Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:219/11.9BEBJA
Secção:CT
Data do Acordão:11/14/2019
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IRS;
MAIS-VALIAS;
DESPESAS NECESSÁRIAS E EFECTIVAMENTE PRATICADAS, INERENTES À AQUISIÇÃO E ALIENAÇÃO.
Sumário:1. Com vista à determinação das mais-valias, as despesas necessárias e efectivamente praticadas inerentes à alienação podem ser adicionadas ao valor de aquisição.
2. O critério legal de relevação das despesas em causa consiste em demonstrar se as mesmas eram necessárias, foram efectivamente praticadas e eram inerentes à alienação do imóvel.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão
I- Relatório
A...... e M..... deduziram impugnação judicial do acto de deferimento parcial da reclamação graciosa apresentada relativamente à liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares [IRS], relativo ao ano de 2008, no montante de imposto a apurar de 230.668,40€.
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, por sentença proferida a fls. 168 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), datada de 16 de Abril de 2018, julgou improcedente a impugnação.
Nas alegações de recurso de fls. 195 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), os recorrentes, A….. e M……, formulam as conclusões seguintes:
«A. Nos autos está em causa saber se certa despesa, ao abrigo do disposto no art. 10.° e 51.°, al. b) do CIRS deve ser considerada para efeitos de mais-valias decorrentes da alienação de um prédio rústico, em razão dessa despesa dizer respeito a alegados serviços de angariação e mediação imobiliária.
B. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial e por isso não admite que a despesa relativa a angariação de comprador seja considerada para efeitos de mais-valias.
C. O presente recurso versa sobre a matéria de facto e sobre matéria de Direito, pois os recorrentes não se conformam quer com a decisão sobre a matéria de facto, quer com a aplicação que o julgador a quo fez do direito aos factos, uma vez que decidiu julgar improcedente a impugnação, pelos motivos aduzidos na sentença recorrida e com a qual não se concorda.
D. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e foram gravados os depoimentos das testemunhas, o que tem relevo para a decisão da matéria de facto.
E. Da análise crítica da prova os recorrentes consideram que a decisão sobre a matéria de facto tem que ser substancialmente alterada em três situações concretas, pelo que expressamente vai impugnada a decisão sobre a matéria de facto nos pontos que se indicam adiante.
F. Primeiro ponto de facto que os recorrentes consideram incorrectamente julgado: «O) P…… conheceu o comprador do imóvel no dia da venda»;
G. Ora, de acordo com a análise da prova não pode ser essa a conclusão a que deve chegar o julgador.
H. Segundo ponto de facto que os recorrentes consideram incorrectamente julgado: o Tribunal a quo e de que ora se recorre, deu como não provado os factos constantes dos artigos 13. °, 15. ° e 16. ° da petição inicial, declarando-o expressamente no seu ponto 6.1. Factos não provados.
I. Terceiro ponto de facto que os recorrentes consideram incorrectamente julgado: da decisão referente aos factos não provados retira-se que a sentença recorrida não deu como provado o contante nos artigos 19.° e 20.° da petição inicial, ou seja, que aquando do pagamento da comissão, o impugnante A...... apenas assinou o cheque, sendo os demais campos do cheque preenchidos pelo Sr. P...... ,
J. Consideram os recorrentes que estes factos devem ser considerados como provados.
K. Da alteração do julgamento destas decisões sobre a matéria de facto resulta consequentemente um enquadramento fáctico-jurídico distinto a dar ao caso.
L. Pelo que, desde já se diga também que, salvo o devido respeito que é muito, os recorrentes não concordam com a decisão de fundo tomada na sentença em crise que deveria ter ido em sentido oposto dando provimento à impugnação.
M. No que diz respeito ao primeiro ponto, o concreto ponto de facto incorrectamente julgado é o seguinte: «O) P…….. conheceu o comprador do imóvel no dia da venda».
N. os concretos meios probatórios que impõem decisão diferente da recorrida, são os depoimentos da testemunha P...... ao longo de todo o seu depoimento é farto ao referir que arranjou o cliente, que surge inscrito na escritura de compra e venda do imóvel em causa nos autos e constante de fls. ... para proceder à compra do mesmo aos aqui recorrentes.
O. Assim como a sua afirmação que "conheci o comprador. Não era meu conhecido. Foi-me apresentado por outra pessoa que também intermediou o negócio (...) mas ainda hoje sou amigo da pessoa que comprou” (cfr. passagem da gravação da prova aos minutos 00:04:31 a 00:04:41), que leva a concluir que o Sr. P...... , na busca de um comprador para o prédio viu-lhe ser apresentado o comprador e depois levou-o ao encontro dos vendedores, conforme decorre da passagem do depoimento do Sr. P...... aos minutos 00:04:41 da gravação respectiva.
P. Esta conclusão de que o Sr. P...... conheceu o comprador do imóvel antes do dia da venda é também retirada da resposta da testemunha à questão de saber como é que o vendedor e o comprador chegaram ao contacto para fazerem um negócio de um milhão e tal de euros, sendo que a testemunha respondeu que foi por seu intermédio e de mais outras pessoas (vide a gravação do depoimento do Sr. P...... dos minutos 00:04:41 aos minutos 00:04:54).
Q. Mas mais, a instâncias do próprio julgador (vide a passagem da gravação do depoimento do Sr. P...... que inicia aos minutos 00:17:00 da mesma e termina aos minutos 00:17:34) fala-se de visitas à propriedade objecto do contrato de compra e venda e a testemunha diz que realizou "Diversas visitas, isto não é só uma visita” (...)
R. Ora, de todos estas partes do depoimento da testemunha P...... se extraem factos que infirmam a conclusão do julgador.
S. Assim, quanto a este primeiro ponto, a concreta decisão de facto que deveria ter sido proferida sobre esta questão de facto impugnada é dar- se como provado que "o P...... conheceu o comprador do imóvel antes do dia da venda e promoveu e acompanhou o mesmo em visitas ao imóvel em causa nos autos”.
T. Quanto ao segundo ponto da impugnação da matéria de facto, ele diz respeito a factos dados como não provados, que deveriam ter sido dados como provados (especificadamente indicados na sentença recorrida como não provados).
U. Aqui o que se trata é de concretos pontos de facto incorrectamente julgados por deverem constar como provados.
V. A douta decisão do Tribunal a quo e de que ora se recorre, deu como não provado os factos constantes dos artigos 13.°, 15.° e 16.° da petição inicial, declarando-o expressamente no seu ponto 6.1. Factos não provados.
W. Ora, os recorrentes consideram, face à prova produzida, que esses factos deveriam ter sido dados como provados e adiantam-se os concretos meios probatórios que impõem decisão diferente da recorrida
X. Resulta do depoimento da testemunha P...... que foi ele, em conjunto com outras pessoas, quem logrou obter o concreto comprador do prédio em causa nos autos.
Y. É clarificadora a passagem da gravação do depoimento do Sr. P...... que inicia aos minutos 00:10:35 da mesma e termina aos minutos 00:11:16), onde se pergunta à testemunha "Se o Senhor C...... não tivesse contactado o senhor para angariar este comprador para esta propriedade o negócio ter-se-ia feito... com aquele comprador?” e esta responde "Com este comprador seguramente que não. Não quer dizer que não pudesse ser feito com outro...”
Z. Ora, daqui resulta que foi a testemunha, com outros, quem angariou o comprador e que este apenas surgiu por intervenção deles.
AA. Para além desta testemunha, o depoimento de A...... também é esclarecedor e permite concluir que houve serviço de angariação de comprador para o prédio e efectivo pagamento desse serviço.
BB. No seu depoimento é lhe perguntado, qual a intervenção que teve no negócio em causa nos autos e a testemunha responde "A intervenção foi o Sr. C...... que me entregou aquilo para vender, depois eu dei para vender ao Sr. P...... , o Sr. P...... arranjou um comprador, que eu não conheço (...)” (vide a passagem da gravação do depoimento do Sr. A...... desde os minutos 00:22:20 da mesma e termina aos minutos 00:23:35).
CC. Pelo que os factos constantes dos artigos 13.°, 15.° e 16.° da petição inicial devem ser dados como provados em função do depoimento da testemunha acima referido.
DD. A testemunha P...... afirma: "É verdade que eu e outras pessoas intermediámos esse negócio e arranjámos, enfim, um cliente que comprou a propriedade do Sr. C...... . E esse pagamento foi efectivamente pago, enfim, foi para dividir entre os intervenientes no negócio (vide a passagem da gravação do depoimento do Sr. P...... que inicia aos minutos 00:03:42 e termina aos minutos 00:03:57).
EE. Também a testemunha A...... confirma os factos (vide a passagem da gravação do depoimento do Sr. A...... desde os minutos 00:23:35 da mesma e termina aos minutos 00:24:12), ao confirmar que se vendesse a terra ganhava alguma coisa com isso, assim como perante o cheque de € 235.000 em causa nos autos disse que... o Sr. P...... trouxe um cheque de comissão e deu-me parte, conforme a gente tinha combinado.
FF. Embora, a sentença especificadamente diga que não dá como provado o constante dos artigos 15.° e 16.° da petição inicial, a verdade é que efectivamente esses factos estão provados no ponto L) da matéria de facto dada como provada.
GG. Prova-se que J) O Impugnante emitiu o cheque n° 7……, sacado sobre o Crédito Agrícola, em 22/02/2008, a favor da sociedade comercial H….., Lda; e que L) Esta sociedade, ou qualquer outra pessoa singular ou colectiva não lhe forneceram recibo de quitação ou factura relativa àquele montante;
HH. Deve assim ser dado como provado o constante dos artigos 13.°, 15.° e 16.° da petição inicial, ou seja, que foi através da intervenção dos angariadores referidos nas alíneas M) e N) da actual matéria de facto dada como provada que os aqui recorrentes conheceram e puderam realizar o negócio de compra e venda com o comprador. E assim, a concreta decisão de facto a tomar é dar como provado que "por realmente ter logrado obter comprador para o prédio em causa, os aqui impugnantes pagaram a quantia de € 253.500,00 (duzentos e cinquenta e três mil e quinhentos euros), através do cheque referido na alínea J) da matéria dada como provada, (conforme comprova a folha de movimentos bancários já junta à própria reclamação como doc. 9 e a cópia do cheque junto como doc. 4), o qual os ora impugnantes estavam convencidos de que havia sido emitido apenas em nome do Sr. P...... , vindo depois a verificar-se que o beneficiário foi a sociedade comercial H...... , Lda.”.
II. Mais deve ser dado como provado que: "de tal valor o seu beneficiário nunca deu quitação, nomeadamente através da emissão de recibo, nem emitiu qualquer factura correspondente a esse serviço”.
JJ. Quanto ao terceiro ponto da impugnação de facto, o que se trata são de factos dados como não provados, que deveriam ter sido dados como provados e sem qualquer referência concreta na sentença recorrida.
KK. Assim, os concretos pontos de facto incorrectamente julgados por deverem constar como provados são os factos constantes dos artigos 19.° e 20.° da petição inicial.
LL. No entender dos recorrentes, deve ser dado como provado, no que concerne ao meio e ao modo de pagamento dos serviços de angariação, que "aquando do pagamento da comissão, o impugnante A...... apenas assinou o cheque, sendo os demais campos do cheque preenchidos pelo Sr. P...... .”,
MM. Os concretos meios probatórios que impõem essa decisão, que é diferente da recorrida, são o próprio cheque a fls. ... dos autos e as declarações da testemunha Sr. P...... no que concerne à intervenção dos recorrentes no preenchimento do cheque e qual o motivo da entrega do mesmo.
NN. Na passagem da gravação do depoimento do Sr. P...... que inicia aos minutos 00:05:25 e termina aos minutos 00:05:40 é-lhe colocada a questão de saber se se está perante um valor de € 253.500,00, o que a testemunha confirma.
OO. Assim como confirma que o pagamento da comissão foi feito por cheque.
PP. Depois exibe-se o cheque constante dos autos a fls... à testemunha e esta confirma que foi efectivamente aquele cheque que serviu para pagamento dos serviços de angariação (vide a passagem da gravação do depoimento do Sr. P...... que inicia aos minutos 00:06:05 e termina aos minutos 00:07:40).
QQ. De seguida é lhe perguntado sobre os escritos no cheque e os seus diversos campos e a testemunha afirma que é sua letra (...) e que "o cheque fui eu que o preenchi” (...) É tudo a minha letra, sim.
RR. A concreta decisão de facto que deveria ter sido proferida sobre esta questão de facto impugnada é que deve ser dado como provado que: por os angariadores referidos nas alíneas M) e N) da actual matéria de facto dada como provada terem logrado obter comprador para o prédio em causa, os aqui recorrentes pagaram a quantia de € 253.500,00 (duzentos e cinquenta e três mil e quinhentos euros), através do cheque referido na alínea J) da matéria dada como provada;
SS. Assim como que: o referido cheque foi preenchido pelos recorrentes apenas no que concerne ao campo "valor”,
TT. Bem como deve ser dado como provado que: o referido cheque de pagamento foi preenchido pelo Sr. P...... nos restantes campos, designadamente no campo destinado ao beneficiário do cheque.
UU. Perante os factos provados e estas alterações à decisão da matéria de facto vejamos o que há a concluir de Direito.
VV. O que está em causa é a aplicação do artigo 51.°, al. b) do CIRS.
WW. A douta decisão do Tribunal a quo e em crise no presente recurso considerou que, para efeitos de venda do prédio denominado "C……”, sito na freguesia e concelho de Aljustrel, inscrito na respectiva matriz sob o art. …… e descrito na CRP Aljustrel sob o número 2…… de que eram titulares os ora Recorrentes até ao momento da venda em causa nos presentes autos, encetaram contactos com pessoas com conhecimentos na área, pessoas, essas, que ficaram incumbidas de publicitar a venda do imóvel e de angariar um comprador para o mesmo.
XX. Na verdade, encontra-se provado que M) P...... é empresário agrícola e gerente da sociedade comercial H...... , Lda; e que N) Este foi mandatado para proceder a diligências de angariação de comprador para o prédio rústico antes citado conjuntamente com outras pessoas, designadamente A……, em contrapartida de um pagamento;
YY. Todavia, o referido Tribunal a quo alicerça a sua convicção de que os referidos P...... e A...... não prestaram os referidos serviços de mediação imobiliária aos ora Recorrentes no facto de os mesmos "demonstrarem desconhecimento em relação ao efectivo comprador”.
ZZ. Ora, como se viu na impugnação da matéria de facto, esta posição do Tribunal a quo resulta de uma deficiente análise e valoração da prova e resulta de uma interpretação manifestamente incorrecta das normas atinentes à prova e daquilo que resulta do senso comum.
AAA. Com efeito, e não obstante a livre apreciação da prova testemunhal que é admitida ao juiz, decorre dos depoimentos de P...... e A...... que os mesmos tiveram intervenção no referido negócio, angariaram o comprador e receberam uma comissão por isso para pelos recorrentes.
BBB. Assim sucede que pelo menos o Sr. P...... conhecia o comprador e foi ele quem o levou ao conhecimento dos vendedores, mediante retribuição - é isto a mediação imobiliária.
CCC. Desconhece-se assim em que material probatório se ancorou o Tribunal a quo para dar como provado que o Sr. P...... só conheceu o comprador no dia da escritura.
DDD. Resulta claro do depoimento do P...... e do A...... que os mesmos promoveram a venda da terra junto de terceiros, levando-os a visitar o prédio a fim de perceber se tinham interesse no mesmo, tendo acabado por o mesmo ser vendido a uma sociedade de um senhor que foi angariado pelo P...... .
EEE. Este conheceu o comprador do prédio antes da escritura e fez visitas com o mesmo ao prédio.
FFF. O A...... sabia da existência do negócio e estava a par do mesmo, o que se retira do facto de saber quem tinha ido à escritura e, depois de pago o preço, a comissão pela angariação ter recebido a sua quota-parte do Sr. P...... .
GGG. Tudo isto, conjugado com toda a demais factualidade, só pode ser de molde a formar no juiz a convicção de que os mesmos tinham intervindo no referido negócio de compra e venda como mediadores, angariando clientes para a compra do imóvel em causa nos autos.
HHH. Foi entregue ao Sr. P...... um cheque para pagar os serviços em causa, como este expressamente admite no seu depoimento.
III. E foi este quem decidiu colocar no mesmo, como beneficiário, a sociedade H...... , Lda.
JJJ. E tal pagamento está enquadrado no programa contratual de uma mediação imobiliária, que montaram.
KKK. Ora, o juiz a quo não pode alhear-se das regras de experiência comum e não pode deixar de concluir que este pagamento foi para cobrir o custo com os serviços de intermediação imobiliária levados a cabo e que conduziram à efectivação do negócio entre as partes, tendo o mesmo sido repartido pelos vários intervenientes que procuraram comprador para o prédio.
LLL. Foi, efectivamente, por parte dos ora Recorrentes, sacado um cheque a favor de uma sociedade comercial de que P...... era - e é - gerente, sociedade, esta, que tem a firma "H...... , Lda.”
MMM. No entanto, tal cheque - que visou o pagamento dos referidos serviços de mediação - apenas foi emitido a favor da mencionada sociedade por expresso pedido do referido P...... - quem preencheu o cheque.
NNN. Sendo que o devedor - in casu, os Recorrentes - cumpriram a obrigação a que se encontravam adstritos, uma vez que procederam ao pagamento das quantias acordadas com os referidos P...... e A…...
OOO. Ora, não existindo quaisquer relações negociais anteriores entre os Recorrentes e a mencionada sociedade, afigura-se notório que o saque do referido cheque, nas aludidas circunstâncias de tempo, lugar e modo teve em vista o pagamento da comissão devida a P...... e A...... .
PPP. O facto de inexistir recibo que comprove os mencionados pagamentos, não é óbice a que se aplique o artigo 51.°, n.° 1, al. b) do Código do IRS.
QQQ. Tal dispositivo legal não exige que tais despesas estejam documentalmente comprovadas.
RRR. Diz apenas que elas, para valerem no cálculo das mais valias devem ser necessárias e efectivamente praticadas.
SSS. Pelo que sempre é de admitir outros meios de prova das referidas despesas e que, pela formulação da letra da lei, esta quis deixar em aberto e permitir.
TTT. Não se olvide que estamos no campo do direito fiscal, onde a tipicidade normativa é regra e, portanto, não pode o intérprete restringir a norma sem um mínimo de correspondência com a letra da mesma.
UUU. No caso em apreço a despesa com a mediação imobiliária foi efectuada - conforme o comprova o depoimento das testemunhas, acompanhados da prova documental - cheque e movimentos bancários - presentes nos autos.
VVV. A não apresentação do recibo deriva da omissão de emissão do mesmo pelos referidos P...... e A...... ou pela própria sociedade H...... , Lda.
WWW. Todavia, o incumprimento do dever legal de emissão do recibo não pode ser oposto aos aqui recorrentes, quando o Tribunal sabe do recebimento, o mesmo está documentalmente comprovado e a sociedade que recebeu os valores acabou por ser tributada por eles em sede de IRC, conforme decorre do depoimento do seu gerente e o Sr. A...... em sede de IRS.
XXX. Assim deve o referido pagamento de 253.500 € ser considerado e qualificado como despesas com a alienação de imóveis para efeitos de cálculo do valor de mais-valias, nos termos e para os efeitos do art.51.° do Código do IRS.
YYY. Se assim não for, determinar-se-á que o incumprimento de uma obrigação legal por parte de outrem cause sérios prejuízos aos ora Recorrentes, que cumpriram a sua parte no mencionado negócio.
ZZZ. O que constitui um atropelo à mais elementar justiça e, por isso, merece censura.
AAAA. Por último, o Tribunal a quo fundamenta o seu acórdão com a circunstância de ter sido declarado voluntariamente pelos ora Recorrentes, na escritura pública de compra e venda, a inexistência de mediação imobiliária no negócio.
BBBB. Não teve, no entanto, em consideração o facto de os mesmos não terem tido plena consciência do alcance e do fundamento de tal menção - leia-se da menção de (não) intervenção de mediador imobiliário - no referido acto notarial.
CCCC. Com efeito, e derivado da própria idade dos Recorrentes, só mais tarde os mesmos tiveram percepção de que a intervenção dos mencionados P...... e A...... constituía actividade de mediação imobiliária que deveria ser declarada
DDDD. Por fim, veja-se que o Sr. P...... afirmou no Tribunal e nada há para duvidar que o negócio só se fez com este comprador por força da sua intervenção, pois que o comprador não era da zona e seria praticamente impossível que o vendedor chegasse ao mesmo (vide a passagem da gravação do depoimento do Sr. P...... que inicia aos minutos 00:17:00 e termina aos minutos 00:17:32).
EEEE. Assim, deste modo, fica também demonstrada a necessidade da despesa para que o negócio efectivamente tivesse ocorrido por aqueles valores e com aquelas partes.
FFFF. Na verdade, a despesa com a angariação do comprador foi inerente ao negócio de compra e venda, pois este só se fez com aquele comprador em concreto por que os vendedores contrataram pelo menos o Sr. P...... e o Sr. A...... para procurarem um comprador, o que vieram a conseguir.
GGGG. Sendo que foi efectivamente uma pessoa obtida pelo esforço daquelas pessoas que veio a comprar a propriedade vendida.
HHHH. As despesas de mediação mobiliária, mais concretamente a comissão de intermediação, são consideradas pela jurisprudência e pela doutrina como despesas necessárias e inerente à venda do imóvel para efeitos no n° 1 alínea a) do art. 51° C.IRS (cfr. v.g. e por todos AC TCA Sul de 14-4-2015, no processo 06824/13).
IIII. Por tudo isto o montante de 235.500 € de despesas suportadas pelos recorrentes com a intermediação efectivamente realizada, que pediram e beneficiaram deve integrar o cálculo de determinação das mais valias à luz do disposto nos art. 10.° e 51.° CIRS no que diz respeito ao negócio em causa nos autos.
JJJJ. Tendo a sentença recorrida violado precisamente esses dispositivos legais, pois que nos termos do artigo 51.° al. a) do Código do IRS, para determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem (...) as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação de direitos reais sobre imóveis.
KKKK. Os recorrentes entendem que deve ser tido em conta o valor pago ao Sr. P...... que este canalizou para a H...... , Lda. e depis repartiu entre si e, pelo menos, o Sr. A...... , tendo vindo depois a ser quer a sociedade quer este último tributados por aquele rendimento.
LLLL. Ainda assim, estando documentalmente comprovado a transferência do valor em causa (confira-se aliás a sua data), (cfr. doc. 4 dos presentes autos e o doc. 9 junto à reclamação graciosa, junta também como doc. 2 da PI)
MMMM. Tendo o mesmo servido para promover a angariação do comprador do prédio rústico em causa,
NNNN. E tendo-se efectivamente realizado o negócio, conforme o demonstra a escritura pública de compra e venda junta como doc. 1 à reclamação graciosa, junta como doc. 2 com a PI.
OOOO. Não podem os aqui recorrentes ficar prejudicados com a recusa de emissão de recibo e/ou factura de um serviço que efectivamente pagaram, e de que beneficiaram por ter sido prestado, e que a lei lhes permite beneficiarem em sede de apuramento de mais-valias.
PPPP. Face a estas considerações a despesa aqui em causa, realizada por causa e para permitir a operação de compra e venda do imóvel em causa nos autos, deverá ser tida em conta na determinação das mais- valias, devendo, por isso, cumprir-se o disposto nos artigos 51.° e 10.° CIRS e, em consequência, revogar-se a sentença recorrida, substituindo- a por outra que dê provimento à impugnação.
X
A recorrida tendo sido devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.
X

A Digna Magistrada do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.
X
Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.

X
II- Fundamentação.
2.1.De Facto.
A sentença recorrida considerou provados os factos seguintes:
«A) O Impugnante marido alienou em 21/02/2008, por intermédio de escritura pública de compra e venda lavrada no Cartório Notarial de Ourique, o prédio rústico denominado “C…..”, este sito na freguesia e concelho de Aljustrel, inscrito na respetiva matriz predial sob o art….., da secção G;
B) A venda teve como preço o valor de 1.183.000,00 euros;
C) Tal imóvel havia sido adquirido pelos Impugnantes em 28/09/1997 pelo valor de 52.373,75 €;
D) Os impugnantes não procederam à declaração da referida venda na declaração de rendimentos modelo 3 quanto ao ano de 2008;
E) A ATA levou a cabo a emissão de liquidação oficiosa respeitante a IRS de 2008 da qual resultou imposto a pagar no montante de 219.300,82 €, acrescido de juros;
F) Não se conformando com tal liquidação, recebida em 20/09/2010, os Impugnantes reclamaram graciosamente em 06/01/2011;
G) Esta reclamação veio a merecer despacho de deferimento parcial mediante concordância com parte da argumentação expendida pelas Impugnantes e rejeição no restante, datado de 20/05/2011;
H) Em concreto foi recusado provimento na consideração de alegados pagamentos de serviços de angariação com a seguinte fundamentação:
“(...) 17. Defendem ainda os Reclamantes fazer prova do pagamento respeitante à comissão de venda do prédio em causa aquando da sua alienação na importância de 253.500,00 €
18. Esclarecem que o mesmo se enquadra no conceito de “... despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação de direitos reais sobre bens imóveis” aclarado na al. a) do art. 51º do CIRS.
19. Ora, estabelecendo a lei determinadas exigências relativas à emissão de facturas (art. 36º do CIVA) que enuncia os requisitos vários e pormenorizados quanto ao seu preenchimento, com o objectivo de evitar a fuga e a evasão fiscais, deveremos concluir que a factura constitui uma formalidade “ad substantiam” para o exercício de qualquer benefício fiscal.
20. Esta falta não poderá ficar sanada com a simples junção de uma folha de movimentos bancários em que alegadamente se atesta a realidade de operações subjacentes já que aquela os relação movimentos bancários não constitui “documento equivalente” às facturas /recibos considerando como “documento equivalente” a que a lei se refere o qual deverá conter, ele próprio e per si, todos os requisitos enunciados no supracitado art. 36º do CIVA.
21. A referida reação dos movimentos bancários, assim como uma cópia de um cheque que se pretende juntar aos autos não podem, de maneira alguma, ser aceites para a validação formal da omissão da respetiva factura / recibo já que a lei é muito clara ao obrigar que essa prova assim seja feita.
22. Além disso, o pagamento efectuado poderá referir-se a uma outra prestação de serviço que não a que está em causa.
23. Acresce ainda que tal como consta da Excritura de Compra e Venda “mais declaram os outorgantes, sob sua responsabilidade, que, neste negócio, não houve intervenção de mediador imobiliário.”;'
I) Mantendo a sua inconformação os Impugnantes deduziram a presente impugnação;
J) O Impugnante emitiu o cheque n° 7….., sacado sobre o Crédito Agrícola, em 22/02/2008, a favor da sociedade comercial H...... , Lda;
L) Esta sociedade, ou qualquer outra pessoa singular ou colectiva não lhe forneceram recibo de quitação ou factura relativa àquele montante;
M) P...... é empresário agrícola e gerente da sociedade comercial H...... , Lda;
N) Este foi mandatado para proceder a diligências de angariação de comprador para o prédio rústico antes citado conjuntamente com outras pessoas, designadamente A...... , em contrapartida de um pagamento;
O) P...... conheceu o comprador do imóvel no dia da venda;
P) O Impugnante entregou-lhe o cheque antes citado, preencheu-o a favor da sociedade H...... e descontou-o;
Q) A...... não conheceu o comprador do imóvel.

*

FACTOS NÃO PROVADOS

Não resultam provados os fatos que contrários a estes se mostram e ainda, especificadamente os factos articulados sob os artigos 13°, 15°, 16° da petição inicial Não resulta, ainda, assente toda a factualidade que se revela acessória à matéria que em função dos fundamentos da impugnação se elege como necessária para a decisão a proferir.

*
Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos dos autos, designadamente naqueles constantes do processo administrativo anexo e juntos à petição inicial.
Atendeu-se, ainda, no depoimento das testemunhas a parte que se mostrou credível. Contudo mostraram-se as testemunhas hábeis na prestação das suas declarações procurando atestar que a sua intervenção no negócio em causa nos autos se mostrava escortinado pela Administração Tributária, para tanto procurando justificar o recebimento de uma comissão paga pelo Impugnante. Todavia, ambos foram unânimes em referir desconhecer ou somente ter conhecido no dia da escritura o comprador do imóvel. Decorre, porém, do senso comum que aquele que angaria ou que medeia algo tem que necessariamente interagir com todas as partes por forma a compor o negócio previsto. Faltando-lhe este elemento essencial, falta a demonstração lógica da angariação / mediação do negócio.
Quanto aos factos alegados e não demonstrados registe-se a regra quanto à sua prova. Nos termos do disposto no n° 1 do art. 74° da LGT o ónus da prova dos factos constitutivos do direito recai sobre quem os invoque. Destarte, todos os factos enunciados pelos Impugnantes que se não mostram assentes decorre a sua falta de demonstração de ausência de prova nesse sentido.


X

Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
R) O valor constante do cheque referido em J) é de €253.500,00 – fls. 62.
S) O valor referido na alínea anterior foi descontado em 25.02.2008 – fls. 50.
X

2.2. De Direito
2.2.1. Nos presentes autos, é sindicada a sentença proferida a fls. 168 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), datada de 16 de Abril de 2018, que julgou improcedente a impugnação deduzida por A...... e M..... contra o acto de deferimento parcial da reclamação graciosa apresentada relativamente à liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares [IRS], relativo ao ano de 2008, no montante de imposto a apurar de 230.668,40€.
2.2.2. Os recorrentes assacam à sentença em crise erro de julgamento quanto à matéria de facto. Concretamente, consideram incorrectamente julgados os elementos seguintes:
a) A asserção de que “O) P...... conheceu o comprador do imóvel no dia da venda”, devia ter sido substituída pela asserção de que “P...... conheceu o comprador do imóvel antes do dia da venda do imóvel e promoveu e acompanhou o mesmo em visitas ao imóvel em causa nos autos”;
b) “Não resultam provados os fatos que contrários a estes se mostram e ainda, especificadamente os factos articulados sob os artigos 13°, 15°, 16° da petição inicial …” [artigo 13.º da petição inicial - «Por realmente ter logrado obter comprador para o prédio em causa pagaram a quantia de €235.500,00, conforme comprova a folha de movimentos bancários junta à reclamação como doc. 9, o qual os impugnantes estavam convencidos de que havia sido emitido apenas em nome de P...... , vindo depois a verificar que o beneficiário foi a sociedade comercial H...... , Lda». // artigo 15.º da petição inicial - «Sucede também que de tal valor o seu beneficiário nunca deu quitação, nomeadamente, através da emissão de recibo, mesmo depois de instado a isso pelos impugnantes». // artigo 16.º da petição inicial - «Nem emitiu qualquer factura correspondente a esse serviço»].
c) Os factos invocados nos artigos 19.º e 20.º da petição inicial deviam ter sido dados como provados e não foram, ou seja deve considerar-se provado que o impugnante apenas assinou o cheque, sendo os demais campos preenchidos pelo Sr. P...... .
Invocam a prova testemunhal e documental.
2.2.3. Está em causa aferir se o alegado pagamento respeitante a invocada comissão de venda do imóvel aquando da sua alienação se integra no conceito de “despesas necessárias e efectivamente praticadas inerentes à aquisição e alienação de direitos reais sobre imóveis”, para efeitos do disposto no artigo 51.º/a), do CIRS, dado possuir suporte probatório suficiente da sua efectividade.
«Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais ou profissionais, de capitais ou prediais, resultem: // a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário»(1).
«O ganho sujeito a IRS é constituído: // a) Pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais…»(2).
«Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem: // a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º».
Sobre a matéria constituem pontos firmes os seguintes:
a) «Sobre o conceito de “despesas necessárias (…), inerentes à alienação”, (…) [a] Administração Fiscal aceita que são consideradas dedutíveis as despesas que se relacionem com a obtenção da mais valia, como o pagamento da remuneração a uma empresa de mediação, no processo de transmissão de determinado bem imóvel. A Administração Fiscal reconhece que, uma vez demonstrada de forma inequívoca a conexão entre o montante pago à empresa de mediação e a transacção concreta que originou a mais valia tributável, nada obsta a que se considere a comissão de intermediação como despesa necessária para efeitos do disposto na alínea a) do artigo 51º do Código do IRS. Assim, uma vez preenchidos os requisitos necessários para demonstrar de forma inequívoca a conexão do montante pago ao mediador imobiliário com a transacção concreta que originou a mais valia tributável e estando devidamente documentada a intervenção do respectivo mediador nos termos legais aplicáveis, poderá considerar-se a comissão de intermediação como “despesa necessária” para efeitos da alínea a) do artigo 51.º do CIRS – (…)»(3).
b) «[A]s despesas suportadas pelo sujeito passivo que podem ser deduzidas ao valor de aquisição do imóvel para efeitos de mais-valias; // No critério legal, só as despesas inerentes são necessárias, pelo que só elas são relevantes. Tal critério contém uma ideia de inseparabilidade, uma relação intrínseca - que não meramente extrínseca - com a alienação: para ser considerada relevante, a despesa há-de sê-lo pela sua posição relativamente à alienação, há-de, em suma, ser dela indissociável. A despesa há-de ser integrante da própria alienação. Não se vê, efectivamente, que outro sentido se possa atribuir à expressão “inerentes à alienação”; Não basta, pois, que as despesas sejam conexas à obtenção do rendimento, é necessário que elas dele sejam indissociáveis»(4).
c) «Para determinação das mais-valias fiscais, as despesas necessárias e efectivamente praticadas inerentes à alienação podem ser adicionadas ao valor de aquisição. // Por outras palavras, a mais-valia resultante da venda do bem imóvel é igual à diferença entre o preço de aquisição, descontado das despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à alienação. // Permite, assim, a lei que o montante dispendido, nomeadamente, com empresas imobiliárias, inerentes à venda de imóveis tem cabimento na referida alínea a), devendo, no entanto, ser devidamente comprovada»(5).
2.2.4. Para julgar improcedente a presente impugnação, a sentença estruturou, em síntese, a argumentação seguinte:
«Com efeito, de toda a factualidade apurada se extrai a conclusão de que os Impugnantes, para efeitos de concretizarem a venda do imóvel descrito em A) do probatório encetaram contactos com pessoas, alegadamente, com conhecimentos nessa área. Aliás, decorreu da prova testemunhal isso mesmo. Sucede, contudo, que não logrou o Tribunal ficar convicto de que tenham sido as testemunhas - P...... e A...... - a intervir como tal no negócio e, por essa via, terem sido pagos por serviços que tenham prestado aos Impugnantes. A atestar esta convicção temos ambas as testemunhas a demonstrarem desconhecimento em relação ao efectivo comprador. Acresce que ocorre um pagamento do Impugnante à sociedade comercial de que é gerente uma das testemunhas em dia imediatamente contínuo à celebração da escritura pública. Na verdade o pagamento foi efectuado à sociedade. Inexiste recibo, desconhece-se o tratamento contabilístico que foi dado na sociedade, desconhece-se se existiam pagamentos pendentes de parte a parte por serviços eventualmente antes prestados.
A tais dúvidas que se enumeram acrescentam-se, ainda, e reputando-se de superiormente significativas, as circunstâncias de ter sido declarado voluntariamente pelos Impugnantes na escritura pública a inexistência de mediação imobiliária no negócio aí vertido, e ainda o facto de a alegada comissão representar valor superior a 20% do preço final. Ora tal valor afigura-se-nos irrazoável para os valores de mercado de comissões praticados.
Pelas razões enunciadas, e ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova pelo julgador, resulta não demonstrada a efetiva existência de angariadores ou mediação imobiliária no negócio em questão.
Todavia, e ainda que ao Tribunal se afigurasse distinta a sua convicção nos elementos probatórios que lhe foram apresentados sempre estes se mostram insuficientes para a exigência que o legislador apresenta como necessária. Recorde-se que o legislador impõe a existência de custo devidamente comprovado. Ora, somente se admite que seja devidamente comprovado o que reveste a forma legal. E, manifestamente, esse não é o caso dos autos. Aliás, a “simplificação” pareceu ser a nota neste negócio pelo que não pode o Tribunal, neste momento, permitir a entrada pela janela de situação fáctico-jurídica que intencionalmente os Impugnantes não pretenderam que “entrasse pela porta”.
Improcede, pois, a presente impugnação».
Recorde-se que em sede de fundamentação da decisão da matéria de facto consignou-se o seguinte:
«Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos dos autos, designadamente naqueles constantes do processo administrativo anexo e juntos à petição inicial.
Atendeu-se, ainda, no depoimento das testemunhas a parte que se mostrou credível. Contudo mostraram-se as testemunhas hábeis na prestação das suas declarações procurando atestar que a sua intervenção no negócio em causa nos autos se mostrava escortinado pela Administração Tributária, para tanto procurando justificar o recebimento de uma comissão paga pelo Impugnante. Todavia, ambos foram unânimes em referir desconhecer ou somente ter conhecido no dia da escritura o comprador do imóvel. Decorre, porém, do senso comum que aquele que angaria ou que medeia algo tem que necessariamente interagir com todas as partes por forma a compor o negócio previsto. Faltando-lhe este elemento essencial, falta a demonstração lógica da angariação / mediação do negócio.
Quanto aos factos alegados e não demonstrados registe-se a regra quanto à sua prova. Nos termos do disposto no n° 1 do art. 74° da LGT o ónus da prova dos factos constitutivos do direito recai sobre quem os invoque. Destarte, todos os factos enunciados pelos Impugnantes que se não mostram assentes decorre a sua falta de demonstração de ausência de prova nesse sentido».
2.2.5. Da impugnação da matéria de facto e do alegado erro de julgamento.
Os recorrentes pretendem fazer valer tese diversa da que fez vencimento na instância.
Sem embargo, a inexistência de contrato de mediação imobiliária que suportaria as alegadas despesas com comissões resulta dos elementos descritos na alínea H), do probatório, do facto de o cheque em causa ter sido emitido em favor de uma sociedade terceira, sem intervenção no negócio em referência, da inexistência de facturas ou de recibos emitidos pelos alegados comissionistas, bem como da alegada comissão representar um valor superior a 20% do preço final, o que não se oferece razoável. Ao invés do referido pelos recorrentes, o valor constante do cheque e que foi descontado corresponde a €253.500,00 e não aos € 235.000,00, pelos mesmos alegados.
Tendo o pagamento sido efectuado na pessoa de uma sociedade terceira ao negócio em causa, cumpriria esclarecer os termos das relações comerciais que intercedem entre a mesma, os intervenientes no negócio jurídico em causa e os alegados angariadores do mesmo. Esclarecimento que não foi feito pelos recorrentes, dado que não alegam factos concretos nesse sentido.
O título que documenta o contrato de prestação de serviços (mediação imobiliária) não existe, como não existe prova do recebimento das quantias em causa por parte dos alegados comissionistas, como também não existe prova das alegadas visitas ao imóvel.
Com vista ao cumprimento do ónus probatório dos recorrentes (artigo 51.º/1a), do CIRS) e do ónus de impugnação especificada da matéria assente (artigo 640.º do CPC), não basta a invocação dos meios probatórios, das asserções de facto que pretende reverter e das asserções de facto que pretende ver acolhidas. Importa que, em tal ensejo, ocorra a relevância ou a pertinência das pretendidas alterações. O que no caso não se verifica, dado que os termos, os beneficiários e o título em que terá ocorrido o pagamento em apreço não se mostram esclarecidos nos autos.
Recorde-se que o critério legal de relevação das despesas em causa consiste em demonstrar que as mesmas eram necessárias, foram efectivamente praticadas e inerentes à alienação do imóvel (artigo 51.º/1a), do CIRS). Ónus de demonstração que, no caso, não foi observado por aqueles que invocam o custo, ou seja, os recorrentes (artigo 74.º/1, da LGT).
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não merece censura, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
DISPOSITIVO
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelos recorrentes.
Registe.
Notifique.


(Jorge Cortês - Relator)


(1º. Adjunto)

(2º. Adjunto)

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(1) Artigo 10.º/1/a), do CIRS.
(2)Artigo 4.º/a) do CIRS.
(3)Acórdão do STA, de 15.09.2010, P. 0329/10
(4)Acórdão do TCAS, de 14/04/2015, P. 06824/13
(5)Parecer da Procuradora da República, de fls. 155/158.