Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2199/13.7BELRS
Secção:CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO
Data do Acordão:06/07/2018
Relator:BENJAMIM BARBOSA
Descritores:NULIDADE DA SENTENÇA
CÓDIGO ADUANEIRO COMUNITÁRIO
VALOR TRANSACCIONAL
VALOR ADUANEIRO
A........... M........... T.......
DADOS ESTÍSTICOS.
Sumário:1.Só a absoluta falta de fundamentação é que determina a nulidade da sentença; a insuficiência, obscuridade ou mediocridade da fundamentação apenas sujeita a sentença ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.

2.Ao proferir a sentença o juiz transpõe para esta peça processual a matéria de facto pertinente que considera adquirida para o processo, reconstituindo e fixando objetivamente a situação de facto subjacente ao litígio que terá de dirimir.

3.A livre apreciação da prova não significa livre arbítrio, mas prudente fixação dos factos.

4.Os factos notórios e as presunções legais não necessitam de prova. Os primeiros são entendidos como aqueles que são do conhecimento geral. As presunções são um processo indireto de prova com uma componente racional, através do qual se induz a realidade de um facto como consequência de outro (ou outros) cuja realidade é indiscutível.

5. As presunções podem ser legais (praesumptiones juris), quando a dedução lógica é efetuada pela própria lei; ou judiciais (praesumptiones hominis), quando essa dedução é realizada pelo tribunal.

6. As presunções legais designam-se juris et de jure quando não podem ser afastadas por prova em contrário, por a lei o proibir (art.º 350.º, n.º 2, do CC). As presunções legais que podem ser ilididas mediante prova em contrário, são chamadas presunções juris tantum e determinam a inversão do ónus de prova.

7. A análise crítica da prova, que permite ao juiz formar a sua convicção, incide sobre os meios de prova. No caso dos depoimentos releva a razão de ciência do depoente, a sua credibilidade e fiabilidade, bem como a consistência das suas declarações quando comparada com os restantes meios de prova. No que concerne aos documentos, é determinante a sua valia e aptidão intrínseca para a prova ou impugnação dos factos a que são oferecidos, bem como a sua genuinidade, integridade e completude.

8. As normas que exigem a motivação da prova impõem que o juiz justifique a sua decisão, expondo as razões em forma de argumentações racionalmente válidas, lógicas, racionais e críticas, sem nota de qualquer arbitrariedade, traduzindo uma cabal e completa justificação do conjunto de razões que subjazem à decisão do juiz em matéria de prova, de tal modo que esta possa ser examinável e cognoscível pelos seus destinatários diretos (as partes e respetivos mandatários), mas também pela própria comunidade jurídica e até pela sociedade em geral, de tal modo que essa motivação possa ser encarada como fator de legitimação da própria decisão.

9. O Código Aduaneiro Comunitário estabelece, como critério prioritário para a fixação do valor da mercadoria importada, o do seu valor transacional.

10. Quando não for possível determinar 0 valor transacional o valor aduaneiro das mercadorias importadas deverá ser efetuado com base em métodos substitutivos, segundo a sequência estabelecida nas alíneas a) a d) do n.º 2 art.º 30.º do Código Aduaneiro e pela respetiva ordem.

11. Se mesmo assim não for possível fixar o valor aduaneiro este será então estabelecido através do método de último recurso, previsto no art.º 31.º do Código Aduaneiro

12. Os critérios legais de fixação do valor aduaneiro de uma mercadoria são sequenciais, apresentando entre si um nexo de subsidiariedade, não podendo o valor aduaneiro ser fixado com base numa disposição sem que a precedente tenha sido excluída por impossibilidade de o determinar. Essa impossibilidade tem de ser absoluta e não meramente relativa, não bastando uma mera dificuldade encontrada na aplicação de um critério para justificar o abandono do mesmo e a passagem para o seguinte e assim sucessivamente.

13. É ilícita a conduta de uma autoridade aduaneira que utilize o método do último recurso sem conseguir justificar cabalmente o abandono dos métodos precedentes.

14. A circunstância do pagamento de uma mercadoria ser feito para uma conta titulada em nome do sócio-gerente da importada no país de exportação, não determina, por si só, a impossibilidade de determinar o valor aduaneiro pelo “método transacional” nem autoriza que se passe, de imediato, ao método do último recurso.

15.Mesmo em situações de coligação entre exportador e importador o Código Aduaneiro não impede a fixação do valor aduaneiro com base no valor transacional.

16. O procedimento de revisão das declarações aduaneiras comporta atos materiais de controlo e de averiguação de preços de mercadorias idênticas ou similares introduzidas no mercado em regime de livre prática.

17. Nesse procedimento a autoridade aduaneira deve solicitar a colaboração do importador para a determinação do valor transacional.

18. O Acordo sobre a aplicação do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio consagra o primado do valor transacional e proíbe práticas diferentes ou discriminatórias, discricionárias ou subjetivas das autoridades aduaneiras, e impõe a determinação de um valor aduaneiro, justo, correto e neutral.

19. A remissão do n.º 1 do artigo 31.º do Código Aduaneiro para o capítulo 3 do mesmo código, implica que as disposições gerais deste capítulo, de que faz parte o artigo 32.º do mesmo código, se apliquem igualmente no caso de a determinação do valor aduaneiro de uma mercadoria importada ser efetuada pelo método do último recurso.

20. A regulamentação da União relativa à avaliação aduaneira tem por objetivo o estabelecimento de um sistema equitativo, uniforme e neutro que exclui a utilização de valores aduaneiros arbitrários ou fictícios.

21. A circunstância de uma entidade importadora não fornecer informações consideradas fidedignas, não permite, por si só, que possam ser utilizados na determinação do valor aduaneiro, sem mais, “dados disponíveis na União” que não sejam compatíveis com o disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 31.º do Código Aduaneiro Comunitário.

22. Os dados estatísticos fornecidos pela A........... M........... T......., do OLAF, não podem ser utilizados na determinação do valor aduaneiro.

23. A A........... M........... T....... é uma ferramenta de tecnologia de informação que usa métodos estatísticos avançados, através de um algoritmo estatístico, para a deteção de padrões relevantes de fraude aduaneira, produzindo dados estatísticos indutivos, probabilísticos, e não dados estatísticos descritivos.

24. A identificação dos comportamentos fraudulentos é feita usando um quantil de regressão, permitindo a identificação de prováveis fraudes às tarifas aduaneiras e a análise de casos particulares.

25. A A........... M........... T....... não é totalmente fiável, por gerar falsos positivos.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:

1 - Relatório

1.1. As partes e o objeto do recurso

A Fazenda Pública, não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial que S… – Sociedade ……………………., Lda., deduziu contra a liquidação n.º …., de 06-08-2013, veio apresentar recurso jurisdicional em cujas alegações expôs as seguintes conclusões:

1.ª A decisão recorrida enferma de nulidade pela falta de exame crítico das provas relevantes para a apreciação da causa e, por não ter especificado os fundamentos de facto e de direito que a justificaram.

2.ª No âmbito da ação inspetiva realizado pela DOS à ora recorrida, a equipa inspetiva analisou todas as declarações de importação de calçado e todos os documentos a ela apensos com particular incidência na análise dos pagamentos efetuados aos fornecedores do calçado importado.

3.ª A equipa inspetiva constatou que o documento de pagamento relativo a cada fatura, que estava registado na conta corrente de cada fornecedor, consistia num pagamento comprovativo de uma transferência internacional de uma conta bancária da empresa para uma conta bancária na China, em nome do sócio - gerente da empresa importadora "S… …………………... Lda.", C… S…

4.ª Esse facto condicionou a determinação do valor aduaneiro pelo método transacional ou seja pelo valor aduaneiro declarado, previsto no art.° 29.° do Código Aduaneiro Comunitário e, por isso, deveria ser recusado!

5.ª Impunha-se prosseguir para os métodos previstos nas alíneas a), b), c) e d) do n.° 2 do art° 30 ° do CAC, até exatamente, à primeira destas alíneas que o permitisse determinar, a saber:

6.ª Valor transacional de mercadorias idênticas,

7.ª Valor transacional de mercadorias similares,

8.ª Valor baseado no preço unitário das vendas na comunidade das mercadorias importadas,

9.ª Valor calculado nos custos de produção.

10.ª Depois de paulatinamente todos os métodos previstos no n.° 2 do art.° 30.° do CAC terem sido analisados e, subsequentemente, rejeitados pela falta de aplicabilidade ao caso vertente.

11.ª Restava a possibilidade da aplicação do método do último recurso previsto no art.° 31.° do CAC, ou seja, se o valor aduaneiro das mercadorias não puder ser determinado por aplicação dos art.° (s) 29.° e 30.° será determinado, com base nos dados disponíveis na Comunidade, por meios razoáveis compatíveis com os princípios e as disposições gerais:
¾ Do acordo relativo à aplicação do art.° VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio;
¾ Do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio;
¾ Das disposições do capítulo sobre valor aduaneiro do CAC. • 57.°

12.ª Neste quadro, não dispunha a inspeção de outros elementos com vista a estabelecer um valor de substituição que não seja o recurso aos valores médios constantes das bases de dados disponibilizados na ferramenta AMT (A........... M........... T.......) do OLAF (European Anti-Fraud Office).

13.ª A sentença ora recorrida enferma de juízo crítico relativamente à argumentação apresentada sobre a determinação do valor aduaneiro das mercadorias:

a) O valor aduaneiro proposto está revestido de todos os contornos legais e perfeitamente legitimado, tendo em conta, sobretudo, os preços médios disponibilizados pela OLAF- European Anti-Fraud Office (Departamento da Luta Anti-fraude da União Europeia) e abrangidos pela operação "DISCOUNT".

b) O método do último recurso foi aceite no processo Técnico de Contestação n.º 12/2013, do Conselho Técnico Aduaneiro com despacho a° 103/2013 de 26/12/2013 do Senhor Diretor-Geral da AT, homologado por despacho n.° 670/2013, de 31/12/2013 do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

14.ª Neste sentido, entendemos que a decisão recorrida da 3.ª Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa deve ser considerada nula, nos termos do n.° 1 do art.° 125.° do CPPT, conjugado com o n.° 4 do art.° 607.° e alínea b) do n.° 1 do art.° 615° do C.P.C.

Nestes termos e nos demais de direito e com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, revogando-se a douta sentença recorrida, confirmando-se integralmente a liquidação objeto da impugnação judicial, e, assim, será respeitado o DIREITO e feita JUSTIÇA!

Contra-alegou a Recorrida, S… — Sociedade ………………………., Lda, concluindo nos seguintes termos:

1.ª A douta sentença faz rigorosa aplicação do direito à matéria de facto provada.

2.ª A partir de 2010 a Alfândega de Alverca foi detentora de uma tabela de valores mínimos, do calçado e do vestuário importados da China, a partir do qual aceitava ou corrigia a declaração das mercadorias sem questionar o valor.

3.ª Em todas as importações referidas nos autos, o despachante interveniente procedeu à consulta da Alfândega para se pronunciar sobre o valor de cada fatura e qual o resultado da comparação com o valor constante da tabela;

4.ª Dessa consulta resultou a correção do valor de algumas importações o que obrigou à emissão de novas faturas de acordo com o valor indicado pelo funcionário em função do que dizia a tabela.

5.ª Nestes casos, as autoridades aduaneiras estão a corrigir pela segunda vez, o que fazem à margem da lei;

6.ª Noutras importações, consultada a tabela, o funcionário informou que era de aceitar o valor constante da fatura, presumivelmente porque o valor da tabela era igual ou inferior ao valor da fatura:

7.ª Nunca foi dada a conhecer a tabela nem foram divulgados os seus valores, nem se conhece qual o critério seguido na correção do valor aduaneiro das mercadorias a declarar.

8.ª Nestas correções do valor existe um duplo; nem a tabela está conforme com a lei, nem são admissíveis tabelas secretas, nem a OLAF tem competência para interferir na gestão aduaneira, para efeitos de correção do valor aduaneiro das mercadorias.

9.ª O artigo VII do GATT e a sua regulamentação, que consagram os critérios a seguir na determinação do valor aduaneiro, foram vertidos no Código Aduaneiro (abreviadamente CAC) na versão vigente ao tempo das importações - (Reg (CEE) 2913/92 do Conselho de 12/10/1992.

10.ª Segundo o CAC, o primeiro critério é aquele que faz coincidir o valor aduaneiro com o valor transacional:

Artigo 29°.

1. O valor aduaneiro das mercadorias importadas é o valor transaccional, isto é, o preço efectivamente pago ou a pagar pelas mercadorias quando são vendidas para exportação com destino ao território aduaneiro da Comunidade, eventualmente, após ajustamento efectuado nos termos dos artigos 32°. e 33°., desde que:

a), b, c)

11.ª O valor aduaneiro e o valor transacional coincidirão se compreenderem algumas despesas adicionais, todas elas tipificadas na no art. 32° do CAC.

12.ª Perdeu-se, neste caso, a ideia axial pela qual se há-de apurar o valor aduaneiro, que passa pelo apuramento do preço efectivamente pago ou pagar, o qual deve refletir as despesas supra citadas e outras previstas no CAC.

13.ª Tanto o econométrico e indecifrável método de determinação do valor aduaneiro criado pela OLAF e aplicado pela ultra zelosa DOS, como a tabela da Ite. Esta justificação é admissível porque não cabe na metodologia de correção prevista na lei.

14.ª Para aplicar estes métodos, os Srs Fiscais nem precisavam de se levantar da secretária. Bastava-lhes clicar na net em www.alibabacom e o maior site do mundo para publicitação de mercadorias dava-lhes o valor de mercadorias idênticas ou/e similares. Só teriam que adicionar as despesas de transporte e do seguro.

15.ª A douta sentença não merece qualquer censura, fez diligente apuramento da prova e sábia aplicação do direito, devendo, por isso, ser confirmada.


*

Neste tribunal a EMMP emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

*

Colhidos os vistos legais vem o processo à conferência.

*,

1.2. Questões a Decidir

¾ Nulidade da sentença;

¾ Método do último recurso para determinação do valor aduaneiro de uma mercadoria;

¾ Aplicação de dados estatísticos obtidos em ambiente de tecnologia de informação na determinação do valor aduaneiro de uma mercadoria.


*

2 – Fundamentação

2.1 - De facto

2.1.1. – Factos provados

A sentença considerou provados os seguintes factos:

1) A impugnante, é uma sociedade por quotas de responsabilidade limitada, que se dedica à comercialização de calçado importado da China, possuindo duas lojas de revenda, uma sita na sede no P… A…, T… dos C…, Lote …, loja 1 e, outra, sita no P… V… (cfr. fls. 6 do processo administrativo junto aos autos);

2) A impugnante foi sujeita a uma ação de inspeção, levada a efeito, pela Divisão de Operação Sul (E RAM) da Direção de Serviços Antifraude Aduaneira, sob a autorização n.º 12.021, com início a 17.12.2012 e fim em 06.06.2013 (cfr. fls. 6 do processo administrativo junto aos autos);

3) Em resultado da ação inspetiva a referida Divisão Operacional Sul elaborou um relatório com as seguintes conclusões:

«(…) A S…., Lda., dedica-se à comercialização de calçado importado da China, possuindo actualmente duas lojas de revenda. Uma sita na sua sede, em P… A… e outra no P… V…. Além destas lojas possui um armazém em Porto, onde armazena a mercadoria que comercializa. A S…, Lda., vende apenas a revendedores, pelo que só aceita encomendas de caixas completas, não comercializando sapatos aos pares. Em cada caixa poderão existir sapatos de vários números, do mesmo modelo e cor.

A empresa mantém contabilidade organizada de acordo com as normas legais em vigor, possuindo Técnico Oficial de Contas externo. Utiliza o sistema de inventário intermitente, executando inventários no final de cada ano. Não possui gestão de stocks, não existindo ligação directa entre o programa de facturação já certificado pela AT - certificação n.º 1350/DGCI) e os stocks.

No âmbito da presente acção inspectiva analisaram -se todas as declarações de importação de calçado bem como todos os documentos a elas apensos, tendo -se confrontado as mesmas com o respectivo registo na contabilidade.

Constatou-se que algumas das declarações de importação seleccionadas para controlo, tinham sido objecto de revisão, por iniciativa da estância aduaneira, no que ao valor aduaneiro diz respeito, uma vez que o mesmo foi considerado excessivamente baixo, quando comparado com os valores médios aceitáveis divulgados pela Comissão Europeia, para este tipo de mercadoria, originária da China. Uma vez que já tinham sido objecto de análise pela estância aduaneira, essas declarações não foram tomadas em consideração na análise do valor aduaneiro efectuada no âmbito da presente secção inspectiva.

Nos termos do disposto no artigo 29.º do CAC - Código Aduaneiro Comunitário, aprovado pelo Reg. (CEE) n.º 2913/92 do Conselho de 12 de Outubro, o valor aduaneiro das mercadorias importadas é o valor transaccional, isto é, o preço efectivamente pago ou a pagar pelas mercadorias quando são vendidas para exportação, com destino ao território Aduaneiro da Comunidade.

Uma vez que o valor aduaneiro relativo ao calçado declarado à Alfândega, aquando do desalfandegamento se afigura demasiado baixo quando comparado com o valor médio da mercadoria em causa, analisaram-se os pagamentos aos fornecedores do calçado importado.

Foram analisados todos os pagamentos das facturas de importação anexas às declarações de importação seleccionadas.

Constatou-se que o documento de pagamento que estava registado na conta-corrente de cada fornecedor para cada factura, consistia num documento comprovativo de uma transferência internacional de uma conta bancária da empresa para uma conta bancária na China em nome do sócio gerente da S…, C… S…, não fazendo qualquer referência ao fornecedor ou à factura. Consequentemente, torna-se impossível estabelecer uma ligação inequívoca entre as transferências efectuadas e as facturas ou transacção comercial a que se referem. Por conseguinte, não é também possível identificar os pagamentos que se reportam às facturas apresentadas à Alfândega, para efeitos de importação.

Declarado às autoridades aduaneiras, conjugada com a circunstância de esse valor ser exageradamente baixo, quando comparado com os preços médios razoáveis de mercado, são causa justificativa para a não-aceitação do valor declarado como o valor transaccional, nos termos do disposto do artigo 29.º do CAC.

Não sendo aplicável o método do valor transaccional, por inexistência de provas na empresa da correcção de tal valor, conjugada com o facto de os preços da mercadoria importada serem manifestamente inferiores aos preços médios admitidos para este tipo de mercadoria, nos termos do CAC, tem de se passar sucessivamente à aplicação dos outros métodos de determinação do valor aduaneiro, previstos no artigo 30º do CAC, e, em último caso, ao método do último recurso, previsto no artigo 31º daquele normativo legal.

O recurso aos outros métodos de determinação do valor aduaneiro deve ser feito pela ordem prevista na legislação supra referida. No caso de não aplicação do valor transaccional deve recorrer-se ao primeiro método de substituição, ou seja, ao método comparativo, método que se subdivide no do valor transaccional de mercadorias idênticas e no do valor transaccional de mercadorias similares. Verificando-se impossibilidade cumulativa da sua aplicação, seguem-se, respectivamente, os “métodos dedutivo e do valor calculado. Finalmente é admitida a aplicação do método do último recurso.

De facto o CAC, prevê que quando o valor aduaneiro não puder ser determinado por aplicação do art. 29º há que utilizar sucessivamente e por esta ordem os seguintes métodos previstos no n.º 2 do artigo 30º deste regulamento:

a) Valor transaccional de mercadorias idênticas vendidas para exportação com destino a Comunidade e exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar ou em momento muito próximo:

b) Valor transaccional de mercadorias similares vendidas para exportação com destino à Comunidade e exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar ou em momento muito próximo:

c) Valor baseado no preço unitário correspondente às vendas na Comunidade das mercadorias importadas ou de mercadorias idênticas ou similares importadas totalizando a quantidade mais elevada feitas a pessoas não coligadas com os vendedores;

d) O valor calculado igual à soma do custo das matérias-primas e das operações de fabrico utilizadas para produzir as mercadorias importadas, de um montante representativo do lucro e de despesas gerais.

Na presente situação não é possível aplicar o valor transaccional de mercadorias idênticas, uma vez que se considera, mercadoria idêntica, uma mercadoria da mesma natureza ou da mesma espécie vendida por um vendedor a um comprador não coligado, e mediante os dados disponíveis, não é passível asseverar a identidade com outras mercadorias exportadas com destino à Comunidade.

O mesmo acontecendo relativamente ao valor transaccional de mercadorias similares. Consideram-se similares mercadorias produzidas no mesmo pais que as mercadorias a avaliar que sem serem iguais apresentam características semelhantes. (art.º 142 n.º 1 das DAC). A qualidade das mercadorias e sua reputação são elementos a tomar em consideração, pelo que se torna impossível, à posteriori, asseverar que outras mercadorias já importadas se revelam similares às ora em análise, correndo-se o risco de obter valores que não correspondem aos reais valores de mercado.

Também pelas mesmas razões não é possível calcular o valor aduaneiro do calçado aplicando o método indicado na alínea C.

Por fim, quanto ao método indicado em d), diga-se que não é aplicável, na medida não é possível determinar com exactidão o custo de matérias-primas e de fabricação do calçado em apreço.

Não sendo possível aplicar os métodos acima referidos resta-nos o método do último recurso. O n.º. 1 do artigo 31º do CAC dispõe que, nestes casos, o valor aduaneiro deve ser determinado com base nos dados disponíveis na Comunidade, por meios razoáveis compatíveis com os princípios e as disposições gerais do Acordo relativo à aplicação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e o Comércio e ainda com base nas disposições dos artigos 28° e 36.º do CAC.

Haverá assim que encontrar um preço que consista numa média dos valores de importação no espaço comunitário, recorrendo a dados estatísticos disponíveis.

Assim, tomou-se por base o preço médio de mercadorias exportadas da China, com destino à Comunidade.

Em resumo:

- Após uma análise cuidada dos elementos mantidos pela empresa na sua contabilidade;

-Tendo em conta os preços médios aceitáveis para este tipo de mercadoria, oriunda da China, no período mais próximo possível, disponibilizados pela O.L.A.F. - European Anti- Fraud Office (Departamento da luta Antifraude da União Europeia)

(vide anexo V onde consta documento da OL AF com indicação das posições pautais em causa e respetivo preço médio), resultante de um estudo elaborado pela própria OLAF, no âmbito de uma acção de controlo conjunta, a nível comunitário.

Concluiu-se que o valor declarado pela empresa aquando do desalfandegamento não pode ser aceite, tendo sido calculado novo valor, de acordo com o acima explicitado, e conforme demonstrado no mapa do anexo II.

Importa sublinhar que na coluna 16 do referido mapa se encontram elencados os preços médios calculados pela OLAF para mercadorias com origem China, para cada uma das posições pautais Inseridas na coluna 15, do mesmo mapa.

Sendo o valor aduaneiro calculado de acordo com o artigo 31° do CAC superior ao declarado pela Shenale para efeitos de desalfandegamento, e uma vez que os direitos aduaneiros são determinados peta aplicação de uma taxa percentual incidente sobre aquele, e não tendo, em sede de audição prévia, a empresa apresentado probatório suficiente para confirmar a veracidade do valor por si declarado no momento do desalfandegamento da mercadoria, constituiu-se dívida em sede de direitos aduaneiros.

Nos termos do n.º 1 do artigo 214º do Código Aduaneiro Comunitário (CAC), o montante de direitos aplicáveis a uma mercadoria é determinado com base nos elementos de tributação específicos dessa mercadoria no momento da constituição da dívida aduaneira.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º1, do artigo 201º do CAC, é facto constitutivo da dívida a introdução em livre prática de uma mercadoria sujeita a direitos de importação, considerando-se a mesma constituída, nos termos do n.º 2, no momento da aceitação da declaração aduaneira em causa.

Os cálculos efectuados para determinação da dívida em sede de direitos aduaneiros encontram-se demonstrados no mapa do anexo II.

Constitui-se também dívida em sede de IVA - Imposto Sobre o Valor Acrescentado, uma vez que, o valor tributável (em sede de IVA) na importação de bens é constituído pelo valor aduaneiro determinado de harmonia com as disposições comunitárias em vigor, tornando-se o imposto (IVA) – “exigível no momento determinado pelas disposições aplicáveis aos direitos aduaneiros, sejam ou não devidos esses direitos”, nos termos dos artigos 7.º, n.º 1 c) e 17.º do Código do IVA, a provado pelo Dec. Lei n.º 394 B/84 de 26/12.

Assim, e com os fundamentos atrás enunciados, foi calculada dívida no montante total de 296.046.42€ (duzentos e noventa e seis mil e quarenta e seis euros e quarenta e dois cêntimos), dos quais 114.135,00€ (cento e catorze mil e cento e trinta e cinco euros) correspondem a direitos aduaneiros e 181.911.42€ (cento e oitenta e um mil e novecentos e onze euros e quarenta e dois cêntimos) correspondem a IVA, conforme Mapa em anexo II. Aos montantes apurados acrescem juros compensatórios legalmente exigíveis.

Uma vez que os declarantes dos DAU’s para os quais foram calculados dívida são solidariamente responsáveis pela mesma, propõe -se que sejam também notificados das presentes conclusões. (…)» (cfr. fls. 8 a 10 do processo administrativo junto aos autos):

4) Em resposta ao solicitado pela Alfândega de Lisboa (DSAFA) a OLAF enviou o preço por quilograma e fórmula de cálculo, referente aos códigos Aduaneiros requerido (posições pautais) n.º ………….: 4,88€/Kg; n.º……….: 5,33€/Kg; n.º …………..: 9.54€/Kg e n.º…………: 5,88€/Kg (cfr. fls. 39 a 41 do processo administrativo junto aos autos);

5) Decorre dos autos que, no âmbito da ação de inspeção foi requerido pela ora impugnante e instaurado processo técnico de contestação a que coube o n.º12/20136, do Conselho Técnico Aduaneiro;

6) Em 07.06.2013, a Divisão Operacional do Sul da Direção de Serviços Antifraude Aduaneira, remeteu ao Director Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, através do ofício n.º 0590 de 07.06.2013, o referido processo técnico de contestação, acompanhado da informação de fls. 50 a 56 (cfr. fls. 48 do processo administrativo junto aos autos);

7) Em face da informação, de fls. 52 do PA junto aos autos, a oponente foi notificada através do ofício n.º 3… de 24.06.2013, em 27.06.2013, data do aviso de receção, para prestação da garantia dos montantes em dívida devido à instauração de processo técnico de contestação (cfr. fls. 57 do processo administrativo junto aos autos);

8) Em 06.08.2013, foi efectuada a liquidação especial n.º 7….registada com o n.º 2013/9… da dívida aduaneira, no montante de €316.666,08 apurada da seguinte forma:

- Direitos Aduaneiros – Rubrica 8…: €114.135,00

- IVA – Txa Normal – Rubrica 4…: €181.911,42

- Juros Comp. S/Dto- Rubrica 6…: €7.949,80

- Juros Comp. S/IVA- Rubrica 6…: €12.669,86

(cfr. fls. 84 do processo administrativo junto aos autos)

9) Através do ofício n.º 4… de 06.08.2013, o representante legal da impugnante foi notificado para pagamento do montante liquidado, em 09.08.2013, data do aviso de receção, tendo o oficio o seguinte conteúdo:

«(…) Serve o presente ofício para dar conhecimento a V.Exa, do teor do ofício 4009 de 2013-08-06, enviado à empresa “S… – Sociedade ……………….., Lda.”, para efeitos de pagamento da dívida calculada com base no relatório final da acção de natureza inspectiva n.º 1…. Levada a cabo pela Divisão Operacional do Sul da Direcção de Serviços Antifraude, por falta de constituição de garantia e por força do é 43.º do Código Aduaneiro Comunitário, aprovado pelo Regulamento n.º 2913/92., do Conselho, de 12 de Outubro. (…)»;

10) A Diretora da Alfândega de Alverca, através de FAX n.º 4026 de 07.08.2013 informou a Direção de Serviços Antifraude – Divisão Operacional do Sul que, após os intervenientes terem sido notificados para prestar garantia, sendo infrutíferos esses esforços, procedeu à liquidação e respetiva notificação para pagamento da mesma (cfr. fls. 83 do processo administrativo junto aos autos);

11) O Administrador da impugnante, identificado com cartão de residente n.º 8… tomou conhecimento pessoal, através do oficio n.º 4153 de 12.08.2013, da notificação e informação para pagamento da divida registada com a liquidação n.º RLB 2013/9001930 de 06.08.2013 (cfr. fls. 87 a 91 do processo administrativo junto aos autos);

12) Em 30.09.2013 foi instaurado processo de execução fiscal no Serviço de Finanças de ................. com o n.º 1…, pela quantia exequenda de €316.666,08 (cfr. fls. 123 a 125 do processo administrativo junto aos autos);

13) Em 26.12.2013, o Diretor Geral dos Impostos, no âmbito de análise ao Processo Técnico de Contestação proferiu Despacho n.º 103/2013, de cujo teor se retira:

«(…) Decide-se no que atende ao litígio sub judice, designadamente no que se refere aos ajustamentos ao valor a duaneiro, ser de aplicar o critério, tal como proposto pelos serviços de inspeção da Divisão Operacional do Sul, que tem por base os “preços médios”, fixados pela Comissão para as mercadorias em causa, nos termos dos artigos 30.º e seguintes Código Aduaneiro Comunitário, aprovado pelo Regulamento (CEE) n.º 2913/92, do Conselho de 12 de Outubro, devendo, in casu, usar -se o método do último recurso, previsto no artigo 31.º deste normativo legal, com fundamento ainda no art.º 181- A, das Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário, aprovado pelo Regulamento (CEE) n.º 2454/93 da Comissão, de 2 de Julho de 1993.(…)» (cfr. fls. 127 a 134 do processo administrativo junto aos autos)

14) O referido despacho foi objeto de homologação por Despacho n.º370/2013 de SESEAF, em 31.12.2013 (cfr. fls. 127 do processo administrativo junto aos autos)

15) A Divisão Operacional do Sul, através do ofício n.º 0181 de 24.02.2014 informou a Diretora da Alfândega de Alverca do despacho do Diretor Geral dos Impostos e bem assim da notificação da impugnante e dos responsáveis solidários (cfr. fls. 126 do processo administrativo junto aos autos);

16) O valor aduaneiro das mercadorias importadas, para desalfandegamento, referente aos anos de 2010 a 2012 foi previamente sujeito a consulta por parte dos serviços da Alfandega de Alverca/Bobadela (cfr. depoimento unânime das testemunhas da impugnante);

17) As mercadorias importadas pela impugnante, calçado em plástico de Homem, Senhora e Criança, originário da China, de muito baixa qualidade, eram destinadas a ser vendidas apenas em feiras (cfr. depoimento das testemunhas da impugnante);

18) Os sapatos de sola de borracha e parte superior de matéria têxtil e os sapatos de sola e parte superior de plástico, para senhora foram submetidos à Alfândega, através das declarações aduaneiras de fls. 265 a 268 dos autos com os códigos aduaneiros 64041990, 6402991 e 64029996;

19) A impugnante em termos contabilísticos, fazia inventário intermitente, não dispunha de gestão de stocks não existindo, igualmente, ligação direta entre o programa de facturação e os stocks (cfr. depoimento da testemunha da Alfândega)


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2.1.2 – Factos não provados:

A sentença considerou não provado que:

20) “Não resulta provado a impossibilidade da aplicação do método comparativo de mercadorias idênticas ou similares, previsto nas al.s a) e b) do n.º2 do art.º30 do CAC, no apuramento dos direitos aduaneiros e IVA da liquidação sindicada nos autos”;

E que

21) “Não se provaram outros factos com relevância para a presente decisão”.


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2.1.3. Motivação

A sentença motivou a decisão relativa à matéria de factos nestes termos:

“A matéria de facto, dada como assente nos presentes autos, foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida, segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito e, a formação da convicção do tribunal, para efeitos da fundamentação dos factos, atrás dados como provados, está referida no probatório com remissão para as folhas do processo onde se encontram, bem do depoimento das testemunhas arroladas pela impugnante.

A testemunha, F… J… S… C…, transitário desde 1986, na área norte do país Matosinhos, prestou serviços de desalfandegamento de mercadorias (calçado de plástico e de baixa qualidade de homem e senhora) oriundo da China à “S…, Lda”..

Confirmou que as mercadorias foram desalfandegadas no posto da Bobadela da Alfândega de Alverca, através do escritório em Lisboa.

Que no ato de desalfandegamento, não houve problemas a nível pautal, a nível de preço após verificação a Alfândega discordou dos valores das faturas porque eram baixos.

Que em todas as situações, a Alfandega propôs um valor através de uma simulação que era feita pelo verificador, foi aceite pelo importador e pagos os respectivos direitos.

Afirmou que depois da correção, por discordância da impugnante foi requerido processo técnico de contestação, onde foi abordado o valor das mercadorias e ainda a intempestividade de nova correção. Afirmou ainda que não tem conhecimento de que a inspeção tenha tido contacto físico com a mercadoria ou tenha procedido à comparação de mercadorias idênticas ou similares. Informou o tribunal que o calçado importado é para chegar ao consumidor final, apenas em feiras, por volta de €5,00.

Confirmou ter conhecimento que houve uma notificação com uma lista de processos para serem sujeitos a nova reavaliação, sendo que alguns casos já tinham sido objeto de correção e outras cuja verificação física tinha sido efetuada.

A testemunha M… L… A…., Ajudante de Despachante e empregado transitário desde 1984, na empresa “D…, Lda.”, há cerca de 21 anos, afirmou que prestou serviços à impugnante no desalfandegamento de mercadoria (Calçado em Plástico de Homem, Senhora e Criança originário da China) de baixa qualidade.

Confirmou ao tribunal que nos anos em causa, ao submeterem as DAU aos Serviços de Alfândega, o verificador dizia a que os preços eram baixos e numa folha de Excel apurava o valor. Esse valor tinha de ser transmitido ao importador que, por sua vez tinha de apresentar um valor mais alto das mercadorias importados para que fossem aceites ela Alfândega. Afirmou não ter conhecimento de que a inspeção tenha ido ao mercado para efetuar a comparação dos produtos importados com produtos idênticos ou similares.

Confirmou ao tribunal que uma grande parte dos processos foram objeto de correção do valor na Alfândega de Alverca.

Afirmou ainda que pela discordância da empresa foi instaurado um processo técnico de contestação mas como despachante da impugnante não foi ouvido para se pronunciar sobre as mercadorias, ou sobre mercadorias idênticas ou similares.

Afirmou que as mercadorias para desalfandegamento a partir do 4.º dia começam a ter penalização. Confirmou ao tribunal que o verificador fazia as contas e dava aos despachantes, em função dos critérios alfandegários, das correspondentes posições pautais. A informação da OLAF é por código pautal, e neste código pautal nada determina ao valor, tanto pode ser um sapato de sola como de plástico.

A testemunha A… de J… A… S…., afirmou ser empregada de escritório na empresa D… Lda., há cerca de 26 anos, faz os trâmites dos despachos da “S…, Lda.”, na Alfândega e tramita os seus despachos para desalfandegamento.

Afirmou ao tribunal que as facturas de importação das mercadorias da China foram quase todas objeto de reavaliação por parte da Alfândega, que er a efetuada numa folha de Excel. Eram esses valores que revelavam ao importador para obter valores mais elevados. Confirmou que a mercadoria é de qualidade má, de tratamento de plástico que não os calçaria aos filhos.

A testemunha M… das N… L… A…, jurou ser técnico de vendas há cerca de 21 anos na empresa “D… Lda.”, transitário e despachante oficial. Informou o tribunal que conhece a impugnante porque foi uma das empresas angariadas por si.

Afirmou ao tribunal que os exemplares de sapatos juntos são os que se referem às partidas e códigos pautais em causa nos autos.

Afirmou ao tribunal que quando iam proceder ao desalfandegamento das mercadorias falavam com um funcionário da AT (verificador) e em função dos papéis que possuíam “DAU”, faziam uma consulta prévia para saber se os valores médios exigidos pela Alfândega, (valor médio atribuído à mercadoria de acordo com o código pautal) valores de que o importador não tinha conhecimento, e em função da resposta de cumprimentos desses valores e critérios, submetiam ou não as facturas a despacho na Alfândega. Se não se enquadrasse dentro dos valores exigidos, tinham de dizer ao importador que arranjasse uma factura com valores mais elevados. Afirmou ter tido de corrigir os valores de algumas facturas, uma vez que tinha de fazer sempre a referida consulta para submeter a despacho das facturas. A consulta era sempre prévia para evitar que os contentores não ficassem parados da Alfândega. Informou por fim que para mercadorias iguais as taxas são iguais, mas os tais conceitos pré-estabelecidos também eram iguais. Ou seja, sabendo os importadores desses critérios um importador da “Adidas” podia fazer passar na Alfândega a mercadoria por preço mais baixo. Se as facturas apresentassem um valor inferior, a Alfândega fazia as correções e aplicava as taxas.

A testemunha R… M… de O… R… C… , jurou ser inspectora da Alfândega, autora da ação de inspeção e do relatório de inspetivo, cujo objeto era o apuramento do valor aduaneiro das mercadorias.

Afirmou ao tribunal que as declarações de importação, referentes a 2011 e 2012 que foram objeto da inspeção externa se encontravam instalações da empresa e do Técnico de Contas.

Confirmou que na conta corrente da contabilidade da impugnante não estavam registados os documentos suporte das transferências e respetivo documento de pagamento.

Afirmou que a impugnante não tinha registo de stocks e seleccionaram para controlo as declarações de importação, referentes a 2011 e 2012.

Confirmou que para saber qual o valor aduaneiro correto das facturas solicitou, em termos contabilísticos, as várias contas correntes dos fornecedores, tendo verificado que os documentos de pagamento estavam registados mas não havia documentos que justificassem as mercadorias tivessem sido pagas por aqueles valores. A transferência desses valores estava registada numa conta do próprio socio da S… na China. Questionada a impugnante disse que depois na China efectuava os pagamentos em dinheiro.

Afirmou estar assim afastada a possibilidade de aplicar o valor transaccional. À posterior não tendo a empresa registo de stock, não podiam saber de que mercadorias se tratava, não podendo recorrer ao método das mercadorias idênticas ou similares, pelo que chegaram ao método do último recurso. Informou que o OLAF tinha os preços justos para as posições pautais por cada quilograma. Confirmou que para aplicação dos preços da OLAF aceitaram as classificações existentes na impugnante.

Afirmou que as correções efetuadas resultam apenas da diferença entre os valores já declarados pela impugnante e o valor que efetivamente foi apurado através da informação por quilograma da OLAF. Os documentos de canal 4 foram conferidos as mercadorias pela Alfândega mas não revistos.

A inspeção solicitou à Direção Geral informação sobre o preço médio das mercadorias, tendo-lhe sido respondido que era a OLAF, que responderia a essa informação.

Sabe que no processo técnico de contestação foi proferida decisão com os mesmos fundamentos vertidos no relatório inspetivo.

O depoimento das testemunhas da impugnante decorreu de forma consistente e segura, tendo a testemunha da Alfândega de Alverca demonstrado alguma insegurança nas respostas aos factos relacionados com procedimentos alfandegários anteriores à realização da ação de inspeção”.


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2.2. De Direito

2.2.1. Nulidade da sentença

2.2.1.1. Falta de especificação dos fundamentos de factos e de direito da decisão

A recorrente principia por sustentar que a decisão recorrida padece de nulidade (nos termos do n.° 1 do art.° 125.° do CPPT, conjugado com o n.° 4 do art.° 607.° e alínea b) do n.° 1 do art.° 615° do C.P.C.), por falta de exame crítico das provas relevantes para a apreciação da causa e, por não ter especificado os fundamentos de factos e de direito que a justificaram.

Averiguemos desde já o segundo segmento desta conclusão, por ser o de decisão mais pacífica.

De harmonia com o disposto no artigo art.º 615, nº 1, do Código do Processo Civil a sentença é nula quando:

a) Não contenha a assinatura do juiz;

b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;

c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;

d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;

e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

Para o caso presente importa o segundo fundamento de nulidade [alínea b)], que é fundamento autónomo de recurso nos termos do n.º 3 deste mesmo artigo.

O que se vem entendendo, doutrinal e jurisprudencialmente, sobre a não especificação dos “fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”?

A doutrina e a jurisprudência coincidem na interpretação desta norma.

Desde Alberto dos Reis a primeira vem entendendo que só a absoluta falta de fundamentação é que determina a nulidade da sentença; a insuficiência, obscuridade ou mediocridade da fundamentação apenas sujeita a sentença “ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade” (1).

Posição semelhante tem sido seguido pelos demais autores, quer no domínio do Código de Processo Civil de 1966, como sucede com Antunes Varela (2), quer no de 1997, de que são exemplos, neste caso, Miguel Teixeira de Sousa e José Lebre de Freitas, António Montalvão Machado e Rui Pinto (3). E o mesmo entendimento doutrinário mantêm-se à luz do novo Código de Processo Civil (4).

A jurisprudência, por seu lado, desde sempre tem seguido, uniformemente e sem hesitações, o entendimento da doutrina.

A fundamentação da sentença tem regulamentação específica no artigo 607.º do CPC:

“1 - …

2 - A sentença começa por identificar as partes e o objeto do litígio, enunciando, de seguida, as questões que ao tribunal cumpre solucionar.
3 - Seguem-se os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.

4 - Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência”.

Ao proferir a sentença o juiz transpõe para esta peça processual a matéria de facto pertinente que considera adquirida para o processo, ou seja, a matéria que considera provada. Poderá, eventualmente, tomar também em consideração a matéria não provada que igualmente considere relevante para a solução jurídica da causa. Ou seja, pede-se ao juiz que nessa tarefa reconstitua e fixe objetivamente a situação de facto subjacente ao litígio que terá de dirimir, embora a lei lhe permita que aprecie “livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto” (n.º 5, 1.ª parte).

Mas essa livre (mas prudente) convicção não significa livre arbítrio; significa outrossim que na fixação dos factos o juiz deve ter em conta a prova legal mas também que o julgamento secundum conscientiam só será fator de legitimação da decisão se através desta conseguir demonstrar a sua capacidade de persuasão racional (5).

Se, nesse caso e em tese geral, parece manifesto que o juiz não pode fixar a matéria de facto contra a prova ou mesmo sem prova, por maioria de razão assim será no processo tributário, já que o princípio do inquisitório tem aqui um valor reforçado de busca da verdade material ou da realidade tributária, se se quiser (6).

Dito isto, é evidente que não existe qualquer nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão. A fundamentação existe, é de resto percetível e não padece de incongruência ou incoerência, pelo que a sua eventual fragilidade, no limite, pode(ria) apenas redundar em erro de julgamento mas não determina a nulidade da sentença.


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2.2.1.2. Falta de exame crítico das provas


Quanto à falta de exame crítico das provas relevantes:

O vocábulo prova tem um significado polissémico. Tanto pode designar a atividade probatória das partes, de terceiros ou do próprio juiz, como o conjunto de meios que as partes apresentam ao julgador ou os coligidos por este, como forma de influenciar a sua convicção acerca da existência ou inexistência de um facto. Por fim pode ser entendido como o meio de prova em si mesmo (documento, perícia, v.g.).

Há, porém, factos que não necessitam de prova, basta a sua mera alegação: são os factos notórios e as presunções legais. Os primeiros estão previstos no artigo 514.º, n.º 1, do CPC, e são entendidos como aqueles que são do conhecimento geral. Sublinhe-se, porém, que não basta para serem qualificados como notórios que os factos sejam do conhecimento geral de um grupo em particular. A generalidade de que fala o preceito deve ser interpretada no sentido do conhecimento do facto por toda a comunidade.

Já as presunções nada mais são do que o juízo lógico do qual se infere, segundo uma relação de causalidade, acontecimentos do mundo interior ou exterior. É um processo indireto de prova, com uma componente racional, através do qual se induz a realidade de um facto como consequência de outro (ou outros) cuja realidade é indiscutível.

Os artigos 349.º a 351.º do Código Civil ocupam-se das presunções.
As presunções podem ser legais (
praesumptiones juris), quando a dedução lógica é efetuada pela própria lei; ou judiciais (praesumptiones hominis), quando essa dedução é realizada pelo tribunal.

As primeiras designam-se presunções juris et de jure; podem ser ilididas mediante prova em contrário, exceto nos casos em que a lei o proibir (art.º 350.º, n.º 2, do CC). Se podem ser afastadas por prova em contrário são chamadas presunções juris tantum. Inverte-se, então, o ónus de prova.
Segundo Vaz Serra:

as presunções juris tantum constituem a regra, sendo as presunções juris et de jure a excepção. Na dúvida, a presunção legal é juris tantum, por não se dever considerar, salvo referência da lei, que se pretendeu impedir a produção de provas em contrário, impondo uma verdade formal em detrimento do real provado”. (7)

Provar um facto mais não é do que um processo que visa demonstrar a sua existência. Por isso, o que pode ser classificado como verdadeiro ou falso é a sua alegação, porque o facto, em si mesmo considerado, ou existe ou não existe. Sublinhe-se, no entanto, que a verdade processual não é sinónimo de verdade absoluta, pelo que a fixação de um facto dado como certo no processo não significa que o mesmo tenha efetivamente ocorrido: apenas quer dizer que o juiz ficou convicto da sua existência. Dito de outro modo, a verdade material e a verdade judicial (8) podem não coincidir.

Tanto assim que há quem veja na prova a manifestação de um verdadeiro nonsense, por não existir qualquer referencial de racionalidade na prova processual (9). Nesta ordem de ideias então a prova mais não é do que um expediente que disfarça a injustiça e a irracionalidade para que tende a decisão judicial, contra as quais apenas o juiz Hércules, de Dworkin, poderia batalhar.

Felizmente que não parece ser o caso da sentença em crise. De facto, a fundamentação da mesma aponta para uma análise criteriosa e exigente das provas. E se desse labor emergiu um resultado desfavorável para a recorrente a justificação reside – na ótica da sentença - na falta de algumas diligências de prova que deveriam ter sido feitas no âmbito do procedimento inspetivo e que – acrescentamos nós - no caso em apreço, não podem(iam) ser levadas a cabo no âmbito deste processo judicial, não obstante o já falado princípio do inquisitório, porque tal equivaleria a continuar, noutra sede e por outra via, uma inspeção que já findou.

Mas ainda antes de se entrar nessa questão, importa apenas refletir um pouco sobre o significado da expressão “análise crítica da prova”, que como decorre do exposto, incide sobre os meios de prova. Por exemplo, no caso dos depoimentos releva a razão de ciência do depoente, a sua credibilidade e fiabilidade, bem como a consistência das suas declarações quando comparada com os restantes meios de prova. No que concerne aos documentos, é determinante a sua valia e aptidão intrínseca para a prova ou impugnação dos factos a que são oferecidos, bem como a sua genuinidade, integridade e completude.

E é este exame crítico sobre os meios de prova que vai possibilitar o processo de formação da convicção do juiz, em função da aplicação de regras de experiência ou de critérios lógicos, os quais vão formar o substrato racional que conduzirá à decisão num certo sentido.

Esse exame interior, no âmago psíquico do juiz, é um momento prévio à sua exteriorização. Por isso a motivação não é nem pode ser, como sustenta Taruffo, “um relato do que sucedeu na mente ou na alma do juiz quando valorou a prova. As normas que exigem a motivação da sentença não reclamam que o juiz se confesse reconstruindo e expressando quais os meandros do seu espírito. Estas normas, pelo contrário, impõem-lhe justificar a sua decisão, expondo as razões em forma de argumentações racionalmente válidas e intersubjetivamente “corretas” e aceitáveis. Para dizer de maneira sintética: os processos psicológicos do juiz, suas reacções íntimas e os seus estados individuais de consciência não interessam nada: o que interessa é que se justifique a decisão com bons argumentos” (10).

Esses bons argumentos devem permitir constatar que essa ponderação interior não foi arbitrária, antes lógica e racional. Isto é, os argumentos da motivação devem poder convencer os destinatários da mesma da bondade intrínseca do raciocínio judicial, de que os meios de prova foram efetivamente sopesados, de que são válidos os motivos que justificam as opções tomadas quanto a eles, em suma, os bons argumentos da motivação devem traduzir uma cabal e completa justificação do conjunto de razões que subjazem à decisão do juiz em matéria de prova, de tal modo que esta possa ser examinável e cognoscível pelos seus destinatários diretos (as partes e respetivos mandatários), mas também pela própria comunidade jurídica e até pela sociedade em geral, de tal sorte que essa motivação possa ser encarada como fator de legitimação da própria decisão.

Como sublinhou o Tribunal Constitucional:

“O sistema da livre apreciação da prova não deve definir-se negativamente pela ausência de regras e critérios legais predeterminantes do seu valor, havendo antes de se destacar o seu significado positivo, que há-de traduzir-se em valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, dos máximos da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita ao julgador objectivar a apreciação dos factos” (11).

Estas considerações permitem desde já dizer que o primeiro segmento da suscitada nulidade também se não verifica. Com efeito, o Senhor juiz a quo justificou demoradamente o seu percurso cognoscitivo, de tal modo que são perfeitamente percetíveis as razões pelas quais valorou os meios de prova no sentido em que o fez. Não há, pois, qualquer défice neste domínio, porque os argumentos invocados exteriorizam aquilo que terá sido o seu pensamento, que se mostra racional, lógico e sensato.

O que a recorrente, bem vistas as coisas, não é sindicar o exame crítico das provas mas outrossim o processo de subsunção dos factos dados como provados ao direito e, eventualmente, a desconsideração de algum ou alguns factos que no seu entender imporiam decisão diversa. Mas isso não representa qualquer nulidade, quando muito significaria apenas um erro de julgamento, a justificar a revogação da sentença ou a sua eventual anulação para ampliação do probatório, se fossem necessárias diligências instrutórias que só na primeira instância pudessem ser concretizadas. Questão que, obviamente, não se confunde com a falta de exame crítico das provas.

Em suma, improcede a arguida nulidade da sentença.


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2.2.2. Da aplicação do método do “último recurso” para determinação do valor aduaneiro da mercadoria

A sentença, fundamentalmente, deu razão à recorrida na impugnação por considerar que a liquidação padecia de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto.

Argumentou a sentença que o Código Aduaneiro Comunitário estabelece que o valor aduaneiro das mercadorias importadas é o valor transacional, isto é, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias quando são vendidas para exportação, com destino ao território aduaneiro da União, eventualmente, após ajustamento efetuado nos termos dos artigos 32.º e 33.º, e desde que não ocorram situações limitativas, referentes nas alíneas a) a d), como dispõe o n.º 1 do art.º 29.

Quando o valor aduaneiro não puder ser determinado por aplicação de nenhuma dessas alíneas, será permitido aplicar o disposto no n.º 2 do art.º 30.º.

Sustentou que a inspeção não tomou contacto com a mercadoria em causa (sapatos de plástico destinados a serem vendidos em feiras), pelo que não acolheu a argumentação do relatório de que “a qualidade das mercadorias e a sua reputação são elementos a ter em consideração, pelo que é de todo inviável, a posteriori, certificar que outras mercadorias já importadas se revelam similares às mercadorias em análise”.

E nesse contexto entendeu que, a ser assim e sempre que o valor aduaneiro não pudesse ser determinado, nos termos do art.º 29º do Código Aduaneiro Comunitário, nem por aplicação dos métodos previstos no artigo 30.º, n.º 2 do mesmo diploma, então em todas as verificações a posteriori apenas podia ser aplicado o método do último recurso, previsto no art.º 31.º, n.º 1, do Código Aduaneiro Comunitário.

O que, na sua ótica, é resultado dessa omissão da inspeção, de falta de contacto direto com a mercadoria, que foi determinante na impossibilidade de fixação do valor aduaneiro das mercadorias. E sublinha que do relatório inspetivo apenas consta que “os elementos sujeitos a verificação foram: a análise de organização contabilística, análise de registos contabilísticos e análise dos documentos de pagamento aos fornecedores de calçado”.

Como o Código Aduaneiro Comunitário prevê que o apuramento do valor aduaneiro das mercadorias seja feito de forma sequencial, respeitando a ordem legal prevista no artigo 30.º, n.º 1, do Código Aduaneiro Comunitário, impunha-se que a inspeção tivesse solicitado à impugnante “amostras da mercadoria importada objeto da inspeção, no sentido do cumprimento dos princípios do dever de cooperação e prossecução do interesse público”, visto que a “Autoridade Tributária e Aduaneira - inspeção tributária, no decurso do procedimento, devem realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material – princípio do inquisitório art.º 58 e 59 da Lei Geral Tributária (LGT)”.

E se assim fosse, observa a sentença, “tendo a inspeção tributária na sua posse, elementos da mercadoria sob análise, como os exemplares que constam dos autos, as referencias, fotografias e respetivos códigos aduaneiros, poderia ter ido mais longe e indagar, junto dos mercados tradicionais (feiras) o valor de bens similares ou idênticos, cumprindo assim o disposto no art.º 30 do Código Aduaneiro Comunitário, aproximando da realidade o seu valor comercial no apuramento dos valores dos direitos aduaneiros e consequente IVA, o que não logrou fazer”.

E com estes argumentos – falta de verificação do preço de venda ao público, em feiras, de mercadorias similares e indevida utilização do método do último recurso - a sentença anulou a liquidação impugnada, tendo considerado prejudicado o conhecimento das restantes questões.

Contra-argumenta a recorrente, invocando que os pagamentos foram feitos para uma conta do próprio gerente da recorrida, na China, facto que “condicionou” a avaliação do valor transacional das mercadorias. E, por isso, constatada a impossibilidade de aplicação sequencial dos métodos previstos no artigo 29.º e 30.º do Código Aduaneiro Comunitário, outro caminho não restava que não fosse a aplicação dos valores médios da A........... M........... T....... (AMT), do European Anti-Fraud Office (OLAF).

Vejamos.

À data dos factos vigorava o Código Aduaneiro Comunitário (doravante CAC), estabelecido pelo Regulamento (CEE) nº 2913/92 do Conselho, de 12 de Outubro de 1992, substituído, desde 1 de novembro de 2013, pelo Código Aduaneiro Modernizado [Jornal Oficial L 145 de 04.06.2008], estabelecido pelo Regulamento (CE) n.º 450/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2008.

Bem como o Regulamento (CEE) n.º 2454/93 da Comissão de 2 de Julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do CAC (DACAC (12)). Este Regulamento contém um Anexo 23, com a epígrafe “Notas interpretativas para efeitos de valor aduaneiro”

O quadro legal a ter em consideração é, portanto, o seguinte:

Art.º 29.º do CAC:
1. O valor aduaneiro das mercadorias importadas é o valor transaccional, isto é, o preço efectivamente pago ou a pagar pelas mercadorias quando são vendidas para exportação com destino ao território aduaneiro da Comunidade, eventualmente, após ajustamento efectuado nos termos dos artigos 32.º e 33.º, desde que:
a) Não existam restrições quanto à cessão ou utilização das mercadorias pelo comprador, para além das restrições que:
- sejam impostas ou exigidas pela lei ou pelas autoridades públicas na Comunidade,
- limitem a zona geográfica na qual as mercadorias podem ser revendidas ou - não afectem substancialmente o valor das mercadorias;
b) A venda ou o preço não estejam subordinados a condições ou prestações cujo valor não se possa determinar relativamente às mercadorias a avaliar;
c) Não reverta directa ou indirectamente para o vendedor nenhuma parte do produto de qualquer revenda, cessão ou utilização posterior das mercadorias pelo comprador, salvo de um ajustamento apropriado puder ser efectuado por força do artigo 32.º e
d) O comprador e o vendedor não estejam coligados ou, se o estiverem, que o valor transacional seja aceitável para efeitos aduaneiros, por força do n.º 2.
2.
a) Para determinar se o valor transaccional é aceitável para efeitos de aplicação do n.º 1, o facto de o comprador e o vendedor estarem coligados não constitui, em si mesmo, motivo suficiente para considerar o valor transacional como inaceitável. Se necessário, serão examinadas as circunstâncias próprias da venda e o valor transaccional será admitido, desde que a relação de coligação não tenha influenciado o preço. Se, tendo em conta informações fornecidas pelo declarante ou obtidas de outras fontes, as autoridades aduaneiras tiverem motivos para considerar que a relação de coligação influenciou o preço, comunicarão os seus motivos ao declarante e dar-lhe-ão uma possibilidade razoável de responder. Se o declarante o pedir, os motivos ser-lhe-ão comunicados por escrito;
b) Numa venda entre pessoas coligadas, o valor transaccional será aceite e as mercadorias serão avaliadas em conformidade com o n.º 1, quando o declarante demonstrar que o referido valor está muito próximo de um dos valores a seguir indicados, no mesmo momento ou em momento muito aproximado:
i) valor transaccional nas vendas, entre compradores e vendedores que não estão coligados, de mercadorias idênticas ou similares para exportação com destino à Comunidade,
ii) valor aduaneiro de mercadorias idênticas ou similares, tal como é determinado em aplicação do n.º 2, alínea c), do artigo 30.º,
iii) valor aduaneiro de mercadorias idênticas ou similares, tal como é determinado em aplicação do n.º 2, alínea d), do artigo 30.º.
Na aplicação dos critérios precedentes, serão devidamente tidas em conta diferenças demonstradas entre os níveis comerciais, as quantidades, os elementos enumerados no artigo 32.º e os custos suportados pelo vendedor nas vendas em que este último e o comprador não estão coligados, custos esses que o vendedor não suporta nas vendas em que este último e o comprador estão coligados.
c) Os critérios enunciados na alínea b) do presente número serão utilizados por iniciativa do declarante e somente para efeitos de comparação. Não poderão estabelecer-se valores de substituição por força da referida alínea.
3.
a) O preço efectivamente pago ou a pagar é o pagamento total efectuado ou a efectuar pelo comprador ao vendedor, ou em benefício deste, pelas mercadorias importadas e compreende todos os pagamentos efectuados ou a efectuar,como condição da venda das mercadorias importadas, pelo comprador ao vendedor, ou pelo comprador a uma terceira pessoa para satisfazer uma obrigação do vendedor. O pagamento não tem que ser efectuado necessariamente em dinheiro.
Pode ser efectuado mediante cartas de crédito ou instrumentos negociáveis, e pode fazer-se directa ou indirectamente.
b) As actividades, incluindo as que se relacionam com a comercialização, empreendidas pelo comprador por sua própria conta, distintas daquelas para as quais está previsto um ajustamento no artigo 32.º, não são consideradas como pagamento indirecto ao vendedor, mesmo se se puder considerar que o vendedor delas beneficia ou que foram empreendidas com o seu acordo, e o seu custo não é acrescido ao preço efectivamente pago ou a pagar para a determinação do valor aduaneiro das mercadorias importadas.

No que se refere ao artigo 29.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CAC, o Anexo 23 do Regulamento relativo às DACAC contém uma nota (n.º 3) que diz o seguinte:

[…]

3. As autoridades aduaneiras, quando não estiverem habilitadas a aceitar o valor transaccional sem inquérito complementar, deverão dar ao declarante a possibilidade de fornecer todas as outras informações pormenorizadas que possam ser necessárias para lhes permitirem examinar as circunstâncias da venda. A este respeito e a fim de determinar se os laços influenciaram o preço, as autoridades aduaneiras deverão estar prontas para examinar os aspectos pertinentes da transacção, entre os quais a maneira pela qual o comprador e o vendedor organizam as suas relações comerciais e a maneira pela qual o preço em questão foi calculado a fim de determinar se o vínculo influenciou o preço. Se puder ser provado que o comprador e o vendedor, ainda que vinculados na acepção do artigo 143.º, compram e vendem um ao outro como se não estivessem vinculados, ficará assim demonstrado que os vínculos não influenciaram o preço. Por exemplo, se o preço tiver sido calculado de maneira compatível com as práticas normais de fixação dos preços no ramo de produção em questão, ou com o modo pelo qual o vendedor calcula os seus preços para as vendas a compradores que não lhe estão vinculados, isso demonstrará que o vínculo não influenciou o preço. Do mesmo modo, quando for provado que o preço é suficiente para cobrir todos os custos e assegurar um lucro representativo de lucro global realizado pela empresa num período representativo (por exemplo numa base anual) pelas vendas de mercadorias da mesma natureza ou da mesma espécie, ficará assim demonstrado que o preço não foi influenciado.



Artigo 30.º do CAC:
1. Quando o valor aduaneiro não puder ser determinado por aplicação do artigo 29.º, há que passar sucessivamente às alíneas a), b), c) e d) do n.º 2 até à primeira destas alíneas que o permita determinar, salvo se a ordem de aplicação das alíneas c) e d) tiver que ser invertida a pedido do declarante; somente quando o valor aduaneiro não puder ser determinado por aplicação de uma dada alínea, será permitido aplicar a alínea que vem imediatamente a seguir na ordem estabelecida por força do presente número.
2. Os valores aduaneiros determinados por aplicação do presente artigo são os seguintes:
a) Valor transaccional de mercadorias idênticas vendidas para exportação com destino à Comunidade e exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar ou em momento muito próximo;
b) Valor transaccional de mercadorias similares, vendidas para exportação com destino à Comunidade exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar ou em momento muito próximo;
c) Valor baseado no preço unitário correspondente às vendas na Comunidade das mercadorias importadas ou de mercadorias idênticas ou similares importadas totalizando a quantidade mais elevada, feitas a pessoas não coligadas com os vendedores.
d) Valor calculado, igual à soma:
- do custo ou do valor das matérias e das operações de fabrico ou outras, utilizadas ou efectuadas para produzir as mercadorias importadas, - de um montante representativo dos lucros e das despesas gerais igual ao que é geralmente
contabilizado nas vendas de mercadorias da mesma natureza ou da mesma espécie que as mercadorias a avaliar, efectuadas por produtores do país de exportação para a exportação com destino à Comunidade,
- do custo ou do valor dos elementos especificados no n.º 1, alínea e), do artigo 32.º.
3. As condições suplementares e normas de execução do n.º 2 supra são determinadas de acordo com o procedimento do comité.



No que se refere ao art.º 30.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CAC, o Anexo 23 contém uma nota (n.º 1), que prevê:

1. Na aplicação das presentes disposições, as autoridades aduaneiras referir-se-ão, sempre que isso seja possível, a uma venda de mercadorias idênticas ou similares realizada ao mesmo nível comercial e sensivelmente na mesma quantidade que as mercadorias a avaliar. Na falta de tais vendas, será possível recorrer a uma venda de mercadorias idênticas ou similares, realizada em qualquer das três situações seguintes:

[…].

Artigo 31.º do CAC:
(Alterado por Regulamento (CE) n.º 82/97 de 19.12.96)
1. Se o valor aduaneiro das mercadorias não puder ser determinado por aplicação dos artigos 29.ºe 30.º, será determinado, com base nos dados disponíveis na Comunidade, por meios razoáveis compatíveis com os princípios e as disposições gerais:
- do acordo relativo à aplicação do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994,
- do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 e
- das disposições do presente capítulo.
2. O valor aduaneiro determinado por aplicação do n.º 1 não se baseará:
a) No preço de venda, na Comunidade, de mercadorias produzidas na Comunidade;
b) Num sistema que preveja a aceitação, para fins aduaneiros, do mais elevado de dois valores possíveis;
c) No preço de mercadorias no mercado interno do país de exportação;
d) No custo de produção, distinto dos valores calculados que foram determinados para mercadorias idênticas ou similares em conformidade com o n.º 2, alínea d), do artigo 30.º;
e) Nos preços para exportação com destino a um país não compreendido no território aduaneiro da Comunidade;
f) Em valores aduaneiros mínimos
ou
g) Em valores arbitrários ou fictícios.


No que se refere ao art.º 31.º, n.º 1, do CAC, o Anexo 23 contém uma nota (n.º 2), que prevê:

Os métodos de determinação do valor que devem empregar-se por força do n.º 1 do artigo 31.º são os definidos no artigo 29.º e no n.º 2 do artigo 30.º sendo conforme com os objectivos e disposições do n.º 1 do artigo 31.º uma flexibilidade razoável na aplicação destes métodos.


Artigo 32.º do CAC
1. Para determinar o valor aduaneiro por aplicação do artigo 29.º, adiciona-se ao preço efectivamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas:
a) Os elementos seguintes, na medida em que forem suportados pelo comprador, mas não tenham sido incluídos no preço efectivamente pago ou a pagar pelas mercadorias:
i) comissões e despesas de corretagem, com excepção das comissões de compra,
ii) custo dos recipientes que, para fins aduaneiros, se considera que fazem um todo com
a mercadoria,
iii) custo da embalagem, compreendendo a mão-de-obra assim como os materiais;
b) O valor, imputado de maneira adequada, dos produtos e serviços indicados em seguida, quando são fornecidos directa ou indirectamente pelo comprador, sem despesas ou a custo reduzido, e utilizados no decurso da produção e da venda para a exportação das mercadorias importadas, na medida em que este valor não tenha sido incluído no preço efectivamente pago ou a pagar:
i) matérias, componentes, partes e elementos similares incorporados nas mercadorias importadas,
ii) ferramentas, matrizes, moldes e objectos similares utilizados no decurso da produção das mercadorias importadas,
iii) matérias consumidas na produção das mercadorias importadas,
iv) trabalhos de engenharia, de estudo, de arte e de design, planos e esboços, executados fora da Comunidade e necessários para a produção de mercadorias importadas;
c) Os direitos de exploração e os direitos de licença relativos às mercadorias a avaliar, que o comprador é obrigado a pagar, quer directa quer indirectamente, como condição da venda das mercadorias a avaliar, na medida em que estes direitos de exploração e direitos de licença não tenham sido incluídos no preço efectivamente pago ou a pagar;
d) O valor de qualquer parte do produto de qualquer revenda, cessão ou utilização posterior das mercadorias importadas que reverta directa ou indirectamente para o vendedor;
e)
i) As despesas de transporte e de seguro de mercadoria importadas e
ii) as despesas de carga e de manutenção conexas com o transporte das mercadorias importadas, até ao local de entrada das mercadorias no território aduaneiro da Comunidade.
2. Qualquer elemento que for acrescentado em aplicação do presente artigo ao preço efectivamente pago ou a pagar basear-se-á exclusivamente em dados objectivos e quantificáveis.
3. Para a determinação do valor aduaneiro, nenhum elemento será acrescentado ao preço efectivamente pago ou pagar, com excepção dos previstos pelo presente artigo.
4. No presente capítulo, pela expressão «comissões de compra» entendem-se as quantias pagas por um importador ao seu agente pelo serviço que lhe presta ao representá-lo na compra das mercadorias a avaliar.
5. Sem prejuízo do disposto na alínea c) do n.º 1:
a) Na determinação do valor aduaneiro, não serão acrescentadas ao preço efectivamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas as despesas relativas ao direito de reproduzir as referidas mercadorias na Comunidade;
b) Os pagamentos efectuados pelo comprador em contrapartida do direito de distribuir ou de revender as mercadorias importadas não serão acrescentados ao preço efectivamente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas, se estes pagamentos não forem uma condição da venda das referidas mercadorias para a sua exportação com destino à Comunidade.

A nota interpretativa em matéria de valor aduaneiro referente ao artigo 32.º, n.º 2, do CAC, constante do mesmo anexo, dispõe:

Quando não existam dados objetivos e quantificáveis no que se refere aos elementos que se devem acrescentar em conformidade com o disposto no artigo 32.º, o valor transacional não pode ser determinado por aplicação do disposto no artigo 29.º. Tal pode ser o caso, por exemplo, da situação: uma taxa é paga com base no preço de venda, no país de importação, de um litro de dado produto que foi importado a peso e transformado em solução depois da importação. Se a taxa se baseia em parte nas mercadorias importadas e em parte em outros elementos que não têm nenhuma relação com elas (por exemplo, quando as mercadorias importadas são misturadas com ingredientes de origem nacional já não podem ser identificadas separadamente, ou quando a taxa não se pode distinguir de medidas financeiras especiais entre o comprador e o vendedor), não será apropriado tentar acrescentar um elemento correspondente a esta taxa. Contudo, se o montante da taxa se baseia somente nas mercadorias importadas e pode ser facilmente quantificado, pode-se acrescentar um elemento ao preço efetivamente pago ou a pagar.


Artigo 78.º do CAC:


1. As autoridades aduaneiras podem, oficiosamente ou a pedido do declarante, proceder à revisão da declaração após a concessão da autorização de saída das mercadorias.

2. As autoridades aduaneiras, depois de concederem a autorização de saída das mercadorias e para se certificarem da exactidão dos elementos da declaração, podem proceder ao controlo dos documentos e dados comerciais relativos às operações de importação ou de exportação das mercadorias em causa, bem como às operações comerciais posteriores relativas a essas mercadorias.

Esses controlos podem ser efectuados junto do declarante, de qualquer pessoa directa ou indirectamente interessada profissionalmente nas citadas operações ou de qualquer outra pessoa que, pela sua qualidade profissional, esteja na posse dos referidos documentos e dados. As referidas autoridades podem, igualmente, proceder à verificação das mercadorias, se estas ainda puderem ser apresentadas.

3. Quando resultar da revisão da declaração ou dos controlos a posteriori que as disposições que regem o regime aduaneiro em causa foram aplicadas com base em elementos inexactos ou incompletos, as autoridades aduaneiras, respeitando as disposições eventualmente fixadas, tomarão as medidas necessárias para regularizar a situação, tendo em conta os novos elementos de que dispõem.
Artigo 151.º das DACAC:

1. Para efeitos de aplicação do n.º 2, alínea b), do artigo 30.º do código [aduaneiro] (valor transacional de mercadorias similares), o valor aduaneiro será determinado recorrendo-se ao valor transacional de mercadorias similares, vendidas ao mesmo nível comercial e sensivelmente na mesma quantidade que as mercadorias a avaliar. Caso não se verifiquem essas vendas, recorrer-se-á ao valor transacional de mercadorias similares, vendidas a um nível comercial diferente e/ou em diferentes quantidades, ajustado para ter em conta as diferenças eventualmente atribuíveis ao nível comercial e/ou à quantidade, contanto que esses ajustamentos, quer conduzam a um aumento quer a uma diminuição do valor, possam apoiar-se em elementos de prova apresentados que demonstrem claramente que esses ajustamentos são razoáveis e exatos.

[…]

3. Se, para efeitos de aplicação do presente artigo, se verificarem dois ou mais valores transaccionais de mercadorias similares, deve-se tomar em consideração o valor transaccional mais baixo para determinação do valor aduaneiro das mercadorias importadas.

4. Para efeitos de aplicação do presente artigo, só será tomado em consideração um valor transaccional de mercadorias produzidas por uma pessoa diferente, se não puder ser encontrado, por aplicação do n.º 1, qualquer valor transaccional de mercadorias similares produzidas pela mesma pessoa que produziu as mercadorias a avaliar.

5. Para efeitos de aplicação do presente artigo, entende-se por ‘valor transacional de mercadorias importadas similares’ o valor aduaneiro previamente determinado de acordo com o artigo 29.º do código [aduaneiro], ajustado em conformidade com o n.º 1 e com o n.º 2 do presente artigo.


Artigo 181.º-A das DACAC:

1. As autoridades aduaneiras não deverão determinar necessariamente o valor aduaneiro das mercadorias importadas, baseando-se no método do valor transacional, quando, de acordo com o procedimento descrito no n.º 2, baseadas em dúvidas fundadas, não estejam convencidas de que o valor declarado é o preço efetivamente pago ou a pagar definido no artigo 29.º do código [aduaneiro].

2. Sempre que as autoridades aduaneiras tenham dúvidas tal como referido no n.º 1, poderão solicitar informações complementares de acordo com o n.º 4 do artigo 178.º Se essas dúvidas persistirem, antes de tomarem uma decisão definitiva e se tal lhes for solicitado, as autoridades aduaneiras deverão informar o interessado por escrito dos motivos sobre os quais essas dúvidas são fundadas e darem-lhe uma oportunidade razoável para responder. A decisão final bem como os respetivos motivos são comunicados ao interessado por escrito.

Tendo em consideração este quadro normativo podemos avançar na dilucidação da questão. Como já se referiu a recorrente discorda da sentença fundamentalmente por entender que a falta de prova direta dos pagamentos ao fornecedor chinês por parte da recorrente legitimou a AT a recorrer ao método do último recurso e aos dados do OLAF.

Por seu lado a sentença considerou que a AT não podia recorrer a esse método sem que, primeiro, esgotasse a possibilidade de determinar o valor transacional por recurso aos métodos previstos nos artigos 29.º e 30.º, n.º 2, do CAC. Mais argumentou que a AT nem sequer considerou a hipótese de determinar esse valor através de mercadoria idêntica ou similar, não tendo sequer solicitado à recorrida amostras da mercadoria em causa.

A sentença não se pronunciou sobre a aplicabilidade ao caso presente dos dados fornecidos pelo OLAF

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, os mecanismos aduaneiros da União visam o estabelecimento de um sistema equitativo, uniforme e neutral, que exclua a utilização de valores aduaneiros arbitrários ou fictícios e que permita que seja refletido no valor aduaneiro definitivamente fixado o valor real da mercadoria importada, tendo em conta todos os elementos dessa mercadoria que representem um valor económico (13).

O critério prioritário para a fixação do valor da mercadoria importada deverá ser o do seu valor transacional, entendido como o valor efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias quando as mesmas são exportadas com destino ao território da União Europeia. Dito de modo mais simples, o valor transacional mais não é do que o preço real do contrato de compra e venda da mercadoria no país exportador, celebrado entre o importador (comprador) e o exportador (vendedor), sem embargo desse valor transacional poder ser ajustado nos termos do artigo 32.º do CAC (14)(15).

Mas quando não for possível determinar 0 valor transacional – por não ser possível apurá-lo ou por ter sido rejeitado (16) - e, consequentemente, o valor aduaneiro nos termos do art.º 29.º do CAC, com eventuais ajustamentos nos termos dos artigos 32.º e 33.º do CAC, o valor aduaneiro das mercadorias importadas deverá ser efetuado com base em métodos substitutivos, segundo a sequência estabelecida nas alíneas a) a d) do n.º 2 art.º 30.º do CAC (17).

O primeiro método a aplicar será então o método comparativo, que comporta dois critérios, ambos relacionados com o valor transacional, o relativo a mercadorias idênticas (primeiro critério) e o que respeita às mercadorias similares (segundo critério) (18).

Segue-se o método dedutivo, previsto no art.º 30.º n.º 2 alínea c) do CAC e desenvolvido no artigo 152.º das DADAC.

Não sendo possível apurar o valor aduaneiro da mercadoria por recurso a este método, há que convocar o método seguinte, o método do valor calculado.

O método do valor calculado está consagrado no art.º 30.º, n.º 2, alínea d) do CAC e no artigo 153.º das DADAC. Neste caso o valor aduaneiro é determinado a partir dos elementos constitutivos do preço, comunicados pelo fabricante da mercadoria.

Se, ainda assim, não for possível fixar o valor aduaneiro este será então estabelecido através de um método residual, de última instância ou método de último recurso, previsto no art.º 31.º do CAC (19).

Resulta deste regime que os critérios de fixação do valor aduaneiro de uma mercadoria são sequenciais, apresentando entre si um nexo de subsidiariedade, não podendo o valor aduaneiro ser fixado com base numa disposição sem que a precedente tenha sido excluída por impossibilidade de o determinar (20).

Entendemos que esta impossibilidade tem de ser absoluta e não meramente relativa. Com efeito, não basta uma mera dificuldade, muito menos abstrata, encontrada na aplicação de um critério para justificar o abandono do mesmo e a passagem para o seguinte e assim sucessivamente. Tal procedimento não pode deixar de ser entendido como violador das disposições do CAC que regulam a fixação do valor aduaneiro, visto que a interpretação dessas normas à luz dos demais dispositivos com os quais devem ser concatenadas, quer do próprio CAC, quer das DACAC e anexos, não deixa margem para quaisquer dúvidas.

A aplicação do método do último recurso previsto no art.º 31.º do CAC, sem que esteja cabalmente esgotada a possibilidade de aplicação de algum dos métodos anteriores não pode, pois, deixar de reputar-se violadora do disposto no artigos 29.º e 30.º do CAC e do princípio do valor aduaneiro dever ser equivalente ao valor transacional.

Retenha-se que, atualmente, na esteira da doutrina de Dworkin, é dominante o entendimento de que os princípios são proposições jurídicas, são standards equivalentes às normas, que apenas diferem destas quanto ao modo da sua aplicação (21).

Consequentemente, a conduta de uma autoridade aduaneira que não respeite, justificadamente, o mecanismo previsto nos dispositivos do CAC acima referidos, nem os princípios que dominam o ordenamento jurídico-aduaneiro da União, e que avance sem delongas, optando pelo atalho ou caminho mais fácil do método do último recurso, não pode deixar de ser considerada, indubitavelmente, como ilícita.

No caso vertente a recorrente argumenta que aplicou paulatinamente os métodos previsto no art.º 30.º, n.º 2, do CAC, e depois de os analisar rejeitou-os por falta de aplicabilidade ao caso vertente [conclusão f)]. É um argumento que, salvo o devido respeito, não convence e que por isso não pode merecer a nossa concordância.

Se bem percebemos o argumento, basta a mera impossibilidade abstrata para justificar a aplicação sequencial das alíneas a) a d) do n.º 2 do art.º 30.º para de imediato se lançar mão do mecanismo do art.º 31.º do CAC. Mas não é assim como já se acentuou.

A impossibilidade de utilização sequencial dos critérios plasmados no art.º 30.º, n.º 2, tem de ser concreta, isto é, só perante uma impossibilidade casuisticamente demostrada de utilizar o primeiro critério é que se poderá avançar para o segundo e assim sucessivamente, até se esgotarem todas as hipóteses concedidas pelo normativo.

E só perante o esgotamento de todas essas hipóteses é que a autoridade aduaneira poderá convocar o disposto no art.º 31.º, n.º 1, tendo sempre presente que a determinação do valor aduaneiro das mercadorias não pode infringir o disposto no n.º 2 do mesmo artigo.

É que, como já se referiu, o princípio basilar, a trave mestra deste regime é de o valor aduaneiro dever ser tendencialmente equivalente ao valor transacional das mercadorias importadas, o que implica a sua determinação concreta por métodos consistentes que tenham em consideração as circunstâncias particulares de cada caso. E só quando se constate que estes não permitem chegar a uma conclusão segura é que poderão ser convocados os referenciais previstos no artigo 31.º, n.º 1, do CAC.

Ora, a recorrente alega que ao verificar que os pagamentos associados a cada fatura tinham sido efetuados para uma conta titulada em nome do sócio-gerente da recorrente, na China, ficou comprovada a impossibilidade de determinar o valor aduaneiro pelo “método transacional” [conclusão d)].

No entanto, contra esta argumentação podem alinhar-se duas razões de peso, de índole legal: em primeiro lugar, mesmo em situações de coligação entre exportador e importador o CAC não impõe nem permite que tal relação seja condição sine qua nom para a desconsideração automática do valor transacional. Isto é, uma relação de coligação não impede a fixação do valor aduaneiro com base no valor transacional [cfr. art.º 29.º, n.º 2, al. a), 1.ª parte].

Em segundo lugar, para efeitos do CAC só existe relação de coligação nos casos tipificados no artigo 143.º do regulamento de aplicação. Ora, se não há qualquer razão para, mesmo em situação de relação de coligação, o valor transacional não ser atendível, por maioria de razão assim deverá ser quando não existe ou não foi demonstrada tal relação.

No caso presente o único “obstáculo”, rectius, a única objeção colocada pela AT, prende-se com o modo como os pagamentos foram efetuados, através de transferências bancárias diretas para uma conta do sócio-gerente da recorrente na China. Só que, como refere a sentença, foi explicado que tal procedimento visou permitir que os pagamentos fossem feitos posteriormente pelo sócio-gerente diretamente ao exportador. É uma explicação aceitável, plausível, que impunha que a AT demonstrasse que as transferências não tiveram essa finalidade. O que não fez, refugiando-se na cómoda afirmação da duvidosa finalidade dessas transferências.

Por outro lado, o art.º 78.º do CAC, consagra um mecanismo para a revisão das declarações aduaneiras após a concessão da autorização de saída das mercadorias (n.º 1). Como decorre linearmente do n.º 2, o procedimento de revisão comporta atos materiais de controlo, que podem ser efetuados junto do declarante, de qualquer pessoa direta ou indiretamente interessada profissionalmente nas citadas operações ou de qualquer outra pessoa que, pela sua qualidade profissional, esteja na posse dos pertinentes elementos.

Tem por isso razão a sentença quando afirma que a AT poderia indagar junto das feiras do preço de venda do calçado da recorrente introduzido em livre prática ou de calçado idêntico ou similar.

De facto, é comummente sabido que o tipo de calçado em causa é vendido ao público a preços irrisórios em feiras e mercados; por isso, neste tipo de mercadorias e considerando a sua proveniência (China), o problema não está, tanto, no valor pago pelo importador pela mercadoria no país exportador mas acima de tudo nas práticas de dumping e de subvenção estatal, que baixam artificialmente o preço das mercadorias e cujo combate se faz em várias frentes, não só pela via aduaneira.

O dumping é um termo usado no contexto do comércio internacional (mas não só), significando a comercialização no mercado importador de produtos estrangeiros a preços abaixo do custo de produção no mercado exportador. Como envolve, em regra, volumes substanciais de exportação de uma mercadoria, pode colocar em risco a viabilidade económica dos produtores dessa mercadoria no mercado importador. Tem, por isso, um alcance mais vasto e mais duradouro do que o mero benefício económico imediato.

Para além de um quadro legal multilateral apropriado (22) e de contramedidas domésticas (23) e europeias (24), o dumping requer uma investigação exaustiva que por vezes demora anos a concluir (25).

Na União Europeia a Comissão é responsável pela investigação de práticas de dumping por parte de produtores exportadores de países terceiros (26). No caso de se verificar uma alegada prática de dumping, a Comissão dá início a um processo anti-dumping, publicando aviso no Jornal Oficial da UE. O inquérito deve ser concluído num prazo máximo de 15 meses e as suas conclusões são publicadas no mesmo jornal.

O inquérito pode dar origem a um regulamento que institui direitos anti-dumping, como sucedeu com os Regulamentos (CE) n.º 553/2006 da Comissão de 23 de Março de 2006, n.º 1472/2006 do Conselho e n.º 388/2008, que adotaram, o último a título definitivo, medidas anti-dumping sobre as importações de determinado tipo de calçado com a parte superior de couro natural originário da República Popular da China, extensíveis às importações expedidas da Região Administrativa Especial de Macau (RAE), independentemente de serem ou não declaradas originárias da RAE.

Na sequência da sua anulação pelo Tribunal de Justiça (27), a Comissão retomou o processo de investigação, vindo a adotar o Regulamento de Execução (UE) 2016/223 da Comissão, de 17 de fevereiro de 2016, que estabelece um procedimento para avaliar determinados pedidos de tratamento de economia de mercado e de tratamento individual apresentados por produtores-exportadores da China e do Vietname e dá cumprimento ao acórdão do Tribunal de Justiça nos processos apensos C-659/13 e C-34/14.

O processo anti-dumping deve demonstrar que os produtores exportadores do país ou países em causa praticam dumping, que a indústria da UE afetada sofreu um prejuízo importante, que existe uma relação de causalidade entre o dumping e o prejuízo verificado e que a imposição de medidas não é contra o interesse da EU.

Se estas quatro condições se verificarem, podem ser impostas medidas anti-dumping às importações da mercadoria em causa. As referidas medidas assumem normalmente a forma de um direito ad valorem, mas podem igualmente revestir a forma de direitos aduaneiros específicos ou compromissos de preços. Os direitos são pagos pelo importador na UE. Os compromissos de preço são oferecidos pelos exportadores, que aceitam vender a um preço mínimo.

No caso do compromisso de preço ser aceite, não serão cobrados direitos anti-dumping sobre as importações, o que pode, eventualmente, configurar um desvio ao princípio de que o valor aduaneiro deve corresponder ao valor transacional efetivo das mercadorias, na hipótese (quiçá remota) do preço mínimo oferecido continuar a situar-se abaixo do preço efetivo de custo.

Na situação sub juditio, não se tratando de um caso de dumping – pelo menos não foi suscitada essa hipótese -, então não colhe o argumento do baixo preço do calçado para justificar a aplicação do art.º 31.º do CAC. Bem vistas as coisas, a vantagem financeira obtida com uma menor tributação aduaneira seria sacrificada com o aumento da carga tributária sobre o lucro, que necessariamente teria uma margem maior, para compensar a diferença entre o preço real de importação e o preço fictício (inferior) declarado.

Por outro lado, os argumentos aduzidos no relatório, sobre a impossibilidade de avaliar o valor transacional de mercadorias idênticas ou similares ou o valor representativo dos custos de fabrico, lucro e despesas gerais, também não colhem visto que esses argumentos partem de uma premissa que já se considerou ser inaceitável, isto é, partem de um raciocínio abstrato de impossibilidade de apuramento do valor transacional e não de uma constatação concreta que requereria, como de resto o art.º 78.º impunha, operações materiais de averiguação de preços de mercadorias idênticas ou similares introduzidas no mercado em regime de livre prática.

Aliás, como sublinha a sentença, a inspeção nem sequer solicitou amostras das mercadorias em causa à recorrente e, acrescentamos nós, outros elementos que pudessem contribuir para a determinação do valor transacional, como de resto impõe o art.º 78.º do CAC e as normas aduaneiras do GATT, que infra, e com mais detalhe, se referirão.

Não tem, portanto, qualquer fundamento a afirmação de ser impossível avaliar o valor transacional de mercadorias idênticas ou similares, desde logo pela singela razão da inspeção “desconhecer” fisicamente a mercadoria a comparar.

Concluiu-se, assim, que a passagem per saltum ao método do último recurso foi ilegal, como de resto já se tinha salientado.


*

2.2.3. A aplicação de dados estatísticos obtidos através de ferramenta informática na determinação do preço aduaneiro

Admitamos, porém, a benefício de raciocínio, mas sem conceder, que hipoteticamente se justificava o método de último recurso. Poderiam, neste caso, ser utilizados os valores constantes da AMT, do European Anti-Fraud Office (OLAF), como sustenta a recorrente, por não dispor a inspeção de outros elementos que pudesse utilizar?

O artigo 31.º, n.º 1, do CAC, prevê que o valor aduaneiro seja determinado com base nos dados disponíveis na União, por meios razoáveis compatíveis com os princípios e as disposições gerais dos acordos internacionais que descreve e com as disposições do seu capítulo 3.

Os referidos acordos internacionais são o Acordo sobre a aplicação do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio (doravante Acordo) e o próprio artigo VII do Acordo Geral (doravante Acordo Geral).

Este artigo VII consagra os princípios para a determinação do valor das mercadorias para fins aduaneiros, que deverá ser estabelecido sobre o valor real da mercadoria importada à qual se aplica o direito ou de uma mercadoria similar, e não sobre o valor do produto de origem nacional ou sobre valores arbitrários ou fictícios [al. a) do n.º 2].

O valor real deverá ser o preço ao qual, em tempo e lugar determinados pela legislação do país importador, as mercadorias importadas ou as mercadorias similares são vendidas ou oferecidas à venda por ocasião das operações comerciais normais efetuadas nas condições de plena concorrência (…) [alínea b), do n.º 2].

No caso de ser impossível determinar o valor real nestes termos, o valor para fins aduaneiros deverá ser baseado na equivalência comprovável, mais próxima desse valor [alínea c), do n.º 2].

Todavia, com o Acordo sobre a aplicação do artigo VII do Acordo Geral o conceito de valor aduaneiro do artigo VII deixou de ser o valor real da mercadoria para passar a ser o valor transacional, definido como o preço efetivamente pago ou a pagar.

Com efeito, logo no ponto 1 do seu preâmbulo o Acordo consagra o princípio do valor transacional como base para a fixação do valor aduaneiro, com os ajustamentos que se revelem necessários, que aliás especifica.

No ponto 2 consagra o princípio da colaboração recíproca entre o importador e a administração aduaneira quando esse valor não puder ser apurado com base no valor transacional e deva ser fixado por referência ao valor de mercadorias idênticas ou similares.

No ponto 3 consagra o princípio de que cabe ao importador escolher, no caso de não ser possível apurar o valor aduaneiro a partir do valor transacional da mercadoria importada, de outra idêntica ou de mercadoria similar, qual a ordem dos métodos que podem então ser aplicados: o método da determinação do valor aduaneiro com base no preço a que as mercadorias são vendidas, no estado em que são importadas, a um comprador que não está coligado com o vendedor no país de importação, ou o método da avaliação, neste caso a pedido do importador, caso as mercadorias sejam objeto de operações de complemento de fabrico ou de transformação depois da importação.

O mecanismo de fixação do valor aduaneiro do Acordo é semelhante ao mecanismo consagrado no CAC. Com efeito, os artigos 1.º a 6.º do Acordo consagram métodos sequenciais de determinação do valor aduaneiro, tendo também como ponto de partida o método do valor transacional (art.º 1.º). No artigos 2.º, 3.º, 5.º e 6.º estão consagrados métodos de substituição nas situações em que não seja possível apurar diretamente o valor transacional.

Assim, no art.º 2.º está consagrado o método do valor transacional de mercadorias idênticas, no art.º 3.º o método valor transacional de mercadorias similares, no art.º 5.º o método do valor dedutivo, e no art.º 6.º o método do valor calculado ou reconstruído. Por fim, no artigo 7.º surge o método de última instância ou de último recurso (28).

O artigo VII do Acordo é substancialmente semelhante ao artigo 31.º do CAC. Estabelece que:

1. Se o valor aduaneiro das mercadorias importadas não puder ser determinado por aplicação das disposições dos artigos 1º a 6º, será determinado por critérios razoáveis compatíveis com os princípios e as disposições gerais do presente acordo e do artigo VII do GATT de 1994 e com base nos dados disponíveis no país de importação.

2. O valor aduaneiro determinado por aplicação das disposições do presente artigo não se baseará:

a) No preço de venda no país de importação de mercadorias produzidas nesse país;

b) Num sistema que preveja a aceitação, para fins aduaneiros, do mais elevado de dois valores possíveis;

c) No preço de mercadorias no mercado interno do país de exportação;

d) No custo de produção distinto dos valores calculados que tiverem sido determinados para mercadorias idênticas ou similares em conformidade com as disposições do artigo 6º;

e) No preço de mercadorias vendidas para exportação com destino a um país distinto do país de importação;

f) Em valores aduaneiros mínimos

ou

g) Em valores arbitrários ou fictícios.

O Acordo consagra, portanto, o primado do valor de transação como ponto de partida para o cálculo do imposto aduaneiro. Mas também outros princípios não menos importantes, designadamente o da uniformidade de tratamento, na medida em que não permite práticas diferentes ou discriminatórias em relação aos importadores, aos locais e ao tempo da importação, da objetividade, com o fito de impedir a discricionariedade e a subjetividade das autoridades aduaneiras, da equidade, visando a aplicação de um valor aduaneiro justo e correto, da neutralidade, impedindo a utilização do artigo VII para outros fins, nomeadamente o combate ao dumping.

No que concerne à remissão constante do artigo 31.º, n.º 1, do CAC, para o capítulo 3 do mesmo código, tal remissão “implica que as disposições gerais deste capítulo, de que faz parte o artigo 32.º do mesmo código, se apliquem igualmente no caso de a determinação do valor aduaneiro de uma mercadoria importada ser efetuada em conformidade com o artigo 31.º, n.º 1, do mesmo código” (29).

Como se observa no acórdão do Tribunal de Justiça “GE Helthcare”:

“Ora (…) a regulamentação da União relativa à avaliação aduaneira tem por objetivo o estabelecimento de um sistema equitativo, uniforme e neutro que exclui a utilização de valores aduaneiros arbitrários ou fictícios. De acordo com o ponto 2 da nota interpretativa para efeitos de valor aduaneiro relativas ao artigo 31.º , n.º 1, do [CAC], constante do Anexo 23 do Regulamento n.º 2454/93, os métodos de avaliação que devem empregar-se por força do n.º 1 do artigo 31.º são os definidos no artigo 29.º e n.º 2 do artigo 30.º desse código, sendo conforme com os objetivos e disposições do n.º 1 do artigo 31.º do mesmo código uma «flexibilidade razoável» na aplicação destes métodos” (30).

Porém, no caso presente o método de determinação do valor aduaneiro previsto no artigo 31.º do CAC foi utilizado sem que tenham sido aplicados os métodos previstos nos artigos 29.° e 30.° do mesmo código.

Por outro lado, quando uma entidade não fornece informações consideradas fidedignas, a flexibilidade razoável de que fala a nota interpretativa relativa ao art.º 31.º, n.º 1, do CAC, ponto 2, constante do anexo 23, não pode ser utilizada para sancionar a utilização de outros “dados disponíveis na União” que não sejam compatíveis com o disposto na alínea g) do n.º 2 do mesmo artigo. Dados razoáveis serão, por exemplo, os provenientes de outros exercícios fiscais da entidade importadora (31).

Por conseguinte, para se poder decidir se os dados fornecidos pela AMT “são dados razoáveis” – na aceção do art.º 31.º, n.º 1, do CAC, e ponto 2 da nota interpretativa a ele respeitante, acima referida – e se podiam ser usados no caso presente é necessário compreender o que esta ferramenta significa.

No âmbito dos programas Hercule, administrados pelo OLAF, de luta contra a fraude [iniciados em 2004 (decisão 804/2004/CE)], que protegem os interesses financeiros da UE, apoiando a ação para combater as irregularidades, fraude e corrupção que afetam o seu orçamento, foram implementados durante a vigência do II programa [2007-2013 (decisão 878/2007/CE)] (32), numa parceria entre o OLAF e o Joint Research Centre, dois projetos para a análise de grande volume de dados, uma ferramenta de monitorização automática (AMT) e um programa para controlo de contentores (CONTRAFFIC).

Ambos permitem apoiar as investigações aduaneiras, fornecendo dados estatísticos e monitorizando o tráfego aduaneiro.

A AMT gera alertas automáticos em caso de valores anormais das mercadorias e é usada para monitorizar os fluxos de comércio, relevantes para análises de inteligência e para identificar os alvos dos controles das autoridades aduaneiras dos Estados-Membros, melhorando a sua capacidade para detetar a subavaliação das mercadorias importadas.

No entanto, a AMT só deverá atingir seu pleno potencial com melhorias que visam a redução do número de alertas falso positivo, que estão a ser implementadas no programa Hercule III (33) (34).

A AMT é uma ferramenta de tecnologia de informação que usa métodos estatísticos avançados, através de um algoritmo estatístico, para a deteção de padrões relevantes de fraude aduaneira (35).

A identificação dos comportamentos fraudulentos é feita usando um quantil de regressão, permitindo a identificação de prováveis fraudes às tarifas aduaneiras e a análise de casos particulares (36).

Como se refere no respetivo site, a abordagem do problema da fraude adotada pelo Joint Research Centre baseia-se na mineração de dados estatísticos: os problemas de controlo de fraude são formulados como padrões a serem detetadas num conjuntos de dados de destino apropriado, desenvolvendo-se em seguida métodos estatísticos para a deteção dos padrões, que incluem aumentos inesperados e sem precedentes de fluxos comerciais num determinado período, bem como preços anormais para as mercadorias comparáveis. Os resultados são analisados por especialistas e a sua divulgação é feita principalmente através da área restrita do site TESEU que é usado operacionalmente pelo OLAF e, designadamente, pelas agências aduaneiras e de luta contra a fraude dos países membros da União Europeia (37).

Sendo, por conseguinte, dados estatísticos indutivos (38), eles representam uma mera probabilidade de ocorrência de situações de fraude aduaneira. Não são o retrato fiel da realidade aduaneira, até porque, como é sabido, a estatística não visa retratar a realidade, é apenas uma tentativa de a explicar.

Por isso a AMT visa, essencialmente, “a identificação de prováveis fraudes às tarifas aduaneiras e a análise de casos particulares”, como já referido. Ou seja, a AMT é uma ferramenta de combate à fraude aduaneira, possibilitando a sinalização de ocorrências suscetíveis de se enquadrarem no conceito, mas não é uma ferramenta para a determinação do valor transacional, quer porque os dados que fornece não são absolutamente fiáveis (39), quer porque esses dados – representando apenas um modelo que tenta explicar a realidade (40) - são inidóneos para determinar valores transacionais ou mesmo valores aduaneiros concretos.

Consequentemente, a utilização de tais dados na determinação do valor aduaneiro no caso sub juditio estava impedida pelo disposto no artigo 31.º, n.º 2, al. g), do CAC.

Impõe-se no entanto dizer que esta conclusão não obsta a que possam ser considerados, na determinação do valor aduaneiro de uma mercadoria, dados estatísticos que não sofram das limitações acima assinaladas quanto àqueles que são fornecidos pela AMT.

Como o Tribunal de Justiça decidiu no acórdão “Euro 2004. Hungary”:

“[o] artigo 181.º-A do Regulamento (CEE) n.º 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento (CEE) n.º 2913/92 do Conselho, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.º 3254/94 da Comissão, de 19 de dezembro de 1994, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à prática das autoridades aduaneiras, como a que está em causa no processo principal, em que o valor aduaneiro das mercadorias importadas é determinado de acordo com o valor transacional de mercadorias similares, método constante do artigo 30.º do Regulamento (CEE) n.º 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário, conforme alterado Regulamento (CE) n.º 3254/94 da Comissão, de 19 de dezembro de 1994, quando o valor transacional declarado, comparado com a média estatística dos preços de compra na importação de mercadorias similares (41), for considerado desproporcionadamente baixo, sem que o importador tenha fornecido, em resposta a um pedido nesse sentido da autoridade aduaneira, elementos de prova ou informações adicionais para demonstrar a exatidão do valor transacional das mercadorias, apesar de as autoridades aduaneiras não contestarem nem porem em causa por qualquer outra forma a autenticidade da fatura ou do certificado de transferência apresentados para justificar o preço efetivamente pago pelas mercadorias importadas”.

Sublinhe-se, que no caso do acórdão acima referido o valor transacional “desproporcionadamente baixo” respeitava à “média estatística” dos preços para a respetiva mercadoria, ou seja, à mediana do intervalo entre o preço mínimo e o preço máximo, e não a valores fornecidos pela AMT.

No entanto o Tribunal de Justiça não deixa de salientar que a utilização dos métodos previstos nos artigos 3o.º e 31.º do CAC só será admissível “se as dúvidas relativas ao valor transacional destas mercadorias persistirem após terem solicitado o fornecimento de qualquer informação ou de qualquer documento complementar e após terem dado à pessoa em causa uma oportunidade razoável para defender o seu ponto de vista relativamente aos motivos em que as referidas dúvidas se baseiam” (42).

E como é bom de ver, tais valores estatísticos devem referir-se às concretas mercadorias em causa, tendo em conta as suas particulares especificidades, e não a valores meramente pautais.

Ora, no caso dos autos não está demonstrado que tenha sido dada essa oportunidade à recorrida. Pelo contrário, um dos fundamentos da impugnação foi o de ter sido emitida a liquidação quando ainda não se tinha esgotado a fase de defesa da recorrida, questão que a sentença considerou improcedente e que já não é possível reapreciar, por ter transitado em julgado.

O que, também por aqui, tornava inadmissível a utilização do método de último recurso no caso em apreço.

Por outro lado, não há elementos nos autos que permitam afirmar que os valores fornecidos pela AMT são referentes a mercadorias em concreto, idênticas ou similares às que aqui estão em causa, e não a meros valores por classificação pautal por referência à Nomenclatura Combinada (43).

Em resumo, não se encontra qualquer razão para a revogação da sentença. O recurso não merece, pois, provimento.


*

2.2.4. Concluindo:

a) A sentença não padece de qualquer nulidade;

b) A utilização do método do último recurso na determinação do valor aduaneiro das mercadorias em causa foi ilegal, quer por não ter sido demostrada e justificada a impossibilidade da sua determinação pelo valor transacional previsto no art.º 29.º do CAC, quer porque o abandono dos métodos sequenciais e substitutivos do n.º 2 do art.º 30.º, do mesmo diploma, se baseou numa mera impossibilidade abstrata sem apoio em factos que evidenciassem uma impossibilidade concreta de utilização de tais métodos.

c) Tanto mais que não foi solicitada a colaboração da recorrida na determinação do valor aduaneiro, como é imposto pelas normas e princípios do direito aduaneiro da União.

d) Dada a sua natureza, os dados estatísticos obtidos a partir da AMT são imprestáveis para a determinação do valor aduaneiro de uma mercadoria, por a sua utilização estar impedida pelo disposto no artigo 31.º, n.º 2, al. g), do CAC.

e) Outros tipos de dados estatísticos podem ser utilizados na determinação do valor aduaneiro através do método do último recurso, desde que não seja possível fixá-lo através do valor transacional da mercadoria nem pelos métodos substitutivos e sequencias precedentes, sempre que este valor seja considerado desproporcionadamente baixo, mas só depois do importador não ter fornecido elementos de prova ou informações adicionais, quando solicitado para tal, que demonstrem a exatidão do valor transacional das mercadorias.


*
3 - Dispositivo:
Em face de todo o exposto acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela recorrida, em ambas as instâncias.
D.n.
Lisboa, 2018-06-07
________________ (Benjamim Barbosa, Relator)
________________ (Anabela Russo)
________________ (José Vital)



(1) Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra, Coimbra Ed.ª, 1984, p. 140.
(2)Antunes Varela; J. Miguel Bezerra; Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª Ed. (reimp.), Coimbra, Coimbra Ed.ª, 2004, pág. 687.
(3)Estudos sobre o Novo Processo Civil, Coimbra, Almedina, 1997, p. 221 e Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 2.ª ed., Coimbra, Coimbra Ed.ª, p. 703, respetivamente.
(4)Cfr. Paulo Ramos de Faria; Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. I, Coimbra. Almedina, 2013, p. 494.
(5) Com efeito, encontra-se hoje ultrapassada a ideia de que no sistema de livre apreciação da prova o juiz, para formar a sua convicção, goza de discricionariedade plena, com base nas provas, para além das provas e até mesmo contra as provas. O sistema de prova livre e íntima convicção sem exteriorização da motivação, que surgiu como reação ao sistema de prova legal ou tarifada, que por sua vez representou um avanço em relação ao primitivo sistema de provas hierarquizadas da idade média (probationes plenae, probationes semiplenae e indicia), deu lugar ao atual sistema de prova livre mas motivada ou fundamentada, exigida entre nós não só pelas leis processuais mas também pela própria Constituição (art.º 205.º, n.º 1). Por outro lado, a crescente introdução de mecanismos de controlo da discricionariedade e de delimitação do espaço da livre convicção do juiz – de tal modo que bem pode dizer-se que a liberdade na apreciação da prova deu lugar, hoje, a uma liberdade condicionada nesse domínio: compagine-se o n.º 4 do artigo 659º, do anterior CPC, com o n.º 4 do artigo 607.º do atual CPC – pode ser vista como reação a alguns excessos mas também como afirmação e exigência do Estado de Direito moderno, pois como escrevia Antunes Varela, “por mais correcta que seja a interpretação das normas examinadas na sentença ou no despacho, e por mais completo e exacto que seja o conhecimento do sistema revelado pelo julgador, a sentença será sempre injusta se ela der como verificado o facto essencial que na realidade se não verificou ou tiver como não verificado, por exemplo, o pagamento que o réu efectuou”
(6) E assim é porque a lei fundamental impõe – embora indiretamente, pois como sustenta Casalta Nabais, (Direito Fiscal, 2.ª ed., Coimbra, Almedina, 2003, p. 149), não é necessário um preceito constitucional específico - que a tributação se faça segundo o princípio da capacidade contributiva, que já Locke enunciava como o dever de cada um “pagar da sua fortuna a proporção devida” (John Locke, Segundo tratado do governo: ensaio sobre a verdadeira origem, alcance e finalidade do governo civil, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2007, p. 140). O princípio da capacidade contributiva exige, por isso, que a tributação incida sobre o facto tributário tal como ele materialmente é e não sobre uma aparência da realidade, assente em pressupostos meramente formais. O que significa que, rigorosamente, a contabilidade e a documentação (ou a falta ou deficiência dela), não devem nem podem ser usadas para camuflar a realidade com vista à obtenção de vantagens fiscais nem para justificar, por si só, um quantum tributário superior ao efetivamente devido.
(7) Provas (direito probatório material) in Boletim do Ministério da Justiça, n.os 110-112, 1961, p. 35. No mesmo sentido, Mário de Brito, Código Civil Anotado, vol. I, ed. de Autor, 1968, p. 466, e Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª ed., Coimbra, Coimbra Ed.ª, 2005, p. 429.
(8)Por isso Michele Taruffo a qualifica como verdade “relativa e contextual” (La Prueba, Artículos y Conferencias, Santiago do Chile, Editorial Metropolitana, 2009, p. 30).
(9) Michelle Taruffo, La Prueba de los Hechos [La prova dei fatti giuridici], trad. Jordi Ferrer Béltran, Madrid, Editorial Trotta, 2008, p. 318.
(10) Op. cit., p. 33 (tradução livre). Como refere o mesmo autor (in Consideraciones sobre prueba y motivación, Revista Jueces para la Democracia, , Madrid, Asociación Jueces para la Democracia, n.º 59, 2007, p. 77 e Paginas sobre Justicia Civil, Madrid, Marcial Pons, 2009, p. 536), a motivação justifica-se internamente quando existe coerência entre as conclusões e as premissas. E externamente quando a decisão tomada deriva da eleição dessas premissas.
(11) Acórdão de 19-11-1996, Diário da República n.º 31, II Série, de 06-02- 1997, p. 1569.
(12) As DACAC entraram em aplicação a 1 de janeiro de 1994. Foram alteradas 58 vezes, a última das quais pelo Regulamento de Execução (UE) n.º 2015/2064, da Comissão, de 17 de novembro.
(13) Assim, acórdão “Compaq”, de 16 de novembro de 2006, C-306/04, EU:C:2006:716, n.º 30, acórdão “EURO 2004. Hungary”, C-291/15, EU:C:2016:455, n.os 23 e 26 e acórdão “GE Healthcare”, de 9 de março de 2017, C-173/15, EU:C:2017:195, n.º 30
(14) Neste sentido cfr. Acórdão “Christodoulou” de 12 de dezembro de 2013, C-116/12, EU:C:2013:825, n.os 38, 44 e 50, acórdão “Stretinskis”, de 21 de janeiro de 2016, C-430/14, EU:C:2016:43, n.º 15, e acórdão “GE Healthcare”, cit., n.º 31
(15) O valor transacional pode ser alvos de ajustamento, em função de elementos que o possam influenciar, em sentido positivo ou negativo. Por exemplo, comissões e despesas de corretagem, o custos das embalagens ou recipientes, custos de transporte após a sua entrada na União, etc..
(16) Nos termos do artigo 29º n.º 1 alínea a) e n.º 2 alínea c), do CAC. Mas a rejeição só poderá ocorrer em circunstâncias específicas e depois de esgotadas todas as hipóteses do importador apresentar os necessários justificativos.
(17) Acórdãos “Euro 2004. Hungary” e “GE Healthcare”, cit., n.º 27 e 75, respectivamente.
(18) O artigo 142.º, n.º 1, alíneas c), d) e e), do Regulamento de aplicação contém as definições de mercadorias idênticas, similares e da mesma natureza ou da mesma espécie:
c) «Mercadorias idênticas»: as mercadorias produzidas no mesmo país que sejam as mesmas sob todos os aspectos, incluindo as características físicas, a qualidade e o prestígio comercial. As diferenças menores do aspecto não obstam a que sejam consideradas como idênticas as mercadorias que em tudo o resto estão conformes com a definição.
d) «Mercadorias similares»: as mercadorias produzidas no mesmo país que, sem serem iguais sob todos os aspectos, apresentem características semelhantes e sejam compostas por matérias semelhantes, o que lhes permite preencher as mesmas funções e serem objecto de troca entre si no comércio; a qualidade das mercadorias, o seu prestígio comercial e a existência de uma marca industrial ou comercial são elementos a tomar em consideração para determinar se as mercadorias são similares;
e) «Mercadorias da mesma natureza ou da mesma espécie»: mercadorias classificadas num grupo ou numa gama de mercadorias produzidas por um ramo de produção específico ou por um sector específico de um ramo de produção, e incluindo as mercadorias idênticas ou similares.
As duas primeiras definições têm correspondência com as definições de mercadorias idênticas e mercadorias similares constantes do artigo 15.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Acordo sobre a aplicação do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 (GATT 1994).
(19) Acórdãos “Euro 2004. Hungary” e “GE Healthcare”, cit., n.º 28 e 76, respectivamente.
(20) Acórdãos “Euro 2004. Hungary” e “GE Healthcare”, cit., n.º 29. e 77, respetivamente. Como refere Rogério Fernandes Ferreira, A Exportação e Importação de Mercadorias, in Temas de Direito Aduaneiro, coord. Tânia Carvalhais Pereira, Coimbra, Almedina, 2014, p. 122, “[o] recurso aos outros métodos será feito pela ordem descrita, e a escolha do tipo de método deverá ser justificada e comunicada ao declarante com os elementos de apreciação utilizados para o efeito. Estes métodos devem ser utilizados mediante uma colaboração entre os serviços aduaneiros e o declarante, para que se possa atingir uma determinação rápida e satisfatória do valor aduaneiro que terá de ser declarado”.
(21)Cfr. Ronald Dworkin, Taking Rights Seriously, Cambridge, Massachusetts, Harvard University Press, 1977, pp. 24 e 25.
(22) Artigo VI do General Agreement on Tariffs and Trade (GATT 1994), da World Trade Organization [https://www.wto.org/english/docs_e/legal_e/19-adp.pdf]
(23) Decreto-Lei n.º 166/2013 de 27 de Dezembro (regime aplicável às práticas individuais restritivas do comércio), que apenas se aplica às empresas estabelecidas em território nacional, excluindo os serviços de interesse económico geral e a compra e venda de bens e as prestações de serviços, na medida em que estejam sujeitas a regulação sectorial (art.º 2.º).
(24) Regulamento (CE) n.º 1225/2009 do Conselho de 30 de Novembro de 2009, relativo à defesa contra as importações objeto de dumping dos países não membros da Comunidade Europeia.
(25) Sobre a dificuldade e morosidade na investigação anti-dumping consulte-se Judith Czako, Johann Human, Jorge Miranda, A Handbook on Anti-Dumping Investigations, Cambridge, Cambrige University Press, 2003, pp. 6 e ss..
(26) Vd. http://trade.ec.europa.eu/tradehelp/pt/anti-dumping.
(27) Acórdão “Brosmann Footwear”, de 2 de fevereiro de 2012, C-249/10P, EU:C:2012:53, e acórdão “Zhejiang Aokang Shoes”, de 15 de novembro de 2012, C-247/10P, EU:C:2012:710, e acórdão de 4 de Fevereiro de 2016, proferido nos processos apensos C-659/13 C, “C & J Clark International Limited”, e C-34/14 “Puma SE”, EU:C:2016:74.
(28) Cfr. Información técnica sobre la valoración en aduana, doc. disponível em: https://www.wto.org/spanish/tratop_s/cusval_s/cusval_info_s.htm.
(29) Acórdão GE Helthcare, cit., n.º 79.
(30) Cit., n.º 80, e acórdão de 28 de fevereiro de 2008, Carboni e derivati, C 263/06, EU:C:2008:128, n.º 60”, aí citado.
(31) Neste sentido acórdão GE Helthcare, cit., n.º 81.
(32) Cfr. https://ec.europa.eu/anti-fraud/policy/hercule_en.
(33) Cfr. http://eur-lex.europa.eu/legal-content/nl/TXT/?uri=CELEX:52015SC0151
(34) COMMISSION STAFF WORKING DOCUMENT, Annual overview with information on the results of the Hercule III Programme in 2014 Accompanying the document REPORT FROM THE COMMISSION TO THE EUROPEAN PARLEMENT AND THE COUNCIL Protection of the European Union's financial interests - Fight against Fraud Annual Report 2014, de 31-07-2015, pp. 14 e 15, disponível em: http://eur-lex.europa.eu/legal-content/LV/ALL/?uri=CELEX%3A52015SC0151.
(35)Cfr. https://ec.europa.eu/jrc/en/research-topic/antifraud
(36) Tomasz Szkutnik, “Statistical challenges in the anti-fraud analysis of Customs data” in AA. VV., Book OF Abstracts, IVth European Conference on Data Analysis 2017, Wroc³aw University of Economics, 28-SEP-2017, p. 122, disponível em: http://ecda2017.ue.wroc.pl/wp-content/uploads/2016/11/BOA-new.pdf.
(37) Cfr. https://ec.europa.eu/jrc/en/research-topic/antifraud
(38)Na estatística indutiva existe um determinado grau de incerteza (percentagem de erro) que é medido em termos de probabilidade.
(39) Vd., supra, notas 31 e 32.
(40) Cfr. Márcio Schwaab, José Carlos Pinto, Análise de Dados Experimentais I. Fundamentos de Estatística e Estimação de Parâmetros, Rio de Janeiro, E-papers Serviços Editoriais, Lda., 2007, p. 20, disponível in: https://books.google.pt
(41) Portanto, com base em dados de estatística dedutiva ou descritiva, que recolhe, apresenta, analisa e interpreta dados numéricos, descrevendo e analisando uma amostra sem retirar conclusões ou ilações.
(42) Acórdão “Euro 2004. Hungary”, cit., n.º 35.
(43) Sobre a Nomenclatura Combinada cfr., para mais desenvolvimento, Rogério Fernandes Ferreira, A Exportação e Importação de Mercadorias, in Temas de Direito Aduaneiro, coord. Tânia Carvalhais Pereira, Coimbra, Almedina, 2014, p.