Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06294/13
Secção:CT
Data do Acordão:09/19/2017
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA. PROVA TESTEMUNHAL.
SUJEITO PASSIVO DA RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA DE SISA. MATÉRIA COLECTÁVEL DO IMPOSTO DE SISA.
REGIME DOS BENEFÍCIOS FISCAIS.
REGIME DE INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS QUE CONSAGRAM BENEFÍCIOS FISCAIS.
AQUISIÇÃO DE IMÓVEIS PARA REVENDA. PERDA DE ISENÇÃO.
ARTº.11, § 3, DO C.I.M.S.I.S.S.D.
NOÇÃO DE COMPRA E VENDA PREVISTA NA NORMA.
ARTº.16, § 1, DO C.I.M.S.I.S.S.D.
FISCALIZAÇÃO CONCRETA DA CONSTITUCIONALIDADE POR PARTE DOS TRIBUNAIS.
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE.
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PROPORCIONALIDADE.
PRINCÍPIO DA BOA-FÉ.
ARTº.266, Nº.2, DA C.R.PORTUGUESA. ARTº.59, DA L.G.TRIBUTÁRIA.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO ENQUANTO FUNDAMENTO DE PROCESSO DE IMPUGNAÇÃO.
NATUREZA RECEPTÍCIA DO ACTO TRIBUTÁRIO.
NOTIFICAÇÃO COMO SIMPLES CONDIÇÃO DE EFICÁCIA DO ACTO TRIBUTÁRIO.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO DE SISA.
JUROS COMPENSATÓRIOS. NOÇÃO. ARTº.35, DA L.G.TRIBUTÁRIA.
PRESSUPOSTOS DO PAGAMENTO DE JUROS COMPENSATÓRIOS.
EXAME DOS PRESSUPOSTOS CULPA E NEXO DE CAUSALIDADE DO PAGAMENTO DE JUROS COMPENSATÓRIOS.
Sumário:1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).
2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma.
3. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
4. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
5. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
6. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
7. Se a decisão do julgador, no que diz respeito à prova testemunhal produzida, estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
8. O sujeito passivo da relação jurídico-tributária de sisa era o transmissário, ou seja, aquele que recebia os bens imóveis transmitidos (no caso de venda é o comprador) e a matéria colectável do imposto (pressuposto objectivo genérico de qualquer relação jurídico-tributária) era constituída pelo valor do imóvel, correspondendo o conceito fiscal de transmissão ao do direito privado, isto é, só é transmissão a perda relativa e a aquisição derivada de direitos, exceptuando os casos em que a lei fiscal dispuser o contrário (artºs.7 e 19, do C.I.M.S.I.S.D.).
9. Do ponto de vista jurídico, e na óptica da relação jurídica de imposto, os benefícios fiscais consubstanciam, antes de mais, factos que estando sujeitos a tributação, são impeditivos do nascimento da obrigação tributária ou, pelo menos, de que a mesma surja em plenitude. Na verdade, enquanto facto impeditivo, o benefício fiscal traduz-se sempre em situações que estão sujeitas a tributação, isto é, que são subsumíveis às regras jurídicas que definem a incidência objectiva e subjectiva do imposto. E, precisamente porque o benefício fiscal constitui um facto impeditivo da tributação-regra, a sua extinção ou falta de pressupostos de aplicação tem por efeito imediato a reposição automática dessa mesma tributação, como estabelece o artº.12, nº.1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
10. As normas que consagram benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, embora admitam a interpretação extensiva (cfr.artº.9, do E.B.F.).
11. A isenção de sisa prevista no artº.11, § 3, do C.I.M.S.I.S.S.D., é uma isenção real condicionada, a título resolutivo, na medida em que caducará se ao prédio adquirido for dado destino diferente, ou se a venda for efectuada para além do prazo fixado na lei ou se for, novamente, vendido para revenda (cfr.artº.16, § 1, do C.I.M.S.I.S.S.D.). Esta caducidade da isenção do tributo ou a perda da sua eficácia apenas se mantém enquanto se verificarem os pressupostos que a condicionaram, operando automaticamente e com efeitos “ex tunc”, logo que verificado algum dos factos que a lei enumera como constituindo condição resolutiva deste benefício fiscal, mais cabendo, então, ao sujeito passivo solicitar a liquidação da sisa (artº.91, do C.I.M.S.I.S.S.D.) no prazo de 30 dias, contados da data da referida ocorrência.
12. A doutrina e jurisprudência são unânimes em considerar que os contratos de alienação a que se referem os artºs.11, § 3, e 16, § 1, do C.I.M.S.I.S.S.D., são os de compra e venda devidamente formalizados, susceptíveis de operar a transmissão civil dos imóveis segundo o direito privado, não relevando, nomeadamente, as simples promessas de venda, ainda que acompanhadas da tradição do imóvel.
13. A previsão do artº.16, § 1, do C.I.M.S.I.S.S.D., não permite considerar como revenda uma operação de permuta a uma terceira sociedade de imóveis, em contrapartida da detenção maioritária do capital social da mesma.
14. O que pode e deve ser objecto da fiscalização concreta da constitucionalidade, por parte dos Tribunais, são normas e não quaisquer decisões, sejam elas de natureza judicial ou administrativa, nem tão pouco eventuais interpretações que de tais normas possam ser efectuadas por aquelas decisões (cfr. artº.204, da C.R.Portuguesa).
15. O princípio da igualdade é um dos princípios estruturantes do sistema constitucional português, encontrando consagração genérica no artº.13, da C.R.Portuguesa. Por sua vez, a vinculação das autoridades administrativas ao princípio da igualdade encontra consagração no artº.266, nº.2, do diploma fundamental. As decisões mais recentes do Tribunal Constitucional, na vertente que aqui interessa, assinalam correctamente que o princípio da igualdade obriga a que se trate por igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, não impedindo a diferenciação de tratamento, mas apenas as discriminações arbitrárias, irrazoáveis, ou seja, as distinções de tratamento que não tenham justificação e fundamento material bastante.
16. O princípio da proporcionalidade, é explicitado como princípio material informador e conformador da actividade administrativa, no artº.266, nº.2, da C.R.Portuguesa, assim implicando a juridicidade de toda a actividade da Administração (cfr.artº.5, nº.2, do anterior C.P.A.). No âmbito do procedimento tributário, a consagração de tal princípio resulta do artº.55, da L.G.Tributária, tendo expresso desenvolvimento no artº.46, do C.P.P.Tributário.
17. A Constituição da República consagra no seu artº.266, os princípios fundamentais por que se deve reger a actividade da Administração Pública, entre os mesmos surgindo, após a revisão constitucional de 1997, o princípio da boa-fé (cfr.nº.2). A expressa menção deste princípio, desenvolvido no direito civil (cfr.v.g.artºs.227, 334 e 762, do C.Civil), significa que ele foi erigido pela Constituição à categoria de princípio jurídico autónomo de direito público. Mas não é transparente a sua especificidade dentro do âmbito dos princípios vinculativos da Administração. Também não é líquido se o princípio da boa-fé é aqui recortado como princípio autónomo em relação ao princípio da protecção da confiança, há muito considerado pela doutrina e jurisprudência como uma dimensão material do princípio do Estado de Direito. Já no domínio da lei ordinária, vamos encontrar a boa-fé reconhecida no artº.59, da L.G.Tributária, normativo que consagra o princípio da colaboração entre a A. Fiscal e os contribuintes, o qual tem como núcleo essencial os deveres de informação recíprocos dos mesmos intervenientes no procedimento tributário gracioso, mais presumindo a boa-fé na actuação de ambas as partes. Esta presunção de boa-fé da actuação da Administração Tributária terá efeitos, essencialmente, ao nível da responsabilidade civil da administração perante os particulares, incluindo a que se traduz no pagamento de juros indemnizatórios, impondo aos que se considerem lesados a prova dos pressupostos em que assenta essa responsabilidade. Esta exigência recíproca de relacionamento segundo as regras da boa-fé já constava, igualmente, do artº.6-A, nº.1, do anterior C.P.Administrativo.
18. Pode definir-se a caducidade como o instituto através do qual os direitos que, por força da lei ou de convenção das partes, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo seu não exercício durante o mesmo período. O instituto da caducidade tem por fundamentos vectores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere.
19. No que diz respeito ao direito tributário, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, matéria que não é de conhecimento oficioso, encontra actualmente consagração genérica no artº.45, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12, norma que vem consagrar um prazo de caducidade de quatro anos (cfr.anterior artº.33, nº.1, do C.P.Tributário, o qual consagrava o prazo de cinco anos). Face à redacção do aludido artº.45, da L. G. Tributária, é claro que, quer o exercício do direito à liquidação, quer a notificação do seu conteúdo ao contribuinte, e não apenas aquele primeiro acto, têm que ocorrer dentro do mencionado prazo de quatro anos contados do facto tributário, sob pena de operar a caducidade de tal direito. O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos.
20. A possibilidade de exame da caducidade do direito à liquidação pode verificar-se no âmbito do processo de impugnação, desde que estejamos perante situação que se reconduz à estruturação de liquidação fora do prazo de caducidade e, necessariamente, também a respectiva notificação foi efectuada fora do prazo. Mais se dirá que a conjuntura de caducidade sob exame por contender com a legalidade, que não com a exigibilidade da dívida, deve visualizar-se como fundamento típico do processo de impugnação judicial e não do processo de oposição à execução fiscal.
21. A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação.
22. No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A., então em vigor).
23. O prazo de caducidade do direito à liquidação de sisa não era de quatro anos, conforme defende o recorrente (cfr.artº.45, nº.1, da L.G.T.), mas antes de oito anos nos termos do artº.92, do C.I.M.S.I.S.S.D. (cfr.artº.35, nº.1, do actual C.I.M.T.).
24. Os juros compensatórios podem definir-se como os que constituem compensação para o credor, por certas utilidades concedidas ao devedor, tendo a função de completar a indemnização devida, assim reparando o credor prejudicado do ganho perdido até que tenha conseguido a reintegração do seu crédito. No âmbito do direito tributário os juros compensatórios podem configurar-se como tendo a natureza de uma verdadeira cláusula penal legal, aparecendo como um agravamento “ex lege” ao imposto, sendo incluídos na liquidação deste e arrecadados juntamente com ele, tendo os mesmos prazos de cobrança e estando sujeitos ao mesmo período prescricional, sobre ambos podendo incidir o cálculo dos juros de mora (cfr.artº.83, do C.P.T.; artº.35, da L.G.T.). Esta natureza dos juros compensatórios, como componente da dívida global de imposto, resulta hoje, com evidência, do preceituado no artº.35, nº.8, da L.G.T.
25. A responsabilidade pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de uma situação em que exista uma dívida de imposto (que serve de base ao cálculo dos juros), verificados os seguintes pressupostos:
a-Actos ou omissões que levem a um atraso na estruturação de uma liquidação; ou
b-Não pagamento de imposto que deva ser efectuado antecipadamente (sem prévia notificação do sujeito passivo pela administração tributária); ou
c-Não pagamento de imposto que foi retido ou que deveria ter sido retido e entregue à administração tributária; ou
d-Reembolso superior ao devido;
e-Atraso na liquidação ou entrega do imposto ou reembolso indevido imputáveis ao contribuinte, isto é, quando exista nexo de causalidade entre a actuação do contribuinte e aquele atraso ou reembolso;
f-Que o retardamento ou reembolso seja imputável ao contribuinte a título de culpa.
26. Deverá entender-se a imputabilidade a que alude o artº.35, nº.1, da L.G.T., como exigindo que possa formular-se um juízo de censura (derivado de uma actuação dolosa ou meramente negligente) ao sujeito passivo. A culpa, na falta de outro critério, deverá ser aferida pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso (cfr.artº.487, nº.2, do C.Civil). A boa-fé é de presumir (cfr.artº. 59, nº.2, da L.G.T.), pelo que a determinação da culpa reconduzir-se-á, na maior parte dos casos, à apreciação da razoabilidade da interpretação da lei que fez o contribuinte. Pressuposto da obrigação do pagamento dos juros compensatórios é, por isso, que o facto seja subjectivamente imputável ao sujeito passivo, isto é, que sobre ele possa recair um juízo de censura ou reprovação da conduta do agente, porque podia e devia, nas circunstâncias do caso, ter agido diversamente.
27. Já quanto ao nexo de causalidade se dirá que a conduta do contribuinte é causal face ao retardamento do pagamento do imposto, adoptando-se o conceito previsto no artº.563, do C.Civil, visto que nos encontramos perante uma forma de responsabilidade civil, se for de um tipo que devesse normalmente conduzir ao mesmo retardamento e, consequentemente, estará esse nexo excluído se, no caso concreto, o mesmo retardamento só ocorreu devido a circunstâncias excepcionais ou anómalas.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
“B..., S.A.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.217 a 232 do processo, através da qual julgou totalmente improcedente a impugnação pelo recorrente intentada, visando actos de liquidação de Sisa e juros compensatórios no montante total de € 1.816.851,14.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.344 a 403 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões (após convite do relator para sintetizar as mesmas):
1-No requerimento de interposição do recurso, a recorrente requereu que ao mesmo fosse atribuído efeito suspensivo dado que o processo de execução, relativo à liquidação impugnada, se encontrava assegurado pela garantia bancária n° 114/2007 (nº.16 dos factos provados);
2-No despacho de admissão do presente recurso vem dito que o recurso tem subida imediata e efeito devolutivo, o que contraria, sem qualquer justificação ou fundamentação, o disposto no art. 286°, n° 2 do CPPT;
3-A garantia já prestada perante o órgão de execução fiscal onde pende o processo respetivo (art. 183°, n° 1 do CPPT) é suficiente para conferir efeito suspensivo ao presente recurso, assim como obstou ao prosseguimento da execução no decurso do processo de impugnação judicial;
4-O cálculo do montante da garantia foi efetuado pelo serviço de finanças competente e obedeceu ao previsto no art. 199°, n° 5 do CPPT, devendo continuar a ser considerada idónea já que o mesmo serviço nunca a pôs em causa ou exigiu o seu reforço, ao abrigo do n° 9 do mesmo artigo;
5-Face ao que ficou dito, vem a recorrente requerer expressamente a alteração do despacho de admissão do recurso, sendo a este atribuído efeito suspensivo ou, caso assim se não entenda, requer que seja indicado qual o montante do reforço da mesma que o Tribunal entende necessário efetuar com essa finalidade;
6-No que diz respeito aos factos provados, a sentença recorrida limita-se a elencar o que consta de alguns documentos juntos aos autos, como se apenas essa prova fosse relevante em matéria tributária;
7-A Juiz a quo ignorou o depoimento das testemunhas e omitiu muitos outros documentos que atestam factos essenciais para a compreensão do que se passou e que evidenciam, não só o comportamento transparente da recorrente, como as dúvidas e hesitações da administração tributária central que nunca respondeu às questões colocadas pelos serviços periféricos sobre a liquidação impugnada;
8-Tais factos são importantes para a decisão da causa - por permitirem aferir do abuso de direito e da violação de deveres fundamentais por parte da administração, por um lado, e da inexistência de culpa por parte do contribuinte, por outro - pelo que devem ser acrescentados à matéria de facto dada como provada, com a redação sugerida a pág.s 26 a 30 das presentes alegações;
9-Verifica-se um lapso manifesto na alínea m) dos Factos Provados que indica a data de 30/07/2004, querendo dizer 30/04/2007;
10-A sentença recorrida encontra-se ferida de nulidade, por omissão de pronúncia sobre questões de facto essenciais para a boa decisão da causa, conforme disposto no art. 668°, n° 1, al. d) do CPC, aplicável por força do art. 2°, al. d) do CPPT;
11-Era do perfeito conhecimento da Direção de Serviços dos Impostos do Selo e das Transmissões do Património (DSISTP) que os imóveis adquiridos pela recorrente, em 23/12/1999, se destinavam a revenda, por tal facto resultar do processo em que a recorrente solicitou a concessão de benefícios fiscais, ao abrigo do DL n° 404/90, para uma operação de reestruturação em que esses mesmos imóveis iriam ser transmitidos para outra sociedade a título de realização de aumento de capital;
12-A administração tributária estava obrigada, por força dos princípios da boa-fé, da transparência de procedimentos, do dever de colaboração e do respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos, a alertar a recorrente para o efeito que, no seu entendimento, decorreria da concretização da projetada operação de reestruturação e que se iria traduzir na caducidade da isenção de sisa anteriormente concedida, por aplicação do disposto no art. 16°, n° 1 do CIMSISSD, dado ocorrer «mudança de destino», conforme posteriormente invocado;
13-Contrariando esses deveres, a administração tributária não informou a recorrente e nem sequer esclareceu os seus próprios serviços que, por duas vezes, perguntaram por escrito (em 29/04/2005 e em 11/07/2006) à DSISTP qual o enquadramento legal da situação que acabou por originar a liquidação impugnada;
14-Acresce que a DSISTP havia já entendido, em casos semelhantes, que a transmissão de imóveis no decurso de operações de fusões, cisões e entradas de ativos não implicava «mudança de destino» pelo que não dava origem à caducidade da isenção prevista no art. 16°, n° 1 do CIMSISSD;
15-A recusa por parte da administração tributária em admitir e reconhecer que mudou os seus procedimentos, e alterou o seu entendimento sobre esta questão, mais não faz do que evidenciar e tornar irrefutável a sua má fé em todo este processo, ficando, assim, ilidida a presunção do art. 59°, n° 2 da Lei Geral Tributária;
16-Ao não informar a recorrente sobre as consequências que para ela adviriam, resultantes da aprovação da operação de reestruturação em análise naquele serviço, a administração tributária violou o disposto nos art.s 4° (princípio da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos), 5° (princípios da igualdade e da proporcionalidade), 6° (princípios da justiça e da imparcialidade), 6°-A (princípio da boa-fé) e 7° (princípio da colaboração da Administração com os particulares) do CPA, bem assim como o disposto nos art.s 55° e 59° da Lei Geral Tributária;
17-A violação dos princípios fundamentais que devem reger a atividade da administração tributária constitui violação de lei que acarreta a anulação da liquidação nesses termos efetuada, conforme resulta do disposto no art. 135° do CPA;
18-Para além disso, tendo a sentença recorrida omitido qualquer referência à violação destes princípios, e não se tendo pronunciado sobre as questões invocadas pela recorrente na sua impugnação, encontra-se ferida de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no art. 668°, n° 1, al. d) do CPC;
19-Entende o Tribunal a quo que "o destino diferente a que alude o § 1° do art. 16" se deve apurar por contraposição a qualquer tipo de transacção diferente da revenda...", corroborando, assim, a afirmação da administração tributária que invoca ter ocorrido, no caso dos autos, «mudança de destino» sem explicar em que é que essa mudança se traduziu e quando operou;
20-Ora, a administração tributária tem vindo a entender que a «mudança de destino» se concretiza quando o bem deixa de ser considerado e tratado como uma "existência" para passar a integrar o ativo imobilizado da empresa, assumindo, assim, um carácter de permanência;
21-Não restam dúvidas de que a operação de reestruturação em causa foi levada a cabo ao abrigo do regime da neutralidade fiscal, como reconhecido - e imposto - pela administração tributária e confirmado pelas testemunhas inquiridas;
22-Assim sendo, a mudança de titularidade da propriedade dos prédios em questão não implica afetação a destino diferente, nem tal poderia acontecer de acordo com o referido princípio da neutralidade fiscal;
23-Ou seja, os prédios que se encontravam no balanço da B..., SA como existências, mercadorias destinadas a revenda, teriam de passar para o balanço da P. ..., SA, exatamente na mesma situação, continuando como mercadorias destinadas a revenda, por assim obrigar a referida exigência de neutralidade fiscal;
24-Aliás, a fiscalização da observância da neutralidade fiscal impendia sobre a administração tributária que, no decurso da inspeção que levou a cabo, não logrou demonstrar, como lhe competia, que tinha havido afetacão a destino diferente;
25-Assim sendo, continuou a impender sobre a nova proprietária dos prédios a obrigação de proceder à sua revenda no prazo de 3 anos, sob pena de ocorrer a caducidade prevista no citado art. 16°, n° 1 do CIMSISSD que elenca três situações distintas em que se verifica tal caducidade: (i) afetacão a destino diferente; (ii) não revenda no prazo de 3 anos; (iii) ou revenda novamente para revenda;
26-Neste caso, verificado que fosse o decurso de 3 anos após a aquisição "originária" para revenda, a nova proprietária estaria obrigada a fazer a competente declaração, no serviço de finanças, no prazo de 30 dias (art. 91° do CIMSISSD), para efeitos de liquidação do imposto devido ou, caso não o fizesse, tal liquidação seria oficiosa;
27-Verificada, assim, a caducidade da isenção por aplicação do n° 1 do art.16° do CIMSISSD, seria a adquirente P. ..., SA a responsável pela liquidação e/ou pagamento do imposto, como sujeito passivo de mesmo;
28-Seguindo este raciocínio, torna-se evidente a ilegitimidade da recorrente/ impugnante, pelo que a liquidação impugnada é ilegal, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento por incorreta interpretação e aplicação do disposto no art. 16°, n° 1 do CIMSISSD;
29-Vem ainda a sentença recorrida afirmar que o único sentido que o art. 16°, n° 1 do CIMSISSD comporta é o de considerar o conceito de «revenda» limitado ao contrato tipificado de compra e venda; contudo, a administração tributária sempre defendeu um conceito de «transmissão fiscal» que vai muito para além do conceito civilístico de compra e venda;
30-É o conceito de transmissão de imóvel que releva para efeitos de aplicação das normas de incidência em IMT (v. art. 2°, n° 5, ails. e) e g) do CIMT) e não o de "compra e venda", ou de "revenda", que não aparece sequer definido na legislação fiscal;
31-O conceito de «transmissão de imóvel», para efeitos de incidência do imposto, não pode ter um âmbito mais alargado do que o utilizado quando se está perante uma isenção, sob pena de gritante ofensa dos princípios da igualdade, da proporcionalidade e da justiça material;
32-Questão incontroversa e aceite pela administração tributária, pelo menos, desde o despacho de 09/07/1980 (P° 15/15, L° 14/2680) que esclarece que, para efeitos fiscais, nomeadamente de sisa, o significado do termo «aquisição» é o mesmo que o de «transmissão», pelo que os imóveis objeto do contrato de cisão/fusão beneficiariam de isenção de sisa, nos termos do art° 11°, n° 3 do CIMSISD de 1958,verificados que fossem os condicionalismos legais;
33-A atual legislação fiscal considera que são operações de concentração a fusão, a cisão e a entrada de ativos pelo que o CIRC lhes dá o mesmo tratamento fiscal; acresce ainda que a realização em espécie do capital social é, para todos os efeitos, designadamente fiscais, uma operação de transmissão de bens, móveis ou imóveis;
34-A interpretação normativa do Tribunal a quo segundo a qual, para efeitos de aplicação do art. 16°, n° 1 do CIMSISSD, só existe «revenda» com a celebração de um contrato de compra e venda de imóvel, afastando a aplicação daquela norma aos casos em que a transmissão ocorreu por força de uma operação de fusão, cisão ou entrada de ativos, é inconstitucional por violação dos direitos fundamentais da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé (art.s 13° e 266° da CRP), atendendo a que, se as transmissões de imóveis efetuadas no âmbito de tais operações são relevantes para efeitos de sujeição a imposto, também o terão de ser quando está em causa uma isenção do mesmo;
35-Para o Tribunal a quo o prazo de caducidade do direito à isenção conta-se a partir da data em que a isenção ficou sem efeito, considerando que o facto tributário "é a constatação de que a impugnante não deu cumprimento à condição a que ficou subordinada a concessão da isenção...";
36-Ora, tratando-se de uma condição resolutiva, tal significa que da sua verificação resulta a resolução (extinção) dos efeitos do negócio ou ato condicional pelo que, extinguindo-se a isenção condicional atribuída, fica de pé unicamente o facto tributário gerador do imposto, ou seja, a aquisição inicial; aliás, a própria administração tributária, no despacho de 30/04/2007 anexo à notificação da liquidação, identificou o facto tributário como tendo ocorrido em 23/12/1999;
37-Assim sendo, a caducidade do direito à liquidação ocorreu em 23/12/2003 (ou seja, anos antes da notificação da liquidação que teve lugar em 10/05/2007), por força do disposto no art. 45°, n°1 da LGT, conjugado com o art. 5°, n° 5 do D.L. n° 398/98, de 17/12, que a aprovou, o qual estipula que o novo prazo de caducidade da liquidação se aplica aos factos tributários ocorridos a partir de 1 de Janeiro de 1998;
38-A sentença recorrida, ao pronunciar-se sobre os juros compensatórios, abordou o problema sob uma perspetiva puramente objetiva ao afirmar que a "condição essencial à exigibilidade de tais juros é que determinado imposto seja devido e que não tenha sido entregue nos cofres do Estado no prazo legalmente determinado";
39-Ora, tal afirmação contraria o disposto no art. 35°, n° 1 da LGT que é claro quando estipula que apenas são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido, o que significa que a liquidação de tais juros pressupõe a culpa do contribuinte, a qual tem de ser fundamentada pela administração tributária já que a mesma não se presume;
40-A recorrente sempre atuou de boa-fé, expôs as suas pretensões com toda a clareza, deu toda a informação relevante sobre a situação concreta e apresentou todos os documentos necessários a uma decisão esclarecida e fundamentada, como ficou demonstrado;
41-A administração tributária teve, desde início, conhecimento completo do que estava em causa e, mesmo assim, decidiu favoravelmente a pretensão da recorrente e concedeu-lhe os benefícios requeridos, sem proceder de imediato, após a concretização da operação de reestruturação ocorrida em 20/12/2002, à liquidação do imposto, a qual só veio a acontecer em 10/05/2007;
42-A recorrente estava profundamente convencida que a operação de entrada de ativos que havia sido aprovada não implicava a caducidade da isenção de que anteriormente havia beneficiado, pois, caso contrário, teria optado por outra solução;
43-Daqui resulta necessariamente que, no caso dos autos, não se encontra preenchido o requisito subjetivo para a liquidação de juros compensatórios, previsto no art. 35°, n° 1 da LGT, pelo que a sentença recorrida violou esta disposição legal, incorrendo em erro de julgamento sobre matéria de direito;
44-Nestes termos e nos mais de Direito deve o presente recurso ser considerado procedente e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, como é de inteira Justiça.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Tribunal “a quo”, a fls.323 e 324 dos autos, com fundamento nos artºs.249, do C.Civil, e 666, nº.2, e 667, nº.1, ambos do C.P.Civil, procedeu à rectificação de erro de escrita constante do nº.12 da matéria de facto dada como provada na sentença, por forma a que, onde se lê " (...) 30/07/2004 (...)", passe a ler-se "(...) 30/04/2007 (...)".
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.410 a 413 dos autos), no qual termina pugnando pelo não provimento do recurso.
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Corridos os vistos legais (cfr.fls.416 do processo), vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.218 a 224 dos autos - numeração nossa):
1-Por escritura de compra e venda, outorgada em 23/12/1999, no 6º Cartório Notarial de Lisboa, a impugnante, “B..., S.A.”, com o n.i.p.c. ..., adquiriu à sociedade “Avenida ..., S.A.”, para revenda, os seguintes prédios (cfr.documento junto a fls.62 a 72 dos presentes autos):
a)prédio urbano, sito na ..., nºs 47, 48 e 49, inscrito na matriz sob o artigo 418, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
b)prédio urbano, sito na ..., nº 35, vigésima quinta dependência, situada dentro do ... ..., inscrito na matriz sob o artigo 473, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
c)prédio urbano, sito na ..., nº 35, quarta dependência, situada dentro do ... ..., inscrito na matriz sob o artigo 427, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
d)do prédio urbano, denominado ... ..., sito na ..., nºs.21 a 35, e Rua da ..., nºs 8 a 16, as seguintes edificações:
- dependência nº 5, T..., inscrito na matriz sob o artigo 428, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 6, Salão ..., inscrito na matriz sob o artigo 429, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 11, ..., inscrito na matriz sob o artigo 433, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 9, Restaurante ..., inscrito na matriz sob o artigo 432, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 8, Fotografia ..., inscrito na matriz sob o artigo 431, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 16, ..., inscrito na matriz sob o artigo 435, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 51, ..., inscrito na matriz sob o artigo 445, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 1, ..., inscrito na matriz sob o artigo 425, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 44, ..., inscrito na matriz sob o artigo 439, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 13, ..., inscrito na matriz sob o artigo 434, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 2, Restaurante ..., inscrito na matriz sob o artigo 426, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 20, parcela de terreno para construção, inscrito na matriz sob o artigo 660, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 23, ..., inscrito na matriz sob o artigo 436, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 26, ..., inscrito na matriz sob o artigo 437, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 36, ... ..., inscrito na matriz sob o artigo 438, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 45, ..., inscrito na matriz sob o artigo 440, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 45-A, barraca, inscrito na matriz sob o artigo 442, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 48, ..., inscrito na matriz sob o artigo 443, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 49, inscrito na matriz sob o artigo 444, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- dependência nº 50, ..., inscrito na matriz sob o artigo 472, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
- edifícios sito na Rua da ..., nºs. 8 a 16, inscrito na respectiva matiz sob o artigo 515;
- parte do edifício com o nº 35, inscrito na matriz sob o artigo 676, da freguesia de ..., concelho de Lisboa;
2-Os prédios mencionados no nº.1, identificados nas verbas um a quatro da aludida escritura, foram vendidos pelo preço global de dois mil e duzentos milhões de escudos (cfr.documento junto a fls.62 a 72 dos presentes autos);
3-Pela transacção identificada no nº.1 não foi liquidada sisa em virtude de a impugnante destinar os prédios a revenda nos termos dos artigos 11º, nº 3 e 13º-A do Código de Imposto Municipal de Sisa e Imposto sobre as Sucessões e Doações (cfr. documento junto a fls.62 a 72 dos presentes autos);
4-No conjunto de prédios transaccionados estava incluído o ..., situado no ... ... e designado por dependência 13 na escritura identificada no nº.1, imóvel que foi declarado de interesse público pelo Decreto do Governo nº 8/83, de 24 de Janeiro;
5-O perímetro da zona especial de protecção conjunta dos imóveis classificados da Avenida ... e área envolvente, em Lisboa, foi fixado nos termos da planta anexa à Portaria nº 529/96, de 1 de Outubro;
6-Em 23/09/2002 a impugnante e a sociedade “L...-Investimentos Imobiliários, S.A.” apresentaram o requerimento de fls.55 a 61 dos autos, dirigido à Senhora Ministra das Finanças, pedindo a concessão de benefícios fiscais e outros, ao abrigo do Dec.-Lei nº 404/90, de 21/12, para a operação de transferência de activos da ......s-Estacionamentos de ..., SA./sociedade contribuidora, constituído por imóveis que integram o ... ..., para a L...-Investimentos Imobiliários, SA./sociedade beneficiária (cfr.documento junto a fls.55 a 61 dos presentes autos);
7-Em 18/12/2002, o pedido referido no número anterior, foi deferido por despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, com a fundamentação constante da informação nº 1798/2002 e pareceres na mesma exarados (cfr.documento junto a fls.84 a 87 dos presentes autos);
8-Por escritura de aumento de capital e remodelação integral do contrato social, outorgada em 20/12/2002, foi decidido aumentar o capital social da sociedade “L...-Investimentos Imobiliários, SA”, em € 10.970.000,00, capital esse integralmente subscrito pela accionista “......s-Estacionamentos, SA”, realizado com entrada em espécie dos prédios do ... ... (cfr.procedimento de reclamação graciosa apensa; informação exarada a fls.115 a 119 do processo administrativo apenso);
9-Na escritura referida no número anterior a sociedade “L...-Investimentos Imobiliários, SA” alterou a sua denominação para “P. ...-Investimentos Imobiliários ... ..., SA” (cfr.procedimento de reclamação graciosa apenso; informação exarada a fls.115 a 119 do processo administrativo apenso);
10-Em 22/01/2003 foi elaborada a informação nº 180/DR-DS/2003, no âmbito do proc. nº 89/3868) da Direcção Regional de Lisboa, do Instituto Português do Património Arquitectónico, sobre a qual recaiu o despacho do seu Director, com o seguinte teor
“1. O despacho 104/89 (SEC) determinou em vias de classificação a zona da Avenida ...;
2. Em 1998 foi proposta a sua revogação, por, entre outras razões ter sido instituída a ZEP da Av. ... / 7ª colina, havendo que identificar, por outro lado, os valores singulares a classificar. Esta proposta mereceu o despacho de 20.8.98 (VP): a reavaliar.
3. Verifica-se hoje que existe uma dualidade de interpretação, situação que importa esclarecer – tendo vulgarmente deixado de ser considerada a Avenida em vias de classificação.
(…)”
(cfr.documentos juntos a fls.73 a 83 dos presentes autos);
11-Por escritura de 05/07/2005, outorgada pelo Notário Privativo do Município de Lisboa, a sociedade “P. ...-Investimentos Imobiliários ... ..., SA” permutou os imóveis sitos no ... ... com o Município de Lisboa (cfr.procedimento de reclamação graciosa apenso; despacho cuja cópia se encontra a fls.38 a 45 dos presentes autos);
12-A Administração Tributária considerando que a impugnante deu destino diferente aos prédios adquiridos em 23/12/1999, para revenda e com isenção de Sisa, procedeu à liquidação ora em causa, por a isenção ter caducado nos termos do artigo 16º, nº 1 do CIMSISSD (cfr.despacho do adjunto do Chefe de Finanças de Lisboa-03, de 30/04/2007, constante a fls.22 a 29 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
13-Em 10/05/2007, através do ofício nº 04481, datado de 30/04/2007, a impugnante foi notificada para proceder ao pagamento da quantia de € 1.416.851,14, sendo € 1.097.355,37 de Imposto Municipal Sisa e € 319.495,77 de juros compensatórios (cfr. documentos juntos a fls.20 a 29 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
14-Em 08/10/2007 a impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação do Imposto Municipal de Sisa (cfr.documento junto a fls.2 a 19 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
15-Em 28/07/2009 a impugnante foi notificada do despacho do Director de Finanças Adjunto que indeferiu a reclamação graciosa, que aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr.documentos juntos a fls.75 a 84 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
16-Para pagamento do imposto municipal de sisa e respectivos juros compensatórios foi instaurado o processo de execução fiscal nº.... no Serviço de Finanças de ..., no qual foi prestada a garantia nº 144/2007 (cfr.informação exarada a fls.111 do processo administrativo apenso; documento junto a fls.319 dos presentes autos);
17-A presente impugnação foi apresentada em 13/08/2009 (cfr.carimbo aposto no rosto da petição inicial a fls.3 dos presentes autos).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Com interesse para a decisão da causa, não se provaram outros factos.
As demais asserções da douta petição integram conclusões de facto ou direito ou meras considerações pessoais da impugnante…”.

X
A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…O Tribunal alicerçou a sua convicção na apreciação conjugada de toda a prova documental junta aos autos pela impugnante e no processo administrativo apenso, organizado nos termos do artigo 111º do C.P.P.T., indicada relativamente a cada um dos factos.
As testemunhas inquiridas esclareçam, em síntese, a matéria relativa à reestruturação empresarial da impugnante, referindo que os prédios do ... ... foram adquiridos por uma questão de oportunidade, constituindo um novo negócio que posteriormente foi autonomizado…”.
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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou, essencialmente, em prova documental constante dos presentes autos e apensos, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
18-O Tribunal “a quo” admitiu o presente recurso com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo da decisão recorrida, devido ao facto da sociedade recorrente ter prestado garantia a suspender o processo de execução, conforme resulta do nº.16 da factualidade provada supra (cfr.despachos exarados a fls.241 e 329 dos presentes autos).
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida considerou, em síntese, julgar improcedente a presente impugnação, em consequência do que manteve os actos tributários objecto do presente processo (cfr.nºs.12 e 13 do probatório).
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
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A título de questão prévia, o apelante vem defender que ao presente recurso seja atribuído efeito suspensivo da decisão recorrida, visto que prestou garantia no âmbito do processo de execução fiscal que aponta a cobrança coerciva da liquidação impugnada (cfr.conclusões 1 a 5 do recurso).
Atento o conteúdo do despacho já exarado pelo Tribunal “a quo” e constante do probatório (cfr.nº.18 da factualidade provada), encontra-se decidido a contento do recorrente esta questão prévia, desnecessário se tornando o seu exame por este Tribunal.
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O recorrente discorda do decidido aduzindo, em primeiro lugar e em sinopse, que a sentença recorrida se encontra ferida de nulidade, por omissão de pronúncia, sobre questões de facto essenciais para a boa decisão da causa. Que tendo a decisão recorrida omitido qualquer referência à violação dos princípios da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos, da igualdade e da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade, da boa-fé, e da colaboração da Administração com os particulares, todos violados pela A. Fiscal, encontra-se ferida de nulidade por omissão de pronúncia (cfr.conclusões 10 a 18 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar uma nulidade da decisão recorrida devido a omissão de pronúncia.
Analisemos se a sentença recorrida sofre de tal pecha.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.7029/13).
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.608, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade da sentença, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.577 e 578, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº.133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac. T.C.A.Sul-2.ªSecção, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.7660/14; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P. Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365).
Revertendo ao caso dos autos, do exame do articulado inicial do processo (e recorde-se que o objecto do processo se fixa na fase dos articulados), deve concluir-se que a sociedade impugnante e ora recorrente erigiu como causas de pedir:
1-A ilegalidade da liquidação impugnada, visto que não ocorreu a caducidade da isenção de sisa concedida ao sujeito passivo de imposto;
2-A ilegalidade do acto tributário impugnado, dado incidir sobre imóveis em vias de classificação e situados numa zona especial de protecção visando a classificação como de interesse público;
3-A caducidade do direito à liquidação;
4-A ilegalidade da liquidação de juros compensatórios, devido a falta de prova do elemento subjectivo da imputação de culpa ao sujeito passivo.
Ora, foram estes os fundamentos da impugnação apreciados e decididos pelo Tribunal “a quo” na fundamentação jurídica da decisão recorrida (cfr.fls.224 a 232 dos presentes autos).
Passando ao pretenso vício decorrente da violação, pela A. Fiscal de diversos princípios do procedimento administrativo e tributário, matéria constante de forma esparsa em variados artigos da petição inicial, tal não constitui uma questão autónoma (no sentido supra delineado) que tenha sido erigida na p.i. como causa de pedir para anular o acto tributário impugnado. Antes nos encontramos perante mero argumento que se enquadra nas questões/causas de pedir identificadas nos nºs.1 e 2 da enumeração acima efectuada.
Já quanto à alegada omissão de pronúncia sobre questões de facto essenciais para a boa decisão da causa, embora não concretizadas pelo apelante, tal esquecimento poderia gerar um eventual erro de julgamento de facto da decisão recorrida, mas nunca uma nulidade devido a omissão de pronúncia.
Em suma, não se vê que a decisão recorrida tenha omitido pronúncia sobre qualquer questão suscitada nos articulados e, nestes termos, improcedendo este fundamento do recurso.
Mais alega o recorrente, em síntese, que a decisão recorrida ignorou o depoimento das testemunhas e não deu relevo a documentos que atestam factos essenciais para a compreensão do que se passou e que evidenciam, não só o comportamento transparente da apelante, como as dúvidas e hesitações da A. Fiscal que nunca respondeu às questões colocadas pelos serviços periféricos sobre a liquidação impugnada. Que tais factos são importantes para a decisão da causa, visto permitirem aferir do abuso de direito e da violação de deveres fundamentais por parte da Fazenda Pública, por um lado, e da inexistência de culpa por parte do contribuinte, por outro, assim devendo ser acrescentados à matéria de facto dada como provada, com a redação sugerida a págs.26 a 30 das presentes alegações (cfr.conclusões 6 a 8 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, supomos, um erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal pecha.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
Tal ónus rigoroso deve considerar-se mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 27/02/2014, proc.7205/13).
Por outro lado, no que concretamente diz respeito à produção de prova testemunhal, refira-se que se a decisão do julgador estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.6280/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6418/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
No caso concreto, não pode deixar de estar votado ao insucesso o fundamento do recurso em análise devido a falta de cumprimento do ónus mencionado supra, desde logo, quanto aos meios probatórios constantes do processo (prova testemunhal e documental) e que impunham o pedido aditamento ao probatório da matéria de facto.
Arrematando, este Tribunal não tem obrigação de conhecer do presente esteio do recurso.
Apesar disso, sempre se dirá que a factualidade que o recorrente pede para se aditar ao probatório e identificada nas alegações de recurso, a fls.369 a 373 do processo, desde logo, não reveste qualquer relevo para a decisão da causa. Assim é, porquanto, respeita a factos relativos à concessão do benefício fiscal associado à operação de reestruturação da empresa entretanto criada pela sociedade impugnante/recorrente, assim sendo factualidade que não incide sobre o objecto do presente litígio, relativo à caducidade da isenção do imposto de SISA devido pela aquisição dos imóveis identificados no nº.1 do probatório (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 5/11/2015, proc.7552/14).
Concluindo, não vislumbra o Tribunal “ad quem” que a sentença recorrida padeça do examinado erro de julgamento de facto, assim sendo forçoso julgar improcedente também este fundamento do recurso.
Mais alega o recorrente, em síntese, que a operação de cessão a uma terceira sociedade dos imóveis dos autos, não consubstancia afectação a destino diferente da revenda. Que a operação em causa obteve a autorização da A. Fiscal, ao conceder as isenções fiscais por si requeridas e ao reconhecer a neutralidade fiscal da operação de reestruturação de empresas em presença. Que a liquidação impugnada incorre no vício de violação de lei, por pressupor a caducidade da isenção, a qual, em rigor, não se terá verificado. Que é evidente a ilegitimidade do recorrente, pelo que a liquidação impugnada é ilegal, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento por incorrecta interpretação e aplicação do disposto no artº.16, nº.1, do C.I.M.S.I.S.S.D. Que a interpretação normativa do Tribunal “a quo”, ao restringir o conceito de revenda à celebração de um contrato de compra e venda de imóvel, padece do vício de inconstitucionalidade devido a violação dos direitos fundamentais da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da boa-fé (cfr.conclusões 19 a 34 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
O Imposto Municipal de Sisa (o dec.lei 308/91, de 17/8, alterou a designação do imposto de sisa para imposto municipal de sisa, tendo em vista a afectação das respectivas receitas aos municípios), criado pelo dec.lei 41969, de 24/11/58 (diploma que aprovou o Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações), podia definir-se como um imposto directo, de obrigação única, características reais e sobre o património, incidindo nas transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade, ou de figuras parcelares desse direito, relativamente a bens imóveis (cfr.preâmbulo e artº.2, do C.I.M.S.I.S.S.D.; Pedro Soares Martinez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.588 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, I, Editora Rei dos Livros, 1996, pág.285 e seg.).
O sujeito passivo da relação jurídico-tributária de sisa era o transmissário, ou seja, aquele que recebia os bens imóveis transmitidos (no caso de venda é o comprador) e a matéria colectável do imposto (pressuposto objectivo genérico de qualquer relação jurídico-tributária) era constituída pelo valor do imóvel, correspondendo o conceito fiscal de transmissão ao do direito privado, isto é, só é transmissão a perda relativa e a aquisição derivada de direitos, exceptuando os casos em que a lei fiscal dispuser o contrário (artºs.7 e 19, do C.I.M.S.I.S.S.D.; Nuno Sá Gomes, Incidência da Sisa, Cadernos de C.T.Fiscal, nº.6, pág.35 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/1/2012, proc.3197/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.4716/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/02/2015, proc.5326/12).
Revertendo ao caso dos autos, conforme se retira do probatório (cfr.nºs.3 e 12 da factualidade provada), entendeu a A. Fiscal, com a chancela do Tribunal “a quo”, que o recorrente deixou de beneficiar da isenção de sisa prevista nos artºs.11, § 3, e 13-A, do C.I.M.S.I.S.S.D., em virtude de ter dado destino diferente aos imóveis urbanos em causa, assim se verificando a caducidade do benefício de isenção de sisa, nos termos do artº.16, § 1, do mesmo diploma.
Antes de mais, se dirá que carece de base legal a alegação do apelante no sentido de a operação em causa ter obtido a autorização da A. Fiscal, ao conceder as isenções fiscais por si requeridas e ao reconhecer a neutralidade fiscal da operação de reestruturação de empresas em presença. É que a aludida reestruturação/transferência de activos foi formulada no quadro do dec.lei 404/90, de 21/12 (cfr.nº.6 do probatório), diploma que aprova o regime de isenção de sisa das empresas que procedam a actos de cooperação ou de concentração. Por seu turno, o acto objecto dos presentes autos respeita à isenção de sisa, pela aquisição de imóveis que, segundo a recorrente/adquirente, integraram o activo circulante da empresa tendo em vista a sua revenda, tudo conforme já vincado supra (nº.3 do probatório).
A isenção em causa, é uma isenção real condicionada, a título resolutivo, na medida em que caducará se ao prédio adquirido for dado destino diferente, ou se a venda for efectuada para além do prazo fixado na lei ou se for, novamente, vendido para revenda (cfr.artº.16, § 1, do C.I.M.S.I.S.S.D.). Esta caducidade da isenção do tributo ou a perda da sua eficácia apenas se mantém enquanto se verificarem os pressupostos que a condicionaram, operando automaticamente e com efeitos “ex tunc”, logo que verificado algum dos factos que a lei enumera como constituindo condição resolutiva deste benefício fiscal, mais cabendo, então, ao sujeito passivo solicitar a liquidação da sisa (artº.91, do C.I.M.S.I.S.S.D.) no prazo de 30 dias, contados da data da referida ocorrência (cfr.F. Pinto Fernandes e N. Pinto Fernandes, C.I.M.S.I.S.S.D. anotado e comentado, Rei dos Livros, 4ª. Edição, 1997, págs.194 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 4/7/2006, proc.1137/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/2/2010, proc.3368/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/02/2015, proc.5326/12).
De acordo com a lei, os benefícios fiscais devem considerar-se medidas de carácter excepcional, instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da tributação que impedem (cfr.artº.2, nº.1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo dec.lei 215/89, de 1/7 - E.B.F.).
Do ponto de vista jurídico, e na óptica da relação jurídica de imposto, os benefícios fiscais consubstanciam, antes de mais, factos que estando sujeitos a tributação, são impeditivos do nascimento da obrigação tributária ou, pelo menos, de que a mesma surja em plenitude. Na verdade, enquanto facto impeditivo, o benefício fiscal traduz-se sempre em situações que estão sujeitas a tributação, isto é, que são subsumíveis às regras jurídicas que definem a incidência objectiva e subjectiva do imposto. E, precisamente porque o benefício fiscal constitui um facto impeditivo da tributação-regra, a sua extinção ou falta de pressupostos de aplicação tem por efeito imediato a reposição automática dessa mesma tributação, como estabelece o artº.12, nº.1, do E.B.F. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/12/2012, proc.5810/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/07/2013, proc.6629/13; Nuno Sá Gomes, Teoria Geral dos Benefícios Fiscais, C.T.F. 359, pág.75 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, I, 1996, Editora Rei dos Livros, pág.323 e seg.).
No caso "sub judice", defende o recorrente que a conceptualização do conceito de revenda previsto na norma de incidência do imposto (cfr.artº.2, do C.I.M.S.I.S.S.D.) deve ser igualmente adoptado pelo legislador para efeitos de delimitação da norma de isenção (cfr.artº.11, § 3, do C.I.M.S.I.S.S.D.), pelo que, o conceito de revenda relevante para efeitos de caducidade é mais amplo do que a formalização do negócio jurídico que lhe subjaz (escritura pública de compra e venda), sendo claro que a operação de cessão a uma terceira sociedade dos imóveis dos autos, não consubstancia afectação a destino diferente da revenda.
É hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.9, do C.Civil; artº.11, da L.G. Tributária; José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, Editorial Verbo, 4ª. edição, 1987, pág.335 e seg.; J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1989, pág.181 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de C.T.Fiscal, nº.174, 1996, pág.363 e seg.).
Especificamente, as normas que consagram benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, embora admitam a interpretação extensiva (cfr.artº.9, do E.B.F.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/6/2013, proc.6588/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/07/2013, proc.6629/13; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª.edição, Coimbra Editora, 2007, pág.463 e seg.; Nuno Sá Gomes, Teoria Geral dos Benefícios Fiscais, Cadernos C.T.F., nº.165, 1991, pág.253 e seg.).
"In casu", a doutrina e jurisprudência são unânimes em considerar que os contratos de alienação a que se referem os artºs.11, § 3, e 16, § 1, do C.I.M.S.I.S.S.D., são os de compra e venda devidamente formalizados, susceptíveis de operar a transmissão civil dos imóveis segundo o direito privado, não relevando, nomeadamente, as simples promessas de venda, ainda que acompanhadas da tradição do imóvel (cfr.F. Pinto Fernandes e N. Pinto Fernandes, C.I.M.S.I.S.S.D. anotado e comentado, Rei dos Livros, 4ª. Edição, 1997, págs.195; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 29/10/2003, rec.894/03; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/11/2009, rec. 891/09; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/11/2011, rec.303/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/2/2010, proc.3368/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/2/2011, proc.4043/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/02/2015, proc.5326/12).
Partindo da letra da lei, pode, desde logo, verificar-se que falha neste caso, ao contrário do que se verifica para a definição da incidência do imposto (cfr.artº.2, do C.I.M.S.I.S.S.D.), uma intenção expressa do legislador em operar qualquer extensão do conceito, daí que, em princípio, o termo "revenda" deva valer para efeitos tributários com o mesmo sentido com que vale no direito comum (cfr.artº.11, nº.2, da L.G.T.), para o qual não basta para operar a transmissão do bem a celebração de um contrato promessa de compra e venda acompanhado da tradição do bem. E olhando agora à "ratio" do preceito, à mesma conclusão somos conduzidos. Se é verdade que a "deformação funcional" do conceito de transmissão para efeitos de incidência real de imposto de sisa acautela o receio do legislador na não celebração dos contratos definitivos de compra e venda de imóveis tendo em vista a evitação fiscal, a "ratio" da caducidade da isenção de imposto nas aquisições de prédios para revenda findos os três anos sem que o prédio tenha sido revendido (cfr.artº.16, § 1, do C.I.M.S.I.S.S.D.), parece ser somente a circunstância de ter sido ultrapassado o prazo tido pelo legislador como razoável para efectuar a revenda do bem, assim cessando, a partir daí, o desagravamento fiscal estrutural concedido atendendo à natureza empresarial da actividade exercida pelo adquirente para revenda, cujo enquadramento se insere no âmbito da tributação do rendimento e que tem como fim último, somente, o de afastar elevados encargos financeiros que, não obstante serem custos dedutíveis para efeitos de determinação do rendimento sujeito a imposto, tenderiam a repercutir-se no preço final da venda dos bens imóveis (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/5/2009, rec.234/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/02/2015, proc.5326/12).
Igualmente, a previsão do artº.16, § 1, do C.I.M.S.I.S.S.D., não permite considerar como revenda uma operação de permuta a uma terceira sociedade de imóveis, em contrapartida da detenção maioritária do capital social da mesma (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/01/2009, rec.642/08; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 7/03/2012, rec.1141/11).
Concordando com a descrita posição da doutrina e jurisprudência, é óbvia a falta de razão do recorrente, pelo que não obsta à caducidade da isenção de sisa, a operação de transferência de activos identificada no nº.6 do probatório.
Apesar disso, defende o apelante que tal interpretação do conceito de revenda, restringindo-a à celebração de um contrato de compra e venda de imóvel, padece do vício de inconstitucionalidade devido a violação dos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e boa-fé.
Encontramo-nos perante alegados vícios de inconstitucionalidade material e que buscam uma fiscalização concreta e com características oficiosas (cfr.artºs.204 e 280, nº.1, da C.R.Portuguesa; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.940 e seg.). No entanto, o que pode e deve ser objecto da fiscalização concreta da constitucionalidade, por parte dos Tribunais, são normas e não quaisquer decisões, sejam elas de natureza judicial ou administrativa, nem tão pouco eventuais interpretações que de tais normas possam ser efectuadas por aquelas decisões (cfr.artº.204, da C.R.Portuguesa; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/4/2006, proc.64561/96; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/1/2011, proc.4401/10; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 5/6/2012, proc.5445/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7164/13; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.518 e seg.).
O princípio da igualdade é um dos princípios estruturantes do sistema constitucional português, encontrando consagração genérica no artº.13, da C.R.Portuguesa. Por sua vez, a vinculação das autoridades administrativas ao princípio da igualdade encontra consagração no artº.266, nº.2, do diploma fundamental.
As decisões mais recentes do Tribunal Constitucional, na vertente que aqui nos interessa, assinalam correctamente que o princípio da igualdade obriga a que se trate por igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, não impedindo a diferenciação de tratamento, mas apenas as discriminações arbitrárias, irrazoáveis, ou seja, as distinções de tratamento que não tenham justificação e fundamento material bastante (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 1º. Volume, Coimbra Editora, 2007, pág.341; ac.Tribunal Constitucional 232/2003, de 13/5/2003; ac.Tribunal Constitucional 45/2010, de 3/2/2010).
Já o princípio da proporcionalidade, é explicitado como princípio material informador e conformador da actividade administrativa, no citado artº.266, nº.2, da C.R.Portuguesa, assim implicando a juridicidade de toda a actividade da Administração (cfr.artº.5, nº.2, do anterior C.P.A.; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.801 e seg.).
De acordo com o mesmo, na actuação administrativa terá de existir uma proporção adequada entre os meios empregues e o fim que se pretende atingir (cfr.José Manuel Santos Botelho, e Outros, Código do Procedimento Administrativo anotado e comentado, Almedina, 4ª. edição, 2000, pág.67, em anotação ao artº.5). No âmbito do procedimento tributário, a consagração de tal princípio resulta do artº.55, da L.G.Tributária, tendo expresso desenvolvimento no artº.46, do C.P.P.Tributário. O princípio da proporcionalidade obriga a Administração Tributária a abster-se da imposição aos contribuintes de obrigações procedimentais que sejam desnecessárias ou inadequadas à satisfação dos fins que aquela visa prosseguir ou que vão além do que seja necessário e adequado impor aos mesmos contribuintes (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, Encontro da Escrita Editora, 4ª. Edição, 2012, pág.448 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.449 e seg.).
Por último, a Constituição da República consagra no seu artº.266, os princípios fundamentais por que se deve reger a actividade da Administração Pública, entre os mesmos surgindo, após a revisão constitucional de 1997, o princípio da boa-fé (cfr.nº.2). A expressa menção deste princípio, desenvolvido no direito civil (cfr.v.g.artºs.227, 334 e 762, do C.Civil), significa que ele foi erigido pela Constituição à categoria de princípio jurídico autónomo de direito público. Mas não é transparente a sua especificidade dentro do âmbito dos princípios vinculativos da Administração. Também não é líquido se o princípio da boa-fé é aqui recortado como princípio autónomo em relação ao princípio da protecção da confiança, há muito considerado pela doutrina e jurisprudência como uma dimensão material do princípio do Estado de Direito. Já no domínio da lei ordinária, vamos encontrar a boa-fé reconhecida no artº.59, da L.G.Tributária, normativo que consagra o princípio da colaboração entre a A. Fiscal e os contribuintes, o qual tem como núcleo essencial os deveres de informação recíprocos dos mesmos intervenientes no procedimento tributário gracioso, mais presumindo a boa-fé na actuação de ambas as partes. Esta presunção de boa-fé da actuação da Administração Tributária terá efeitos, essencialmente, ao nível da responsabilidade civil da administração perante os particulares, incluindo a que se traduz no pagamento de juros indemnizatórios, impondo aos que se considerem lesados a prova dos pressupostos em que assenta essa responsabilidade. Esta exigência recíproca de relacionamento segundo as regras da boa-fé já constava, igualmente, do artº.6-A, nº.1, do anterior C.P.Administrativo (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/1/2013, proc.6337/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/03/2016, proc.9282/16; J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.803 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª. edição, Encontro da Escrita, 2012, pág.495 e seg.).
Voltando ao caso concreto, não vislumbra o Tribunal que a actuação da A. Fiscal, no que concerne, especificamente, à estruturação da liquidação de sisa objecto dos presentes autos, se possa considerar como violadora dos examinados princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e boa-fé.
Sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente esteio do recurso, mais se confirmando a decisão recorrida neste segmento.
Aduz, ainda, o apelante que extinguindo-se a isenção condicional atribuída, fica de pé unicamente o facto tributário gerador do imposto, ou seja, a aquisição inicial ocorrida em 23/12/1999. Que a caducidade do direito à liquidação ocorreu em 23/12/2003 (ou seja, anos antes da notificação da liquidação que teve lugar em 10/05/2007), por força do disposto no artº.45, nº.1, da L.G.T. (cfr.conclusões 35 a 37 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um novo erro de julgamento de direito da sentença recorrida.
Deslindemos se a sentença objecto do presente recurso padece de tal vício.
Pode definir-se a caducidade como o instituto através do qual os direitos que, por força da lei ou de convenção das partes, se devem exercer dentro de certo prazo, se extinguem pelo seu não exercício durante o mesmo período. O instituto da caducidade tem por fundamentos vectores como a certeza e a ordem pública, vistos no sentido de que é necessário que, ao fim de certo lapso de tempo, as situações jurídicas se tornem certas e inatacáveis. Esta prevalência de considerações de ordem pública constitui a razão explicativa para que o prazo de caducidade corra sem suspensões e interrupções e, em princípio, que só o exercício do direito durante o mesmo impeça que a caducidade opere. A necessária brevidade da relação jurídica que comporta um direito caducável determina que o não exercício do mesmo no prazo legal ou convencionalmente definido acarreta a sua extinção. Refira-se, ainda, que a caducidade, determinando a extinção do direito e da correspondente vinculação sem mais, não gera o consequente aparecimento de uma obrigação natural, contrariamente ao que acontece com o instituto da prescrição. Por último, a caducidade deve consubstanciar-se como uma excepção peremptória passível de apreciação oficiosa pelo Tribunal (cfr.artºs.328, 331 e 333, todos do C.Civil; artº.496, do C.P.Civil; Luis A. Carvalho Fernandes, Teoria Geral do Direito Civil, II, A.A.F.D.L., 1983, pág. 567 e seg.; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª.edição, Coimbra Editora, 1989, pág.372 e seg.; Aníbal de Castro, A Caducidade na doutrina, na lei e na jurisprudência, 3ª.edição, 1984, pág.29 e seg.).
No que diz respeito ao direito tributário, o regime da caducidade do direito à liquidação de impostos, matéria que não é de conhecimento oficioso, encontra actualmente consagração genérica no artº.45, da Lei Geral Tributária, aprovada pelo dec.lei 398/98, de 17/12, norma que vem consagrar um prazo de caducidade de quatro anos (cfr.anterior artº.33, nº.1, do C.P.Tributário, o qual consagrava o prazo de cinco anos). Face à redacção do aludido artº.45, da L. G. Tributária, é claro que, quer o exercício do direito à liquidação, quer a notificação do seu conteúdo ao contribuinte, e não apenas aquele primeiro acto, têm que ocorrer dentro do mencionado prazo de quatro anos contados do facto tributário, sob pena de operar a caducidade de tal direito. O prazo de caducidade em análise justifica-se por razões objectivas de segurança jurídica, tendo o propósito último de gerar a definição da situação do obrigado tributário num prazo razoável, cujo decurso conduz à preclusão do direito do Estado de promover a liquidação dos impostos que lhe sejam eventualmente devidos (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/10/2012, proc.5792/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.7031/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/10/2014, proc.7773/14; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e Anotada e comentada, Editora Encontro da Escrita, 4ª. Edição, 2012, pág.359 e seg.; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª.edição, Coimbra Editora, 2007, pág.259 e seg.; Joaquim Casimiro Gonçalves, A caducidade face ao direito tributário, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, 1999, pág.225 e seg.).
A Constituição da República Portuguesa, após a revisão introduzida pela Lei Constitucional nº.1/82, de 30/9, prevê no seu artº.268, nº.3, que os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados na forma prevista na lei (lei ordinária), assim impondo à Administração um dever de dar conhecimento aos interessados, mediante uma comunicação oficial e formal, do teor dos actos praticados, comunicação essa que deve incluir também a própria fundamentação do acto que do mesmo faz parte integrante (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4ª. Edição revista, II volume, Coimbra Editora, 2010, pág.824 e seg.).
A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; Alberto Pinheiro Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Almedina, 1972, pág.239 a 242; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.94 e seg.; Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.309 a 311).
No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A., então em vigor; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12).
Mais se dirá que a conjuntura de caducidade sob exame por contender com a legalidade, que não com a exigibilidade da dívida, deve visualizar-se como fundamento típico do processo de impugnação judicial e não do processo de oposição à execução fiscal (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 12/10/2005, rec.633/05; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2012, proc.5594/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/11/2013, proc.7031/13).
No caso dos autos, estamos face a liquidação de sisa, sendo que, de acordo com os ensinamentos da doutrina e jurisprudência, o Imposto Municipal de Sisa deve considerar-se um tributo de obrigação única, dado que dá origem somente a uma obrigação tributária que não se renova. O período de imposto é, precisamente, o critério temporal pelo qual a lei fragmenta no tempo um facto duradouro, via de regra correspondente ao período anual. O período de imposto surge, assim, como elemento essencial do facto tributário, de tal modo que nos factos duradouros periódicos a cada período (anual) corresponde uma obrigação nova e autónoma, tudo por contraposição aos impostos de obrigação única que têm por base facto tributário instantâneo (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 26/10/2011, rec.354/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/08/2012, proc.5857/12; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, Rei dos Livros, volume I, 1996, pág.130 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.45 e seg.).
A liquidação impugnada é referente à transmissão de imóveis por escritura pública celebrada em 23/12/1999 (cfr.nºs.1 e 3 do probatório), a qual ficou isenta nos termos do disposto nos artºs.11, § 3, e 13-A do C.I.M.S.I.S.S.D., em virtude da compra se destinar a revenda, isenção essa concedida pelo prazo de três anos, tudo conforme já examinado supra.
Recorde-se que o legislador expressamente acolheu, na delimitação do regime da caducidade do direito à liquidação, conforme resulta do disposto no artº.46, nº.2, al.c), da L.G.T. (aplicável ao caso dos autos, “ex vi” do artº.92, do C.I.M.S.I.S.S.D.), que o prazo para o exercício do direito à liquidação se suspende “em caso de benefícios fiscais de natureza condicionada, desde a apresentação da declaração até ao termo do prazo legal de cumprimento da condição”. Assim sendo, o termo inicial do prazo de caducidade do direito à liquidação somente opera com a dita caducidade da isenção, “in casu”, em 23/12/2002 (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/08/2012, proc.5857/12).
No entanto, sem prejuízo de tudo o acabado de mencionar, certo é que o prazo de caducidade do direito à liquidação não era de quatro anos, conforme defende o recorrente (cfr.artº.45, nº.1, da L.G.T.), mas antes de oito anos nos termos do artº.92, do C.I.M.S.I.S.S.D. (cfr.artº.35, nº.1, do actual C.I.M.T.).
No caso em apreço, o prazo de caducidade iniciou-se em 20/12/2002, pelo que se impunha que a notificação da liquidação aqui em causa fosse efectuada até 20/12/2010. Ora, o recorrente foi notificado da liquidação de sisa em 10/05/2007 (cfr.nº.13 do probatório), pelo que, manifestamente, não ocorreu a caducidade do direito à liquidação no caso dos autos.
Sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente esteio do recurso, mais se confirmando a decisão recorrida, também neste segmento.
Defende, por último, o apelante que não se encontra preenchido o requisito subjectivo para a liquidação de juros compensatórios, previsto no artº.35, nº.1, da L.G.T., pelo que a sentença recorrida violou esta disposição legal, incorrendo em erro de julgamento sobre matéria de direito (cfr.conclusões 38 a 43 do recurso).
Examinemos se a sentença recorrida suporta tal pecha.
Os juros compensatórios podem definir-se como os que constituem compensação para o credor, por certas utilidades concedidas ao devedor, tendo a função de completar a indemnização devida, assim reparando o credor prejudicado do ganho perdido até que tenha conseguido a reintegração do seu crédito. No âmbito do direito tributário os juros compensatórios podem configurar-se como tendo a natureza de uma verdadeira cláusula penal legal, aparecendo como um agravamento “ex lege” ao imposto, sendo incluídos na liquidação deste e arrecadados juntamente com ele, tendo os mesmos prazos de cobrança e estando sujeitos ao mesmo período prescricional, sobre ambos podendo incidir o cálculo dos juros de mora (cfr.artº.83, do C.P.T.; artº.35, da L.G.T.; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 27/11/96, C.T.F.387, pág.285 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/10/2013, proc.6670/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 24/9/2015, proc.8225/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/11/2015, proc.8976/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/3/2016, proc.9282/16; ac.T.C.A.Sul -2ª.Secção, 15/12/2016, proc.8415/15; Francisco Rodrigues Pardal, Juros Compensatórios, C.T.F.114, pág.37 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª. edição, Encontro da Escrita, 2012, pág.283 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.234 e seg.).
Esta natureza dos juros compensatórios, como componente da dívida global de imposto, resulta hoje, com evidência, do preceituado no artº.35, nº.8, da L.G.T.
A responsabilidade pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de uma situação em que apareça uma dívida de imposto (que serve de base ao cálculo dos juros), verificados os seguintes pressupostos:
1-Actos ou omissões que levem a um atraso na estruturação de uma liquidação; ou
2-Não pagamento de imposto que deva ser efectuado antecipadamente (sem prévia notificação do sujeito passivo pela administração tributária); ou
3-Não pagamento de imposto que foi retido ou que deveria ter sido retido e entregue à administração tributária; ou
4-Reembolso superior ao devido;
5-Atraso na liquidação ou entrega do imposto ou reembolso indevido imputáveis ao contribuinte, isto é, quando exista nexo de causalidade entre a actuação do contribuinte e aquele atraso ou reembolso;
6-Que o retardamento ou reembolso seja imputável ao contribuinte a título de culpa, tenha o nexo de imputação características dolosas ou meramente negligentes (cfr.artº.35, nº.1, da L.G.T.; ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 21/1/2015, rec.632/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/10/2013, proc.6670/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 24/9/2015, proc.8225/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/11/2015, proc.8976/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/3/2016, proc.9282/16; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/12/2016, proc.8415/15; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.235; José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.298 e seg.).
Haverá, agora, que saber se estão reunidos os pressupostos para a liquidação de juros compensatórios no caso "sub judice", os quais se encontram enumerados supra.
Está em causa a apreciação do nexo de culpa e de causalidade face à conduta da sociedade impugnante/recorrente, tendo em consideração o objectivo retardamento no pagamento do imposto.
Conforme se alude acima, deverá entender-se a imputabilidade a que alude o artº.35, nº.1, da L.G.T., como exigindo que possa formular-se um juízo de censura (derivado de uma actuação dolosa ou meramente negligente) ao sujeito passivo. A culpa, na falta de outro critério, deverá ser aferida pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso (cfr.artº.487, nº.2, do C.Civil). A boa-fé é de presumir (cfr.artº. 59, nº.2, da L.G.T.), pelo que a determinação da culpa reconduzir-se-á, na maior parte dos casos, à apreciação da razoabilidade da interpretação da lei que fez o contribuinte. Pressuposto da obrigação do pagamento dos juros compensatórios é, por isso, que o facto seja subjectivamente imputável ao sujeito passivo, isto é, que sobre ele possa recair um juízo de censura ou reprovação da conduta do agente, porque podia e devia, nas circunstâncias do caso, ter agido diversamente (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/11/2015, proc.8976/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/12/2016, proc.8415/15; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.235 e seg.).
Já quanto ao nexo de causalidade se dirá que a conduta do contribuinte é causal face ao retardamento do pagamento do imposto, adoptando-se o conceito previsto no artº.563, do C.Civil, visto que nos encontramos perante uma forma de responsabilidade civil, se for de um tipo que devesse normalmente conduzir ao mesmo retardamento e, consequentemente, estará esse nexo excluído se, no caso concreto, o mesmo retardamento só ocorreu devido a circunstâncias excepcionais ou anómalas (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/11/2015, proc.8976/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/12/2016, proc.8415/15; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P. Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág. 236 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, deve concluir-se pela imputabilidade, pelo menos a título negligente, do objectivo retardamento do pagamento do imposto devido, à sociedade impugnante/recorrente. Assim é, porquanto, a apelante não respeitou o enquadramento legal vigente na altura no que se refere à não liquidação imediata do valor devido de sisa, no momento em que deu um destino diferente aos imóveis adquiridos para revenda, operação que permitia a isenção nos termos do artº.16, nº.1, do C.I.M.S.I.S.S.D., assim se verificando a falta de diligência da sociedade recorrente no respectivo pagamento do imposto (cfr.nºs.8 e 12 do probatório).
Por outras palavras, o recorrente não logra reverter o juízo de culpa que sobre si impende pela falta de liquidação atempada do imposto. Tal conduta é exigível ao operador económico diligente, colocado na posição da sociedade apelante. O recorrente não pode olvidar que o conceito de revenda não foi preenchido com a operação por si realizada de entrega em espécie do imóvel à sociedade que constituiu, pelo que, em face da verificação da condição resolutiva da isenção, era-lhe exigível que procedesse à liquidação do imposto (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 5/11/2015, proc.7552/14).
Por último, deve concluir-se pela existência de um juízo de causalidade adequada por parte da conduta da sociedade recorrente face ao verificado retardamento na liquidação/pagamento do imposto legalmente devido, tudo em virtude da caducidade da isenção de sisa ocorrida e supra examinada.
A sentença sob recurso não merece censura neste segmento.
Atento tudo o relatado, nega-se provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
X
Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 19 de Setembro de 2017


(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)