Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07829/11
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:03/22/2012
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:ÓNUS DA PROVA, AQUISIÇÃO DE NACIONALIDADE, LIGAÇÃO EFETIVA
Sumário:1.Cada litigante tem, em regra, o ónus de provar a existência dos pressupostos positivos e negativos das normas substantivas favoráveis à sua pretensão/excepção.

2. O art. 343º-1 CC necessita de ser interpretado à luz do art. 342º-2 CC, acabando por ser de aplicar in toto a regra do cit art. 342º-2 CC..

3. E, por isso, cabe aqui ao MP alegar e provar factualidade que demonstre que o réu não tem uma ligação efectiva, material ou real à nação e sociedade portuguesas (art. 9º-a da LN), assim impedindo que o autor prossiga no exercício do direito que invoca (previsto no art. 2º da LN).

4. Está adquirido que o requerente, menor brasileiro nascido em 1994, residente sempre no Brasil, onde estuda, quer ser português e é filho de uma pessoa brasileira que adquiriu em 2008 a nacionalidade portuguesa. Tal conjunto factual prova claramente que o réu não tem uma ligação efectiva, material ou real à nação e sociedade portuguesas.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul:

I.RELATÓRIO

I.1. Processo
· MINISTÉRIO PÚBLICO intentou no T.A.C de LISBOA processo especial de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa contra
· PAULO …………….., filho de Fernando ……………. e Cristina ……………., todos com os demais sinais nos autos, nascido a 6.09.1994, de nacionalidade brasileira, natural de São Paulo, Brasil,

pedindo o arquivamento do processo conducente ao registo da nacionalidade portuguesa.

Por sentença de 28-2-11, o referido tribunal decidiu julgar o pedido procedente.

I.2. Alegações de recurso

Inconformado, o réu recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando nas alegações as seguintes conclusões:

I. A inexistência de factos e a não alegação de factos de que tenha sido dado conhecimento ao Conservador dos Registos Centrais, obrigando-o, nos termos do artº 57º, nº 7 do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (1) a adotar os procedimentos aí previstos, constitui exceção material inominada, que inviabiliza a instância, por dela ser impeditiva.

II. Os factos dados como provados que decorrem dos documentos registrais, provam apenas o que nos registos se contém, não podendo dos mesmos extrair-se nenhuma outra conclusão, para além da que o próprio registo permite.

III. Os factos constantes de declarações apresentadas pelos representantes legais do recorrente não são constitutivos de inexistência de uma ligação à comunidade nacional.

IV. Os factos provados não são, de modo e nenhum, indiciários de uma falta de ligação à comunidade nacional, podendo coexistir em existir em indivíduos que tenham um profunda ligação a essa comunidade.

V. Tais factos não são impeditivos de uma forte ligação à comunidade nacional.

VI. Tais factos não permitem, por si só, fundamentar um juízo de indesejabilidade de receção dos indivíduos por eles marcados na comunidade portuguesa.

VII. A lei não exige que o candidato à aquisição da nacionalidade pelo casamento demonstre perante o conservador ou o tribunal que se encontra inserido na comunidade nacional.

VIII. Ao pressupor essa exigência, a douta sentença recorrida ofende o disposto no artº 57º,3 do Regulamento da Nacionalidade, em que tal exigência não se encontra prevista.

IX. A partir da reforma da Lei da Nacionalidade introduzida pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril, complementada pelo Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de Fevereiro, deixou de ser exigível ao requerente da aquisição da nacionalidade por efeito da vontade a demonstração de que se encontra inserido na comunidade nacional.

X. Em consonância com as obrigações assumidas no quadro da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade, a Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril, veio estabelecer a presunção de que os filhos menores dos que adquirem a nacionalidade portuguesa têm uma ligação efetiva à comunidade nacional, porém ilidível mediante a alegação e prova de factos que comprovem a inexistência de tal ligação.

XI. A ligação efetiva à comunidade nacional tem que ser aferida à luz dos princípios da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade, não podendo ser discriminatória em razão de raça ou origem nacional ou étnica, em conformidade com o artº 5ª da referida Convenção (2).

XII. A obrigação de o requerente se pronunciar sobre a efetiva ligação à comunidade nacional resume-se, por força do modelo aprovado, à escolha de um SIM ou de um NÃO no formulário pré-estabelecido.

XIII. A douta decisão recorrida, ao pressupor que o requerente tinha que apresentar provas adicionais ou fazer de declarações não contidas no formulário, ofende, também, o disposto no artº 32º,2 do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (3).

XIV. No quadro da versão da Lei da Nacionalidade aprovada pela Lei Orgânica nº 2/2006, cit. e do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa aprovado pelo Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de Dezembro a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa passou a depender de participação do Conservador dos Registos Centrais, vinculada às regras do artº 57º,7 do Regulamento da Nacionalidade.

XV. A Conservatória dos Registos Centrais não participou ao Ministério Público quaisquer factos suscetíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidade por efeito da vontade.

XVI. O processo está ferido, desde a sua origem, por violação do artº 57º,7 do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa.

XVII. A inexistência de ligação efetiva á comunidade portuguesa não pode provar-se por documentos registrais ou por declarações dos interessados que não a indiciem.

XVIII. Para que possa ser promovida a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa com fundamento na falta de ligação à comunidade nacional, é indispensável que o conservador dos Registos Centrais apresente factos concretos e provas concretas que permitam ilidir tal presunção e que permitam fundar um juízo de indesejabilidade do indivíduo na comunidade portuguesa.

XIX. A oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa só pode ser deduzida em circunstâncias que indiciem de forma inequívoca a indesejabilidade de quem pretenda adquirir a nacionalidade portuguesa.

XX. A aquisição da nacionalidade portuguesa por parte de cônjuge de cidadão português é um direito fundamental, a que o Ministério Público não pode oferecer oposição sem que, para tanto, tenha a certeza e tenha provas da indesejabilidade da integração do indivíduo em causa na comunidade nacional.

XXI. A oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa por parte de filho menor de quem adquire a nacionalidade constitui uma manifestação de censura à constituição da própria família concreta, implicando a rejeição de um elemento da mesma, pelo que só deve se deduzida quando, por razões de ordem pública, se conclua pela necessidade de um «divórcio» politico, relativamente ao filho menor, que declare inaceitável a integração de tal filho na comunidade portuguesa.

XXII. O direito à aquisição da nacionalidade por parte de filho menor de quem adquire a nacionalidade portuguesa constitui um direito fundamental, a que se aplica o regime do artº 18º da Constituição.

XXIII. A douta decisão recorrida, tal como foi formulada, não encontra na lei nenhum suporte concreto, ofendendo o disposto no artº 9º, 1 e 2 do Código Civil, o artº 9º, al. a) da Lei da Nacionalidade (4), o artº 57º,7 do Regulamento da Nacionalidade, e os artºs 18º, 26º e 36º,6 da Constituição.

*

Nas contra-alegações, o recorrido diz:

A) O Ministério Público instaurou acção de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa contra Paulo Augusto ……………., nascido a 6 de Setembro de 1994, de nacionalidade brasileira, natural de São Paulo, Brasil, e aí residente.

B) O Réu contestou, alegando, em suma, que, relativamente aos menores cujo pai ou mãe adquire ou tenha adquirido a nacionalidade portuguesa, a Convenção Europeia sobre a Nacionalidade, no seu artigo 6.°, n. 4, estabelece a obrigatoriedade de o Estado lhes permitir a aquisição da nacionalidade portuguesa. Alegou ainda, por um lado, que o Réu não apresentou, nem tinha que apresentar quaisquer provas de ligação à comunidade portuguesa, porque tal não lhe é exigível por lei e, por outro, que a aquisição da nacionalidade portuguesa por parte de filhos menores de cidadãos que adquiriram a nacionalidade portuguesa é problema de direitos fundamentais, pelo que deve ser enquadrado no regime do artigo 18.° da Constituição da República Portuguesa.

C) Foi proferida sentença, julgando procedente a oposição deduzida pelo Ministério Público à aquisição da nacionalidade portuguesa.

Fundamentação de facto e de Direito

O Mmo. Juiz a quo considerou provada a matéria de facto, com base na análise crítica dos documentos constantes dos autos, nos termos da douta sentença que aqui se dá por reproduzida.

Aderindo, no essencial, à fundamentação constante da sentença, salientamos o seguinte:

1 - O artigo 4.° da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade (5) consagra que o direito interno de cada Estado permitirá a aquisição da sua nacionalidade, entre outros, dos filhos menores de um dos seus nacionais, aos quais seja aplicável a excepção prevista 6.°, n. 1, alínea a). (6)

O Estado Português, na sua legislação, consagra a faculdade de qualquer estrangeiro menor obter a nacionalidade portuguesa, desde que preenchidos os requisitos para essa concessão de nacionalidade. Ora, sendo entendimento do Réu que não tinha que apresentar quaisquer provas de ligação à comunidade portuguesa, por tal não ser legalmente exigível, não resultou demonstrado e com o grau de intensidade exigido, que detenha já uma ligação efectiva à comunidade portuguesa, ou sequer que se encontra num processo estruturado e revelador de uma caminhada para adquirir a nacionalidade portuguesa.

2 - Sendo este um problema de direitos fundamentais - como tal enquadrável no regime do artigo 18.oda Constituição da República Portuguesa -, não significa que se esteja perante um direito absoluto. Porém, desde que fique salvaguardado o núcleo essencial do direito fundamental em causa, a lei pode introduzir limitações aos exercícios dos direitos, liberdades e garantias e direitos análogos - como a lei da nacionalidade o faz.

3 - O actual artigo 37.°, n. 1, do Regulamento da Nacionalidade, aprovado pelo Decreto-Lei n. 237-A/2006, de 14 de Dezembro (7), continua a consignar como ónus do interessado a instrução dos requerimentos com os documentos necessários para a prova das circunstâncias de que depende a atribuição, aquisição ou perda da nacionalidade.

4 - A oposição a aquisição da nacionalidade - no que tange à falta de ligação efectiva à comunidade nacional - continua a derivar da existência de um requerimento feito por alguém que pretenda adquirir a nacionalidade portuguesa, considerando que lhe assiste um direito e devendo pronunciar-se sobre a existência dessa ligação.

5 - A acção destinada à declaração de inexistência de ligação à comunidade portuguesa continua a configurar-se como uma acção de simples apreciação negativa.

6 - De acordo com o disposto no artigo 343.°, n. 1, do Código Civil, nas acções de simples apreciação negativa compete ao réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga.

*

Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora decidir em conferência.

I.3. Objecto do recurso

O objecto do recurso jurisdicional está na decisão recorrida e seus fundamentos. O âmbito do recurso é delimitado pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (conclusões necessariamente sintéticas e com a indicação das normas jurídicas violadas) e apenas pode incidir sobre questões (coisa diversa das considerações, argumentos ou juízos de valor (8)) que tenham sido apreciadas ou devessem ser anteriormente apreciadas, não se podendo confrontar o tribunal superior com questões novas (9) ou cobertas por caso julgado (logicamente, sem prejuízo do conhecimento das questões de conhecimento oficioso).

*

II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1. FACTOS CONSIDERADOS PROVADOS

O tribunal recorrido fixou assim a factualidade relevante provada:

1.

O Requerido, PAULO …………………, nasceu a 6.09.1994, em São Paulo, Brasil (doc.s de fls. 9-10 e 14-15).

2.

A sua mãe, Cristina …………… e depois do casamento Cristina ………….., veio a adquirir a nacionalidade portuguesa nos termos do artigo 6.°, n. 4, da Lei n. 37/81, de 3 de Outubro, conforme averbamento de 17.11.2008 - decisão do Conservador-Auxiliar dos Registos Centrais de 14.11.2008 (cfr. doc. a fls. 11-12).

3.

Pelo requerimento entrado nos serviços da CRC em 16.09.2009, o Requerido, através dos seus pais, requereu a nacionalidade portuguesa ao abrigo do artigo 2.° da Lei da Nacionalidade, por ser filho menor de indivíduo que adquiriu a mesma nacionalidade (cfr. requerimento de fls. 4-5, o qual se dá por integralmente reproduzido).

4.

Com base em tal declaração foi instaurado na Conservatória dos Registos Centrais o proc. n. 36911 de 2009, no qual não foi lavrado o registo em questão.

5.

O Requerido sempre residiu no Brasil, onde estuda (cfr. doe. de fls. 12 e por confissão).

6.

O Requerido fala português (acordo).

7.

Dou por integralmente reproduzido o teor do doc. de fls 7-8 (carta dirigida à CRC).

8.

Como resulta dos doc.s de fls, 20, 22-23, 28, 32, a mãe do interessado interveio por diversas vezes no procedimento administrativo de referência, pedindo esclarecimentos e efectuando solicitações.

9.

E nessa sequência foi remetido aos pais do Requerido o ofício cuja cópia consta a fls 35, donde consta: "Se quiser poderá V. Exa., com a maior brevidade (até 16 de Julho de 2010), juntar provas de ligação à comunidade nacional portuguesa, as quais serão devidamente ponderadas na decisão de efectuar ou não a referida participação [participação ao MP para eventual dedução de oposição]".

10.

Os pais do Requerido nada mais vieram requerer ou juntar ao processo administrativo (confissão).

11.

Com o Requerimento inicial, foi junto "Poup Jovem Cx Geral Depósitos", "Declaração da Câmara Portuguesa de Comércio no Brasil" e "Print da Newsletter Portal do Cidadão" (acordo e doc. de fls. 9-10).

12.

Dou por integralmente reproduzido o teor do despacho proferido no processo n. 36911/09, da CRC, constante de fls. 36-38.

*

II.2. APRECIAÇÃO DO RECURSO

A)

A fundamentação jurídica do tribunal a quo é a seguinte:

«A oposição à aquisição de nacionalidade, no que tange à falta de ligação efectiva à comunidade nacional (que é o que está em causa no presente processo) continua a derivar da existência de um requerimento feito por alguém que pretende adquirir a nacionalidade portuguesa, considerando que lhe assiste esse direito e devendo pronunciar-se sobre a existência daquela ligação. A constatação, face às explicações dadas, de que as razões aduzidas serão insuficientes para se concluir pela ligação à comunidade nacional, levará à comunicação ao Ministério Público para a instauração do processo de oposição. Como no caso sucedeu.

A acção destinada à declaração da inexistência da ligação à comunidade portuguesa continua, pois e salvo melhor opinião, a configurar-se, como uma acção de simples apreciação negativa. Neste sentido concluiu o acórdão da Relação de Lisboa de 15-02-2007, proc. n. 7772/06, cujo sumário parcialmente se transcreve:

A acção de simples apreciação tem por fim unicamente obter a declaração da existência ou inexistência de um direito ou de um facto (art. 4,°, n. 2, al. a), do CPC).

Donde, considera-se, no que aqui interessa, que a lei não alterou o figurino da oposição à aquisição da nacionalidade como acção de simples apreciação negativa, destinada à demonstração da inexistência de ligação à comunidade nacional, com as consequências daí advindas.

Ora, de acordo com o disposto no art. 343.°, n. 1 do C. Civil, nas acções de simples apreciação ou declaração negativa, compete ao réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga (v. supra).

Ao exposto acresce que recentemente o TCA Sul no Acórdão de 2.10.2008, proc. n. 4125/08, veio a concluir no sentido supra proposto, decidindo que as acções de oposição à aquisição de nacionalidade portuguesa devem ser classificadas como acções de simples apreciação negativa, pelo que, atento o disposto no art 343.°, n. 1, do C. Civil, compete ao Réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga.

Muito sugestivamente, em consideração que aqui se sufraga na íntegra, conclui igualmente o TCA Sul no acórdão referido que: "De qualquer modo, pelo facto de estarmos perante uma acção que é consequência de uma pretensão, junto dos Registos Centrais, por parte do interessado, que aí manifesta a sua intenção de adquirir a nacionalidade portuguesa, também lhe cabe, de acordo com as regras gerais do ónus da prova, demonstrar os factos constitutivos da sua pretensão."

Ou como refere o recente acórdão de 19.11.2009 do TCA Sul no processo n. 05367/09: "a prova dos factos constitutivos de tal direito incumbe ao interessado na aquisição da nacionalidade portuguesa”.

ii) Apreciação do caso concreto

Nos termos do art 2.° da Lei da Nacionalidade - o pedido foi formulado ao abrigo dessa disposição legal - os filhos menores ou incapazes de pai ou mãe que adquira a nacionalidade portuguesa podem também adquiri-la, mediante declaração.

A lei passou a referir-se, como se disse anteriormente, apenas à inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional.

A jurisprudência tem vindo, ao longo dos anos, a defender que a ligação efectiva à comunidade nacional há-de ser aferida por todo um conjunto de factores, como o domicílio, a língua, as relações familiares, um conhecimento mínimo da História e da Geografia do País, ou seja, de tudo aquilo em que se possa radicar um sentimento de pertença.

No Ac. da Rel. de Lisboa, de 26.09.2001 (in www.dgsi.pt) alinhou-se por esse diapasão, ao referir-se que a ligação efectiva à Comunidade Nacional há-de compreender-se "em função de factos relacionados com diversos factores, a saber, e inter alia, o domicílio, a língua, a família, a cultura, as relações de amizade, a integração social e económico-profissional. E tal em ordem a expressar um sentimento de pertença perene à Comunidade Portuguesa."

Noutros arestos (acedidos também na citada base de dados) fala-se da demonstração de "um espírito e sentimento forte de portuguesismo e patriotismo próximos dos nacionais originários" (Ac. Rel. Lisb. de 17.12.98); ou de que já, "no todo ou em parte, se é, psicológica e sociologicamente, português" (Ac. R.L., também de 17.12.98); ou de que "deverá ter por base o domicílio, a língua, os aspectos culturais, sociais, familiares, económico-profissionais, de amizade e outros que traduzam a ideia de um sentimento de pertença à comunidade nacional" (Ac. Rel. Lisb de 30.04.98), não podendo a comunidade portuguesa ser "entendida como o círculo restrito dos familiares e amigos do requerente estrangeiro e sua esposa" (Ac. Rel. L., de 27.05.97), exigindo-se "a verificação de elos consistentes de natureza económica, profissional, social e cultural, de modo a corporizarem um sentimento de pertença efectiva à comunidade portuguesa, manifestados de forma mais ou menos prolongada e não através de actos isolados ou escassos" (Ac. Rel. Lisb., de 11.03.99).

Com especial aplicação no caso em apreço, especificou já o Supremo Tribunal de Justiça, no Ac. de 14.12.2006, proc. n.o 06B4329, que: "Não resulta da lei, para os casos de pretensão de aquisição da cidadania portuguesa por filho menor de quem a adquiriu, a desvinculação de algumas das suas exigências. Apesar do interesse da família nuclear da unidade de nacionalidade de pais e filhos, a lei não o arvorou em elemento suficiente ou particularmente relevante para a aquisição da nacionalidade por estrangeiros filhos de quem tenha adquirido a cidadania portuguesa. Não define a lei o que deve entender-se por ligarão efectiva à comunidade nacional. Mas ela tem a ver com a identificação, por parte do interessado, com a comunidade nacional, como realidade complexa em que se incluem factores objetivos de coesão social."

Donde, a ligação efectiva à comunidade nacional portuguesa envolve, naturalmente, factores vários, designadamente o domicílio, a língua falada e escrita, os aspectos culturais, sociais, familiares, económicos, profissionais e outros, reveladores de um sentimento de pertença à comunidade portuguesa, em Portugal ou no estrangeiro. Necessário é pois que se possa concluir que se encontra estruturada e arreigada no âmago do candidato a caminhada para adquirir a nacionalidade portuguesa.

Ora, face aos elementos constantes dos autos e na ausência de outros, entende-se que se pode concluir pela inexistência de ligação efetiva à comunidade nacional. Com efeito, e com relevo para a apreciação da presente acção, do Requerido apenas se sabe que é filho de nacional que adquiriu a nacionalidade portuguesa e que fala português (a língua oficial do Brasil). Mas nada se sabe no que se refere a contactos com a comunidade nacional portuguesa, aos conhecimentos que tem dos costumes portugueses, da sua história, das instituições portuguesas, etc.

Temos pois que não vem minimamente demonstrada, por ora, qualquer afinidade com os usos, costumes, tradição e história do povo português, sendo que a circunstância de ser filho de cidadã que adquiriu a nacionalidade portuguesa não representa, por si só - qual conditio sine qua non - o preenchimento do requisito da ligação efectiva à comunidade portuguesa.

Como se acabou de dizer, a circunstância de ser filho de progenitora a quem foi atribuída a nacionalidade portuguesa não pode ser arvorado em elemento bastante de ligação à comunidade portuguesa. Caso contrário, bastaria invocar esse singelo fundamento para que a nacionalidade fosse automaticamente concedida, fundamento esse não acolhido pelo legislador.

Impor-se-ia, portanto, que o Requerido trouxesse ao processo outros elementos que pudessem fundar o direito à aquisição da nacionalidade portuguesa, na sequência do requerido junto da Conservatória dos Registos Centrais. O que não fez.

Aliás, o actual art. 37.°, n. 1, do Regulamento da Nacionalidade, aprovado pelo Decreto-Lei n. 237-A/2006, de 14 de Dezembro, continua a consignar como ónus do interessado a instrução dos requerimentos com os documentos necessários para a prova das circunstâncias de que depende a atribuição, aquisição ou perda de nacionalidade portuguesa.

Por outro lado, também o invocado art. 6.°, n. 4, da Convenção Europeia sobre a Nacionalidade não impede a conclusão alcançada.

Donde, consagrando o Estado português na sua legislação a faculdade a qualquer estrangeiro menor, cujo pai ou mãe adquira ou tenha adquirido a nacionalidade portuguesa, de obterem a nacionalidade portuguesa, não se alcança a alegada violação/preterição deste princípio. Coisa distinta é a necessidade de preenchimento dos requisitos para essa concessão da nacionalidade. E no seu caso concreto, não vem demonstrado pelo Requerido, com o grau de intensidade exigido, que detenha já uma ligação efectiva à comunidade portuguesa ou sequer que se encontra num processo estruturado e revelador de uma caminhada para adquirir a nacionalidade portuguesa.

Aliás, como olimpicamente decorre da contestação apresentada, é entendimento do Requerido que não tinha que apresentar quaisquer provas de ligação à comunidade portuguesa, porque tal não lhe é exigível por lei.

Por outro lado ainda, cumpre referir que é verdade que o problema da aquisição da nacionalidade por parte dos filhos menores dos cidadãos que adquiriram a nacionalidade portuguesa é problema de direitos fundamentais, devendo ser enquadrado no regime do art, 18.0 da CRP. Efectivamente assim é.

Porém, tal não significa que se esteja perante um direito absoluto. Com efeito, a lei pode introduzir limitações ao exercício dos direitos, liberdades e garantias e direitos análogos - como a lei da nacionalidade o faz - desde que fique salvaguardado o chamado núcleo essencial do direito fundamental em causa. Ora, na presente situação, aplicando a lei ao caso concreto, não se vê em que medida possa ter ocorrido uma aplicação da lei susceptível de afectar o assinalado direito fundamental. Mais uma vez, a questão é a do preenchimento dos requisitos de que depende a concessão da nacionalidade - e não se pode conceber que a mesma seja susceptível de atribuir por mera declaração, sem mais -, devendo, portanto, o interessado instruir o processo com elementos demonstrativos da declarada ligação efectiva à comunidade nacional. Mais, como a experiência deste tribunal neste domínio permite atestar, inúmeros são os casos de atribuição da nacionalidade (quer na fase administrativa, quer na fase contenciosa), significando isto que o dito núcleo essencial do direito fundamental permanece intacto e operativo.

Tudo visto, entende-se, repetindo o já afirmado, que por ora não vem minimamente demonstrado o preenchimento do requisito da ligação efectiva à comunidade portuguesa.»

B)

A decisão recorrida, tal como foi formulada, não encontra na lei nenhum suporte concreto, ofendendo o disposto no artº 9º do Código Civil, o artº 9º-a) da Lei da Nacionalidade (10), o artº 57º-7 do Regulamento da Nacionalidade (11), e os artºs 18º (12), 26º (13) e 36º-6 (14) da Constituição?

Constitui fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa a inexistência de ligação efectiva do interessado à comunidade nacional. Esta ligação efectiva/material/real à nação/sociedade portuguesa há-de resultar, naturalmente, de indícios de vária ordem, caso a caso.

No caso presente, está apenas provado que o requerente, menor brasileiro nascido em 1994, residente sempre no Brasil, onde estuda, quer ser português e que é filho de uma pessoa brasileira que adquiriu em 2008 a nacionalidade portuguesa. Nada mais se alegou e provou, além de ser óbvio que o menor fala a língua de Camões.

O tribunal a quo considerou que não se preencheu, assim, o requisito (para a aquisição da nacionalidade) da ligação efectiva à comunidade portuguesa.

Ora, o recorrente considera, além do mais, que:

- A partir da reforma da Lei da Nacionalidade introduzida pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril, complementada pelo Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de Fevereiro, deixou de ser exigível ao requerente da aquisição da nacionalidade por efeito da vontade a demonstração de que se encontra inserido na comunidade nacional; a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa só pode ser deduzida em circunstâncias que indiciem de forma inequívoca a indesejabilidade de quem pretenda adquirir a nacionalidade portuguesa;

-A oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa por parte de filho menor de quem adquire a nacionalidade constitui uma manifestação de censura à constituição da própria família concreta.

Das normas portuguesas que transcrevemos, resulta claro que a Convenção cit. (arts. 4º a 6º) não foi desrespeitada de todo: a lei nacional não faz nenhuma das discriminações ali proibidas e permite a “nacionalização portuguesa” de menores estrangeiros filhos de portugueses dentro das regras da Convenção.

Aliás, no caso presente, releva o facto de o menor ter nascido brasileiro em 1994, filho de brasileiros, e depois (em 2008) se ter tornado filho de uma cidadã brasileira que se tornou portuguesa. O art. 6º da Convenção não é minimamente beliscado pela nossa lei nesta sede concreta.

O essencial aqui tem a ver com as regras do ónus da prova aplicáveis (v. arts. 341º ss CC), ou melhor, com a disciplina dos efeitos da falta de prova de certos factos ou da dúvida sobre certos factos (A. VARELA et al., Manual…, 2ª ed., p. 447ss), pois dela resulta a sorte da acção.

A nossa Lei da Nacionalidade, respeitando perfeitamente o art. 6º da Convenção, prevê como obstáculo à aquisição da nacionalidade a inexistência de uma ligação efectiva, material ou real à nação ou sociedade portuguesas.

Também prevê que:

- «O adoptado plenamente por nacional português adquire a nacionalidade portuguesa».

- «Os filhos menores ou incapazes de pai ou mãe que adquira a nacionalidade portuguesa podem também adquiri-la, mediante declaração». É a aquisição da nacionalidade por efeito da vontade. Portanto, tais menores têm o (logicamente raro) direito (legal) de adquirirem a nacionalidade portuguesa.

Neste quadro específico, a (in)existência de uma ligação efectiva, material ou real à nação ou sociedade portuguesas tem de ser provada por quem (v. arts. 342º e 343º-1 CC)? (15)

Àquele que invocar (em juízo) um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado (art. 342º-1 CC). Ora, note-se que aqui o menor não é o autor desta acção.

A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado (em juízo e fora dele) compete àquele contra quem a invocação é feita (art. 342º-2 CC).

Cada litigante tem, portanto e em regra, o ónus de provar a existência dos pressupostos positivos e negativos das normas substantivas favoráveis à sua pretensão/excepção (assim: arts. 342º CC e 516º CPC; e A. VARELA et al., ob. cit., p. 455, 460 e 461; e ALBERTO DOS REIS, CPCA, III, p. 278).

No entanto, nas acções de simples apreciação ou declaração negativa (ou provocationes ad agendum: ANSELMO DE CASTRO, DPCD, I, 1981, p. 116 e 122), como a presente, pretendendo-se obter a declaração judicial da inexistência de um direito (A. VARELA et al., Manual…, 2ª ed., p. 20-21) a que outrem se arroga, compete ao réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arrogou e arroga – art. 343º-1 CC.

Mas, se assim fosse sem mais, teríamos um ciclo vicioso, que redundaria em estas normas (arts. 342º e 343º-1 CC) serem inúteis ou tautológicas.

É por isto que o cit. art. 343º-1 CC necessita de ser interpretado à luz do cit art. 342º-2 CC, acabando por ser de aplicar in toto a regra cit. do art. 342º-2 CC (assim: J. P. REMEDIO MARQUES, A Acção Declarat…, 3ª ed., p. 130): a prova dos factos impeditivos (…) do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita, mesmo que este seja o autor da acção.

E, por isso, cabe aqui ao MP alegar e provar factualidade que demonstre que o réu não tem uma ligação efectiva, material ou real à nação e sociedade portuguesas (art. 9º-a da LN), assim impedindo que o autor prossiga no exercício do direito que invoca (previsto no art. 2º da LN).

Isto quer dizer que, se os factos apurados ou adquiridos em juízo nada ou pouco esclarecerem sobre tal assunto nuclear, o autor obviamente perderá a acção.

Ora, no caso presente, está adquirido que o requerente, menor brasileiro nascido em 1994, residente sempre no Brasil, onde estuda, quer ser português e é filho de uma pessoa brasileira que adquiriu em 2008 a nacionalidade portuguesa. Nada mais se provou, além de ser óbvio que o menor fala a língua de Camões, comum aos 2 países.

Dali resulta que o que distingue o menor de qualquer outro menor brasileiro com a mesma idade é apenas a sua vontade e o facto de a sua mãe ter adquirido a nacionalidade portuguesa quando ele tinha 14 anos.

É isso uma ligação efectiva, material ou real à nação e sociedade portuguesas? Não.

Tal conjunto factual prova claramente que o réu não tem uma ligação efectiva, material ou real à nação e sociedade portuguesas. Dir-se-ia que, neste caso, o MP não teve de se esforçar muito para demonstrar que o réu não tem a ligação real à sociedade portuguesa.

C)

Não colhem aqui os argumentos do recorrente a favor do direito a constituir ou a ter família (direito da mãe do réu), que esta acção não põe em causa. De todo.

O previsto no artº 57º-7 do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (16) não condiciona absolutamente a actividade do MP; trata-se de um dever legal de um órgão da Administração. Apenas. O processo não está portanto ferido, desde a sua origem, por violação do artº 57º-7 do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa. Para que possa ser promovida a oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa com fundamento na falta de ligação à comunidade nacional, não é indispensável que o conservador dos Registos Centrais apresente factos concretos e provas concretas que permitam ilidir uma presunção inexistente e que permitam fundar um juízo de indesejabilidade do indivíduo na comunidade portuguesa.

Não existe aqui qualquer ofensa do artº 57º-3 do Regulamento da Nacionalidade.

É verdade que a partir da reforma da Lei da Nacionalidade introduzida pela Lei Orgânica nº 2/2006, de 17 de Abril, complementada pelo Regulamento da Nacionalidade Portuguesa, aprovado pelo Decreto-Lei nº 237-A/2006, de 14 de Fevereiro, deixou de ser exigível ao requerente da aquisição da nacionalidade por efeito da vontade a demonstração de que se encontra inserido na comunidade nacional. Mas não desapareceu a possibilidade de se provar em juízo o oposto de tal inserção, mesmo com factos apresentados pelo réu. É que a lei continua a exigir, legitimamente, uma ligação efectiva, material ou real à nação e sociedade portuguesas.

O direito à aquisição da nacionalidade portuguesa por parte de filho menor de quem adquire a nacionalidade portuguesa não constitui um direito fundamental (direito imposto pela dignidade do ser humano) e não é obviamente um direito absoluto e incondicionado.

Motivos por que o recurso não merece provimento.

*

III- DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juizes da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar o recurso improcedente.

Custas a cargo do recorrente.

Lisboa, 22-3-2012

(Paulo Pereira Gouveia; relator) _____________________________________________

(António C. da Cunha) _____________________________________________________

(J. Fonseca da Paz) _______________________________________________________


(1) Art. 57º
1 - Quem requeira a aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou por adopção, deve pronunciar-se sobre a existência de ligação efectiva à comunidade nacional e sobre o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo anterior.
2 - Exceptua-se do disposto no número anterior a aquisição da nacionalidade por parte de quem a tenha perdido, no domínio do direito anterior, por efeito do casamento ou da aquisição voluntária de nacionalidade estrangeira.
3 - Para efeitos do disposto no n.º 1, o interessado deve:
a) Apresentar certificados do registo criminal, emitidos pelos serviços competentes do país da naturalidade e da nacionalidade, bem como dos países onde tenha tido e tenha residência;
b) Apresentar documentos que comprovem a natureza das funções públicas ou do serviço militar prestados a Estado estrangeiro, sendo caso disso.
4 - A declaração é, ainda, instruída com certificado do registo criminal português sem prejuízo da dispensa da sua apresentação pelo interessado nos termos do n.º 7 do artigo 37.º
5 - O conservador ou o oficial dos registos pode, mediante requerimento do interessado, fundamentado na impossibilidade prática de apresentação dos documentos referidos na alínea a) do n.º 3, dispensar a sua junção, desde que não existam indícios da verificação do fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade, que esses documentos se destinavam a comprovar.
6 - A Conservatória dos Registos Centrais deve solicitar as informações necessárias às entidades referidas no n.º 5 do artigo 27.º, sendo aplicável o disposto nos n.os 6 e 7 do mesmo artigo.
7 - Sempre que o conservador dos Registos Centrais ou qualquer outra entidade tiver conhecimento de factos susceptíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidade, por efeito da vontade ou por adopção, deve participá-los ao Ministério Público, junto do competente tribunal administrativo e fiscal, remetendo-lhe todos os elementos de que dispuser.
8 - O Ministério Público deve deduzir oposição nos tribunais administrativos e fiscais quando receba a participação prevista no número anterior.
(2) Artigo 5.º Não discriminação
1 - As normas de um Estado Parte sobre nacionalidade não conterão distinções nem incluirão qualquer prática que conduza à discriminação em razão de sexo, religião, raça, cor ou origem nacional ou étnica.
2 - Cada Estado Parte regular-se-á pelo princípio da não discriminação entre os seus nacionais, independentemente da nacionalidade ter sido adquirida por nascimento ou em qualquer momento subsequente.
(3) Art. 32º
1 - As declarações a que se refere o n.º 1 do artigo anterior podem ser prestadas em extensões da Conservatória dos Registos Centrais junto de outras pessoas colectivas públicas, em termos a fixar por protocolo a celebrar entre essas entidades e a Direcção-Geral dos Registos e do Notariado, em conservatórias do registo civil e em serviços consulares portugueses, sendo aí reduzidas a auto, e enviadas para a Conservatória dos Registos Centrais, se possível por via electrónica, nas condições que vierem a ser fixadas por portaria do Ministro da Justiça.
2 - Salvo tratando-se de atribuição de nacionalidade mediante inscrição de nascimento no registo civil português, as declarações referidas no número anterior podem ainda constar de impresso, de modelo a aprovar por despacho do director-geral dos Registos e do Notariado, podendo ser apresentadas nas extensões da Conservatória dos Registos Centrais ou enviadas, por correio, para a mesma Conservatória, ou por via electrónica, nas condições que vierem a ser fixadas por portaria do Ministro da Justiça.
3 - As declarações efectuadas nos termos previstos no número anterior só se consideram prestadas na data da sua recepção na Conservatória dos Registos Centrais, devendo ser objecto de indeferimento liminar, no prazo de 30 dias, nos seguintes casos:
a) Quando não constem do impresso de modelo aprovado para esse efeito, ou sejam omitidas menções ou formalidades nele previstas;
b) Quando não sejam acompanhadas dos documentos necessários para comprovar os factos que constituem o fundamento do pedido, sem prejuízo do disposto nos n.os 4 a 7 do artigo 37.º;
c) Quando não sejam apresentados os documentos previstos no n.º 3 do artigo 57.º, sendo caso disso.
4 - Se o conservador ou o oficial dos registos concluir que a declaração deve ser liminarmente indeferida notifica o interessado dos fundamentos que conduzem ao indeferimento para que este se pronuncie, no prazo de 20 dias.
5 - Em caso de indeferimento liminar, as declarações não produzem efeitos, sendo proferida decisão fundamentada por conservador ou por oficial dos registos.
6 - Sendo o indeferimento objecto de recurso hierárquico ou de reacção contenciosa, o prazo para a dedução de oposição à aquisição da nacionalidade só começa a contar a partir da data da decisão do referido recurso ou do trânsito em julgado da sentença que se tiver pronunciado sobre esse acto de indeferimento, considerando-o inválido ou inexistente.
(4) Art. 9º da Lei da Nacionalidade
Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa:
a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional;
b) A condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa;
c) O exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro.
(5) Artigo 4.º Princípios
As normas de cada Estado sobre a nacionalidade basear-se-ão nos seguintes princípios:
a) Todos os indivíduos têm direito a uma nacionalidade;
b) A apatridia deverá ser evitada;
c) Nenhum indivíduo será arbitrariamente privado da sua nacionalidade;
d) Nem o casamento ou a dissolução de um casamento entre um nacional de um Estado Parte e um estrangeiro, nem a alteração de nacionalidade por um dos cônjuges durante o casamento, afectará automaticamente a nacionalidade do outro cônjuge.
(6) Artigo 6.º Aquisição de nacionalidade
1 - Cada Estado providenciará no sentido de o seu direito interno prever a aquisição da nacionalidade ex lege pelos seguintes indivíduos:
a) Menores cujo pai ou mãe possuam, à data do nascimento de tais menores, a nacionalidade desse Estado Parte, salvo quaisquer excepções previstas pelo respectivo direito interno no tocante a menores nascidos no estrangeiro. Relativamente a menores cuja paternidade seja estabelecida por reconhecimento, decisão do tribunal ou procedimento similar, cada Estado Parte poderá providenciar no sentido de o menor adquirir a sua nacionalidade nos termos previstos pelo seu direito interno;
b) Recém-nascidos abandonados, encontrados no seu território, e que, de outro modo, seriam apátridas.
2 - Cada Estado Parte deverá prever, no seu direito interno, a faculdade de aquisição da sua nacionalidade por menores nascidos no seu território e que não adquiram outra nacionalidade aquando do nascimento. Tal nacionalidade será concedida:
a) Por nascimento ex lege; ou
b) Subsequentemente, a menores que permaneceram apátridas, mediante pedido formulado à autoridade competente, por ou em nome do menor em causa, segundo a forma prevista pelo direito interno do Estado Parte. A aceitação de tal pedido poderá ficar dependente de residência legal e habitual no seu território por um período imediatamente anterior à formulação do pedido não superior a cinco anos.
3 - Cada Estado Parte deverá prever no seu direito interno a faculdade de naturalização de indivíduos legal e habitualmente residentes no seu território. Ao estabelecer as condições para efeitos de naturalização, esse Estado Parte estabelecerá um período de residência não superior a 10 anos imediatamente anterior à formulação do pedido.
4 - O direito interno de cada Estado Parte permitirá a aquisição da sua nacionalidade pelos seguintes indivíduos:
a) Cônjuges dos seus nacionais;
b) Filhos menores de um dos seus nacionais aos quais seja aplicável a excepção prevista no artigo 6.º, n.º 1, alínea a);
c) Menores cujo pai ou mãe adquira ou tenha adquirido a sua nacionalidade;
d) Menores adoptados por um dos seus nacionais;
e) Indivíduos que tenham nascido no seu território e aí residam legal e habitualmente;
f) Indivíduos que residam legal e habitualmente no seu território há um determinado período de tempo com início antes de atingirem a idade de 18 anos, devendo tal período ser determinado pelo direito interno do Estado Parte em causa;
g) Apátridas e refugiados reconhecidos, legal e habitualmente residentes no seu território.
(7) Art. 37º do Regulamento da Nacionalidade
1 - As declarações e os requerimentos para efeitos de nacionalidade são instruídos com os documentos necessários para a prova das circunstâncias de que dependa a atribuição, aquisição ou perda da nacionalidade portuguesa e com os demais documentos necessários para a prática dos correspondentes actos de registo civil obrigatório.
2 - Os documentos apresentados para instruir as declarações e os requerimentos, quando escritos em língua estrangeira, são acompanhados de tradução feita ou certificada, nos termos previstos na lei.
3 - As certidões de actos de registo civil, nacional ou estrangeiro, destinadas a instruir as declarações e os requerimentos são, se possível, de cópia integral e emitidas por fotocópia do assento.
4 - Os interessados estão dispensados de apresentar as certidões de registos que devam instruir as declarações para fins de atribuição, aquisição ou perda da nacionalidade, bem como as certidões de registos referidas no n.º 3 do artigo 4.º, no n.º 1 do artigo 5.º e no n.º 2 do artigo 70.º, desde que indiquem elementos que permitam identificar os assentos, designadamente o local de nascimento ou de casamento, a respectiva data e, se for do seu conhecimento, a conservatória do registo civil português onde se encontram arquivados e o respectivo número e ano, caso em que essas certidões são oficiosamente obtidas.
5 - É dispensada a junção de certidão de registo ou de documento existentes em suporte digital, quando os órgãos do registo civil aos mesmos tiverem acesso, através de sistema informático.
6 - A apresentação de certidões de assentos que devam instruir declarações ou requerimentos para fins de atribuição, aquisição ou perda da nacionalidade é dispensada, se os correspondentes actos de registo se encontrarem arquivados na Conservatória dos Registos Centrais.
7 - Os interessados estão, igualmente, dispensados de apresentar os seguintes documentos, os quais são oficiosamente obtidos junto das entidades competentes, sempre que possível, por via electrónica:
a) Certificado do registo criminal português;
b) Documentos emitidos pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, destinados a comprovar a residência legal no território português, bem como a circunstância prevista na alínea c) do n.º 2 do artigo 10.º
8 - Sem prejuízo do que se encontre estabelecido em convenções internacionais e leis especiais, as certidões de actos de registo civil emitidas no estrangeiro são legalizadas nos termos previstos no Código de Processo Civil.
9 - Em caso de dúvida sobre a autenticidade do conteúdo de documentos emitidos no estrangeiro, pode ser solicitada às autoridades emitentes a confirmação da sua autenticidade, sendo os encargos daí resultantes suportados pelos interessados.
(8) Até porque “de minimis non curat praetor”.
(9) Daqui ser essencial que se tenha presente o invocado nos articulados.
(10) Artº 9º da Lei da Nacionalidade
Constituem fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa:
a) A inexistência de ligação efectiva à comunidade nacional;
b) A condenação, com trânsito em julgado da sentença, pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a 3 anos, segundo a lei portuguesa;
c) O exercício de funções públicas sem carácter predominantemente técnico ou a prestação de serviço militar não obrigatório a Estado estrangeiro.
(11) Artº 57º-7 do Regulamento da Nacionalidade
7 - Sempre que o conservador dos Registos Centrais ou qualquer outra entidade tiver conhecimento de factos susceptíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidade, por efeito da vontade ou por adopção, deve participá-los ao Ministério Público, junto do competente tribunal administrativo e fiscal, remetendo-lhe todos os elementos de que dispuser.
(12) Art. 18º
1. Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas.
2. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
3. As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.
(13) Art. 26º
1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação.
2. A lei estabelecerá garantias efectivas contra a obtenção e utilização abusivas, ou contrárias à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias.
3. A lei garantirá a dignidade pessoal e a identidade genética do ser humano, nomeadamente na criação, desenvolvimento e utilização das tecnologias e na experimentação científica.
4. A privação da cidadania e as restrições à capacidade civil só podem efectuar-se nos casos e termos previstos na lei, não podendo ter como fundamento motivos políticos.
(14) Art. 36º
6. Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial.
(15) V. MIGUEL Y ALONSO, Los princípios de la carga de la prueba, in BFDLx, 1957, p. 171 ss; VAZ SERRA, in BMJ nº 110, p. 111 ss; A. VARELA et al., Manual…, 2ª ed., p. 445ss.
(16) Art. 57º
1 - Quem requeira a aquisição da nacionalidade portuguesa, por efeito da vontade ou por adopção, deve pronunciar-se sobre a existência de ligação efectiva à comunidade nacional e sobre o disposto nas alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo anterior.
2 - Exceptua-se do disposto no número anterior a aquisição da nacionalidade por parte de quem a tenha perdido, no domínio do direito anterior, por efeito do casamento ou da aquisição voluntária de nacionalidade estrangeira.
3 - Para efeitos do disposto no n.º 1, o interessado deve:
a) Apresentar certificados do registo criminal, emitidos pelos serviços competentes do país da naturalidade e da nacionalidade, bem como dos países onde tenha tido e tenha residência;
b) Apresentar documentos que comprovem a natureza das funções públicas ou do serviço militar prestados a Estado estrangeiro, sendo caso disso.
4 - A declaração é, ainda, instruída com certificado do registo criminal português sem prejuízo da dispensa da sua apresentação pelo interessado nos termos do n.º 7 do artigo 37.º
5 - O conservador ou o oficial dos registos pode, mediante requerimento do interessado, fundamentado na impossibilidade prática de apresentação dos documentos referidos na alínea a) do n.º 3, dispensar a sua junção, desde que não existam indícios da verificação do fundamento de oposição à aquisição da nacionalidade, que esses documentos se destinavam a comprovar.
6 - A Conservatória dos Registos Centrais deve solicitar as informações necessárias às entidades referidas no n.º 5 do artigo 27.º, sendo aplicável o disposto nos n.os 6 e 7 do mesmo artigo.
7 - Sempre que o conservador dos Registos Centrais ou qualquer outra entidade tiver conhecimento de factos susceptíveis de fundamentarem a oposição à aquisição da nacionalidade, por efeito da vontade ou por adopção, deve participá-los ao Ministério Público, junto do competente tribunal administrativo e fiscal, remetendo-lhe todos os elementos de que dispuser.
8 - O Ministério Público deve deduzir oposição nos tribunais administrativos e fiscais quando receba a participação prevista no número anterior.