recorrente, pressupõe que a invalidade se fundamenta na caducidade contratual com efeitos jurídicos indemnizatórios retirados do bloco normativo que a Recorrente invoca, ou seja, tem como causa de pedir, regime do contrato de trabalho a termo certo celebrado entre as partes.
E podemos entender que a conexão objectiva exigida pelo artº 4º nº 1 CPTA justificativa da cumulação com o segundo pedido formulado, de declaração de ilicitude do alegado despedimento de 15.10.2012, se insere na relação de prejudicialidade por ambos se inscreverem na mesma relação jurídica de trabalho e, assim, salva-se a petição inicial por subsunção na previsão do artº 4º nº 1 a), segunda parte, do CPTA.
Nesta construção, assiste razão à Recorrente, pelo que cabe conhecer em substanciação na medida da suficiência de probatório fixado pelo Tribunal a quo.

b) contrato de trabalho a termo certo/ contrato a termo resolutivo certo – Lei 23/2004, Lei 12-A/2008 e Lei 59/2008;

Conforme probatório e respectiva documentação de suporte junta ao processo, verifica-se que a Recorrente celebrou com o Município Recorrido um contrato de trabalho a termo certo com início em 16.10.2006 e duração anual passível de renovação, que cessou em 15.10.2012.
Celebrado em 16.10.2006 sendo a entidade empregadora um Município, o contrato em causa foi celebrado no domínio da lei em vigor à data, ou seja, pelos dispositivos da Lei 23/2004 de 22.06, designadamente, para o caso que importa, os artºs. 1º nº 5, 2º nº 1 e 9º (aplicabilidade do regime do contrato de trabalho a termo certo em sede de Código do Trabalho, v.g. artº 139º nºs. 1 e 2 CT, Lei 99/2003, 01.12) e o artº 10º nº 2 (caducidade no termo do prazo máximo de duração previsto no CT).
Todavia, com a entrada em vigor em 01.03.2008 da Lei 12-A/2008 de 27.02 (vd. artº 118º nº 1), por aplicação do disposto nos artºs 2º nº 1 e 3º nº 2 e 92º nº 2, o contrato de trabalho celebrado entre as partes transitou nessa data de 01.03.2008 por determinação expressa do artº 22º nº 1 da Lei 12-A/2008 para o regime do contrato de trabalho em funções públicas por tempo determinado, ou contrato a termo resolutivo certo, constante dos artºs. 91º a 107 da Lei 59/2008 de 11.09 (RCTFP).
Cabe interpretar o regime do artº 252º nº3 do RCTFP atendendo ao lugar paralelo em sede de regime de contrato individual de trabalho no artº 388º nº 2 do CT (Lei 99/2003, 01.12), hoje artº 344º nº 2 do CT/2009 (Lei 7/2009 de 12.02) em ordem a saber se lugar à compensação prevista no nº 3 do artº 252º do RCTFP, levando em conta os efeitos jurídicos decorrentes da não comunicação renovatória do contrato de trabalho a termo certo e da duração total do contrato ou caducidade automática por decurso do prazo máximo legal impeditivo da declaração renovatória da entidade pública empregadora.

c) denúncia contratual; não comunicação renovatória;

Começando por transcrever os normativos em causa, dizem os mesmos o seguinte:
1. artº 252º nº 3 do RCTFP – “A caducidade do contrato a termo certo que decorra da não comunicação, pela entidade empregadora pública, da vontade de o renovar confere ao trabalhador o direito a uma compensação correspondente a três ou dois dias de remuneração base por cada mês de duração do vínculo, consoante o contrato tenha durado por um período que, respectivamente, não exceda ou seja superior a seis meses.”
2. artº 388º nº 2 CT/2003 – “A caducidade do contrato a termo certo que decorra da declaração do empregador confere ao trabalhador o direito a uma compensação correspondente a três ou dois dias de retribuição base e diuturnidades por cada mês de duração do vínculo, consoante o contrato tenha durado por um período que, respectivamente, não exceda ou seja superior a seis meses.”
3. artº 344º nº 2 CT/2009 - “Em caso de caducidade de contrato a termo certo decorrente de declaração do empregador, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a três ou dois dias de remuneração base e diuturnidades por cada mês de duração do contrato, consoante esta não exceda ou seja superior a seis meses, respectivamente.”
Resulta da lei transcrita que, seja no sector público seja no sector privado, o direito do trabalhador à compensação pecuniária por caducidade do contrato de trabalho a termo certo, tem como facto originário a declaração expressa de sentido extintivo por parte da respectiva entidade empregadora, a chamada denúncia contratual no que tange ao sector privado, ou de não comunicação renovatória no domínio do sector público.

d) duração total do contrato; declaração expressa renovatória;

Em segundo lugar, para efeitos de interpretação e aplicação o artº 252º nº 3 do RCTFP (Lei 59/2008) releva a duração total do contrato em razão de a lei determinar no artº 104º nº 4 do RCTFP que se considera como um “único contrato aquele que seja objecto de renovação”, aliás, à semelhança do disposto no artº 149º nº 4 CT/2009, 140º nº 5 CT/2003.
Importa, pois, saber se ocorreu a caducidade automática por decurso do prazo máximo legal impeditivo da declaração renovatória da entidade pública empregadora, na exacta medida em que, como se dispõe nos artºs 104º nº 2 e 92º nº 2 do RCTFP, respectivamente, o contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo “não está sujeito a renovação automática” e “não se converte, em caso algum, em contrato por tempo indeterminado, caducando no termo do prazo máximo previsto no presente Regime”.
Significa este regime que a renovação do contrato a termo certo celebrado com entidade empregadora pública carece de declaração expressa nesse sentido.
Exactamente o inverso do prescrito no regime privado onde, salvo cláusula de prazo determinado não renovável, a renovação automática deste tipo contratual decorre da lei, cfr. artº 149º nºs. 1 e 2 CT/2009, 140º nºs. 1 e 2 CT/2003.

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Dito isto, importa subsumir a situação de facto de execução duradoura decorrente da celebração contratual em 16.10.2006, ao regime jurídico aplicável desde 01.03.2008, ou seja, o regime do contrato de trabalho em funções públicas por tempo determinado, ou contrato a termo resolutivo certo, constante dos artºs. 91º a 107 do RCTFP (Lei 59/2008 de 11.09).
Como já se deixou dito, a aplicação do regime da caducidade constante do artº 252º nº 3 do RCTFP carece de saber, primeiro, qual o regime jurídico da durabilidade do contrato a termo certo e, segundo, qual a durabilidade do contrato a termo certo presente nos autos.
Importa ao caso o disposto nos artºs. 103º e 104º nº 4 do RCTFP:
1. artº 103º do RCTFP - “O contrato a termo certo dura pelo período acordado, não podendo exceder três anos, incluindo renovações, nem ser renovado mais de duas vazes, sem prejuízo de disposto em lei especial.”;
2. artº 104º nº 4 do RCTFP – “Considera-se como único contrato aquele que seja objecto de renovação.”
No caso, de acordo com o probatório, o contrato celebrado em 16.10.2006 teve duas renovações de 1 ano cada, de 15.10.2007 a 15.10.2009, seguida de uma renovação de 3 anos de 2009 a 15.10.2012.
O que significa, atendendo ao prazo máximo legalmente permitido de 3 anos para os contratos a termo resolutivo certo (prazo inicial incluindo renovações), que o contrato presente nos autos celebrado em 16.10.2006, tinha à data de 15.10.2012 esgotado a duração máxima legalmente permitida no domínio da Lei 58/2009 (3 anos incluindo renovações), e esgotado, também, o número possível de renovações, a saber, duas, sendo que a terceira renovação o foi no âmbito do artº 103º do RCTFP, regime aplicável ao contrato em causa desde 01.03.2008 por determinação expressa do artº 22º nº 1 da Lei 12-A/2008 entrado em vigor naquela data (vd. artº 118º nº 1).

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O mesmo é dizer, por reporte ao disposto no artº 252º nº 3 do regime do RCTFP, que a caducidade ocorreu por esgotamento do prazo máximo legal e não por falta de comunicação da vontade de renovação da entidade empregadora, o Município recorrido, declaração que juridicamente lhe estava vedada em face de se ter esgotado a durabilidade máxima legalmente permitida para os contratos a termo certo (artº 103º do RCTFP).
O que significa que a Recorrente não tem direito à compensação, por a situação de facto não se subsumir na hipótese legal do artº 252º nº 3 RCTFP.

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Neste sentido interpretativo se pronunciou em acórdão de 17.04.2015 o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo tirado no recurso nº 1473/14 que uniformizou a orientação jurisprudencial nos seguintes termos:
“No domínio da redacção inicial do artº 252º nº 3 do RCTFP, aprovado pela Lei 59/2008, de 11.09, a caducidade do contrato de trabalho a termo certo cuja renovação fosse já legalmente impossível não conferia ao trabalhador o direito à compensação mencionada nessa norma.”






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Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em, procedendo à reforma do acórdão de 26.11.2015 por rectificação, julgar procedente o recurso e revogar a sentença proferida e, em substituição, julgar a acção improcedente mantendo válido e eficaz o despacho de 26.11.2012 do Presidente da Câmara do Município Recorrido que indeferiu o pedido de compensação pela caducidade do contrato a termo.
Custas a cargo da Recorrente.


Lisboa, 07.ABR.2016,


(Cristina dos Santos)

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(Paulo Gouveia)

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(Nuno Coutinho - com declaração de voto)

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Declaração de Voto: "Vencido, aderindo à fundamentação constante dos votos de vencido do Acórdão do STA de 17.04.2015, mencionado neste Acórdão"

(1) ( Lebre de Freitas, CPC – Anotado, Vol. 2º, 2ª ed. Coimbra Editora, pág. 700.)