Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 205/17.5BEPRT |
Secção: | CA- 2º JUÍZO |
Data do Acordão: | 12/19/2017 |
Relator: | HELENA CANELAS |
Descritores: | CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL LEVANTAMENTO DO EFEITO SUSPENSIVO AUTOMÁTICO EXCLUSÃO DA PROPOSTA DOCUMENTOS DA PROPOSTA LÍNGUA ESTRANGEIRA PRINCÍPIO DA INTANGIBILIDADE DAS PROPOSTAS ESCLARECIMENTOS NOTIFICAÇÃO |
Sumário: | I – Sempre que o processo de contencioso pré-contratual seja intentado com vista à impugnação de atos de adjudicação, a sua instauração suspende automaticamente os efeitos do ato de adjudicação ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado, nos termos do artigo 103º-A nº 1 do CPTA revisto (DL. n.º 214-G/2015, de 2 de outubro). II – A interpretação consentida pela concatenação dos nºs 2 e 4 do artigo 103º-A do CPTA é a de que o levantamento do efeito suspensivo automático está sujeito um duplo grau de exigência, na medida em que só deve ser levantado quando resulte que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos (nº 2) quando na ponderação com os danos que podem resultar do seu levantamento aqueles se mostrem superiores (nº 4). III – Consubstanciando o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático um incidente do processo de contencioso pré-contratual, atentos os termos como o mesmo se mostra ali configurado, implica que lhe devam ser supletivamente aplicáveis, nos termos do artigo 1º do CPTA, as normas para os incidentes da instância contidas nos artigos 292º ss. do CPC novo. IV – O Tribunal só deve levar a cabo diligências de instrução e prova, se se deparar com matéria de facto controvertida relevante para a decisão do incidente, pois só ela estará e deverá ser sujeita a prova, devendo, pois, recusar, por impertinente, a produção de prova requerida, designadamente a testemunhal, se for de concluir, em face do objeto do incidente, não existir matéria de facto controvertida com relevância para a respetiva decisão. V - É de configurar que o retardamento da celebração e execução do contrato de aquisição de uma lancha de pilotos faz perigar, de modo gravoso, a prossecução do interesse público levado a cabo pela entidade adjudicante, que tem a seu cargo a segurança marítima e portuária nas áreas sob a sua jurisdição, se foi quer a escassez de lanchas de piloto com as características da pretendida, quer a penúria das que possui, que justificou essa nova aquisição, conjugada com a circunstância de que a manutenção do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação até que seja decidido (com trânsito em julgado) o pedido impugnatório (obstando à celebração e execução do contrato até que a ação seja definitivamente decidida), acarretará, no caso de a ação vir a ser julgada improcedente, um retardamento na celebração e execução do contrato, fazendo acrescer mais uma dilação temporal (a da perduração do processo judicial), por natureza de duração incerta, ao prazo de fornecimento da lancha, que é de 300 dias, lançando, por conseguinte, para um momento futuro ainda mais longínquo (e incerto), a aquisição pela entidade adjudicante da pretendida lancha de pilotos, ocasião em que ocorrerá então, finalmente, a afetação da lancha a adquirir à satisfação do interesse público a que se destina. VI – Do nº 1 do artigo 58º nº 1 do CCP resulta a regra que a proposta e todos os documentos que a constituem e integram, devem estar redigidos numa única língua, que é a portuguesa, não sendo, assim, admissível a proposta que esteja totalmente ou parcialmente escrita em língua estrangeira, a qual, em tal caso, deve ser excluída, por força do disposto artigo 146º nº 2 alínea e) do CCP. VII – Tal regra comporta, todavia, desvios, os quais ocorrem quanto aos seguintes documentos, e nas seguintes situações: i) quanto aos documentos referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 57º do CCP, quando, em função da especificidade técnica das prestações objeto do contrato a celebrar, o programa do procedimento ou o convite, prevejam a possibilidade de algum desse documentos serem redigidos em determinada língua estrangeira - (cfr. nº 2 do artigo 58º do CCP); ii) quanto aos documentos referidos no n.º 3 do artigo 57º do CCP (i. é, os documentos de apresentação facultativa, que os concorrentes incluam nas suas propostas para melhor sustentar os atributos da proposta), desde que o programa do procedimento ou o convite não imponha o contrário – (cfr. nº 3 do artigo 58º do CCP). VIII – À luz da ressalva no artigo 58º nº 3 do CCP, não têm que se encontrar redigidos em língua portuguesa os documentos de apresentação facultativa que os concorrentes incluam nas suas propostas nos termos do artigo 57º nº 3 do CCP, a não ser que o Programa do Procedimento (ou o convite) o imponham. IX - Os esclarecimentos às propostas haverão de consistir apenas em informações, explicações destinadas a tornar claro, congruente ou inequívoco um elemento que na proposta estava apresentado ou formulado de forma pouco clara ou menos apreensível, tendo por escopo a melhor compreensão de um qualquer aspeto ou elemento da proposta, não podendo (i) contrariar os elementos constantes dos documentos que as constituem, (ii) alterar ou completar os respetivos atributos, (iii) nem visar suprir omissões que determinem a sua exclusão. X - A notificação imposta na segunda parte do nº 3 do artigo 72º do CCP (nos termos do qual os esclarecimentos prestados pelos concorrentes “…devem ser disponibilizados em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo todos os concorrentes ser imediatamente notificados desse facto”) visa assegurar aos demais concorrentes o conhecimento de que foram prestados esclarecimentos quanto a alguma das propostas, no que constitui uma positivação e concretização dos princípios da publicidade e transparência dos procedimentos concursais. XI – A omissão dessa notificação não conduzirá à invalidade do ato final de adjudicação, se, no caso, o princípio da transparência se mostrar assegurado, por, quer os pedidos de esclarecimentos formulados pelo júri quer as respostas da concorrente que os mesmos mereceram, terem sido oportuna e adequadamente praticados na plataforma eletrónica e nela disponibilizados. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO ENP - …………………., SA instaurou o presente Processo de Contencioso Pré-contratual contra a APDL - ASSOCIAÇÃO DOS PORTOS DO DOURO, LEIXÕES E VIANA DO CASTELO, SA, em que é contrainteressada a sociedade S................ M..........., LTD. (todas devidamente identificadas nos autos) no qual, por referência ao Concurso Público para «Aquisição de Uma Lancha de Pilotos» (procedimento n.º 5641/2016), no qual formulou o seguinte pedido, nos seguintes termos: «a) Ser decretada a invalidade da decisão de admissão da proposta da adjudicatária e, anulando-se a adjudicação à proposta da contrainteressada S................ M..........., Ltd e o respetivo contrato, caso já tenha sido celebrado; b) Condenar a R. a alterar a decisão de admissão das propostas, excluindo todas as propostas apresentadas e, em consequência, extinguir o procedimento objeto do presente processo, por causa de não adjudicação; c) Mantendo a R. natural a intenção de contratar, deverá ser condenada a lançar novo concurso público, com publicidade internacional, para a aquisição de uma lancha de pilotos, nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea b) do Código dos Contratos Públicos; Ou em alternativa, d) Ser a R. condenada a convidar obrigatoriamente a A. e a contrainteressada a apresentar propostas, no âmbito de um procedimento de ajuste direto, nos termos do artigo 24.º, n.º 1, alínea b) e n.º 3 do Código dos Contratos Públicos.»
II. Não obstante no passado dia 23/06/2017 ter sido proferido despacho saneador com prolação de decisão de mérito, pelo qual o douto Tribunal recorrido julgou - e muito bem - totalmente improcedente a presente ação de contencioso pré-contratual e, em consequência, absolveu a entidade demandada APDL e a contrainteressada S................ dos pedidos formulados pela autora, esta poderá, mesmo sem fundamento para tanto, decidir seguir o caminho do recurso jurisdicional. III. Daí que, por mera cautela - para o caso de ser atribuído efeito suspensivo ao recurso da decisão de mérito, com o que, note-se, não se concorda, antes devendo ser atribuído efeito devolutivo - a entidade demandada se sirva do presente recurso jurisdicional, pugnando pela revogação da decisão que indeferiu o levantamento do efeito suspensivo e substituição por outra que o defira. IV. A recorrente não se conforma com a decisão recorrida, entendendo que a decisão sobre a matéria de facto deveria ter sido diferente e que o Tribunal recorrido não fez uma correcta apreciação dos factos que resultam dos autos, tendo ainda procedido a uma errada aplicação do direito aplicável. V. O ponto 4) a) dos factos provados ("ocorrências procedimentais e processuais relevantes ", no texto do despacho recorrido) deve ter a seguinte redacção: "A entidade demandada dispõe das seguintes lanchas de pilotos: a. a lancha «EIRA», com 15,6 metros, all weather, trabalhando em qualquer condição climática até ao limite das condições de embarque do piloto, construída em 2002, sendo a mais utilizada. Esta lancha tem sofridos várias avarias que, de dia para dia, se mostram mais recorrentes, prevendo-se que venham a aumentar cada vez mais ao longo do corrente ano de 2017” - estes factos encontram-se alegados no processo administrativo, no documento n.º 2 do requerimento de incidente e nos artigos 35.º e 36.º do requerimento de incidente que não foi infirmado pela autora. VI. O ponto 7) dos factos provados ("ocorrências procedimentais e processuais relevantes'', no texto do despacho recorrido) deve ter a seguinte redacção: "A 03.01.2017 foi a autora notificada do relatório final de apreciação das propostas (dele constando a exclusão da proposta da autora e a admissão da proposta da contrainteressada) e da decisão de adjudicação à concorrente e contrainteressada S................ M..........., Lda." - este facto resulta do teor dos documentos que instruem o processo administrativo, nomeadamente, do relatório preliminar e do relatório final. VII. O ponto 8) dos factos provados ("ocorrências procedimentais e processuais relevantes", no texto do despacho recorrido) deve ter a seguinte redacção: "A 01.02.2017 a aqui autora intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a presente acção de contencioso pré-contratual pela qual reclama a anulação do acto de adjudicação, mas não a anulação da decisão de exclusão da sua proposta.” - este facto resulta do conteúdo da petição inicial. VIII. Por resultarem do requerimento de incidente apresentado pela recorrente (sem qualquer contestação pela autora), devem ser aditados às "ocorrências procedimentais e processuais relevantes" os seguintes factos que devem ser dados como provados: § Facto 10) Os Pilotos de Barra, funcionários da APDL, são as únicas pessoas que têm o poder de assistir os comandantes dos navios que pretendem entrar no porto de Leixões, os quais não estão autorizados a entrar no e a sair do porto sem estarem devidamente acompanhados pelo Piloto de Barra que os assiste nas operações de entrada e saída do porto. § Facto 11) A transferência do Piloto de Barra para bordo do navio, para o embarque ou desembarque, é feita precisamente através de uma lancha de pilotos. § Facto 12) O serviço de pilotagem prestado pela APDL decorre de imposição legal, concretamente, do preceituado pelo Decreto-Lei n.º 48/2002, de 2 de Março, que regula a actividade de pilotagem. § Facto 13) Uma lancha de pilotos é uma embarcação especialmente concebida para permitir a transferência do piloto do navio e para o navio, transferência feita muitas vezes debaixo de condições de vento e mar bastante adversas. § Facto 14) O trajecto entre o local de embarque na lancha e o de embarque do navio chega, muitas vezes, a ser de 1 hora. § Facto 15) O ponto de pilotagem é feito em mar aberto a cerca de duas (2) milhas náuticas da ponta do quebra-mar exterior do porto de Leixões. § Facto 16) O porto de Leixões está geograficamente localizado na zona norte e costa aberta do Atlântico a qual tem momentos frequentes de forte agitação marítima, grande ondulação e ocorrência de ventos fortes durante longos períodos do ano. § Facto 17) Sendo o serviço executado em mar aberto, por vezes sob condições extremas de mar e vento, a confiança na fiabilidade do equipamento tem de ser total, uma vez que a mais pequena falha ou anomalia pode provocar perdas humanas e materiais irreparáveis. § Facto 18) O porto de Leixões não pode ter apenas uma lancha de pilotos operacional. § Facto 19) A paragem do porto de Leixões acarretaria a paragem de indústrias que estão praticamente dependentes da chegada de matérias-primas por barco, como, por exemplo, a Barbosa & Almeida, a Fábrica de Papel de Cacia, a Siderurgia da Maia, entre outras. § Facto 20) Toda a comunidade portuária servida pelo porto de Leixões seria fortemente afectada se os navios de carga deixassem de poder entrar e/ou sair do porto de Leixões. § Facto 21) Se os navios não puderem atracar no porto de Leixões, serão encaminhados para portos do norte de Espanha. § Facto 22) A construção de uma lancha com as características impostas pelo procedimento concursal dos autos prolonga-se por cerca de dez (10) meses. IX. Subsidiariamente, entendendo o Tribunal ad quem que os factos alegados carecem ainda de prova, então, deverá ser ordenada a baixa dos autos à primeira instância para instrução, nomeadamente, para inquirição das três testemunhas arroladas. X. A recorrente não concorda com a decisão de indeferimento do pedido de levantamento do efeito suspensivo, por entender que não foi feita uma correcta apreciação dos factos e do direito aplicável. XI. Por um lado, a correcta apreciação dos factos resultantes dos autos impunha o reconhecimento da forte lesão do interesse público prosseguido pela recorrente e a ausência de dano por banda da autora. XII. Por outro lado, o doutro tribunal recorrido violou o disposto no n.º 2 do artigo 103.º-A do CPTA; devia ter interpretado esta norma no sentido de que se encontravam reunidos os pressupostos para que o levantamento do efeito suspensivo fosse deferido, pois ficou demonstrada a superioridade dos danos invocados pela APDL (face aos putativos danos da autora). XIII. Os factos alegados e provados pela APDL permitem concluir pela grave lesão do interesse público, se o efeito suspensivo automático do artigo 103.º-A do CPTA se mantiver. XIV. As lanchas de pilotos existentes já não servem para a actividade operacional do porto de Leixões (ora porque estão sempre avariadas, ora porque não trabalham em mar aberto e só podem operar com bom tempo). XV. Estabelecendo o artigo 142.º do CPTA a possibilidade da parte vencida apresentar recurso - e, tendo, entretanto sido proferido o despacho saneador que conheceu do mérito, julgando a acção totalmente improcedente - se tal ocorrer, isto é, se a autora apresentar recurso do despacho saneador, não se conseguirá prever o tempo necessário para que uma decisão judicial se torne definitiva (transitada em julgado). XVI. Assente que se encontra que a entidade demandada, aqui recorrente, gere um porto que ocupa o lugar cimeiro nas cargas e descargas de navios em Portugal, sendo responsável, no conjunto da sua actividade por aproximadamente 25% do total de cargas anualmente movimentadas em Portugal e que recebe em média cerca de 2730 navios por ano, se o efeito suspensivo automático não for levantado, o Departamento de Pilotagem do porto de Leixões ficará imobilizado, deixando de poder receber os navios com a mesma frequência, por se encontrar dependente da intermitente operacionalidade da lancha EIRA. XVII. Afinal, o Tribunal recorrido que, num ponto do despacho recorrido escreveu que «não havia necessidade de fazer cessar o efeito suspensivo automático porque se previa que em 1O dias viesse a ser proferida a decisão sobre o mérito da causa», escreveu também, mais adiante, que «a cessação do efeito suspensivo determinaria, em grande medida, a execução quase integral do contrato», o que, com o devido respeito, não faz sentido pois a embarcação demora cerca de 1O meses a estar concluída. XVIII. Resulta implícito do despacho recorrido que o Meritíssimo Juiz assumiu que a autora reclamava a possibilidade de vir a celebrar o contrato com a entidade demandada, aqui recorrente, o que não corresponde à realidade. XIX. Tal só se pode ficar a dever a uma errada apreciação da matéria de facto, o que deve ser superiormente corrigido. XX. Tal como a acção foi configurada pela autora, esta nunca terá a possibilidade de vir a celebrar o contrato de fornecimento de uma lancha de pilotos com a recorrente (não foi esse o seu pedido). XXI. Ocorre contudo que à eventual atribuição de um qualquer quantum indemnizatório não se reconhece ligação com a produção dos efeitos do acto impugnado (e, bem, assim, com a execução do contrato). XXII. O diferimento da execução do acto será gravemente prejudicial para o interesse público e, bem assim, gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, nomeadamente, para o interesse prosseguido pela APDL e para os vários agentes económicos que dependem da importação e/ou exportação de mercadorias via barco. XXIII. Efetuada uma ponderação entre os interesses públicos e privados em presença, tendo subjacente o juízo de prognose relativo ao tempo previsível da duração da ação de contencioso pré-contratual e, considerando as circunstâncias do caso concreto, mostra-se manifesto que os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo (para o interesse público) seriam manifestamente superiores aos que poderão decorrer do seu levantamento (para a autora). XXIV. Em consequência, deverá o despacho recorrido ser superiormente revogado e substituído por um outro que conclua pelo deferimento do pedido de levantamento do efeito suspensivo, por ser essa a única solução legalmente possível e justa.
B - Ao contrário na douta Sentença recorrida, a proposta da contrainteressada viola expressamente o disposto no caderno de encargos do procedimento pré-concursal, objeto do litigo, e respetivas condições técnicas, designadamente, constantes do desenho de arranjo geral e catálogo do modelo da lancha proposto com as especificações técnicas completas (anexo f), integrados da proposta da contrainteressada, a saber o modelo “INTERCEPTOR 48 PILOT”; C - A Sentença desconsiderou a existência do referido documento (anexo f – especificações/catalogo do modelo “INTERCEPTOR 48 PILOT proposto pela contrainteressada), por se considerar que o mesmo era um “documento facultativo” ou “complementar”, não obrigatório, considerando-o como um documento previsto no n.º 3 do artigo 57.º do Código dos Contratos Públicos. D - A contrainteressada apresentou o referido anexo como um documento integrador quer, do artigo 57.º, n.º 1, alínea b), quer do artigo 57.º, n.º 1, alínea c) do CCP – “documentos exigidos pelo programa do procedimento que contenham os termos ou condições, relativos a aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule.” E - Foi a própria contrainteressada que expressamente faz depender a validade da sua proposta do conteúdo do seu anexo f), pois na sua memória descritiva e modo de execução remete expressamente para conteúdos e parágrafos das especificações técnicas completas em inglês, escrevendo e remetendo inequivocamente na sua memória descritiva “ver Anexo f9) paragrafo 1.4.”; “ver “Anexo f.9) parágrafo 6.3)”; “ver documento da Auto Sueco Portugal Anexo f6); “ver anexo f10 Artigo 5.3” F - Sem aquele “anexo f)” a contrainteressada não teria apresentado de forma completa e, como tal, legal o documento exigido pelo parágrafo 7.2 da alínea b) do Programa do Procedimento, que a entidade exigia que os concorrentes se vinculassem, nos termos do artigo 57.º, n.º 1, alínea c) do CCP, sendo tal ilegalidade cominada com a exclusão da respetiva proposta, de acordo com o artigo 146.º, n.º 2, alínea d) do CCP. G - Assim, violou a douta sentença recorrida (tal como a entidade recorrida no seu relatório de analise de propostas), o disposto artigo 57.º, n.º 1, alínea c) e artigo 146.º, n.º 2, aliena d) do CCP, confirmando a admissibilidade da proposta apresentada pela contrainteressada, ao considerar que o documento “anexo f)” da contrainteressada era um mero documento facultativo e não obrigatório da proposta, ao abrigo do artigo 57.º, n.º 3 do CPP, não revelando para análise da sua conformidade com as disposições do caderno de encargos e suas especificações técnicas. H - Se, ao invés, a entidade recorrida e o Tribunal a quo considerassem tal documento como integrante da memória descritiva apresentada pelo concorrente então imponha-se a sua análise material e sua conformidade com o caderno de encargos e condições técnicas postos a concurso, resultando que o mesmo violava expressamente condições técnicas do caderno de encargos expressamente exigiam no ponto 4.1 – Proteção catódica, designadamente apresenta um prazo de garantia inferior a dois anos. I - Pelo que, a memória descritiva, no seu conjunto, apresentada pela contrainteressada contradiz flagrantemente as peças do concurso, violando quer a entidade recorrida, quer o Tribunal o aquo o disposto nos artigos 70.º, n.º 2, alínea b), por remissão do artigo 146.º, n.º 2, alínea o) do CCP, ao admitir tal proposta. J - O Tribunal a quo não se pronunciou sobre a falta de notificação aos concorrentes dos pedidos de esclarecimentos de propostas e esclarecimentos prestados pelos concorrentes, questão esta expressamente alegada pelas partes processuais, designadamente a recorrente que expressamente invocou a nulidade daqueles esclarecimentos. K - Ao não se pronunciar sobre uma questão relevante, com influencia direta sobre o mérito da questão, como infra se virá, a sentença recorrida violou o disposto no artigo 615.º, n.º 1, aliena d) do Código do Processo Civil, aplicável pelo artigo 35.º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. L - A contrainteressada chegou mesmo, em sede de esclarecimentos, a substituir documentos obrigatórios – nomeadamente o desenho de arranjo geral que integra a memória descritiva e execução do contrato; M - O desenho de arranjo geral original da proposta da contrainteressada podia e devia ter localizado os “lifts points”, tando mais que em sede de esclarecimento a contrainteressada expressamente substitui um documento da proposta por outro – novo desenho de arranjo geral onde afinal é possível localizar os lifts points no só no deck exterior, como no deck interior – novo anexo C; N - Ainda que os pedidos de esclarecimentos e os esclarecimentos prestados pela contrainteressada tivessem sido notificados à recorrente, os mesmos não poderiam ser legalmente admitidos, nos termos do artigo 72.º, n.º 2 do Código dos Contratos Públicos, pois aquele normativo não permite que os esclarecimentos “não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem [propostas], não alterem ou completem os respectivos atributos, visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º“ O - O próprio júri ao fundamentar a exclusão da proposta da recorrente, com base em ligeiras divergências dos “lift point” entre o exigido no caderno de encargos e o proposto, demonstra inequivocamente que aquela omissão (absoluta) na proposta da adjudicatária, sendo motivo de exclusão da proposta, não podia ser suprimida em sede de esclarecimentos; P - Assim, ao aceitar como legais e válidos os esclarecimentos prestados pela contrainteressada e com isto substituir o desenho de arranjo geral, a douta sentença, à semelhança da entidade recorrida, violou o disposto no artigo 72.º, n.º 2 do Código dos Contratos Públicos.
* * Sem vistos, em face do disposto no artigo 36º nº 1 alínea e) e nº 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento. * II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidirO objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA. No caso, vêm interpostos dois recursos independentes: i) - um interposto pela ré APDL - ASSOCIAÇÃO DOS PORTOS DO DOURO, LEIXÕES E VIANA DO CASTELO, SA (a fls. 87 ss.), dirigido à decisão proferida em 08-06-2017 (fls. 159 ss.), pelo Mmº Juiz do Tribunal a quo, de indeferimento do pedido de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA. ii) – outro interposto pela autora ENP - ESTALEIROS NAVAIS DE PENICHE, SA (a fls. 255 ss.) dirigido à sentença (saneador-sentença) proferida pelo Mmº Juiz do Tribunal a quo em 23-06-2017 (fls. 170 ss.) pela qual foi julgada improcedente a ação com improcedência dos pedidos nela formulados pela autora.
- a de saber se a sentença recorrida incorre em nulidade por omissão de pronúncia quanto à invocação feita na ação a respeito da circunstância de não constarem no procedimento os pedidos de esclarecimentos nem a respetiva notificação com violação do artigo 72º nº 3 do CCP – (conclusões J) a K) da alegações de recurso). * A – De facto A1. - No despacho de 08/06/2017, pelo qual o Mmº Juiz do Tribunal a quo indeferiu o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA – que havia sido requerido pela ré APDL - ADMINISTRAÇÃO DOS PORTOS DO DOURO, LEIXÕES E VIANA DO CASTELO, S.A. – foi dada como provada a seguinte factualidade, nos seguintes termos: a. A entidade demandada é uma empresa pública que tem por objeto, entre outros, assegurar o exercício de competências necessárias ao regular funcionamento do porto do Douro, Leixões e Viana do Castelo, cabendo-lhe o exercício de competências e prerrogativas de autoridade portuária que lhe estejam acometidas, incluindo em matéria de segurança marítima e portuária na sua área de jurisdição. (cf. b. O porto gerido pela entidade demandada ocupa o lugar cimeiro nas cargas e descargas de navios em Portugal, sendo responsável, no conjunto da sua atividade, por aproximadamente 25% do total de cargas anualmente aqui movimentadas. c. O porto gerido pela entidade demandada recebe uma média anual de 2730 navios. d. A entidade demandada dispõe das seguintes lanchas de pilotos: • a lancha «EIRA», com 15,6 metros, all weather, trabalhando em qualquer condição climática até ao limite das condições de embarque do piloto, construída em 20021 sendo a mais utilizada; • a lancha « PERLONGAS», com casco planante que apenas permite uma navegação com boas condições tempo e mar, com um motor que não ultrapassa as 2500 rpm e já com 18anos, não podendo funcionar em mar aberto; • a lancha «GILRÉU », com 12 metros de comprimento e 7 anos, sem ter características all weather e com problemas mecânicos e ao nível do motor, impedindo-a frequentemente de estar operacional. e. A aqui entidade demandada determinou a abertura de concurso público n.º 010/2016 para celebração de «Contrato de Fornecimento de uma Lancha de Pilotos», cujo anúncio foi publicado sob a forma de Anúncio n.º 5641/2016, na parte L do Diário da República, 2.ª Série, N.º 174, de 9 de setembro de 2016. f. As aqui autora e contrainteressada apresentaram as respetivas candidaturas ao procedimento referido em 1). g. A 03.01.2017 foi a autora notificada do relatório final de apreciação das propostas e da decisão de adjudicação à concorrente e contrainteressada S................ M..........., Lda. h. A 01.02.2017 a aqui autora intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a presente ação de contencioso pré-contratual. i. Após remessa dos autos a este tribunal, foi a entidade demandada citada por oficio remetido por este tribunal a 17.02.2017, aí se consignando, além do mais, a advertência constante do artigo 103.º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. ~ A2. - Na sentença de 23-06-2017, que julgou procedente a ação, o Mmº Juiz do Tribunal a quo deu como provada a seguinte factualidade, nos seguintes termos: 1.1 A entidade demandada lançou a 09.09.2016, através do anúncio do procedimento n.º 5641/2016, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 174, um procedimento pré-contratual para «Aquisição de Uma Lancha de Pilotos» (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «DR_JOUE», ficheiro informático sob a designação «DR_signed.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 1.2 No âmbito do procedimento referido em 1.1) foi elaborado um instrumento escrito, em papel timbrado da entidade demandada, sob a designação de «Condições Técnicas», objeto de publicitação na plataforma eletrónica onde o aludido procedimento estava a ser tramitado, e subordinado, além do mais, às seguintes cláusulas: «1. INTRODUÇÃO «7. DOCUMENTOS DA PROPOSTA 1.5 A 25.10.2016 a contrainteressada apresentou e submeteu por via eletrónica na plataforma onde estava ser tramitado o procedimento referido em 1.1) um documento em papel timbrado daquela sociedade, com o seguinte teor (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «Propostas», subpasta «S................ M............zip», ficheiro informático sob a designação «f1) Carta da Abertura.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Texto no original»
«Texto no original»
1.7 Na mesma data, a contrainteressada apresentou e submeteu por via eletrónica na plataforma onde estava ser tramitado o procedimento referido em 1.1) um documento, sob a designação «B.1. Memória Descritiva e Modo de Execução (Segundo Parágrafo 7.2. Alínea b) do Programa do Procedimento», com o seguinte teor (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «Propostas», subpasta «S................ M............zip», ficheiro informático sob a designação «b) Memoria Descritiva.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Texto no original»
1.8 Ainda na mesma data, a contrainteressada apresentou e submeteu por via eletrónica na plataforma onde estava ser tramitado o procedimento referido em 1.1) um documento, sob a designação «Volvo D13 MH Brochure», com o seguinte teor (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «Propostas», subpasta «S................ M............zip», ficheiro informático sob a designação «f7) Volvo D13 MH Brochure.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Texto no original»
1.9 A autora também apresentou proposta, instruindo-a, entre outros, com um documento sob a designação de «Memória Descritiva com Arranjo Geral — Segundo ponto 7.2 Alínea b) do Programa do Procedimento», no qual deixou consignado, além do mais, o seguinte (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «Propostas», subpasta «Estaleiros Navais de Peniche.zip», ficheiro informático sob a designação «Memoria Descritiva-APDL-15m.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Texto no original»
1.10 A 28.10.2016 o utilizador da plataforma eletrónica onde estava a ser tramitado o procedimento referido em 1.1) Paulo ………….., da entidade demandada, expediu mensagem por correspondência eletrónica através de funcionalidade da própria plataforma, com a referência «PT1.MSG.434487», endereçado à contrainteressada, subordinada ao assunto «Pedido de esclarecimento à proposta apresentada», e com o seguinte teor: «Exmos. Senhores, 1.11 A 31.10.2016 o utilizador da plataforma eletrónica onde estava a ser tramitado o procedimento referido em 1.1) Ronald ……….., da contrainteressada, expediu mensagem por correspondência eletrónica através de funcionalidade da própria plataforma, com a referência «PT1.MSG.435255», endereçado à entidade demandada, em resposta à comunicação referida em 1.10), subordinada ao assunto «RE: Pedido de esclarecimento à proposta apresentada», e com o seguinte teor: «A S................ M........... agradece à APDL a mensagem enviada em 28-10-2016. 1.12 A 07.11.2016 o utilizador da plataforma eletrónica onde estava a ser tramitado o procedimento referido em 1.1) Paulo …………., da entidade demandada, expediu nova mensagem por correspondência eletrónica através de funcionalidade da própria plataforma, com a referência «PT1.MSG.438500», endereçado à contrainteressada, subordinada ao assunto «Pedido de esclarecimento à proposta apresentada 2», e com o seguinte teor: «Exmos. Senhores, 1.13 A 09.11.2016 o utilizador da plataforma eletrónica onde estava a ser tramitado o procedimento referido em 1.1) Ronald ……….., da contrainteressada, expediu mensagem por correspondência eletrónica através de funcionalidade da própria plataforma, com a referência «PT1.MSG.440326», endereçado à entidade demandada, em resposta à comunicação referida em 1.12), subordinada ao assunto «RE: Pedido de esclarecimento à proposta apresentada 2», e com o seguinte teor: «A S................ M........... agradece à APDL a mensagem enviada em 7-11-2016. 1.14 Em anexo à comunicação referida em 1.13) a contrainteressada juntou, além do mais, um ficheiro sob a designação «Anexo C — Arranjo Geral», com o seguinte teor (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «Resposta Pedido de esclarecimento à proposta apresentada», subpasta «S................ M..........._2», subpasta «PT1_MSG_440326_20161110122329.zip», ficheiro informático sob a designação «Anexo C Arranjo Geral - 2.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Texto no original»
1.15 A 23.11.2016 o Júri do procedimento referido em 1.1) reuniu para elaboração do relatório preliminar, no qual fez consignar, além do mais, o seguinte (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «Relatório Preliminar», ficheiro informático sob a designação «Relatório Preliminar_signed.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Texto no original»
1.16 A 09.12.2016 a aqui autora submeteu instrumento escrito, via plataforma eletrónica onde estava a ser tramitado o procedimento referido em 1.1.), com o seguinte teor: «Exmo. Senhor 1.17 A 15.12.2016 o júri do procedimento referido em 1.1), em reunião para apreciação da pronúncia escrita da autora referida em 1.16) e elaboração do relatório final, fez consignar em ata, além do mais, o seguinte (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «Relatório Final», ficheiro informático sob a designação «Relatório Final_signed.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido): «Texto no original»
1.18 A 22.12.2016 o Conselho de Administração da entidade demandada reuniu para apreciar o relatório final referido em 1.17), adotando a Deliberação n.º 511/2016, pela qual foi deliberado aprovar o aludido relatório final e adjudicar o contrato à contrainteressada (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «MOSS», ficheiro informático sob a designação «Deliberação CA Adjudciação.msg», cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 1.19 A decisão de adjudicação referida em 1.18) foi notificada à contrainteressada, pela plataforma eletrónica onde estava a ser tramitado o procedimento referido em 1.1), a 02.01.2017 (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «Adjudicação», ficheiro informático sob a designação «Comunicação de Adjudicação.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 1.20 A 02.02.2017 o Conselho de Administração da entidade demandada aprovou, pela Deliberação n.º 035/2017, a minuta do contrato a outorgar com a contrainteressada (cf. processo administrativo instrutor apenso aos autos em ficheiros informáticos gravados em suporte físico pen, na pasta «MOSS», ficheiro informático sob a designação «DEl – 035- 2017.pdf», cujo teor se dá por integralmente reproduzido). ** B – De direito1. Do recurso interposto pela ré APDL - ASSOCIAÇÃO DOS PORTOS DO DOURO, LEIXÕES E VIANA DO CASTELO, SA (a fls. 87 ss.) dirigido à decisão de indeferimento do pedido de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA 1.1 Da decisão recorrida A ré APDL - ASSOCIAÇÃO DOS PORTOS DO DOURO, LEIXÕES E VIANA DO CASTELO, SA, requereu através do requerimento apresentado em 02-05-2017 (a fls. 86 ss.), o levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA revisto. O Mmº Juiz do Tribunal a quo decidiu o incidente por despacho de 08-06-2017 (fls. 159 ss.), e julgando-o improcedente, manteve o efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA revisto. Nessa decisão, levou ao probatório a matéria de facto vertida em A1 supra. E após proceder, extensa e aprofundadamente, ao enquadramento do artigo 103º-A do CPTA, quer no que respeita ao estabelecimento do efeito suspensivo automático, ali previsto, quer no que se refere aos critérios para o seu levantamento (vide págs. 3-9 do despacho), disse o seguinte: «Cientes deste enquadramento, recuperemos aqui as alegações da entidade demandada para aferir se, de facto, se verifica esse diferimento da execução do contrato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos. A este respeito alega a entidade demandada (pertinentemente e sem qualquer esquiço de infirmação pela autora) que é, ex vi legis, uma empresa pública com responsabilidades na área da segurança marítima do porto de Leixões, que é o porto mais dinâmico em Portugal, com um movimento de cargas e descargas que se estabilizou, ao longo dos últimos anos, em mais de 2700 navios (número superior aos portos de Lisboa e de Sines, respetivamente 2.º e 3.º no ranking nacional respetivo). Nesse âmbito, a aquisição de uma lancha de pilotos é fundamental para o cabal exercício de atividade comercial do porto de Leixões, posto que estamos perante uma embarcação especialmente concebida para permitir a transferência de piloto do navio e para o navio, em alto mar, frequentemente debaixo de condições de vento e mar bastante adversas, ainda para mais na frente marítima em que o porto gerido pela entidade demandada desenvolve a sua atividade (geograficamente localizado na zona norte e costa aberta do Atlântico, com momentos frequentes de forte agitação marítima, grande ondulação e ocorrência de ventos fortes durante longos períodos do ano). Mais alega que, apesar de ter teoricamente 3 embarcações que, à partida, poderiam desempenhar tais funções, apenas uma delas é viável para as condições de tempo e mar frequentemente verificadas em alto mar no Atlântico Norte, o que é manifestamente insuficiente para o cabal desempenho da atividade do porto de Leixões. Por último, alega que o objeto do contrato não é instantâneo: a adjudicatária terá de construir a embarcação de acordo com as especificações do Caderno de Encargos, o que poderá durar mais de 10 meses após adjudicação e celebração do contrato — o que também não é compaginável com a espera que uma decisão nos autos, sobretudo se houver lugar a instrução, poderá determinar. Nada disto, em bom rigor, é sequer posto em causa pela autora. Mas sendo este o argumentário da entidade demandada, será que podemos julgar preenchida a previsão normativa do artigo 103.º—A, n.º 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos? Julgamos que não. Por um lado, faz-se notar que a presente ação é, ex vi legis, uma ação urgente, tramitando prioritariamente, nos termos do disposto no artigo 36.º, n.os 1, alínea c), e 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. A partir do momento em que, findos os articulados, o processo seja concluso ao juiz, dispõe este do prazo (ordenador) de 10 dias para a prolação da decisão ou submissão do mesmo a julgamento [cf. artigo 102.º, n.º 3, alínea b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos] – sem prejuízo das faculdades adicionais que resultam atualmente dos artigos 87.º—A e 87.º—C do mesmo diploma, aqui aplicáveis com as necessárias e devidas adaptações por força da remissão operada pelo n.º 1 do artigo 102.º daquele código. De resto, na presente data realizou-se audiência prévia com dispensa de instrução, pelo que se iniciará o aludido prazo de 10 dias para prolação de decisão. Por outro lado, a suspensão dos efeitos do contrato por efeito da impugnação da adjudicação constitui uma obrigação que emerge diretamente da lei processual. Trata-se, portanto, de uma imposição normativa (e comunitária), que traduz vicissitude, não só alheia e exógena, como também cogente e supraordenada à entidade demandada. Além disso, não se lobriga fundamento na alegação quanto à lesão do interesse público. Acresce ainda, por importante, que o ato de adjudicação, em si mesmo, não constitui um título jurídico bastante para acautelar quaisquer despesas efetuadas antes da celebração do contrato. Daí que o legislador tenha consagrado a clausula stand still no próprio Código dos Contratos Públicos (cf. artigo 104.º, n.º 1), preceito que impede a celebração do contrato antes de decorridos 10 dias úteis após a notificação da adjudicação — em solução hodiernamente compaginável com a própria lei do processo, como vimos já (artigo 103.º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos). Tal período de paralisação destina-se justamente a permitir que os diversos operadores económicos avaliem, ponderem e decidam se pretendem efetivamente fazer uso dos meios legais de impugnação de adjudicação à sua disposição. É, pois, apodítico que o ato de adjudicação está sujeito a vicissitudes jurídicas, sendo a impugnação com efeito suspensivo automático uma delas. Por último, não podemos deixar de fazer notar que o conjunto das 3 embarcações de que dispõe a entidade demandada (apesar de maior ou menor aptidão de 2 delas), tem sido suficiente para acautelar a sua atividade até ao presente momento. Não será, por isso, por mais 10 dias (prazo estimado para proferir decisão) que advirá uma lesão de tal forma premente e candente que permita operar o levantamento do efeito suspensivo que a própria lei determina. É, assim, inevitável concluir que da manutenção do efeito suspensivo não decorrem danos relevantes a ponderar, ao contrário do que refere a entidade demandada no seu requerimento. Ao invés, já o levantamento do efeito suspensivo poria definitivamente em causa a utilidade da sentença a proferir nos autos e implicaria uma situação de facto consumado, geradora de prejuízos na esfera jurídica da autora. Efetivamente, a cessação do efeito suspensivo determinaria, não só a celebração do contrato e, em grande medida, também a sua execução material (quase integral) durante a pendência da ação até ao respetivo trânsito em julgado. E, como os próprios legisladores comunitário e nacional expressamente consagraram, a execução material do contrato é suscetível de conduzir à impossibilidade absoluta de reconstituição da situação material hipotética, no caso de procedência do pedido, o que acarreta necessariamente que a autora perca, definitiva e irreversivelmente, o direito a celebrar ela própria o contrato com a entidade demandada – o que, por si só e em si mesmo, é efeito que a nova lei adjetiva pretende, de forma genérica e abstrata, afastar. Mais se refira que, apesar de se configurar como possível a reintegração específica da esfera jurídica da autora, caso venha a ser julgada procedente a ação de contencioso pré-contratual dos autos, mormente mediante a atribuição de um quantum indemnizatório, certo é que, à luz da solução normativa hodiernamente cogente, essa tutela ressarcitória não basta; torna-se mister assegurar ao concorrente a possibilidade de celebrar o contrato, em caso de ilegalidade detetada e declarada judicialmente no âmbito de procedimento pré-contratual adjudicatório. Em suma: impõe-se concluir, destarte, que, no caso vertente, o levantamento da suspensão requerida pela entidade demandada será determinante da constituição de uma situação de facto consumado e/ou da produção de prejuízos «graves e irreparáveis» para os interesses da autora. Mais importa concluir que a entidade demandada não alegou nem logrou provar, como lhe competia, factos concretos tendentes a fundamentar a superioridade dos danos que resultariam da manutenção da suspensão automática, para efeito de ponderação dos interesses suscetíveis de serem lesados, nos termos do já referido artigo 103.º—A, n.os 2 e 4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Tudo visto e sopesado, perante os interesses contrapostos na relação jurídica material controvertida subjacente aos presentes autos, julga este tribunal não ter ficado demonstrado que os danos que, com toda a probabilidade, resultariam da manutenção do efeito suspensivo se mostram superiores aos que podem resultar do seu levantamento. E, como tal, indefere-se o referido incidente.» ~ Começa a recorrente por invocar que a decisão sobre a matéria de facto deveria ter sido diferente quanto aos pontos 4) a), 7) e 8) do respetivo probatório, exprimindo a respetiva redação que entende correta (vide conclusões IV. a VII. das alegações de recurso), e que deve também ser aditada como provada matéria que não foi considerada na decisão recorrida, que enuncia como factos nºs 10 a 22 (vide conclusão VIII. das alegações de recurso). Subsidiariamente à propugnada modificação da matéria de facto, para o caso de o Tribunal entender que os factos em causa carecem de prova, não produzida, defende dever ser ordenada a baixa dos autos à primeira instância para instrução, nomeadamente, para inquirição das testemunhas por si arroladas (vide conclusão IX. das alegações de recurso). E invoca ainda que o Tribunal a quo não fez uma correta apreciação dos factos e do direito aplicável, a qual impunha o reconhecimento da forte lesão do interesse público prosseguido pela recorrente, por ter ficado demonstrada a superioridade dos danos invocados pela APDL face à ausência de dano por banda da autora, pelo que deveria ter sido levantado o efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A nº 1 do CPTA por si requerido, e que ao decidir diferentemente o Tribunal a quo violou o disposto no n.º 2 do artigo 103.º-A do CPTA (vide conclusões X. a XXIV. das alegações de recurso). ~ 1.3 Da análise e apreciação do recurso1.3.1 Com vista a enfrentarmos as questões trazidas em recurso, comecemos por atentar no seu enquadramento normativo. No que acompanharemos, aqui, o já expandido, designadamente, nos acórdãos deste TCA Sul de 04-10-2017, Proc. nº 1329/16.1BELSB e de 09-11-2017, Proc. nº 1268/16.6BESNT, de que fomos relatores. 1.3.2 As ações de impugnação ou de condenação à prática de atos administrativos (ou equiparados, para tal efeito) relativos à formação de contratos de empreitada de obras públicas, de concessão de obras públicas, de concessão de serviços públicos, de aquisição ou locação de bens móveis e de aquisição de serviços, seguem a forma de processo de contencioso pré-contratual prevista e regulada nos artigos 100º ss. do CPTA. 1.3.3 Sempre que o processo de contencioso pré-contratual seja intentado com vista à impugnação de atos de adjudicação, a sua instauração suspende automaticamente os efeitos do ato de adjudicação ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado. É o que resulta do artigo 103º-A nº 1 do CPTA, introduzido pelas alterações resultantes do DL. n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, que dispõe o seguinte: “A impugnação de atos de adjudicação no âmbito do contencioso pré-contratual urgente faz suspender automaticamente os efeitos do ato impugnado ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado”. Trata-se do designado efeito suspensivo automático da impugnação dos atos de adjudicação. Solução acolhida pelo legislador nacional, em transposição das Diretivas Recursos, como aliás, é mencionado no preâmbulo do diploma. Recorde-se que a Diretiva n.º 2007/66/EC, do Parlamento Europeu e do Conselho, publicada no JO L n.º 335, de 20-12-2007, prevê no seu artigo 2º nº 3, para no caso de “recurso de uma decisão de adjudicação de um contrato para um órgão que decida em primeira instância, independente da entidade adjudicante, os Estados-Membros devem assegurar que a entidade adjudicante não possa celebrar o contrato antes de a instância de recurso ter tomado uma decisão, quer sobre o pedido de medidas provisórias, quer sobre o pedido de recurso”. 1.3.4 Este efeito suspensivo automático do ato de adjudicação (ou do contrato, caso tenha sido celebrado) pela mera decorrência da instauração do processo de contencioso pré-contratual em que o mesmo seja impugnado, agora acolhido no CPTA neste nº 1 do seu artigo 103º-A, conduz a que atualmente, o autor impugnante não precise de lançar mão do mecanismo da providência cautelar de suspensão de eficácia para impedir a execução do ato de adjudicação, ou do contrato, caso este entretanto já houvesse sido celebrado, estar a entidade adjudicante obrigada. 1.3.5 Porém, esse efeito suspensivo automático pode ser levantado por decisão judicial, a requerimento da entidade adjudicante ou dos contra-interessados. É o que resulta do nº 2 do artigo 103º-A do CPTA, que dispõe que “…no caso previsto no número anterior, a entidade demandada e os contrainteressados podem requerer ao juiz o levantamento do efeito suspensivo, alegando que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos…”. Quando tal seja requerido, o demandante dispõe do prazo de sete dias para responder ao pedido de levantamento, findo o qual o juiz decide (no prazo máximo de dez dias) (nº 3), sendo o efeito suspensivo automático levantado “…quando, ponderados os interesses suscetíveis de serem lesados, os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento” (nº 4). 1.3.6 A introdução do mecanismo do efeito suspensivo automático agora previsto no artigo 103º-A nº 1 do CPTA, operada pelo DL. n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, visa dar cumprimento à Diretiva Recursos (Diretiva 2007/66/CE), no que tange ao disposto no seu artigo 2º nº 3, a qual prevê no seu artigo 2º nº 3, que no caso de “recurso de uma decisão de adjudicação de um contrato para um órgão que decida em primeira instância, independente da entidade adjudicante, os Estados-Membros devem assegurar que a entidade adjudicante não possa celebrar o contrato antes de a instância de recurso ter tomado uma decisão, quer sobre o pedido de medidas provisórias, quer sobre o pedido de recurso”. Este normativo comunitário determina um efeito substantivo, sobre o ato de adjudicação, na decorrência da sua impugnação: o da suspensão dos seus efeitos, impedindo a celebração do respetivo contrato, até que a impugnação do ato de adjudicação seja decidida. 1.3.7 A imposição do efeito suspensivo automático operado por aquela norma comunitária (artigo 2º nº 3 da Diretiva 2007/66/CE), deverá, assim, ser enquadrada com a cláusula standstill tal como plasmada no artigo 2º-A da mesma Diretiva, nos termos da qual, com vista a assegurar-se que os interessados dispõem “…de um prazo suficiente para assegurar um recurso eficaz das decisões de adjudicação de contratos tomadas por entidades adjudicantes” (nº 1), a celebração do contrato “…não pode ter lugar antes do termo de um prazo mínimo de 10 dias consecutivos a contar do dia seguinte à data em que a decisão de adjudicação do contrato tiver sido enviada aos proponentes e candidatos interessados, em caso de utilização de telecópia ou de meios eletrónicos, ou, em caso de utilização de outros meios de comunicação, antes do termo de um prazo mínimo, alternativamente, de 15 dias consecutivos, a contar do dia seguinte à data em que a decisão de adjudicação tiver sido comunicada aos proponentes e candidatos interessados, ou de 10 dias consecutivos a contar do dia seguinte à data de receção da decisão de adjudicação do contrato” (nº2) (acolhida na ordem interna no artigo 104º nº 1 alínea a) do Código dos Contratos Públicos). 1.3.8 O contexto destes normativos é-nos dado com clareza por António Cadilha, in, “Contencioso Pré-Contratual”, Revista Julgar, nº 23, Coimbra Editora, 2014, consultável in, http://julgar.pt/wp-content/uploads/2014/05/10-Ant%C3%B3nio-Cadilha.pdf, A Diretiva 2007/66/CE, nos seguintes termos: “A Diretiva 2007/66/CE teve por principal finalidade corrigir ou atenuar uma situação — que se entendeu subsistir um pouco por toda a Europa — de défice de tutela jurisdicional dos participantes em procedimentos de contratação pública, em particular no que respeita à possibilidade de impugnação, em momento útil, do ato decisivo deste tipo de procedimentos (o ato de adjudicação). Tal défice resultava de algumas deficiências que atingiam, em termos de configuração e eficácia, os sistemas de contencioso em matéria de contratação pública que vigoravam nos vários Estados-membros no início do processo de revisão da Diretiva “Recursos”. Uma das principais deficiências prendia-se com a extrema dificuldade em obter uma sentença judicial de anulação de um contrato público. Com efeito, mesmo nos Estados-membros em que, embora em moldes diferenciados, se admitia que a ilegalidade de certos atos do procedimento pré-contratual se projetasse sobre a (in)validade do contrato celebrado subsequentemente (como sucede em Portugal), a verdade é que a morosidade associada aos processos impugnatórios tornava, na prática, extremamente difícil obter uma sentença judicial desse tipo. Fosse porque (i) quando o tribunal se pronunciava sobre a questão, o contrato já estava plenamente executado, fosse porque (ii) se entendia que a sua anulação representava um prejuízo inaceitável para o interesse público subjacente ao contrato ou fosse, ainda, porque (iii) o decurso do tempo tornava os tribunais mais sensíveis à posição do co-contratante alicerçada nos valores da segurança e estabilidade jurídica, a prática demonstrava que a “anulação de contratos públicos na sequência da anulação de atos pré-contratuais da entidade adjudicante era uma situação claramente excecional”. A celebração e início de execução do contrato tendia a tornar material ou juridicamente irreversíveis as infrações ao direito da contratação pública — pelo menos no plano da sua reparação natural, por via da reconstituição da situação jurídico-procedimental existente antes de tais infrações. (…) O quadro que acabamos de descrever, no que respeita à (in)eficácia dos meios de tutela previstos na Diretiva 89/665/CEE, acabou por redundar na adoção, pelas entidades adjudicantes, de um conjunto de práticas particularmente nocivas para o objetivo de garantir o efetivo cumprimento do direito da contratação pública. Uma delas respeita à tendência para essas entidades, após a prática do ato de adjudicação, procederem rapidamente à celebração do contrato público visado, por forma a evitar que uma eventual ação judicial — já intentada ou a intentar por algum dos concorrentes vencidos — possa ter consequências relevantes sobre o desfecho do procedimento adjudicatório (fenómeno que ficou conhecido por “corrida à assinatura do contrato”). É que, pelos motivos aduzidos, a outorga do contrato “torna [tendencialmente] irreversíveis os efeitos da adjudicação, colocando a empresa sucumbente na situação de apenas poder reclamar um eventual ressarcimento dos danos (nos casos restritos em que consiga provar a existência de prejuízos efetivos), e sendo-lhe retirada a possibilidade de ser adjudicatária em caso de sucesso do recurso”. Sabendo que o único “risco” que corriam era o de eventualmente virem a ser condenadas a pagar uma indemnização — condenação que dificilmente seria em montante elevado e, que em qualquer caso, só sucederia muito tempo depois, dada a morosidade dos processos indemnizatórios –, o incentivo era para as entidades adjudicantes precipitarem a celebração do contrato, frustrando, assim, a tutela judicial dos concorrentes (ilegalmente) preteridos. Foram estas circunstâncias que em grande medida motivaram a Diretiva 2007/66/CE, levando o legislador comunitário a introduzir um conjunto de inovações destinadas a reforçar a efetividade dos mecanismos de recurso pré-contratuais, de modo a garantir que estes estejam efetivamente disponíveis num momento prévio à celebração do contrato, e que as entidades adjudicantes não possam livremente restringir a sua eficácia, conseguindo, através da simples celebração antecipada do contrato, evitar o pleno alcance da tutela jurisdicional. Essas inovações traduziram-se essencialmente na previsão de um “complexo de termos suspensivos mínimos que devem decorrer antes que seja possível [à entidade adjudicante] celebrar o contrato em causa”. O primeiro é um termo suspensivo obrigatório, de natureza procedimental, que deve necessariamente decorrer entre a notificação do resultado do procedimento pré-contratual aos interessados e a celebração do contrato público (cfr. artigo 2.º-A, n.º 2). Trata-se da consagração legal do “período de standstill”, ou seja, de “um impedimento temporário à celebração do contrato, que opera ex lege por um determinado período de tempo, independentemente da proposição de qualquer ação judicial” — e que entre nós foi introduzido, em 2008, com o CCP, que fixou esse período em 10 dias (artigo 104.º, n.º 1, alínea a)). Mas o intuito de fortalecer a tutela pré-contratual dos participantes num procedimento de formação de um contrato público não se esgotou na imposição de uma obrigação de “standstill”, que se destina a garantir àqueles participantes tempo suficiente para avaliarem a legalidade do ato de adjudicação e (se for caso disso) ativarem aqueles mecanismos, sem correrem o risco de o contrato ser, entretanto, outorgado. Com efeito, o legislador comunitário teve a noção de que esta medida isolada não representaria qualquer significativo acréscimo de eficácia do sistema se, ao mesmo tempo, não se garantisse que, sempre que um dos concorrentes preteridos decida efetivamente impugnar o ato de adjudicação, o tribunal pudesse dispôr do tempo indispensável para apreciar a viabilidade desse pedido, antes da celebração do contrato (ou pelo menos para prolongar a suspensão ex lege). Se não se avançasse nesse sentido, a possibilidade de tutela jurisdicional que a paralisação ex lege do procedimento proporciona revelar-se-ia meramente teórica, dada a impraticabilidade de obtenção dessa tutela no curto espaço de vigência do “standstill”. Para acautelar esta situação, a Diretiva 2007/66/CE veio impor, no seu artigo 2.º, n.º 3, que os Estados-membros estabelecessem um prolongamento automático do efeito suspensivo decorrente do “standstill” sempre que, no decurso deste, seja deduzida uma pretensão contenciosa — principal ou cautelar — contra o ato de adjudicação. Ficou consignado assim um segundo termo suspensivo, que se distingue do “standstill” por se tratar de uma suspensão não obrigatória mas facultativa, na medida em que depende da utilização, pelo interessado, de meios de reação judicial contra o ato de adjudicação.(…)” 1.3.9 E foi perspetivando que o mecanismo de suspensão automática previsto no artigo 3º nº 2 da Diretiva, acolhido na ordem interna no nº 1 do artigo 103º-A do CPTA, poderia gerar situações em que a paralisação dos efeitos do ato de adjudicação e do próprio contrato (caso entretanto já tivesse sido celebrado) afetasse, de forma desproporcionada, a prossecução do interesse público por ele visado (ou outros interesses em presença), que o legislador nacional consagrou no nº 2 do artigo 103º-A do CPTA a possibilidade de ser levantado o efeito suspensivo automático, a requerimento das partes interessadas, alegando para tanto “…que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos” (nº 2), efeito suspensivo que é levantado “…quando, ponderados os interesses suscetíveis de serem lesados, os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento”. É a seguinte a redação do artigo 103º-A do CPTA: “Artigo 103º-A 1 - A impugnação de atos de adjudicação no âmbito do contencioso pré-contratual urgente faz suspender automaticamente os efeitos do ato impugnado ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado. Efeito suspensivo automático 2 - No caso previsto no número anterior, a entidade demandada e os contrainteressados podem requerer ao juiz o levantamento do efeito suspensivo, alegando que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, havendo lugar, na decisão, à aplicação do critério previsto no n.º 2 do artigo 120.º 3 - No caso previsto no número anterior, o demandante dispõe do prazo de sete dias para responder, findo o que o juiz decide no prazo máximo de 10 dias, contado da data da última pronúncia apresentada ou do termo do prazo para a sua apresentação. 4 - O efeito suspensivo é levantado quando, ponderados os interesses suscetíveis de serem lesados, os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento.” 1.3.10 Em face da redação constante da parte final do nº 2 deste artigo 104ºA e do nº 4 do mesmo artigo, aparentemente não coincidente e contraditória, poderão resultar dúvidas quanto ao critério da decisão do pedido de levantamento do efeito suspensivo automático. Havendo, de todo o modo, que descortinar o critério que o legislador, pretendeu e fez estabelecer. 1.3.11 A doutrina não deixa de fazer referência a tal dificuldade, que tem tentado resolver. Rodrigo Esteves de Oliveira, in, “A tutela "cautelar" ou provisória associada à impugnação da adjudicação de contratos públicos”, CJA 115, Janeiro-Fevereiro 2016, pág. 24 ss., diz, a este respeito, o seguinte: “A questão que se coloca é saber se, no juízo de ponderação de interesses, o tribunal apenas pode ou deve atender a danos dessa valia ou gravidade do lado da entidade demandada ou dos contrainteressados, confrontando-os com os danos invocados pelo demandante, ou se, pelo contrário, do lado da entidade demandada e contrainteressados, são invocáveis quaisquer danos, mesmo os que não se subsumam nesses conceitos legais. Como bem observa Vieira de Andrade, os conceitos utilizados pelo legislador «operam, em regra, como limites absolutos», sendo duvidoso que isso seja «compatível com o "princípio da prevalência do interesse preponderante no caso concreto").» Com efeito, numa pura lógica de ponderação de interesses, como a que está inscrita no art. 103.º-A, n.º 4, os demandados não teriam de provar a verificação dos "requisitos" do n.º 2, mas apenas que os danos que resultam da manutenção do efeito suspensivo (sejam eles quais forem) são superiores, em valor e peso, aos que resultam do seu levantamento. O diferimento da execução do ato poderia, portanto, não ser gravemente prejudicial para o interesse público, mas apenas prejudicial, e poderia também não ser gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, mas apenas de consequências lesivas desproporcionadas, e ainda assim se justificar o levantamento, desde que, repete-se, fossem superiores aos danos invocados pelo demandante. Seria um sistema equilibrado. No entanto, a ideia do legislador pode também ter sido a de replicar aqui uma solução próxima daquela que existe no art. 128.º do CPTA – em que também só se admite o levantamento administrativo da proibição provisória de executar o ato administrativo, mediante resolução fundamentada, quando o "diferimento da execução [seja] gravemente prejudicial para o interesse público" -, fazendo, portanto, com que apenas fossem considerados "candidatos positivos" à ponderação do n.º 4 do art. 103.º-A os danos que se subsumissem no seu n.º 2. Admitimos que seja esta a única solução que compatibiliza a letra do n.º 2 com a letra do n.º 4, mas temos dúvidas se ela corresponde verdadeiramente à intenção do legislador. Em segundo lugar, salvo se se tratar de um pequeno lapso, não se percebe muito bem a remissão que se faz no n.º 2 do art. 103.º-A para o n.º 2 do art. 120.º (critério da ponderação de interesses), quando do próprio art. 103.º-A consta o critério relevante para o efeito, a saber, no n.º 4, quando aí se estabelece (no contexto também de uma ponderação de interesses) que "o efeito suspensivo é levantado quando, ponderados os interesses suscetíveis de serem lesados, os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento". Em terceiro lugar, sendo seguro que não jogam aqui considerações sobre a aparência do bom direito”, há dúvidas, que o legislador não tinha de esclarecer, sobre quais são os danos atendíveis do lado do demandante (que ele deve fazer constar da pronúncia referida no art. 103.º-A nº 3).” Margarida Olazabal Cabral, in, “O contencioso pré-contratual no CPTA revisto – algumas notas”, Lisboa, Centro de Estudos Judiciários, Fevereiro, 2017, pág. 58 ss., consultável em: http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/Administrativo_fiscal/eb_Contencioso_Precontratual.pdf, diz, a este mesmo propósito, o seguinte: “A lei também não é clara quanto aos critérios de decisão do juiz acerca do levantamento, ou não, dos efeitos suspensivos. Na verdade, e como tem vindo a ser assinalado, existe uma duplicação da parte final do n.º 2 (“havendo lugar na decisão à aplicação do critério previsto no n.º 2 do artigo 120.º”) e o n.º 4 (“o efeito suspensivo é levantado quando ponderados os interesses suscetíveis de serem lesados, os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento”), ambos do artigo 103.º-A. Em bom rigor, a diferença fundamental que existe entre as duas previsões é a possibilidade de substituir o levantamento da suspensão por outras providências. Embora existam interpretações diferentes, estou convencida que o n.º 4 se manteve no CPTA por mero lapso: numa versão do anteprojeto tratava-se do único número onde se regulava o critério de decisão, e, quando esta matéria passou a ser integralmente tratada no n.º 3, o legislador material não reparou e manteve o n.º 4. Em qualquer caso, dizendo o n.º 2 mais do que o n.º 4 parece-me que deve prevalecer. Sem grande novidade diria que o legislador estabeleceu aqui uma lógica de ponderação de interesses, exigindo ao demandado e aos contrainteressados um especial cuidado no pedido de levantamento – quer solicitando-lhes que alegue que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público, quer que as consequências lesivas da manutenção da suspensão seriam claramente prejudiciais para o interesse público – e exigindo-lhes que provem (através de prova a oferecer na resposta ao pedido de levantamento nos termos do artigo 293º n.º 1, conjugado com o artigo 292º, ambos do CPC de 2013, ex vi art. 1º, do CPTA) – os prejuízos que decorreriam do levantamento do efeito suspensivo. Embora o legislador qualifique o tipo de prejuízo (grave) e a natureza da desproporção (clara) a alegar e provar, a remissão para o n.º 2 do artigo 120.º leva-me a concluir que a tarefa do juiz será, a partir daí, de uma ponderação de danos verdadeira (entre os que decorreriam do levantamento e os que adviriam da suspensão), devendo a suspensão ser levantada se os prejuízos para o interesse público e privado em presença decorrentes da manutenção do efeito suspensivo forem superiores aos danos para os interesses em presença decorrentes do levantamento. Essa é a única interpretação que garante a proteção igual dos vários interesses em presença, não se vendo como seria constitucionalmente admissível privilegiar a proteção dos interesses do demandante face aos interesses da entidade demandada e dos contrainteressados (sem esquecer as exigências da Diretiva Recursos a este propósito). Entendo as referências da primeira parte do n.º 2 do artigo 103.º-A como pondo um ónus no demandado e nos contrainteressados no tipo de alegação que devem fazer, no sentido de afastar a pré-compreensão que vigorou durante tantos anos de que o interesse público será sempre prejudicado com a suspensão, pelo que deveria sempre prevalecer o interesse da entidade adjudicante na execução do ato. Trata-se também de afastar a ideia de que o único prejuízo do Requerente que seria relevante seria o risco de insolvência decorrente da frustração da execução do contrato, como tantas vezes a jurisprudência exigia. O legislador deixa assim uma nota no que se refere à tutela pré contratual no sentido de afastar algum “facilitismo judicial” na valorização dos prejuízos para o interesse público (em que pouco se exigia da entidade demandada em termos de alegação e ponderação). Agora requer-se que a entidade demandada invoque prejuízos concretos e graves, ou desproporcionados. Não basta o mero atraso na celebração do contrato ou na sua execução. Mas não é mais do que isso o que se prevê no artigo 103.º A quanto ao prejuízo decorrente da manutenção de suspensão, tendo o juiz que decidir, ponderando todos os danos em pé de igualdade. Acresce que nessa ponderação o juiz tem obviamente de considerar a resposta do demandante que tanto pode ter invocado o prejuízo que para si advirá do levantamento da suspensão, como também ter rebatido os prejuízos alegados pela entidade demandada e/ou contrainteressados, para que estes possam ser ponderados pelo juiz.(…)”. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha in, “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2017, 4ª edição, págs. 643 ss., dizem: “No que diz respeito aos pressupostos de que depende a concessão do levantamento do efeito suspensivo automático, afigura-se da maior importância notar que, ao exigir um grave prejuízo para o interesse público ou uma clara desproporção das consequências lesivas para outros interesses envolvidos (aqui se incluindo os interesses do adjudicatário), o preceito faz depender o levantamento do efeito suspensivo automático do preenchimento de pressupostos exigentes, no que diz respeito aos danos que podem resultar da manutenção do efeito suspensivo: a regra é o efeito suspensivo automático, que só deve ser levantado em circunstâncias particularmente exigentes. (…) A referência, no nº 2, ao “grave prejuízo para o interesse público” e à lesão “claramente desproporcionada dos outros interesses envolvidos” tem, entretanto, o alcance de clarificar que, para a obtenção do levantamento do efeito suspensivo, não é suficiente a invocação abstrata pelos requerentes de prejuízos genéricos, sendo antes exigível a demonstração em concreto dos danos que a manutenção do efeito suspensivo acarreta para o interesse público ou os interesses privados relacionados com a adjudicação, para o que haverá que atender à natureza do contrato que é objeto do procedimento pré-contratual, à sua efetiva importância para a satisfação de necessidades coletivas, ao período de tempo que previsivelmente decorrerá até ao julgamento da ação e, se for caso disso, à situação em que se encontra a execução do contrato e as prestações e investimentos já realizados.” 1.3.12 Temos para nós que a interpretação consentida pela concatenação dos nºs 2 e 4 do artigo 103º-A do CPTA é a de que o efeito suspensivo automático (previsto no nº 1) deve ser levantado quando se demonstre (por alegação e prova) que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos (nº 2) quando na ponderação com os danos que podem resultar do seu levantamento aqueles se mostrem superiores (nº 4). Trata-se, de um duplo grau de exigência, como de certo modo já se entendeu no acórdão deste TCA Sul de 14-07-2016, Proc. nº 13444/16, in, www.dgsi.pt/jtcas, ao considerar-se que «Do art. 103º-A, do CPTA revisto, resulta que o levantamento do efeito suspensivo automático depende da verificação - cumulativa - dos seguintes requisitos: a) Grave prejuízo para o interesse público ou de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos. b) Ponderação de todos os interesses em presença segundo critérios de proporcionalidade.», e se reiterou, no acórdão de 04-10-2017, Proc. 1329/16.1BELSB, de que fomos relatores, disponível in, www.dgsi.pt/jtcas. Interpretação que é, a um tempo, consentida pelo elemento literal dos dispositivos em causa, e a outro pelo espírito da lei, enformada pelo direito comunitário subjacente. O direito comunitário, pretende, através da Diretiva, a suspensão automática do ato de adjudicação em caso de recurso, com o que visa impedir o efeito de facto consumado decorrente da celebração e execução do contrato (que possa vir a ser reconhecido como ilegal), como já se viu supra. Se a norma nacional permite o levantamento desse efeito suspensivo quando, sob alegação da entidade adjudicante ou dos contra-interessados, se constate que o diferimento da execução do ato seja não tão somente prejudicial para o interesse público (que sempre será), mas gravemente prejudicial, que naturalmente exige uma qualificação (agravada) desse prejuízo, no sentido de sério, intenso ou elevado. O mesmo com as consequências lesivas para os outros interesses envolvidos, que a lei exige deverem ser claramente desproporcionadas. Pelo que só nesse caso deve a imposição ope legis do efeito suspensivo ceder, determinando o Tribunal o seu levantamento. Assim o entendem também Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 4ª Edição, 2017, pág. 845, afirmando em conclusão que “…numa interpretação conjugada do n.º 2 com o n.º 4, o levantamento do efeito suspensivo só pode ser decretado quando se verifique, comprovadamente, que da manutenção desse efeito resultaria um desequilíbrio desproporcionado entre os interesses envolvidos, em desfavor da entidade demandada ou dos contrainteressados”. Trata-se afinal, como diz, António Cadilha, in, “Contencioso Pré-Contratual”, Revista Julgar, nº 23, Coimbra Editora, 2014, consultável in, http://julgar.pt/wp-content/uploads/2014/05/10-Ant%C3%B3nio-Cadilha.pdf, pág. 213, de solução legal que “…garante a integral conformidade do direito processual nacional com o artigo 2.º, n.º 3, da Diretiva Recursos, indo ao encontro dos interesses jurídicos que esta Diretiva procura tutelar: i) Por um lado, o interesse em garantir que o direito à tutela jurisdicional dos concorrentes preteridos nesse procedimento — e, reflexamente, o interesse pelo respeito da ordem jurídica comunitária e pelos valores concorrenciais que ela pretende implementar na contratação pública — não são postergados pela celebração do contrato público logo após o fim do período de “standstill”, assegurando-lhes que, caso pretendam impugnar o ato de adjudicação durante esse período, a outorga do contrato não pode ocorrer sem que a sua pretensão seja objeto de algum tipo de apreciação judicial; ii) Por outro, o interesse em evitar que se produzam danos desproporcionados ao interesse público e especialmente nos interesses da celeridade dos procedimentos de formação dos contratos públicos e da eficiência da atuação administrativa.” 1.3.13 Em sentido confluente já se pronunciou este TCA Sul, designadamente, nos seguintes acórdãos: - de 14-07-2016, Proc. nº 13444/16, onde se sumariou que: «I - Do art. 103º-A, do CPTA revisto, resulta que o levantamento do efeito suspensivo automático depende da verificação - cumulativa - dos seguintes requisitos: a) Grave prejuízo para o interesse público ou de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos. b) Ponderação de todos os interesses em presença segundo critérios de proporcionalidade. II - O requisito enunciado no antecedente ponto I, alínea a), implica a alegação da pertinente factualidade, cujo ónus probatório recai sobre a entidade demandada e os contra-interessados, os quais deverão oferecer a competente prova com o requerimento em que é deduzido o incidente (cfr. art. 293º n.º 1, conjugado com o art. 292º, ambos do CPC de 2013, ex vi art. 1º, do CPTA). III – Não basta à entidade demandada e aos contra-interessados alegarem – e provarem – a existência de prejuízos para o interesse público e para os outros interesses envolvidos, sendo necessária a alegação – e prova – da existência de grave prejuízo para o interesse público ou de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos. IV – O requisito acima enunciado no ponto I, alínea b), significa que a manutenção ou levantamento do efeito suspensivo depende de um juízo de ponderação de danos, devendo o efeito suspensivo ser levantado quando os danos com a manutenção sejam superiores aos danos com o levantamento, estes últimos a alegar pelo autor na resposta ao incidente, na qual também deverá oferecer a competente prova (cfr. art. 293º n.º 1, conjugado com o art. 292º, ambos do CPC de 2013, ex vi art. 1º, do CPTA).» - de 24-11-2016, no Proc. 13747/16, onde se sumariou que: «(…) ii) Do artigo 103.º-A, do CPTA, resulta que o levantamento do efeito suspensivo automático depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos: a. Alegação e prova de grave prejuízo para o interesse público ou de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos; b. Ponderação de todos os interesses em presença segundo critérios de proporcionalidade. iii) Para efeitos de verificação do primeiro daqueles requisitos não basta a existência de mera prejudicialidade para o interesse público, nem a existência de apenas consequências lesivas desproporcionadas, na medida em que o legislador terá, ele mesmo, necessariamente ponderado a possibilidade da existência de um prejuízo desse tido (não qualificado) e não o afastou do alcance do efeito suspensivo.»; - de 24-11-2016, Proc. nº 919/16.7BELSB, em que se sumariou: «(…) IV - O fim ou o objetivo do efeito suspensivo automático constante do artigo 103º-A/1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos é a tutela jurisdicional efetiva da posição jurídica do autor, evitando o facto consumado resultante da “corrida ao contrato” e favorecendo ex legis a apreciação jurisdicional útil ou consequente da legalidade do ato administrativo de adjudicação. V - O regime que resulta dos nº 2 e nº 4 do artigo 103º-A do Código de Processo nos Tribunais Administrativos é o seguinte: 1º- o “critério decisório”, ou melhor, a metodologia decisória do juiz passa pela ponderação racional e expressa, num juízo de prognose, de todos os interesses em presença e de todos os danos respetivos à luz da máxima metódica da proporcionalidade (com os seus três testes ou exames: adequação ou idoneidade, necessidade ou exigibilidade, proporcionalidade em sentido estrito ou equilíbrio); 2º- os dois pratos da balança do juiz, para ponderação ou sopesamento, são constituídos, (i) num lado, pelos prejuízos a causar pela continuação do efeito suspensivo automático e, (ii) por outro lado, pelos prejuízos a causar pela retoma do prosseguimento do procedimento pré-contratual na fase pós-adjudicatória; 3º- o juiz decidirá levantar o efeito suspensivo da interposição da ação (iniciado com a citação da entidade pública demandada) se - e só se – concluir que os prejuízos que resultarão da manutenção do efeito suspensivo se mostram claramente superiores aos prejuízos que possam resultar da retoma do prosseguimento do procedimento pré-contratual na fase pós-adjudicatória.»; - de 12-09-2017, Proc. nº 27/17.3BELSB-A, onde se sumariou que «I – Para que a regra do efeito suspensivo automático prevista no nº 1 do artigo 103-A do CPTA ceda é necessário que o diferimento da execução do acto seja gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionada para outros interesses envolvidos. II – Não se verifica grave lesão do interesse público, nem consequências lesivas desproporcionadas para outros interesses envolvidos, se a entidade adjudicante celebrou, com o adjudicatário do procedimento concursal visado nos autos, contrato de prestação de serviços com objecto igual ao do referido procedimento, contrato esse com a duração de um mês, que se renova automaticamente por iguais e sucessivos períodos até à decisão do Tribunal que levante o efeito suspensivo ou até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal quanto à questão de fundo no processo» - de 04-10-2017, Proc. nº 1904/16.4BELSB-A, em que se sumariou que: «I -Nos termos do artigo 103.º-A, do CPTA, resulta que o levantamento do efeito suspensivo automático depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos (i) alegação e prova de grave prejuízo para o interesse público ou de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos e (ii) ponderação de todos os interesses em presença segundo critérios de proporcionalidade. II - Da concatenação do art. 103.º-A, n.º 2, do CPTA, com o disposto no art. 342.º n.º 1, do C. Civil, decorre que recai sobre a entidade demandada e os contra-interessados o ónus de alegar e provar que o diferimento da execução do acto seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos. III - A suspensão do acto de adjudicação impugnado e a consequente suspensão do procedimento tendente à celebração do contrato, que impede a imediata execução do serviço de fornecimento de Gás Natural a um conjunto de 50 veículos de recolha de resíduos sólidos num universo de 172 viaturas, embora constitua um prejuízo para o interesse público, consubstancia tão-somente um mero prejuízo – o efeito normal – decorrente do retardamento do início do fornecimento do GN a uma parte dos veículos que vêm efectuando a recolha de resíduos sólidos, os quais continuam a ser garantidos pelos serviços municipais –, e não um prejuízo anormal, extraordinário ou, no dizer da lei, “gravemente prejudicial para o interesse público” e que, como tal, deva ser imperiosa e urgentissimamente acautelado por via do incidente previsto no artigo 103.º, n.º 2, do CPTA.» - de 04-10-2017, Proc. 1329/16.1BELSB, em que se sumariou, entre o demais, o seguinte: «IX - A interpretação consentida pela concatenação dos nºs 2 e 4 do artigo 103º-A do CPTA revisto é a de que o efeito suspensivo automático (previsto no nº 1) deve ser levantado quando se demonstre (por alegação e prova) que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos (nº 2) quando na ponderação com os danos que podem resultar do seu levantamento aqueles se mostrem superiores (nº 4), consubstanciando, assim, um duplo grau de exigência.». 1.3.14 Simultaneamente importa atender que a decisão que recai sobre o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA revisto consubstancia a decisão de um incidente do processo de contencioso pré-contratual, atentos os termos como o mesmo se mostra configurado. Incidente esse que é processado nos próprios autos de processo de contencioso pré-contratual, seguindo a tramitação ali prevista, em termos que, formulado pela entidade demandada ou pelos contra-interessados o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático (nº 2) o autor na ação pode a ele responder, no prazo de sete dias, após o que o juiz decide (nº 3). 1.3.15 Não se prevê, na tramitação contida nos nºs 2 a 4 do artigo 103º-A do CPTA para o incidente de levantamento do efeito suspensivo automático, qualquer fase de instrução e prova. Porém, tratando-se, como se trata, de um incidente, devem aplicar-se supletivamente, nos termos do artigo 1º do CPTA, as normas para os incidentes da instância contidas nos artigos 292º ss. do CPC novo. O que significa que no requerimento em que se suscita o incidente de levantamento do efeito suspensivo automático, e nos articulados de resposta que sejam apresentados, podem as partes oferecer os respetivos meios de prova, seja documental ou outra, inclusive a testemunhal, ainda que, neste caso, com um número máximo de cinco testemunhas (cfr. artigos 293º nº 1 e 294º nº 1 do CPC novo) –(vide a este respeito o Acórdão deste TCA Sul de 09-11-2017, Proc. n.º 1268/16.6BESNT, de que fomos relatores). 1.3.16 Mas, como se entendeu já nesse referido Acórdão deste TCA Sul de 09-11-2017, Proc. n.º 1268/16.6BESNT, de que fomos relatores, «…a circunstância de terem sido oferecidas testemunhas em qualquer dos articulados atinentes ao incidente não implica que o juiz tenha que, obrigatoriamente, levar a cabo diligência de inquirição das testemunhas. O Tribunal só deve levar a cabo diligências de instrução e prova, se se deparar com matéria de facto controvertida relevante para a decisão do incidente, pois só ela estará e deverá ser sujeita a prova, devendo, pois, recusar, por impertinente, a produção de prova requerida, designadamente a testemunhal, se for de concluir, em face do objeto do incidente, não existir matéria de facto controvertida com relevância para a respetiva decisão (cfr. artigos 6º nº 1, 3º nº 1 e 5º nº 1 do CPC novo e artigo 90º nº 1 do CPTA revisto).» Assim, tendo sido requerida, por qualquer das partes, a produção de prova testemunhal, tal não implica, por si e automaticamente, que o Tribunal tenha que proceder, forçosamente, à sua inquirição. E, concomitantemente, o facto de o Tribunal não levar a cabo a inquirição das testemunhas oferecidas por qualquer das partes, não consubstanciará uma nulidade processual, por omissão de ato processual, nos termos do artigo 195º nº 3 do CPC novo, ex vi do artigo 1º do CPTA. 1.3.17 A circunstância de o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA revisto consubstanciar um incidente do processo de contencioso pré-contratual, atentos os termos como o mesmo se mostra ali configurado, conduzir a que lhe sejam supletivamente aplicáveis, nos termos do artigo 1º do CPTA, as normas para os incidentes da instância contidas nos artigos 292º ss. do CPC novo, implica também a sua sujeição ao disposto no artigo 293º nº 3 do CPC novo, nos termos do qual “…a falta de oposição no prazo legal determina, quanto à matéria do incidente, a produção do efeito cominatório que vigora na causa em que o incidente se insere”. O que nos remete para o atualmente disposto no artigo 83º nº 4 do CPTA revisto, nos termos do qual “…a falta de impugnação especificada nas ações relativas a atos administrativos e normas não importa a confissão dos factos articulados pelo autor, mas o tribunal aprecia livremente essa conduta para efeitos probatórios”. 1.3.18 Vale neste âmbito, portanto, a regra que já existia no âmbito da antiga ação administrativa especial. A tal respeito, já se entendeu, entre outros, no acórdão deste TCA Sul de 16-12-2015, Proc. 12693/15, in, www.dgsi.pt/jtcas, de que fomos relatores, que « (…)II – Nos termos do segmento inserto na última parte do nº 4 do artigo 83º do CPTA, na falta de contestação ou de impugnação especificada “o tribunal aprecia livremente essa conduta para efeitos probatórios”, o que só pode significar que por efeito daquela regra, válida para a ação administrativa especial e aqui aplicável, perante a falta de contestação fica a valer o princípio da livre apreciação da prova. III – Ficando a alegação factual, feita na petição inicial, sujeita ao princípio da livre apreciação da prova de acordo com o normativo contido no artigo 83º nº 4 do CPTA, o Tribunal haverá de ter em consideração o acervo probatório produzido no processo conjugado com o comportamento processual (silente) do réu.». 1.3.19 O que atualmente implica que no âmbito do incidente de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA revisto, perante a falta de resposta ao pedido de levantamento desse efeito suspensivo automático, a alegação factual feita no respetivo requerimento fica sujeita ao princípio da livre apreciação da prova, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 83º nº 4 do CPTA e artigo 293º nº 3 do CPC novo, pelo que o Tribunal haverá de ter em consideração o acervo probatório produzido no processo conjugado com o comportamento processual (silente) das contra-partes. 1.3.20 Tudo o que se viu e explanou supra tem relevância para a situação presente, em face das questões trazidas em recurso pela recorrente ré. Vejamos, pois, se há motivo que justifique a revogação da decisão recorrida, que indeferiu o pedido de levantamento do efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-a do CPTA revisto. 1.3.21 É verdade que o Mmº Juiz do Tribunal a quo descurou a circunstância de a proposta da autora na ação ter sido excluída do procedimento pré-contratual em causa e que tal decisão de exclusão não foi impugnada na ação, tendo a autora circunscrito os fundamentos da impugnação do ato de adjudicação à ilegal admissão da proposta da contra-interessada, única que, para além da sua, foi apresentada no procedimento, e que nele substitui. Ora, se a proposta da autora foi excluída do procedimento, e se no processo de contencioso pré-contratual não vem impugnada essa decisão de exclusão (como expressamente, ademais, é reconhecido a autora), não está propriamente em causa, na ponderação dos interesses a que aludem os nºs 2 e 4 do artigo 103º-A do CPTA revisto, assegurar à autora a possibilidade de lhe ver a ser a si adjudicado o contrato no âmbito do procedimento. Pelo que nesse aspeto, como bem invoca a recorrente, incorreu o Tribunal a quo em erro de apreciação. 1.3.22 Como também tem que reconhecer-se ter o Tribunal a quo incorrido em erro de apreciação ao circunscrever a perduração dos invocados efeitos nefastos para o interesse público com a manutenção do efeito suspensivo automático apenas até ao momento da prolação da sentença em 1ª instância. É que o efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA revisto manter-se-á (se o mesmo não for levantado por decisão judicial) enquanto se mantiver pendente a ação de contencioso pré-contratual na qual é impugnado o ato de adjudicação. Ora, cabendo da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, no âmbito do processo de contencioso pré-contratual, recurso de apelação para o Tribunal Central Administrativo competente (posto que cumpridos, em concreto, os respetivos requisitos de recorribilidade), e tendo tal recurso efeito suspensivo, nos termos do disposto no artigo 143º nº 1 do CPTA revisto, mesmo que a sentença negue procedência ao pedido impugnatório do ato de adjudicação, mantendo-o, só com o trânsito em julgado dessa sentença cessará o efeito suspensivo automático previsto no artigo 103º-A do CPTA revisto, e não no momento da prolação daquela sentença. A que acresce ainda a possibilidade de vir a ser interposto recurso de revista, o qual igualmente tem efeito suspensivo (cfr. artigos 150º e 143º nº 1 do CPTA revisto). 1.3.23 Deve, ao invés, ter-se presente, a circunstância de, no caso, o procedimento pré-contratual se destinar à aquisição de uma lancha de pilotos cujo respetivo prazo máximo de fornecimento é de 300 (trezentos) dias (a contar da data de assinatura do contrato), que foi efetivamente o prazo contratual a que se submeteu a contra-interessada adjudicatária através da sua proposta. Isto, porque a lancha a adquirir dever ser ainda construída pela adjudicatária. Sendo o contrato a celebrar o de fornecimento de uma lancha de pilotos sujeito ao prazo máximo de fornecimento de 300 dias contados da sua celebração, por a lancha a fornecer dever ser ainda construída pela adjudicatária, o levantamento do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação, previsto no artigo 103º-A do CPTA revisto, não implicará a sua imediata aquisição (fornecimento), já que essa só se verificará após o hiato temporal necessário à construção. E se assim é, só nessa ocasião ocorrerá a sua afetação à satisfação do interesse público a que se destina. 1.3.24 Razão pela qual o levantamento do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação, previsto no artigo 103º-A do CPTA revisto, não implicará, no caso, a imediata aquisição (fornecimento) da lancha de pilotos, já que essa só se verificará após o hiato temporal necessário à sua construção, num máximo de 300 dias contados data da assinatura do contrato. Mas permitirá a celebração do contrato. E com ele a construção da lancha, que haverá de estar concluída até 300 dias após a assinatura do contrato. 1.3.25 Acresce que a manutenção do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação até que seja decidido (com trânsito em julgado) o pedido impugatório, obsta à celebração e execução do contrato até que a ação seja definitivamente decidida. O que acarretará, no caso de a ação vir a ser julgada improcedente, um retardamento na celebração e execução do contrato, fazendo acrescer mais uma dilação temporal (a da perduração do processo judicial), por natureza de duração incerta, ao referido prazo de fornecimento de 300 dias. Lançando, por conseguinte, para um momento futuro ainda mais longínquo (e incerto), a aquisição pela entidade adjudicante da pretendida lancha de pilotos. 1.3.25 Como se viu supra, a interpretação consentida pela concatenação dos nºs 2 e 4 do artigo 103º-A do CPTA é a de que o levantamento do efeito suspensivo automático (previsto no nº 1) está sujeito um duplo grau de exigência, na medida em que só deve ser levantado quando resulte que o diferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos (nº 2) quando na ponderação com os danos que podem resultar do seu levantamento aqueles se mostrem superiores (nº 4). O levantamento do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação só é, pois, permitido, quando se constate (sob alegação da entidade adjudicante ou dos contra-interessados) que o diferimento da execução do ato de adjudicação é não tão somente prejudicial para o interesse público (que sempre será), mas gravemente prejudicial, o que naturalmente exige uma qualificação (agravada) desse prejuízo, no sentido de sério, intenso ou elevado. O mesmo com as consequências lesivas para os outros interesses envolvidos, que a lei exige deverem ser claramente desproporcionadas. Pelo que só nesse caso deve a imposição ope legis do efeito suspensivo ceder, determinando o Tribunal o seu levantamento – (vide, neste sentido, o acórdão deste TCA Sul de 04-10-2017, Proc. 1329/16.1BELSB, in, www.dgsi.pt/jtcas, de que fomos relatores). 1.3.26 Não basta, pois, o mero atraso na celebração do contrato ou na sua execução, para justificar o levantamento do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação, o qual só deve ser decidido em circunstâncias particularmente exigentes. E é da ponderação dessas circunstâncias, do sopesar das consequências lesivas para os diversos interesses envolvidos, que haverá de decidir-se pelo levantamento do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação se for de concluir pela desproporcionalidade da sua manutenção. 1.3.27 Na situação presente resulta em face da matéria levada ao probatório na decisão recorrida, que a entidade demandada, que é uma empresa pública que tem por objeto, entre outros, assegurar o exercício de competências necessárias ao regular funcionamento do porto do Douro, Leixões e Viana do Castelo, cabendo-lhe o exercício de competências e prerrogativas de autoridade portuária que lhe estejam acometidas, incluindo em matéria de segurança marítima e portuária na sua área de jurisdição, dispõe de três lanchas de pilotos (identificadas sob os nomes «EIRA», a «PERLONGAS» e a «GILRÉU»), tendo determinado a abertura de concurso público para celebração de um Contrato de Aquisição de mais uma Lancha de Pilotos, cujo anúncio foi publicado em 09-09-2016. Resulta também da matéria levada ao probatório da decisão recorrida que as identificadas lanchas de pilotos, detidas atualmente pela entidade demandada, têm as seguintes características e funcionalidades essenciais: - a lancha «EIRA»: 15,6 metros, all weather, trabalhando em qualquer condição climática até ao limite das condições de embarque do piloto, construída em 2002 sendo a mais utilizada; - a lancha «PERLONGAS»: casco planante que apenas permite uma navegação com boas condições tempo e mar, com um motor que não ultrapassa as 2500 rpm e já com 18anos, não podendo funcionar em mar aberto; - a lancha «GILRÉU»: 12 metros de comprimento e 7 anos, sem ter características all weather e com problemas mecânicos e ao nível do motor, impedindo-a frequentemente de estar operacional. 1.3.28 A necessidade da entidade demandada reforçar a sua frota de lanchas de pilotos, renovando-a, através da aquisição de uma nova lancha de pilotos, a ser construída de raiz, para levar a cabo as suas atribuições, conduziu-a a lançar o procedimento concursal aqui em causa. E é esse o interesse público que está presente. 1.3.29 Ora, é de configurar que o retardamento da celebração e execução do contrato de aquisição de uma lancha de pilotos faz, efetivamente, perigar, de modo gravoso, a prossecução do interesse público levado a cabo pela entidade adjudicante, que tem a seu cargo a segurança marítima e portuária nas áreas sob a sua jurisdição, se foi quer a escassez de lanchas de piloto com as características da pretendida, quer a penúria das que possui, que justificou essa nova aquisição. Isto conjugado com a circunstância, já supra vista, de que a manutenção do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação até que seja decidido (com trânsito em julgado) o pedido impugnatório (obstando à celebração e execução do contrato até que a ação seja definitivamente decidida), acarretará, no caso de a ação vir a ser julgada improcedente, um retardamento na celebração e execução do contrato, fazendo acrescer mais uma dilação temporal (a da perduração do processo judicial), por natureza de duração incerta, ao prazo de fornecimento da lancha, que é de 300 dias; lançando, por conseguinte, para um momento futuro ainda mais longínquo (e incerto), a aquisição pela entidade adjudicante da pretendida lancha de pilotos. E só nessa ocasião ocorrerá a afetação da lancha a adquirir à satisfação do interesse público a que se destina. 1.3.30 De outra parte, na situação presente, não pode a autora vir a ser a adjudicatária no procedimento, como se viu, por a sua proposta ter sido excluída sem que ponha em causa esse ato de exclusão, com o qual se conformou. Sendo que simultaneamente não existe qualquer outro interessado no procedimento, já que a ele se apresentaram apenas a autora e a contra-interessada adjudicatária. 1.3.31 Pelo que a ponderação dos interesses em presença conduz, efetivamente, a que sobrepesem os interesses do lado do interesse público a cuja satisfação se destina a celebração e execução do contrato prosseguido. Justificando-se, em face destes elementos, que no caso devesse ter sido levantado o efeito suspensivo automático do ato de adjudicação, à luz do disposto nos nºs 2 e 4 do artigo 103º-A do CPTA revisto. 1.3.32 Ao ter decidido diferentemente, incorreu, pois, o Tribunal a quo em erro de julgamento. Razão pela qual deve ser revogada a decisão recorrida, e substituída por outra que levante o efeito suspensivo automático do ato de adjudicação. 1.3.33 Decisão que se toma, agora, como se disse, com base no circunstancialismo referido, sem necessidade de modificar ou recompor o probatório constante da decisão recorrida, mormente nos termos e aspetos propugnados pela recorrente no seu recurso, por desnecessário e inútil para o desfecho da solução, favorável à recorrente. O que concomitantemente implica que também não se reconduza o presente incidente para a realização das diligências de produção de prova requeridas pela recorrente, por igualmente desnecessárias inúteis. Sendo certo que, relembre-se, perante a alegação circunstanciada feita pela entidade demandada no seu requerimento, com vista a sustentar o levantamento do efeito suspensivo automático do ato de adjudicação, a autora silenciou, não tendo apresentado resposta. Não estando, assim, em discussão, nem sendo objeto de controvérsia, quaisquer factos que a ela pudessem respeitar e de que pudesse beneficiar, nem simultaneamente a produção de qualquer prova, que esta não solicitou. 1.3.34 Deve pois, pelos fundamentos expostos, ser revogada a decisão recorrida, e substituída por outra que levante o efeito suspensivo automático do ato de adjudicação. O que se decide. * 2. Do recurso interposto pela autora ENP - ESTALEIROS NAVAIS DE PENICHE, SA da sentença de 23-06-2017 (fls. 170 ss.) que julgou a ação improcedente 2.1 Da decisão recorrida Por sentença (saneador-sentença) de 23-06-2017 (fls. 170 ss.) o Mmº Juiz do Tribunal a quo julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo os demandados do pedido. Decisão que assentando na matéria de facto nela dada como provada, que não vem impugnada no presente recurso, assentou na seguinte fundamentação, que se passa a transcrever: «I. Nos presentes autos a autora pretende por em causa o ato impugnado, mas apenas no segmento em que não excluiu a proposta da contrainteressada. Não está aqui em causa, portanto, qualquer dissensão quanto à exclusão da própria proposta da autora, posto que a demandante com ela se conformou. Sobre esse segmento não nos pronunciaremos, por conseguinte. Isso mesmo se deixa desde já estabelecido. II. Segundo a autora, a entidade demandada laborou em erro ao considerar que os documentos que instruíram a proposta da contrainteressada preenchiam as condições técnicas estabelecidas nas peças do procedimento. O argumentário da autora neste ponto pode reconduzir-se a três asserções essenciais. Desde logo, a demandante sustenta que a proposta da contrainteressada era composta também por brochuras técnicas, das quais resultavam desconformidades com o que era exigido no procedimento. Por esse motivo, ao não considerar tais brochuras, o júri do procedimento não apurou, como lhe competia fazer, a violação da solução proposta por aquela concorrente de condições técnicas estabelecidas nas peças do procedimento. Errou o júri, pois, ao não apreciar tais brochuras. Mas também errou se, ao invés, as considerou, porque vinham redigidas em língua inglesa, violando o programa do procedimento que exigia que os documentos obrigatórios da proposta viessem redigidos em língua portuguesa. III. De acordo com o artigo 56.º do Código dos Contratos Públicos, proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo. Seguindo aqui de perto os ensinamentos da doutrina da especialidade (ESTEVES DE OLIVEIRA & ESTEVES DE OLIVEIRA, 2016: 570), a própria noção legal demonstra que não se trata aqui de uma declaração unitária, mas sim de um complexo de declarações heterogéneas respondendo às diversas solicitações ou exigências postas pela lei ou pela entidade adjudicante quanto a aspetos e questões consideradas procedimentalmente relevantes para aferir das vantagens que cada proposta lhe trará, se o contrato for celebrado com base nela. «A proposta corresponde portanto a um processo documental em que, além da pretensão (“modelada”) de celebrar o contrato objeto do procedimento e da aceitação do conteúdo do caderno de encargos, o concorrente há de incluir, basicamente, os documentos — qualquer que seja a sua forma (escrita, desenhada, maquetas, etc.) — nos quais exprime os atributos e características das prestações que se propõe realizar e (ou) receber, em função do objeto do contrato e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, bem como, se for o caso, os termos e condições relativos a aspetos desses, mas subtraídos à concorrência. [Nessa perspetiva,] na linguagem corrente, mesmo na técnica, nada obsta a que se utilize o conceito proposta ligando-o a qualquer um dos seus atributos — falar-se-á então em proposta de preço, proposta de prazo, etc. —, mas no Código o conceito proposta vem uniformemente reportado ao processo documental em que os interessados manifestam a sua pretensão à adjudicação do contrato e aos termos em que se dispõem a celebrá-lo» (idem, ibidem). IV. Sem embargo do que se deixou estabelecido, importa ter bem presente que a lei utiliza padrões de rigor distintos quanto aos diversos elementos da proposta, sendo preclusiva quanto à omissão de alguns, e omissa na cominação quanto a outros. Esclareçamos esta asserção. V. De acordo com o artigo 57.º, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos, na proposta há de conter-se obrigatoriamente: i) uma declaração de aceitação (ou de adesão) ao Caderno de Encargos; ii) a definição dos atributos da proposta, ou seja, dos seus elementos ou características respeitantes a todos os (e só aos) aspetos da execução do contrato submetidos pelo Caderno de Encargos à concorrência (ou, dito de outro modo, a definição das concretas prestações que o concorrente se propõe fazer à entidade adjudicante, ou dela pretende fazer para obter o contrato, e das circunstâncias concretas da respetiva realização); iii) declarações exigidas pelo programa do procedimento quanto aos termos e condições de execução do contrato em aspetos não submetidos à concorrência, aos quais o concorrente deve vincular-se. Quanto a estas, a ausência de qualquer das aludidas menções é fundamento de exclusão da proposta [cf. o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo70.º e da alínea d) do n.º 2 do artigo 146.º, ambos do Código dos Contratos Públicos]. VI. Por seu turno, de acordo já com o n.º 3 do mesmo artigo 57.ºdo Código dos Contratos Públicos, os concorrentes podem (trata-se, portanto, de uma faculdade de exercício discricionário ou potestativo, consoante a perspetiva, mas sem qualquer alcance preclusivo) incluir nas suas propostas quaisquer outros documentos avulsos ou específicos que contenham referências ou menções que considerem necessárias para complementar os atributos respetivos, quando a definição ou descrição básica dos mesmos precise de ser clarificada, completada ou comprovada através da apresentação desses documentos. VII. Como adverte a doutrina da especialidade, «[…] nada obsta também a que os concorrentes, se o entenderem conveniente, incluam na proposta declarações destinadas a clarificar o sentido e alcance dos atributos, especificações, condições e termos das mesmas, para facilitar a sua análise e compreensão pelo júri ou pelo órgão adjudicante, antecipando assim os esclarecimentos que, presumem, eles lhes possam vir a demandar ao abrigo do art. 72.º. [Mas, nesse caso, e em] boa verdade, porém, não se trata aí de elementos autónomos da proposta, como aqueles que se viram [no § antecedente desta sentença], mas apenas de definir mais completa ou claramente os respetivos atributos […]» (ESTEVES DE OLIVEIRA & ESTEVES DE OLIVEIRA, 2016: 582). VIII. Ainda a este respeito, é fundamental aqui discernir e distinguir «atributos» da proposta, que constituem elementos obrigatórios da mesma, nos termos estabelecidos adrede, dos demais «termos e condições», sejam procedimentais, sejam voluntários, que nem sempre se incluirão no conteúdo obrigatório da proposta. Eis o escopo das linhas que se seguem. IX. São atributos das propostas as prestações ou tarefas concretamente definidas (pela sua espécie, qualidade e quantidades e por quaisquer outros elementos ou características) que, em relação aos aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência pelo Caderno de Encargos (artigo 56.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos) e aí valorizados como fatores de avaliação das propostas (artigo 75.º, n.º 1, do mesmo diploma), os concorrentes se propõem fazer à entidade adjudicante e/ou obter dela em troca da celebração do contrato. «Os atributos configuram por isso, na expressão mais elementar ou simples do conceito, a proposta propriamente dita apresentada pelo concorrente, aquilo que a singulariza das demais e que traduz o modo concreto como determinado concorrente respondeu ao apelo da entidade adjudicante: só há portanto atributo aí onde haja um aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos. [Sendo certo que e]sse aspeto da execução (vg., preço, prazo, etc.) pode ser totalmente deixado à concorrência, caso em que os concorrentes, salvo limitação legal, dispõem de liberdade plena na conformação do respetivo atributo, ou pode haver limites mínimos e/ou máximos que recebem na lei o nome de parâmetros base (artigo 42.º, n.os 2 e 3) —, caso em que a proposta, o seu atributo, se deve situar dentro dos limites apontado […]. Como quer que seja, para a lei, só há atributo quando esteja em causa um qualquer aspeto (minimamente relevante) da execução do contrato sobre o qual a concorrência é chamada a oferecer a sua prestação, a sua proposta propriamente dita. X. » Por outro lado, justamente por tais aspetos serem deixados à concorrência, a lei exige que eles encontrem um reflexo nos fatores ou subfactores do critério da proposta economicamente mais vantajosa. E se assim é, isso significa que são os atributos, todos eles e só eles, que valorizam ou desvalorizam as propostas em sede da sua avaliação, ordenação e adjudicação — salvo, claro, no caso de, por razões que se prendem com deficiências da respetiva formulação ou características, eles darem lugar à exclusão da própria proposta, em virtude do disposto nas alíneas a), b) e c) do art. 70.º/1» (idem, ibidem: 584 — sublinhados nossos). XI. Ao invés, os termos e condições «procedimentais» das propostas correspondem a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos. Será esse o caso, recorrendo novamente aos ensinamentos da doutrina, do prazo de execução do contrato, quando ele seja estabelecido apenas em termos máximos. Nesse tipo de situações, «[…] pode a entidade adjudicante considerar que é adjudicatoriamente irrelevante que ele seja prestado em 15 dias, num mês ou em dois, desde que não ultrapasse dos meses. Pode ela, neste caso, pura e simplesmente fixar o prazo da prestação de serviço em dois meses, mas também pode estabelecer que esse prazo é no máximo de dois meses; o concreto prazo que venha a ser proposto pelos concorrentes configurará então um termo ou condição, que releva para efeitos de conformidade ou regularidade da proposta — pois que serão excluídas todas as que apresentem um prazo superior a este [m]as já não releva —por aqui se distinguindo dos atributos — para efeitos da respetiva avaliação e adjudicação, na medida em que a oferta de um prazo mais curto do que o de dois meses é adjudicatoriamente inócua ou irrelevante, não havendo melhor pontuação da proposta por causa disso. || Note-se que o facto de não se tratar de um aspeto submetido à concorrência não dispensa os concorrentes de proporem um prazo para o efeito, apenas significa que, seja qual for o prazo que apresentem (desde que não superior a dois meses), ele não será, não poderá ser, avaliado pela entidade adjudicante com vista à formulação do seu juízo adjudicatório.» (idem, ibidem: 587 e 588). XII. Esclareça-se que os termos e condições «voluntários» distinguem-se, quer dos atributos das propostas, quer dos termos e condições «procedimentais». Os termos e condições «voluntários» estão previstos no artigo 96.º, n.º 4, do Código dos Contratos Públicos, reportando-se a aspetos da execução do contrato não regulados pelo caderno de encargos, enquanto que os «procedimentais», como vimos, versam efetivamente sobre aspetos previstos nas peças do procedimento, embora não submetidos à concorrência. XIII. Por último, cumpre aqui deixar estabelecido, neste enquadramento dogmático e normativo, que os documentos das propostas deverão ser redigidos em língua portuguesa, nos termos do estabelecido no n.º 1 do artigo 58.º do Código dos Contratos Públicos. Se assim não for, a proposta deverá ser objeto de exclusão, nos termos do disposto no artigo 146.º, n.º 2, alínea e), do mesmo diploma. XIV. No entanto, e isso é que importa reter, não só esta regra de redação de documentos em língua portuguesa admite exceções, como a exclusão não é a solução que inexoravelmente se haja de postular em caso de inobservância daquela regra, não sendo, de resto, aplicável quanto a alguns dos documentos que integram a proposta. XV. Na verdade, o próprio artigo 58.º do Código dos Contratos Públicos admite exceções à regra, permitindo a utilização de língua estrangeira nos documentos da proposta, nomeadamente nas situações previstas nos seus números 2 a 4. Deixemos aqui de lado a situação prevista no n.º 4, que aqui não interessa apurar, e centremo-nos nas restantes. São assim, para os efeitos que interessam à economia da presente decisão, admissíveis documentos em língua estrangeira nas seguintes situações: i) quando, por causa da especificidade técnica das prestações a realizar, o convite ou o programa do procedimento admitam que alguns dos documentos com atributos das propostas (ou suas condições e termos) sejam redigidos em certa língua estrangeira (artigo 58.º, n.º 2); e ii) quando os concorrentes apresentem juntamente com a proposta, ao abrigo do disposto no artigo 57.º, n.º 3, do código, documentos de apresentação facultativa para melhor sustentar os atributos da mesma, salvo se o programa do procedimento obrigar ao uso da língua portuguesa (artigo 58.º, n.º 3). XVI. «Sendo assim, é causa única de exclusão de propostas, por razões respeitantes ao idioma em que vêm formulados, o facto de qualquer dos seus documentos obrigatórios (ou parte essencial dos mesmos) estarem redigidos numa língua estrangeira […] não prevista no […] programa do procedimento — como resulta da segunda parte da alínea e) do art. 146.º/2 do Código. [Na certeza, porém, de que] essa remissão expressa do art. 146.º apenas para os n.os 1 e 2 (e agora também para o n.º 4) do art. 58.º significa que já não são excluídas as propostas quando os documentos nela facultativamente incluídos (ao abrigo do art. 57.º/3) venham redigidos numa língua estrangeira — como em regra poderiam vir —, mesmo que a utilização dela tenha sido vedada pelo programa do procedimento. [Em bom rigor, n]esse caso, tais documentos têm-se por não escritos ou, melhor, por não apresentados, sem que isso se reflita contudo na admissão da proposta» (ESTEVES DE OLIVEIRA & ESTEVES DE OLIVEIRA, 2016: 594 e 595). XVII. Cientes deste enquadramento, volvamos o nosso olhar para o caso dos autos. XVIII. O programa de procedimento a que se reportam os autos estabelecia, no seu ponto 7., a obrigatoriedade de apresentação de alguns documentos com redação em língua portuguesa, enunciando-se nos seus n.os 1 e 2: declaração de aceitação do conteúdo das condições técnicas; documentos com os atributos das propostas (nota justificativa do preço e memória justificativa e descritiva). E só destes [cf. ponto 1.3) do probatório]. XIX. Mais previa o mesmo ponto do programa, agora no seu n.º 3, a admissibilidade de apresentação de «[…] quaisquer outros documentos que o concorrente apresent[ass]e por os considerar indispensáveis para os efeitos […]» de atestar os atributos da proposta, mas aí sem qualquer cominação para a língua. XX. A contrainteressada instruiu a sua proposta, além do mais, com: i) uma carta de apresentação, na qual referia que «[o]s documentos da [pro]posta [eram] em língua portuguesa, em conformidade com o Programa de Procedimento Alínea 7 [e que a]lguns documentos como, por exemplo, catálogos e brochuras técnicas, que não faz[ia]m parte integrante da [pro]posta ser[iam] apresentados em inglês, de acordo com CCP Artigo 58.º»; ii) proposta de preço, discriminativo, em português; iii) memória justificativa e discriminativa, igualmente em português; iv) brochuras técnicas, em inglês. Tudo nos termos da matéria levada ao probatório nos pontos 1.5) a 1.8) — com sublinhados nossos. XXI. Aqui chegados, estamos já em condições de concluir serem improcedentes as alegações da autora. XXII. Por um lado, não assiste razão à demandante quando alega que a entidade demandada não deveria ter atendido aos documentos em língua inglesa apresentados pela contrainteressada: não só o admitiam os artigos 57.º, n.º 3, e 58.º, n.º 3, ambos do Código dos Contratos Públicos, como vimos, como o próprio programa do procedimento não vedava, em absoluto, a apresentação de outros documentos redigidos em língua que não a portuguesa, fora dos casos previstos nos n.os 1 e 2 do ponto 7. E foi isso precisamente que a contrainteressada observou: apresentou em língua portuguesa a declaração de aceitação do conteúdo das condições técnicas, bem como os documentos com os atributos das propostas (nota justificativa do preço e memória justificativa e descritiva), limitando-se a juntar em língua inglesa documentos avulsos ou específicos que continham referências ou menções que considerou conveniente juntar, apenas para complementar os atributos respetivos, por entender que a definição ou descrição básica dos mesmos poderia necessitar de ser clarificada, completada ou comprovada através da apresentação desses documentos. Tudo ao abrigo, repete-se, do disposto nos artigos 57.º, n.º 3, e 58.º, n.º 3, ambos do Código dos Contratos Públicos e do ponto 7.3. do programa do procedimento. XXIII. Por outro lado, também não assiste razão à autora quando sustenta que o júri do procedimento deveria tomar em linha de consideração, para efeitos de avaliação e exclusão, os aludidos documentos redigidos em língua inglesa constantes da proposta da contrainteressada. Como vimos, só os documentos com os atributos da proposta propriamente dito é que têm (recte: podem) ser objeto de avaliação pelo júri. Os demais, ainda que possam ser lidos e até apreciados para enquadrar holisticamente a proposta do concorrente (se não, nem sequer seria admissível a sua junção, sendo que o artigos 57.º e 58.º do Código dos Contratos Públicos o permitem, como vimos), não podem ser avaliados, no sentido de os confrontar com as cláusulas técnicas e os parâmetros base e fatores de classificação e ponderação da proposta. De resto, foi isso mesmo que sucedeu: o júri apenas avaliou os documentos contendo os atributos da proposta; já os demais ficheiros com catálogos e brochuras em língua inglesa, juntos a título meramente complementar e facultativo, ainda que possam ter sido apreciados, não foram objeto de avaliação. XXIV. De facto, o que se verifica no caso dos autos foi que o júri do procedimento atendeu, para efeitos de avaliação da proposta da contrainteressada e da aferição da sua conformidade com as peças do procedimento, à memória descritiva e justificativa apresentada por aquela concorrente — e só a esse documento. É nessa memória descritiva, reproduzida em 1.7) do probatório, que constam inequívocas declarações da contrainteressada pelas quais aquela concorrente asseverava que iria fornecer o bem, ou conforme solicitado, ou até excedendo o solicitado, explicitando, de resto, como e em que medida é que lograria tal desiderato. XXV. Nem se diga, como pretende a autora, que a contrainteressada remetia expressamente para as brochuras, integrando-a na sua proposta em termos tais que as caracterizava como definindo atributos da sua proposta. Da dinâmica factual apurada não resulta que a contrainteressada tenha feito depender o conteúdo da memória descritiva do catálogo apresentado. Ao invés, como já tivemos oportunidade de deixar estabelecido, tais documentos, enquanto elementos integrantes da proposta, eram necessariamente redigidos em língua portuguesa: os demais (catálogos e brochuras técnicas), como esclarecia a contrainteressada na «carta de apresentação» reproduzida em 1.6) do probatório, «[…] não faz[ia]m parte integrante da [pro]posta […]». XXVI. Em concreto, não assiste razão à autora quando alega especificamente que o júri terá atendido ao que resultava do anexo f) da proposta da contrainteressada (brochuras e catálogos) para avaliar a questão dos lift points. A este respeito, sustenta a demandante que a contrainteressada não apresentou a existência, o tipo e muito menos a localização dos lift points na lancha proposta, nem na memória descritiva e modo de execução, nem no desenho de arranjo geral. Logo, aduz a autora, o juízo do júri apenas se pode ter baseado naquele anexo f). XXVII. Porém, a dinâmica factual apurada pelo tribunal infirma essa alegação da demandante. Constava do ponto 2.2. das Condições Técnicas do Caderno de Encargos que deveriam existir quatro bases de olhal, lift points, que deveriam ser embebidos no convés e com tampa a mesmo nível de forma a não interferir com a zona de trabalho. Ou seja, vislumbra-se aqui uma preocupação no sentido de que os pontos que vão permitir pegar na lancha para a colocar em terra não possam estar acima do nível do solo, sob pena de se criar uma situação de perigo para o piloto de barra que anda na lancha sob condições climatéricas adversas e com o piso molhado. XXVIII. Ora, a este respeito, a contrainteressada enunciou, logo na memória descritiva, que «[…] o casco ser[ia] construído em PRVF laminado com reforço adicional em áreas de contacto com outras embarcações ou cais. A superestrutura ser[ia] construída no mesmo molde do convés e ser[ia] uma peça única […]» [cf. ponto 1.7) do probatório]. XXIX. Ademais, após pedido de esclarecimentos do júri do procedimento, a contrainteressada esclareceu o seguinte: «As Bases de Olhal são construídas em aço inox e serão instaladas 2 (dois) a cada bordo fazendo parte da estrutura do casco, centrados com o centro de gravidade da lancha e deverão ser embebidos no convés e com tampa ao mesmo nível de forma a não interferir com a zona de trabalho. Estas Bases de Olhal são iguais às que foram instaladas nas lanchas da Figueira da Foz e Aveiro e também na lancha de classe “Barracuda”». E acrescentou o desenho do «arranjo geral» no qual evidenciava que os lift points estavam escondidos, ou seja, que não eram percetíveis ao nível do chão. De tudo isto deu conta o júri do procedimento no relatório final. Tudo nos termos da matéria levada ao probatório nos pontos 1.12) a 1.14) e 1.17). XXX. Idêntico juízo merece a alegação da autora de que a proposta da contrainteressada não respeita o prazo de garantia imposto pelo caderno de encargos relativamente à proteção catódica, e que, nessa medida, deveria ter sido excluída ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 2, alínea b), do Código dos Contratos Públicos. A autora suporta a sua pretensão no argumentário de que a contrainteressada emitiu, nas brochuras e catálogos juntos à sua proposta como anexo f), uma declaração negocial no sentido de garantir apenas um ano de vida útil e de garantia. Mas não é esse o julgamento do tribunal. XXXI. De facto, não sendo atribuída (nem pelo Código dos Contratos Públicos, nem pelo programa do procedimento, nem sequer pela própria concorrente e, sobretudo, nem pela entidade adjudicante) relevância procedimental àqueles documentos, no sentido de os caracterizar como documentos pelos quais se definiam atributos da proposta da contrainteressada, não se lhes pode atribuir a natureza de declaração negocial, nos termos enunciados pela autora. Tal declaração negocial quanto à colocação e garantia da proteção catódica apenas decorre, bem vistas as coisas, da própria memória descritiva apresentada pela contrainteressada. Daí que se tenha de atender ao que pela concorrente foi escrito na sua proposta, nomeadamente, ao que resulta do ponto 4.1. da memória justificativa e descritiva, no qual a concorrente apresentou proposta pela qual se propôs a fornecer o bem visado conforme solicitado, isto é, respeitando todas as condições impostas pelas peças do concurso. Ora, se se propôs fornecer o bem conforme solicitado no ponto 4.1. das cláusulas técnicas, é porque se comprometia a respeitar tudo o que estava naquele ponto 4.1., designadamente, a proteção contra a corrosão galvânica, por um período mínimo de dois anos. XXXII. Nem se diga que a contrainteressada, nessa sua «memória justificativa e descritiva», se limitou a apresentar o preço e a dizer que o restante seria conforme solicitado. Uma leitura integrada e integral permite-nos surpreender nesses documentos da proposta da contrainteressada um conjunto de declarações pelas quais aquela concorrente enunciava e identificava expressamente os aspetos que havia a desenvolver e a inovar. No caso concreto, a contrainteressada assumia o fornecimento da lancha conforme solicitado e que, em alguns casos, até colocaria acabamentos superiores aos solicitados. XXXIII. Face ao exposto, improcede a pretensão da autora neste ponto. * XXXIV. Mais alega a autora que a admissão da proposta da contrainteressada viola o princípio da intangibilidade das propostas. XXXV. Já o sabemos: o princípio da intangibilidade das propostas (imutabilidade ou indisponibilidade) é um princípio fundamental da contratação pública, instrumental da concorrência, imparcialidade e transparência, e postula que, com a entrega da proposta (e com o termo do prazo para a sua apresentação), o concorrente já não pode alterá-la, ficando assim vinculado àquilo a que aí se comprometeu e, em caso de adjudicação, a celebrar o contrato concorrido em conformidade com ela. XXXVI. Em observância a esta exigência, o órgão de cúpula desta jurisdição já teve oportunidade para deixar estabelecido que não é permitido alterar a proposta, nomeadamente integrar, modificar, reduzir ou aumentar os atributos nela inicialmente apresentados, seja para a tornar conforme aos parâmetros vinculativos constantes das peças do procedimento (cf. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido a 08.09.2004 no processo n.º 890/04), seja para colmatar omissões suas, sendo então irrelevante que a alteração resulte da iniciativa dos próprios interessados ou até do júri do procedimento ou da entidade adjudicante (cf. acórdãos do mesmo tribunal de 19.05.2004 e de 03.06.2004, proferidos respetivamente nos processos 416/04 e 483/04). XXXVII. O Código dos Contratos Públicos consagra esta ideia de intangibilidade, embora se denote uma preocupação em «[…] atenu[ar] de maneira significativa os excessos com que — sem qualquer vantagem para a proteção dos interesses relevantes, diga-se — parte da doutrina e da jurisprudência aplicava a este princípio […]» (ESTEVES DE OLIVEIRA & ESTEVES DE OLIVEIRA, 2016: 203). É nomeadamente o caso do artigo 72.º do Código dos Contratos Públicos, no qual (só) se admitem os esclarecimentos das propostas por parte dos concorrentes, a solicitação do júri, desde que os mesmos «[…] não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprimir omissões […]» delas. XXXVIII. Na verdade, «[a]pós o termo do prazo para a sua apresentação, a proposta, além de não poder ser retirada (efeito de indisponibilidade) […] não pode ser alterada, tornando-se intangível (efeito de congelamento ou de petrificação). [Trata-se de uma decorrência] do princípio da concorrência, mas resulta também de forma muito clara do artigo 72.º do CCP, [pelo que o]s esclarecimentos prestados pelos concorrentes hão de limitar-se a uma mera função de explicação ou de aclaração de algo menos nítido ou claro, não podendo por isso servir para dizer coisa diferente do que estava expressamente assumido na proposta (colisão entre o esclarecimento e a proposta e respetivos documentos), nem para completar ou aperfeiçoar algum atributo seu, nem para integrar lacunas existentes nos atributos ou nos elementos da proposta (preço, prazo, produto, etc.), cuja omissão justificasse a sua exclusão» (ESTEVES DE OLIVEIRA, 2008: 77 e 78). XXXIX. Diferente destas situações é a da sanação de lapsos evidentes ou a retificação de erros manifestos (de cálculo, de escrita ou outros) da proposta. Quanto a estes, deve admitir-se a retificação, mesmo ex officio pelo próprio júri, ou então pelo concorrente, se instado pelo júri. No sentido da admissibilidade de correção deste tipo de lapsos depõem inúmeros argumentos, a saber: i) um argumento de índole normativa, considerando a consagração de um lugar paralelo, atento o teor do artigo 249.º do Código Civil português, segundo o qual se podem corrigir erros manifestos «[…] revelados no próprio contexto da declaração ou das circunstâncias em que ela é feita […]»; ii) um argumento de índole dogmática, atentos os contributos da doutrina da especialidade (ESTEVES DE OLIVEIRA & ESTEVES DE OLIVEIRA, 2016: 203); e iii) um argumento de índole exegética, por força de decisões jurisdicionais proferidas pelos tribunais superiores desta jurisdição sobre esta matéria, entretanto transitadas em julgado (v.gr.: acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 09.04.2003, processo n.º 48396, e do Tribunal Central Administrativo Norte, proferidos a 14.06.2007 e a 06.12.2013, proferidos respetivamente nos processos n.os 1657/07.1 e 02363/12.6BELSB (Porto), in http://www.dgsi.pt). XL. É a esta luz que devemos aqui perspetivar a atividade do júri do procedimento quando aprecia as propostas dos concorrentes: no seu labor de apreciação e de avaliação, «[…] as propostas são decompostas nos seus atributos, ou seja, nos seus elementos ou características respeitantes a aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência pelo Caderno de Encargos (artigo 56.º, n.º 2)» (REBELO DE SOUSA & SALGADO DE MATOS, 2009: 112). É, assim, nesta fase, que o júri aprecia e avalia as propostas: aprecia, porque verifica se as propostas reúnem as condições prévias, legais ou regulamentares, para poderem ser admitidas; caso não reúnam, devem ser excluídas, ao abrigo do disposto nos artigos 146.º, ex vi artigo 122.º, n.º 2, e 70.º, n.º 2, todos do Código dos Contratos Públicos; e avalia, porque aplica a cada uma das propostas o critério de adjudicação (idem, ibidem: 112 e 113). XLI. Mas se assim é, então nesta fase o júri do procedimento pode pedir aos concorrentes esclarecimentos sobre as propostas por si apresentadas (artigo 72.º do Código dos Contratos Públicos). Trata-se, não obstante, de uma faculdade de que dispõe o júri — não de um ónus. XLII. Pois bem, o que verificamos é que o júri do procedimento solicitou efetivamente esclarecimentos à contrainteressada. Fê-lo, aliás, em duas ocasiões distintas. XLIII. A primeira delas foi logo a 28.10.2016. Nessa situação, o júri limitou-se a alertar para uma possível verificação de lapso manifesto de escrita (motor US EPA Tier 3 e não Tier 2) — lapsus scribendi calamendique esse que viria a ser confirmado e corrigido pela contrainteressada a 31.10.2016 [cf. pontos 1.10) e 1.11) dos factos provados]. Tudo conforme a jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Norte constante do acórdão proferido a 06.12.2013 (processo n.º 02363/12.6BELSB(Porto), já citado e disponível para consulta em http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/967ddebf549e2bac80257c40003bc1e8?OpenDocument). XLIV. A segunda ocasião foi a 07.11.2016. Nessa segunda interpelação à contrainteressada, o júri solicitou pedidos de esclarecimentos relativos aos lift points (modelo e localização) e ao mastro rebatível a implantar sobre a ponto de comando. Tratava-se, em qualquer dos casos, como se depreende com mediana clareza das interpelações e da resposta da contrainteressada [cf. pontos 1.12) e 1.13) do probatório], de meros esclarecimentos, pelos quais não se visou a obtenção de declarações de uma concorrente que contrariassem os elementos constantes dos documentos que as constituíam, nem alterassem ou completassem os respetivos atributos, nem visassem suprimir omissões. XLV. Pelo contrário: nenhuma das soluções técnicas que a contrainteressada se propunha implementar a respeito dos pontos 2.2 e 2.8 das cláusulas técnicas (eram esses os pontos objeto do pedido de esclarecimento) foi alterada ou complementada após o pedido de esclarecimentos, pois era a que se previa. A resposta dada pela concorrente em nada contrariou — antes, pelo contrário, esclareceu — os elementos constantes da proposta que havia sido apresentada. Dito por outras palavras: os atributos da proposta não foram alterados, mas apenas explicados de forma mais efetiva e esclarecedora pela concorrente. E é essa precisamente a intenção do legislador ao consagrar a possibilidade de serem efetuados pedidos de esclarecimento. XLVI. A este respeito, importa convocar novamente a jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Norte constante do já citado acórdão proferido a 06.12.2013 (processo n.º 02363/12.6BELSB(Porto), integralmente disponível e acessível para consulta online in http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/967ddebf549e2bac80257c40003bc1e8?OpenDocument). Aí se deixou consignado, no respetivo sumário, o seguinte: VI. A ideia basilar ínsita no n.º 2 do art. 72.º do CCP é a de que os esclarecimentos são algo que se destina a aclarar, explicitar, clarificar algum elemento da proposta que está ou parece estar enunciado de modo pouco claro, ou de não ser apreensível, ou unívoco o sentido duma expressão, dum aspeto ou elemento da proposta, na certeza de que para a atendibilidade do esclarecimento que se prenda com a interpretação de elemento/aspeto da proposta importa que o mesmo tenha nesta ainda uma normal, uma razoável correspondência verbal sob pena de se poder por em causa a concorrência e igualdade dos concorrentes. VII. Tem-se como inadmissíveis esclarecimentos prestados pelos concorrentes que contrariem elementos constantes de documentos das propostas, que alterem ou completem estas nas respetivas caraterísticas/atributos ou que se destinem ou visem suprir omissões da proposta a que faltasse algum dos atributos submetidos à concorrência pelo caderno de encargos e que seriam conducentes à sua exclusão [arts. 70.º, n.ºs 1 e 2 e 72.º, n.º 2 ambos do CCP]. VIII. Não será possível admitir a formulação de pedido de esclarecimento quanto a proposta apresente graves defeitos que a tornem insuscetível de avaliação quanto a um determinado atributo da mesma já que tal se traduziria num esgotar da previsão da al. c) do n.º 2 do art. 70.º do CCP, sendo que o mesmo já não ocorrerá quando se trate de caso de mera dificuldade de leitura do atributo que esteja em causa. XLVII. Atenta a proficiência e o acerto hermenêutico patenteados naquela decisão e tendo em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito constituído (artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil português), nenhuns motivos se vislumbram para não aderir ao julgamento aí efetuado, cujos considerandos se julgam aplicáveis ao caso dos autos, mutatis mutandis — nomeadamente extraindo, a contrario sensu, a admissibilidade de esclarecimentos quando se trate apenas de suprir mera dificuldade de leitura do atributo da proposta. XLVIII. Logo, julgamos que o regime do artigo 72.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos não foi violado in casu, pelo que improcede também por aqui a pretensão da autora. * XLIX. Por último, alega a autora que o júri do procedimento tratou de forma injustificadamente desigual as propostas da demandante da contrainteressada, tendo «criticado, de forma lateral», a proposta da autora e «perdoado» tudo à proposta da outra concorrente. L. Desde já se diga, atalhando caminho, não lhe assistir qualquer razão também neste ponto. LI. Desde logo, não corresponde ao que se logrou apurar nos autos que o júri do procedimento se tenha bastado com uma «pronúncia lateral» ou residual acerca da proposta da autora. Pelo contrário: em sede de relatório final, o júri do procedimento afadigou-se em rebater, ponto por ponto, as alegações da autora vertidas no seu instrumento escrito de audiência prévia [cf. pontos 1.16) e 1.17) do probatório]. Foram naquele relatório final identificados pelo menos 6 pontos da proposta da autora que justificavam a sua exclusão, por inobservância estrita e expressa de cláusulas técnicas fixadas no procedimento. Não se tratou, portanto, de uma análise superficial da proposta da autora; foi, ao invés, uma análise aprofundada, ainda que plasmada num enunciado textual sintético. LII. Dito isto, assentimos que se verifica in casu a premissa apriorística de que parte a autora, quando alega que a memória descritiva da sua proposta era mais extensa do que a da contrainteressada. Com efeito, a memória descritiva apresentada pela autora é um vasto documento, composto por 25 páginas de texto corrido, com um “tamanho de letra” de “11”, seguindo todo o esquema organizacional das Condições Técnicas do caderno de encargos. Por seu turno, a memória justificativa e descritiva da contrainteressada consta de 9 páginas em tabelas, de uma forma esquemática [cf. pontos 1.9) e 1.7), respetivamente, dos factos provados]. LIII. Porém, sem que se possa negar pertinência a esta observação, nem por isso julgamos assistir razão à autora na asserção conclusiva que pretende extrair desta constatação: a de que a sua proposta é, só por esse facto, necessariamente mais completa do que a da outra concorrente. De facto, não é pela extensão da proposta que se afere a sua completude, idoneidade e aptidão; nem pode assumir uma relevância decisiva, à partida, a circunstância de uma proposta (memória justificativa e descritiva) ser composta por 25 páginas ou por 9 páginas, estar apresentada em fascículo de texto desenvolvido com capa, antecapa e índice, ou se apresentar, ao invés, num fascículo mais condensado em forma de quadro. O que releva é essencialmente (recte: exclusivamente) o conteúdo da proposta. De tal sorte que podemos asseverar que nem sempre o maior «fôlego» textual corresponde inelutavelmente a uma proposta completa; ou, noutra perspetiva, nem sempre uma proposta mais sintética e esquemática é necessariamente simplista e minimalista. Julgamos mesmo que o caso dos autos demonstra a falência dessa asserção que pretende fazer valer a autora. LIV. Neste conspecto, importa fazer notar e recordar que a proposta da autora foi excluída, sem que a demandante pretenda nos presentes autos pôr em causa essa exclusão, conformando-se com a correção do juízo efetuado pelo júri do procedimento. Isto é: a autora, ao reconhecer que foi bem excluída, anui (ou, no mínimo, conforma-se) com o juízo do júri do procedimento, ao julgar que a proposta da demandante, ou não explicou com pormenor o que se propunha executar, ou se limitou a reproduzir as cláusulas técnicas, sem assumir uma posição séria no sentido da sua conformidade com as mesmas, ou até violou expressamente algumas especificações técnicas que tinham sido impostas pelo caderno de encargos. Daí que a proposta da autora tivesse de ser excluída pelas seis razões apontadas no relatório final. LV. Ora, se aquela proposta tinha de ser excluída, não podia ser objeto de avaliação. Nada mais restava ao júri do procedimento, portanto, do que ver se a proposta da outra concorrente tinha de ser excluída. Concluindo que não existiam razões que impusessem a sua exclusão, nada obstava a que aquela proposta fosse analisada e avaliada. LVI. Pois bem, como esclarecem os tratadistas (CAETANO, 2013: 599 e passim; ESTEVES DE OLIVEIRA & ESTEVES DE OLIVEIRA, 2016: 577 e passim), no direito da contratação pública são válidas as exigências essenciais das propostas contratuais, nomeadamente a sua seriedade, firmeza e certeza. Uma proposta deve ser, desde logo, séria, ou seja, elaborada com o propósito de ser mantida e cumprida. Mas também deve ser firme, ou seja, formulada sem cláusulas restritivas, resolutivas ou excecionais, e nunca formulada em termos dubitativos ou hipotéticos. Por fim, a proposta deve ser certa, definindo de uma forma concreta e precisa os respetivos atributos, termos e condições daquilo que se oferece e pretende, sem alternativas ou declarações vagas ou indeterminadas. E o júri entendeu que a proposta da contrainteressada preenchia todos estes requisitos e exigências, cumprindo o conteúdo mínimo do caderno de encargos. LVII. Não havendo, contudo, mais propostas a concorrerem entre si e cumprindo a proposta da outra concorrente o conteúdo mínimo do caderno de encargos, a mesma foi aceite e indicada como a proposta escolhida. O que não quer dizer que o júri não tenha analisado em concreto e especificamente a proposta do concorrente S................. LVIII. Aqui chegados, constatamos ser improcedente a pretensão da autora também neste ponto, com o que soçobra in totum a presente ação. LIX. Tudo visto e sopesado, analisado o regime jurídico pertinente e apreciada a dinâmica factual apurada, julgamos improcedente, pelos motivos expostos supra, a pretensão impugnatória da autora, nada havendo a apontar ao ato impugnado no segmento em que não excluiu a proposta da contrainteressada.» ~ 2.2.1 No presente processo pré-contratual, instaurado com referência ao Concurso Público para «Aquisição de Uma Lancha de Pilotos» (procedimento n.º 5641/2016) lançado pela APDL - ASSOCIAÇÃO DOS PORTOS DO DOURO, LEIXÕES E VIANA DO CASTELO, SA, a autora, ora recorrente, impugnou o ato de adjudicação do contrato em causa à contrainteressada S................ M..........., LTD., pugnando que a proposta da adjudicatária devia ter sido excluída, pelos fundamentos que expressou ao longo da sua petição inicial, e que se podem assim, reconduzir: - por o documento anexo f) da proposta estar maioritariamente escrito em língua estrangeira, devendo-o estar em língua portuguesa - (vide artigos 13º a 26º da PI); - por não constar do procedimento que tenham sido solicitados e fornecidos quaisquer esclarecimentos da proposta da contra-interessada, com violação do artigo 72º nº 3 do CCP - (vide artigos 33º a 37º da PI); - por a omissão constante da proposta da contra-interessada relativamente aos denominados “lift points” não poder ser suprida através de esclarecimentos, como sucedeu, com violação do artigo 72º nº 2 do CCP e do princípio da intangibilidade das propostas - (vide artigos 38º a 44º da PI); - por a proposta da contra-interessada não observar o ponto 4.1 das Condições Técnicas do Caderno de Encargos no que respeita ao prazo mínimo de 2 anos de proteção contra a correção galvânica, com violação do artigo 70º nº 2 alínea b) do CCP - (vide artigos 45º a 60º da PI). 2.2.2 Na sentença recorrida o Mmº Juiz do Tribunal a quo explicitou ser o thema decidendum o de saber se a proposta da contra-interessada deveria ter sido objeto de ato de exclusão (vide ponto III.1 da sentença recorrida - pág. 5). Tendo concluído, a final, assim não ser, com o que julgou improcedente a pretensão impugnatória da autora (vide LIX da sentença recorrida - pág. 58). 2.2.3 Defende a recorrente, nos termos que expõe nas suas alegações de recurso e reconduz às respetivas conclusões, que ao contrário do entendido na sentença recorrida, a proposta da contrainteressada viola expressamente o disposto no caderno de encargos do procedimento pré-concursal e respetivas condições técnicas, designadamente, constantes do desenho de arranjo geral e catálogo do modelo da lancha proposto com as especificações técnicas completas (anexo f), integrados da proposta da contrainteressada, a saber o modelo “INTERCEPTOR 48 PILOT”; que a sentença desconsiderou a existência do referido documento (anexo f – especificações/catalogo do modelo “INTERCEPTOR 48 PILOT proposto pela contrainteressada), por se considerar que o mesmo era um “documento facultativo” ou “complementar”, não obrigatório, considerando-o como um documento previsto no n.º 3 do artigo 57.º do Código dos Contratos Públicos; que a contrainteressada apresentou o referido anexo como um documento integrador quer, do artigo 57.º, n.º 1, alínea b), quer do artigo 57.º, n.º 1, alínea c) do CCP – “documentos exigidos pelo programa do procedimento que contenham os termos ou condições, relativos a aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule.”; que foi a própria contrainteressada que expressamente faz depender a validade da sua proposta do conteúdo do seu anexo f), pois na sua memória descritiva e modo de execução remete expressamente para conteúdos e parágrafos das especificações técnicas completas em inglês, escrevendo e remetendo inequivocamente na sua memória descritiva “ver Anexo f9) paragrafo 1.4.”; “ver “Anexo f.9) parágrafo 6.3)”; “ver documento da Auto Sueco Portugal Anexo f6); “ver anexo f10 Artigo 5.3”; que sem aquele “anexo f)” a contrainteressada não teria apresentado de forma completa e, como tal, legal o documento exigido pelo parágrafo 7.2 da alínea b) do Programa do Procedimento, que a entidade exigia que os concorrentes se vinculassem, nos termos do artigo 57.º, n.º 1, alínea c) do CCP, sendo tal ilegalidade cominada com a exclusão da respetiva proposta, de acordo com o artigo 146.º, n.º 2, alínea d) do CCP; concluindo ter assim a sentença recorrida violado (tal como a entidade recorrida no seu relatório de analise de propostas), o disposto artigo 57.º, n.º 1, alínea c) e artigo 146.º, n.º 2, aliena d) do CCP, ao considerar que o documento “anexo f)” da contrainteressada era um mero documento facultativo e não obrigatório da proposta, ao abrigo do artigo 57.º, n.º 3 do CPP, não revelando para análise da sua conformidade com as disposições do caderno de encargos e suas especificações técnicas; que se ao invés, a entidade recorrida e o Tribunal a quo considerassem tal documento como integrante da memória descritiva apresentada pelo concorrente então imponha-se a sua análise material e sua conformidade com o caderno de encargos e condições técnicas postos a concurso, resultando que o mesmo violava expressamente condições técnicas do caderno de encargos expressamente exigiam no ponto 4.1 – Proteção catódica, designadamente apresenta um prazo de garantia inferior a dois anos; que a memória descritiva, no seu conjunto, apresentada pela contrainteressada contradiz flagrantemente as peças do concurso, violando quer a entidade recorrida, quer o Tribunal a quo o disposto nos artigos 70.º, n.º 2, alínea b), por remissão do artigo 146.º, n.º 2, alínea o) do CCP, ao admitir tal proposta; que a contrainteressada chegou mesmo, em sede de esclarecimentos, a substituir documentos obrigatórios – nomeadamente o desenho de arranjo geral que integra a memória descritiva e execução do contrato; que o desenho de arranjo geral original da proposta da contrainteressada podia e devia ter localizado os “lifts points”, tando mais que em sede de esclarecimento a contrainteressada expressamente substitui um documento da proposta por outro – novo desenho de arranjo geral onde afinal é possível localizar os lifts points no só no deck exterior, como no deck interior – novo anexo C; que ainda que os pedidos de esclarecimentos e os esclarecimentos prestados pela contrainteressada tivessem sido notificados à recorrente, os mesmos não poderiam ser legalmente admitidos, nos termos do artigo 72.º, n.º 2 do Código dos Contratos Públicos, pois aquele normativo não permite que os esclarecimentos “não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem [propostas], não alterem ou completem os respectivos atributos, visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º”; que o próprio júri ao fundamentar a exclusão da proposta da recorrente, com base em ligeiras divergências dos “lift point” entre o exigido no caderno de encargos e o proposto, demonstra inequivocamente que aquela omissão (absoluta) na proposta da adjudicatária, sendo motivo de exclusão da proposta, não podia ser suprimida em sede de esclarecimentos; que assim, ao aceitar como legais e válidos os esclarecimentos prestados pela contrainteressada e com isto substituir o desenho de arranjo geral, a douta sentença, à semelhança da entidade recorrida, violou o disposto no artigo 72.º, n.º 2 do Código dos Contratos Públicos – (vide conclusões A) a I) e L) a P) da alegações de recurso). Imputa, assim, nestes aspetos, à sentença recorrida, erros de julgamento, por errada interpretação e aplicação do direito. 2.2.4 Antecipe-se, desde já, que não lhe assiste razão, devendo ser mantido o julgamento de improcedência quanto às invocadas causas de invalidade feito na sentença recorrida. 2.2.5 Começando pela questão relativa ao uso da língua estrangeira (inglesa) no documento anexo f) da proposta da contra-interessada, atentemos no quadro normativo convocado. 2.2.6 Em conformidade com o artigo 11º nº 3 da CRP a única língua oficial de Portugal é o Português. Sendo também a adotada, nos termos do expressamente previsto no atual artigo 54º do CPA novo (aprovado pela Lei nº 42/2014, de 11 de julho), nos procedimentos administrativos sujeitos à regulamentação legal deste Código (cfr. artigo 2º) de acordo com o qual “…a língua do procedimento é a língua portuguesa”. No âmbito dos procedimentos pré-contratuais regulados pelo Código dos Contratos Públicos (aprovado pelo DL. nº 18/2008, de 29 de janeiro) dispõe o artigo 58º do CCP, o seguinte: “Artigo 58º 1 - Os documentos que constituem a proposta são obrigatoriamente redigidos em língua portuguesa. Idioma dos documentos da proposta 2 - Em função da especificidade técnica das prestações objeto do contrato a celebrar, o programa do procedimento ou o convite, podem admitir que alguns dos documentos referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo anterior sejam redigidos em língua estrangeira, indicando os idiomas admitidos. 3 - Os documentos referidos no n.º 3 do artigo anterior podem ser redigidos em língua estrangeira, salvo se o programa do procedimento dispuser diferentemente.” Neste contexto o artigo 146º nº 2 alínea e) do CCP estipula que devem ser excluídas as propostas “…que não cumpram (…) os nºs 1 e 2 do artigo 58º”. 2.2.7 Na situação presente na sentença recorrida entendeu-se o seguinte (vide págs. 48-50): «XVIII. O programa de procedimento a que se reportam os autos estabelecia, no seu ponto 7., a obrigatoriedade de apresentação de alguns documentos com redação em língua portuguesa, enunciando-se nos seus n.os 1 e 2: declaração de aceitação do conteúdo das condições técnicas; documentos com os atributos das propostas (nota justificativa do preço e memória justificativa e descritiva). E só destes [cf. ponto 1.3) do probatório]. XIX. Mais previa o mesmo ponto do programa, agora no seu n.º 3, a admissibilidade de apresentação de «[…] quaisquer outros documentos que o concorrente apresent[ass]e por os considerar indispensáveis para os efeitos […]» de atestar os atributos da proposta, mas aí sem qualquer cominação para a língua. XX. A contrainteressada instruiu a sua proposta, além do mais, com: i) uma carta de apresentação, na qual referia que «[o]s documentos da [pro]posta [eram] em língua portuguesa, em conformidade com o Programa de Procedimento Alínea 7 [e que a]lguns documentos como, por exemplo, catálogos e brochuras técnicas, que não faz[ia]m parte integrante da [pro]posta ser[iam] apresentados em inglês, de acordo com CCP Artigo 58.º»; ii) proposta de preço, discriminativo, em português; iii) memória justificativa e discriminativa, igualmente em português; iv) brochuras técnicas, em inglês. Tudo nos termos da matéria levada ao probatório nos pontos 1.5) a 1.8) — com sublinhados nossos. XXI. Aqui chegados, estamos já em condições de concluir serem improcedentes as alegações da autora. XXII. Por um lado, não assiste razão à demandante quando alega que a entidade demandada não deveria ter atendido aos documentos em língua inglesa apresentados pela contrainteressada: não só o admitiam os artigos 57.º, n.º 3, e 58.º, n.º 3, ambos do Código dos Contratos Públicos, como vimos, como o próprio programa do procedimento não vedava, em absoluto, a apresentação de outros documentos redigidos em língua que não a portuguesa, fora dos casos previstos nos n.os 1 e 2 do ponto 7. E foi isso precisamente que a contrainteressada observou: apresentou em língua portuguesa a declaração de aceitação do conteúdo das condições técnicas, bem como os documentos com os atributos das propostas (nota justificativa do preço e memória justificativa e descritiva), limitando-se a juntar em língua inglesa documentos avulsos ou específicos que continham referências ou menções que considerou conveniente juntar, apenas para complementar os atributos respetivos, por entender que a definição ou descrição básica dos mesmos poderia necessitar de ser clarificada, completada ou comprovada através da apresentação desses documentos. Tudo ao abrigo, repete-se, do disposto nos artigos 57.º, n.º 3, e 58.º, n.º 3, ambos do Código dos Contratos Públicos e do ponto 7.3. do programa do procedimento. XXIII. Por outro lado, também não assiste razão à autora quando sustenta que o júri do procedimento deveria tomar em linha de consideração, para efeitos de avaliação e exclusão, os aludidos documentos redigidos em língua inglesa constantes da proposta da contrainteressada. Como vimos, só os documentos com os atributos da proposta propriamente dito é que têm (recte: podem) ser objeto de avaliação pelo júri. Os demais, ainda que possam ser lidos e até apreciados para enquadrar holisticamente a proposta do concorrente (se não, nem sequer seria admissível a sua junção, sendo que o artigos 57.º e 58.º do Código dos Contratos Públicos o permitem, como vimos), não podem ser avaliados, no sentido de os confrontar com as cláusulas técnicas e os parâmetros base e fatores de classificação e ponderação da proposta. De resto, foi isso mesmo que sucedeu: o júri apenas avaliou os documentos contendo os atributos da proposta; já os demais ficheiros com catálogos e brochuras em língua inglesa, juntos a título meramente complementar e facultativo, ainda que possam ter sido apreciados, não foram objeto de avaliação. 2.2.7 Do nº 1 do artigo 58º nº 1 do CCP resulta, com efeito, a regra que a proposta e todos os documentos que a constituem e integram, devem estar redigidos numa única língua, que é a portuguesa. Não sendo, assim, admissível a proposta que esteja totalmente ou parcialmente escrita em língua estrangeira, a qual, em tal caso, deve ser excluída, por força do disposto artigo 146º nº 2 alínea e) do CCP. Mas tal regra comporta desvios. A tal respeito recuperemos o que se disse no recente acórdão deste TCA Sul de 09-11-2017, Proc. n.º 418/16.7BECTB, in, www.dgsi.pt/jtcas, de que fomos relatores: «3.2.4 Do nº 1 do artigo 58º nº 1 do CCP resulta a regra que a proposta e todos os documentos que a constituem e integram, devem estar redigidos numa única língua, que é a portuguesa. Não sendo, assim, admissível a proposta que esteja totalmente ou parcialmente escrita em língua estrangeira, a qual, em tal caso, deve ser excluída, por força do disposto artigo 146º nº 2 alínea e) do CCP. Regra que, todavia, comporta desvios. Os quais ocorrem quanto aos seguintes documentos, e nas seguintes situações: i) quanto aos documentos referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 57º do CCP, quando, em função da especificidade técnica das prestações objeto do contrato a celebrar, o programa do procedimento ou o convite, prevejam a possibilidade de algum desse documentos serem redigidos em determinada língua estrangeira - (cfr. nº 2 do artigo 58º do CCP); ii) quanto aos documentos referidos no n.º 3 do artigo 57º do CCP (i. é, os documentos de apresentação facultativa, que os concorrentes incluam nas suas propostas para melhor sustentar os atributos da proposta), desde que o programa do procedimento ou o convite não imponha o contrário – (cfr. nº 3 do artigo 58º do CCP).
O que mereceu da contra-interessada o seguinte esclarecimento (vide 1.13) do probatório):
~ 2.2.22 E também improcede o recurso quanto ao julgamento de improcedência feito na sentença recorrida quanto à invocada violação do artigo 70º nº 2 alínea b) do CCP por a proposta da contra-interessada não observar o ponto 4.1 das Condições Técnicas do Caderno de Encargos no que respeita ao prazo mínimo de 2 anos de proteção contra a correção galvânica. 2.2.23 A este respeito, foi expendido o seguinte na sentença recorrida (vide pág. 51 ss. da sentença): «XXX. Idêntico juízo merece a alegação da autora de que a proposta da contrainteressada não respeita o prazo de garantia imposto pelo caderno de encargos relativamente à proteção catódica, e que, nessa medida, deveria ter sido excluída ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 2, alínea b), do Código dos Contratos Públicos. A autora suporta a sua pretensão no argumentário de que a contrainteressada emitiu, nas brochuras e catálogos juntos à sua proposta como anexo f), uma declaração negocial no sentido de garantir apenas um ano de vida útil e de garantia. Mas não é esse o julgamento do tribunal. XXXI. De facto, não sendo atribuída (nem pelo Código dos Contratos Públicos, nem pelo programa do procedimento, nem sequer pela própria concorrente e, sobretudo, nem pela entidade adjudicante) relevância procedimental àqueles documentos, no sentido de os caracterizar como documentos pelos quais se definiam atributos da proposta da contrainteressada, não se lhes pode atribuir a natureza de declaração negocial, nos termos enunciados pela autora. Tal declaração negocial quanto à colocação e garantia da proteção catódica apenas decorre, bem vistas as coisas, da própria memória descritiva apresentada pela contrainteressada. Daí que se tenha de atender ao que pela concorrente foi escrito na sua proposta, nomeadamente, ao que resulta do ponto 4.1. da memória justificativa e descritiva, no qual a concorrente apresentou proposta pela qual se propôs a fornecer o bem visado conforme solicitado, isto é, respeitando todas as condições impostas pelas peças do concurso. Ora, se se propôs fornecer o bem conforme solicitado no ponto 4.1. das cláusulas técnicas, é porque se comprometia a respeitar tudo o que estava naquele ponto 4.1., designadamente, a proteção contra a corrosão galvânica, por um período mínimo de dois anos. XXXII. Nem se diga que a contrainteressada, nessa sua «memória justificativa e descritiva», se limitou a apresentar o preço e a dizer que o restante seria conforme solicitado. Uma leitura integrada e integral permite-nos surpreender nesses documentos da proposta da contrainteressada um conjunto de declarações pelas quais aquela concorrente enunciava e identificava expressamente os aspetos que havia a desenvolver e a inovar. No caso concreto, a contrainteressada assumia o fornecimento da lancha conforme solicitado e que, em alguns casos, até colocaria acabamentos superiores aos solicitados.» 2.2.24 Percebe-se que o Tribunal a quo tenha fundamentado, nestes termos, a sua decisão, quanto à invocada violação da exigência contida no Caderno de encargos respeitante ao prazo mínimo de garantia de 2 anos, já que o enfoque feito na ação foi no sentido de que a contra-interessada a não cumpria, por no documento «anexo f9)» se encontrar a seguinte menção (ponto 5.5 – a pág. 21): «Anodes of a suitable size are to be fitted, one per engine to provide a one year service life», tendo a autora, ora recorrente, fundado naquela circunstância e na natureza daquele documento a invocada violação - (vide artigos 45º a 60º da PI). 2.2.25 Como já se viu supra, aquele documento não tem a natureza de documento obrigatório da proposta, não sendo, assim, através dele que se haverá de observar o cumprimento ou incumprimento do Caderno de Encargos, como, aliás, não deixou de ser referido na sentença recorrida. Ora, para além do que consta da Memória Descritiva da proposta da contra-interessada, em que se suportou a sentença recorrida e cujo teor interpretou, e que em bom rigor a recorrente não ataca, a contra-interessada plasmou expressamente na «Carta de Abertura» da sua proposta, o seguinte (vide 1.5) do probatório): «C – condições de Garantia: Oferecemos as melhores condições de Garantia e Serviço de Assistência Pós-Venda, por um período de 2 (dois) anos». Resultando, também por esta razão, a clara sujeição da proposta da contra-interessada ao prazo (mínimo) de garantia de 2 anos exigido no Caderno de Encargos. 2.2.26 Não merecendo, por conseguinte, também neste aspeto, acolhimento o recurso. 2.2.27 Improcedem, pois, os erros de julgamento apontados à sentença recorrida. ~ 2.3 Da invocada nulidade por omissão de pronúncia2.3.1 Sustenta também a recorrente que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a invocação feita na ação quanto à circunstância de não constarem no procedimento os pedidos de esclarecimentos nem a respetiva notificação com violação do artigo 72º nº 3 do CCP, e que ao não se pronunciar sobre tal questão, a sentença recorrida violou o disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código do Processo Civil, aplicável pelo artigo 35.º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos – (vide conclusões J) a K) da alegações de recurso). Vejamos. 2.3.2 Nos termos do disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 615º nº 1 do CPC novo é nula a sentença quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”. A nulidade da sentença por omissão de pronúncia está diretamente relacionada com o comando inserto na primeira parte do nº 2 do artigo 608º do CPC novo, de acordo com o qual o juiz “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada para a solução dada a outras”. Tal nulidade serve assim de cominação ao desrespeito de tal dever e só ocorre quando o juiz não conheça de questões essenciais para dirimir a lide que as partes tenham submetido à sua apreciação, traduzidas no binómio pedido/causa de pedir e cujo conhecimento não esteja prejudicado pela decisão dada a outras (vide a este respeito, entre outros, os Acórdãos deste TCA de 11/02/2010, Proc. 05531/09 e de 09/07/2009, Proc. 03804/08, in, www.dgsi.pt/jtcas e o Acórdão do STA de 11/02/2009, Proc. 0217/08, in, www.dgsi.pt/jsta). Trata-se, como diz Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220 e 221, do “corolário do princípio da disponibilidade objetiva (art. 264.º, n.º 1 e 664.º, 2.ª parte)” que “significa que o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos formulados por elas, com exceção apenas das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se tornar inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.” Porém, como acrescenta este autor “o tribunal não tem de se pronunciar sobre todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes, desde que não deixe de apreciar os problemas fundamentais e necessários à decisão da causa”. No âmbito da apreciação de mérito dos processos impugnatórios, como é o caso, o Tribunal deve decidir todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação pronunciando-se sobre “…todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas contra o ato impugnado” exceto quando não possa dispor dos elementos indispensáveis para o efeito (cfr. artigo 95º nºs 1 e 3 do CPTA revisto). 2.3.3 Na situação presente, perscrutada a Petição Inicial da ação constata-se que a autora, ora recorrente, invocou vários fundamentos de invalidade ao ato de adjudicação, entre eles a violação do artigo 72º nº 3 do CCP por não constar do procedimento que tenham sido solicitados e fornecidos quaisquer esclarecimentos da proposta da contra-interessada nem ter disso sido notificada - (vide artigos 33º a 37º da PI). Percorrida a sentença recorrida constata-se que, efetivamente, nela não foi tomada posição quanto a tal questão, não tendo a mesma sido enfrentada pelo Tribunal a quo. Pelo que ocorre, nesta parte, nulidade da sentença recorrida, por omissão de pronúncia quanto a tal questão (cfr. artigo 615º nº 1 alínea d) do CPC). O que se decide. ~ 2.4 Do conhecimento em substituição2.4.1 Verificada a nulidade decisória (parcial) da sentença recorrida, por omissão de pronúncia quanto à invocada causa de invalidade do ato de adjudicação, cumpre, agora, proceder à sua apreciação, em substituição. O que se passa a fazer, dispondo os autos dos elementos para tanto necessários, e tendo as partes já debatido tal questão, mostrando-se assegurado o respetivo contraditório (cfr. artigos 149º do CPTA revisto e 665º do CPC novo, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA). 2.4.2 De acordo com o disposto no artigo 72º nº 3 do CCP os esclarecimentos prestados pelos concorrentes “…devem ser disponibilizados em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo todos os concorrentes ser imediatamente notificados desse facto.” Invocou a recorrente na Petição Inicial da ação que em parte nenhuma do procedimento consta o pedido de esclarecimentos quer a sua resposta, salvo a referência que lhes é feita no Relatório Final, e que não foi notificada deles para sobre os mesmos se pronunciar em sede de audiência prévia, ocorrendo, por tal razão, violação do artigo 72º nº 3 do CCP - (vide artigos 33º a 37º da PI). Na contestação apresentada pela Entidade Demandada (a fls. 55 ss. - única contestação apresentada) esta, pronunciando-se quanto a tal questão, disse, entre o demais, que o pedido de esclarecimentos em causa foi dirigido à contra-interessada através da plataforma eletrónica, em respeito do princípio da transparência, e que os esclarecimentos ficaram visíveis na plataforma a todos os participantes; que de todo o modo a eventual falta de notificação dos pedidos de esclarecimentos não consubstanciaria nulidade do procedimento, nem conduziria à anulabilidade da decisão final de adjudicação por não se tratar de violação de qualquer formalidade essencial - (vide artigos 51º a 54º da contestação). 2.4.3 O Código dos Contratos Públicos (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro) adotou, como é sabido, a desmaterialização dos procedimentos de contratação pública, consagrando a utilização de meios eletrónicos na formação dos contratos. Tal conduziu a que fosse necessário assegurar o respeito por princípios fundamentais, tais como os da disponibilidade, da não discriminação e livre acesso, da interoperabilidade e compatibilidade, da confidencialidade, da integridade e da segurança, e outros conexos, de forma a acautelar e garantir a fidedignidade da utilização desses mesmos meios eletrónicos, o que foi designadamente feito através do DL nº 143-A/2008, de 25 de junho (diploma que veio estabelece os princípios e regras gerais a que devem obedecer as comunicações, trocas e arquivo de dados e informações previstos no CCP) e da Portaria nº 701-G/2008, de 29 de julho (que veio definir os requisitos e condições a que deve obedecer a utilização de plataformas eletrónicas pelas entidades adjudicantes, na fase de formação dos contratos públicos). Sendo que, entretanto, a Lei nº 96/2015, de 17 de agosto, transpondo o artigo 29.º da Diretiva 2014/23/UE, o artigo 22.º e o anexo IV da Diretiva 2014/24/UE e o artigo 40.º e o anexo V da Diretiva 2014/25/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, veio regular a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública, revogando o anterior DL. nº 143-A/2008, de 25 de junho. 2.4.4 A plataforma eletrónica assegurará, assim, a prática de todos os atos praticados no procedimento pré-contratual, devendo, nos termos do disposto nos artigos 467º e 468º do CCP, todas as comunicações e notificações a efetuar no âmbito do procedimento pré-contratual ser efetuadas através de correio eletrónico ou de outro meio de transmissão escrita e eletrónica de dados. O que é reforçado pelo artigo 61º da Lei nº 96/2015, de 17 de agosto, nos termos do qual “…todas as notificações e comunicações entre a entidade adjudicante ou o júri do procedimento e os interessados, os concorrentes ou o adjudicatário, relativas à fase de formação do contrato e que, nos termos do CCP, devem ser praticadas num determinado prazo são feitas através das plataformas eletrónicas por via de envio automático de mensagens eletrónicas, devendo as mesmas ficar disponíveis para consulta na área exclusiva respetiva” (nº 1). Devendo a plataforma eletrónica, nos termos do artigo 30º nº 1 da Lei nº 96/2015, “…garantir que todas as mensagens entre interessados, candidatos, concorrentes e adjudicatários, relativas a pedidos de esclarecimentos, lista de erros e omissões, pronúncias, incluindo os documentos anexos às mesmas, ficam automaticamente disponíveis para visualização daqueles que tenham acesso à fase do procedimento em curso” (alínea b)); “…garantir o envio de mensagens de correio eletrónico para todos os intervenientes na fase do procedimento de formação do contrato público em curso, sempre que, nos termos do CCP, tais comunicações sejam obrigatórias” (alínea c)); “…garantir o registo do envio das mensagens de correio eletrónico” (alínea d)); “…garantir o registo de qualquer ação efetuada pelos diversos utilizadores registados” (alínea e)); “…disponibilizar um relatório para verificação e controlo do fluxo do procedimento de acordo com o artigo seguinte” (alínea g)); “…facultar o acesso ao registo de atividades realizadas nas diversas etapas do processo de contratação, com possibilidade de definição de notificações automáticas de eventos” (alínea m)). 2.4.5 Mas a plataforma eletrónica constitui apenas a infraestrutura tecnológica na qual o procedimento pré-contratual se desenvolve. Pelo que é à entidade adjudicante e ao respetivo júri que compete iniciar e conduzir o procedimento de formação do contrato, praticando nele os respetivos atos (cfr. artigos 36º e 67º do CCP e artigo 60º da Lei nº 96/2015). 2.4.5 Na situação presente quer os pedidos de esclarecimentos formulados pelo júri do procedimento dirigidos à contra-interessada quer as respostas que eles mereceram desta mostram-se terem sido praticados na plataforma eletrónica (vide 1.10), 1.11), 1.12) e 1.13) probatório) como incumbia. Pelo que nessa parte não pode proceder a invocação da autora, ora recorrente, não ocorrendo violação da exigência contida na primeira parte do nº 3 do artigo 72º do CCP, no sentido de que os esclarecimentos que venham a ser prestados pelos concorrentes devam estar disponibilizados na plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante. 2.4.6 Mas o referido nº 3 deste artigo 72º impõe também, no seu segundo segmento, que todos os concorrentes sejam “imediatamente notificados desse facto”. Com o que se visa assegurar aos demais concorrentes o conhecimento de que foram prestados esclarecimentos quanto a alguma das propostas, esclarecimentos que, relembre-se, à luz do disposto no artigo 72º nº 2 do CCP, passam a fazer parte da mesma. No que constitui uma positivação e concretização dos princípios da publicidade e transparência dos procedimentos concursais. 2.4.7 Não resulta dos autos que tal notificação tenha ocorrido. Todavia, a sua falta não inquina, na presente situação, e em face das respetivas particularidades, o ato final de adjudicação, em termos que conduzam à sua invalidade e anulação, assegurado que está terem sido praticados oportuna e adequadamente na plataforma e nela disponibilizados quer os pedidos de esclarecimentos formulados pelo júri quer as respostas que eles mereceram. É que o princípio da transparência, no caso, não sai beliscado, por se mostrar garantido na respetiva tramitação eletrónica do procedimento. A omissão ocorrida consubstanciará, apenas, mera irregularidade, por não ter sido de imediato, aquando da prestação dos esclarecimentos, levado ao conhecimento da autora, através daquela notificação, que haviam sido prestados esclarecimentos pela contra-interessada, como o impunha a parte final do nº 3 do artigo 72º do CCP. Mas a transparência do procedimento, garante simultâneo da imparcialidade, mostra-se assegurada. 2.4.8 A omissão da notificação prevista na segunda parte do nº 3 do artigo 72º do CCP não conduzirá à invalidade do ato final de adjudicação, se, no caso, o princípio da transparência se mostra assegurado, por quer os pedidos de esclarecimentos formulados pelo júri quer as respostas da concorrente que os mesmos mereceram terem sido oportuna e adequadamente praticados na plataforma e nela disponibilizados. 2.4.9 Improcede, assim, também neste aspeto, a invocação da recorrente. O que se decide. ~ 2.5 Do desfecho da açãoJulgado improcedente o recurso no que tange aos erros de julgamentos apontados à sentença recorrida, e julgada improcedente, em sede de conhecimento em substituição, a apontada causa de invalidade do ato de adjudicação, cujo conhecimento havia sido omitido pelo Tribunal a quo, emerge como improcedente o pedido impugnatório dirigido ao ato de adjudicação, e com ele, a ação, nada mais cumprindo apreciar ou decidir. * IV. DECISÃONestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em: i) conceder provimento ao recurso interposto pela ré APDL - ASSOCIAÇÃO DOS PORTOS DO DOURO, LEIXÕES E VIANA DO CASTELO, SA revogando a decisão recorrida e levantando o efeito suspensivo automático do ato de adjudicação; ii) conceder parcial provimento ao recurso interposto pela autora ENP - ESTALEIROS NAVAIS DE PENICHE, SA, declarando nula a sentença recorrida, por omissão de pronúncia, na parte em que não conheceu da invocada violação do artigo 72º nº 3 do CCP, e conhecendo em substituição, julgar a mesma improcedente. ~ Custas de ambos os recurso pela autora, neles recorrida e recorrente, respetivamente - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigo 7º e 12º nº 2 do RCP e 189º nº 2 do CPTA.* Notifique. D.N. * Lisboa, 19 de Dezembro de 2017 ______________________________________________________ Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora) ______________________________________________________ Maria Cristina Gallego dos Santos ______________________________________________________ Ana Celeste Catarrilhas da Silva Evans de Carvalho |