Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 01620/06 |
| Secção: | Contencioso Administrativo - 2º Juízo |
| Data do Acordão: | 05/18/2006 |
| Relator: | Cristina dos Santos |
| Descritores: | JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA – COMPETÊNCIA MATERIAL CESSÃO NOS ARRENDAMENTOS DO IGAPHE PARA A FUNDAÇÃO D. PEDRO IV NATUREZA JURÍDICA DOS CONTRATOS |
| Sumário: | 1. Por imperativo constitucional, a delimitação da competência dos tribunais administrativos exige que a actividade administrativa desenvolvida no caso concreto assuma a natureza de relação jurídica regulada pelo Direito Administrativo cfr. artºs. 212º nº 3 e 268º nº 4 CRP. 2. O clausulado dos contratos de arrendamento celebrados entre o Fundo de Fomento da Habitação e os ora Recorrentes - vigentes aquando da sub-rogação da ora Recorrida Fundação D. Pedro IV na posição de senhorio do IGAPHE [conforme contrato de cessão de 1.2.2005, supra transcrito na alínea D do probatório], sendo o IGAPHE o instituto público com personalidade jurídica que sucedeu ao extinto FFH [pelo DL 214/82 de 29.5] na dominialidade do património e nos arrendamentos e demais contratos conforme artº 30º nº 1 DL 88/87 de 26.2 - não permite dúvidas no tocante à natureza administrativa de tais arrendamentos. |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | Maria ....e Outros (+ 48), todos com os sinais nos autos, inconformados com a sentença proferida proferida pela Mma. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que julgou os Tribunais Administrativos incompetentes em razão da matéria para conhecer do litígio, dela vêm recorrer concluindo como segue: A Os actos que determinam a aplicação de um regime da renda apoiada, previsto no Decreto-Lei 166/93, de um preço técnico dos fogos dos requerentes e do montante da renda apoiada são actos claramente administrativos pelo que sindicáveis perante os Tribunais Administrativos nos termos do disposto no artigo 51°, n°2, do CPTA, e 1°, e 4°, n°1 (corpo e alínea d) do ETAF; B Efectivamente, "é recorrível o acto da Administração que determina a aplicação da renda técnica a um fogo municipal, uma vez que é só com tal acto que é definida, em concreto, a situação jurídica do interessado" – in www.dgsi.pt - documento número SA1200511030762 - Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, relatado pelo Exmo. Juiz Conselheiro São Pedro, de 03-11-2005; C O regime da renda apoiada é, claramente, um regime em que são atribuídas às entidades aí referidas, Estado, Municípios, Regiões Autónomas e Instituições Particulares de Solidariedade Social poderes de autoridade unilaterais de conformação da situação jurídica de terceiros, poderes esses que escapam a qualquer lógica de equilíbrio entre prestações, nomeadamente a alteração, determinada unilateralmente e sem o assentimento dos requerentes, do regime jurídico que regia as relações entre as partes; D O regime da renda dita apoiada não é uma mera especialidade do regime do arrendamento urbano; E É um regime com normas de direito administrativo ditado por imperativos de ordem pública e com uma clara finalidade e interesse público imanente à garantia do direito à habitação; F Para tanto, tais normas definem um sem número de obrigações à autoridade que as aplica e às pessoas às quais tal regime é aplicado, nomeadamente a existência e necessidade de publicações, anúncios, organização de um local onde podem ser concedidos esclarecimentos, obrigatoriedade de entrega de documentação de cariz absolutamente pessoal à autoridade sob pena de resolução imediata do contrato de arrendamento, possibilidade da autoridade determinar a transferência de fogo de um morador etc); G Estamos, assim, perante um regime jurídico totalmente estranho a uma relação jurídica de cariz privatístico; H Estamos, antes, perante uma autêntica relação jurídica administrativa, em que são concedidos poderes de autoridade unilaterais à entidade que as aplica (nomeadamente o de aplicar um regime jurídico totalmente estranho e alheio ao assentimento dado pelos visados, de fixação de preços técnicos e do valor de renda dita apoiada), por motivos e razões de ordem e interesse públicos, e na prossecução de poderes públicos dimanado de normas administrativas que estabelecem um iter procedimental também ele totalmente alheio às relações jurídicas privadas, como são os exemplos das normas contidas nos artigos 6°, 9° e 11° do Regime da Renda Apoiada; I Ao considerar a Jurisdição Administrativa incompetente, em razão da matéria, para conhecer dos presentes autos, a mui douta sentença recorrida, violou, concomitantemente o disposto nos artigos 1°, 4°, n°1 (corpo e alínea d) do ETAF e 51°, n°2, do C.P.T.A. pelo que deve ser revogada e subsituída por outra que julgue os Tribunais Administrativos competentes em razão da matéria para conhecer do presente pleito. * A Recorrida contra-alegou pugnando pela manutenção do julgado. * A EMMP junto deste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido que se transcreve: “(..) Vem o presente recurso jurisdicional interposto da sentença que considerou os Tribunais Administrativos incompetentes em razão da matéria para apreciar e decidir o pedido de suspensão de eficácia da deliberação de 8-6-2005, do Conselho de Administração da Fundação D. Pedro IV, que sujeitou os requerentes, arrendatários de fogos de habitação social pertencentes ao Estado, ao regime de renda apoiada previsto no DL n° 166/93, de 7-5 e consequente fixação de novo montante de renda por aplicação de renda técnica. Segundo a douta sentença recorrida, o objecto do presente processo cautelar respeita a uma alteração da renda, inicialmente fixada em contrato de arrendamento, pelo que não se estando perante uma questão emergente de relações jurídicas administrativas, mas emergente duma relação jurídica de direito privado, não são os Tribunais Administrativos os competentes para o apreciar. Não concordaram, porém, os requeridos, alegando, essencialmente, que o regime de renda apoiada não é uma mera especialidade do regime de arrendamento urbano, mas sim um regime com normas de direito administrativo ditado por imperativos de interesse público com vista a garantir o direito à habitação. Além disso, a Fundação requerida detém poderes de autoridade unilaterais que fogem à lógica do equilíbrio entre prestações, uma vez que os requerentes não deram o seu assentimento para a alteração das rendas. Vejamos se têm razão. O DL 166/93, que veio regular o regime de renda apoiada, que fora previsto no artigo 82.° do Regime do Arrendamento Urbano (RAU) aprovado pelo DL 321-B/90, de 15 de Outubro, dispõe: "Artigo 1.° - 1 - O presente diploma tem por objecto o estabelecimento do regime de renda apoiada. 2 - Ficam sujeitos ao regime de renda apoiada os arrendamentos das habitações do Estado, seus organismos autónomos e institutos públicos, bem como os das adquiridas ou promovidas pelas Regiões Autónomas, pelos municípios e pelas instituições particulares de solidariedade social com comparticipações a fundo perdido concedidas pelo Estado, celebrados após a entrada em vigor do presente diploma. 3 - Ficam igualmente sujeitos ao regime de renda apoiada os arrendamentos das habitações adquiridas ou promovidas pelas Regiões Autónomas, comparticipadas a fundo perdido pela respectiva Região, celebrados após a entrada em vigor do presente diploma". Por sua vez, refere o citado artigo 82.° do DL 321-B/90, de 15 de Outubro: "Renda apoiada 1 - No regime de renda apoiada, o montante das rendas é subsidiado, vigorando, ainda, regras específicas quanto à sua determinação e actualização. 2 - Ficam sujeitos ao regime referido no número anterior os prédios construídos ou adquiridos para arrendamento habitacional pelo Estado e seus organismos autónomos, institutos públicos e autarquias locais e pelas instituições particulares de solidariedade social com o apoio financeiro do Estado. 3 - O regime de renda apoiada fica sujeito a legislação própria, aprovada pelo Governo". Segundo o acórdão do STA de 2-2-05, proferido no processo n° 011/04, "São actos de gestão privada os que se compreendem numa actividade em que o agente, despido de poder público, se encontra e actua numa posição de paridade com os particulares a que os actos respeitam e, portanto, nas mesmas condições e no mesmo regime em que poderia proceder um particular, com submissão a normas de direito privado. São actos de gestão pública os que se compreendem no exercício de um poder público, integrando eles mesmos a realização de uma função pública, independentemente de envolverem ou não o exercício de meios de coerção e independentemente ainda das regras, técnicas ou de outra natureza, que na prática dos actos devam ser observadas". Os requerentes residem em fogos que lhe foram distribuídos pelo Fundo de Fomento de Habitação, com o qual celebraram contrato de arrendamento. Este organismo foi extinto pelo DL n° 214/82, de 29-5, tendo, o respectivo património sido transferido para o Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado, nos termos do art° 30° n° l do DL n° 88/87 e, mais tarde, sendo objecto de cessão à Fundação ora recorrida, pelo art° 4° da Lei n° 55-B/2004, DE 30-12, o qual estipula: "Transferência de património edificado para os municípios 1 - O Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado (IGAPHE) pode, sem exigir qualquer contrapartida e sem sujeição às formalidades previstas no artigo 3.°, transferir para os municípios, empresas municipais ou de capital maioritariamente municipal, para instituições particulares de solidariedade social ou para pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, desde que prossigam fins assistenciais e demonstrem capacidade para gerir os agrupamentos habitacionais ou bairros a transferir, a propriedade de prédios ou suas fracções que constituem agrupamentos habitacionais ou bairros, incluindo os espaços existentes de uso público, equipamentos, arruamentos e restantes infra-estruturas, bem como os direitos e obrigações a estes relativos e aos fogos em regime de propriedade resolúvel. 2 - A transferência do património referida no número anterior efectua-se por auto de cessão de bens, o qual constituirá título bastante de prova para todos os efeitos legais, incluindo os de registo. 3 - Após transferência do património, poderão as entidades beneficiárias proceder à alienação dos fogos aos respectivos moradores nos termos do Decreto-Lei n.° 141/88, de 22 de Abril, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 288/93, de 20 de Agosto. 4 - O arrendamento dos fogos destinados a habitação fica sujeito ao regime de renda apoiada, nos termos do Decreto-Lei n.° 166/93, de 7 de Maio". Quanto à natureza das decisões e contratos celebrados pelas Instituições privadas de Solidariedade Social escreveu-se no acórdão do STA de 8-10-02, in rec° n° 01308/02: "I - As Instituições Particulares de Solidariedade Social são pessoas colectivas de direito privado, com autonomia, não administradas pelo Estado, que prosseguem os objectivos enunciados nas diversas alíneas do n.° l do artigo 1.°do Decreto-Lei n.° 118/93, de 25 de Fevereiro, que estabelece o seu Estatuto legal (artigos 1.° e 3.° desse diploma). II - Estão sujeitas à tutela do Estado, cuja autorização dos serviços competentes é necessária para a prática de determinados actos, nomeadamente a aquisição de bens imóveis a título oneroso ou a alienação de imóveis a qualquer título (artigo 32.°, n.° 1), os seus orçamentos e contas carecem de vistos pelos serviços competentes (artigo 33.°), que poderão ordenar a realização de inquéritos, sindicâncias e inspecções a estas instituições e seus estabelecimentos (artigo 34.°). As empreitadas de obras de construção ou grande reparação deverão ser feitas em concurso ou hasta pública, conforme for mais conveniente (artigo 23.°, n.°l). III - Da conjugação da disciplina estabelecida nos preceitos enunciados no número anterior com a estabelecida no artigo 3.°, n.° 2, alínea b) do Decreto-Lei n.° 59/99, de 2 de Março, é de concluir que a sua gestão está sujeita a um controlo por parte do Estado, donde decorre que estas pessoas são de considerar donas de obras públicas, o que significa que os contratos por elas celebrados são contratos de empreitada de obras públicas, regulados pelo referido Decreto-Lei n.° 59/99. São contratos praticados a coberto de uma ambiência de direito público, resultante do predomínio de preocupações de interesse público, que prosseguem, que as leva a não poder adoptar procedimentos diferentes dos nele tipificados (artigo 7º do mesmo diploma) e a actuar numa posição de supra ordenação que lhes possibilita o estabelecimento de cláusulas exorbitantes, ou seja, são contratos administrativos. IV - As relações deles decorrentes são relações jurídicas administrativas, sendo o acto da Direcção de uma dessas instituições que procedeu à adjudicação de um contrato de empreitada um acto administrativo, para cujo conhecimento são competentes os tribunais administrativos (artigo 212.°, n.° 3 da CRP e artigo 3.° do ETAF) e, dentro destes, os tribunais administrativos de círculo (artigo 51.°, alínea j) do ETAF)" cfr, no mesmo sentido, o acórdão do STA de 14-3-06, in proc° n° 0976/05. Do que se acaba de transcrever, decorre, a nosso ver, que, também no caso vertente, os contratos de arrendamento celebrados entre os requerentes e o ex-Fundo de Fomento de Habitação, para ocupação de fogos para habitação social, "são contratos praticados a coberto de uma ambiência de direito público, resultante do predomínio de preocupações de interesse público, que prosseguem, que as leva a não poder adoptar procedimentos diferentes dos nele tipificados (artigo 7.° do mesmo diploma) e a actuar numa posição de supra ordenação que lhes possibilita o estabelecimento de cláusulas exorbitantes, ou seja, são contratos administrativos. Assim, as relações deles decorrentes são relações jurídicas de direito administrativo por que formadas não no âmbito de qualquer contrato de arrendamento, mas dum contrato de arrendamento de um fogo para habitação social, com características específicas de eminente interesse social, já que têm em conta diversos factores personalizados em função das características de cada arrendatário, ficando o mesmo sujeito ao critério de fixação de cláusulas exorbitantes por parte da entidade arrendatária ou da entidade encarregada, por esta, de gerir o seu património. De facto, atendendo ao carácter de cedência por uma entidade pública, com benefícios especiais por esta concedidos normalmente em função da situação de carência económica dos arrendatários, acarreta para estes também especiais deveres, com carácter de imposição, pela entidade proprietária. Daí que a relação assim criada obedeça a normas também específicas que fogem às normas que regem o arrendamento urbano, nomeadamente quanto à fixação das rendas. Nestes termos e independentemente da questão da adequação do meio processual utilizado, suscitada pela entidade requerida nas suas contra alegações e que foge ao âmbito deste recurso jurisdicional, parece-nos que são os tribunais administrativos os competentes para apreciar a questão suscitada nos autos. Aliás, questões semelhantes correram termos na jurisdição administrativa, tal como aconteceu, por exemplo, nos processos n°s 0762/04, 01592/03 e 01203/05, todos do STA e ainda no processo n° 00474/04, deste TCA Sul. Termos em que emitimos parecer no sentido de ser revogada a sentença recorrida, baixando os autos à primeira instância para aí prosseguirem os seus termos. (..)”. * Com dispensa de vistos substituídos pelas competentes cópias entregues aos Exmos Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão, em conferência - artºs. 36º nºs. 1 e 2 CPTA e 707ºnº 2 CPC, ex vi artº 140º CPTA. * Para conhecimento da excepção de incompetência absoluta, pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade: A Todos os Requerentes firmaram contrato de arrendamento com o Fundo de Fomento de Habitação, nos termos das cláusulas contratuais, dos quais, abaixo, se transcreve um dos contratos de arrendamento (cfr. doc. 2, junto com o r.i., de fls. 173 a 174-verso dos autos e admissão por acordo): “(..) FUNDO DE FOMENTO DA HABITAÇÃO CONTRATO DE ARRENDAMENTO Entre Maria José Cecília de Gomes Cabrita Bento Franco na qualidade de representante do Fundo de Fomento da Habitação, nos termos do artº. 4º do Decreto -Lei nº 214/73, de 9 de Maio e Adolfo Fernando Teixeira Pinto, casado [ininteligível], natural de Mões e residente em Lote 249, 3º C é celebrado o presente contrato de arrendamento nas condições a seguir indicadas: I O primeiro outorgante dá de arrendamento ao segundo outorgante o Fogo nº 411 (413-A) do prédio Lote 249 – 3º C sito na Zona N/2 do Bairro de Chelas omisso na respectiva matriz e de que é proprietária o Fundo de Fomento da Habitação. II O arrendamento é pelo prazo de um ano, com início no dia um de Julho de mil novecentos e oitenta considerando-se sucessivamente renovado por iguais períodos se não for denunciado por qualquer dos outorgantes com a antecedência mínima de trinta dias em relação ao termo do prazo contratual. III A renda mensal é da quantia de quatro mil quatrocentos e quatro escudos, actualizável nos termos do artigo 21º do Decreto Lei nº 49 033 de 28 de Maio de 1969 e será paga nos primeiros oito dias de cada mês na Caixa Geral de Depósitos, à ordem do F. F. H.. IV Quando a renda não for paga no prazo estabelecido no presente contrato, disporá o inquilino de quinze dias para efectuar o seu pagamento aumentada de l5% sobre o respectivo montante; decorrido este prazo ficará o arrendatário obrigado a pagar, além das rendas em atraso, uma indemnização igual a 50% do que for devido. V 1. A casa arrendada destina-se exclusivamente a habitação do arrendatário e do seu agregado familiar. 2. É proibida a sublocação, total ou parcial, sob pena de multa igual à renda de seis meses, e de despejo, em caso de reincidência. VI 1. 0 inquilino, não poderá efectuar na habitação quaisquer obras nem de qualquer forma, alterar as suas características nem consentimento escrito do senhorio. 2. No caso de infracção ao disposto no nº 1, é notificado o inquilino para repor a casa no seu estado anterior; se não o fizer, poderá o senhorio rescindir o contrato, sem prejuízo da responsabilidade do inquilino pelas despesas que, para aquele fim tiveram de ser feitas. VII São ainda deveres do arrendatário: 1. Promover a instalação e ligação de contadores de água, gás e energia eléctrica, cujas despesas, bem como as dos respectivos consumos, são da sua conta; 2. Conservar no estado em que actualmente se encontram não só a instalação da luz eléctrica mas ainda todas as canalizações e seus acessórios, pagando à sua conta as reparações que se tornarem necessárias por efeito de incúria ou indevida utilização; 3. Não conservar na habitação animais que incomodem os vizinhos ou causem quaisquer danos; 4. Não fazer ruídos que incomodem os vizinhos; 5. Não depositar lixo senão nos locais para isso destinados. VIII No fim do arrendamento, o inquilino restituirá a casa limpa, com todas as portas, chaves, vidros, instalações, canalizações e seus acessórios ou dispositivos de utilização, sem quaisquer deteriorações, salvo as inerentes ao seu uso normal. IX Sem prejuízo dos casos já contemplados e dos expressos nas disposições legais aplicáveis, pode o senhorio resolver o contrato antes do termo nele previsto, quando se verifiquem os fundamentos seguintes; 1. Haver o inquilino incorrido em qualquer das irregularidades previstas no Decreto nº 49 034, de 28 de Maio de 1969, para obtenção da casa; 2. Não aceitar a actualização da renda nos termos do artigo 21º.do Decreto-Lei nº 49 033; 3. Não cumprir as obrigações impostas pela cláusula VII deste contrato. X Nos termos da Portaria nº 386/77, de 25 de Junho, o inquilino poderá ter direito a um subsídio equivalente à diferença entre a Prestação pessoal de renda e a técnica, O senhorio e o inquilino comprometem-se, nesses casos, a ajustar os valores de acordo com o rendimento do agregado familiar, nos ter da legislação em vigor. XI Tudo o que não estiver expressamente regulado neste contrato sê-lo-á pelas disposições aplicáveis aos diplomas acima citados e demais legislação em vigor, XII O segundo outorgante declara aceitar o presente contrato de arrendamento nas condições nele estatuídas, que se obriga a cumprir pontual e integralmente. Lisboa, 16 de Março de 1982 (assinaturas dos outorgantes) (..)” B Todos os Requerentes firmaram com o Fundo de Fomento de Habitação, contrato de arrendamento cujas cláusulas correspondem às do contrato transcrito em A (cfr. docs. nºs. 1, 2, 3, 4 e 5 junto junto com o r.i., de fls. 169 a 184 dos autos, confissão dos Requerentes cfr. artº 7º r.i. e admissão por acordo). C A Requerida outorgou com o IGAPHE auto de cessão, mediante o qual lhe foi transmitido património imobiliário, no qual se integram os fogos onde residem os ora Requerentes, que abaixo se transcreve na íntegra (cfr. doc. nº 9 junto com o r.i., de fls. 246 a 261 dos autos e admissão por acordo). “(..) INSTITUTO DE GESTÃO E ALIENAÇÃO DO PATRIMÓNIO HABITACIONAL DO ESTADO TRANSFERÊNCIA DE PATRIMÓNIO, DIREITOS E OBRIGAÇÕES DO IGAPHE PARA A FUNDAÇÃO D. PEDRO IV AUTO DE CESSÃO Entre; O Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado, abreviadamente designado por IGAPHE, Instituto Público com sede na Avenida 5 de Outubro, 153 em Lisboa, pessoa colectiva nº 501 800 441, representado por João Paulo Sousa e Silva Zbyszewski, casado, natural da freguesia de Mercês, concelho de Lisboa, residente na freguesia de Santo Condestável, concelho de Lisboa, titular do Bilhete de Identidade nº 8341916, emitido em 7 de Janeiro de 1999, pelos Serviços de Identificação Civil de Lisboa, na qualidade de Presidente do Conselho Directivo do IGAPHE com poderes para o acto conforme deliberação do Conselho Directivo do Instituto, de 25 de Janeiro de 2005, que igualmente aprovou a respectiva minuta; e, A Fundação D. Pedro IV, pessoa colectiva nº 502 7S9 492, representada por Vasco Manuel Abranches do Canto Moniz, divorciado, natural da freguesia de Bonfim, concelho do Porto, residente na freguesia de S. Pedro de Penaferrim concelho de Sintra, titular do Bilhete de Identidade n° 713598, emitido em 17 de Fevereiro de 1997, pelos Serviços de Identificação Civil de Lisboa, na qualidade de Presidente do Conselho de Administração da Fundação D. Pedro IV, com poderes para o acto conforme deliberação, de 14 de Janeiro de 2005, do referido Conselho de Administração, que igualmente lhe deu poderes para aprovar a respectiva minuta. É celebrado o presente auto de cessão patrimonial de direitos e de obrigações nos termos nas condições constantes dás cláusulas seguintes: CLÁUSULA PRIMEIRA Nos termos do artigo 4º da Lei n.° 55-B/2004, de 30 de Dezembro, atenta a deliberação do Conselho Directivo do IGAPHE de 25 de Janeiro de 2005 que aprovou a proposta da Comissão de Avaliação nomeada aos termos e para os efeitos previstos na Resolução do Conselho de Ministros n° 63/2004, de 21 de Maio, o IGAPHE transfere para a Fundação D. PEDRO IV, e esta aceita, sem quaisquer contrapartidas o direito de propriedade e os direitos e obrigações sobre: a. Os prédios urbanos e fracções autónomas de prédios urbanos sitos aos Bairros de Chelas-Zona l, Chelas-Zona N 2, Academia das Ciências, Arco do Cego, Alto da Serafina, Madre de Deus, Calçada dos Mestres, Encarnação, Olivais Norte e Olivais Sul, todos situados no concelho de Lisboa, descritos no Anexo ao presente auto de cessão que dele faz parte integrante para todos os efeitos, b. Os espaços exteriores de uso público, equipamento, arruamentos e restantes infra-estruturas que fazem parte integrante dos Bairros identificados na alínea nterior, CLÁUSULA SEGUNDA 1. A Fundação D. Pedro IV, juntamente com a transferência dos bens referidos na cláusula primeira, aceita a partir da data da respectiva transmissão a responsabilidade pelos direitos e obrigações inerentes aos mesmos, nomeadamente: a) Os contratos de arrendamento e de comodato escritos ou verbais, celebrados pelo IGAPHE ou pelas entidades que o antecederam na titularidade daquele património; b) Os contratos-promessa de compra e venda celebrados pelo IGAPHE ou pelas entidades que o antecederam na titularidade daquele património, vigentes à data de produção de efeitos do presente auto; c) Os compromissos de venda assumidos pelo IGAPHE nos termos do disposto no Decreto-Lei n° 141/88, de 22 de Abril, com o direito ao recebimento dos respectivos pagamentos; d) A titularidade das respectivas acções judiciais pendentes em 1de Fevereiro de 2005; e) O direito ao recebimento das rendas em dívida, bem como o direito a quaisquer indemnizações devidas pelos respectivos moradores e ex-moradores; f) Os acordos celebrados pelo IGAPHE com os respectivos moradores e ex-moradores relativos à regularização de rendas em dívida; g) O direito a receber quaisquer indemnizações a pagar pelos ocupastes ilegais daquele património; h) O encargo com as despesas de condomínio na quota parte que é devida; i) Os contratos celebrados pelo IGAPHE para o fornecimento de energia eléctrica e água relativos ao património transferido, incluindo os recibos postos a pagamento a partir da data da transferência; l) Os contratos relativos à conservação e manutenção de instalações eléctricas e mecânicas existentes; k) As tarifas de conservação de esgotos relativas ao património transferido postas a pagamento posteriormente à data da transferência patrimonial. 2. Exceptuam-se do disposto no número UM todos os direitos e obrigações emergentes de contratos de empreitada e fornecimentos adjudicados pelo IGAPHE ou pelas entidade a quem este sucedeu. CLÁUSULA TERCEIRA 1. A transferência de propriedade sobre os bens imóveis, bem como sobre os respectivos direitos e obrigações anteriormente identificador produz efeitos a partir do dia 1de Fevereiro de 2005 2. Sem prejuízo do estipulado no número anterior, o IGAPHE procederá durante os meses de Fevereiro a Abril de 2005, inclusive, à cobrança das rendas e das prestações de acordos relativos à regularização de rendas em dívida, efectuando a transferência dos valores recebidos para a Fundação D. Pedro IV, oportunamente. CLÁUSULA QUARTA Após a transferência, a Fundação D. Pedro IV só poderá alienar os fogos identificados na cláusula primeira e no anexo ao presente auto aos respectivos moradores e nos termos e condições constantes do Decreto-Lei nº 141/88, de 22 de Abril, com a redacção dada pelo Decreto-Lei nº 288/93, de 20 de Agosto. CLÁUSULA QUINTA O arrendamento dos fogos destinados a habitação fica sujeita ao regime de renda apoiada, nos termos do disposto no Decreto-Lei nº 166/93, de7 de Maio. CLÁUSULA SEXTA Para todos os fogos que venham a vagar a Fundação D. Pedro IV obriga-se a solicitar à Câmara Municipal de Lisboa e ao IGAPHE ou a entidade que lhe suceda, a indicação de agregados familiares a realojar nos mesmos, aos termos da legislação aplicável. CLÁUSULA SÉTIMA A Fundação D. Pedro IV obriga-se, caso as entidades referidas na cláusula anterior não indiquem agregados familiares para a ocupação daqueles fogos, a destiná-los prioritariamente ao realojamento de agregados familiares ou a arrendá-los de acordo com o disposto no Decreto-Lei nº 797/76, de 6 de Novembro, no regime da renda apoiada, ou ainda a aliená-los ao Município de Lisboa. CLÁUSULA OITAVA A Fundação D. Pedro IV obriga-se a apresentar anualmente ao IGAPHE ou à entidade que lhe suceda, o relatório e contas do exercício das suas actividades do ano anterior, que demonstrem a gestão do património referido na cláusula primeira, designadamente no que respeita a novos arrendamentos e à alienação de fracções. CLÁUSULA NONA Em caso de incumprimento do estipulado nas cláusulas quarta a oitava do presente auto de cessão de bens, a Fundação D. Pedro IV incorre na obrigação de indemnizar o IGAPHE ou a entidade que lhe suceda, até ao montante equivalente ao valor patrimonial transferido, sendo a indemnização a pagar graduada conforme a gravidade da infracção. CLÁUSULA DÉCIMA Não obstante a indemnização prevista na cláusula anterior, ou verificando-se o incumprimento das obrigações previstas ao presente auto de cessão, o IGAPHE ou a entidade que lhe suceda, mantém a faculdade de resolver o presente contrato, revertendo o património em posse da Fundação D. Pedro IV para o mesmo ou para a entidade que lhe suceda. Esta transmissão fica isenta do pagamento imposto de selo nos termos da alínea d) do artigo 6º do respectivo Código, aprovado pelo Decreto-Lei n° 287/2003, de 12 de Novembro. Está dispensada à apresentação de licenças de utilização dos bens transferidos, nos termos do disposto nos artigos 12º e 20º do Decreto-Lei nº 288/93, de 20 de Agosto A transferência de propriedade é celebrada mediante auto de cessão nos termos do nº 2 do artigo 4º da Lei nº 55-B/2004, de 30 de Dezembro. Feito em duplicado» e assinado em Lisboa, a 1 de Fevereiro de 2005. Pelo IGAJPHE (assinatura) Pela Fundação D. Pedro IV (assinatura) (..)” D Os Requerentes foram notificados da sujeição dos fogos ao regime de renda apoiada nos termos da notificação - quanto a uma das notificações, por as demais terem conteúdo igual à excepção do valor da nova renda - que abaixo se reproduz na integra - cfr. docs. n°s. 60 a 112, juntos com o r.i. de fls. 263 a 367 dos autos e admissão por acordo): “(..) Fundação D. Pedro IV MARIA DA RESSURREIÇÃO RODRIGUES RUA ADAES BERMUDES, LOTE 249-R/CD 1900-608 LISBOA N/ Refª 1X3.2 – 952/05 Lisboa, 22 de Novembro de 2005 Assunto: Notificação da aplicação do regime de renda apoiada Renda apoiada para o ano de 2006 Exma. Sra. 1. Em conformidade com o previsto no Artº 11º do Decreto-Lei nº 166/93, de 7 de Maio, na sequência da publicitação da aplicação do regime de renda apoiada nos Jornais "24 horas”, "Diário de Notícias” e “Correio da Manhã”, nos dias 10, 11 e 12 de Outubro de 2005, a Fundação D, Pedro IV comunica a V. Exa. que a partir do dia 1 de Janeiro de 2006, o fogo sito no LOTE 249 - R/C D na RUA ADAES BERMUDES, Concelho de Lisboa, fica sujeito ao regime de renda apoiada previsto no Decreto-Lei nº 166/93, de 7 de Maio. 2. Ao abrigo dos Artºs. 2º, 3º, e 5º do Decreto-Lei n.° 106/93, de 7 de Maio, o valor mensal da sua renda apoiada, determinado pela aplicação da taxa de esforço ao rendimento mensal corrigido do agregado familiar, é de 245,6 euros. 3. O montante da renda actualiza-se, anual e automaticamente, em função da variação do rendimento mensal corrigido do agregado familiar, conforme o previsto no Artº 8º nº 2, do Decreto- Lei nº 166/93 de 7 de Maio. 4. Ao abrigo dos Artºs. 2º, 4º do Decreto-Lei nº 166/93 de 7 de Maio, o valor do preço técnico do fogo que habita é de 246,6 euros. 5. O pagamento do preço técnico por inteiro, é determinado pelo incumprimento injustificado da apresentação de documentos e esclarecimentos necessários para a instrução e ou actualização dos processos de arrendamento, tal como, por falta de declaração quer por falsa declaração dos rendimentos do agregado familiar, sem prejuízo de constituir fundamento de resolução do contrato de arrendamento e a eventual responsabilidade criminal do declarante (conforme o previsto no Artº 9º nº 3 e Artº 6º nº 5 e nº 6 do Decreto Lei nº 166/93 de 7 de Maio) 6. Conscientes das dificuldades que se vivem presentemente, nesta fase de mudança, durante todo o ano de 2006 não se aplicará o valor total da renda apoiada calculada de 245,6 euros, referido no ponto 2, mas apenas o valor de 171,92 euros, importância esta que deverá ser creditada na sua conta bancária mensalmente de 1 a 8 de cada mês. Com os nossos melhores cumprimentos, SERVIÇO DE HABITAÇÃO (Directora) (assinatura) (..)” * Nos termos do artº 712º nº 1 b) CPC ex vi artº 140º CPTA, adita-se ao probatório a alínea E, com a seguinte matéria de facto: E A publicitação da aplicação do regime de renda apoiada no jornal denominado “24 horas” foi feita no dia 11.Out.2005, terça-feira, na página nº 37 destinada a “Pub. – anúncios classificados” , com o seguinte teor: “(..) 24horas • Terça-feira, 11 de Outubro de 2005 PUB • ANÚNCIOS CLASSIFICADOS • 37 Fundação D. Pedro IV Instituição Particular de Solidariedade Social A FUNDAÇÃO D. PEDRO IV Instituição Particular de Solidariedade Social Na qualidade de locadora anuncia: A aplicação do regime de renda apoiada a partir de l de Janeiro de 2006 conforme a deliberação de 8 de Julho de 2005 do Conselho de Administração desta Fundação, aos fogos abaixo citados: a) Freguesia de Marvila, fogos sitos: • Praceta André Vidal de Negreiros e Via Principal de Peões, Lote 105. • Rua André Vidal de Negreiros e Av. Dr. Augusto de Castro, Lotes 9; 10; 11; 12; 13; 14. • Via Principal de Peões e Rua André Vidal de Negreiro, Lote 30. • Rua Aquilino Ribeiro, Lotes 15; 35. • Rua Aquilino Ribeiro e Rua Eng. Ferreira Dias, Lote 1. • Rua Eng. Rodrigues de Carvalho, Lote 2 Corpo A e B; 3 Corpo A e B; 4. • Rua Manuel Teixeira Gomes, Lotes 60; 60 A; 66; 67. • Rua Rui de Sousa e Rua Manuel Teixeira Gomes, Lote 68. • Rua Paulo Dias de Novais, Lotes 17; 18; 19; 20; 34. • Rua Rui de Sousa, Lotes 64; 65 A Corpo l e 2; 65 B; 65 Corpo 1 e 2. • Rua Tomás Alcaide, Lotes 62; 63 Corpo 1e2. • Rua Adães Bermudes, Lotes 249; 250; 251; 252; 253. • Rua Cassiano Branco, Lote 221 Bl;221 B2. • Rua Domingos Parente, Lote 247. • Rua Luís Cristino da Silva, Lotes 200; 203; 222; 223 Bl; 223 B2; 224, 227 Hl; 227 H2; 248. • Rua Norte Júnior, Lote 232. • Rua Keil do Amaral, Lote 225Dl;225D2;226EI;226E2;228Gl;228 G2;228G3; 228G4; 228G5; 229FI;229F2;229F3. b) Freguesia de Santa Maria dos Olivais, fogos sitos: • Largo l º Tenente João Rodrigues de Moura, nº 5, R/C Dto. • Rua de Baixo Limpopo, n.° 5,3.° Esq. • Rua Cidade da Beira, n.° 63, R/C Esq. • Rua das Escolas, nº l; • Rua do Poço Coberto, nº 2. Para efeitos de esclarecimentos sobre a aplicação do regime de renda apoiada, os arrendatários deverão dirigir-se à Travessa do Torel, l - 1150-347 LISBOA (..)” – fls. 262 dos autos. *** DO DIREITO Do ponto de visto do objecto da presente providência cautelar, os Requerentes ora Recorrentes pedem a suspensão de eficácia “(..) dos actos administrativos praticados pela Requerida Fundação D. Pedro IV – Instituição Particular de Solidariedade Social, que determinaram a aplicação do regime da renda apoiada aos fogos (..) do preço técnico que foi fixado para cada um destes fogos, respectivamente (..) e do montante da renda apoiada que foi considerado devido por cada um dos requerentes, respectivamente (..) bem como do valor exigido só para 2006 para alguns dos requerentes (..) A pretensão dos Requerentes traduz-se, pois, na suspensão da decisão do senhorio de aumentar as rendas dos locados de 4 400$00 para 50 000$00, rectius, 245,6 euros mensais [49 120$00], conforme alíneas A e D do probatório, enquanto aguardam o trânsito em julgado da decisão em sede da acção principal de que esta providência é dependente. Concretizando, os actos jurídicos cuja suspensão é pedida são as novas rendas para 2006 objecto de notificação [em Novembro.2005] aos Requerentes ora Recorrentes na sequência da deliberação de 8.JUL.2005, [a cessão patrimonial do IGAPHE a favor da Fundação D. Pedro IV teve lugar por contrato de 1.FEV.2005], deliberação objecto de anúncio público, entre outros, na página 37 do dito jornal “24 horas” de 11.Out.2005, transcrito na alínea E do probatório supra. * Sabido que, por imperativo constitucional, cfr. artºs. 212º nº 3 e 268º nº 4 CRP, a delimitação da competência dos tribunais administrativos exige que a actividade administrativa desenvolvida no caso concreto assuma a natureza de relação jurídica regulada pelo Direito Administrativo, importa qualificar a natureza do regime jurídico que compete à relação contratual controvertida subjacente ao objecto do procedimento cautelar em causa. Cumpre evidenciar que o que está em causa é a suspensão do aumento da retribuição locatícia a cargo dos inquilinos ora Recorrentes, no domínio dos contratos de arrendamento para habitação, de renovação sucessiva e de que são titulares, contratos esses em que operou a regra da emptio non tollit locatum traduzida, no que respeita ao terceiro cessionário, ou seja, a Fundação D. Pedro IV, na transmissão da posição do locador detida pelo IGAPHE pela subsistência dos arrendamentos em face de cláusula contratual expressa de sub-rogação na posição de senhorio, não sendo de esquecer que se trata de regime de sub-rogação legal já decorrente do artº 1057º C. Civil, cláusula cujo teor é o seguinte: “(..) CLÁUSULA SEGUNDA: 1. A Fundação D. Pedro IV, juntamente com a transferência dos bens referidos na cláusula primeira, aceita a partir da data da respectiva transmissão a responsabilidade pelos direitos e obrigações inerentes aos mesmos, nomeadamente: a) Os contratos de arrendamento e de comodato escritos ou verbais, celebrados pelo IGAPHE ou pelas entidades que o antecederam na titularidade daquele património; (..)”. Se os contratos de arrendamento em que a Recorrida é senhorio por sub-rogação do IGAPHE ex vi da cláusula 2ª do contrato de cessão de 1.2.2005, e sobre os quais pretende aumentar as rendas segundo o regime da renda apoiada do DL 166/93 de 7.5 evidenciarem marcas de administratividade o presente processo competirá à jurisdição administrativa por via do disposto do artº 4º nº 1 f) do ETAF. a. artº 4º nº 1 f) do ETAF Segundo o artº 4º nº 1 f) do novo ETAF (1), ademais dos contratos administrativos por natureza e por determinação legal, cfr. artº 178º nº 2 CPA, compete à jurisdição administrativa apreciar as questões relativas à interpretação, validade e execução dos contratos, o “de objecto passível de actos administrativo”, v.g. artº 179º CPA, o “especificamente a respeito dos quais existam normas de direito público que regulem aspectos específicos do respectivo regime substantivo”, o “em que pelo menos uma das partes seja uma entidade pública ou concessionário que actue no âmbito da concessão” o “que as partes tenham expressamente submetido a um regime substantivo de direito público”. À luz destes critérios concretamente quanto ao segundo, são dirimíveis pelos tribunais administrativos as situações emergentes tanto das relações contratuais típicas a que aludem os artºs 178º nº 2 e 179º CPA como “(..) quaisquer outros contratos regulados, em aspectos “substantivos” do seu regime, por normas de direito público. Regimes substantivos de direito público, por nós, são aqueles em que a parte administrativa goza de poderes de autoridade e, em assim, aqueles cuja execução é fixada mediante “cláusulas” específicas de interesse público, postas pelo legislador em consideração do ente público contratante, ou, se se preferir, em consideração do objecto implicado no contrato. Necessário é não esquecer que o que se deve discutir a este propósito é o regime do contrato em causa, não o regime legal do exercício de uma actividade profissional que seja objecto de uma prestação contratual, porque, hoje, praticamente todas as actividaders de particulares para fins de mero interesse individual estão jurídico-publicamente condicionadas e reguladas. (..) (..) por força deste segmento da alínea f) do artº 4º /1 do ETAF, basta que um qualquer aspecto “substantivo” (não meramente procedimental) relevante do próprio contrato esteja sujeito – no que respeita aos direitos e deveres das partes, ou à sua direcção, modificação, fiscalização extinção ou sanção – a um regime específico, de direito público, para que o mesmo se considere (administrativo e) integrado na jurisdição administrativa. Além de outros, até mais evidentes, é o que sucede com os contratos de arrendamento de imóveis do domínio privado do Estado e das autarquias locais (por força da remissão constante do artº 1º do Decreto Lei nº 45 133), os quais se encontram sujeitos, nos termos do Decreto Lei nº 507/79 (de 24.XII) a ordem administrativa de despejo antecipado e à sua efectivação policial, se necessária, por razões de serviço (ou dos serviços). (..)”. (2). Compete, ainda, aos tribunais administrativos apreciar a conformidade da actuação das partes com o clausulado contratual e o complexo normativo aplicável no contexto e dirimir os litígios que possam surgir a propósito dos correspondentes contratos tendo em conta os factores que o artº 4º nº 1 f) ETAF prevê, no tocante à “(..) sempre aberta questão da delimitação da figura do contrato administrativo. Com efeito, a solução de se determinar que, para além dos casos de contrato típico ou de contrato com objecto passível de acto administrativo, só ficam submetidos à apreciação da jurisdição administrativa os litígios emergentes de contratos que as partes expressamente submetam a um regime de direito público [..] talvez possa constituir uma pista para que, no plano substantivo, se avenca para a delimitação da figura do contrato administrativo nos mesmo termos. (..)”. (3). De modo que “(..) Quando a lei não determina a natureza do contrato, tem então o intérprete de a “descobrir”. Tendo em conta o critério da relação jurídica administrativa (artº 178º nº 1 do CPA) e os factores a que se refere o artº 4º nº 1 f) do ETAF, deverá então qualificá-lo como administrativo quando: (..) b) a lei, sem indicar a natureza jurídica, define um regime substantivo especial para um contrato (..) disciplinando aspectos da relação contratual, dos direitos e deveres das partes (..); em tal caso, o legislador quer regular em termos especiais o contrato pelo facto de a Administração ser parte; estaremos aí perante uma administrativização da relação contratual e a sujeição dessa relação a um regime substantivo de direito público, pelo que o contrato não deve deixar de ser qualificado como administrativo; trata-se do segundo tipo de contratos a que se refere o artº 4º nº 1 f) do ETAF (“contratos especificamente a respeito dos quais existam normas de direito público que regulem aspectos específicos do respectivo regime substantivo”) (..)”. (4). b. recursos públicos e necessidades colectivas - artº 405º C. Civil O clausulado dos contratos de arrendamento celebrados entre o Fundo de Fomento da Habitação e os ora Recorrentes - vigentes aquando da sub-rogação da ora Recorrida Fundação D. Pedro IV na posição de senhorio do IGAPHE [conforme contrato de cessão de 1.2.2005, supra transcrito na alínea D do probatório], sendo o IGAPHE o instituto público com personalidade jurídica que sucedeu ao extinto FFH [pelo DL 214/82 de 29.5] na dominialidade do património e nos arrendamentos e demais contratos conforme artº 30º nº 1 DL 88/87 de 26.2 - não permite dúvidas no tocante à natureza administrativa de tais arrendamentos. Em primeiro lugar, pelas disposições de direito público a que nos mesmos se faz referência nas cláusulas IX e X, a saber, o DL 49033 de 20.5.69, o Decreto 40064 da mesma data e a Portaria 386/77 de 25.6 que em ordem à promoção da habitação social – objectivo dos arrendamentos em causa – determina o esquema de cálculo da renda técnica, com o objectivo de “(..) adequar a renda à dimensão e situação económica dos agregados familiares de menores recursos (..)”. Segundo, a cláusula 2ª do contrato de cessão do IGAPHE a favor da Recorrida em que esta expressamente “aceita a partir da data da respectiva transmissão a responsabilidade pelos direitos e obrigações inerentes aos mesmos, nomeadamente: a) Os contratos de arrendamento e de comodato escritos ou verbais, celebrados pelo IGAPHE ou pelas entidades que o antecederam na titularidade daquele património”. Terceiro, a cláusula 8ª do citado contrato de cessão, pela qual a Recorrida “Fundação D. Pedro IV obriga-se a apresentar anualmente ao IGAPHE ou à entidade que lhe suceda, o relatório e contas do exercício das suas actividades do ano anterior, que demonstrem a gestão do património referido na cláusula primeira”. Quarto, o teor das notificações de aumento de rendas aos ora Recorrentes, pela qual a Recorrida declara que o cálculo de aumento de rendas obedece às disposições do DL 166/93 de 7.5, no que tange à renda apoiada para “(..) os imóveis sujeitos ao regime de arrendamento social (..)”. * Todo o contrário do que ocorre no domínio do direito civil, por força do estatuído no artº 405º Civil em que rege o princípio da livre conformação do conteúdo dos contratos obrigacionais pelas partes outorgantes, tendo apenas como observância vinculada os chamados “limites da lei”, isto é, ressalvadas as imposições de ordem pública, boa-fé e bons costumes, v.g., entre outros, as artºs. 280º nº 2, 334º nº 2 e 762º nº 2 todos do C. Civil. Em nosso critério e recorrendo às palavras de Freitas do Amaral e Mário Aroso de Almeida, o complexo normativo e contratual que regula os contratos de arrendamento e, concretamente, o aumento de rendas determinado pela Recorrida configura um regime jurídico de “(..) regras específicas que não podem deixar de ser qualificadas como de direito público, uma vez que têm em vista contratos celebrados por entidades que gerem recursos públicos para a satisfação de necessidades colectivas (..)” (5) . Recursos públicos constituídos pelo património imobiliário do Fundo de Fomento da Habitação, transmitido para o IGAPHE e para a Fundação D. Pedro IV, a título gratuito, note-se, e satisfação de necessidades colectivas que no caso se traduz na promoção da habitação social. * c. reserva constitucional de direito administrativo Em função da reserva constitucional a favor das autoridades públicas do exercício de poderes e prerrogativas de autoridade, as entidades privadas não são admitidas a exercer poderes públicos que se traduzam em prerrogativas de autoridade de carácter normal ou permanente salvo expressa disposição constitucional: “(..) possibilitar a escolha do Direito Administrativo por entidades privadas significaria permitir verdadeiros fenómenos de auto-atribuição de poderes de autoridade, mutilando-se, em consequência, o princípio da legalidade da competência e reserva constitucional do exercício normal de poderes de autoridade para as autoridades pública. Não existe, por conseguinte, qualquer espaço de autonomia da vontade privada no sentido de habilitar a possibilidade de escolha da aplicação do Direito Público nas formas de actuação empresarial das entidades privadas (..) [e] não possa uma entidades privada, agindo enquanto tal, exercer prerrogativas de autoridade ou poderes exorbitantes sobre os outros sujeitos de direito, servindo-se para o efeito do Direito Administrativo.(..)” Por outro lado, admitir o recurso a normas de Direito Administrativo sem, implícitamente, admitir também que tal pressupõe o exercício de competências e prerrogativas de autoridade – poderes exorbitantes se comparados com os poderes subjectivos normais nas áreas obrigacionais configuradas como lugares paralelos próprios do Direito Privado - traduz uma concepção em que o “(..) Direito Administrativo nega-se a si próprio, suicidando a sua autonomia e a sua própria razão de existência. (..) em síntese: não há Direito Administrativo sem a atribuição a um sujeito de poderes unilaterais de autoridade sobre vários sujeitos e cujo exercício está sempre teleologicamente vinculado à prossecução do interesse público. (..) (6). * Dada a indissociável ligação entre Direito Administrativo e jurisdição administrativa, como já acima posto em evidência, constitucionalmente firmada nos artºs. 212º nº 3 e 268º nº 4 da CRP, a “(..) fuga generalizada da actividade administrativa para o Direito Privado, frustando a competência reservada dos tribunais administrativos, acabaria por mutilar todos os direitos subjectivos de natureza processual conferido pelo artigo 268º nº 4, enquanto formas específicas configuradas pela Constituição de concretização pelos administrados do direito geral de acesso aos tribunais, desvirtuando ou inutilizando o princípio do acesso à justiça administrativa (..) Neste preciso sentido, pode extrair-se, em conclusão, a existência de uma reserva de Direito Administrativo garantida pela Constituição (..)” em que o Direito Privado “(..) expressa valores e interesses constitucionais decorrentes dos princípios da igualdade e da liberdade que, bem ao contrário do princípio da competência e da relação supra-ordenação/subordinação que caracteriza o Direito Administrativo, se mostram insusceptíveis de constituir a forma típica de actuação da Administração quando esta exerce prerrogativas de autoridade (..) poderes unilaterais de autoridade visando a prossecução do interesse público e cujo fundamento de conformidade não podia ter como padrão as soluções do Direito Civil (..).(7), com sublinhados nossos. * Com fundamento nas razões supra expostas entendemos que o regime jurídico dos contratos de arrendamento a que aludem os autos evidenciam um modo de normativização próprio do Direito Administrativo no domínio das relações jurídicas contratuais introduzindo, como diz a doutrina, “factores de administrativização” que patenteiam “marcas – importantes e juspublicísticamente protegidas (específica ou exclusivamente) – de administratividade” (8). Em nosso critério, ao caso dos autos cabe inteiramente a seguinte proposição doutrinária, a que se adere e que se transcreve, na parte julgada relevante: “(..) As marcas de administratividade dos contratos administrativos não residem, portanto, só na atribuição ou assunção explícita da prerrogativa de autoridade (se bem que ela seja, claro, factor iniludível de administratividade): há casos em que se chega à existência da prerrogativa, precisamente, através da presença de outras marcas ou factores de administrativização jurídica da respectiva relação. Pensamos, aliás, que essa proposta de trazer para o direito administrativo todos os contratos que tragam marcas – importantes e juspublicísticamente protegidas (específica ou exclusivamente) – de administratividade, é a única compatível com a imputação constitucional (artº 214º nº 3) da jurisdição do direito administrativo e das relações jurídico-administrativas aos tribunais administrativos. Está aí assumido, como o está no artº 1º do ETAF – e agora no Código de Procedimento Administrativo [178º nº 1 e 179º] -, que o direito das relações jurídico-administrativas não é um direito que extravaza dos institutos ou categorias do direito privado, mas é um direito (potencialmente) concorrente com ele em todos os domínios, desde que esteja a regular a vida jurídica de entes encarregados da realização de tarefas da própria colectividade ou o modo de realização de interesses assumidos como sendo públicos, da própria colectividade. (..) (..) admite-se que, no caso de uma figura contratual prevista para ser utilizada por Administrações Públicas não ter disciplina específica na lei administrativa – como sendo um contrato exorbitante (do) ou inconcebível no direito privado ou, pelo menos, distinto os que lhe correspondem, quando celebrados entre particulares – ela (tal figura) possa, mesmo assim, ser reportada ao direito administrativo contratual, ao regime deste capítulo do Código, por decorrência de qualquer marca significativa de administratividade assumida e querida no respectivo título. (..)” (9). * Donde se conclui pela competência da jurisdição administrativa para conhecer do presente litígio. * Não se conhece desde já em substituição (artº 715º nº 2 CPC ex vi artº 1º LPTA) na medida em que a matéria de facto constante do probatório, incluso a aqui aditada, não é suficiente para substanciar o conhecimento do peticionado, nem seria adjectivamente lícito assim proceder à fixação da factualidade por se traduzir na supressão de um grau de recurso no domínio da matéria de facto. Devem os autos, assim, transitar para a 1ª Instância para fixação do pertinente probatório e julgamento devido. *** Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul – 2º Juízo em, na procedência do recurso, julgar competente a 1ª Instância da jurisdição administrativa em razão da matéria suscitada nos autos, e, consequentemente, revogar a sentença proferida., devendo a instância prosseguir se nada mais obstar. Sem custas por isenção subjectiva da Recorrida – artº 2º nº 1 c) CCJ. Lisboa, 18.Maio.2006. (Cristina dos Santos) (Teresa de Sousa) (Xavier Forte) (1) Introduzido pela Lei 13/2002 de 19.02, republicado e em vigor desde 1.1.2004 conforme artº 1º da Lei nº 4-A/2003 de 19.02 que deu nova redacção ao artº 9º da Lei 13/02, (2) Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, Código de processo nos tribunais administrativos – Estatuto dos tribunais administrativos e fiscais – Anotados, Vol. I, Almedina/2004, págs. 56/57. (3) Mário Aroso de Almeida, Implicações de direito substantivo da reforma do contencioso administrativo, CJA nº 34, pág. 78. (4) Pedro Gonçalves, O contrato administrativo – uma instituição do direito administrativo do nosso tempo, Almedina/2004, págs.58/59. (5) Diogo Freitas do Amaral, Mário Aroso de Almeida, Grandes linhas da reforma do contencioso administrativo, Almedina/2003, págs. 39 e 40. (6) Paulo Otero, Vinculação e liberdade de conformação jurídica do sector empresarial do Estado, Coimbra Editora/1998, págs. 265 e 266. (7) Autor e Obra citada em (11), págs. 291 e 292. (8) Mário Esteves de Oliveira, Costa Gonçalves, Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo – Comentado, 2ª edição, Almedina, págs.811 e 812. (9) Autores e Obra citada em (8), págs. 812 e 813, comentário ao artº 178º CPA. |