Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07503/14
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:04/10/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
NULIDADES PROCESSUAIS.
NULIDADES PROCESSUAIS SECUNDÁRIAS. REGIME DE ARGUIÇÃO.
DESPACHO LIMINAR DE REJEIÇÃO DE RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS.
ARTº.245, DO C.P.P.T.
DECISÃO DE VERIFICAÇÃO E GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS COMPETE AO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL.
Sumário:
1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
2. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
3. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
4. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
5. As nulidades processuais consubstanciam os desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder, embora não de modo expresso, uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais (cfr.artº.195, do C.P.Civil). As nulidades de processo que não sejam de conhecimento oficioso têm de ser arguidas, em princípio, perante o Tribunal que as cometeu (cfr.artºs.196 e 199, do C.P.Civil). São as nulidades secundárias, com o regime de arguição previsto no artº.199, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6.
6. Tratando-se de irregularidade anterior à decisão final, a sua arguição deve ser efectuada junto do próprio Tribunal recorrido, em consonância com o preceituado no citado artº.199, do C.P.Civil. Mais, as irregularidades não qualificadas como nulidades principais ou de conhecimento oficioso (cfr.artº.98, do C.P.P.T.) ficam sanadas com o decurso do prazo em que podem ser arguidas, o que significa que tudo se passa como se elas não tivessem sido praticadas. Por último, se o interessado, além de pretender arguir a nulidade processual, quiser também interpor recurso da decisão que foi proferida, deverá cumulativamente apresentar requerimentos de arguição da nulidade e de interposição de recurso, não podendo fazer a arguição da nulidade neste último.
7. O despacho liminar de rejeição de reclamação de créditos apresentada, devido a extemporaneidade da mesma, encontra assento legal no artº.868, nº.4, do C.P.Civil (cfr.actual artº.791, nº.4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), aplicável à execução fiscal "ex vi" do artº.246, do C.P.P.T.
8. A Lei do Orçamento de Estado para 2011 - Lei 55-A/2010, de 31/12 - retirou aos Tribunais Tributários a competência para a decisão da verificação e graduação de créditos, transferindo-a para o órgão da execução fiscal, o que concretizou com as alterações que introduziu ao C.P.P.T., nomeadamente aos artºs.97, nº.1, al.o), e 245. Aos Tribunais tributários ficou apenas atribuída a competência para decidir as reclamações que venham a ser apresentadas das decisões administrativas de verificação e graduação de créditos.
9. Em relação a este novo regime coloca-se a questão, de direito transitório, de saber se ele deve aplicar-se, ou não, imediatamente aos processos que estão já pendentes. Nos termos do artº.12, nº.3, da L.G.T., as normas sobre procedimento e processo são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes. A transferência para os serviços de finanças da competência atribuída aos Tribunais Tributários para a verificação e graduação de créditos, acompanhada da possibilidade de reclamação para o Tribunal, com efeito suspensivo, parece não prejudicar as garantias dos contribuintes, uma vez que, ao fim e ao cabo, lhes é assegurada a possibilidade de obterem uma decisão judicial antes de se produzirem quaisquer efeitos quanto ao reconhecimento e graduação dos créditos reclamados. Pelo que, é de concluir que os processos desse tipo que não estejam pendentes nos Tribunais Tributários em 1/1/2011, data em que o novo regime entrou em vigor, deixa de ser da competência dos Tribunais a respectiva verificação e graduação de créditos.


O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
"... , I.F.I.C. - INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DE CRÉDITO, S.A.", com os demais sinais dos autos, deduziu salvatério dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Almada, exarada a fls.47 a 53 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedente a reclamação de acto do órgão de execução fiscal deduzida pelo recorrente enquanto credor reclamante no âmbito do processo de execução fiscal nº.3697-2007/101893.0 que corre termos no 2º.Serviço de Finanças de Seixal, visando despacho que indeferiu pedido de arguição de nulidade processual tudo no espaço da mencionada execução.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.67 a 94 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-A sentença recorrida não deve manter-se, pois não consagra a justa e correcta aplicação das normas legais e dos princípios jurídicos aplicáveis;
2-De facto, entende a recorrente, salvo o devido respeito, que se mostra deficiente a matéria de facto considerada assente, bem como que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, por ter ocorrido erro na determinação da norma aplicável;
3-Começa a sentença em riste por referir que a recorrente "... alega, em síntese, que:
Não obstante ter sido considerada intempestiva a reclamação de créditos por si efectuada deveria ter sido notificada da decisão de verificação e graduação de créditos, nos termos do disposto no art. 245.°, n.º 2 do CPPT;
Termina pedindo que seja anulada a decisão proferida e o processado posterior à mesma"
Mais constando, da douta sentença, na parte da fundamentação:
A) - DOS FACTOS PROVADOS
Compulsados os autos e analisada a prova documental, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a decisão de mérito:

1. Em 22/01/2010, foi efectuada a penhora do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Amora sob o n° 870/19861209 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n° 4395, no âmbito do processo de execução fiscal n° 3697200701018930 que corre termos no Serviço de Finanças de Seixal 2a por dívidas à Fazenda Pública e em que é executado ... (cfr. doc. junto a fls. 50 e segs. do processo instrutor junto aos autos);
2. Sobre o imóvel identificado no ponto anterior recaía uma hipoteca a favor da Reclamante ... , I.F.I.C., Instituição Financeira de Crédito, S.A. (cfr. doc. junto a fls. 98 e segs. do processo instrutor junto aos autos);
3. Em 05/11/2010 foi a reclamante citada para reclamar os seus créditos (cfr. doc. junto a fls. 129 do processo instrutor junto aos autos);
4. Em 23/12/2010 a Reclamante ... , I.F.I.C., Instituição Financeira de Crédito, S.A. apresentou a sua reclamação de créditos (cfr. doc. junto a fls. 130 e segs. Do processo instrutor junto aos autos);
5. Em 30/08/2012 foi proferido despacho pelo chefe do Serviço de Finanças de Seixal 2a a considerar extemporânea a reclamação de créditos apresentada (cfr. doc. junto a fls. 141 do processo instrutor junto aos autos);
6. Em 06/09/2012, foi a Reclamante notificada deste despacho (cfr. doc. junto a fls. 143 do processo instrutor junto aos autos);
7. Em 19/10/2012 e em face da inexistência de contestação do despacho identificado no ponto 5 deste probatório, foi ordenada a prossecução dos autos);
8. Em data que não se consegue precisar, mas que deve ter ocorrido em Outubro de 2012, foi efectuada a graduação de créditos (cfr. doc. junto a fls 161 e segs. Do processo instrutor junto aos autos);

A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

DOS FACTOS NÃO PROVADOS
Dos factos constantes da Reclamação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita."

C) DO DIREITO

Vem a Reclamante alegar que não obstante a sua reclamação de créditos ter sido intempestivamente apresentada deve ser notificada da verificação e graduação efectuada"...

Decorre ainda do probatório supra que a Reclamante foi notificada do despacho que considerou intempestiva a sua reclamação de créditos em 06.09.2012, não tendo apresentado qualquer reclamação ou contestação a esse acto de declaração de intempestividade da reclamação de créditos apresentada...

... pelo que de nada lhe serviria ser notificada do despacho onde foram verificados e graduados os créditos reclamados, porquanto, quanto a si, já havia precludido qualquer prazo para reclamar do acto que considerou intempestiva a reclamação de créditos por si apresentada....

Concluindo que "Era no momento em que lhe foi notificado o acto que considerou intempestiva a reclamação de créditos por si apresentada que deveria ter sido apresentado uma reclamação nos termos e ao abrigo do disposto no art. 276." do C.P.P.T.. De facto, esse acto tornou-se definitivo na ordem jurídica, dito de outro modo, consolidou-se na ordem jurídica, pelo que não pode pretender agora com a verificação e graduação abrir-se novo prazo de reclamação"

4-Não pode a recorrente conformar-se com o facto do processo de execução fiscal ter prosseguido os seus termos sem a mesma ter sido notificada, na pessoa da sua mandatária, da decisão de verificação e graduação de créditos, o que lhe permitiria, querendo, nos termos do n.° 3 do art. 245° do C.P.P.T., reclamar de tal decisão nos termos e prazos previstos nos art. 276.° e seguintes do C.P.P.T., pelos motivos que se passam a expor:
QUESTÃO PRÉVIA
5-Não poderá a recorrente deixar de referir que, ao contrário do considerado na sentença em riste, a credora não alegou que, ainda que tempestiva a sua reclamação, deveria ter sido notificada da graduação de créditos;
6-Bem, pelo contrário! A reclamante entende (e sempre entendeu) que a reclamação dos seus créditos garantidos pelo imóvel hipotecado a seu favor foi tempestiva e devia ter sido considerada na decisão de verificação e graduação para efectivo pagamento pelo produto da venda que veio a ocorrer;
7-Sendo que, como ao diante se procurará demonstrar, não se encontra precludido qualquer direito de expor e demonstrar o seu entendimento;
8-Na verdade, apenas através do ofício, remetido por e-mail, com a referência n.°1280/2013 (Cód. Assunto: 215.05.01) de 2013.07.09, tomou a reclamante conhecimento que o processo de graduação em assunto prosseguiu com a Credora "... , EFIC, Instituição Financeira de Crédito, S.A:" excluída da liquidação, porquanto, de acordo com o aí mencionado, "a reclamação de créditos foi considerada intempestiva ... " e "...não deu entrada neste Serviço de Finanças nenhuma reclamação prevista no art. 276.° do C.P.P.T.";
9-Mas, não obstante a citação enviada à credora, no âmbito do processo de execução fiscal n.° 3697200701018930 do 2º. Serviço de Finanças de Seixal, para reclamar os seus créditos nos termos e para os efeitos dos art. 239.° e 240.° do C.P.P.T., a mesma já tinha, em 12.07.2010, apresentado reclamação de créditos, nos termos do disposto no art. 871.° do C.P.C., por também ser titular de penhora registada a seu favor no âmbito de acção executiva por si instaurada, no processo de execução fiscal n.° 3409200601105000 e Aps. do 3º. Serviço de Finanças de Almada, o qual deu origem à penhora que se encontrava registada em primeiro lugar sobre o imóvel que veio a ser vendido;
10-Logo, sempre entendeu a credora reclamante que a sua reclamação de créditos se mostrava tempestiva, já que os referidos créditos foram reclamados junto da Administração Tributária e em processo da Fazenda Nacional antes da citação expedida pelo Serviço de Finanças e antes da alienação do bem imóvel que garantia o seu crédito, e, como tal, deveria a reclamação ter sido atendida e verificados e graduados os seus créditos, preferencialmente atenta a garantia real (hipoteca) de que beneficiam;
11-Tanto mais que foram verificados e graduados para pagamento pelo produto da venda do imóvel créditos fiscais perseguidos noutras execuções que correm seus termos em Serviços de Finanças distintos, nomeadamente, foi graduado e pago o crédito exequendo em causa no processo de execução fiscal n.° 3409200601105000 do 3º. Serviço de Finanças de Almada, precisamente o processo de execução fiscal no qual a ora requerente tinha, oportunamente, reclamado os seus créditos;
12-Pelo que sempre a sua reclamação de créditos teria de ser remetida pelo 3º. Serviço de Finanças de Almada ao 2º. Serviço de Finanças de Seixal para verificação e graduação ou, pelo menos, a credora informada do destino da sua reclamação, o que, até ao momento, não ocorreu;
13-Tanto mais que, até ao momento, a recorrente não foi notificada, nos termos do art. 866.° do C.P.C, (ex vi art. 246 do C.P.P.T.), das certidões apresentadas pelos Serviços de Finanças de Lisboa 2 e Almada 3 nos termos do n.° 1 do art. 241 do C.P.P.T., desconhecendo-se se as mesmas foram apresentadas e, em caso afirmativo, se dentro do prazo de 15 dias conferido para o efeito;
14-Apenas poderiam ser graduados e pagos pelo produto da venda do imóvel penhorado nos autos os créditos reclamados para esse efeito, não resultando dos autos que os serviços periféricos da área do domicílio fiscal do contribuinte a quem foram penhorados os bens ou do estabelecimento comercial ou industrial o tenham feito;
15-Sendo que, pelo contrário, dos autos resulta que, apenas em Novembro de 2011, bem depois de se ter realizado a venda do imóvel hipotecado a favor da recorrente (a qual ocorreu em 31.03.2011), o Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Seixal 2 extraiu uma certidão de dívidas da qual constam processos de execução fiscal em curso em processos distintos, nomeadamente os já referidos Serviços de Finanças de Lisboa 2 e Almada 3, tendo só nessa data então notificado a credora (ofício 17706 de 07.11.2011) da admissão da sua reclamação de créditos, bem como da reclamação de créditos da Fazenda Nacional;
16-Ora, não pode o Sr. Chefe do Serviço de Finanças do Seixal 2 ignorar a reclamação apresentada pela ora recorrente no processo de execução fiscal em curso no Serviço de Finanças de Almada 3 com o fundamento de se tratar de "...outro processo a correr noutro concelho e que necessariamente corre com outro número..." e depois pretender, motu próprio, reclamar e dar pagamento a todos os créditos da Fazenda Nacional;
17-Por outro lado, a credora reclamante apresentou ainda a sua reclamação de créditos (precisamente os mesmos créditos) em 23.12.2010 junto do 2º. Serviço de Finanças do Seixal, ou seja, ainda dentro do prazo conferido pelo n.° 4 do art. 240 do C.P.P.T.;
18-Quer nos termos do art 871 do C.P.C., quer nos termos do n.° 4 do at. 240 do C.P.P.T., é indiscutível que a credora reclamou os seus créditos garantidos por hipoteca e também por penhora junto da Administração Tributária ainda antes de ter sido citada para esse efeito e antes de ocorrer a venda do imóvel penhorado;
19-Independentemente do órgão periférico (concreto Serviço de Finanças em causa) a que a reclamação foi dirigida, é forçoso concluir que a credora reclamou oportuna e tempestivamente os seus créditos garantidos pelo bem imóvel cujo produto da venda foi alvo de graduação - de facto, sempre nos encontraríamos perante os mesmos créditos em confronto - os da ora reclamante e os da Fazenda Nacional (independentemente do Serviço de Finanças) garantidos pelo mesmo imóvel, salientando-se ainda que, in casu, nos encontramos perante Serviços de Finanças da mesma Direcção de Finanças de Setúbal;
20-Pelo que entende a recorrente que deverá rejeitar-se o estrito rigor formal adoptado pelo órgão de execução fiscal e aceitar-se um entendimento que melhor garanta a tutela efectiva dos direitos e interesses da reclamante e a concretização da Justiça Material!
DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA E NÃO PROVADA
21-Resultam da sentença recorrida os factos que o Tribunal "a quo" considerou provados com base na prova documental junta;
22-No entanto, resultam ainda do processo outros factos com interesse para a decisão de mérito da causa, que, quer por resultarem de prova documental não impugnada, quer por terem sido admitidos por acordo, deveriam ter sido considerados provados e, nos termos do n.° 3 do art. 659.° do C.P.C., ser levados em consideração na fundamentação da sentença;
23-Crê assim a recorrente que se mostra deficiente e insuficiente a decisão proferida quanto à matéria de facto dada como provada, considerando-se imprescindível a ampliação da mesma, aditando-se à matéria de facto dada como provadas os seguintes factos:

9) Em 12.07.2010, a Credora apresentou reclamação de créditos (acompanhada do respectivo comprovativo do pagamento de taxa de justiça), nos termos do disposto no art. 871.° do C.P.C., por também ser titular de penhora registada a seu favor no âmbito de acção executiva por si instaurada, no processo de execução fiscal n.° 3409200601105000 e Aps. do Serviço de Finanças de Almada 3, o qual deu origem à penhora que se encontrava registada em primeiro lugar sobre o imóvel identificado em 1. - facto admitido por acordo

10) Do produto da venda, vieram a ser pagos os créditos da Fazenda Nacional que constituíam a quantia exequenda do processo de execução fiscal referido em 9 (cfr. decisão de verificação e graduação de créditos e liquidação do processo instrutor junto aos autos);

DO ERRO DE JULGAMENTO
24-Quer a fundamentação do despacho do Senhor Chefe do Serviço de Finanças, quer da sentença recorrida, para indeferirem a pretensão da reclamante/recorrente, assentam unicamente no facto de não ter existido qualquer contestação ou reclamação nos termos do art. 276.° do C.P.P.T. do despacho proferido pelo Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Seixal 2, em 30.08.2012, no qual foi referido que era considerada extemporânea a apresentação da reclamação de créditos em nome da recorrente;
25-No entanto, a sede própria e momento oportuno para decidir da tempestividade da reclamação de créditos apresentada sempre seria no momento em que o órgão de execução fiscal decidisse da verificação e graduação dos créditos reclamados;
26-Na verdade, o referido entendimento do Chefe do Serviço de Finanças notificado através do oficio 11705 de 2012-08-31, só por si, não afecta a esfera jurídica, os direitos e interesses da credora reclamante e, por esse motivo, nunca seria passível de reclamação - pois que é em sede de decisão de graduação que os créditos se verificam e graduam;
27-De facto, nos termos do art. 276.° do CPPT "As decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro são susceptíveis de reclamação para o tribunal tributário de 1.ª instância.";
28-Mas, só devem considerar-se lesivos, e, por isso, impugnáveis contenciosamente, os actos que tenham repercussão negativa imediata na esfera jurídica dos seus destinatários;
29-A notificação que a ora recorrente recebeu, com um despacho a informar que se considerava extemporânea a reclamação de créditos, limitou-se a dar-lhe conhecimento do entendimento do Senhor Chefe do Serviço de Finanças, mas tal posição em nada contendia com os direitos ou interesses legítimos da reclamante, dado que e conforme supra referido, apenas na decisão de verificação e graduação de créditos poderia ser, a final, conhecida a questão da admissibilidade da reclamação apresentada, pelo que o despacho notificado não consistiu em qualquer acto susceptível de impugnação através da reclamação prevista do art. 276.° do C.P.P.T. (não obstando a tal o facto de a credora ter então sido notificada para esse efeito, dado que a mesma nunca estaria vinculada a lançar mão de um meio inadequado);
30-Objecto de reclamação, nos termos do art. 276 do C.P.P.T., poderia ser (e teria de o ser face aos diferentes entendimentos em confronto) a decisão de verificação e graduação de créditos por a mesma afectar os direitos e interesses legítimos da ora recorrente, caso a mesma fosse notificada à credora reclamante, o que, infeliz e ilegalmente, não veio a acontecer;
31-De facto, nos termos do disposto no n.° 2 do art. 868 do C.P.C. (aplicável in casu ex vi art. 246 do C.P.P.T), sob a epígrafe "Termos posteriores - Verificação e Graduação de Créditos", se constata que "Se nenhum dos créditos for impugnado ou a verificação dos impugnados não depender de prova a produzir, proferir-se-á logo sentença que conheça da sua existência e os gradue com o crédito do exequente, sem prejuízo do disposto no n.º 4";
32-Referindo-se, no n.° 4 que "Haver-se-ão como reconhecidos os créditos e as respectivas garantias reais que não forem impugnados, sem prejuízo das excepções ao efeito cominatório da revelia, vigentes em processo declarativo, ou do conhecimento das questões que deviam ter implicado rejeição liminar da reclamação";
33-Também do n.° 2 do art. 245 do C.P.P.T., resulta que "Havendo reclamações ou juntas as certidões referidas no artigo 241, o órgão de execução fiscal procede à verificação e graduação de créditos, notificando dela todos os credores que reclamaram créditos ";
34-Decorre assim dos referidos preceitos legais que, não tendo existido rejeição liminar da reclamação de créditos apresentada (como não existiu), não havendo impugnações ou prova a produzir, será logo proferida sentença que conheça da sua existência, sem prejuízo do conhecimento das questões que deviam ter implicado rejeição liminar da reclamação;
35-Pelo que o despacho proferido pelo Sr. Chefe do Serviço de Finanças com a informação que considerava extemporânea a apresentação da reclamação de créditos não tem qualquer previsão ou cabimento legal e não possui virtualidade de produzir qualquer efeito na ordem jurídica;
36-Na própria decisão de verificação e graduação de créditos proferida no processo de execução fiscal (graduação de créditos n.° 3697.2011.3291 constante do processo instrutor junto aos autos), resulta da fundamentação apresentada pelo Sr. Chefe do Serviço de Finanças que a tempestividade da reclamação de créditos apresentada pela credora reclamante foi, nesse momento (e, então sim, em sede própria) apreciada - "Assim, considero extemporânea a apresentação da reclamação de créditos.";
37-Não obstante a credora ter sido notificado do teor do despacho do Chefe proferido em 30.08.2012, não existiu qualquer efeito preclusivo quanto ao seu direito de reclamar da decisão do Chefe do Serviço de Finanças, proferida na decisão de verificação e graduação de créditos, que não conhecesse da existência do seu crédito por extemporaneidade da reclamação de créditos apresentada;
38-Dado que, não tendo a reclamação de créditos sido objecto de indeferimento liminar, apenas na decisão de verificação poderia ser emitido juízo quanto às condições de sua admissibilidade;
39-Daí a credora reclamante entender que a sentença recorrida faz uma errada aplicação do disposto no art. 276 do C.P.P.T., dado que o despacho proferido pelo Sr. Chefe do Serviço de Finanças não era susceptível de reclamação nos termos e ao abrigo do disposto no art. 276 do C.P.P.T., pelo que não houve qualquer acto a tornar-se definitivo/consolidar-se na ordem jurídica;
40-Com efeito, as alterações legislativas introduzidas pela Lei n.° 55-A/2010 de 31/12, ao conferirem ao órgão de execução fiscal a competência para apreciar e decidir as reclamações de créditos, conduziram a um alargamento do leque das decisões passíveis de reclamação nos termos do art. 276 do C.P.C., as quais passaram a incluir, precisamente, as decisões de verificação e graduação de créditos a proferir pelos Srs. Chefes dos Serviços de Finanças;
41-Dispõe assim o n.° 3 do art. 245 do C.P.P.T: "Os credores referidos no número anterior (como o é a recorrente que apresentou, de facto, reclamação de créditos) podem reclamar da verificação e graduação de créditos nos termos e prazos previstos nos art. 276."e seguintes";
42-Ou seja, de acordo com o referido preceito legal, passível de reclamação é a decisão final de verificação e graduação de créditos, na qual o Senhor Chefe deveria, então, proceder à verificação do crédito reclamado;
43-Tanto mais que, tendo presente a data de instauração do processo executivo no qual foi realizada a venda fiscal (2007), bem como a data da apresentação das reclamações de créditos por parte da recorrente (12.07.2010 e 23.12.2010), ambas anteriores à entrada em vigor das alterações legislativas introduzidas pela Lei n.° 55-A/2010 de 31/12 (a qual apenas veio a ocorrer em 01.01.2011), o órgão de execução fiscal não teria competência para proceder a qualquer indeferimento liminar da reclamação apresentada;
44-Devendo apenas, nos termos do n.° 2 do art. 245 do C.P.P.T., na redacção em vigor à data da reclamação de créditos, remeter o processo ao tribunal tributário de primeira instância para aí serem tramitados os ulteriores termos da verificação e graduação;
45-Por outro lado, nos termos do n.° 2 do art. 245 do C.P.P.T., "Havendo reclamações ... o órgão de execução fiscal procede à verificação e graduação dos créditos, notificando dela todos os credores que reclamaram créditos ";
46-Ora, in casu, a falta de notificação da decisão de verificação e graduação de créditos acarreta nulidade processual por omissão, uma vez que tal omissão influiu no exame e na decisão da causa e lesou gravemente os interesses da credora reclamante que, dessa forma, se viu coarctada e privada da possibilidade do seu Direito Constitucional de Defesa através da apresentação da devida e oportuna reclamação;
47-A ora requerente não pode aceitar, nem conformar-se, com a violação do seu estatuto e direitos processuais, nomeadamente o direito de ser notificada da decisão de verificação e graduação de créditos para, querendo, reagir quanto à mesma, notificação essa que veio a ser preterida;
48-A omissão de tal notificação obstou ilegitimamente a que a reclamante exercesse aquele seu direito processual de reclamar da decisão de verificação e graduação, em defesa da satisfação do seu crédito garantido por hipotecas;
49-O processo de execução fiscal tem natureza judicial, pelo que, só através da reclamação a apresentar da decisão de verificação e graduação de créditos após a sua notificação, poderia a credora reclamante exercer plenamente os seus direitos e ver-se ressarcida, pelo menos em parte, quanto aos seus créditos pelo produto da venda do imóvel penhorado;
50-Tal resulta inequívoca e expressamente do art. 103 da L.G.T., no qual se preceitua que "...O processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos actos que não tenham natureza jurisdicional";
51-Sendo que, nos termos do art. 36 do C.P.P.T., a decisão de verificação e graduação de créditos ainda não produziu qualquer efeito quanto à ora requerente porquanto ainda não lhe foi validamente notificada;
52-Pelo que, não sendo a referida decisão eficaz quanto à credora reclamante, nos termos do art. 36 do C.P.P.T., a mesma ainda não transitou em julgado;
53-Concluindo-se, dessa forma e na senda do que vem sendo referido, que a omissão da prática de tal acto previsto na lei (notificação da decisão de verificação e graduação de créditos nos termos do n.° 2 do art. 145 do C.P.P.T.), porque teve influência no exame e decisão da causa ao não possibilitar à credora reclamante a apresentação de reclamação, constituiu nulidade processual, pelo que, nos termos do n.° 2 do art. 201 do C.P.P.T., deverão também ser anulados "...os termos subsequentes que dele dependam absolutamente... ", como é o caso da liquidação e pagamentos já efectuados, indevidamente, pelo Serviço de Finanças de Seixal 2;
54-De facto, com vista à reposição da legalidade na tramitação do processo de graduação de créditos deverá ser verificada e julgada procedente a arguição da nulidade da omissão da notificação à reclamante da decisão de verificação e graduação de créditos e, consequentemente, anulado o processado posterior, inclusive a liquidação e pagamentos efectuados;
55-A sentença recorrida violou assim os dispositivos legais contidos no artº. 868.°, n.° 2 e n.° 4 do C.P.C. (ex vi art. 246.° 6 do C.P.P.T), 36.°, 40.°, 240.°, n.º1 e n.° 4, 241.°, n.° 1, 245.°, n.° 2 e 3, e 276.°, todos do CPPT, porquanto os mesmos não foram interpretados e aplicados com o sentido versado nas considerações anteriores;
56-Nos termos vindos de expor e nos que V.as Ex.as, sempre mui doutamente, poderão suprir, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que julgue procedente a reclamação apresentada pela credora, declarando a nulidade processual cometida, por omissão, consubstanciada na falta de notificação, à credora reclamante, da decisão de verificação e graduação de créditos proferida pelo órgão de execução fiscal (ordenando a concretização de tal notificação) e anulando o processado posterior, inclusive a liquidação e pagamento efectuados;
57-Termos em que deve ser revogada a douta sentença recorrida e substituída por uma outra nos termos expostos, crê-se, será feita inteira e sã Justiça.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.108 dos autos) no sentido de se negar provimento ao recurso.
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Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.657, nº.4, do C.P.Civil; artº.278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.49 e 50 dos autos):
1-Em 22/01/2010, foi efectuada a penhora do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Amora sob o n° 870/19861209 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n° 4395, no âmbito do processo de execução fiscal nº.3697-2007/101893.0 que corre termos no 2º. Serviço de Finanças de Seixal por dívidas à Fazenda Pública e em que é executado ... (cfr.documento junto a fls.50 a 56 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
2-Sobre o imóvel identificado no ponto anterior recaía uma hipoteca a favor da reclamante "... , I.F.I.C. - Instituição Financeira de Crédito, S.A." (cfr. documento junto a fls.98 e seg. do processo instrutor apenso aos presentes autos);
3-Em 5/11/2010 foi a reclamante citada para reclamar os seus créditos (cfr.documentos juntos a fls.128 e 129 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
4-Em 23/12/2010 a reclamante "... , I.F.I.C. - Instituição Financeira de Crédito, S.A." apresentou a sua reclamação de créditos (cfr.documentos juntos a fls. 130 e 131 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
5-Em 30/08/2012 foi proferido despacho pelo chefe do 2º. Serviço de Finanças de Seixal a considerar extemporânea a reclamação de créditos apresentada (cfr.documento junto a fls.141 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
6-Em 6/09/2012, foi a reclamante notificada deste despacho (cfr.documentos juntos a fls.142 e 143 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
7-Em 19/10/2012 e em face da inexistência de contestação do despacho identificado no ponto 5 deste probatório, foi ordenada a prossecução dos autos (cfr.documento junto a fls.147 do processo instrutor apenso aos presentes autos);
8-Em data que não se consegue precisar, mas que deve ter ocorrido em Outubro de 2012, foi efectuada a graduação de créditos (cfr.documento junto a fls.161 e seg. do processo instrutor apenso aos presentes autos).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Dos factos constantes da Reclamação, todos objectos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita…”.
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A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese, julgar totalmente improcedente a presente reclamação de acto do órgão de execução fiscal, em virtude do decaimento dos respectivos fundamentos.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e como supra se alude, que resultam do processo outros factos com interesse para a decisão de mérito da causa, quer por resultarem de prova documental não impugnada, quer por terem sido admitidos por acordo, os quais deveriam ter sido considerados provados e, nos termos do nº.3, do artº.659, do C.P.C., ser levados em consideração na fundamentação da sentença. Crê, assim, a recorrente que se mostra deficiente e insuficiente a decisão proferida quanto à matéria de facto dada como provada, considerando-se imprescindível a ampliação da mesma, aditando-se à matéria de facto dada como provadas os seguintes factos:
9) Em 12.07.2010, a Credora apresentou reclamação de créditos (acompanhada do respectivo comprovativo do pagamento de taxa de justiça), nos termos do disposto no art. 871.° do C.P.C., por também ser titular de penhora registada a seu favor no âmbito de acção executiva por si instaurada, no processo de execução fiscal n.° 3409200601105000 e Aps. do Serviço de Finanças de Almada 3, o qual deu origem à penhora que se encontrava registada em primeiro lugar sobre o imóvel identificado em 1. - facto admitido por acordo;
10) Do produto da venda, vieram a ser pagos os créditos da Fazenda Nacional que constituíam a quantia exequenda do processo de execução fiscal referido em 9 (cfr.decisão de verificação e graduação de créditos e liquidação do processo instrutor junto aos autos);
(cfr.conclusões 22 e 23 do recurso), com suporte em tal alegação procurando consubstanciar erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
No caso concreto, pretende o recorrente que se adite ao probatório a factualidade identificada supra e que, alegadamente, tem a ver com o processo de execução fiscal nº. 3409-2006/110500.0 e aps., o qual corre termos no 3º. Serviço de Finanças de Almada.
Adiantamos dois vectores no sentido de julgar improcedente o presente fundamento do recurso:
1-Desde logo, a factualidade em causa não reveste qualquer relevo para a decisão da causa, visto ser relativa a processo de execução fiscal diferente daquele em que foi deduzida a presente reclamação ao abrigo do artº.276, e seg. do C.P.P.T.;
2-Do exame do teor da verificação e graduação de créditos identificada no nº.8 do probatório (cfr.fls.161 a 165 do processo instrutor apenso) não consta a referência a qualquer crédito reconhecido e graduado que seja constante do mencionado processo de execução fiscal nº.3409-2006/110500.0 e aps., o qual corre termos no 3º. Serviço de Finanças de Almada.
Concluindo, não vislumbra o Tribunal “ad quem” que a sentença recorrida padeça do examinado erro de julgamento de facto, assim sendo forçoso julgar improcedente este fundamento do recurso.
Mais aduz o apelante, em síntese, que nos termos do artº.245, nº.2, do C.P.P.T., "Havendo reclamações ... o órgão de execução fiscal procede à verificação e graduação dos créditos, notificando dela todos os credores que reclamaram créditos ". Que, "in casu", a falta de notificação da decisão de verificação e graduação de créditos acarreta nulidade processual por omissão, uma vez que tal omissão influiu no exame e na decisão da causa e lesou gravemente os interesses da credora reclamante que, dessa forma, se viu coarctada e privada da possibilidade do seu Direito Constitucional de Defesa através da apresentação da devida e oportuna reclamação. Que a omissão de tal notificação obstou ilegitimamente a que a reclamante exercesse aquele seu direito processual de reclamar da decisão de verificação e graduação, em defesa da satisfação do seu crédito garantido por hipotecas. Que a omissão da prática de tal acto previsto na lei (notificação da decisão de verificação e graduação de créditos nos termos do nº.2, do artº.245, do C.P.P.T.), porque teve influência no exame e decisão da causa ao não possibilitar à credora reclamante a apresentação de reclamação, constituiu nulidade processual. Pelo que, com vista à reposição da legalidade na tramitação do processo de graduação de créditos deverá ser verificada e julgada procedente a arguição da nulidade da omissão da notificação à reclamante da decisão de verificação e graduação de créditos e, consequentemente, anulado o processado posterior, inclusive a liquidação e pagamentos efectuados (cfr.conclusões 45 a 54 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, se bem entendemos, consubstanciar a existência de nulidade processual de que padecem os autos.
Examinemos se o presente processo enferma de tal vício.
Abordando as nulidades processuais, dir-se-á que as mesmas consubstanciam os desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder, embora não de modo expresso, uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais (cfr.artº.195, do C.P.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6393/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 13/2/2014, proc.7308/14; Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág.176; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.79).
As nulidades de processo que não sejam de conhecimento oficioso têm de ser arguidas, em princípio, perante o Tribunal que as cometeu (cfr.artºs.196 e 199, do C.P.Civil). São as nulidades secundárias, com o regime de arguição previsto no artº.199, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6.
Mais, tratando-se de irregularidade anterior à decisão final, a sua arguição deve ser efectuada junto do próprio Tribunal recorrido, em consonância com o preceituado no citado artº.199, do C.P.Civil. Por outro lado, as irregularidades não qualificadas como nulidades principais ou de conhecimento oficioso (cfr.artº.98, do C.P.P.T.) ficam sanadas com o decurso do prazo em que podem ser arguidas, o que significa que tudo se passa como se elas não tivessem sido praticadas. Por último, se o interessado, além de pretender arguir a nulidade processual, quiser também interpor recurso da decisão que foi proferida, deverá cumulativamente apresentar requerimentos de arguição da nulidade e de interposição de recurso, não podendo fazer a arguição das ditas nulidades neste último (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/5/2013, proc. 6018/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.6971/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 13/2/2014, proc.7308/14; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.86 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, não vislumbra o Tribunal que se deva sinalizar a existência de uma nulidade processual no âmbito do processado constante da execução fiscal nº.3697-2007/101893.0, a qual corre termos no 2º. Serviço de Finanças de Seixal, especificamente no espaço do incidente de verificação e graduação de créditos existente no mesmo processo executivo. É que a notificação da decisão de verificação e graduação de créditos a ser efectuada a todos os credores reclamantes (cfr.artº.245, nº.2, do C.P.P.T.), pressupõe que as reclamações em causa tenham sido admitidas liminarmente e, por consequência, que o crédito respectivo deva ser levado em consideração na decisão de verificação e graduação de créditos em causa. Ora, no caso presente, conforme se retira da matéria de facto provada (cfr.nºs.5 e 6 do probatório), o Chefe do 2º. Serviço de Finanças de Seixal rejeitou a reclamação de créditos apresentada pelo recorrente, em virtude de a considerar extemporânea, tendo tal decisão transitado em julgado. Por outro lado, deve referir-se que o despacho liminar de rejeição da reclamação de créditos apresentada devido a extemporaneidade da mesma encontra assento legal no artº.868, nº.4, do C.P.Civil (cfr.actual artº.791, nº.4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), aplicável à execução fiscal "ex vi" do artº.246, do C.P.P.T. (cfr. Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.85, nota 4).
Atento o referido, não tinha o Órgão de Execução Fiscal que levar em consideração na decisão do incidente de verificação e graduação de créditos em causa a reclamação de créditos apresentada pelo recorrente de forma extemporânea e já rejeitada liminarmente e, por maioria de razão, que notificar a sociedade recorrente da mesma decisão.
Concluindo, não se verifica qualquer nulidade processual secundária no âmbito do processo de execução fiscal nº.3697-2007/101893.0, assim não padecendo a decisão recorrida de qualquer vício de violação de lei.
Em virtude da rejeição do presente fundamento do recurso, deve considerar-se prejudicado o exame do esteio constante das conclusões 31 a 39 da apelação, o qual tem por pressuposto a não existência do examinado despacho de indeferimento liminar ou que tal despacho de indeferimento liminar não se encontra previsto na lei.
Mais aduz o recorrente que as alterações legislativas introduzidas pela Lei 55-A/2010 de 31/12, ao conferirem ao órgão de execução fiscal a competência para apreciar e decidir as reclamações de créditos, conduziram a um alargamento do leque das decisões passíveis de reclamação nos termos do artº.276, do C.P.P.T., as quais passaram a incluir, precisamente, as decisões de verificação e graduação de créditos a proferir pelos Srs. Chefes dos Serviços de Finanças. Que, tendo presente a data de instauração do processo executivo no qual foi realizada a venda fiscal (2007), bem como a data da apresentação das reclamações de créditos por parte da recorrente (12.07.2010 e 23.12.2010), ambas anteriores à entrada em vigor das alterações legislativas introduzidas pela Lei 55-A/2010 de 31/12 (a qual apenas veio a ocorrer em 1/01/2011), o órgão de execução fiscal não teria competência para proceder a qualquer indeferimento liminar da reclamação apresentada. Devendo apenas, nos termos do nº.2, do artº.245, do C.P.P.T., na redacção em vigor à data da reclamação de créditos, remeter o processo ao Tribunal tributário de primeira instância para aí serem tramitados os ulteriores termos da verificação e graduação (cfr.conclusões 40 a 44 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal pecha.
A Lei do Orçamento de Estado para 2011 - Lei 55-A/2010, de 31/12 - retirou aos Tribunais Tributários a competência para a decisão da verificação e graduação de créditos, transferindo-a para o órgão da execução fiscal, o que concretizou com as alterações que introduziu ao C.P.P.T., nomeadamente aos artºs.97, nº.1, al.o), e 245. Aos Tribunais tributários ficou apenas atribuída a competência para decidir as reclamações que venham a ser apresentadas das decisões administrativas de verificação e graduação de créditos.
Em relação a este novo regime coloca-se a questão, de direito transitório, de saber se ele deve aplicar-se, ou não, imediatamente aos processos que estão já pendentes.
Nos termos do artº.12, nº.3, da L.G.T., as normas sobre procedimento e processo são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes. A transferência para os serviços de finanças da competência atribuída aos Tribunais Tributários para a verificação e graduação de créditos, acompanhada da possibilidade de reclamação para o Tribunal, com efeito suspensivo, parece não prejudicar as garantias dos contribuintes, uma vez que, ao fim e ao cabo, lhes é assegurada a possibilidade de obterem uma decisão judicial antes de se produzirem quaisquer efeitos quanto ao reconhecimento e graduação dos créditos reclamados. Pelo que, é de concluir que os processos desse tipo que não estejam pendentes nos Tribunais Tributários em 1/1/2011, data em que o novo regime entrou em vigor, deixa de ser da competência dos Tribunais a respectiva verificação e graduação de créditos (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.169 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, conforme resulta do exame do probatório (cfr.nºs.4 a 8 da factualidade provada), o processo de execução fiscal nº.3697-2007/101893.0 nunca foi remetido a Tribunal com vista à decisão do incidente de verificação e graduação de créditos, permanecendo no 2º. Serviço de Finanças de Seixal na aludida data de 1/1/2011, pelo que era de lhe aplicar o novo regime constante do artº.245, do C.P.P.T., com as alterações introduzidas pela Lei 55-A/2010, de 31/12, e sendo competente para a mesma decisão o Chefe do citado Serviço de Finanças conforme efectivamente aconteceu, nenhuma ilegalidade se verificando neste procedimento.
Concluindo, nega-se provimento ao presente fundamento do recurso, mais se confirmando a decisão recorrida neste segmento.
E retomando a decisão do Tribunal "a quo", era no momento em que lhe foi notificado o acto que considerou intempestiva a reclamação de créditos por si apresentada que o recorrente deveria ter apresentado uma reclamação nos termos e ao abrigo do disposto no artº.276, do C.P.P.T., se acaso considerasse que a mesma reclamação era tempestiva. Não o tendo feito, esse acto tornou-se definitivo na ordem jurídica, dito de outro modo, consolidou-se na ordem jurídica pelo que não pode pretender agora com a verificação e graduação abrir-se novo prazo para a reclamação.
A finalizar, sempre se dirá que a decisão recorrida não viola, manifestamente, as disposições constantes dos artºs.868, nºs.2 e 4, do C.P.Civil, 36, 40, 240, nºs.1 e 4, 241, nº.1, 245, nºs.2 e 3, e 276, todos do C.P.P.T.
Rematando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 10 de Abril de 2014




(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Jorge Cortês - 2º. Adjunto)