Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1971/16.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:03/11/2021
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
ILEGITIMIDADE
Sumário:Mesmo perante um conceito amplo de legitimidade para o processo judicial tributário (quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido) e perante o próprio conceito de interesse legalmente protegido, não se vê que tal pressuposto processual possa ser atribuído ao recorrente pois não é nem sujeito passivo da liquidação impugnada, nem é responsável subsidiário (não está a ser responsabilizado subsidiariamente pois não foi contra ele ordenada reversão no processo de execução fiscal - nº 4 do art. 23º da LGT; nº 3 do art. 9º do CPPT), nem é titular de interesse legalmente protegido.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO
J....., com os demais sinais nos autos, vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que declarou o recorrente parte ilegítima da Acção de Impugnação Judicial que o mesmo intentou contra a FAZENDA PÚBLICA, onde requereu que fossem declaradas inválidas/nulas as liquidações adicionais de IVA, com os n.º ....., ....., ....., ....., ..... e ....., e, devolvidos todos os valores indevidamente retidos por conta dessas liquidações.

O Recorrente, J....., apresentou as suas alegações, e formulou as seguintes conclusões:

«A) A douta sentença que aqui se recorre considerou que "(...) não se vê que tal pressuposto processual possa ser atribuldo ao Impugnante: nem é sujeito passivo da liquidação impugnada, nem é responsável subsidiário (não está a ser responsabilizado subsidiariamente pois não foi contra ela ordenada a reversão no processo de execução fiscal - nº 4 do artigo 23° da LGT; nº 3 do artigo 9° do CPPT), nem, conforme acima de concluiu, é titular de interesse legalmente protegido,na medida em que,por um lado, o ato tributário de liquidação (autoliquldação), objeto desta impugnação judicial,projeta os seus efeitos na esfera juridica e patrimonial do sujeito passivo de IVA, sociedade S.....,S.A., e não na esfera jurídica e patrimonial do Impugnante, mero representante legal dessa sociedade, e, por outro lado, a notificação que lhe foi feita no âmbito do processo 9492/05.0TOLSB não incorpora qualquer liquidação de imposto operada em nome do Impugnante, nem lhe confere legitimidade para a intervenção no processo judicial tributário."

B) Acrescentando ainda a douta sentença que "termos em que se defere a arguição da exceção dilatória da ilegitimidade do Impugnante."

C) Decidindo desta forma, erradamente, o Tribunal a quo "Pelo exposto, nos termos das disposições legais citadas, julgo o Impugnante parte ilegítima e absolvo a Fazenda Pública da instância."

D) Salvo o devido respeito, o entendimento do Tribunal a quo é de todo inconcebível, e não pode o mesmo prevalecer.

E) Nos termos do disposto no n°1 do artigo 9º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), "Têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes, Incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido.''

F) Acrescentando o nº 2 do mesmo dispositivo legal que, "A legitimidade dos responsáveis solidários resulta da exigência em relação a eles do cumprimento da obrigação tributária ou de quaisquer deveres tributários, ainda que em conjunto com o devedor principal.''

G) Acresce que, estatul o artigo 105° do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT) no seu nº 1 que "Quem não entregar à administração tributária, total ou parcialmente, prestação tributária de valor superior a (euro) 7500, deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar é punido com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias.''

H) Salvo melhor entendimento, do teor da norma legal acima transcrita, verifica-se a exigência ao destinatário da notificação nos termos do artigo 105º do RGIT, do pagamento da obrigaçao tributária.

I) Aliás, sob pena de sendo responsável subsidiário na obrigação de pagamento vir a ser responsabilizado, pelo não pagamento e corno autor do alegado crime de abuso de confiança fiscal.

J) Por tudo, isto, e tendo o aqui Impugnado, sido notificado, corno ficou provado nos presentes autos, nos termos do disposto no artigo 105º nº 4 alínea b) do RGIT, bem como tido contra o mesmo, na qualidade de responsável solidário proferido despacho de acusação do crime de abuso de confiança fiscal, é de todo incompreenslvel que o Tribunal a quo, considere, que o mesmo nao tem legitimidade, em virtude de não ter um interesse legalmente protegido.

K) Mais ao ser solicitado ao mesmo o pagamento do imposto, sob pena de prosseguimento de procedimento criminal, as liquidações objeto dos presentes autos, projeta inequivocamente os seus efeitos na esfera jurídica e patrimonial do aqui Impugnante.

L) Pois que é de todo incompreensível, que o Impugnante tenha legitimidade e seja considerado responsável subsidiário, no procedimento criminal, e que no processo judicial tributário não o tenha.

M) Desta forma, andou mal o Tribunal a quo, ao considerar não só que o Impugnante não tem um interesse legalmente protegido, bem como que os atos impugnados não produzem efeitos na esfera jurídica do Impugnado.

N) Pois que, se uma pessoa, que é condenado por crime de abuso de confiança fiscal, pelo imposto aqui em causa, não tem legitímidade, por não ter interesse legitimo em demandar, quem terá?

O) Ora, o Recorrente, durante os anos de 2005 a 2007, foi gerente da sociedade "S....., S.A.", pessoa coletiva número ......

P) E como já supra referido, por esse facto, nos termos do disposto no artigo 105° nº 4 al. b) do RGIT, foi notificado para proceder ao pagamento das importâncias decorrentes das liquidações adicionais e dos respetivos juros de mora, e coima aplicável.

Q) E, por conta destes factos, foi constituido arguido e condenado no âmbito do processo de inquérito nº 9492/05.0TDLSB. Sendo que, a referida Sociedade Comercial veio a ser objeto de liquidação.

R) Desta forma, é indubitável com o interesse do Impugnante em demandar, e consequentemente a sua legitimidade processual e material.

S) As liquidações adicionais objeto nos presentes autos, tiveram origem nas seguintes faturas:(i) Nota de Débito nº 11/2005, de 31103/2005; (ii) Nota de Débito nº 12/2005, de 30/04/2005; (iii) Nota de Débito nº 13/2005, de 31/05/2005; (iv) Nota de Débito nº 14/2005, de 30/06/2005; (v) Nota de Débito nº 15/2005, de 31/07/2005; (vi) Nota de Débito nº 16/2005,de 31/08/2005; (vii) Nota de Débito nº 17/2005, de 30/09/2005; (viii) Nota de Débito nº 2/2004, de 30/07/2004; (ix) Nota de Débito nº 3/2004, de 31/08/2004; (x) Nota de Débito nº 4/2004, de 30/09/2004; (xi) Nota de Débito nº 5/2004, de 31/10/2004; (xii) Nota de Débito nº 6/2004, de 30/11/2004, (xiii) Nota de Débito nº 7/2004, de 30/12/2004.

T) E da breve análise das referidas faturas, constata-se que as mesmas se referem única e exclusivamente a cedência de pessoal. Constata-se ainda que a S....., S.A., apenas e somente pretende ser reembolsada dos montantes despendidos relativos ao pessoal cedido.

U) Ora, a cedência de pessoal não é considerada, para efeitos de tributação de IVA, como prestação de serviços, desde que o montante, debitado à entidade a quem foi cedido o pessoal, corresponda comprovadamente, ao reembolso exato das despesas com ordenados ou vencimentos, os respetivos encargos com a segurança social, e quaisquer outras importâncias obrigatoriamente suportadas pela entidade a quem pertencem os trabalhadores, por força de contrato de trabalho, ou outra legislação aplicável.

V) É este,efetivamente o caso dos presentes autos.

W) É aliás, este o entendimento na doutrina expressa pela administração fiscal, que na sequência do despacho nº 384/99- XII, de sua Exa. o Ministério das Finanças de 13/10/1999, foi elaborado o Oficio - Circulado nº 30019 de 04/05/2000, da Direção de Serviços do IVA, que, tendo em vista uniformizar procedimentos, divulga a não sujeição a imposto das operações de cedência de pessoal em todas as situações em que o montante debitado comprovadamente corresponda ao reembolso de despesas com ordenados ou vencimentos, quotizações para a segurança social e quaisquer outras importâncias obrigatoriamente suportadas pela empresa a que pertence o trabalhador, por força de contrato de trabalho ou previstas na legislaçao aplicável (v.g. prémios de seguros de vida, complementos de pensões, contribuições para fundos de pensão, etc.).

X) Sendo este o entendimento e a obrigatoriedade desde o ano de 2000, aquando da emissão das faturas aqui em causa, em 2004 e 2005, e que originaram as liquidações adicionais objeto dos presentes autos, a S....., S.A., não devia, nem podia liquidar IVA. Pois que, as operaçoes tituladas pelas mesmas são a "Cedência de Pessoal", e como tal, não sujeitas a IVA.

Y) Porém, e erradamente, a mesma emitiu as faturas e liquidou o IVA correspondente. E isto, a pedido da equipa de inspeção tributária que ai se encontrava a efectuar o procedimento de inspeção. Consequentemente, as mesmas deram origem a correções meramente aritméticas.

Z) Acresce que, tais faturas originaram os montantes de IVA constantes das Liquidações adicionais, criando desta forma um imposto que não é devido. E consequentemente, uma divida indevida de IVA para sociedade, e inclusive imputando ao administrador da sociedade, a prática de ilícito criminal.

AA) Assim, os atos de liquidações adicionais encontram-se feridos de nulidade nos termos do disposto no artigo 161° nº 2 alínea k) do Código de Procedimento Administrativo (CPA).

BB) "A nulidade constitui a forma mais greva de Invalidade, torna o ato totalmente ineficaz. É insuscetível de sanação, é impugnável a todo o tempo perante os tribunais, sendo que este conhecimento judicial concorre com o conhecimento administrativo", Acórdão do TCA Norte, Processo 00007/09.2BEMDI, de 09/06/2010, disponível em http:f/www.dgsi.pt.
CC) Desta forma, os atos de liquidação adicional de IVA, são nulos, em virtude de criarem obrigações pecuniárias não previstas na lei, porque as operações que as originaram, são operações não sujeitas a IVA.

DD) Pelo que tais atos podem ser mantidos na ordem jurídica, tendo de ser declarados nulos, com todas as cominações legais.

EE) Por tudo isto, andou mal o Tribunal a quo, ao considerar improcedente a presente impugnação, considerando que nos presentes autos o Impugnante é parte ilegítima. Considerando, erradamente, verificada a exceção dilatória da ilegitimidade do Impugnante.

NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO SEMPRE COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V/ EXAS. DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE POR PROVADO E CONSEQUENTEMENTE SEREM DECLARADOS NULOS OS ATOS DE LIQUIDAÇÃO ADICIONAL DE IVA.»

A Recorrida, FAZENDA PÚBLICA, devidamente notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.
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Foram os autos a vista do Magistrado do Ministério Público que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Com os Vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.
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Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a recorrente remate a sua alegação (art. 639º do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.
De outro modo, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, o objecto do mesmo está circunscrito à questão de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento por ter julgado o Impugnante, ora Recorrente, parte ilegítima e ter absolvido a Fazenda Pública da instância.

E, caso se conclua pela positiva, importará, então, se a tanto nada mais obstar, apreciar as restantes questões que o recorrente alegou na impugnação.


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II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. De facto
A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:

«Para o conhecimento das questões prévias suscitadas importa considerar as seguintes ocorrências processuais:

A) O Impugnante foi gerente da sociedade S....., S.A., pessoa coletiva número ....., com sede na ....., DAFUNDO, no quadriénio 2004/2007 (conforme invocado pelo Impugnante e resulta de fls. 17 e segs.).

B) A S....., S.A., apresentou a declaração de IVA referente ao período de 0503T, da qual resultou o valor a pagar de €437.301,60 (conforme resulta de fls. 19 do PAT apenso).

C) A S....., S.A., apresentou a declaração de IVA referente ao período de 0506T, da qual resultou o valor a pagar de €485.877,30 (conforme resulta de fls. 19 do PAT apenso).

D) A S....., S.A., apresentou a declaração de IVA referente ao período de 0509T, da qual resultou o valor a pagar de €538.200,78 (conforme resulta de fls. 20 do PAT apenso).

E) A S....., S.A., apresentou a declaração de IVA referente ao período de 0409T, da qual resultou o valor a pagar de 242.633,91 (conforme resulta de fls. 17 do PAT apenso).

F) A S....., S.A., apresentou a declaração de IVA referente ao período de 0412T, da qual resultou o valor a pagar de €153.553,19 (conforme resulta de fls. 18 do PAT apenso).

G) A sociedade S....., S.A., não enviou aos serviços competentes, os montantes apurados e efetivamente recebidos a título de Imposto sobre o Valor Acrescentado, correspondentes ao período compreendido entre abril de 2004 a setembro de 2006 (conforme resulta de fls. 14 do processo administrativo apenso).

H) Foi instaurado o inquérito criminal n.º 9492/05.0TDLSB contra o ora Impugnante e outros (conforme resulta de fls. 17 e segs.).

I) A ATA emitiu as seguintes liquidações adicionais:




J) Pela AP. 31/20111103 foi efetuado o registo provisório por natureza da decisão judicial de encerramento do processo de insolvência da sociedade S....., S.A. (conforme resulta da cópia da certidão permanente de fls. 62 e segs.).

K) Por carta de 11/11/2011, foi o Impugnante notificado, no âmbito do processo criminal a que se refere a alínea anterior, na qualidade de arguido, de que por despacho de 10/11/2011, foi parcialmente arquivado o inquérito criminal e, também, de que foi deduzida acusação e para, querendo, requerer a abertura da instrução (conforme resulta de fls. 17).

L) Foi notificado, por ofício de 29/07/2011, no âmbito do processo de inquérito NUIPC 9492/05.0TDLSB, para, na qualidade de gerente da S....., S.A., no prazo de 30 dias, efetuar o pagamento das quantias a que se reportam as liquidações impugnadas, podendo beneficiar da extinção do procedimento criminal (conforme resulta de fls. 14 a 17).

M) A petição inicial da presente impugnação foi apresentada em 25/05/2016 (conforma registo de fls. 81)


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Ao abrigo do art. 662º do CPC, por se encontrar provado documentalmente e por se poder revelar útil para a decisão da causa, adita-se o seguinte facto:

N) A notificação referida em L), foi remetida pela Divisão de Processos Criminais Fiscais da Direção de Finanças de Lisboa no âmbito do processo de inquérito n.º 9492/05.0TDLSB, tendo a notificação o seguinte conteúdo:
«Nos termos da al. b) do n.º 4 do art. 105º do RGIT fica notificado, assim como as seguintes sociedades das quais é gerente ou administrador:
(...).; F..... S.A. (antes, S....., S.A.); (...)
Para pagar (...) as importâncias relativas ao IVA apurado referente às mencionadas sociedades e nos períodos abaixo discriminados, constantes até à presente data no processo de inquérito acima identificado (...)
F..... S.A.: Total das liquidações: (...) N.º Liquidação: ....., (...); Montante: €538.200,78; (...); N.º Liquidação: ..... (...); Montante: €485.877,30 (...);N.º Liquidação: ..... (...); Montante: €437.301,60; (...).
Tenha-se em conta, nos termos do citado prazo legal, que só haverá lugar a punibilidade se o pagamento das dívidas em causa não for efectuado no prazo acima referido. (...)»
– cfr. ofício, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, junto como documento n.º 1 com a petição inicial, a fls. 14 a 17 dos autos.
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II.2. De Direito
Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida julgou o impugnante parte ilegítima, e absolveu a Fazenda Pública da instância. Para tal, apresentou a seguinte fundamentação, em síntese:

«Nos termos do disposto nos nºs. 1 e 4 do art. 9.º do CPPT, têm legitimidade no processo judicial tributário, além da AT, os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais, quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido, o Ministério Público e o representante da Fazenda Pública.

Ora, dado o acima exposto, mesmo perante este conceito amplo de legitimidade para o processo judicial tributário (quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido) e perante o próprio conceito de interesse legalmente protegido, não se vê que tal pressuposto processual possa ser atribuído ao Impugnante: nem é sujeito passivo da liquidação impugnada, nem é responsável subsidiário (não está a ser responsabilizado subsidiariamente pois não foi contra ela ordenada reversão no processo de execução fiscal – n.º 4 do art. 23.º da LGT; n.º 3 do art. 9.º do CPPT), nem, conforme acima se concluiu, é titular de interesse legalmente protegido, na medida em que, por um lado, o ato tributário de liquidação (autoliquidação), objeto desta impugnação judicial, projeta os seus efeitos na esfera jurídica e patrimonial do sujeito passivo de IVA, sociedade S....., S.A. e não na esfera jurídica e patrimonial do Impugnante, mero representante legal dessa sociedade e, por outro lado, a notificação que lhe foi feita no âmbito do processo 9492/05.0TDLSB não incorpora qualquer liquidação de imposto operada em nome do Impugnante, nem lhe confere legitimidade para intervenção no processo judicial tributário.

Assim, apelando à notificação operada nos termos da al. b) do n.º 4 do art. 105.º do RGIT apenas para efeitos de afirmar a respetiva legitimidade e considerar tempestiva a impugnação] tem que concluir-se que o Impugnante, para além de deduzir intempestivamente (por antecipação) a presente impugnação (pois que não é sujeito passivo da liquidação impugnada e não foi proferido - e pode nem vir a ser - na execução fiscal instaurada contra o sujeito passivo S....., S.A. despacho de reversão contra si), também a deduziu sem para tanto ter legitimidade.


Termos em que se defere a arguição da exceção dilatória da ilegitimidade do Impugnante.

A ilegitimidade constitui uma exceção dilatória que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição da Fazenda Pública da instância, nos termos dos artigos 577.º, alínea e) e 576.º, n.º 2 e 278.º, n.º 1, alínea d), do C.P.C.. aplicável “ex vi” artigo 2.º alínea
e) do C.P.P.T..

Finalmente, anota-se que em consequência da solução dada à questão concretamente conhecida ficou prejudicado o conhecimento de outras questões.»

Inconformado, o impugnante veio interpor recurso da referida decisão alegando [conclusões de recurso J) a R)] que Por tudo, isto, e tendo o aqui Impugnado, sido notificado, corno ficou provado nos presentes autos, nos termos do disposto no artigo 105º nº 4 alínea b) do RGIT, bem como tido contra o mesmo, na qualidade de responsável solidário proferido despacho de acusação do crime de abuso de confiança fiscal, é de todo incompreenslvel que o Tribunal a quo, considere, que o mesmo nao tem legitimidade, em virtude de não ter um interesse legalmente protegido. Mais ao ser solicitado ao mesmo o pagamento do imposto, sob pena de prosseguimento de procedimento criminal, as liquidações objeto dos presentes autos, projeta inequivocamente os seus efeitos na esfera jurídica e patrimonial do aqui Impugnante. Pois que é de todo incompreensível, que o Impugnante tenha legitimidade e seja considerado responsável subsidiário, no procedimento criminal, e que no processo judicial tributário não o tenha. Desta forma, andou mal o Tribunal a quo, ao considerar não só que o Impugnante não tem um interesse legalmente protegido, bem como que os atos impugnados não produzem efeitos na esfera jurídica do Impugnado. Pois que, se uma pessoa, que é condenado por crime de abuso de confiança fiscal, pelo imposto aqui em causa, não tem legitímidade, por não ter interesse legitimo em demandar, quem terá? Ora, o Recorrente, durante os anos de 2005 a 2007, foi gerente da sociedade "S....., S.A.", pessoa coletiva número ...... E como já supra referido, por esse facto, nos termos do disposto no artigo 105° nº 4 al. b) do RGIT, foi notificado para proceder ao pagamento das importâncias decorrentes das liquidações adicionais e dos respetivos juros de mora, e coima aplicável. E, por conta destes factos, foi constituido arguido e condenado no âmbito do processo de inquérito nº 9492/05.0TDLSB. Sendo que, a referida Sociedade Comercial veio a ser objeto de liquidação. Desta forma, é indubitável com o interesse do Impugnante em demandar, e consequentemente a sua legitimidade processual e material.

Vejamos.
Segundo julgamos perceber, entende o impugnante, ora recorrente, que tendo sido notificado, nos termos do disposto no art. 105º, nº 4, al.b), do RGIT, bem como sido contra o mesmo, na qualidade de responsável solidário, proferido despacho de acusação do crime de abuso de confiança fiscal, não podia o Tribunal a quo considerar que o mesmo não tem legitimidade, em virtude de não ter interesse legalmente protegido.

Façamos um breve enquadramento legal.
O artigo 105º, n.º 1, do RGIT determina que quem não entregar à administração tributária, total ou parcialmente, prestação tributária de valor superior a €7500, deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar é punido com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias.
Por sua vez, o artigo 105º, n.º 4, alínea b), do RGIT prevê que os factos descritos nos números anteriores só são puníveis se a prestação comunicada à administração tributária através da correspondente declaração não for paga, acrescida dos juros respetivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito.

Conforme decorre das alíneas L) e N) do probatório, o Impugnante, ora recorrente, foi notificado, ao abrigo do disposto no artigo 105.º, n.º 4, alínea b), do RGIT, no âmbito do processo de inquérito n.º 9492/05.0TDLSB, para, na qualidade de gerente ou administrador de várias sociedades comerciais, nomeadamente da «F..... S.A.», antes, «S....., S.A.» e no prazo de 30 dias, efetuar o pagamento das quantias a que se reportam as liquidações impugnadas, podendo beneficiar da extinção do procedimento criminal, uma vez que só haveria lugar a punibilidade se o pagamento das dívidas em causa não fosse efectuado no prazo acima referido.

Aqui chegados, importa referir que, em relação às liquidações adicionais de IVA aqui em causa, o Impugnante/Recorrente não é contribuinte directo, nem substituto, nem responsável subsidiário, posto que não resulta dos autos que tenha sido efectivada a reversão de processos de execução fiscal instaurados para a cobrança das quantias aqui em questão, nem demonstra qualquer interesse legalmente protegido que lhe confira legitimidade em processo tributário.
Em sede recurso, vem o recorrente fazer apelo à notificação, nos termos do disposto no art. 105º, nº 4, alínea b), do RGIT, a que supra se fez referência.
No entanto, mesmo atendendo ao conteúdo da referida notificação [alínea N) do probatório], forçoso é concluir que o Impugnante/Recorrrente não foi notificado como sujeito passivo, para pagamento da dívida nos termos da alínea b) do n.º 4 do artigo 105.º do RGIT, antes o tendo sido a sociedade «S....., S.A.», na pessoa do Impugnante/Recorrente, na respectiva qualidade de representante legal, pelo que se conclui que tal notificação não confere a este legitimidade para deduzir a presente impugnação judicial.

Por outro lado, o ofício de notificação efetuado pela Direcção de Finanças de Lisboa insere-se no âmbito do próprio processo crime, nos termos da alínea b) do n.º 4 do artigo 105.º do RGIT, valendo, portanto, apenas para os efeitos aí previstos: se a quantia ali indicada for paga os factos integradores do tipo de crime ali em causa não serão puníveis.
Com efeito, o pagamento das quantias referidas no ofício de notificação acima mencionado é facultativo (configurando o não pagamento uma condição de punibilidade) não ficando impedido o Impugnante de, em sede de processo crime e com a amplitude aí admitida, fazer a prova de que não praticou os factos por que é acusado.

No mesmo sentido, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28/11/2012, proferido no Proc. n.º 0648/12, disponível em www.dgsi.pt, onde se decidiu caso idêntico, e de onde se retira o seguinte excerto:
«4.1. No entendimento da sentença, a ilegitimidade da recorrente (impugnante) decorre de esta não ser contribuinte directo (nº 3 do art. 18º da LGT), nem substituto (art. 20º da LGT), nem responsável subsidiário, posto que não efectivada a reversão (nº 1 do art. 23º da LGT), nem demonstrar qualquer interesse legalmente protegido que lhe confira legitimidade em processo tributário, dado que, mesmo atendendo à citada notificação, a impugnante não foi notificada como sujeito passivo, para pagamento da dívida nos termos da al. b) do nº 4 do art. 105º do RGIT, antes o tendo sido a sociedade B……., Lda.
Ora, é certo que, como a sentença julgou provado, pelo ofício do 2º Juízo Criminal de Loures, foi comunicada à impugnante a notificação que lhe fora dirigida na qualidade de representante legal da “B……, Lda.” pela Divisão de processos Criminais da Direcção de Finanças de Lisboa, no âmbito do Inquérito nº 177/06.1IDLSB, nos termos do disposto no art. 105º nº 4 al. b), do RGIT, para efectuar o pagamento da importância de € 26.462,75 por dívida proveniente de IVA em falta do período de Dezembro de 2003, acrescida de coima e juros.
E também o MP considera que foi aquela sociedade que foi notificada na pessoa da recorrente, na respectiva qualidade de gerente e representante legal (art. 41º nº 1 CPPT), daqui concluindo que, por isso, tal notificação não confere a esta legitimidade para intervenção no processo judicial tributário.
Contudo, atentando no teor do dito ofício de fls. 66, vê-se que tal notificação, ordenada por despacho proferido no âmbito do processo 177/06.11DLSB a correr termos no 2º Juízo Criminal de Loures, tem por destinatários, simultaneamente, quer a B……, Lda. (que é notificada na pessoa da recorrente, como gerente daquela), quer a própria recorrente, ambas ali arguidas. ( O teor do despacho que ordena tal notificação é o seguinte: «Uma vez que as arguidas estão nestes autos (…) notifique-as agora nos termos e para os efeitos do disposto no art. 105º, nº 4, al. b) do RGIT, com cópia de fls. 263».
E o teor da notificação é, além do mais, o seguinte:
«Nos termos do art. 105º nº 4 al. b) do Regime Geral das infracções Tributárias (RGIT) – ficam por este meio NOTIFICADOS a firma arguida: B……., Lda., NIPC ……, com sede (…), na pessoa da gerente e a própria: A……, NIF ……. com domicílio (…) no Processo de INQUÉRITO nº 177/06.11DLSB que corre termos na (…)» )
4.2. Todavia, ainda assim, também esta notificação (em nome pessoal) não releva para a questão aqui em apreço.
Com efeito, a recorrente apela ao teor dessa notificação para sustentar apenas que, embora formalmente a dívida ainda não tenha sido revertida contra si quando lhe foi feita tal notificação (para efeitos do disposto no nº 4 do art. 105º do RGIT), materialmente está já a ser-lhe exigido por parte da AT o pagamento da dívida em causa, como se de qualquer outra prestação tributária se tratasse.
Aliás, como se depreende da petição inicial da presente impugnação, a recorrente pretende impugnar, não o acto determinativo da quantia calculada para efeitos de tal notificação, mas, antes, o próprio acto tributário de liquidação (ou melhor autoliquidação) a que aquela mesma quantia reportou (a recorrente invoca, aliás, vários fundamentos, nomeadamente, a inexistência de pressupostos para a autoliquidação e a caducidade do direito à liquidação).
E, na verdade, a quantia referida na notificação não substancia acto de liquidação do tributo, ou qualquer outro acto de liquidação que haja sido operado pela Administração Tributária relativamente à recorrente, como sujeito passivo de imposto.
Tal notificação, embora efectuada pelos Serviços da AT, insere-se no âmbito do próprio processo crime, nos termos da al. b) do nº 2 do art. 105º do RGIT, e nesse processo se esgotam as suas virtualidades.
A este propósito escreve, aliás, a Consª. Isabel Marques da Silva (REGIME GERAL DAS INFRACÇÕES TRIBUTÁRIAS, 3ª ed., Almedina, 2010, pp. 229 a 231. ) o seguinte:
«A par desta condição de punibilidade, que hoje consta da alínea a) do nº 4 do artigo 105º do RGIT, a Lei do Orçamento do Estado para 2007 introduziu ao tipo uma outra, inteiramente nova, que consta da alínea b) do nº 4. A qualificação desta nova alínea como condição de punibilidade, embora não seja questão pacífica na doutrina (( ), foi a orientação que sempre propusemos e que o Supremo Tribunal de Justiça acolheu através do seu Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 6/2008, de 9 de Abril (( ). Por força desta nova alínea, os factos só serão puníveis se, havendo declaração mas faltando a entrega da prestação tributária devida, o contribuinte, notificado para o efeito, não paga a prestação devida acrescida dos juros respectivos e valor da coima aplicável no prazo de 30 dias.
Ao contrário do que se dispõe no seu nº 6, a alínea b) do nº 4 do artigo 105º do RGIT, o novo preceito não esclarece quem deve notificar o contribuinte para efeitos de regularização da sua situação tributária, mas parecia-nos evidente que deveria ser a administração tributária ou a da segurança social (( ), pois antes de decorrido o prazo de 30 dias sobre a data notificação os factos não são puníveis, e, não os sendo, não poderá haver processo, consequentemente não haveria ocasião para intervenção do Ministério Público ou de juiz (( ).
Se este entendimento se nos continue a figurar correcto em relação aos processos instaurados após a entrada em vigor da nova alínea b), há que reconhecer que, mercê da aplicação da disposição aos processos pendentes por força do princípio da aplicação retroactiva da lei penal mais favorável, o Ministério Público e os tribunais providenciaram nalguns casos, eles próprios, a essa notificação, fundamentalmente por razões de economia processual. A questão de saber se esta notificação, quando feita pelo tribunal de julgamento, não seria inconstitucional por violação do princípio da separação de poderes, foi apreciada pelo Tribunal Constitucional, que decidiu no sentido de não haver inconstitucionalidade naquela interpretação na alínea b) do nº 4 do artigo 105º do RGIT( ).»
No caso, aquela notificação, embora efectuada, como se disse, pelos Serviços da AT, insere-se no âmbito do próprio processo crime, nos termos da al. b) do nº 2 do art. 105º do RGIT, valendo, portanto, apenas para os efeitos aí previstos: se a quantia ali indicada for paga (e que haverá de corresponder à soma da prestação comunicada à AT através da respectiva declaração, dos juros respectivos e do montante da coima aplicável) os factos integradores do tipo de crime (abuso de confiança) não serão puníveis.
Mas, se assim é, então, porque a notificação opera tão só no âmbito do processo crime, também não há nela a invocada exigência material, por parte da AT, da dívida correspondente ao imposto que está a ser objecto de cobrança em processo de execução fiscal, carecendo de razão legal a alegação da recorrente [cfr. Conclusão H) do recurso] no sentido de que aquele acto é equivalente a um acto de declaração de reversão da dívida contra a recorrente e operado através do referido mecanismo legal previsto no nº 4 do art. 105º do RGIT.
É que, constituindo a reversão um instituto próprio do processo de execução fiscal, por via do qual a exequente (AT) chama à execução pendente os responsáveis subsidiários pela dívida exequenda de imposto, a recorrente nem está, por via da invocada notificação prevista no nº 4 do art. 105º do RGIT, a ser chamada (ex novo ou mesmo subsidiariamente) ao processo crime (já está, ali, constituída como arguida, juntamente com a B……, Lda.), nem a AT ali executa qualquer imposto.
Tanto que, como se salienta no supra citado acórdão do TConstitucional, ( Nº 409/2008, de 31/7/2008, proc. nº 361/08, publicado no DR, 2ª série, nº 185, de 24/9/2008, pp. 40235 e ss. ) o critério de que competente para determinar a notificação prevista nesta al. b) do nº 4 do art. 105º do RGIT é a entidade titular do procedimento ou do processo (Administração, Ministério Público, tribunal de instrução criminal ou tribunal do julgamento), consoante a fase em que ele se encontre quando surge a necessidade de proceder a essa notificação, não colide com o princípio da separação de poderes, pois que, «Quando o Ministério Público, na fase do inquérito, determina essa notificação, ele visa, não a prossecução da tarefa de cobrança de receitas típica da Administração Tributária, mas o apuramento, que lhe incumbe enquanto titular da acção penal, da verificação dos requisitos que o habilitem a tomar uma decisão de acusação ou de não acusação. Similarmente, quando o juiz de instrução ou o juiz do julgamento determina idêntica notificação, ambos se limitam a praticar um acto instrumental necessário à comprovação da existência, ou não, de uma condição de punibilidade, que determinará a opção entre pronúncia ou não pronúncia e entre condenação ou absolvição (ou arquivamento). Isto é: em todas essas hipóteses, a determinação da notificação pelo Ministério Público ou por magistrados judiciais insere-se perfeitamente dentro das atribuições constitucionais dessas magistraturas (exercício da acção penal e administração da justiça, respectivamente), sem qualquer invasão da reserva da Administração, nem, consequentemente, com violação do princípio da separação de poderes (…)»
4.3. E nem se diga, igualmente, que há aqui violação do direito à tutela jurisdicional efectiva.
Com efeito, o pagamento das quantias reportadas na dita notificação é facultativo (configurando o não pagamento uma condição de punibilidade, se o arguido a ele não proceder, não fica impedido de, em sede de processo crime e com a amplitude aí admitida, fazer a prova de que não praticou os factos por que é acusado – incluindo, portanto, os próprios factos que substanciam o tipo tributário) não havendo, por isso, que chamar à colação [cfr. as Conclusões J) e K) do recurso] qualquer violação do direito à tutela jurisdicional efectiva, ou do princípio da presunção de inocência, consagrados nos arts. 20º, 268º, nº 4, e 32º, nº 1 da CRP.
E, ao invés do alegado na Conclusão G) do recurso, aquele pagamento, como supra se disse, também não está a ser exigido por via de qualquer acto impositivo da AT, como se de qualquer outra prestação tributária se tratasse.
4.4. Nos termos do disposto nos nºs. 1 e 4 do art. 9º do CPPT, têm legitimidade no processo judicial tributário, além da AT, os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais, quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido, o Ministério Público e o representante da Fazenda Pública.
Ora, dado o acima exposto, mesmo perante este conceito amplo de legitimidade para o processo judicial tributário (quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido) e perante o próprio conceito de interesse legalmente protegido, não se vê que tal pressuposto processual possa ser atribuído à recorrente: nem é sujeito passivo da liquidação impugnada, nem é responsável subsidiária (não está a ser responsabilizada subsidiariamente pois não foi contra ela ordenada reversão no processo de execução fiscal - nº 4 do art. 23º da LGT; nº 3 do art. 9º do CPPT), nem, conforme acima se concluiu, é titular de interesse legalmente protegido, na medida em que, por um lado, como bem refere o MP, o acto tributário de liquidação (autoliquidação), objecto desta impugnação judicial, projecta os seus efeitos na esfera jurídica e patrimonial do sujeito passivo de IVA, sociedade B……., Lda. e não na esfera jurídica e patrimonial da recorrente, mera representante legal dessa sociedade e, por outro lado, a notificação que lhe foi feita no âmbito do processo 177/06.11DLSB a correr termos no 2º Juízo Criminal de Loures não incorpora qualquer liquidação de imposto operada em nome da recorrente, nem lhe confere legitimidade para intervenção no processo judicial tributário.
Assim, e independentemente da questão de saber se a impugnação podia ser apresentada sem ter sido precedida da reclamação prévia referida no art. 131º do CPPT [relembre-se que, mesmo de acordo com a alegação da recorrente, ela pretende impugnar a autoliquidação referente ao IVA do período de Dezembro de 3003, como se depreende, aliás, também do teor das Conclusões R) a CC) das alegações de recurso, apelando à notificação operada nos termos da al. b) do nº 4 do art. 105º do RGIT apenas para efeitos de afirmar a respectiva legitimidade e considerar tempestiva a impugnação] tem que concluir-se que a impugnante, para além de deduzir intempestivamente (por antecipação) a presente impugnação (pois que não é sujeito passivo da liquidação impugnada e não foi proferido - e pode nem vir a ser - na execução fiscal instaurada contra o sujeito passivo B……., Lda. despacho de reversão contra si), também a deduziu sem para tanto ter legitimidade.
A sentença recorrida não enferma, portanto, dos erros de julgamento que a recorrente lhe imputa, nomeadamente por violação do direito a uma tutela jurisdicional efectiva (art. 20º e nº 4 do art. 268º da CRP), por violação do princípio da presunção de inocência (nº 4 do art. 32º da CRP) ou por violação da proibição de indefesa (arts. 20º e 268º nº 4, da CRP).»

Na esteira do Acórdão supra transcrito, com cujos fundamentos concordamos inteiramente, pelo que os fazemos nossos, também no caso em apreço, mesmo perante um conceito amplo de legitimidade para o processo judicial tributário (quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido) e perante o próprio conceito de interesse legalmente protegido, não se vê que tal pressuposto processual possa ser atribuído ao recorrente pois não é nem sujeito passivo da liquidação impugnada, nem é responsável subsidiário (não está a ser responsabilizado subsidiariamente pois não foi contra ele ordenada reversão no processo de execução fiscal - nº 4 do art. 23º da LGT; nº 3 do art. 9º do CPPT), nem, conforme acima se concluiu, é titular de interesse legalmente protegido, na medida em que, por um lado, o acto tributário de liquidação, objecto desta impugnação judicial, projecta os seus efeitos na esfera jurídica e patrimonial do sujeito passivo de IVA, a sociedade S....., S.A. e não na esfera jurídica e patrimonial do recorrente, mero representante legal dessa sociedade e, por outro lado, a notificação que lhe foi feita, no âmbito do processo 9492/05.0TDLSB, não incorpora qualquer liquidação de imposto operada em nome do recorrente, nem lhe confere legitimidade para intervenção no processo judicial tributário.

Deste modo, forçoso é concluir que a sentença recorrida não padece de erro de julgamento por ter julgado o Impugnante, ora Recorrente, parte ilegítima e ter absolvido a Fazenda Pública da instância.

Termos em que se nega provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida, e considerando-se prejudicado o conhecimento de qualquer outra questão.

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Uma pequena nota final relativamente à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, nº 7 do RCP, tendo em consideração que o valor da causa foi fixado em € 2.032.183,93.

No caso concreto, ponderado o comportamento processual das partes litigantes, a complexidade do processo, e atendendo a que as questões decidendas não exigiram do julgador especiais e diversos conhecimentos técnicos e jurídicos, consideramos ser de dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 7, do RCP.


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III – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes da 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao presente recurso, e em consequência, manter a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 7, do RCP.

Registe e notifique.

Lisboa, 11 de Março de 2021

[O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Desembargadoras Maria Cardoso e Catarina Almeida e Sousa]


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[Lurdes Toscano]

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[Maria Cardoso]

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[Catarina Almeida e Sousa]