Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:11684/14
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:03/12/2015
Relator:HELENA CANELAS
Descritores:INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA – TAXA DE RECURSOS HÍDRICOS
Sumário:I – A competência material para apreciar e decidir se são devidas as quantias emitidas por concessionária da exploração e gestão de sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento referentes à taxa de recursos hídricos a que aludem os artigos 20º, 21º e 22º do DL n.º 97/2008, de 11 de Junho e o artigo 82º da Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro pertence aos tribunais tributários e não aos tribunais administrativos.

II - A circunstância de o réu não ter suscitado a questão da incompetência em razão da matéria na sua contestação, apenas o tendo feito em momento posterior, não obsta à apreciação de tal questão em sede de despacho-saneador em face da natureza de ordem pública da questão da competência dos tribunais que impõe o seu conhecimento oficioso enquanto não houver sentença transitada em julgado sobre o fundo da causa, nos termos do disposto nos artigos 13º do CPTA e 97º nº 1 do CPC novo.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO
O Município do Fundão (devidamente identificado nos autos), réu na ação administrativa comum, sob a forma de processo ordinário (Proc. nº 2/10.9BECTB) em que é autor Águas do Zêzere e Côa, S.A (igualmente devidamente identificado nos autos), inconformado com a decisão vertida no despacho-saneador de 08/04/2014 (proferido pela Mmª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco em sede de audiência prévia a que alude o artigo 591º do CPC novo, aprovado pela Lei nº 41/2013) pela qual julgou improcedente a exceção de incompetência material dos tribunais administrativos para conhecerem do pedido formulado na ação (que havia sido suscitada pelo recorrente, réu na ação, defendendo que a mesma pertence aos tribunais tributários em face da natureza fiscal da questão em dissídio), vem dela interpor o presente recurso autónomo, com subida em separado, ao abrigo do disposto nos artigos 644º nº 2 alínea b) e 645º nº 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), pugnando pela sua revogação, com substituição por decisão que julgue a incompetência material do Tribunal Administrativo para conhecer o pedido relativo à Taxa de Recursos Hídricos, declarando competentes para o efeito os Tribunais Tributários, absolvendo, em consequência, o réu, aqui recorrente, da instância.

Nas suas alegações o Recorrente formula as seguintes conclusões nos seguintes termos:
«1. 0 despacho saneador ora recorrido viola o disposto nos artigos. 212º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa , e nos artigos. 1°, nº 1, 4°, 1, ai. a), 44°, 1, e 49°, todos do ETAF.

2. Pelas razões ora alegadas a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, faz, ao decidir como decidiu, com todo o respeito se refere, uma interpretação errada do estipulado no artigo 77º nº 2 e 80º da lei nº 58/2005 de 29/12 (Lei da Água), do artigo 5º e 14º do Decreto Lei nº 97/2008 de 11/06 e dos pontos B.1.2 e B.1.3 do despacho nº 484/2009 do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, publicado no Diário da República , 2º série de 8/01/2009.

3. A questão que se coloca com o presente recurso é a de saber se o Tribunal Administrativo é competente para decidir o pedido de condenação do R. a pagar à A. a Taxa de Recursos Hídricos e respetivos juros.

4. A cobrança dos valores reclamados a título de taxa de recursos hídricos, adiante designada por TRH, e respetivos juros de mora, pressupõe a apreciação de normas de direito fiscal substantivo, o que determina a incompetência do Tribunal a quo em razão da matéria.

5. Pelo que nesta parte dos autos, estamos no âmbito de uma relação jurídica de natureza tributária ou fiscal pois implica a discussão e interpretação de normas de natureza fiscal e que se situam no domínio da atividade tributária;

6. E para a qual são competentes os Tribunais Tributários , nos termos conjugados dos arts. 212°, nº 3 da Constituição da República Portuguesa, e nos arts. 1º, nº 1, 4º, nº 1, ai. a), 44°, nº 1, e 49º, todos do ETAF.

7. Sendo, em consequência, incompetente em razão da matéria, para dirimir esta questão o presente Tribunal Administrativo de Castelo Branco, e sendo, em consequência, inidónea para tanto o presente meio processual utilizado a ação administrativa comum.

8. 0 artigo 212.º n.º 3 da CRP dispõe que “compete ao tribunais (...) fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes da relações jurídicas (...) fiscais”;

9. 0 artigo 212.º nº 3 da CRP tem concretização legal no nº 1 do artigo 1.º do ETAF, segundo o qual os tribunais da jurisdição (...) fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas (...)fiscais”

10. A TRH encontra-se disciplinada pela lei nº 58/2005 de 29/12 (Lei da Água), pelo Decreto lei nº 97/2008 de 11/06 e pelo despacho 484/2009 do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, publicado no Diário da República, 2º série de 8/01/2009.

11. 0 artigo 77º nº 2 da Lei da Água determina que estão sujeitos ao pagamento de TRH todos os utilizadores dos recursos hídricos que utilizem bens do domínio público e todos os utilizadores de recursos hídricos públicos ou particulares que beneficiem de prestações públicas que lhes proporcionem vantagens ou que envolvam a realização de despesas públicas.

12. 0 artigo 5.º do decreto-lei 97/2008 de 11/06, determina que todas as pessoas, singulares ou coletivas, que efetuem as utilizações do domínio público hídrico descritas no artigo 4.º do referido diploma são sujeitos passivos da TRH, devendo repercutir o valor da taxa no consumidor final.

13. A base tributável encontra-se definida no artigo·77º da Lei da Água, dispondo o artigo 80º que a taxa é cobrada pelas autoridades licenciadoras aquando da emissão dos títulos de utilização privativa.

14. Por seu turno o artigo 14.º do decreto-lei 97/2008 de 11/06, determina que a liquidação compete à ARH,

15. E o artigo 16.0 n.º 4 dispõe que o pagamento é feito empregando todos os meios genericamente previstos na LGT.

16. 0 ponto B.1.2 do despacho 484/2009 determina que as entidades gestoras dos sistemas multimunicipais de abastecimento de água e saneamento de águas residuais devem repercutir a TRH, que pagaram à ARH, nos Municípios utilizadores dos serviços, sendo a forma de repercussão disciplinada no ponto 8.1.3 do referido despacho .

17. Face ao quadro legal que rege a liquidação, pagamento e repercussão da TRH, salvo melhor opinião e respeito por opinião contrária, a conclusão só pode ser a de que na apreciação do pedido de pagamento da TRH o Tribunal é chamado a interpretar e aplicar normas de direito tributário por forma a dirimir um litígio que emerge do exercício da função tributária da administração pública.

18. No caso dos autos o objecto do litígio que o tribunal administrativo foi convocado a dirimir e decidir reconduz-se a apurar se são legalmente devidas e exigíveis da R as quantias facturadas enquanto valores respeitantes à parcela reportada à recuperação do valor pago pela A. com os encargos legais obrigatórios, nomeadamente e no caso, com a taxa de recursos hídricos (cfr. Arts 20., 21, 22.º, do DL 97/08 e 82º do lei n.º 58/05).

19. Em discussão nos presentes autos está, assim, o reflexo directo da relação jurídica fiscal que se estabeleceu e estabelece entre a ARH competente e a aqui A - com a liquidação e pagamento anual da taxa de recursos hídricos cujo montante pago "adiantado " a concessionária tem o direito a ser ressarcida.

20. Pelo que, o que está efectivamente em causa e é pedido prende-se, entre o mais, com o não pagamento duma parcela inserida nas facturas emitidas e que é relativa à cobrança da taxa de recursos hídricos,

21. Pelo que a causa de pedir e o pedido não se enquadram no domínio da responsabilidade fundada no incumprimento do contrato de concessão enquanto fonte duma relação jurídica administrativa ,

Mas antes,

22. Numa decorrência de relação jurídica fiscal visto estar em discussão a legalidade da interpretação e aplicação de disposições de direito fiscal , ou que se situa no campo da actividade tributária.

23. Assim conclui-se que o pedido de condenação do R. dos montantes relativos à TRH, alegadamente devida e não paga, acrescida de juros moratórias, inscreve-se no âmbito de uma relação jurídico tributária,

24. Pelo que a competência para a sua apreciação pertence aos tribunais tributários e não aos tribunais administrativos.

25. Pelo que terá, como é de inteira justiça , ser declarada a incompetência material do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco materialmente incompetente para conhecer o pedido relativo à TRH, absolvendo-se o R. da instância

26. Declarando-se competente para dirimir e conhecer este pedido os Tribunais Tributários


A Recorrida, autora na ação, contra-alegou (fls. 25 ss.), pugnando pela improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, defendendo que, como nela se entendeu, os tribunais administrativos são os competentes em razão da matéria para decidir o pedido formulado na ação.

Admitido o recurso, por despacho da Mmª Juiz do Tribunal a quo de 16/05/2014 (de fls. 18 ss.), com efeito meramente devolutivo, subiu o mesmo em separado a este Tribunal instruído, entre o demais, com certidão das seguintes peças processuais:
- da petição inicial (fls. 52 ss.)
- da contestação (fls. 67 ss.)
- da réplica (fls. 74 ss.)
- do requerimento de 27/02/2013 do réu (fls. 153 ss.)
- do requerimento de resposta da autora de 08/03/2014 (fls. 164 ss.)
- da ata de audiência prévia de 08/04/2014 (fls. 109 ss.)

O(a) Digno(a) Magistrado(a) do Ministério Público junto deste Tribunal notificado(a) nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA emitiu Parecer (fls. 180 ss.) no sentido da improcedência do recurso, com manutenção da decisão recorrida, por entender, em suma, que a relação jurídica controvertida é de natureza administrativa e não fiscal, sendo que dele notificadas as partes, nenhuma respondeu (cfr. fls. 184-185).

Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.


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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO (das questões a decidir)
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA (correspondentes aos artigos 660º nº 2, 664º, 684º nºs 3 e 4 e 690º do CPC antigo).
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pelo recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida no despacho-saneador de 08/04/2014, proferido pela Mmª Juiz do Tribunal a quo em sede de audiência prévia a que alude o artigo 591º do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) pela qual julgou improcedente a exceção de incompetência material dos tribunais administrativos para conhecerem do pedido formulado na ação (que havia sido suscitada pelo recorrente, réu na ação, defendendo que a mesma pertence aos tribunais tributários em face da natureza fiscal da questão em dissídio) e assim declarou o tribunal (administrativo) competente em razão da matéria, incorreu em erro de julgamento, por a competência em razão da matéria pertencer aos tribunais tributários em face da natureza fiscal da questão a decidir.
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III. FUNDAMENTAÇÃO

Da decisão recorrida
No despacho-saneador de 08/04/2014, proferido pela Mmª Juiz do Tribunal a quo em sede de audiência prévia a que alude o artigo 591º do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) no âmbito da ação administrativa comum, sob a forma de processo ordinário, (Proc. nº 2/10.9BECTB), em que é autor Águas do Zêzere e Côa, S.A, aqui recorrido, e réu o Município do Fundão, aqui recorrente, foi julgada improcedente a exceção de incompetência material dos tribunais administrativos para conhecerem do pedido formulado na ação (que havia sido suscitada pelo recorrente, réu na ação, defendendo que a mesma pertence aos tribunais tributários em face da natureza fiscal da questão em dissídio) e assim declarado o tribunal (administrativo) competente em razão da matéria para decidir a ação (pelos fundamentos vertidos nas págs. 8 a 18 da respetiva ata).
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Da tese do recorrente
Pugna o recorrente, réu na ação, pela revogação da decisão recorrida, com substituição por decisão que julgue a incompetência material do Tribunal Administrativo para conhecer o pedido formulado na ação relativo à Taxa de Recursos Hídricos, declarando competentes para o efeito os Tribunais Tributários, absolvendo-o em consequência da instância. Sustenta para o efeito nas suas alegações, nos termos que reconduz às respetivas conclusões, que a decisão recorrida viola o disposto nos artigos. 212º, nº 3 da Constituição da República Portuguesa, e nos artigos 1°, nº 1, 4°, 1, al. a), 44°, 1 e 49°, todos do ETAF; que a Mmª Juiz do Tribunal a quo, faz, ao decidir como decidiu uma interpretação errada do estipulado no artigo 77º nº 2 e 80º da Lei nº 58/2005 de 29/12 (Lei da Água), do artigo 5º e 14º do DL. nº 97/2008 de 11/06 e dos pontos B.1.2 e B.1.3 do despacho nº 484/2009 do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, publicado no Diário da República , 2º série de 8/01/2009; que a questão que se coloca com o presente recurso é a de saber se o Tribunal Administrativo é competente para decidir o pedido de condenação do R. a pagar à A. a Taxa de Recursos Hídricos e respetivos juros; que a cobrança dos valores reclamados a título de taxa de recursos hídricos, adiante designada por TRH, e respetivos juros de mora, pressupõe a apreciação de normas de direito fiscal substantivo, o que determina a incompetência do Tribunal a quo em razão da matéria; que assim nesta parte dos autos, estamos no âmbito de uma relação jurídica de natureza tributária ou fiscal pois implica a discussão e interpretação de normas de natureza fiscal e que se situam no domínio da atividade tributária para a qual são competentes os Tribunais Tributários, nos termos conjugados dos arts. 212°, nº 3 da Constituição da República Portuguesa, e nos arts. 1º, nº 1, 4º, nº 1, al. a), 44°, nº 1, e 49º, todos do ETAF, sendo, em consequência, incompetente em razão da matéria, para dirimir esta questão o Tribunal Administrativo de Castelo Branco, e sendo, em consequência, inidónea para tanto o presente meio processual utilizado a ação administrativa comum; que o artigo 212.º n.º 3 da CRP dispõe que compete ao tribunais (...) fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes da relações jurídicas (...) fiscais”; que o artigo 212.º nº 3 da CRP tem concretização legal no nº 1 do artigo 1.º do ETAF, segundo o qual os tribunais da jurisdição (...) fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas (...) fiscais”; que a Taxa de Recurso Hídricos (TRH) encontra-se disciplinada pela Lei nº 58/2005 de 29/12 (Lei da Água), pelo Decreto lei nº 97/2008 de 11/06 e pelo despacho 484/2009 do Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, publicado no Diário da República, 2º série de 8/01/2009; que o artigo 77º nº 2 da Lei da Água determina que estão sujeitos ao pagamento de TRH todos os utilizadores dos recursos hídricos que utilizem bens do domínio público e todos os utilizadores de recursos hídricos públicos ou particulares que beneficiem de prestações públicas que lhes proporcionem vantagens ou que envolvam a realização de despesas públicas; que o artigo 5.º do DL. nº 97/2008 de 11/06, determina que todas as pessoas, singulares ou coletivas, que efetuem as utilizações do domínio público hídrico descritas no artigo 4.º do referido diploma são sujeitos passivos da TRH, devendo repercutir o valor da taxa no consumidor final; que a base tributável encontra-se definida no artigo·77º da Lei da Água, dispondo o artigo 80º que a taxa é cobrada pelas autoridades licenciadoras aquando da emissão dos títulos de utilização privativa; que por seu turno o artigo 14.º do decreto-lei 97/2008 de 11/06, determina que a liquidação compete à ARH, e o artigo 16º n.º 4 dispõe que o pagamento é feito empregando todos os meios genericamente previstos na LGT; que o ponto B.1.2 do despacho 484/2009 determina que as entidades gestoras dos sistemas multimunicipais de abastecimento de água e saneamento de águas residuais devem repercutir a TRH, que pagaram à ARH, nos Municípios utilizadores dos serviços, sendo a forma de repercussão disciplinada no ponto 8.1.3 do referido despacho; que face ao quadro legal que rege a liquidação, pagamento e repercussão da TRH, salvo melhor opinião e respeito por opinião contrária, a conclusão só pode ser a de que na apreciação do pedido de pagamento da TRH o Tribunal é chamado a interpretar e aplicar normas de direito tributário por forma a dirimir um litígio que emerge do exercício da função tributária da administração pública; que no caso dos autos o objeto do litígio que o tribunal administrativo foi convocado a dirimir e decidir reconduz-se a apurar se são legalmente devidas e exigíveis da R as quantias faturadas enquanto valores respeitantes à parcela reportada à recuperação do valor pago pela A. com os encargos legais obrigatórios, nomeadamente e no caso, com a taxa de recursos hídricos (cfr. Arts 20º, 21º, 22.º, do DL nº 97/08 e 82º da Lei n.º 58/05); que assim em discussão nos presentes autos está o reflexo direto da relação jurídica fiscal que se estabeleceu e estabelece entre a ARH competente e a aqui A - com a liquidação e pagamento anual da taxa de recursos hídricos cujo montante pago "adiantado " a concessionária tem o direito a ser ressarcida; que assim o que está efetivamente em causa e é pedido prende-se, entre o mais, com o não pagamento duma parcela inserida nas faturas emitidas e que é relativa à cobrança da taxa de recursos hídricos, pelo que a causa de pedir e o pedido não se enquadram no domínio da responsabilidade fundada no incumprimento do contrato de concessão enquanto fonte duma relação jurídica administrativa mas antes numa decorrência de relação jurídica fiscal visto estar em discussão a legalidade da interpretação e aplicação de disposições de direito fiscal, ou que se situa no campo da atividade tributária; que assim conclui-se que o pedido de condenação do R. dos montantes relativos à TRH, alegadamente devida e não paga, acrescida de juros moratórias, inscreve-se no âmbito de uma relação jurídico-tributária, pelo que a competência para a sua apreciação pertence aos tribunais tributários e não aos tribunais administrativos, devendo ser declarada a incompetência material do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco para conhecer o pedido relativo à TRH, absolvendo-se o R. da instância, declarando-se competente para dirimir e conhecer este pedido os Tribunais Tributários.
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Da análise e apreciação da questão
É a seguinte a factualidade relevante para a decisão da questão submetida em recurso a este Tribunal, a qual decorrente dos elementos patenteados nos presentes autos de recurso, em face das peças processuais com que o mesmo foi instruído:
1. A aqui recorrida, Águas do Zêzere e Côa, S.A, dirigiu ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco (por mail enviado em 28/12/2009) a Petição Inicial destinada a instaurar «ação administrativa comum sob a forma de processo ordinário», ao abrigo dos artigos 4º nº 1 alínea f) do ETAF e 37º nº 2 alíneas g) e h) do CPTA, que ali expressamente invocou, contra o Município do Fundão, aqui recorrente, nela formulando o seguinte pedido nos seguintes termos:

«Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exa. Doutamente suprirá, deve a presente ação administrativa comum ser julgada procedente, por provada, e em consequência, deve o Município do Fundão ser condenado a pagar à AzC as seguintes importâncias:

a) O valor de € 551.188,59 (quinhentos e cinquenta e um mil cento e oitenta e oito euros e cinquenta e nove cêntimos), devido pelos serviços prestados pela AzC ao Município do Fundão, nos termos supra descritos;

b) O valor de € 6.462,03 (seis mil quatrocentos e sessenta e dois euros e três cêntimos), a título de juros de mora vencidos até ao dia 28 de Dezembro de 2009, perfazendo a importância global, em conjunto com a alínea anterior, de € 557.650,62 (quinhentos e cinquenta e sete mil seiscentos e cinquenta euros e sessenta e dois cêntimos), acrescido de juros de mora vincendos até efetivo e integral pagamento.»

2. Com a petição inicial a autora, aqui recorrida, juntou, entre os demais documentos (sob Doc. nº 2), o «Contrato de Concessão» celebrado entre si e o Estado Português em 15/09/2000, pelo qual o Estado Português (concedente) atribuiu à Águas do Zêzere e Côa, S.A, (concessionária), em regime de exclusivo, a «concessão da exploração e gestão, as quais abrangem a conceção, a construção das obras e equipamentos, bem como a exploração, reparação, renovação e manutenção, nos termos da clásula 23ª, do sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Alto Zêzere e Côa para captação, tratamento e distribuição de água para consumo público e para recolha, tratamento e rejeição de efluentes dos municípios de Almeida, Belmonte, Covilhã, Figueira de Castelo Rodrigo, Fundão, Guarda, Manteigas, Meda, Penamacor, Pinhel e Sabugal, que foi criado pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 121/2000, de 4 de Julho» (cfr. Cláusula 1ª nº 1 daquele Contrato de Concessão).

3. Com a petição inicial a autora, aqui recorrida, juntou também (sob Doc. nº 3), o «Contrato de Fornecimento» celebrado entre si e o réu, Município do Fundão, aqui recorrente, na mesma data (15/09/2000), pelo qual a primeira (Águas do Zêzere e Côa, SA) se obrigou «a fornecer água ao Município, destinada a abastecimento público, nos termos e de acordo com as condições previstas no contrato de concessão celebrado entre o Estado e a Sociedade relativo à atribuição da concessão da exploração e gestão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e saneamento do Alto Zêzere, criado pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 121/2000, de 4 de Julho» (cfr. Cláusula 1ª nº 1 daquele Contrato de Fornecimento).

4. Com a petição inicial a autora, aqui recorrida, juntou também (sob Doc. nº 4), o «Contrato de Recolha» celebrado entre si e o réu, Município do Fundão, aqui recorrente, na mesma data (15/09/2000), pelo qual a primeira (Águas do Zêzere e Côa, SA) se obrigou «a recolher efluentes provenientes do sistema próprio do Município, nos termos e de acordo com as condições previstas no contrato de concessão celebrado entre o Estado e a Sociedade relativo à atribuição da concessão da exploração e gestão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e saneamento do Alto Zêzere, criado pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 121/2000, de 4 de Julho» (cfr. Cláusula 1ª nº 1 daquele Contrato de Recolha).

5. A Petição Inicial foi submetida à distribuição no Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, sob Proc. nº 2/10.9BECTB, em matéria administrativa, como 1ª espécie – ação administrativa comum sob a forma de processo ordinário.

6. Na sua contestação o réu, aqui recorrente suscitou, entre o demais, a exceção dilatória concernente na preterição de Tribunal Arbitral, que foi apreciada no despacho-saneador de 08/04/2014 (proferido pela Mmª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco em sede de audiência prévia a que alude o artigo 591º do CPC novo, aprovado pela Lei nº 41/2013), nele tendo sido a mesma considerada procedente apenas no que respeita «às questões da ilegalidade da concessão por violação dos pressupostos legais que o DL. nº 121/2000 impõe por o sistema não incluir o Município da Covilhã, como exige aquele diploma e não cumprimento por parte da Autora da obrigação de fornecimento de água em alta e de recolha e tratamento de efluentes em diversas freguesias do concelho do Fundão» que foram suscitadas pelo réu, por constituir violação da convenção de arbitragem, e julgada improcedente no demais, isto é, quanto ao pedido de pagamento das quantias vertidas pelas faturas discriminadas na petição inicial emitidas pela autora.

7. Na sua contestação o réu, aqui recorrente não suscitou a questão da incompetência, em razão da matéria dos tribunais administrativos para apreciarem e decidirem o pedido formulado na ação, o que apenas veio a fazer através do requerimento que apresentou em 27/02/2013 (fls. 153 ss.), sustentando pertencer aos tribunais tributários a competência para decidir o pedido formulado pela autora na ação, pugnando pela sua consequente absolvição da instância.

8. Questão à qual a autora respondeu por requerimento de 08/03/2014 (fls. 164 ss.), defendendo pertencer a competência material aos tribunais administrativos.

9. No despacho-saneador de 08/04/2014, proferido pela Mmª Juiz do Tribunal a quo em sede de audiência prévia a que alude o artigo 591º do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) foi julgada improcedente a suscitada exceção de incompetência material dos tribunais administrativos para conhecerem do pedido formulado na ação e assim declarado o tribunal (administrativo) competente em razão da matéria para decidir a ação, pelos fundamentos vertidos nas págs. 8 a 18 da respetiva ata.



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Tendo presente os factos assim elencados, relevantes para a questão a decidir, vejamos, então, se merece provimento o presente recurso, por ser de acolher a tese do recorrente.
Atentando-se no quadro normativo relevante para a decisão a proferir, e que foi também invocado pelas partes, em defesa das suas respetivas teses.
Vejamos.
Nos termos do artigo 13º do CPTA “o âmbito da jurisdição administrativa e a competência dos tribunais, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria”.
E nos termos do artigo 97º nº 1 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013), ex vi do artigo 1º do CPTA a incompetência absoluta “deve ser suscitada oficiosamente pelo tribunal enquanto não houver sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa.”
O artigo 1º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei nº 13/2002, de 19 de Fevereiro, define o âmbito da jurisdição administrativa e fiscal em função dos litígios emergentes das “relações jurídicas administrativas e fiscais” à luz do disposto no nº 3 do artigo 212º da Constituição da República Portuguesa que determina que “compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”.
À luz daqueles normativos o critério de determinação da jurisdição competente é o critério material da relação jurídica subjacente ao litígio.
Para além dos demais tribunais superiores, são órgãos da jurisdição administrativa e fiscal os Tribunais Administrativos de Circulo e os Tribunais Tributários, os quais podem funcionar agregados, adotando, nesse caso, a designação de Tribunal Administrativo e Fiscal, conforme resulta do disposto no artigo 9º do ETAF.
Conforme dispõe o nº 1 do artigo 44º do ETAF é da competência dos Tribunais Administrativos de Circulo conhecer, em primeira instância, de todos os processos do âmbito da jurisdição administrativa (com exceção daqueles cuja competência, em primeiro grau de jurisdição, esteja reservada aos tribunais superiores).
E em conformidade com o disposto no nº 1 do artigo 49º do ETAF (na versão anterior às alterações que lhe foram introduzidas pela Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro, em vigor à data em que a ação foi instaurada) é da competência dos Tribunais Tributários conhecer, entre o demais:
“a) Das ações de impugnação:
i) Dos atos de liquidação de receitas fiscais estaduais, regionais ou locais, e parafiscais, incluindo o indeferimento total ou parcial de reclamações desses atos;
ii) Dos atos de fixação dos valores patrimoniais e dos actos de determinação de matéria tributável suscetíveis de impugnação judicial autónoma;
iii) Dos atos praticados pela entidade competente nos processos de execução fiscal;
iv) Dos atos administrativos respeitantes a questões fiscais que não sejam atribuídos à competência de outros tribunais;
b) Da impugnação de decisões de aplicação de coimas e sanções acessórias em matéria fiscal;
c) Das ações destinadas a obter o reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos em matéria fiscal;
d) Dos incidentes, embargos de terceiro, verificação e graduação de créditos, anulação da venda, oposições e impugnação de atos lesivos, bem como de todas as questões relativas à legitimidade dos responsáveis subsidiários, levantadas nos processos de execução fiscal;
e) Dos seguintes pedidos:
i) De declaração da ilegalidade de normas administrativas de âmbito regional ou local, emitidas em matéria fiscal;
ii) De produção antecipada de prova, formulados em processo neles pendente ou a instaurar em qualquer tribunal tributário;
iii) De providências cautelares para garantia de créditos fiscais;
iv) De providências cautelares relativas aos atos administrativos impugnados ou impugnáveis e às normas referidas na subalínea i) desta alínea;
v) De execução das suas decisões;
vi) De intimação de qualquer autoridade fiscal para facultar a consulta de documentos ou processos, passar certidões e prestar informações;
f) Das demais matérias que lhes sejam deferidas por lei.”

Nos termos do Decreto-Lei n.º 325/2003, de 29 de Dezembro, que define a sede, a organização e a área de jurisdição dos tribunais administrativos e fiscais, concretizando o respetivo Estatuto, o Tribunal Administrativo de Círculo e o Tribunal Tributário de Castelo Branco funcionam de forma agregada com a designação de Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, mantendo-se a separação da competência para a apreciação dos litígios em função da matéria em causa de cada um daqueles tribunais.
A Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro (vulgo Lei da Água) prevê no seu artigo 68º nº 8 que em “contrapartida da utilização do domínio público hídrico é devida uma taxa de recursos hídricos por força da utilização dominial, do impacte efetivo ou potencial de atividade concessionada, no estado das massas de águas”.
E no artigo 78º, sob a epígrafe de “taxa de recursos hídricos” que a “taxa de recursos hídricos (TRH) tem como bases de incidência objetiva separadas: a) A utilização privativa de bens do domínio público hídrico, tendo em atenção o montante do bem público utilizado e o valor económico desse bem; b) As atividades suscetíveis de causarem um impacte negativo significativo no estado de qualidade ou quantidade de água, internalizando os custos ambientais associados a tal impacte e à respetiva recuperação” (nº 1) e que a “utilização de obras de regularização de águas superficiais e subterrâneas realizadas pelo Estado constitui também base de incidência objetiva da TRH, proporcionando a amortização do investimento e a cobertura dos respetivos custos de exploração e conservação, devendo ser progressivamente substituída por uma tarifa cobrada pelo correspondente serviço de água” (nº 2).
Dispõe ainda o seu artigo 80º nº 1 que a “taxa é cobrada pelas autoridades licenciadoras, quando da emissão dos títulos de utilização que lhe der origem e periodicamente, nos termos fixados por estes títulos”.
E o seu artigo 82º que o “regime de tarifas a praticar pelos serviços públicos de águas visa os seguintes objetivos: a) Assegurar tendencialmente e em prazo razoável a recuperação do investimento inicial e de eventuais novos investimentos de expansão, modernização e substituição, deduzidos da percentagem das comparticipações e subsídios a fundo perdido; b) Assegurar a manutenção, reparação e renovação de todos os bens e equipamentos afetos ao serviço e o pagamento de outros encargos obrigatórios, onde se inclui nomeadamente a taxa de recursos hídricos; c) Assegurar a eficácia dos serviços num quadro de eficiência da utilização dos recursos necessários e tendo em atenção a existência de receitas não provenientes de tarifas” (nº 1), sendo que o “regime de tarifas a praticar pelas empresas concessionárias de serviços públicos de águas obedece aos critérios do n.º 1, visando ainda assegurar o equilíbrio económico-financeiro da concessão e uma adequada remuneração dos capitais próprios da concessionária, nos termos do respetivo contrato de concessão, e o cumprimento dos critérios definidos nas bases legais aplicáveis e das orientações definidas pelas entidades reguladoras” (nº 2).
O DL n.º 97/2008, de 11 de Junho veio, na decorrência daquela Lei nº 58/2005 (Lei da Água), estabelecer o regime económico e financeiro dos recursos hídricos previsto pela Lei n.º 58/2005, “disciplinando a taxa de recursos hídricos, as tarifas dos serviços públicos de águas e os contratos-programa em matéria de gestão dos recursos hídricos ” (cfr. artigo 1º).
E ali estatuiu, em termos de “incidência objetiva”, que a “taxa de recursos hídricos incide sobre as seguintes utilizações dos recursos hídricos: a) A utilização privativa de águas do domínio público hídrico do Estado; b) A descarga, direta ou indireta, de efluentes sobre os recursos hídricos, suscetível de causar impacte significativo; c) A extração de materiais inertes do domínio público hídrico do Estado; d) A ocupação de terrenos ou planos de água do domínio público hídrico do Estado; e) A utilização de águas, qualquer que seja a sua natureza ou regime legal, sujeitas a planeamento e gestão públicos, suscetível de causar impacte significativo” (cfr. artigo 4º).
E em termos de “incidência subjetiva”, que são “sujeitos passivos da taxa de recursos hídricos todas as pessoas, singulares ou coletivas, que realizem as utilizações referidas no artigo anterior estando, ou devendo estar, para o efeito munidas dos necessários títulos de utilização” (cfr. artigo 5º nº 1), sendo que quando “a taxa não seja devida pelo utilizador final dos recursos hídricos, deve o sujeito passivo repercutir sobre o utilizador final o encargo económico que ela representa, juntamente com os preços ou tarifas que pratique” (nº 2).
Dispondo ainda no seu artigo 14º que a “liquidação da taxa de recursos hídricos compete às ARH, devendo estas emitir para o efeito a correspondente nota de liquidação ” (nº 1), a qual sempre que o título de utilização possua validade igual ou superior a um ano “é feita até ao termo do mês de janeiro do ano seguinte àquele a que a taxa respeite” (nº 2), mas se tal título de utilização possua validade inferior a um ano “a liquidação da taxa de recursos hídricos é prévia à emissão do próprio título” (nº 3).
Preceituando o seu artigo 16º a respeito do seu pagamento que sempre “que o título de utilização possua validade igual ou superior a um ano, o pagamento da taxa de recursos hídricos é feito até ao termo do mês de fevereiro do ano seguinte àquele a que a taxa respeite” (nº 1) e se o título de utilização possuir validade inferior a um ano “o pagamento da taxa de recursos hídricos é prévio à emissão do próprio título” (nº 3), sendo que o “pagamento da taxa de recursos hídricos pode ser feito empregando todos os meios genericamente previstos pela Lei Geral Tributária, nomeadamente a moeda corrente, o cheque, o débito em conta, a transferência bancária ou o vale postal, devendo ser realizado por débito em conta sempre que o sujeito passivo constitua pessoa coletiva e o título possua validade igual ou superior a um ano” (nº 4).
Por seu turno no seu artigo 20º dispõe-se que estão “sujeitos ao regime de tarifas todos os utilizadores dos serviços públicos de águas, independentemente da forma de gestão que neles seja adotada”.
Sendo que por força do seu artigo 21º o “regime de tarifas aplicável aos serviços públicos de águas está subordinado aos princípios genericamente estabelecidos pela Lei da Água e pelo presente diploma, devendo permitir a recuperação dos custos associados à provisão destes serviços, em condições de eficiência e mediante a diferenciação contabilística das componentes referidas na alínea zz) do artigo 4.º da Lei da Água, garantir a transparência na formação da tarifa a pagar pelos utilizadores e assegurar o equilíbrio económico e financeiro de cada serviço prestado pelas entidades gestoras”.
Estipulando ainda o seu artigo 22º nº 3 que o “regime tarifário deve ser estruturado de forma que assegure o pagamento dos demais encargos obrigatórios por lei, nomeadamente da taxa de recursos hídricos e das taxas devidas a entidades reguladoras”.
Feito este périplo, importa chamar à colação o que já foi decidido em situações em tudo semelhantes à que é trazida no presente recurso, quer quanto ao respetivo quadro factual, quer quando ao quadro normativo aplicável, nos Acórdãos do TCA Norte de 25/11/2011, Proc. n.º 02750/10.4BEPRT; de 13/01/2012, Proc. n.º 00844/11.8BEPRT, de 02/03/2012, Proc. n.º 02223/11.8BEPRT; de 11/01/2013, Proc. n.º 00858/09.8BEPRT e de 25/01/2013, Proc. nº 00377/10.0BEPRT, in www.dgsi.pt/jtcan, no sentido de a competência material para apreciar e decidir se são devidas as quantias emitidas por concessionária da exploração e gestão de sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento referentes à taxa de recursos hídricos a que aludem os artigos 20º, 21º e 22º do DL n.º 97/2008, de 11 de Junho e o artigo 82º da Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro pertencer aos tribunais tributários e não aos tribunais administrativos.
Entendimento que subscrevemos e relativamente ao qual não existem motivos para nos afastarmos na situação presente.
Sendo que o Supremo Tribunal Administrativo recusou de modo reiterado através, designadamente, dos seus Acórdãos de 20/06/2013, Proc. 01017/13; de 25/10/2013, Proc. 01408/13 e de 06/02/2014, Proc. 094/14, in www.dgsi.pt/jsta, os recursos de revista (artigo 150º do CPTA) interpostos por entender que as decisões pelas quais foi considerado que para conhecer de litígio sobre a taxa de recursos hídricos são os tribunais tributários não versa sobre questão de especial dificuldade jurídica nem apresenta peculiar relevância social, não se justificando a admissão de revista.
Importando evidenciar que na situação dos autos a questão em dissídio, relativamente à qual o recorrente manifestou discordância, interpondo, nessa parte, e só nessa, o presente recurso, é tão só a de saber se os tribunais administrativos são os competentes em razão da matéria para conhecer o pedido formulado pela autora na ação no que tange aos valores (considerados devidos, no entender da autora, mas que o reu contesta e discute) referentes à taxa de recursos hídricos imputados nas faturas emitidas pela autora na decorrência dos contratos, de fornecimento e de recolha, celebrados em 15/09/2000 entre autora e réu (juntos sob Doc.s nº 3 e nº 4 com a Petição Inicial), cujo pagamento é pretendido. Valores que são descriminados nos artigos 30º, 34º, 38º, 42º, 46º e 50º da Petição Inicial. Não pondo em causa que no que respeita aos demais valores contantes das faturas emitidas, os tribunais materialmente competentes são os tribunais administrativos.
Ora tal como já se expendeu nos supra citados arestos, a tal respeito, deve entender-se por “questão fiscal”, de harmonia com a jurisprudência firmada pelo STA, “aquela que, de qualquer forma, imediata ou mediata, faça apelo à interpretação e aplicação de norma de direito fiscal com atinência ao exercício da função tributária da Administração ou à obtenção de receitas destinadas à satisfação de encargos públicos”. Sendo assim “questão fiscal” aquela que emerge de resolução autoritária que imponha o pagamento de prestações pecuniárias com vista à satisfação de encargos públicos dos respetivos entes impositivos (cfr. Casalta Nabais in, “Direito Fiscal”, 2.ª edição, pág. 366). Ou, por outras palavras, está-se perante “questão fiscal” “quando a mesma diga respeito à interpretação e aplicação de normas legais de natureza tributária, ou seja, se refira a uma resolução autoritária que negue direito a não pagamento ou que imponha o pagamento de qualquer prestação pecuniária com vista à obtenção de receitas destinadas à satisfação dos encargos públicos do Estado ou de outras pessoas coletivas públicas, bem como o conjunto de relações jurídicas que com elas estejam objetivamente conexas ou teleologicamente subordinadas” (vide, Acórdão do TCA Norte de 25/11/2011, Proc. 02750/10.4BEPRT, in www.dgsi.pt/jtcan).
Como é dito no Acórdão do TCA Norte de 13/05/2011, Proc. 534/09.1BEBRG (inédito, mas citado e transcrito, em parte, no Acórdão daquele mesmo Tribunal de 13/01/2012, Proc. 00844/11.8BEBRG, in, www.dgsi.pt/jtcan) “O contrato de fornecimento contínuo um contrato administrativo [al. g) do n.º 2 do art. 178.º do CPA] e estando em causa o incumprimento de obrigações dele emergentes, facilmente se percebe que a questão se enquadra no âmbito de uma relação jurídica administrativa e não de uma relação jurídica fiscal. O litígio não é relativo a uma “questão fiscal”, na tese ampliativa defendida pela jurisprudência, segunda a qual questões fiscais são “as que exigem a interpretação e aplicação de quaisquer normas de Direito Fiscal substantivo ou adjetivo para a resolução de questões sobre matérias respeitantes ao exercício da função tributária da Administração Pública” (cfr. Ac. do Pleno do STA de 12.11.2009, proc. n.º 0366/09). Ora, a ação respeita ao cumprimento de um contrato administrativo, não envolvendo diretamente a interpretação e aplicação de disposições de direito fiscal, ou que se situem no campo da atividade tributária. Pretende-se apenas o pagamento de dívidas resultantes do não cumprimento pontual do contrato. Como vimos, a ação não tem por objeto um ato tributário ou o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido em matéria fiscal, mas a satisfação de um crédito emergente de um contrato administrativo. Mas, mesmo que se pretenda avançar pela distinção entre taxa e preço, sempre se dirá que a contrapartida exigida na ação consubstancia um preço devido pela prestação de um serviço público. À primeira vista, como o preço pago pela prestação do serviço público de fornecimento de água é um serviço que por essência pertence à titularidade do Estado, e portanto não pode ser objeto de oferta e procura, dir-se-á que tem as caraterísticas de taxa. Marcello Caetano, escrevia que “o preço pago pelas prestações fornecidas pelos serviços públicos geridos diretamente por pessoas coletivas de direito público tem a natureza jurídica de taxa e nessa qualidade está sujeito ao regime de cobrança das receitas fiscais” (cfr. Manual de Direito Administrativo, Vol. II, pág. 1061 - sobre a distinção entre taxa e preço, cfr. Alberto Xavier, Manual de Direito fiscal, 1974, pág. 53 e ss.; Sousa Franco, Manual de Finanças Públicas e Direito Financeiro, Vol. I, Lisboa, 1974, pág. 760, Teixeira Ribeiro, Finanças Públicas, pág. 262). Acontece que, no caso dos autos, a tarifa não regula as relações contratuais entre o Município e os consumidores, mas sim as relações entre o concessionário e o Município. Nesta relação, a tarifa tem por finalidade remunerar o concessionário pelos serviços contratados, assumindo assim a natureza de preço. Quando um serviço público é concedido, a tarifa é a principal fonte de retribuição do concessionário, mesmo que não chegue a cobrir o custo de produção (preço político). Marcello Caetano, dizia que a tarifa desempenha uma dupla função: “nas relações entre o concessionário e o público, a de regular o preço das prestações do serviço; nas relações entre concedente e concessionário, a de regular os termos em que aquele consente a este a remuneração da sua iniciativa e dos seus capitais” (Manual ob. cit. pág. 1100). Basta ler a legislação ao abrigo da qual foram celebrados os contratos de concessão e de fornecimento de água, para se qualificar a contrapartida do Município como um preço. A atividade de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, recolha, tratamento e rejeição de águas residuais urbanas, é uma atividade económica que, nos sistemas multimunicipais, pode ser concessionada pelo Estado a empresas cujo capital seja maioritariamente subscrito por entidades do setor público, nomeadamente autarquias locais (…). O regime jurídico de exploração e gestão dos sistemas multimunicipais e municipais dessa atividade consta do DL n.º 379/93, do DL n.º 319/94 (relativo ao abastecimento de água para consumo público) e do DL n.º 162/96 (relativo à recolha, tratamento e rejeição de efluentes). Os sistemas multimunicipais, aqueles que servem pelo menos dois municípios e exigem um investimento efetuado predominantemente pelo Estado (n.º 2 do art. 1.º da Lei n.º 88-A/97), são sistemas em «alta», ou seja, que funcionam a montante da distribuição de água ou a jusante da coleta e tratamento de efluentes e resíduos sólidos e que apenas podem ser criados e concedidos por decreto-lei (n.º 1 do art. 3.º do DL n.º 379/93). Os municípios que os utilizam são obrigados a proceder à ligação dos seus sistemas municipais a esses sistemas e à criação das condições para uma boa harmonização entre ambos os sistemas. Por isso, regra geral, a distribuição de água para consumo público e a recolha, tratamento e rejeição de efluentes é efetuada a coberto de duas relações contratuais: contrato de concessão entre o Estado e uma empresa de capitais maioritariamente públicos e um contrato de fornecimento entre o concessionário e os utilizadores (n.º 2 do art. 2.º do DL 379/93 e art. 5.º do DL n.º 319/94). O contrato de concessão é um contrato administrativo celebrado segundo as bases anexas ao DL 319/94 e que dele fazem parte integrante. No que aqui interessa, que é a qualificação da obrigação peticionada como taxa ou preço, o artigo 5.º do DL n.º 379/93 prescreve que o decreto-lei que estabelece a concessão deve prever a remuneração do investimento e a aprovação pelo Estado das tarifas a cobrar. As Bases XIII e XIV do contrato de concessão, que fazem parte integrante do DL n.º 319/94, regulam sobre o financiamento da concessionária e sobre os critérios para a fixação das tarifas: a primeira, considera fonte de financiamento as receitas provenientes das tarifas cobradas; e a segunda, considera que as tarifas são “fixadas por forma a assegurar a proteção dos interesses dos utilizadores, a gestão eficiente do sistema, o equilíbrio económico-financeiro da concessão e as condições necessárias para a qualidade do serviço”, devendo assegurar a amortização dos investimentos iniciais e posteriores, a manutenção, reparação e renovação dos equipamentos, a adequada remuneração dos capitais próprios da concessionária e atender ao nível de custos necessários para uma gestão eficiente dos sistemas. (…). As tarifas fixadas pelo Estado indicam o valor de cada metro cúbico de água fornecida pela concessionária ao utilizador. Através de contratos de fornecimento, os municípios utilizadores do sistema intermunicipal contratam um determinado volume de água medido à entrada dos reservatórios de chegada de cada utilizador, o qual é faturado com a periodicidade mensal (Base XXVIII e XXXI). Como se vê, nas relações entre concessionária e município utilizador, as tarifas visam cobrir os gastos de exploração e de equipamento do serviço público de fornecimento de água aos municípios, e portanto, apesar de aprovadas pelo concedente, assumem a natureza de preço fixo. Os utilizadores pagam à concessionária o volume de água e de efluentes contratado, calculando-se cada metro cúbito em função de uma tarifa de preços pré-fixada pela concedente. Ora, se o litígio está centrado no volume de água que a recorrida recebeu e não pagou e no volume de efluentes que entregou e não pagou, então o que está em causa é uma relação jurídica administrativa e não uma questão fiscal».
Sendo que a respeito da apreciação, em torno da questão se saber quais os tribunais competentes em razão da matéria para apreciarem e decidirem a questão de saber se são devidos os montantes respeitantes à taxa de recursos hídricos, vertidos nas faturas emitidas pela concessionária de sistema multimunicipal, é dito no Acórdão do TCA Norte de 13/01/2012, Proc. 00844/11.8BEBRG, in, www.dgsi.pt/jtcan, o seguinte: “A discussão da questão em presença, até pelos fundamentos aduzidos em sede de pretensão e articulado de oposição, passa pela aferição da legalidade e bondade de interpretação e aplicação de normas de direito fiscal com atinência ao exercício da função tributária da Administração, já que o que materialmente está em causa prende-se com o assegurar, através da faturação efetuada, do pagamento dos encargos tidos pela A. com a taxa de recursos hídricos por si devida e liquidada no quadro da relação jurídica fiscal que se estabeleceu entre a ARH e A. [no âmbito da incidência/sujeição subjetiva e objetiva à liquidação e pagamento da taxa recursos hídricos por parte da A. àquele ente público - cfr. arts. 68.º e 80.º da Lei n.º 58/05, 04.º, 05.º, 14.º e 16.º do DL n.º 97/08]. O objeto do litígio que o tribunal administrativo foi convocado a dirimir e decidir reconduz-se a apurar se são legalmente devidos e exigíveis da R. as quantias faturadas enquanto valores respeitantes a parcela reportada à recuperação do valor pago pela A. com os encargos legais obrigatórios, nomeadamente e no caso, com a taxa de recursos hídricos [cfr. arts. 20.º, 21.º e 22.º do DL n.º 97/08 e 82.º da Lei n.º 58/05]. Em discussão nos autos está, assim, o reflexo direto da relação jurídica fiscal que se estabeleceu e estabelece entre a ARH competente e a aqui A. [com a liquidação e pagamento anual da taxa de recursos hídricos cujo montante pago “adiantado” a concessionária tem o direito a ser ressarcida]. Nada tem que ver com um alegado incumprimento de obrigações decorrentes ou emergentes do contrato de fornecimento de água para consumo humano por parte da R. relativamente ao pagamento à A. do preço de tal fornecimento no prazo de 60 dias a contar da data de emissão das respetivas faturas. O litígio não se insere, por conseguinte, estritamente nas relações entre a concessionária e o utilizador, pedindo aquela o pagamento das quantias devidas pelo fornecimento de água a que estava obrigada por força daquele contrato de fornecimento. É que o diferendo não está centrado no volume e preço de água que a recorrida recebeu e não pagou. O que está efetivamente em causa e é pedido prende-se unicamente com o não pagamento duma parcela inserida nas faturas emitidas e que é a relativa à cobrança da taxa de recursos hídricos, pelo que a causa de pedir e o pedido não se enquadram no domínio da responsabilidade fundada no incumprimento do contrato de concessão, enquanto fonte duma relação jurídica administrativa, mas antes numa decorrência de relação jurídica fiscal visto estar em discussão a legalidade da interpretação e aplicação de disposições de direito fiscal, ou que se situa no campo da atividade tributária.” E mais à frente naquele aresto é dito o seguinte: “Colhido e aqui reiterado o entendimento acabado de reproduzir, com plena valia para a decisão da questão em discussão, temos apenas como parcialmente procedente o recurso jurisdicional que se mostra dirigido já que tão-só na vertente do pedido que recai sobre os juros de mora alegadamente devidos pelo atraso no pagamento dos fornecimento/consumos de água de Setembro de 2010 nos situamos, de harmonia com a fundamentação aduzida no ponto antecedente, no quadro da relação jurídica contratual administrativa para a qual aquele TAF goza de competência em razão da matéria. Com efeito, apenas e só nesse âmbito estamos em presença de alegada responsabilidade decorrente de incumprimento de obrigações insertas no contrato de concessão, envolvendo litígio entre a concessionária e o utilizador quanto às relações dele emergentes. Naquele restrito quadro do pedido/pretensão o diferendo está centrado no volume/preço de água que a recorrida recebeu e que alegadamente não pagou tempestivamente, o que se consubstancia numa relação jurídica administrativa. Já o invés importa caracterizar e considerar quanto a todo o demais pedido e objeto de pretensão formulado nos autos pela A., aqui recorrente, porquanto em consonância com o entendimento atrás expendido nos situamos no quadro estamos no âmbito de relação jurídica tributária visto que o litígio não se insere estritamente nas relações entre a concessionária e o utilizador em que aquela pede a esta o pagamento de quantia devida pelo fornecimento de água a que estava obrigada por força daquele contrato de fornecimento e que não foi pago ou não o foi tempestivamente. O que efetivamente está em causa e é pedido naquele segmento reconduz-se unicamente ao não pagamento duma parcela inserida nas faturas emitidas relativa à cobrança da taxa de recursos hídricos, pelo que a causa de pedir e o pedido nesse domínio não se enquadra na responsabilidade fundada no incumprimento do contrato de concessão, enquanto fonte duma relação jurídica administrativa, mas antes numa decorrência de relação jurídica fiscal visto estar em discussão a legalidade da interpretação e aplicação de disposições de direito fiscal, ou que se situa no campo da atividade tributária, impondo-se neste âmbito a manutenção do julgado aqui sindicado.”
Na situação dos autos temos precisamente em discussão, entre os valores vertidos nas faturas emitidas pela autora na decorrência dos contratos, de fornecimento e de recolha, celebrados em 15/09/2000 entre autora e réu Município, discriminadas na sua petição inicial, para cujo pagamento pede a condenação do Município (no valor total de 551.188,59 € - vide alínea a) do pedido formulado a final da petição inicial), os que são referentes à taxa de recursos hídricos imputados naquelas mesmas faturas. Valores que são descriminados nos artigos 30º, 34º, 38º, 42º, 46º e 50º da Petição Inicial.
No despacho-saneador de 08/04/2014 a Mmª Juiz do Tribunal a quo considerou aquele tribunal materialmente competente in totum para conhecer e decidir a causa.
Não pode todavia manter-se tal decisão, pelos fundamentos já constantes nos arestos citados, aqui igualmente válidos. Com efeito, no que tange aos valores referentes à taxa de recursos hídricos imputados naquelas mesmas faturas, peticionados pela autora e por ela descriminados nos artigos 30º, 34º, 38º, 42º, 46º e 50º da Petição Inicial, e respetivos juros de mora, tem que concluir-se, por se tratar de questão fiscal saber se os mesmo são ou não devidos pelo Município réu, de litigio a dirimir pelos tribunais tributários.
Apenas cabendo aos tribunais administrativos decidir, por sim, nessa parte respeitar a questão atinente a eventual incumprimento contratual, a questão de saber se são devidos os demais montantes peticionados pela autora. Pelo que apenas nesta parte, e para tal efeito, deve manter-se o decidido (que ademais não foi objeto de impugnação no presente recurso).
Já quanto à questão de saber se são devidos os valores referentes à taxa de recursos hídricos, por a mesma respeitar a questão fiscal, emergindo de relação jurídica tributária, deveria a Mmª Juiz do Tribunal a quo ter considerado aquele tribunal materialmente incompetente para a apreciar e decidir, declarando competentes para o efeito os tribunais tributários. Não pode, pois, manter-se o decidido, nesta parte, merecendo provimento o recurso. O que implica que deva ser, nessa parte, revogada a decisão objeto do presente recurso. Ainda que tal não conduza à absolvição do réu da instância, como propugna o recorrente, que se mantém, prosseguindo o processo para conhecimento do mérito da pretensão no que respeita à parte relativamente à qual o tribunal administrativo é o materialmente competente, apenas obstando a que aquele tribunal aprecie o mérito da pretensão na parte relativamente à qual não detém competência, por a mesma pertencer aos tribunais tributários.
Importando, porque em tempo, referir que a circunstância de o réu, aqui recorrente, não ter suscitado a questão da incompetência em razão da matéria na sua contestação, mas apenas em articulado posterior, não obstava à apreciação de tal questão em sede de despacho-saneador, como sucedeu, em face da natureza de ordem pública da questão da competência dos tribunais, que impõe o seu conhecimento oficioso enquanto não houver sentença transitada em julgado sobre o fundo da causa, nos termos do disposto nos artigos 13º do CPTA e 97º nº 1 do CPC novo.

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IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em conceder provimento ao recurso jurisdicional, revogando-se a decisão proferida no despacho-saneador, no segmento recorrido, declarando-se incompetente em razão da matéria o tribunal administrativo de círculo de Castelo Branco para apreciar e decidir a pretensão na parte que respeita aos valores referentes à taxa de recursos hídricos e respetivos juros de mora, obstando assim ao conhecimento do mérito da pretensão nessa parte, prosseguindo os autos para conhecimento do mais, se a tanto na mais obstar.
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Custas pelo recorrido.
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Notifique.
D.N.
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Lisboa, 12 de Março de 2015
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Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora)


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António Paulo Esteves Aguiar de Vasconcelos


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Pedro José Marchão Marques