Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:20/23.7 BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:01/11/2024
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ATO DO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
INTERPRETAÇÃO DO PEDIDO
Sumário:I - A propriedade ou impropriedade do meio processual afere-se pelo pedido final formulado na p.i., ou seja, pela pretensão que o A. pretende fazer valer com a ação.
II - Se as concretas causas de pedir invocadas não são adequadas à forma de processo escolhida pelo A., então estamos perante questões relacionadas com a viabilidade do pedido, e não da propriedade do meio processual, pelo que não haveria erro na forma do processo, mas improcedência da ação.

III - Os princípios anti-formalista, pro actione e pro favoritate instantia, impõem ao juiz que interprete os pedidos formulados pelo autor de modo a adequar o processo à forma processual mais apta para que possa proferir uma decisão de mérito.

IV - Independentemente de a prescrição ser fundamento de oposição (quando a mesma já se verificou no momento em que se contesta o chamamento à execução fiscal), a verdade é que a prescrição pode sempre ser suscitada junto do órgão da execução fiscal que, aliás, dela deve conhecer oficiosamente.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção de execução fiscal e de recursos contra-ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

M ……………………………………., invocando o disposto nos artigos 276º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), reclamou judicialmente contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças da Amadora -1, proferido em 06/12/22, que indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição das dívidas em cobrança no processo de execução fiscal nº ……………….312 e apensos (……………….054; ……………….498 e ……………………583), referentes a IVA, IRC, juros e encargos, dos anos de 2009 e 2010, no valor total de €2.769,61, contra si revertidas depois de originariamente instaurado contra a sociedade comercial L.........–………………, Unipessoal, Lda.

Por sentença datada de 12/10/23, o referido Tribunal julgou verificada a exceção de erro na forma do processo, invocada pela Fazenda Pública, considerando ainda a insusceptibilidade da convolação, atenta a intempestividade do meio processual adequado (oposição à execução fiscal), pelo que, em consequência, absolveu da instância da Fazenda Pública.

Inconformada a Reclamante interpôs o presente recurso jurisdicional, tendo na sua alegação formulado o seguinte quadro conclusivo:

«1. O presente recurso é legitimo e tempestivo porquanto: i) a sentença recorrida foi notificada a 13 de Outubro de 2023; ii) sentença esta que foi totalmente desfavorável à Recorrente, julgando-se procedente a exceção de erro na forma do processo e, em consequência, absolvendo-se a Fazenda Pública da instância quanto a todos os pedidos, que incidiu sobre a reclamação judicial, na qual se pedia em suma a declaração de nulidades e de prescrição de todas as dívidas objecto de todos os PEF, bem como a anulação daquelas e a extinção destes; iii) O presente recurso é legítimo porque visa impugnar a sentença do Tribunal de Primeira Instância que versa sobre reclamação judicial em processo de execução fiscal, na medida em que existem bem mais de 3 (três) acórdãos de tribunais superiores que perfilhem solução oposta relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência substancial de regulamentação jurídica, nos termos do art. 280.º n.º 3 do CPPT, tendo a vasta Jurisprudência citada vindo a admitir a apreciação e declaração de nulidades processuais e de prescrições de dívidas tributárias e conexas em sede de reclamação judicial; iv) o presente Recurso é de Apelação para o Tribunal Central Administrativo SUL (art. 627.º n.º 2 do CPC) porque incidente sobre matéria de facto e matéria de Direito (art. 31.º n.º 1 e 3 do ETAF e art. 280.º n.º 1 segunda parte e a contrario sensu); v) o presente recurso tem efeito suspensivo e sobe nos próprios autos (art. 645.º n.º 1 al. a) e c) e 647.º n.ºs 2 e 3 do CPC, e art. 278.º n.º 8 e 286.º n.º 2 do CPPT); vi) o presente Recurso visa impugnar matéria de facto e matéria de Direito, na medida em que a douta Sentença recorrida não dá como facto provado que a sociedade devedora originária foi citada pessoalmente dos PEF n.º ……………………312 e Apensos; bem como que dá como provado que a Recorrente foi citada em 31-3-2011, não considerando prescritas dívidas com mais de 13 anos e cujos PEF foram declarados em falhas em 27-11-2013, concluindo a douta Sentença recorrida que havia erro na forma do processo quanto a todos os pedidos e por isso absolveu totalmente da instância a Fazenda Nacional.

2. A douta Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto dada como provada com base nas provas documentais juntas aos autos: i) em primeiro lugar, considerou a douta Sentença recorrida que a pretensa citação da Recorrente de 31-3-2011 o foi efectivamente; quando de acordo com a lei então em vigor, não tendo existido qualquer prova de efectiva citação de todos os PEF mencionados acima à devedora originária L......... - ……………………….., UNIPESSOAL, LDA (NIPC ……………), qualquer pretensa citação teria de ser considerada como dirigida à devedora originária por meio da sua representante legal, como vem e vinha referido expressamente nos art. 41.º n.º 1 190.º n.º 5 do CPPT - Conforme Jurisprudência superior citada; ii) tendo a citação as funções que legalmente lhe são cometidas (art. 189.º n.º 1 do CPPT), este meio de comunicação processual afigura-se como um direito e uma garantia processual constitucional dos executados (art. 20.º n.º 1 e 4 e 268.º n.º 3 e 4 da CRP) – além de que é com a citação que se constitui e estabiliza a instância ou relação jurídica processual (art. 259.º n.º 2, 260.º e 564.º do CPC); iii) Impedindo-se assim a sociedade devedora originária de se defender, de pedir pagamento faseado, ou de pagar e evitar a acumulação de juros, com lesão consequente do benefício da excussão prévia da Responsável subsidiária e ora Recorrente; iv) em segundo lugar, a douta Sentença recorrida dá como provada a citação da reversão de todos os PEF contra a Recorrente em 31-3-2011, cf. (DOCS. n.º 006727171 e 006727178 publicitados no SITSAF pela Fazenda Nacional no dia 25-9-2023), quando consultando os autos não existe nenhum aviso de recepção assinado, tal como manda e mandava a lei (art. 190.º e 192.º do CPPT) – devendo no limite, em caso de devolução da carta registada com AR proceder-se a citação edital – o que não ocorreu (DOCS. n.º 006727171 e 006727178 publicitados no SITSAF pela Fazenda Nacional no dia 25-9-2023), tendo ocorrido falta de citação (que é uma nulidade insanável – art. 165.º n.º 1 al. a), 2 e 4 do CPPT); v) a Recorrente faz prova de que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que lhe não foi imputável (art. 190.º nº 6 e 192.º n.º 3 do CPPT), o que aqui é extremamente pertinente dado que as cartas registadas com aviso de recepção foram registadas como não entregues por impossibilidade (DOCS. n.º 006727171 e 006727178 publicitados no SITSAF pela Fazenda Nacional no dia 25-9-2023), o que se deveu ao facto de terem sido dirigidas para a morada Rua António Sardinha, 32, 1E, 2700-087 Amadora - casa arrendada sem contrato escrito; quando há muito a Recorrente se mudou (em 2009, em data que não sabe precisar), e comunicou a mudança às Finanças, para a RUA …………………… Nº 19 2º A …………………, 2. - 545 M …………. (casa que a sua Filha adquiriu em 14 de Março de 2008 para que a Recorrente sua Mãe a fosse habitar) – cf. carta do banco de 2010 e atestado de residência da Junta de Freguesia de Mem Martins que confirma a data de residência da Recorrente nesta morada em 1-1-2010, bem como a escritura pública de aquisição desta habitação, datada de 14-3-2008, que se juntam como DOC.1, DOC.2 e DOC.3 respectivamente; vi) Ou se assim não se considerar, o que não se concede, deverá ser no mínimo considerada a frustração da hipotética citação, quanto aos referidos PEF, como nulidade da citação, não operando os seus hipotéticos efeitos interruptivos da prescrição das dívidas tributárias e conexas – art. 191.º do CPC.; vi) sendo que a referida falta de citação prejudicou a Recorrente que não foi efectivamente chamada aos processos para se defender, requerer pagamento a prestações ou demonstrar que não foi notificada para exercer o direito de audição prévia nem foi gerente de facto - cf. normas legais, Doutrina e Jurisprudência citadas.

3. Consequentemente, a douta Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento sobre matéria de Direito: i) em primeiro lugar, considerou a douta Sentença do Tribunal de Primeira Instância que houve erro na forma do processo, não permitindo a lei que no processo de reclamação judicial se conhecesse das nulidades insanáveis e sanáveis, bem como da prescrição das dívidas, absolvendo da instância a Fazenda Nacional – o que não se concede à luz da legislação em vigor e da Jurisprudência superior já citada; ii) sendo a ilegitimidade do executado e a prescrição das dívidas dois dos fundamentos da oposição à execução (art. 204.º n.º 1 al. b) e d) do CPPT), não significa que só este meio processual seja o adequado - nos termos dos art. 276.º do CPPT e 95.º n.º 1 da LGT.; iii) até porque a questão da prescrição tributária foi novamente suscitada – bem como outros “novos” assuntos, como a ilegitimidade, a que estava obrigada a pronunciar-se – e é de conhecimento oficioso, devendo o Tribunal conhecê-la e apreciá-la, nos termos do art. 175.º do CPPT – como vem defendendo expressa e abundantemente a nossa Jurisprudência superior - por exemplo Acórdão do TCA Sul, Processo n.º 09486/16, decidido por unanimidade em 14-04-2016 (Relatora Lurdes Toscano); Acórdão do TCA Sul, Processo n.º 2589/19.1BELRS, decidido por unanimidade em 30-09-2020 (Relatora Cristina Flora); Acórdão do STA, Processo n.º 0189/06, proferido em 28-06-2006 (Relator Jorge Lopes de Sousa); Acórdão do STA proferido em 03-10-2007, no processo n.º 0702/07 (Relator Jorge Lino); o Acórdão do STA proferido em 24-02-2011, no processo n.º 0105/11 (Relator António Calhau); Acórdão do STA, Processo n.º 0234/15, decidido por unanimidade em 04-11-2015 (Relatora Ana Paula Lobo); Acórdão do STA, Proc. n.º 0186/18, decidido unanimemente em 14-03-2018 (Relator Ascensão Lopes); Acórdão do STA, Processo n.º 0371/09.3BEAVR 0221/18, decidido por unanimidade em 16-09-2020 (Relator Joaquim Condesso); iv) em segundo lugar, como se referiu acima, a Recorrente fez prova de que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que lhe não foi imputável (art. 190.º nº 6 e 192.º n.º 3 do CPPT), na medida em que as cartas registadas com aviso de recepção foram registadas como não entregues por impossibilidade (DOCS. n.º 006727171 e 006727178 publicitados no SITSAF pela Fazenda Nacional no dia 25-9-2023), o que se deveu ao facto de terem sido dirigidas para a morada R ……………., 32, 1E, ……….. A………….. - casa arrendada sem contrato escrito; quando há muito a Recorrente se mudou (em 2009, em data que não sabe precisar), e comunicou a mudança às Finanças, para RUA ………………….. Nº 19 2º A ………………, 2…….. - 545 M …………. (casa adquirida em 14 de Março de 2008 pela sua Filha para que a Recorrente a fosse habitar) – cf. carta do banco de 2010 e atestado de residência da Junta de Freguesia de Mem Martins que confirma a data de residência da Recorrente nesta morada em 1-1-2010, bem como a escritura pública de aquisição desta habitação, datada de 14-3-2008, que se juntam como DOC.1, DOC.2 e DOC.3 respectivamente; v) como atrás se disse, a prova da efectiva citação de todos os PEF acima referidos cabia à Fazenda Nacional (art. 74.º da LGT) – prova essa que aqui se ilidiu quanto aos PEF n.º ………………..312 e Apenso; vi) não tendo sido consideradas provadas as hipotéticas citações relativas a todos os PEF, e havendo prejuízo para a defesa da Recorrente como acima se alegou, não podiam ter sido consideradas pela douta Sentença recorrida como efectivamente ocorridas e provadas; vii) ora, considerando que não houve efectiva citação da reversão dos PEF n.º ……………………312 e Apensos, não poderia a douta Sentença dar como interrompida a prescrição das respectivas dívidas; viii) pelo que deveriam ter sido valoradas as falhas de citação relativas a todos os PEF como falta de citação – ou no limite como nulidade da tentativa frustrada de citação dos PEF n.º ……………………..312 e Apensos - art. 165.º n.º 1 al. a), 2 e 4 do CPPT; ix) até porque constitui nulidade insanável em processo tributário “A falta de informações oficiais referentes a questões de conhecimento oficioso no processo” (art. 98.º n.º 1 b) do CPPT), cabendo, também por isso, o ónus da prova do envio e do aviso à AT (art. 74.º da LGT; x) a não ocorrência devida e efectiva de citação, bem como a sua nulidade, não produz qualquer efeito interruptivo do decurso do prazo prescricional – o que não podia ter deixado de ser tido em consideração pela douta Sentença recorrida; xi) tudo conforme Jurisprudência superior citada; xii) em terceiro lugar, considerando que não houve efectiva citação da reversão dos PEF n.º ……………..312 e Apensos, deveria a douta Sentença dar como prescritas as respectivas dívidas - tendo sido os PEF n.º ………….312 e Apensos instaurados em 2009 e 2010 contra a sociedade L......... - …………………, LDA, por dívidas de IVA, impostos sobre o rendimento, juros e encargos anteriores; xiv) não tendo sido a Recorrente, relativamente a todos, devida e efectivamente citada da reversão dos referidos PEF, nem notificada para exercer o direito de audição prévia, nem figurando em qualquer título executivo (no portal das Finanças) como executada nos mesmos; xv) estando todas as referidas dívidas prescritas quanto à Recorrente, ao abrigo do art. 48.º n.º 3 da LGT, conjugado com os art. 48.º n.º 1 e 49.º n.º 3 da LGT; xvi) pelo que desde 2010 até Outubro de 2023 passaram mais de 5 anos e mais de 8 anos (mais de 13 anos), pelo que as mesmas dívidas não podem ser imputadas à Recorrente, por efeito da prescrição, uma vez que quanto a si não se verificou qualquer causa suspensiva ou interruptiva da mesma, nos termos do art. 49.º n.º 1 e 4 da LGT; xvii) a prescrição é de conhecimento oficioso e pode ser invocada a todo o tempo (art. 175.º do CPPT) e confere à Recorrente o direito de recusar o cumprimento da prestação e/ou de se opor ao exercício do direito prescrito (conforme art.º 304.º, n.º 1 do Código Civil); xviii) além de que, como acima referido, o prazo de prescrição da dívida tributária só se interrompe uma vez pelo facto que primeiro ocorrer (art. 49.º n.º 3 da LGT); xix) tudo conforme Jurisprudência superior citada; xx) em quarto lugar, ainda que assim não se entendesse, o que não se concede e só se avança por dever de bom patrocínio da causa, sempre estariam as dívidas prescritas ao abrigo do efeito instantâneo da interrupção da prescrição, sob pena de imprescritibilidade prática das dívidas tributárias; xxi) os referidos PEF foram instaurados em 2009 e 2010, tendo por objecto dívidas tributárias cujos factos geradores ocorreram anteriormente; xxii) pelo que, mesmo que a Recorrente tivesse deles sido citada para efeitos de se operar a respectiva reversão dos PEF contra si, sempre se dirá que desde então até à presente data já passaram 13 anos ou mais; xxiii) tudo conforme normas, Doutrina e Jurisprudência superior citadas; xxiv) por último, ainda que assim não se entendesse, o que não se concede, sempre estão prescritas as dívidas por força da declaração em falhas de todos os PEF em 27-11-2013, como afirma expressamente o despacho de indeferimento do SF de Amadora 1 recebido a 9-12-2022, o que faz recomeçar a contagem do prazo de prescrição das dívidas tributárias e conexas – pelo que, mesmo contando com os cerca de 3 meses e meio de suspensão da prescrição por força do processo de insolvência da Recorrente (declaração de insolvência em 06-02-2019 e encerramento do processo de insolvência em 20-5-2019) e contando com os 180 dias de suspensão da prescrição por força da Legislação do Covid-19, as dívidas estão prescritas, pelo menos, desde 11-9-2022 – nos termos dos art. 272.º e ss. do CPPT; xxv) sendo que desde a declaração em falhas recomeça a contagem dos prazos prescricionais interrompidos pela eventual citação, como tem decidido clara e expressamente a nossa Jurisprudência superior - por exemplo, Acórdão do TCA Norte, Processo n.º 01262/22.8BEBRG, decidido por unanimidade em 30-11-2022 (Relatora Margarida Reis); Acórdão do TCA Sul, Processo n.º 51/23.7 BELLE, decidido por unanimidade em 22-06-2023 (Relatora Susana Barreto); Acórdão do STA, decidido por unanimidade em 31-01-2018 no Processo n.º 021/18 (Relator Ascensão Lopes); Acórdão do STA, Proc. n.º 0518/20.9BELLE,decidido por unanimidade em 26-05-2021 (Relator Joaquim Condesso); Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Proc. n.º 01208/21.0BEBRG, decidido por unanimidade em 16-02-2022 (Relator Aníbal Ferraz).

Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o presente Recurso ser admitido e considerado procedente por provado, requerendo-se consequentemente a V. Exa. que sejam:

i) reconhecidos e declarados os erros de julgamento da douta Sentença recorrida quanto à matéria de facto, considerando que a Recorrida e a sociedade devedora originária não foram efectiva e devidamente citadas de nenhum PEF e dívida, conforme argumentação acima expendida com base em normas, Doutrina e Jurisprudência citadas;

ii) consequentemente, reconhecidos e declarados os erros de julgamento da douta Sentença recorrida quanto à matéria de Direito, considerando admissível a apreciação de nulidades e prescrições em sede de reclamação judicial; porque não houve causas de suspensão ou interrupção do decurso do prazo prescricional, as dívidas compreendidas entre o período de 2009 e 2010 (ou anteriores) estão prescritas por terem passado bem mais de 5 e de 8 anos ; bem como por já terem passado mais de 8 anos desde a declaração em falhas de todos os PEF em 27-11-2013 – conforme argumentação acima expendida com base em normas, Doutrina e Jurisprudência citadas;

iii) devendo ainda ser revogada a douta Sentença recorrida e substituída por outra que reconheça e declare as prescrições de todas as dívidas revertidas à Recorrente, por já terem passado mais de 5 e de 8 anos desde o início do prazo prescricional, sem que tenha ocorrido qualquer facto suspensivo ou interruptivo do decurso do prazo prescricional;

iv) sendo, por fim, anuladas as dívidas tributárias e extintos todos os Processos de Execução Fiscal respectivos, no que à Recorrente respeita.»


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Não há registo de contra-alegações.

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Neste TCA, o Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso. Em síntese, é o seguinte o entendimento do EMMP:

«(…)

Analisados os autos, designadamente a matéria de facto provada vertida na douta sentença recorrida, e considerando as disposições legais aplicáveis, propendemos por considerar, salvo melhor opinião, que assiste razão à recorrente quando defende que não se verifica erro na forma do processo e, dessa forma, podendo o Tribunal a quo apreciar e decidir, na reclamação, as questões que suscitou.

Com efeito, no que respeita à invocada prescrição da dívida – primeiramente suscitada perante o órgão de execução fiscal, que a não reconheceu e, depois, na presente reclamação – a jurisprudência vem entendendo que, por se tratar de matéria de conhecimento oficioso (art. 175º do CPPT), o meio processual de reclamação de atos de órgão de execução fiscal é meio idóneo para dela conhecer.

Por sua vez, no que respeita à alegada nulidade do processado por falta de citação da Reclamante para o processo de execução fiscal, também a reclamação constitui procedimento idóneo para o seu conhecimento, quer nos casos em que é primeiramente arguida perante o órgão de execução fiscal, quer mesmo quando constitua questão incidental prévia relativamente à apreciação, designadamente, da caducidade ou da prescrição da dívida exequenda. (vide, entre outros, Acórdão do Pleno do STA de 05.07.2012, processo nº 0873/11, Acórdãos do STA de 12.10.2011, processo nº 0609/11; de 04.02.2014, processo nº 0247/14; e de 05.07.2017, processo nº 0721/15, todos disponíveis em www.dgsi.pt/).

Deste modo, afigura-se-nos que a douta decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, ao absolver da instância a Fazenda Pública com fundamento na procedência da exceção de erro na forma do processo e, por via disso, não ter apreciado as questões suscitadas pela Reclamante referentes às alegadas prescrição da dívida exequenda e de falta de citação da Reclamante.

Assim, emitimos parecer no sentido da procedência do recurso quanto aos aspetos atrás referidos, não se conhecendo dos demais invocados pela reclamante e, consequentemente, se determine a baixa dos autos ao Tribunal de 1ª instância, para conhecer do mérito da ação, se nada obstar.”


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Com dispensa de vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, vêm os autos à conferência desta Subsecção do TCA-Sul para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto
A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«a) Em 14.03.2007, pela apresentação 18/20070314, na 1.ª Conservatória do Registo Predial/Comercial da Amadora foi constituída a firma L......... – ………….., Unipessoal, Lda., pessoa coletiva n.º 508042984 – cfr. doc. 1 junto com a PI;

b) A reclamante assumiu funções de sócia-gerente da firma referida no número anterior - cfr. doc. 1 junto com a PI e acordo;

c) A AT instaurou os PEF’s ………………..312 e apensos, contra L......... – ……………., Unipessoal, Lda., pessoa coletiva n.º ………………, pelas dívidas a seguir indicadas – fls. 22 PEF e acordo;

« Texto no original»

d) Em 27-10-2010, o Adjunto do Chefe de Finanças do Serviço de Finanças Amadora 1 proferiu despacho, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, de onde se extrai o seguinte – fls. 24 PEF e acordo:

« Texto no original»

e) Em 02.11.2010, o documento referido no número anterior foi remetido à reclamante por via postal registada, com a referência RM …………… PT – cfr. fls. 25-26 PEF e acordo;

f) No envelope da correspondência referido no número anterior foi aposto um carimbo onde se lê “2010-11-12 AMADORA Objeto não reclamado” – cfr. fls. 27 PEF e acordo;

g) Em 27.11.2010, o Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Amadora 1, proferiu despacho de reversão, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, que qual se extrai o seguinte – cfr. fls 28-31 PEF e acordo:

« Texto no original»

(…)

« Texto no original»

h) Em 24.03.2011, o Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Amadora 1, emitiu, em nome da reclamante, o “mandado de citação |reversão”, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, do qual extrai-se o seguinte – cfr. fls 32-33 PEF e acordo:

« Texto no original»

(…)

« Texto no original»

(…)

« Texto no original»

i) Em 31.03.2011, a AT elaborou, em nome da reclamante, a “Nota de marcação para citação/reversão art.º 160.º CPPT” referente ao PEF ………………312 e apensos cujo teor se dá por integralmente reproduzido, do qual extrai-se o seguinte - cfr. fls. 41 PEF e acordo:

« Texto no original»

j) Em 04.04.2011, a AT elaborou, em nome da reclamante, a “Certidão de citação c/ Hora certa p/ reversão art.º 160.º CPPT” referente ao PEF …………….312 e apensos cujo teor se dá por integralmente reproduzido, do qual extrai-se o seguinte: - cfr. fls. 42 PEF e acordo:

« Texto no original»

k) Os documentos referidos no número anterior foram enviados pela AT, por correio registado com a referência RM ………. PT, dirigidos à reclamante, para a morada ……………….., ………, Amadora – cfr. fls. 43-45 PEF físico;

l) A correspondência referida no número anterior foi devolvida à AT, tendo-lhe sido aposto um carimbo onde se lê “Não atendeu “Avisado” – cfr. fls 46-47 PEF físico;

m) Em 21.01.2016, pela apresentação 52/20160121, foi efetuado o seguinte registo, referente à firma indicada na alínea a), “Dissolução e encerramento da liquidação” -cfr. doc. 1 junto com a PI e acordo;

n) Em 10.10.2022, a reclamante dirigiu um requerimento ao Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Amadora 1, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, com referência aos PEF’s ………………..312 e apensos, pedindo que todas as dívidas e todos os PEF fossem extintos com fundamento em ilegitimidade da reclamante e na prescrição das dívidas tributárias – cfr. PI e acordo;

o) Em 06.12.2022, o Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Amadora 1 proferiu despacho, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, de indeferimento do requerimento mencionado na alínea anterior – cfr. fls. 103 e seguintes e acordo;

p) Em 09.12.2022, a reclamante recebeu o Despacho referido na alínea anterior - cfr. PI e acordo;

q) Em 20.12.2023, a PI deu entrada no Serviço de Finanças Amadora -1 – cfr. fls. 1 SITAF.


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Nada mais se provou com interesse ou relevância para a apreciação da matéria de exceção.

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Os factos provados assentam na análise crítica aos documentos juntos aos autos, e não impugnados, e no acordo das partes, conforme se indica em cada alínea do probatório. »

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- De Direito


Comecemos por colocar um ponto de ordem naquilo que está em causa neste processo, pois que, desde o requerimento inicial dirigido ao órgão da execução fiscal, passando pela reclamação apresentada ao abrigo do artigo 276º do CPPT, que os articulados se mostram manifestamente prolixos e notoriamente confusos.

Vejamos, simplificando.

Inicialmente, a Reclamante dirigiu-se ao órgão da execução fiscal invocando expressamente: (i) a sua ilegitimidade para os processos de execução fiscal, por não poder ser responsabilizada a título subsidiário, por dívidas da devedora originária, a sociedade L........., ………………; (ii) a prescrição das dívidas exequendas subjacentes aos processos de execução fiscal nº s ……………….312 e apensos (……………..054; ……………..498 e …………….583).

Em 06/12/22, foi proferida a decisão reclamada, na qual se procedeu unicamente à “análise da prescrição dos processos de execução fiscal supra mencionados que se encontram instaurados no Serviço de Finanças de Amadora 1”, tendo-se concluído que, nos processos em causa, “ainda não ocorreu a prescrição das dívidas em cobrança coerciva”.

A reclamação judicial dirigida ao TAF de Sintra e na qual foi proferida a sentença ora recorrida dirigiu-se à citada decisão de 06/12/22 e, no essencial, defende que a mesma deve ser anulada já que: (i) se verifica ilegitimidade da Reclamante para os processos de execução fiscal, por não poder ser responsabilizada a título subsidiário, por dívidas da devedora originária, a sociedade L........., ……………….; (ii) se verifica a prescrição das dívidas exequendas subjacentes aos processos de execução fiscal nº s ……………….312 e apensos (…………………054; ……………….498 e …………….583). Em termos menos claros, porém, verifica-se que a Recorrente também alega não ter sido citada para a execução.

Esclareça-se que a petição de reclamação segue de perto o teor do requerimento inicialmente dirigido ao órgão da execução fiscal, mantendo a sua linha argumentativa inalterada, não se insurgindo, por um lado, quanto à não decisão da alegada ilegitimidade da revertida por não poder ser responsabilizada a título subsidiário, nem contrapondo outros argumentos relativamente à análise que foi feita quanto à prescrição.

Com este esclarecimento feito, avancemos.

No TAF de Sintra, a sentença proferida foi no seguinte sentido:

“O artigo 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), cujo título é “Reclamações das decisões do órgão de execução fiscal”, estabelece o seguinte:

“As decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro são susceptíveis de reclamação para o tribunal tributário de l.ª instância.”

Da disposição indicada extrai-se que das decisões do órgão de execução fiscal desfavoráveis ao executado cabe reclamação para o tribunal tributário de 1.ª instância, a quem caberá apreciar a legalidade daquelas decisões. Caso a decisão impugnada seja ilegal, deverá ser anulada pelo Tribunal.

Resulta dos factos provados que a reclamante requereu ao OEF, com referência aos PEF’s ………………….312 e apensos, que todas as dívidas e todos os PEF fossem extintos com fundamento em ilegitimidade e na prescrição das dívidas tributárias (alínea n). Na sequência deste requerimento, o OEF veio a indeferir o pedido com fundamento na não prescrição das dívidas exequendas.

Face ao estabelecido no artigo 276.º do CPPT, o Tribunal apenas pode apreciar a legalidade desta decisão, ou seja, o Tribunal apenas pode apreciar se a decisão de indeferimento do pedido que a reclamante fez ao OEF é ou não ilegal e, em caso afirmativo, proceder à sua anulação. Todavia, o Tribunal não pode substituir-se ao OEF e apreciar as questões constantes no requerimento que lhe foi dirigido.

Analisada a PI, o Tribunal constata que a reclamante formulou os seguintes pedidos ao Tribunal:

“Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o presente Requerimento ser considerado procedente por provado, requerendo-se consequentemente a V. Exa. que sejam

(i) reconhecidas e declaradas as acima mencionadas ilegitimidades, nulidades e prescrições tributárias;

(ii) e que sejam anuladas todas as dívidas e extintos todos os PEF referidos no que à Reclamante respeita”

Resulta do que precede que a reclamante não pede ao Tribunal que aprecia a legalidade da decisão de indeferimento do OEF, aquilo que a reclamante pede ao Tribunal é que se substitua ao OEF e aprecie as questões constantes no requerimento que lhe dirigiu. Diga-se, aliás, que a PI é praticamente igual ao requerimento que foi apresentado ao OEF.

Além do mais, face aos pedidos formulados, o Tribunal conclui que existe erro na forma de processo, porquanto a ilegitimidade e a prescrição da dívida são fundamentos de oposição à execução, conforme estabelecido no artigo 204.º, n.º 1, alíneas b) e d) do CPPT.

Havendo erro na forma de processo, cumpre ao Tribunal aferir da possibilidade da convolação do processo na forma adequada, nos termos do disposto no artigo 97.º, n.º 3 da LGT e artigo 98.º, n.º 4 do CPPT. Porém, a convolação só deve ser determinada se a ação for tempestiva, relativamente à forma que o processo deve seguir. Resulta dos factos provados que a reclamante foi citada em 31.03.2011, pelo que à data da apresentação da PI há muito que o prazo dos 30 dias tinha transcorrido.

Estabelece o artigo 203.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, que a oposição deve ser deduzida no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal.

Resulta dos factos provados que a reclamante foi citada em 31.03.2011, pelo que à data da apresentação da PI há muito que o prazo dos 30 dias tinha transcorrido.

Em consequência, não pode o Tribunal proceder à convolação do processo, porquanto estaria a praticar um ato inútil e como tal proibido por lei.

(…)

Em consequência, e não sendo possível a convolação do processo na forma adequada, procede a exceção de erro na forma de processo”.

A Recorrente, uma vez mais de forma algo confusa, insurge-se contra o decidido, defendendo que se verifica o erro quanto ao julgamento da matéria de facto e que a sentença errou, de direito, ao concluir que houve erro na forma processual adequada. Como vimos, o TAF de Sintra entendeu que, in casu, o meio processual adequado era a oposição à execução fiscal e que a convolação em tal meio processual não era possível por a tal obstarem questões de tempestividade.

Considera a Recorrente que a reclamação apresentada era o meio idóneo a conhecer as questões suscitadas, referindo-se expressamente à prescrição, à ilegitimidade da revertida e, bem assim, ainda que de forma menos precisa, a nulidades processuais e à falta de citação da Executada, Recorrente. A Recorrente reitera que deve o Tribunal reconhecer que as dívidas estão prescritas.

Vejamos.

Como se escreveu no acórdão deste TCA, de 30/09/20, no processo nº 2589/19.1BELRS “A cada direito corresponde um, e apenas um, meio processual adequado para o seu reconhecimento em juízo (“a ação adequada”), a não ser que a lei determine o contrário (cf. art. 2.º, n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art. 2.º, alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)).

Verifica-se o erro na forma de processo quando o A. faz uso de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão.

A propriedade ou impropriedade do meio processual afere-se pelo pedido final formulado na p.i., ou seja, pela pretensão que o A. pretende fazer valer com a ação. O pedido formulado deve ser adequado à finalidade abstratamente figurada pela lei para essa forma processual, sob pena de ocorrer erro na forma de processo (cf. neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STA de 28/3/2012, proc n.º 1145/11, e de 29/2/2012, proc. n.º 1161/2011, de 28/05/2014, proc. 01086/13, de 18/06/2014, proc. n.º 01549/13, de 05/11/2014, proc. n.º 01015/14).

Se as concretas causas de pedir invocadas não são adequadas à forma de processo escolhida pelo A., então estamos perante questões relacionadas com a viabilidade do pedido, e não da propriedade do meio processual, pelo que não haveria erro na forma do processo, mas improcedência da ação (nesse sentido, Ac. 18/06/2014, proc. n.º 01549/13, Ac. do STA de 17/04/2013, proc. n.º 0484/13, e Ac. do STA de 20/02/2013, proc. n.º 0114/13, de 18/06/2014, proc. n.º 01549/13).

Saliente-se que o Juiz está vinculado pelo pedido, uma vez este delimita as questões que o tribunal deve apreciar nos termos da alínea e) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, não obstante, pode interpretar o pedido, determinando o real sentido da pretensão do A. Efetivamente, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem admitido de forma reiterada que o pedido formulado na petição possa ser interpretado (vide, entre muitos outros, Ac. do STA de 16/04/2008, proc. n.º 051/08, de 4/02/2009, proc. n.º 0925/08, de 11/02/2009, proc. n.º 924/08, de 7/07/2010, proc. n.º 0366/10, e de 26/09/2012).

Por outro lado, o facto de haver cumulação de pedidos não obsta a que se conclua pela propriedade do meio processual utilizado com base num dos pedidos, devendo ser considerados sem efeito os demais que não sejam adequados, prosseguindo o processo relativamente ao pedido adequado à forma de processo escolhida pelo A. (solução que se extrai do tratamento dado a uma questão paralela no n.º 4 do art. 193.º do CPC – nesse sentido, cf. Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário- anotado e comentado, Vol. I, 6.º Ed., Áreas Editora, 2011, p. 92) – também neste sentido, vide, Ac. do STA de 28/05/2014, proc. 01086/13”.

No caso, o despacho reclamado corresponde à decisão proferida pelo Chefe do Serviço de Finanças, no qual foi indeferido o anterior pedido de reconhecimento da prescrição de diversas dívidas exequendas.

Ora, não oferece dúvidas, que tal despacho é suscetível de reclamação judicial, nos termos previstos no artigo 276º e ss do CPPT.

É verdade que é pelo pedido que se afere a adequação da forma processual. No caso, o pedido formulado na reclamação coincide com o seguinte: que sejam “reconhecidas e declaradas as mencionadas ilegitimidades, nulidades e prescrições tributárias” e que “sejam anuladas todas as dívidas e extintos todos os PEF referidos no que à Reclamante respeita”.

É certo que o pedido que deveria ter sido formulado na p.i. seria o de anulação do ato reclamado, pois seria o adequado à finalidade abstratamente figurada pela lei para a reclamação do ato do órgão de execução fiscal prevista no art. 276.º do CPPT. “Porém, o juiz poderá interpretar o pedido formulado de modo a ajuizar se é o adequado para fazer valer a sua pretensão. Ora, o efeito jurídico formulado pela reclamante no final da p.i. é o da extinção do processo de execução fiscal (com fundamento na prescrição que se peticione que declare). Não obstante, com fundamento no princípio da tutela jurisdicional efetiva, e no princípio pro actione, podemos interpretar o pedido formulado na p.i. no sentido de que este contém um pedido implícito, nomeadamente, o da anulação do ato (…), e que a questão da prescrição é a causa de pedir que sustenta a sua pretensão” – cfr. acórdão citado supra.

Neste sentido, o acórdão do STA de 12/10/16, proc. n.º 0424/16 , no qual se escreveu que “Os princípios anti-formalista, pro actione e pro favoritate instantia, impõem ao juiz que interprete os pedidos formulados pelo autor de modo a adequar o processo à forma processual mais apta para que possa proferir uma decisão de mérito”.

Temos assim que, independentemente de a prescrição ser fundamento de oposição (quando a mesma já se verificou no momento em que se contesta o chamamento à execução fiscal), a verdade é que a prescrição pode sempre ser suscitada junto do órgão da execução fiscal que, aliás, dela deve conhecer oficiosamente. De resto, no âmbito da execução fiscal, também o Tribunal dela pode conhecer oficiosamente. Nesta sentido, uma vez mais se chama à colação o aresto citado, no sentido de que “ainda que a prescrição já tenha sido suscitada anteriormente no processo de execução fiscal, e dessa decisão não tenha havido reclamação nos termos do art. 276.º do CPPT, tal não significa que não poderá ser novamente ser suscitada e/ou conhecida, pois a sua verificação está ligada exatamente ao decurso do tempo, ou seja, num determinado momento poderá não se verificar a prescrição, mas passado dias, meses ou anos, o prazo prescricional se poderá completar, pelo que, posteriormente, sempre se deverá declarar oficiosamente quer pelo juiz, quer pelo órgão de execução fiscal, pois é o que decorre da lei (art. 175.º do CPPT)”.

Portanto, errou ao Tribunal ao concluir que, in casu, se verificou o erro na forma do processo, pois assim não sucede. Nesta medida, não se verificando o apontado erro, não faz sentido discorrer, como o TAF de Sintra fez, sobre a possibilidade de convolação.

Diga-se, ainda, e retomando uma ideia já avançada antes, que não se desconsidera que a reclamação judicial assentava também na ilegitimidade da Recorrente por não poder ser responsabilizada a título subsidiário, por falta dos pressupostos previstos no artigo 24º da LGT.

Trata-se, por um lado, de matéria que não foi apreciada no despacho reclamado, para além de a ilegitimidade em causa ser exclusivamente fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos previstos no artigo 204º, nº1, alínea b) do CPPT.

Seja como for, e como antes adiantámos, “Se as concretas causas de pedir invocadas não são adequadas à forma de processo escolhida pelo A., então estamos perante questões relacionadas com a viabilidade do pedido, e não da propriedade do meio processual…”.

Por último, atentemos, ainda, no teor do parecer do EMMP, na parte em que aí se refere que “no que respeita à alegada nulidade do processado por falta de citação da Reclamante para o processo de execução fiscal, também a reclamação constitui procedimento idóneo para o seu conhecimento, quer nos casos em que é primeiramente arguida perante o órgão de execução fiscal, quer mesmo quando constitua questão incidental prévia relativamente à apreciação, designadamente, da caducidade ou da prescrição da dívida exequenda”.

Embora, e uma vez mais, tenhamos que referir a forma confusa e imprecisa como as questões são colocadas no articulado de reclamação, a verdade é que na interpretação que dele fazemos ainda se alcança que, sem grande rigor terminológico, a Reclamante alega que a sua citação não foi efetuada (ou que não o foi de acordo com os requisitos legalmente impostos). A falta de citação pode e deve ser conhecida na reclamação prevista no artigo 276º, desde logo, como aqui acontece, em que se visa apreciar a verificação (ou não) da prescrição das dívidas exequendas.

Portanto, temos que concluir que, contrariamente ao decidido, não se verifica o erro na forma do processo e, nessa medida, caberá ao Tribunal de 1ª instância, se a tal nada mais obstar, proferir decisão no âmbito da reclamação que lhe foi dirigida.

No caso, é patente que este Tribunal não pode decidir em substituição, por ser manifesta falta de elementos para tal, desde logo o processo executivo que não se mostra junto aos autos, bem como os demais elementos que venham a ser necessários para aferir da citação, designadamente os constantes do cadastro da Executada.

Por conseguinte, terão os autos de baixar à 1.ª Instância para que seja proferida decisão de mérito em conformidade, se outro fundamento, diverso do ora decidido, a tal não obstar.

Como está bem de ver, portanto, procedendo as conclusões atinentes ao erro de julgamento quanto ao erro na forma de processo, ficam prejudicadas as demais questões aqui colocadas, seja quanto ao erro de julgamento de facto, seja quanto à apreciação da prescrição.

Há, pois, que conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, devendo os autos baixar ao TAF de Sintra para aí prosseguirem os seus termos


*







III – DECISÃO




Termos em que, acordam os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais da Secção de Contencioso Tributário do TCA Sul em:


- Conceder provimento ao recurso;


- Revogar a sentença recorrida;

- Ordenar a baixa dos autos ao TAF de Sintra para prolação de nova decisão.

Sem custas.

Registe e Notifique.

Lisboa, 11/01/24



Catarina Almeida e Sousa

Lurdes Toscano

Hélia Gameiro Silva