Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1340/13.4BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:01/14/2020
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores: IRC. COMPROVAÇÃO DA EFECTIVIDADE DO CUSTO. PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA.
Sumário:1) O ónus da demonstração da efectividade do custo que recai sobre o contribuinte não se mostra observado quando os documentos juntos na pendência da impugnação correspondem a documentos avulsos, escritos em língua estrangeira, sem qualquer conciliação, justificação, explicação ou registo contabilístico correspondente.
2) O ónus de comprovação dos custos que recai sobre o contribuinte exige a especificação dos mesmos, caso a caso, acompanhado dos registos contabilísticos correspondentes.
3) Estando em causa a concessão de empréstimos que correspondem a operações vinculadas, sem remuneração, efectuadas entre sociedades integrantes de um grupo societário, sendo as sociedades mutuárias sociedades dominantes da mutuante, mostram-se verificados os pressupostos de aplicação da norma relativa aos preços transferências.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I- Relatório

A sociedade impugnante L........, S.A, S.A. e a Fazenda Pública, deduziram recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto a sentença proferida pelo Juíz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, exarada a fls. 1628 a 1648 do presente processo, através da qual julgou parcialmente procedente a impugnação, e, em consequência, decidiu anular a liquidação de IRC e juros compensatórios, de 2008, na parte referente à correcção relativa a despesas não documentadas provenientes das sucursais da Roménia e Bulgária.
A recorrente L........, S.A., termina as alegações (cfr.fls.1775 a 1778 dos autos) do seu recurso formulando as seguintes conclusões:
A - Salvo o devido respeito que a douta sentença recorrida nos merece, a recorrente discorda do julgamento da matéria de fato e de direito contido naquela, ou seja, o Tribunal a quo efetuou um errado e incorreto julgamento da matéria de fato e de direito.
B - Por um lado, a recorrente entende que se encontram julgados incorretamente os fatos provados sob as letras "I.", "J." e "K."
C - Com efeito, além de não terem sido impugnados os documentos nº 2 a 85 e nº 124 a 129, juntos com o requerimento de 23.10.2013, a fls. 524 a ..... dos autos e fls. 77 a 114 dos documentos juntos no sitaf a 28.09.2015, apenso, identificados no facto provado da letra "I.", os documentos 231, 232, 235, 238, 241 a 266 e 268 a 292, juntos com o requerimento de 18.07.2014, a fls. 1174, 1175, 1179, 1183, 1186 a 1211 e 1213 a 1247 dos autos, identificados no facto provado da letra "J." e os documentos 97 e 113, juntos com o requerimento de 23.10.2013, a fls. 744 (com tradução a fls. 42 do apenso) e 762 a 770 dos autos, e doc. 123, a fls. 1050 dos autos (com tradução a fls. 179 do apenso), junto com o requerimento de 18.07.2014, identificados no facto provado da letra "K.", também não foram impugnados nem os documentos 1, 86 a 96, 98 a 112, 114 a 120, 122 e 123 juntos com o requerimento de 23.10.2013, a fls. 520, 626, 671, 679, 681, 737 a 743, 745 a 756, 759 a 761, 771 a 774, 776, 777, 780, 785 e 786 dos autos, nem os documentos 45 a 122, 124 a 240, 267 e 293, juntos com o requerimento de 18.07.2014, a fls. 971 a 1042, 1044 a 1049, 1051 a 1073, 1075, 1077 a 1089, 1091 a 1117, 1119 a 1121, 1124 a 1129, 1131 a 1143, 1147 a 1150, 1152 a 1155, 1157, 1159 a 1163, 1165, 1167, 1168, 1170 a 1173, 1176, 1177, 1181, 1182, 1184, 1185, 1212 e 1247 dos autos.
D - Assim, não tendo nenhum dos 129 documentos juntos com o requerimento de 23.10.2013 nem nenhum dos 292 documentos juntos com o requerimento de 18.07.2014 sido impugnados são os mesmos válidos e idóneos para dar como provados os respetivos custos.
E - Aliás, os documentos aceites pela AT em sede de direito de audição nem foram traduzidos nem objeto de qualquer validação especial, com base nos quais foram aceites custos relativos a impostos e a outros custos e perdas financeiras relativas às sucursais da Bulgária, Roménia e Argélia, no montante de € 647.926,91.
F - Aliás, a recorrente juntou os documentos 1 a 44, em 18 de julho de 2014, para poder demonstrar que os documentos juntos com o requerimento de 23.10.2013 tinham a mesma identidade e semelhança formal e material relativamente aos documentos juntos e aceites em sede de direito de audição. Por sua vez, os documentos nº 45 a 292 juntos com o requerimento de 18.07.2014 têm também a mesma identidade material e formal dos documentos nº 1 a 44 juntos no referido requerimento.
G - Identidade formal e material de parte substancial dos 129 documentos juntos com o requerimento de 23.10.2013 e dos 292 documentos juntos com o requerimento de 18.07.2014, que justifica que o respetivo teor seja aceite como prova dos custos titulados pelos mesmos.
H - 129 documentos juntos com o requerimento de 23.10.2013 e 292 documentos juntos com o requerimento de 18.07.2014, cuja idoneidade e suficiência probatória é ainda de aceitar tendo em conta que, em sede de julgamento, foram os referidos documentos confirmados pelo teor do depoimento da testemunha J........, arrolada pela ora recorrente.
I - O depoimento da testemunha da recorrente, J........ o qual foi claro, cristalino, linear, convincente e persuasio, não suscitando dúvidas por parte do Tribunal, conforme assim melhor resulta nomeadamente do seu teor ao minuto 10 e 43 segundos e seguintes da gravação da audiência de julgamento.
J - Deste modo, da instrução efetuada pela recorrente mediante a junção dos requerimentos de 23.10.2013 e de 18.07.2014 resulta que o teor dos factos provados pelas letras "I.", "J." e "K." terá de passar a ser a seguinte:
"I. No ano de 2008, a recorrente incorreu em custos, refletidos nas contas das suas sucursais, nos seguintes termos:
sucursal da Roménia:
..... - de 288.148,75 RON, ou seja, € 75.533,71, conforme documentos 2 a 85 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 524 a ..... dos autos;
..... - de 1.882.537,83 RON, ou seja, € 493.477,95, conforme documentos 120 e 123 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 780, 781 e 786 dos autos;
..... - de 863.241,93 RON, ou seja, € 226.285,42, conforme documentos 124 a 129 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 782 a 800 dos autos;"
sucursal da Bulgária:
..... - de 568.259,31 LEV, ou seja, € 267.435,49, conforme documentos 90 a 115 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 737 a 772 dos autos;
..... - de 330,61 LEV, ou seja, € 155,59, conforme documento 116 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 773 dos autos;"
"J. No mesmo período, a recorrente incorreu em custos, refletidos nas contas das suas sucursais, nos seguintes termos:
sucursal da Roménia:
..... - de 328.831,81 RON, ou seja, € 86.198,14, conforme documentos 231 a 240 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1172 a 1185 dos autos;
..... - de 504.014,41 RON, ou seja, € 132.119,52, conforme documentos 241 a 267 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1186 a 1212 dos autos;
..... - de 247.244,77 RON, ou seja, € 64.811 ,36, conforme documentos 268 a 293 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1213 a 1247 dos autos;"
"K. No mesmo período, a recorrente incorreu em custos, refletidos nas contas das suas sucursais, nos seguintes termos:
sucursal da Bulgária:
..... - de 42.573,69 LEV, ou seja, € 20.036,09, conforme documentos 104 a 123 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1030 a 1050 dos autos;
..... - de 3.147,34 LEV, ou seja, € 1.481,21, conforme documentos 124 a 137 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1051 a 1064 dos autos;
..... - de 6.324,40 LEV, ou seja, € 2.975,93, conforme documentos 138 a 230 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1065 a 1173 dos autos:
…. - de 3.663,23 LEV, ou seja, € 1.723,99, conforme documentos 45 a 103 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 971 a 1029 dos autos;"
K - Os custos justificados nos termos dos fatos provados supra sob as letras "I.", "J." e "K." perfazem, pois, o montante global de € 1.372.234,30, pelo que tendo a Autoridade Tributária corrigido no relatório de inspeção a quantia de € 1.435.669,98, significa que apenas não foi justificada a diferença entre os referidos valores que perfaz € 63.435,68.
L - Por sua vez, a recorrente discorda da aplicação do direito aos factos provados sob as letras "A.", "B.", e "C.".
M - Com efeito, fazendo parte da matéria de fato provada consubstanciada nos factos provados com as letras "A.", "B." e "C." que os referidos contratos beneficiam durante o período de 1O e 20 anos, do regime de não pagamento de juros, contados desde 2000, ou seja, em 2008 mantinha-se o referido regime de não sujeição a juros, pelo que a aplicação do regime constante do artigo 58° do CIRC é ilegal por também não ser aplicável o artigo 20º do CIRC.
N - A douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento da matéria de direito na medida em que transforma como taxa de operação comparável a taxa de juro prevista no nº 1 da cláusula 3ª do "Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente", tão-só prevista para o período após a carência de juros, a qual foi fixada à Taxa Lisbor, a seis meses, acrescida de 1,50%" e a taxa de juro prevista no nº 1 da cláusula segunda do "Contrato de suprimentos", ou seja a taxa Euribor a 12 meses acrescidos de 1,50% ..."
O - Com base nas referidas taxas foi efetuada uma correção aos proveitos, a título de juros, nas quantias de € 2.401.101,25 e 41.634,27, no que "Contrato de Mútuo sob a forma de Conta Corrente" diz respeito e da quantia de € 602.141,01 no que ao "Contrato de Suprimentos" diz respeito, correções estas que violam ainda o regime do artigo 58° do CIRC, mais concretamente o seu número um.
P - Com efeito, a aplicação do regime de relações especiais exige e implica sempre que seja definida e individualizada pelo menos uma operação comparável entre duas entidades independentes, sendo de referir que em sede de matéria de facto dada como provada, não foi feita nenhuma descrição de operações de financiamento celebradas entre entidades independentes com base nas quais seriam feitas as correções fiscais à própria recorrente, faltando assim um pressuposto essencial para a aplicação do regime do artigo 58° do CIRC.
Q - Acresce referir que a aplicação ao exercício de 2008 da taxa de juro prevista para um período posterior ao próprio exercício de 2008 configura uma tributação duma operação que de acordo com o texto dos próprios contratos de mútuo sob a forma de conta corrente e de suprimentos não estava sujeita a juros, ou seja, o procedimento adotado pela AT no exercício de 2008 de aplicar uma taxa de juro que no contrato apenas estava prevista para exercícios posteriores configura uma alteração do próprio texto dos contratos, dito de outra forma, tal procedimento configura a atribuição dum efeito jurídico-fiscal que não faz parte dos próprios contratos.
R - Só que a alteração e ou modificação dos efeitos fiscais, em 2008, dos contratos celebrados pelos contribuintes constitui a aplicação duma norma anti­abuso cujo respetivo regime está consignado no artigo 63° do CPPT, regime este que depende de despacho do Diretor geral da Autoridade Tributária e da prévia notificação de audição prévia específica para o caso, formalidades estas que não foram cumpridas pelo que a respetiva correção fiscal em sede de juros é ilegal.
S - Embora o valor da causa tenha sido fixado em € 2.006.480,47, contudo, nos termos do disposto no art.º 6°, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais (RCP), o excesso que ultrapasse o valor de € 275 000,00, pode ser dispensado de tributação na conta final, quando a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.
T - Ora, nem na primeira instância nem no presente recurso se vislumbram questões de elevada especialização ou complexidade técnica a dirimir, limitando-se os autos à apreciação de uma única questão jurídica (aceitação de custos fiscais em sede de IRC), pelo que é aplicável o regime do nº 7 do artigo 6° do RCP.
U - A douta decisão recorrida fez errada aplicação dos artigos 74°,1 da LGT, dos artigos 23º, 1, 42° e 58° do CIRC e do 63° do CPPT.
V - Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, anulando-se a liquidação de IRC de 2008 no que ao acréscimo dos lucros tributáveis das quantias de € 2.401.101,25, 41.634,27, 602.141,01 e 1.372.234,30, e no que à tributação autónoma diz respeito relativamente à quantia de € 1.372.234,30, devendo ainda a recorrente ser dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça na parte em que exceda a quantia de € 275.000,00.
X
Contra-alegou a FAZENDA PÚBLICA (cfr.fls.1713 a 1727 dos autos), formulando as sequentes conclusões:
a) Os documentos juntos pela Impugnante/Recorrente, e que contribuíram para e considerar como provados os factos constante nas alíneas 1, J e K, são particulares, e a Recorrida não invocou a falsidade destes, dado que os documentos particulares não provam, só por si, o seu conteúdo, ou seja, constituem apenas um meio de prova livremente apreciado pelo julgador, pois nenhuma força probatória plena lhes é atribuída.
b) Não obstante, a Fazenda Pública, aqui Recorrida, não se conformou quanto ao conteúdo de todos os documentos juntos pela Impugnante, e nesta medida impugnou a sua força probatória, nomeadamente demonstrando que os mesmos não eram capazes de provar os factos que a Impugnante pretendia, com os mesmos, provar.
c) Pela Fazenda Pública ficou demonstrado que todos os documentos apresentados pela Impugnante não faziam prova dos fundamentos da ação.
d) Do que deriva a total falta de sustentação de que tenha existido um "errado e incorreto julgamento da matéria de fato" (conclusão A) do recurso da Impugnante), devendo nesta medida improceder o recurso.
e) A prova documental refere-se a algo capaz de demonstrar a existência de um facto, pelo que, não se alcança o sentido da alegação e conclusões E), F) e G) da Recorrente, pois os documentos não têm a natureza de provados ou não, tal caraterização é única e exclusiva para factos.
f) A Impugnante apresentou em juízo documentos escritos em língua estrangeira, e nos termos do art. 134° do CPC (ex vi art. 2° al. e) do CPC) cabe ao juiz, por sua iniciativa, ou a pedido de alguma das partes, determinar a sua tradução, se necessária, e in casu o Juiz em primeira instância entendeu que tal era necessário (" vide" despacho de 07/04/2015), pelo que não tendo a Recorrente apresentado a tradução dos documentos, implicou que o Tribunal "a quo" não tenha apurado os "factos constitutivos do direito alegado" (art. 342º n.º 1 Código Civil), ou conforme sentenciado, ficou o Tribunal impedido de identificar os dados essenciais das operações (fornecedor e adquirente, descrição da operação e valor) e de apreender os elementos essenciais das operações.
g) A mera invocação pela Impugnante de que a falta de tradução dos documentos não pode conduzir a uma prova insuficiente, esperando dessa forma modificar a matéria de facto (alíneas I, J, K), não é, só por si, bastante para que o Tribunal "ad quem" possa alterar a decisão proferida em primeira instância, porque no processo de impugnação judicial vigora o principio da livre apreciação da prova e o principio do ónus da prova, assim, cabendo in casu o ónus da prova à Impugnante, o qual não alcançou, consequentemente o julgamento realizado em Primeira instância é acertado e não sofre de vícios.
h) A Junção no processo de impugnação dos mesmos 44 documentos que em sede inspetiva permitiram prover parte dos custos, e a invocação de que os mesmos têm "a mesma identidade e semelhança formal e material" dos juntos aos autos de impugnação judicial, não é por si só bastante ou suficiente para que este Tribunal de Recurso possa afastar os factos provados I, J e K incluídos no probatório.
i) Os aludidos 44 documentos juntos não se afigura constituírem "concretos meios probatórios, constantes do processo ..., que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnada diversa da recorrida" (al. b) do n.º 1 do art.640° do CPC, aplicável subsidiariamente nos termos da al. e) do art.2° do CPPT), pois, os mesmos não constituem fundamento da ação, visto não fazerem prova dos custos que na impugnação judicial a Impugnante pretendia provar.
j) Dos depoimentos das testemunhas ouvidas nestes autos, não resulta de forma alguma que os factos provados sob as alíneas I, J e K devam assumir os termos indicados pela Recorrente na conclusão T) do recurso, ou que exista erro do julgador ao fixar aqueles factos provados.
k) O sentenciado em primeira instância não apresenta violação de lei ao aplicar o art. 58° do CIRC aos factos provados sob as letras A, B e C, atenta a fundamentação legal feita constar no sentenciado, ou seja, atendendo que a Impugnante não logrou demonstrar a racionalidade económica de financiamento, com carência de juros, o que in casu implicava um dever acrescido de fundamentação porque, na situação dos autos, contrariamente às situações regra, verifica-se que é a construtora a financiar a SGPS, e a atividade de financiamento não faz parte do objeto social da Impugnante, por outro lado, sendo a Impugnante a sociedade com maiores custos operacionais também não se justifica a realização dessas operações de financiamento com carência de pagamento de juros, uma vez que sendo a Impugnante a sociedade participada (e não a sociedade beneficiária) não tem a expetativa de obter o retorno desses investimentos, nomeadamente por via dos dividendos.
l) O sentenciado não sofre de "erro de julgamento da matéria de direito na medida em que transforma em operação comparável" (conclusão AC)) a taxa de juro prevista nos contratos de mútuo sob a forma de conta-corrente e no contrato de suprimentos, dado que é facto notório que nenhuma entidade independente aceitaria ceder fundos, com renúncia à receção de remuneração e não beneficiar de garantias.
m) Conforme sentenciado, a AT aplicou a taxa acordada pelas parte porque considerou que essa taxa não era diversa da que seria contratada se a operação fosse praticada entre entidades independentes, pelo que desta forma a AT cumpriu o ónus da prova na justificação do critério adotado, cabendo assim à Impugnante alegar e demonstrar que o método usado pela AT não foi o correto, ou ainda que, num empréstimo acordado entre entidades independentes, a taxa aplicável seria outra diferente.
A Impugnante não logrou alcançar tal ónus, que a si competia.
n) Não ocorre erro de julgamento porque a Impugnante não fez prova de que um credor independente, em situação análoga, não aplicaria juros; ou de que um credor independente, em situação análoga, consentia em renunciar ao recebimento dos juros; e ainda que as mutuárias debatiam-se com dificuldades financeiras que levaram a mutuante (Impugnante) a renunciar aos juros ou a diferir a sua cobrança.
o) Sendo certo e seguro que uma entidade independente, sem relações especiais, não procederia a empréstimos sem obtenção de uma remuneração, é evidente a existência de uma efetiva diferença de preços, afigurando-se assim adequada a correção dos preços para os próprios níveis contratados pela Impugnante.
p) Jurisprudencialmente, o sentenciado afigura-se não sofrer de erro de julgamento, e também a atuação da AT foi legal, como se retira do acórdão do TCA Sul, proc. n.º 04384/10, de 05/07/2011, que admite a adoção pela AT do critério feito constar nos próprios contratos celebrados com violação do art. 58° do CIRC.
q) O sentenciado deve manter-se, afigurando-se ser errada e infundamentada a conclusão da Recorrente e Impugnante que a decisão judicial impugnada "fez errada aplicação dos artigos 74°, 1 da LGT, dos artigos 23°, 1, 42° e 58° do CIRC e 63° do CPPT" (conclusão AS)).
r) A fazenda Pública deve ser dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art. 6° n.º 7 do RCP, nomeadamente porque nestas contra-alegações pugna de modo fundamentado, pela posição adotada, em conformidade com o direito processual aplicável, e sem utilizar qualquer meio que possa ser reputado de inútil, desadequado ou dilatório, bem como respeita o princípio da colaboração com a justiça, abstendo-se da prática de atos inúteis, fornecendo todos os elementos necessários à boa decisão da causa.
s) Pedido: Requer-se "doutamente" a este Venerando Tribunal que considere o recurso interposto pela Impugnante/Recorrente totalmente improcedente, e ainda que seja a Recorrida dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que exceda o montante de e 275.000.
X
O Digno Representante da Fazenda Pública, também deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto a mesma sentença. Termina as alegações (cfr.fls.1667 a 1678 verso dos autos) do seu recurso formulando as seguintes Conclusões:
a) O facto provado na sentença indicado no ponto K deve ser retificado, dado que por mero lapso, ficou omitido que o valor incorrido “em custos, no montante de 91.899,87” é na moeda usada naquele país (Bulgária), ou seja, o LEV.
b) A Recorrente não se conforma com o sentenciado na parte em que deu como provado, sob o ponto I, que a Recorrida realizou prova, que “I. No ano de 2008, a sucursal da Roménia incorreu custos, reflectidos na conta ....., no montante global de 288.148,75 Ron,” cuja motivação da decisão de facto consiste nos Docs. 2 a 85 juntos pela Impugnante, conforme descrito nesta alínea do probatório.
c) Os documentos n.º 2 a 85 juntos pela Impugnante pelo seu requerimento de 23/10/2013 encontram-se redigidos em língua estrangeira, com exceção do Doc. 8, e conforme se verifica do requerimento apresentado pela Impugnante nos autos em 28/09/2015, somente foi apresentada a tradução para a língua portuguesa dos Docs. 13, 40, 46 e 60.
d) O Tribunal “a quo” tomou como relevante a falta de tradução dos documentos de suporte para considerar que não se provou que “A Impugnante tenha suportado outros custos nas sucursais da Roménia, Bulgária e Argélia, para além dos referidos nas alíneas I., J. e K. dos factos provados” (pág. 23 da sentença)
e) A falta de tradução dos documentos impende, de forma relevante, fazer prova dos encargos em apreciação, atendendo que dos documentos redigidos em língua estrangeira não é possível aferir a que título o encargo é suportado, se a Impugnante é (ou não) a beneficiária ou consumidora do bem ou serviço, ou qual é este, e nem qual a indispensabilidade dos mesmos para a obtenção de proveitos ou ganhos sujeitos ao imposto e para a manutenção da fonte produtora.
f) A falta de tradução dos documentos implica o desconhecimento da realidade a que os mesmos respeitam, nomeadamente se os mesmos respeitam (ou não) à atividade comercial desenvolvida pela Impugnante.
g) A simples junção dos documentos redigidos em língua estrangeira, implica omissão por completo da obrigação que deriva para a Impugnante do art. 23º n.º 1 do CIRC.
h) O aludido Doc. 8 não tem o valor de 62,00Ron, conforme atribuição feita pela Impugnante no seu requerimento de 23/10/2013, pois atento o seu conteúdo o seu valor é, isso sim, de € 62.
i) Acrescidamente, parte do valor deste documento respeita a encargos do ano de 2007, ou seja, € 20,15 (153,99 Ron), o que não deve ser aceite, em respeito pelo princípio da especialização, conforme ficou contestado sob o art. 194º da contestação, e que o sentenciado também acolheu, conforme decorre de fls. 24 da sentença (último parágrafo, a propósito do Doc. 267).
j) Somados os valores que resultam dos Docs. 8, 13, 40,46 e 60, totalizamos o valor de 256.750,22 Ron, o que equivale a € 70.110,78, tendo presente a aludida taxa de câmbio (“vide” Doc. 1).
k) Face ao valor dado como provado (288.148,75 Ron/€ 78.684,78), temos uma diferença de 31.398,53 Ron (€ 8.574,00), correspondentes a custos aceites no sentenciado e que por meio deste recurso ficam impugnados, devendo o sentenciado ser revogado neste montante, por padecer de erro de julgamento.
l) A recorrente também não se conforma que o sentenciado tenha dado por provado na alínea J) que, no exercício fiscal de 2008, a Impugnante, relativamente à sucursal da Roménia, tenha incorrido em custos “reflectidos na conta 68: (…) com código ....., no valor de 483.659,34 Ron; (…)”, atendendo que a prova produzida, e com base na qual o sentenciado se suportou (“cfr. docs. ….241 a 266;…juntos com o requerimento de 18.07.2014…”) não sustenta tal decisão.
m) Também neste caso a Impugnante apresentou os documentos 241 a 267 para suporte destes encargos, através do seu requerimento junto aos autos em 18/07/2014, e alguns destes encontravam-se redigidos em língua estrangeira, nomeadamente os Docs. 241 a 253, 257 a 261 e 263 a 266, tendo a Impugnante, relativamente aos quais, apresentado a tradução dos Docs. 245, 246, 250, 251, 257, 264 e 266, pelo seu requerimento junto aos autos em 27/06/2015.
n) A semelhança do supra alegado e agora concluído de d) a g), somente devem ser aceites custos que estejam comprovados por documentos traduzidos para a língua portuguesa, e os apresentados em língua portuguesa.
o) Da tradução para português dos Docs. 245, 246, 250, 251, 257, 264 e 266 resulta que o total dos custos pelos mesmos representado ascende a 332.775,36 Ron/€ 90.870,97, ou seja, um valor inferior em 150.883,98 Ron/€ 41.201,89, face aos custos considerados provados (483.659,34 Ron/€ 132.072,86), e que não se aceita.
p) Acrescidamente, tendo presente que a Impugnante apresentou desde “ab initio” os documentos n.º 254, 255, 256 e 262 em língua portuguesa, verifica-se que os mesmos respeitam a “encargos financeiros – juros”, calculados para o período compreendido entre janeiro e setembro do ano de 2008, respeitantes a contratos de suprimentos assinados em 19/05/2008 e 25/10/2005 (Doc. 254), em 20/01/2007 (Doc. 255), em 25/10/2005 (Doc. 256), e, em 19/05/2006 e 25/10/2005 (Doc. 262).
q) O Doc. 267, também redigido em Português, respeita a “Encargos Financeiros” “Referente ao período entre Out./05 a Dez/08.”, tendo o Tribunal, em respeito pelo princípio da especialização de exercícios, quanto ao mesmo “aceite a proporção corresponde a ¼ do respectivo custo, por estarem em causa quatro exercícios fiscais.” (pág. 24 da sentença), ou seja, de 8.995,56 Ron (€ 2.456,42).
r) A Impugnante em momento algum identificou ou apresentou os contratos a que se referem tais “encargos financeiros”, afim de ser possível verificar quem são as partes contratuais dos mesmos e qual a razão ou origem da sua celebração, ou seja, averiguar, no mínimo, se de facto a Impugnante é neles partes, se o seu conteúdo respeita à atividade comercial por si desenvolvida e se revelam indispensabilidade (nos termos do art. 23º do CIRC).
s) Não tendo assim atuado, os aludidos custos não podem ser aceites, dado que a Impugnante não fez prova que pagando os ditos encargos financeiros não está a suportar encargos financeiros que lhe são alheios.
t) O valor de custos correspondentes aos aludidos documentos perfaz o total de 148.030,60 Ron/€ 40.422,71, o qual não deve ser aceite.
u) Cautelarmente, caso não seja considerado procedente que os valores inscritos nos Docs. 245, 257 e 266 não deve ser aceite como custo fiscal, revela que estes documentos, conforme da sua tradução se alcança, são meros “lançamentos contabilísticos”, ou seja, estamos perante suportes contabilísticos internos, mas que não transmitem qualquer conexão entre o encargo suportado e a indispensabilidade do mesmo, e por esse efeito não devem ser aceites como comprovativos do custo fiscal.
v) A Fazenda Pública manifesta ainda discordância que na sentença tenha sido dado como provado que a Impugnante, no exercício fiscal de 2008, quanto à sucursal da Roménia, tenha incorrido em custos, refletidos na conta ..... “e com o código ....., no valor de 246.696,82 Ron (…)” (facto provado J), atendendo a que a prova em que o sentenciado se baseou, os documentos “268 a 292 juntos com o requerimento de 18.07.2014” (pág. 10 da sentença), não permitem suportar tal montante.
w) A Impugnante somente apresentou a tradução para português de parte dos aludidos documentos, isto é, dos Docs. 269, 271, 273 e 279, pelo que, a falta de tradução dos restantes documentos, com base nos quais a Impugnante pretendia fazer prova documental do custo suportado, e que o sentenciado tomou em consideração para decidir, não podem ser aceites, dado que dos documentos não traduzidos não se afigura ter sido apreendido os dados ou elementos essenciais das operações e respetiva indispensabilidade.
x) Somente estão suportados custos pelos aludidos documentos, no montante de 184.544,70 Ron (€ 50393,62), não podendo, em consequência ser aceite que a Impugnante suportou custos fiscalmente aceites no montante de 246.696,82 Ron (€ 67.365,50), o que perfaz uma diferença de 62.152,12 Ron (€ 16.971,88).
y) Conclui-se que, o sentenciado sofre de erro de julgamento, e em consequência deve ser revogado em parte, ou seja, não deve manter-se a sentença impugnada na parte que considerou que a Impugnante, no exercício fiscal de 2008, relativamente à sucursal da Roménia, incorreu em custos no total de 1.882.235,69 Ron (€ 513.982,10), mas somente no total de 1.489.770,46 (€ 406.811,61), devendo assim o sentenciado ser revogado no montante de 392.465,23Ron (€ 107.170,48).
z) Na contestação a Fazenda Pública peticionou a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art. 6º n.º 7 do RCP, não tendo este pedido sido decidido, verifica-se, em consequência, a violação dos deveres de pronúncia do Tribunal “a quo”, sobre uma questão que devia ser apreciada, o que constitui nulidade da sentença, nos termos do art. 615º n.º 1 al. d) do CPC (“ex vi” art. 2º al. e) do CPPT), com o dever de ser arguida em sede de recurso (art. 615º n.º 4 do CPC).
aa) Sem conceder, e por cautela, afigura-se que este Tribunal Superior pode oficiosamente conhecer de tal pedido realizado em primeira instância.
bb) O valor deste recurso afigura-se dever ser fixado em € 107.170,48, por ser o montante que representa a utilidade económica do pedido realizado nesta instância judicial, mas caso este Tribunal Superior assim não o entenda e venha a fixar o valor do recurso em quantia superior a € 275.000, solicita-se que a Recorrente deve ser dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art. 6º n.º 7 do RCP.
cc) Na primeira instância, afigura-se que as questões decididas, em especial a que se refere aos denominados “preços de transferência”, é uma questão que pode ser considerada de “elevada especialização jurídica”, contudo, as restantes questões a decidir, afigura-se serem de natureza mais simples.
dd) No presente recurso, a questão a tratar é única, e embora envolvendo a apreciação de prova documental, afigura-se que a questão não deve ser considerada de elevada especialização jurídica.
ee) Afigura-se que, a conduta da Fazenda Pública não é merecedora de censura, na medida em que pugnou na contestação, e agora neste recurso, de modo fundamentado, pela posição adotada, em conformidade com o direito processual aplicável, e sem utilizar qualquer meio que possa ser reputado de inútil, desadequado ou dilatório, bem como se pautou pelo princípio da colaboração com a justiça, abstendo-se da prática de atos inúteis, fornecendo todos os elementos necessários à boa decisão da causa, pelo que, fixar custas com base num valor de processo de € 2.006.480,47 (fixado em primeira instância), afigura-se violar os princípios da proporcionalidade, da justiça e do acesso ao direito.
ff) Desta forma, requer-se a este douto tribunal “ad quem”, que caso não seja considerada nula a sentença proferida, ordene que, quer neste Tribunal Superior (considerando a possibilidade do valor do recurso ser fixado em quantia superior à indicada pela Recorrente, e em quantia superior a € 275.000), quer na Primeira Instância, seja a Fazenda Pública dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art. 6º n.º 7 do RCP, ou seja, que em sede de elaboração da conta de custas nos presentes autos, seja desconsiderado o remanescente da taxa de justiça, considerando-se como montante máximo o valor de € 275,000,00 (Tabela I do RCP).
gg) Requer-se “doutamente” a este Venerando Tribunal que considere o presente recurso procedente, com fixação do valor do recurso no montante de € 107.170,48, ou caso seja fixado em outra quantia que ultrapasse € 275.000,00, seja a Recorrente dispensada do pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que exceda o aludido montante.
X
No seu recurso, a Fazenda Pública requereu a junção de um documento.
X
Não há registo de contra-alegações no âmbito deste recurso.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da improcedência de ambos os recursos (cfr.fls.1782 a 1783 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.1785 e 1785 verso dos autos), vêm os autos à conferência para deliberação.
X
II-Fundamentação
II.1. De facto
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.1630 verso a 1639 verso dos autos):
A - Em 20.09.2000, a Construtora do L........, SGPS, S.A. e a Construtora do L........, S.A., actualmente denominada L........, S.A., ora Impugnante, celebraram um acordo denominado “Contrato de Mútuo sob a Forma de Conta- Corrente”, mediante o qual efectuavam “empréstimos destinados à cobertura de carência das respectivas tesourarias” (cláusulas 1.ª e 2.ª) e, nos termos previstos na cláusula 3.ª, “1 – Os juros a pagar por cada uma das partes pelos empréstimos efectuadas no âmbito do presente contrato fixam-se à Taxa Lisbor, a seis meses, acrescidas de 1,5%. 2 – Devido ao descrito nos considerandos supra, ou seja, a canalização de recursos para novos projectos na área da construção que, directa ou indirectamente beneficiam ambas as Contraentes, projectos esses que se encontram em fase de arranque e cuja maturação e retorno será dilatado no tempo, as partes acordam que o pagamento dos respectivos juros beneficiam de um prazo de carência de dez anos, com início na data de entrega das quantias mutuadas ao abrigo do presente contrato, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento ou ao pagamento de quaisquer juros.” (cfr. contrato, a fls. 141 a 144 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido – anexo 5 do relatório de inspecção tributária (adiante, abreviadamente, RIT);
B - Em 21.09.2004, a Construtora do L........, SGPS, S.A. e a Impugnante celebraram um “Contrato de Suprimentos”, mediante o qual esta constitui e realiza “suprimentos sob a forma de dinheiro e nos valores que, nos termos e para os efeitos do presente contrato, lhe sejam previamente solicitados por esta, destinados a apoio à actividade da Primeira Contratante na área das concessões rodoviárias e consoante estas necessidades” (cláusula 1.ª) e, de acordo com a cláusula 2.ª do acordo, “1 - Os suprimentos constituídos e realizados vencerão juros à taxa Euribor a 12 meses acrescidos de 1,50% (…), sem prejuízo, no entanto do estipulado no número seguinte da presente cláusula; 2 - Acordam as partes, pelos motivos referidos nos Considerandos, num período de carência de juros até ao início do efectivo retorno do investimento efectuado na concessão rodoviária supra referenciada, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento nem pagamento de quaisquer juros.”. (cfr. contrato, a fls. 146 a 149 dos autos, que se dá por reproduzido – anexo 6 do RIT);
C - Resulta dos “Considerandos” do acordo referido na alínea antecedente, que “(…) C) A primeira Contratante encontra-se em fase de constituição de novas sociedades comerciais que, directa ou indirectamente, iniciam novos projectos ao nível de investimentos em infra- estruturas de concessões rodoviárias, nomeadamente na B........, através do veículo S.........., S.A.”; “D) Os investimentos referidos no considerando anterior envolvem montantes muito elevados, uma dilação temporal alargada entre o início da execução dos projectos e a maturação dos mesmos (previsivelmente, de 20 anos) e, consequentemente, do início do respectivo retorno; E) Acresce que tais investimentos acarretam, para a Primeira Contratante, necessidades intensivas de afectação de recursos financeiros (…); F) Mais reconhece a Primeira Contraente que (…) a Segunda possa contar com fundos de montante e com carácter de permanência adequados à manutenção da normal fluidez da sua actividade; G) A Segunda Contratante, em virtude de ser a sociedade que, enquanto empreiteira, executará materialmente os trabalhos das infra-estruturas de concessões rodoviárias e de ser accionista da Primeira Contratante, tem, por tal facto, interesse próprio e legítimo no bom andamento e desenvolvimento dos projectos de investimentos desta Contratante (…).” (cfr. contrato, a fls. 146 a 149 dos autos);
D - Em 19.05.2005, a Impugnante celebrou com a sua Sucursal da Roménia um “Contrato se Suprimentos”, no valor de € 520.000,00, pelo prazo de 10 anos, renovável, sendo reembolsável em prestações trimestrais, sucessivas, com início em 19.05.2007 (cfr. contrato, junto como doc. 121 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 782 a 784 dos autos, que se dá por reproduzido);
E - Em 11.08.2006, a Impugnante celebrou com o B..........................., S.A. um acordo denominado “Contrato de Abertura de Crédito”, destinado a apoiar a estratégia de internacionalização do Grupo L........, SGPS, S.A., pelo montante máximo de € 9.500.000,00, com o prazo de 10 anos, com vencimento de juros à taxa EURIBOR a 3 meses, acrescida de 1 margem de 1%, com uma T.A.E. de 3,45%, calculados ao dia, tendo em garantia sido entregue uma livrança em branco, avalizada pela Construtora do L........, SGPS, S.A. (cfr. doc. n.º 3 junto com a p.i., a fls. 285 a 304 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);
F - Em 07.01.2007, a Impugnante celebrou com o B............, S.A. um acordo denominado “Contrato de Empréstimo”, sob a forma de mútuo, tendo a Construtora do L........ SGPS, S.A. intervindo no mesmo, na qualidade de garante, pelo valor de € 7.500.000,00, destinado ao financiamento das suas necessidades de tesouraria, pelo prazo de 10 anos, com vencimento de juros à taxa nominal correspondente à EURIBOR a 6 meses, à data 3,865%, acrescida da margem, que à data correspondia a 4, 875%, sendo a TAE efectiva de 4,937%, com contagem de juros dia a dia, tendo em garantia sido entregue uma livrança em branco, avalizada à subscritora pela Garante (cfr. doc. 2 junto com a p.i., a fls. 266 a 284 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido);
G - Em 25.03.2008, a L........ SGPS, S.A. e a L........ , SGPS, S.A, celebraram um acordo denominado “Contrato de Compra e Venda de Acções”, relativo à venda à segunda de 94,72% do capital social da Impugnante (cfr. contrato, a fls. 129 a 139 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido – anexo 4 do RIT);
H - Em 28.03.2008, a L........, SGPS, S.A. e a Impugnante celebraram um acordo denominado “Contrato de Mútuo sob a Forma de Conta- Corrente”, destinado ao apoio à tesouraria das respectivas outorgantes, nos termos do qual “O capital mutuado não vencerá juros na medida em que o presente mútuo se insere na Relação de Domínio existente entre as Outorgantes, e o interesse próprio das mesmas em evitar o recurso ao crédito a entidades terceiras.” (cláusula 3.ª). (cfr. contrato, a fls. 163 a 165 dos autos – anexo 9 do RIT);
I - No ano de 2008, a sucursal da Roménia incorreu custos, reflectidos na conta ....., no montante global de 288.148,75 Ron, e, na conta ....., no valor de 863.241,93 Ron (cfr. docs. 2 a 85 e 124 a 129 juntos com o requerimento de 23.10.2013, a fls. 524 a ..... dos autos e fls. 77 a 114 dos documentos juntos no site a 28.09.2015, apenso, que se dão por reproduzidos);
J - No mesmo período, a sucursal da Roménia incorreu custos, reflectidos na conta 68: com código ....., no montante de 488,85 Ron; com código ....., no valor de 483.659,34 Ron; e com o código ....., no valor de 246.696,82 Ron (cfr. docs. 231, 232, 235 e 238; 241 a 266; 268 a 292 juntos com o requerimento de 18.07.2014, a fls. 1174, 1175, 1179 e 1183; 1186 a 1211; 1213 a 1247 dos autos, que se dão por reproduzidos);
K - No mesmo período, da conta 68, com o código ....., a sucursal da Bulgária incorreu em custos no montante de 91.899,87 (cfr. docs. 97 e 113 juntos com o requerimento de 23.10.2013, a fls. 744 (com tradução a fls. 42 do apenso) e 762 a 770 dos autos, e doc. 123, a fls. 1050 dos autos (com tradução a fls. 179 do apenso), junto com o requerimento de 18.07.2014, que se dão por reproduzidos);
L - A coberto da ordem de serviço OI.........., a Impugnante foi objecto de uma acção de inspecção externa, de âmbito geral, ao exercício de 2008, que teve início em 24.05.2010 e termo a 03.11.2010 – cfr. p. 5 do RIT, a fls. 40 a 265 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido;
M - Por despacho de 25.06.2008 do Director-Geral dos Impostos foi renovada a comissão de serviço do Director de Serviço da Direcção de Serviços de Inspecção Tributária (DSIT, actual Unidade de Grandes Contribuintes, UGC) – (cfr. Aviso (extracto) n.º 22086/2008, publicado no Diário da República, II Série, n.º 159, de 19.08.2008, doc. 7 junto com a contestação, a fls. 891 dos autos, que se dá por reproduzido);
N - Por despachos n.º 28233/2008, de 22.10.2008, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e n.º 12194/2009, de 12.05.2009, do Director-Geral dos Impostos foi atribuída competência à DSIT para desenvolver a acção de inspecção referida na alínea L. supra (cfr. docs. 8 e 9 juntos com a contestação, a fls. 892 a 894 dos autos, que se dão por reproduzidos);
O - Em 01.02.2011, foi concluído o RIT, elaborado na sequência da realização da acção de inspecção referida na alínea antecedente, no qual, além do mais, consta o seguinte:

“(…) III DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) //(…)

III.1.1.3 – Princípio de plena concorrência associado a empréstimos concedidos a entidade relacionada

1. Relações societárias

O capital da L........, SA (sujeito passivo) era detido maioritariamente, na percentagem de 94,72%, pela Construtora do L........ SGPS, SA (NIPC ..........) até 25 de Março de 2008. Nesta data, foi alienada à sociedade L........, SGPS, SA (NIPC ..........) a totalidade da participação detida (Anexo 4 – folhas 1 a 11).

A sociedade L........, SGPS, SA (NIPC ..........) foi constituída em 24 de Março de 2008, e o seu capital é detido na totalidade (100%) pela Construtora do L........ SGPS, SA (NIPC ..........).

Decorrente desta alteração societária, verificou-se também uma alteração relativamente às entidades envolvidas nas operações de financiamento concedido.

A partir daquela data passaram a coexistir três empréstimos concedidos por parte do sujeito passivo:

a) Dois contratos designados de “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” estabelecidos com as sociedades Construtora do L........ SGPS, SA (NIPC ..........) (já firmado em 2000) e L........, SGPS, SA (NIPC ..........) (novo em 2008);
b) Um outro, (já firmado em 2004), designado por “Contrato de suprimentos” formalizado com a sociedade Construtora do L........ SGPS, SA (NIPC ..........).

2. Das operações de financiamento concedido

Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA
A L........, SA apresentou na conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA o saldo final devedor no ano de 2008 no montante de € 44.753.702,93, cujos movimentos se podem observar no mapa seguinte:
    Conta
    Data
    Descritivo
    Débito
    Crédito
Saldo
    ........
    01.00.2008
    Saldos iniciais
    52.399.183,66
    -
    52.399.183,66
    ........
    03.01.2008
    Empréstimo Obtido C.L........
-
    4.500.000,00
    47.899.183,66
    ........
    07.01.2008
    Empréstimos Concedidos -
    210.459,20
    -
    48.109.642,86
    ........
    25.01.2008
    Empréstimos Concedidos -
    406.272,77
    -
    48.515.915,63
    ........
    07.02.2008
    Saída tesouraria
    98.800,00
    -
    48.614.715,63
    ........
    25.02.2008
    Saída tesouraria
    171.000,00
    -
    48.785.715,63
    ........
    29.02.2008
    Empréstimos Concedidos -
    27.245,00
    -
    48.812.960,63
    ........
    30.08.2008
    Documento
-
    2.033.375,00
    46.779.585,63
    ........
    30.08.2008
    Documento
-
    2.005.000,00
    44.774.585,63
    ........
    30.08.2008
    Documento
-
    11.382,70
    44.763.202,93
    ........
    30.08.2008
    Documento
-
    9.500,00
    44.753.702,93
    53.312.960,63
    8.559.257,70
    44.753.702,93

O saldo da conta está titulado por duas operações de financiamento distintas, que foram denominadas de “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” e “contrato de suprimentos”, cujos contratos constam do anexo 5 – (folhas 1 a 4) e do anexo 6 – (folhas 1 a 4), respectivamente.

O sujeito passivo foi notificado no sentido de discriminar os movimentos, identificando igualmente o saldo inicial e o saldo final, relativamente à conta em análise, para cada um dos contratos reconhecidos (anexo 7 – folhas 1 a 8). Em resposta ao pedido efectuado, o mesmo apresentou o seguinte detalhe dos movimentos para cada um dos contratos:

“Contrato de mútuo sob a forma d e conta -corrente”

    Conta
    Data
    Descritivo
    Débito
    Crédito
Saldo
    ........
    01.00.2008
    Saldos iniciais
    42.870.986,95
    -
    42.870.986,95
    ........
    03.01.2008
    Emprés timo Obtido C.L........
-
    4.500.000,00
    38.370.986,95
    ........
    07.01.2008
    Emprés timos Concedidos -
    210.459,20
    -
    38.581.446,15
    ........
    25.01.2008
    Emprés timos Concedidos -
    406.272,77
    -
    38.987.718,92
    ........
    07.02.2008
    Saída tesouraria
    98.800,00
    -
    39.086.518,92
    ........
    25.02.2008
    Saída tesouraria
    171.000,00
    -
    39.257.518,92
    ........
    29.02.2008
    Emprés timos Concedidos -
    27.245,00
    -
    39.284.763,92
    ........
    30.08.2008
    Docum ento
-
    2.033.375,00
    37.251.388,92
    ........
    30.08.2008
    Docum ento
-
    2.005.000,00
    35.246.388,92
    ........
    30.08.2008
    Docum ento
-
    11.382,70
    35.235.006,22
    ........
    30.08.2008
    Docum ento
-
    9.500,00
    35.225.506,22
    43.784.763,92
    8.559.257,70
    35.225.506,22

“Contrato de suprimentos”

Relativamente a este contrato não ocorreram movimentos durante o ano de 2008, apresentando o saldo inicial e final o valor de € 9.528.196,71.

Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA
A L........, SA apresentou na conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA o saldo final devedor, no ano de 2008, no montante de € 11.395.235,88, cujos movimentos se podem observar no Anexo 8 – folhas 1 a 2.

O sujeito passivo foi notificado para apresentar o contrato de suporte à operação de financiamento, referente àquele saldo (anexo 7 – folhas 1 a 8).

Em resposta ao pedido, o sujeito passivo informou que o saldo da conta estava titulado por uma operação de financiamento, subtítulo “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”, tendo apresentado o respectivo contrato (anexo 9 – folhas 1 a 3).

Passamos então a analisar em detalhe cada um dos contratos.

2.1– “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”

2.1.1 - Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA

O contrato, apresentado pelo sujeito passivo, denominado como “contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”, e datado de 20 de Setembro de 2000, foi celebrado entre as sociedades Construtora do L........, SA (anterior designação da L.........., SA, mantendo o mesmo número de contribuinte) e a Construtora do L........ SGPS, SA, que conforme é referido na alínea a) do citado contrato, são sociedades que se encontram em relação de domínio, e que tem como objecto, de acordo com o nº 1 da 1ª cláusula que “As Contraentes, no âmbito da Relação de Domínio existente, comprometem-se a manter uma estreita colaboração de forma a optimizar as suas respectivas tesourarias”. É estipulado no acordo, nº 2 da mesma cláusula que “As Contraentes, através das suas respectivas administrações, manterão contactos regulares no sentido de estabelecerem as necessidades/recursos existentes, montantes e respectivas datas de entrega dos empréstimos destinados à cobertura de carência das respectivas tesourarias.”. A 2ª cláusula vem ainda reforçar que: “Os empréstimos serão entregues conforme as necessidades de apoio à tesouraria das respectivas Contraentes.”.

No nº 1 da 4ª cláusula é definido o período temporal do contrato, transcrevendo “Os empréstimos são concedidos pelo prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar das respectivas entregas.”

Neste contrato, é ainda estabelecido a remuneração e carência de pagamento dessa mesma remuneração, dos fundos transferidos. O nº 1 da 3ª cláusula define que “Os juros a pagar por cada uma das partes pelos empréstimos efectuados no âmbito do presente contrato fixam-se à Taxa Lisbor, a seis meses, acrescidas de 1,50%.”. O nº 2 da mesma cláusula define então o período de carência de pagamento dos juros, estabelecendo que “…as partes acordam que o pagamento dos respectivos juros beneficiam de um prazo de carência de dez anos, com início na data da entrega das quantias mutuadas ao abrigo do presente contrato, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento ou ao pagamento de quaisquer juros.”.

Por último, é relevante transcrever um considerando que consta no contrato em apreço, na alínea h) em particular, “As Contraentes, no seu interesse próprio e legítimo, pretendem conjugar esforços no sentido de optimizar as suas respectivas tesourarias evitando o recurso ao crédito a entidades terceiras”.

2.1.2- Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA

O contrato, apresentado pelo sujeito passivo, denominado como “contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”, e datado de 28 de Março de 2008, foi celebrado entre as sociedades L........, SGPS, SA e L........, SA, que conforme é referido na alínea a) do citado contrato, são sociedades que se encontram em relação de domínio, e que tem como objecto, de acordo com o nº 1 da 1ª cláusula que “As Contraentes, no âmbito da Relação de Domínio existente, comprometem-se a manter uma estreita colaboração de forma a optimizar as suas respectivas tesourarias”. É estipulado no nº 2 da mesma cláusula que “As Contraentes, através das suas respectivas administrações, manterão contactos regulares no sentido de estabelecerem as necessidades/recursos existentes, montantes e respectivas datas de entrega dos empréstimos destinados à cobertura de carência das respectivas tesourarias.”. A 2ª cláusula vem ainda reforçar que “Os empréstimos serão entregues conforme as necessidades de apoio à tesouraria das respectivas Outorgantes.”.

No nº 1 da 4ª cláusula é definido o período temporal do contrato, transcrevendo “Os empréstimos são concedidos pelo prazo máximo de 364 (trezentos e sessenta e quatro) dias a contar das respectivas entregas.”

Neste contrato, é ainda estabelecido que os fundos transferidos não estão sujeitos a remuneração, conforme se verifica na 3ª cláusula, que determina que “O capital mutuado não vencerá juros na medida que o presente mútuo se insere na Relação de Domínio existente entre as Outorgantes, e no interesse próprio das mesmas em evitar o recurso ao crédito a entidades terceiras.”.

2.2– “Contrato de suprimentos”

O contrato de “suprimentos” foi firmado entre a Construtora do L........, SGPS, SA (identificada no contrato como primeira contratante) e a L........, SA (identificada no contrato como segunda contratante) assinado em 21 de Setembro de 2004, e tem como objecto a transferência de fundos determinada na sua 1ª cláusula, “A Segunda Contratante, na qualidade de accionista na Primeira Contratante, constituiu e realiza na Primeira Contratante, suprimentos sob a forma de dinheiro e nos valores que, nos termos e para os efeitos do presente contrato, lhe sejam previamente solicitados por esta, destinados a apoio da actividade da Primeira Contratante na área das concessões rodoviárias e consoante estas necessidades.”.

Antes de prosseguir a análise detalhada às características e condições definidas no contrato em epígrafe, é fundamental dissecar o conteúdo e a relação societária entre as sociedades enunciadas na cláusula supra citada.

Na data em que o contrato foi firmado entre as duas sociedades Construtora do L........ SGPS, SA e L........, SA, a primeira detinha uma participação no capital da segunda que representava 94,72% do mesmo. Nestes termos, a relação enunciada na referida cláusula está incorrecta, ou seja, e ao contrário do que é tipificado, a Construtora do L........ SGPS, SA (identificada no contrato como primeira contratante) é que é accionista da L........, SA (identificada no contrato como segunda contratante).

No ano de 2008, as alterações societárias que ocorreram no grupo L........, não modificaram as relações especiais que existem entre as sociedades implicadas neste contrato, determinadas nos termos do nº 4 do artigo 58º do CIRC. (…)

Analisadas as questões erráticas enunciadas na 1ª cláusula, no entender da Administração Fiscal, do contrato em título, enunciemos os restantes pontos do mesmo. No nº 1 da 2ª cláusula é definido que “Os suprimentos constituídos e realizados vencerão juros à taxa Euribor a 12 meses acrescidos de 1,50% (um virgula cinco décimas de porcento), sem prejuízo, no entanto, do estipulado no número seguinte da presente cláusula.”, acrescendo o nº 2 que: “Acordam as partes, pelos motivos referidos nos Considerandos, num período de carência de juros até ao início do efectivo retorno do investimento efectuado na concessão rodoviária supra referenciada, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento nem pagamento de quaisquer juros.”.

Por fim é estipulado na 3ª cláusula que “O empréstimo é cedido pelo prazo de 120 (cento e vinte) meses, a contar das respectivas entregas, automática e sucessivamente renovável por iguais períodos, …”.

3. Da subordinação ao Princípio de Plena Concorrência pela existência de relações especiais entre as entidades intervenientes
O Princípio de Plena Concorrência consagrado no ordenamento jurídico nacional no n.º 1 do artigo 58.º do CIRC // (…).

Relativamente ao exercício em análise (ano de 2008), e para efeitos de aferir da existência de relações especiais, devemos identificar dois períodos distintos. Num primeiro período que decorre entre 1 de Janeiro de 2008 e 24 de Março de 2008, a Construtora do L........ SGPS detém por via directa 94,72% do capital da L........,, SA. Num segundo período que decorre entre 25 de Março de 2008 e 31 de Dezembro de 2008, a Construtora do L........ SGPS, SA detém a totalidade do capital da L........, SGPS, SA, que por sua vez detém, 94,72% do capital da L......., SA (conforme nota 37 do Anexo ao Balanço e Demonstração de Resultados do exercício de 2008 do sujeito passivo). Consequentemente, estas duas entidades, Construtora do L........ SGPS, SA e L........, SGPS, SA qualificam-se como entidades relacionadas com o sujeito passivo (em cumprimento da alínea a) do n.º 4 do artigo 58.º do CIRC), estando subordinadas à aplicação do Princípio de PPLENAConcorrência preconizado no n.º 1 do artigo 58.º do CIRC, nas operações comerciais e financeiras entre si realizadas.

Nesta conformidade, e enquanto operações financeiras, a concessão de empréstimos, quer sejam titulados pelo contrato denominado “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” quer seja pelo “Contrato de suprimentos” pela L........, SA à Construtora do L........ SGPS, SA e L........, SGPS, SA, qualificam-se como operações vinculadas, estando assim sujeitas ao cumprimento do Princípio de Plena Concorrência, estatuído no n.º 1 do artigo 58.º do CIRC.

4. Da selecção do método mais apropriado de fixação do preço de transferência

De acordo com o n.º 2 do artigo 58.º do CIRC “O sujeito passivo deve adoptar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método ou métodos susceptíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efectua e outras substancialmente idênticas, em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais (…)”.

No mesmo sentido estipula o n.º 1 do artigo 4.º da Portaria 1446-C/2001, que “O sujeito passivo deve adoptar, para determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método mais apropriado a cada operação ou série de operações (…)”.

Segundo o n.º 2 do citado normativo “Considera-se como método mais apropriado para cada operação ou série de operações aquele que é susceptível de fornecer a melhor e mais fiável estimativa dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados numa situação de plena concorrência, devendo ser feita a opção pelo método mais apto a proporcionar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações vinculadas e outras não vinculadas (…)”.

O n.º 3 do artigo 58.º do CIRC, identifica os métodos que podem ser utilizados na determinação do preço de transferência, a saber:

1. Método do Preço Comparável de Mercado;
2. Método do Preço de Revenda Minorado;
3. Método do Custo Majorado;
4. Método do Fraccionamento do Lucro;
5. Método da Margem Líquida da Operação. // (…)
O Método do Preço Comparável de Mercado assume-se, assim, como o método mais adequado a aplicar, sendo que a sua preferência em relação aos demais métodos advém do facto de constituir a forma mais directa de determinar se as condições acordadas entre entidades relacionadas, são condições de Plena Concorrência. (…)

Rejeição do Método do Preço de Revenda Minorado

O Método do Preço de Revenda Minorado tem como base o preço de revenda praticado pelo Sujeito Passivo numa operação comparável realizada com uma entidade independente, tendo por objecto um produto adquirido a uma entidade com a qual esteja em situação de relações especiais, ao qual é subtraída a margem de lucro bruto praticada por uma terceira entidade numa operação comparável (Cfr. artigo 7.º da Portaria).

Este método é especialmente recomendado para actividades de distribuição (Cfr. parágrafo 2.14. a 2.31. do Relatório da OCDE 1995). Assim, uma vez que as operações em análise não se enquadram como actividades de distribuição, rejeitamos a utilização deste método.

Rejeição do Método do Custo Majorado

O Método do Custo Majorado tem como base o montante dos custos suportados por um fornecedor de um produto ou serviço fornecido numa operação vinculada, ao qual é adicionada a margem de lucro bruto praticada numa operação não vinculada comparável (cfr. artigo 8.º da Portaria).

A utilização deste método é recomendada pela OCDE essencialmente no caso de vendas de produtos semi-acabados entre empresas associadas, no quadro de acordos celebrados entre empresas associadas com vista à usufruição em comum de equipamentos ou ao aprovisionamento a longo prazo, ou quando a operação vinculada consiste na prestação de serviços (cfr. parágrafo 2.32. do Relatório da OCDE de 1995). Assim, atendendo à operação controvertida, rejeitamos a utilização deste método.

Rejeição dos métodos não tradicionais

Os vulgarmente designados métodos não tradicionais (método do fraccionamento do lucro e método da margem líquida da operação) apenas serão susceptíveis de utilização quando os métodos tradicionais (método do preço comparável de mercado, método do preço de revenda minorado e método do custo majorado) não possam ser aplicados (cfr. alínea b) in fine do número 1 do artigo 4.º da Portaria).

Face a tudo o que foi exposto, e atendendo a existência de operações similares, que tiveram por contraparte entidades independentes, o método do preço comparável de mercado revela-se o mais apropriado em conformidade com o previsto no número 2 do artigo 4.º da Portaria, pelo que será utilizado na pesquisa de condições que seriam praticadas entre entidades independentes em operações similares às ora analisadas.

5. Da pesquisa de uma operação comparável
Em conformidade com a explanação já efectuada, o Método do Preço Comparável de Mercado pode ser utilizado comparando as condições ocorridas numa operação vinculada com as condições praticadas numa operação realizada com uma entidade independente.

De acordo com o n.º 3 do artigo 4.º da Portaria “Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas.”

Em conformidade com o parágrafo 199 do Relatório do Comité dos Assuntos Fiscais da OCDE de 1979 “Preços de Transferência e Empresas Multinacionais”, quando se pretende determinar o que se entende por empréstimo comparável ou similar, será necessário atender aos seguintes factores: o montante e a duração do empréstimo, a sua natureza ou o seu objectivo, a divisa em que se encontra especificado, e a situação financeira do mutuário.

Ora, no âmbito da análise efectuada à conformidade das suas operações financeiras vinculadas com o Princípio de Plena Concorrência, podemos identificar para as três operações em análise, nos contratos as seguintes remunerações:

· “Contrato d e mútuo sob a form a d e c o n ta -corrente”
Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA

O nº 1 da 3ª cláusula define que “Os juros a pagar por cada uma das partes pelos empréstimos efectuados no âmbito do presente contrato fixam-se à Taxa Lisbor, a seis meses, acrescidas de 1,5%.”.

Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA
Neste contrato foi ainda estabelecido que os fundos transferidos não estão sujeitos a remuneração, conforme se afere na 3ª cláusula, que define que “O capital mutuado não vencerá juros na medida que o presente mútuo se insere na Relação de Domínio existente entre as Outorgantes, e no interesse próprio das mesmas em evitar o recurso ao crédito a entidades terceiras.”.

No entanto, dado que este contrato tem exactamente as mesmas características que aquele referido na alínea anterior, respeitantes aos fundos transferidos contabilizados na conta ........ - Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA, a remuneração do capital emprestado a considerar é a mesma, ou seja, Taxa Euribor, a seis meses, acrescida de um spread de 1,5%.

· “Contrato d e s uprimentos”
O nº 1 da 2ª cláusula define que “Os suprimentos constituídos e realizados vencerão juros à taxa Euribor a 12 meses acrescidos de 1,5% (um vírgula cinco décimas de porcento),…”

Em face da existência de cláusulas contratuais prevendo a remunerabilidade das operações controvertidas, bem como, as taxas de remuneração aplicáveis, de cujo recebimento a entidade cedente dos fundos abdicou, pretende- se efectuar uma análise de comparabilidade incidente sobre a opção de investimento tomada pelo sujeito passivo (o financiamento da entidade relacionada a título gratuito, em detrimento da opção de a financiar com recurso a um empréstimo remunerado), considerando a expectável opção que entidades independentes tomariam em circunstâncias comparáveis, movidas por critérios de eficiente racionalidade económica.

6.Determinação do preço que seria praticado entre entidades independentes
Atendendo aos fundamentos aduzidos nos parágrafos anteriores, importa analisar se caso as operações de “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” e “Contrato de suprimentos”, realizadas entre a L........, SA e a Construtora do L........ SGPS, SA, e a operação de “Contrato de mútuo sob a forma de conta- corrente” realizada entre a L........, SA e a L........, SGPS, SA, tivessem sido celebradas entre entidades independentes, teriam sido contratados, aceites e praticados termos similares aos que foram definidos para estas operações.

Considerando a complexidade técnica das questões relacionadas com a temática dos Preços de Transferência, o preâmbulo da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro, aconselha a consulta dos relatórios da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) que desenvolvem esta matéria, e cuja adopção pelos países membros é objecto de recomendações aprovadas pelo Conselho desta organização internacional.

O Relatório da OCDE de 1995, subordinado à temática dos Princípios Aplicáveis em Matéria de Preços de Transferência destinados às Empresas Multinacionais e às Administrações Fiscais (adiante designado por Relatório de 1995 ou Guidelines da OCDE), defende que a aplicação do Princípio de Pplena Concorrência assenta, de um modo geral, numa comparação entre as condições praticadas numa operação vinculada, e as condições praticadas numa operação similar realizada entre operações independentes.

De acordo com o ponto 192 do Relatório da OCDE de 1979, o princípio geral que convém acolher é o de que o empréstimo deverá suportar juros desde que os tivesse suportado em circunstâncias análogas entre partes independentes.

Neste relatório foram analisadas as particularidades de 3 situações específicas (cfr. §194 e segs. do Relatório de 1979), a seguir enumeradas:

· Créditos Comerciais (juros resultantes de atrasos nos pagamentos)
· Dificuldades financeiras iniciais
· Outras dificuldades financeiras

O ponto 193 desse relatório estipula que nestes casos, o ónus da prova incumbirá, em regra, ao contribuinte.

No primeiro caso (créditos comerciais) dever-se-á adoptar a noção de práticas comerciais normais, ou seja, possibilidade de não aplicação de juros no caso de um credor independente em situação análoga não aplicar juros. No entanto, alerta-se para o facto de no preço dos bens ou serviços poder estar incluído um elemento de juro implícito.

No segundo caso há que considerar serem sempre devidos juros (ainda que o seu pagamento se encontre diferido definitivamente), salvo se, em circunstâncias idênticas, um mutuante independente consentisse em renunciar a esses juros.

No terceiro caso o mutuante pode renunciar à, ou diferir a, cobrança de juros sobre um empréstimo pendente quando a mutuária se debata com dificuldades financeiras.

No entanto, tal como já referido, se estivéssemos perante uma destas três situações, o ónus da prova caberia ao contribuinte, pelo que o Dossier de Preços de Transferência teria que conter a demonstração de enquadramento da situação em apreço numa dessas três situações, o que não acontece, dado que o sujeito passivo não tem organizado o referido Dossier relativo ao exercício de 2008.

Nesta conformidade, e dada a inexistência de evidência de que os fundos concedidos a título de “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” e de “Contrato de suprimentos” pela L........, SA à Construtora do L........ SGPS, SA, e “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” pela L........,, SA à L........, SGPS, SA, se possam enquadrar em alguma das três hipóteses de concessão de financiamentos a título gratuito, afigura-se-nos ser de aplicar o princípio geral de que um empréstimo entre entidades relacionadas deverá suportar juros desde que os tivesse suportado entre entidades independentes em circunstâncias análogas.

O sujeito passivo foi notificado (anexo 7 – folhas 1 a 8) nos seguintes termos “Relativamente aos fundos colocados à disposição da L........ SGPS, SA e L........, SGPS, SA, e tendo em atenção que estas empresas estão em situação de relações especiais com a L........, S.A, nos termos do nº 1 do artigo 58º do CIRC, queiram demonstrar que foram praticadas as condições de plena concorrência, nos termos do artigo referido, das seguintes cláusulas contidas nos contratos que suportam esta transferência de fundos:

· “Con trat o d e s u p rim en to s”
O nº 2 da 2ª cláusula estipula que: “Acordam as partes, pelos motivos referidos nos Considerandos, num período de carência de juros até ao início do efectivo retorno do investimento efectuado na concessão rodoviária supra referenciada, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento nem pagamento de quaisquer juros.”

· “Con trat o d e m ú tuo so b a fo rm a d e c o n ta -co rren te”
Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA
O nº2 da 3ª clausula convenciona que “Devido ao descrito nos considerandos supra, ou seja, a canalização de recursos para novos projectos na área da construção que, directa e indirectamente beneficiam ambas as Contraentes, projectos esses que se encontram em fase de arranque e cuja maturação e retorno será dilatada no tempo, as partes acordam que o pagamento dos respectivos juros beneficiam de um prazo de carência de dez anos, com inicio na data da entrega das quantias mutuadas ao abrigo do presente contrato, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento ou ao pagamento de quaisquer juros.”

Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA
Neste contrato foi ainda estabelecido que os fundos transferidos não estão sujeitos a remuneração, conforme se afere na 3ª cláusula, que define que “O capital mutuado não vencerá juros na medida que o presente mútuo se insere na Relação de Domínio existente entre as Outorgantes, e no interesse próprio das mesmas em evitar o recurso ao crédito a entidades terceiras.”.

Em resposta ao pedido efectuado, conforme se pode verificar no anexo 10 – folhas 1 e 2, o sujeito passivo prestou os seguintes esclarecimentos: “A L........, SA tinha claro interesse próprio, directo e legítimo em que a L........, SGPS, SA, sua sociedade dominante, pudesse dispor dos recursos financeiros necessários a alocar pelas vias referidas nos ditos contratos aos projectos aí mencionados e que tal alocação não fosse susceptível de prejudicar as suas necessidades correntes de tesouraria…

É que, para além do reforço posicional de ambas as empresas em sectores estratégicos, o recebimento, pela sociedade dominada, de contrapartidas de tal execução, possibilitaria a obtenção de proveitos desta e, consequentemente, o aumento do valor patrimonial da empresa e, também coerentemente, o valor que cada participação social por si detida representa.

Parece-nos assim, desde logo quanto aos interesses subjacentes às operações, aqueles não são semelhantes aos das operações em que, por exemplo, tivesse ocorrido intervenção de instituições financeiras, pois os interesses destas, quando colocam fundos à disposição de outras entidades consistirão, para além da restituição dos capitais disponibilizados a outrem, no recebimento da correspondente remuneração.

Assim, as operações previstas nos contratos aí indicados, efectuadas entre a L........, SGPS, SA e a L........, SA, revestem-se, pois, de natureza complexa e que, salvo melhor entendimento, a sua análise não poderá ser efectuada numa óptica de comparabilidade das mesmas com operações financeiras de “empréstimo” entre entidades não relacionadas, pelo que não fará sentido falar-se, aqui, em condições de “plena concorrência” a observar.”.

Ora, como decorre do espírito que assiste ao Princípio de Plena Concorrência legitimado no ordenamento jurídico nacional, afigura-se-nos que a argumentação aduzida pelo sujeito passivo não poderá ter acolhimento.

Com efeito, tal Princípio encontra-se sustentado no entendimento aceite por todos os países membros da OCDE, no qual Portugal se inclui, de que por via da sua adopção se estabeleça uma paridade no tratamento fiscal entre entidades relacionadas e empresas independentes. Este objectivo de equidade fiscal decorre do imperativo constitucionalmente previsto no art.º 103.º da Constituição da República.

A jurisprudência portuguesa tem vindo a defender que a avaliação de qualquer operação e encargo/proveito associado deverá ser efectuado numa perspectiva individualizada de cada empresa ou instituição, em detrimento de uma óptica de gestão do grupo. Por outro lado, tem vindo a ser defendido por alguma doutrina que, a existência de empréstimos sem remuneração não pode ser baseada em opções de estratégias de negócio.

Ou seja, a pretensão contratualmente evidenciada, de as contraentes conjugarem esforços no sentido de optimizar as suas respectivas tesourarias evitando o recurso ao crédito a entidades terceiras, não poderá, nos termos de toda a citada doutrina e jurisprudência, ser acolhida pela Administração Fiscal para aceitar a ausência de remuneração nas operações de financiamento intra-grupo controvertidas, uma vez que entidades independentes, agindo de um modo comercial racional, não abdicariam de receber uma remuneração pelo capital alocado a este financiamento intra-grupo.

Concretizando, se na concessão de fundos pela L........, SA, tivessem sido contratados, aceites e praticados os mesmos termos contratados, aceites e praticados, por entidades independentes em operações comparáveis, regidas por critérios de racionalidade económica, esta teria auferido uma remuneração de mercado pelo financiamento concedido, equivalente à taxa Euribor a 6 meses acrescida de um spread de 1,5%, relativamente ao “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente e equivalente à taxa Euribor a 12 meses acrescida de um spread de 1,5%, relativamente ao “Contrato de suprimentos” pelo que se verifica, assim, uma violação do Princípio de Plena Concorrência consagrado no n.º 1 do artigo 58.º do CIRC.

7.Do impacto da violação do Princípio de Plena Concorrência na determinação do lucro tributável
7.1- “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”

Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA
Em face de tudo o ante exposto, a quantificação da remuneração de Pplena concorrência, exigível no exercício em apreciação, associada ao “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”, relativamente aos reforços de fundos contabilizados na conta em epigrafe, concedidos pelo sujeito passivo à Construtora do L........ SGPS, SA, foi efectuada considerando os montantes financiados, as datas de concessão e a taxa Euribor a 6 meses no anexo 11 – folhas 1 a 7, consta o histórico das taxas em vigor em 2008, retirado do site do Banco de Portugal), apurada a média anual, acrescida de um spread de 1,5%, conforme contrato constante do anexo 5 – folhas 1 a 4.

Através da aplicação da ante citada metodologia conclui-se que, se a operação tivesse sido realizada entre entidades independentes, o preço praticado, sob a forma de remuneração do financiamento seria de € 2.401.101,25, por aplicação do nº 1 do artigo 58º do CIRC, conforme se pode ver em detalhe no anexo 12 – folha 1.

Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA
A quantificação da remuneração de Pplena concorrência, exigível no exercício em apreciação, associada ao “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”, relativamente aos reforços de fundos contabilizados na conta em epígrafe, concedidos pelo sujeito passivo à L........, SGPS, SA, foi efectuada considerando condições análogas ao contrato firmado relativamente aos fundos contabilizados na conta anteriormente referida, uma vez que estamos em presença do mesmo tipo de operação financeira de cedência de fundos. Essa quantificação, foi então apurada considerando os montantes financiados, as datas de concessão e a taxa Euribor a 6 meses (no anexo 11 – folhas 1 a 7, consta o histórico das taxas em vigor em 2008, retirado do site do Banco de Portugal), apurada a média anual, acrescida de um spread de 1,5%, conforme contrato constante do anexo 5 – folhas 1 a 4.

Através da aplicação da ante citada metodologia conclui-se que, se a operação tivesse sido realizada entre entidades independentes, o preço praticado, sob a forma de remuneração do financiamento seria de € 41.634,27, por aplicação do nº 1 do artigo 58º do CIRC, conforme se pode ver em detalhe no anexo 13 – folha 1.

7.2– “Contrato de suprimentos”
Em face de tudo o ante exposto, a quantificação da remuneração de plena concorrência, exigível no exercício em apreciação, associada ao “Contrato de suprimentos” concedidos pelo sujeito passivo à Construtora do L........ SGPS, SA, foi efectuada considerando os montantes financiados, as datas de concessão e a taxa Euribor a 12 meses (no anexo 11 – folhas 1 a 7, consta o histórico das taxas em vigor em 2008, retirado do site do Banco de Portugal), nelas vigente acrescidas de um spread de 1,5%, conforme contrato constante do anexo 6 – folhas 1 a 4.

Através da aplicação da ante citada metodologia conclui-se que, se a operação tivesse sido realizada entre entidades independentes, o preço praticado, sob a forma de remuneração do financiamento seria de € 602.141,01, por aplicação do nº 1 do artigo 58º do CIRC, conforme se pode ver em detalhe no anexo 14 – folha 1.

8.Conclusões
Em face de tudo o ante exposto, e estando cumpridos os requisitos de fundamentação previstos no n.º 3 do artigo 77.º da Lei Geral Tributária, na medida em que:

· A L........, SA, a Construtora do L........ SGPS, SA e a L........, SGPS, SA qualificam-se como entidades relacionadas nos termos preconizados no n.º 4 do artigo 58.º do CIRC, as operações entre elas realizadas estão subordinadas ao Princípio de Plena Concorrência, previsto no n.º 1 do artigo 58.º do CIRC.
8.1- “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”

Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA

§ A concessão pela L........, SA à Construtora do L........ SGPS, SA, de fundos titulados pelo “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” não remunerados, não constitui uma opção de investimento de plena concorrência, na medida em que entidades independentes, teriam contratado, aceite ou praticado, termos diferentes em circunstâncias comparáveis;
§ A remuneração de plena Concorrência determinado com base na aplicação do Método do Preço Comparável de Mercado é de € 2.401.101,25;
§ Da violação do Princípio de plena Concorrência resulta uma subvalorização/ subquantificação do resultado tributável da L........, SA no montante de € 2.401.101,25;
Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA

§ A concessão pela L........, SA à L........, SGPS, SA, de fundos titulados pelo “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” não remunerados, não constitui uma opção de investimento de plena concorrência, na medida em que entidades independentes, teriam contratado, aceite ou praticado, termos diferentes em circunstâncias comparáveis;
§ A remuneração de Plena Concorrência determinado com base na aplicação do Método do Preço Comparável de Mercado é de € 41.634,27;
§ Da violação do Princípio de Plena Concorrência resulta uma subvalorização/ subquantificação do resultado tributável da L........, SA no montante de € 41.634,27;
8.2– “Contrato de suprimentos”
§ A concessão pela L........, SA à Construtora do L........ SGPS, SA, de fundos não remunerados, titulado pelo contrato em epígrafe, não constitui uma opção de investimento de pplena concorrência, na medida em que entidades independentes, teriam contratado, aceite ou praticado, termos diferentes em circunstâncias comparáveis;
§ A remuneração de Plena Concorrência determinado com base na aplicação do Método do Preço Comparável de Mercado é de € 602.141,01;
§ Da violação do Princípio de Plena Concorrência resulta uma subvalorização/ subquantificação do resultado tributável da L........, SA no montante de € 602.141,01;
Propõe-se uma correcção positiva ao resultado tributável declarado pela L........, SA., no montante total de € 3.044.876,53 (soma dos três valores calculados), dando cumprimento ao Princípio de Plena Concorrência, preconizado no n.º 1 do artigo 58.º do CIRC. // (…)

III.1.1.6 - Encargos não documentados/não aceites fiscalmente

O sujeito passivo efectuou lançamentos contabilísticos nas seguintes contas, no total de € 2.083.596,89, referentes à integração das contas das sucursais da Argélia, Roménia e Bulgária:

Conta ….. – Impostos (sucursal da Roménia) - € 138.488,86;

Conta ….. – Impostos (sucursal da Bulgária) - € 3.842,77;

Conta ….. – Outros custos e perdas financeiras (sucursal da Bulgária) - € 494.713,53;

Conta ….. – Outros custos e perdas financeiras (sucursal da Roménia) - € 1.386.637,40;

Conta ….. – Outros custos e perdas financeiras (sucursal da Argélia) - € 59.914,33.

Foi ainda contabilizado o valor de € 836,29, na conta ….. – Custos e perdas extraordinários – Correcções relativas a exercícios anteriores, através do lançamento nº ……. no diário “tesouraria” de 30-9-2008, respeitante à regularização de saldo de caixa.

O sujeito passivo foi notificado, e requerido inúmeras vezes durante o decorrer do procedimento inspectivo, para apresentar relativamente a estes custos os extractos e documentos de suporte que identificassem os custos, e que justificassem a dedutibilidade fiscal dos mesmos, nomeadamente à luz do nº 1 do artigo 23º do CIRC (anexo 7 – folhas 1 a 8).

O mesmo apenas apresentou os extractos das contas enunciadas, não apresentando quaisquer elementos, e ou esclarecimentos que justificassem a contabilização daqueles custos, e a sua dedutibilidade fiscal. (…)

Relativamente aos custos em epígrafe, indubitavelmente se conclui que o sujeito passivo não respeitou as regras previstas na legislação mencionada, referentes à obrigação de manter a contabilidade organizada, nomeadamente a regra definida na alínea a) do nº 3 do artigo 115º do CIRC, que dispõe que todos os registos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados quando necessário. (…)

Relativamente aos registos contabilísticos concernentes com as sucursais, cumpre ainda adir que é definido na alínea a) do nº 1 do artigo 3º do CIRC a incidência do IRC, estabelecendo que: “ O IRC incide sobre: alínea a)·O lucro das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, das cooperativas e das empresas públicas e o das demais pessoas colectivas ou entidades referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo anterior que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola;”, conjugado com o do nº 1 do artigo 4º do CIRC, depreende-se que o IRC devido pelo sujeito passivo incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora do território, conforme é ai claramente determinado: “Relativamente às pessoas colectivas e outras entidades com sede ou direcção efectiva em território português, o IRC incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.”.

Face a tudo o que foi anteriormente exposto, é de acrescer ao resultado tributável, os custos não dedutíveis nos termos do n.º 1 do artigo 23º do CIRC, no total de € 2.084.433,18, referentes a integração das contas das sucursais da Argélia, Roménia e Bulgária, e regularização do saldo de caixa, em concordância com os articulados legais anteriormente explicitados.

A título complementar, importa referir que os encargos ora em questão, estão ainda sujeitos a tributação autónoma à taxa de 50%, nos termos do nº 1 do artigo 81º do CIRC, conforme ponto III.1.2.2.

A este respeito, cumpre informar o sujeito passivo que, em caso de posterior apresentação dos necessários suportes documentais, com referência aos encargos envolvidos na presente proposta de correcção, terá a empresa que apresentar os elementos por via dos quais faça a comprovação objectiva de que tais encargos são inequivocamente indispensáveis à obtenção de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, sob pena de, não o fazendo, continuarem os mesmos a não concorrer para a formação do resultado tributável, em razão directa de não verificarem os pressupostos de dedutibilidade fiscal constantes do artigo 23.º do CIRC. (…)

Face à documentação apresentada em sede de direito de audição pelo sujeito passivo, o valor desta correcção foi alterado para € 1.435.669,98 (Vide ponto IX do presente relatório). (…).” (cfr. RIT);

P - Em 07.02.2011, o RIT foi sancionado por despacho do Director de Serviços de Inspecção Tributária (cfr. despacho, a fls. 41 dos autos, que se dá por reproduzido);
Q - Na sequência das conclusões do RIT, em 14.02.2011, foi emitida a liquidação adicional de IRC n.º 2011 ….., relativa ao exercício de 2008, e juros compensatórios, no valor total de € 2.006.480,47 – cfr. fls. 56 do PRG apenso;
R - Em 29.09.2011, a Impugnante apresentou reclamação graciosa contra a liquidação de IRC e a liquidação de juros compensatórios referida na alínea antecedente, com fundamento em insuficiente fundamentação, violação de lei, erro na quantificação da taxa de juro e falta de competência da entidade que procedeu às correcções – cfr. reclamação, a fls. 3 a 54 do PRG apenso, que se dá por integralmente reproduzida;
S - Em 27.08.2012, foi elaborada “Informação”, em análise da reclamação graciosa apresentada, que propôs o indeferimento total da reclamação, por considerar que os contratos de mútuo e suprimento celebrados pela Impugnante estão sujeitos ao regime do princípio da plena concorrência, conforme previsto no art. 58.º do CIRC e Portaria n.º 1446-C/2001, e que não se verifica o alegado erro na quantificação, e, quanto às despesas não documentadas, por não ter demonstrado que as mesmas foram comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou manutenção da fonte produtora, nos termos previstos no art. 23.º do CIRC (cfr. informação, a fls. 56 a 67 do PRG apenso, que se dá por reproduzida);
T - Por despacho de 06.09.2012, foi sancionada pelo Director da Unidade dos Grandes Contribuintes a proposta de indeferimento da reclamação graciosa, com os fundamentos constantes da informação referida na alínea antecedente (cfr. fls. 56 do PRG apenso);
U - Através do ofício n.º……, de 06.09.2012, a Impugnante foi notificada para, querendo, exercer o direito de audição relativamente ao projecto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada, não o tendo exercido – cfr. ofício, a fls. 69 do PRG apenso;
V - Por despacho de 03.10.2012 foi indeferida a reclamação graciosa, tendo a Impugnante sido notificada da decisão, através do ofício n.º ……, de 04.10.2012 – cfr. decisão e ofício, a fls. 73 a 87 do PRG apenso que se dão por integralmente reproduzidas;
W - Notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, a Impugnante apresentou recurso hierárquico, que foi indeferido por despacho, de 05.06.2013, da Subdirectora-Geral da Unidade dos Grandes Contribuintes, com os seguintes fundamentos:
“(…) 1. Na apreciação da RG, os Serviços pronunciaram-se, cabal e detalhadamente, sobre a argumentação aduzida pelo sujeito passivo, não se concluindo por nenhuma ilegalidade;

2.Nesta sede, o sujeito passivo limita-se a reproduzir, textualmente, os fundamentos da RG, não apontado qualquer ilegalidade à decisão da Reclamação;
3.Como foi exposto atrás, as correcções são legítimas por terem sido observados os preceitos legais a elas atinentes. (…)”
– cfr. despacho e informação, a fls. 305 a 314 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidos;

X - Através do ofício n.º …., de 09.07.2013, a Impugnante foi notificada da decisão de indeferimento do recurso hierárquico apresentado – cfr. ofício a fls. 305 dos autos.

X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte:
“…- A Construtora do L........, SGPS fosse devedora à Impugnante do montante de € 10.815.761,26, a título de preço de venda das participações sociais que não foram pagas;
- Em 2004, a Impugnante vendeu à Construtora do L........, SGPS participações sociais, no montante de € 3.301.237,40, que não foram pagas;
- O saldo apresentado na conta ........, a 31.12.2008, no valor de € 35.225.506,22 estivesse influenciado pelas verbas referidas nos pontos precedentes;
(por falta de junção da pertinente prova documental, designadamente dos respectivos contratos de venda de acções e dos comprovativos dos correspondentes lançamentos contabilísticos).
-A Impugnante tenha suportado outros custos nas sucursais da Roménia, Bulgária e Argélia, para além dos referidos nas alíneas I., J. e K. dos factos provados;
(por falta de junção da pertinente prova documental, designadamente quanto à sucursal da Argélia e Bulgária e, quanto a esta, ainda por falta de tradução dos documentos de suporte, nos termos previstos no art. 134.º do CPC (ex vi art. 2.º, e) do CPPT) ou por não estarem legíveis (cfr. nomeadamente, docs. 86 a 90, 91, 93, 95, 96, 99, 100, 102, 103, 105, 106, 109, 110, 112, 114, 115, 116);
quanto aos documentos referentes a correcções cambias referentes à conta ..... (sucursal da Roménia), por falta de apresentação de documentos oficiais contendo as taxas de juros aplicáveis no início e final dos respectivos períodos; e, em relação aos documentos referentes a juros de mora por contribuições devidas à Segurança Social, por força do disposto no art. 42.º, n.º 1, d) do CIRC (na redacção em vigor à data), cfr. nomeadamente, docs. 92, 94, 98, 101, 104, 107, 108 e 111 do apenso).…”
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte:
“…A decisão da matéria de facto foi realizada com base na análise das informações e dos documentos, não impugnados, constantes dos autos e do PAT apenso, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.
Em relação ao depoimento das testemunhas:
No seu depoimento J........ veio alegar que a razão de ser dos financiamentos serem concedidos pela Impugnante à SGPS foi uma exigência dos Bancos, uma vez que a Impugnante, na qualidade de “construtora”, podia oferecer mais garantias (reais). No entanto, esse facto não ficou demonstrado nos autos, nomeadamente com prova documental complementar que evidenciasse que a Impugnante prestou garantias reais (cfr., por exemplo, os contratos de empréstimos e de abertura de crédito referidos nas alíneas E. e F. supra) e esse facto (instrumental) também não foi confirmado pela testemunha C…….., pelo que o mesmo não ficou provado.
A testemunha da AT, S…….., confirmou, no essencial, os factos constantes do RIT.
Da prova documental junta pelo Impugnante:
Os documentos juntos pela Impugnante e que serviram para prova dos custos incorridos nas sucursais da Roménia e Bulgária, nos termos que constam das alíneas I., J. e K. supra, identificam os dados essenciais das operações (fornecedor e adquirente, descrição da operação e valor) e permitem apreender os elementos essenciais das operações sendo, por isso, idóneos para comprovar os custos suportados. Considerando que não está em causa a efectiva realização das operações, mas sim a inexistência do respectivo suporte documental, com a junção dos referidos documentos, impõe-se concluir que os custos estão devidamente titulados.
Refira-se ainda que o doc. 8, junto com o requerimento de 23.10.2013, no valor de 62,00 Ron, não obstante ser referente ao pagamento de portagens em euros e em Portugal, foi objecto de contabilização pela sucursal da Roménia, nos termos que resultam do extracto de conta …., junto como doc. 1 com o requerimento de 23.10.2013, devendo o mesmo ser aceite, por corresponder a custos incorridos na sucursal, com as referidas deslocações.
Foram igualmente aceites os encargos financeiros suportados com os financiamentos obtidos junto do M…….. Bucarest, B…… e M…… U…… Bulgária, nos termos previstos no art. 23.º, n.º 1, c) do CIRC (na redacção em vigor à data), na medida em que os encargos com a mesma natureza e origem que, à data da inspecção, se encontravam devidamente documentados foram aceites pela Inspecção Tributária, no âmbito do direito de audição.
Em relação ao documento 267, em que foi invocada pela AT a violação do princípio da especialização de exercícios, por se reportar a encargos relativos ao período de Outubro de 2005 a Dezembro de 2008, na falta de melhor prova e em respeito do referido princípio, foi aceite a proporção corresponde a ¼ do respectivo custo, por estarem em causa quatro exercícios fiscais.…”.
X
Compulsados os autos, impõe-se rectificar a alínea K) da matéria assente, da qual passa a constar o seguinte:
«K. No mesmo período, da conta …., com o código …., a sucursal da Bulgária incorreu em custos no montante de 91.899,87 Lev (cfr. docs. 97 e 113 juntos com o requerimento de 23.10.2013, a fls. 744 (com tradução a fls. 42 do apenso) e 762 a 770 dos autos, e doc. 123, a fls. 1050 dos autos (com tradução a fls. 179 do apenso), junto com o requerimento de 18.07.2014, que se dão por reproduzidos);»

II.2. De Direito
2.2.1. Nos presentes autos, é sindicada a sentença proferida a fls. 1628/1648, que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida por L........, S.A. contra a liquidação de IRC e juros compensatórios, de 2008.
A sentença entendeu ser de julgar improcedente a impugnação, salvo no que respeita à correcção relativa a despesas não documentadas provenientes das sucursais da Roménia e da Bulgária, anulando estas últimas.
2.2.2. Do recurso jurisdicional interposto pela impugnante [conclusões a) a K)].
A recorrente censura a sentença recorrida no que respeita ao julgamento da matéria de facto, por referência às alíneas I., J. e K. da mesma. Invoca, em síntese, que «…da instrução efetuada pela recorrente mediante a junção dos requerimentos de 23.10.2013 e de 18.07.2014 resulta que o teor dos factos provados pelas letras "I.", "J." e "K." terá de passar a ser a seguinte:
"I. No ano de 2008, a recorrente incorreu em custos, refletidos nas contas das suas sucursais, nos seguintes termos:
sucursal da Roménia:
..... - de 288.148,75 RON, ou seja, € 75.533,71, conforme documentos 2 a 85 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 524 a ..... dos autos;
..... - de 1.882.537,83 RON, ou seja, € 493.477,95, conforme documentos 120 e 123 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 780, 781 e 786 dos autos;
..... - de 863.241,93 RON, ou seja, € 226.285,42, conforme documentos 124 a 129 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 782 a 800 dos autos;"
sucursal da Bulgária:
..... - de 568.259,31 LEV, ou seja, € 267.435,49, conforme documentos 90 a 115 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 737 a 772 dos autos;
..... - de 330,61 LEV, ou seja, € 155,59, conforme documento 116 do requerimento de 23.10.2013, a fls. 773 dos autos;"
"J. No mesmo período, a recorrente incorreu em custos, refletidos nas contas das suas sucursais, nos seguintes termos:
sucursal da Roménia:
..... - de 328.831,81 RON, ou seja, € 86.198,14, conforme documentos 231 a 240 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1172 a 1185 dos autos;
..... - de 504.014,41 RON, ou seja, € 132.119,52, conforme documentos 241 a 267 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1186 a 1212 dos autos;
..... - de 247.244,77 RON, ou seja, € 64.811 ,36, conforme documentos 268 a 293 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1213 a 1247 dos autos;"
"K. No mesmo período, a recorrente incorreu em custos, refletidos nas contas das suas sucursais, nos seguintes termos:
sucursal da Bulgária:
..... - de 42.573,69 LEV, ou seja, € 20.036,09, conforme documentos 104 a 123 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1030 a 1050 dos autos;
..... - de 3.147,34 LEV, ou seja, € 1.481,21, conforme documentos 124 a 137 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1051 a 1064 dos autos;
..... - de 6.324,40 LEV, ou seja, € 2.975,93, conforme documentos 138 a 230 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 1065 a 1173 dos autos:
….. - de 3.663,23 LEV, ou seja, € 1.723,99, conforme documentos 45 a 103 do requerimento de 18.07.2014, a fls. 971 a 1029 dos autos;"
Os custos justificados nos termos dos fatos provados supra sob as letras "I.", "J." e "K." perfazem, pois, o montante global de € 1.372.234,30, pelo que tendo a Autoridade Tributária corrigido no relatório de inspeção a quantia de € 1.435.669,98, significa que apenas não foi justificada a diferença entre os referidos valores que perfaz € 63.435,68».
Apreciando.
Está em causa a correcção com a fundamentação seguinte:
«III.1.1.6 - Encargos não documentados/não aceites fiscalmente

O sujeito passivo efectuou lançamentos contabilísticos nas seguintes contas, no total de € 2.083.596,89, referentes à integração das contas das sucursais da Argélia, Roménia e Bulgária:

Conta ….. – Impostos (sucursal da Roménia) - € 138.488,86;

Conta …… – Impostos (sucursal da Bulgária) - € 3.842,77;

Conta …… – Outros custos e perdas financeiras (sucursal da Bulgária) - € 494.713,53;

Conta ….. – Outros custos e perdas financeiras (sucursal da Roménia) - € 1.386.637,40;

Conta ….. – Outros custos e perdas financeiras (sucursal da Argélia) - € 59.914,33.

Foi ainda contabilizado o valor de € 836,29, na conta ….. – Custos e perdas extraordinários – Correcções relativas a exercícios anteriores, através do lançamento nº …… no diário “tesouraria” de 30-9-2008, respeitante à regularização de saldo de caixa.

O sujeito passivo foi notificado, e requerido inúmeras vezes durante o decorrer do procedimento inspectivo, para apresentar relativamente a estes custos os extractos e documentos de suporte que identificassem os custos, e que justificassem a dedutibilidade fiscal dos mesmos, nomeadamente à luz do nº 1 do artigo 23º do CIRC (anexo 7 – folhas 1 a 8).

O mesmo apenas apresentou os extractos das contas enunciadas, não apresentando quaisquer elementos, e ou esclarecimentos que justificassem a contabilização daqueles custos, e a sua dedutibilidade fiscal. (…)

Relativamente aos custos em epígrafe, indubitavelmente se conclui que o sujeito passivo não respeitou as regras previstas na legislação mencionada, referentes à obrigação de manter a contabilidade organizada, nomeadamente a regra definida na alínea a) do nº 3 do artigo 115º do CIRC, que dispõe que todos os registos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados quando necessário. (…)

Relativamente aos registos contabilísticos concernentes com as sucursais, cumpre ainda adir que é definido na alínea a) do nº 1 do artigo 3º do CIRC a incidência do IRC, estabelecendo que: “ O IRC incide sobre: alínea a)·O lucro das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, das cooperativas e das empresas públicas e o das demais pessoas colectivas ou entidades referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo anterior que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola;”, conjugado com o do nº 1 do artigo 4º do CIRC, depreende-se que o IRC devido pelo sujeito passivo incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora do território, conforme é ai claramente determinado: “Relativamente às pessoas colectivas e outras entidades com sede ou direcção efectiva em território português, o IRC incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.”.

Face a tudo o que foi anteriormente exposto, é de acrescer ao resultado tributável, os custos não dedutíveis nos termos do n.º 1 do artigo 23º do CIRC, no total de € 2.084.433,18, referentes a integração das contas das sucursais da Argélia, Roménia e Bulgária, e regularização do saldo de caixa, em concordância com os articulados legais anteriormente explicitados.

A título complementar, importa referir que os encargos ora em questão, estão ainda sujeitos a tributação autónoma à taxa de 50%, nos termos do nº 1 do artigo 81º do CIRC, conforme ponto III.1.2.2.

A este respeito, cumpre informar o sujeito passivo que, em caso de posterior apresentação dos necessários suportes documentais, com referência aos encargos envolvidos na presente proposta de correcção, terá a empresa que apresentar os elementos por via dos quais faça a comprovação objectiva de que tais encargos são inequivocamente indispensáveis à obtenção de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, sob pena de, não o fazendo, continuarem os mesmos a não concorrer para a formação do resultado tributável, em razão directa de não verificarem os pressupostos de dedutibilidade fiscal constantes do artigo 23.º do CIRC. (…)

Face à documentação apresentada em sede de direito de audição pelo sujeito passivo, o valor desta correcção foi alterado para € 1.435.669,98 (Vide ponto IX do presente relatório). (…).” (cfr. RIT)».

As razões do dissídio entre as partes residem na comprovação dos custos em presença.
As correcções em exame assentam no disposto nos artigos 23.º/1/a)[1] e 42.º/1/g)[2], do CIRC.
Na petição inicial, a recorrente/impugnante invoca que os documentos comprovativos dos custos em causa encontram-se nas sucursais da Roménia, da Bulgária e da Argélia, mas que protesta juntar os documentos comprovativos dos custos não aceites relativos às sucursais em causa no montante de €1.435.669,99.
Através dos requerimentos de 23.10.2013 e de 18.07.2014, juntos aos autos, em momento posterior ao da instauração da presente impugnação, a recorrente/impugnante juntou um acervo de documentos.
Em face da junção dos referidos documentos, a demandada, em sede de contestação (artigos 162.º a 206.º) impugnou os mesmos, alegando, em síntese, que tais documentos não permitem reconstituir as transacções económicas que alegadamente pretendem titular, por falta de elementos identificativos de tais operações ou por falta de inteligibilidade dos documentos em causa, pelo que, seja a materialidade/efectividade das operações em apreço, seja a sua indispensabilidade não se mostram comprovadas nos autos.
Por seu turno, a sentença, em sede de matéria de facto não provada, considerou o seguinte:
«-A Impugnante tenha suportado outros custos nas sucursais da Roménia, Bulgária e Argélia, para além dos referidos nas alíneas I., J. e K. dos factos provados;
(por falta de junção da pertinente prova documental, designadamente quanto à sucursal da Argélia e Bulgária e, quanto a esta, ainda por falta de tradução dos documentos de suporte, nos termos previstos no art. 134.º do CPC (ex vi art. 2.º, e) do CPPT) ou por não estarem legíveis (cfr. nomeadamente, docs. 86 a 90, 91, 93, 95, 96, 99, 100, 102, 103, 105, 106, 109, 110, 112, 114, 115, 116);».
E em sede de fundamentação da decisão da matéria de facto da sentença consta o seguinte:
«Da prova documental junta pelo Impugnante:
Os documentos juntos pela Impugnante e que serviram para prova dos custos incorridos nas sucursais da Roménia e Bulgária, nos termos que constam das alíneas I., J. e K. supra, identificam os dados essenciais das operações (fornecedor e adquirente, descrição da operação e valor) e permitem apreender os elementos essenciais das operações sendo, por isso, idóneos para comprovar os custos suportados. Considerando que não está em causa a efectiva realização das operações, mas sim a inexistência do respectivo suporte documental, com a junção dos referidos documentos, impõe-se concluir que os custos estão devidamente titulados.
Refira-se ainda que o doc. 8, junto com o requerimento de 23.10.2013, no valor de 62,00 Ron, não obstante ser referente ao pagamento de portagens em euros e em Portugal, foi objecto de contabilização pela sucursal da Roménia, nos termos que resultam do extracto de conta ....., junto como doc. 1 com o requerimento de 23.10.2013, devendo o mesmo ser aceite, por corresponder a custos incorridos na sucursal, com as referidas deslocações».
A propósito da comprovação dos custos (ou dos gastos) em IRC, não sofre dúvida que «[a] comprovação das despesas necessárias à obtenção do lucro da sociedade é inerente e indissociável da dedutibilidade (…): os proveitos são os proveitos comprovadamente feitos e os gastos são os gastos comprovadamente tidos»[3]. Mais se refere que «[n]a perspectiva dos interesses fiscais, as exigências formais de documentação encontram a sua razão de ser numa dúplice justificação: por um lado, na necessidade de comprovar a efectivação do custo, a sua existência (desiderato alcançado pelo suporte em si); por outro lado, para aferir a natureza da despesa e respectiva comprovação da indispensabilidade do custo face à actividade do sujeito passivo (privilegiando-se aqui os elementos constantes do documento)»[4].
No que respeita ao alcance do ónus da prova dos custos, pontos firmes da jurisprudência do TCAS são os seguintes:
i) «O custo não documentado pode relevar fiscalmente se o contribuinte provar, por qualquer meio admissível, a efectividade da operação e o montante do gasto».[5]
ii) «A exigência de prova documental não se confunde nem se esgota na exigência de factura, bastando tão-só um documento escrito, em princípio externo e com menção das características fundamentais da operação, uma vez que ao contrário do que se passa com o IVA, em sede de IRC, a justificação do custo consubstancia uma formalidade probatória e, por isso, substituível por qualquer outro género de prova».[6]
iii) «Na execução da contabilidade, todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, susceptíveis de serem apresentados sempre que necessário (artigo 123.º/2/a), constituindo uma das obrigações acessórias do sujeito passivo a de exibição de documentos fiscalmente relevante, incluindo a contabilidade ou escrita».[7]
iv) «Normalmente, a comprovação documental faz-se por documento externo, ou seja, que provenha ou se destine ao exterior (ex: facturas, recibos e notas de crédito), com menção das características fundamentais da operação em causa. Mas, a falta de documento externo não impede a dedutibilidade, podendo a comprovação ser efectuada por documento interno, desde que permita aferir sobre a efectividade da operação e do montante»[8] .
v) «Para efeitos da dedutibilidade fiscal dos gastos incorridos ou suportados pelo sujeito passivo com a aquisição de bens ou serviços, o comprovativo documental, independentemente, da natureza ou suporte, tem que obedecer a um conteúdo mínimo. Assim, pelo menos, deve conter determinados elementos: o nome ou a denominação social do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário; os números de identificação fiscal do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário, sempre que se tratem de entidades com residência ou estabelecimento estável em território nacional; a quantidade e a denominação usual dos bens adquiridos ou dos serviços prestados; o valor da contraprestação, designadamente, o preço; a data em que os bens foram adquiridos ou os serviços foram realizados»[9] .
Compulsados os autos, verifica-se que os documentos juntos pela recorrente não preenchem os requisitos referidos. Perante a fundamentação da correcção em exame, constante do RIT, a alegação da impugnante constante da petição inicial não assenta na existência de determinados custos, comprovados por documentos discriminados correspondentes, os quais teriam sido indevidamente desconsiderados. Ao invés, a impugnante protesta juntar documentos alegadamente comprovativos do «montante em falta de €1.435.669,99». Em momento posterior à instauração da impugnação, sem justificação para tal e, em violação do princípio da estabilidade da instância (artigo 260.º do CPC), a impugnante junta documentos que distribui por custos, cuja classificação apresenta ex novo. Ou seja, na pendência da impugnação, a impugnante procede à reelaboração da contabilidade, aduzindo novos lançamentos e novos documentos de suporte, preterindo o dever de comprovação documental concomitante dos custos inscritos na contabilidade, sem justificação aparente para tal procedimento (artigo 115.º/3, do CIRC). Não basta invocar que os custos se relacionam com as sucursais, dado que, sendo os mesmos da sociedade portuguesa, ora impugnante, tais custos devem ter registos na contabilidade da sociedade, com sede em Portugal, de forma discriminada e documentada e acessível a um destinatário médio, o que no caso, não ocorre.
Mais se refere que os documentos juntos na pendência da impugnação correspondem a documentos avulsos, escritos em língua estrangeira, sem qualquer conciliação, justificação, explicação ou registo contabilístico correspondente. Deficiências não supridas pelo depoimento da testemunha, J........, responsável pela contabilidade da impugnante, dado que não existem registos discriminados e suportados em documentos para os alegados custos, nem justificação para tal omissão.
O ónus de comprovação dos custos que recai sobre o contribuinte exige a especificação dos mesmos, caso a caso, acompanhado dos registos contabilísticos correspondentes. O que não foi efectuado pela impugnante. A posição processual em apreço mantém-se em sede de alegações de recurso, pelo que, em rigor, o ónus de impugnação especificada da matéria de facto assente não foi observado (artigo 640.º do CPC), dado que não são indicados os concretos pontos de matéria de facto que justificariam uma decisão diferente, nem os elementos de prova que justificariam tal modificação, na tese da recorrente.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não merece censura, pelo que deve ser mantida, nesta parte.
Motivo porque se impõe julgar improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.3. Do recurso da Fazenda Pública quanto à impugnação da matéria de facto.
A recorrente considera, em síntese, que a sentença incorreu em erro de julgamento, no que respeita à matéria de facto assente, referida às alíneas I., J. e K.
2.2.3.1. No que respeita à alínea I), [conclusões b) a k)] a recorrente censura o valor em causa, devendo o mesmo corresponder a 256.750,22 Ron e não aos 288.148,75 Ron dados como provados, sustenta.
Compulsados os autos bem como os elementos de suporte da decisão fixada na alínea I), ora em exame, verifica-se que a recorrente não logra demonstrar a tese do erro de julgamento da matéria de facto assente, no que respeita quesito em exame. A decisão em apreço assenta na fundamentação da matéria de facto supra. Os elementos indicados na alínea do probatório da sentença em apreço foram considerados suficientes para justificar os custos em presença. Sobre a força e sobre o valor probatório dos elementos em causa, bem como sobre a fundamentação da convicção probatória do tribunal recorrido, a recorrente nada diz. Não questiona os dados identificativos das operações em causa. A fundamentação contida no quesito oferece-se plausível, no confronto com os elementos aí indicados. Pelo que não se comprova o alegado erro de julgamento, nesta parte
Pelo que se impõe julgar improcedente a presente acusação.
2.2.3.2. No que respeita à alínea J), [conclusões l) a y)] a recorrente censura o valor em causa; invoca que os documentos correspondem a meros lançamentos contabilísticos; que apenas os documentos 269, 271, 273 e 279, foram traduzidos para português, que não existem contratos que suportem os custos invocados.
Compulsadas as presentes alegações, bem como os elementos de suporte da decisão fixada na alínea J), ora em exame, verifica-se que a recorrente não contesta, seja o valor probatório dos elementos em causa, seja a asserção de facto que deles foi extraída. Ao invés, a discordância centra-se apenas sobre certos documentos, alegadamente de cariz interno, ou que não têm tradução para o português, ou que não são suportados por contratos ou cujos elementos não foram sopesados com o princípio da especialização dos exercícios. A recorrente não contesta a força e o valor probatório de todos elementos em causa, bem como a fundamentação da convicção probatória do tribunal recorrido. Não questiona os dados identificativos das operações em causa. A fundamentação contida no quesito oferece-se plausível, no confronto com os elementos aí indicados. Pelo que não se comprova o alegado erro de julgamento, nesta parte
Em face do exposto, impõe-se julgar improcedente a presente acusação.
2.2.4. No que respeita ao alegado erro de julgamento quanto ao direito aplicável, invocado pela impugnante. A recorrente invoca, para tanto, que «[a] douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento da matéria de direito na medida em que transforma como taxa de operação comparável a taxa de juro prevista no nº 1 da cláusula 3ª do "Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente", tão-só prevista para o período após a carência de juros, a qual foi fixada à Taxa Lisbor, a seis meses, acrescida de 1,50%" e a taxa de juro prevista no nº 1 da cláusula segunda do "Contrato de suprimentos", ou seja a taxa Euribor a 12 meses acrescidos de 1,50% ..."; «a aplicação do regime de relações especiais exige e implica sempre que seja definida e individualizada pelo menos uma operação comparável entre duas entidades independentes, sendo de referir que em sede de matéria de facto dada como provada, não foi feita nenhuma descrição de operações de financiamento celebradas entre entidades independentes com base nas quais seriam feitas as correções fiscais à própria recorrente, faltando assim um pressuposto essencial para a aplicação do regime do artigo 58° do CIRC; «[a] aplicação ao exercício de 2008 da taxa de juro prevista para um período posterior ao próprio exercício de 2008 configura uma tributação duma operação que de acordo com o texto dos próprios contratos de mútuo sob a forma de conta corrente e de suprimentos não estava sujeita a juros, ou seja, o procedimento adotado pela AT no exercício de 2008 de aplicar uma taxa de juro que no contrato apenas estava prevista para exercícios posteriores configura uma alteração do próprio texto dos contratos, dito de outra forma, tal procedimento configura a atribuição dum efeito jurídico-fiscal que não faz parte dos próprios contratos»; «[a] alteração e ou modificação dos efeitos fiscais, em 2008, dos contratos celebrados pelos contribuintes constitui a aplicação duma norma anti­abuso cujo respetivo regime está consignado no artigo 63° do CPPT, regime este que depende de despacho do Diretor geral da Autoridade Tributária e da prévia notificação de audição prévia específica para o caso, formalidades estas que não foram cumpridas pelo que a respetiva correção fiscal em sede de juros é ilegal».
Apreciando.
A fundamentação da correcção em apreço consta do ponto “III. do RIT Descrição dos factos e fundamento das correcções meramente aritméticas”, supra. Estão em causa ajustamentos em contratos de empréstimo outorgados pela impugnante com sociedades em posição de domínio em relação à mesma, os quais não prevêem num período de dez anos o pagamento de qualquer remuneração pelo financiamento concedido (ou não prevêem qualquer remuneração).[10]
A propósito dos preços de transferência (ou da transferência indirecta de lucros) regia à data o preceito do artigo 58.º (“Preços de transferência”) do CIRC, o qual determinava que [n.º 1], «[n]as operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis». Mais se consigna que «[4] Considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre: (…) // f) Empresas que se encontrem em relação de domínio, nos temos em que esta é definida nos diplomas que estatuem a obrigação de elaborar demonstrações financeiras consolidadas; (…) //.»
«Considera-se que duas sociedades estão em relação de domínio quando uma delas, dita dominante, pode exercer, directamente ou por sociedades ou pessoas que preencham os requisitos indicados no artigo 483.º, n.º 2, sobre a outra, dita dependente, uma influência dominante. // Presume-se que uma sociedade é dependente de uma outra se esta, directa ou indirectamente: // a) Detém uma participação maioritária no capital»[11].
A determinação de preços de livre concorrência assenta no critério da comparabilidade, ao mais elevado grau, com operações substancialmente análogas realizadas entre partes independentes. Este critério é apurado através dos métodos seguintes: i) o método do preço comparável de mercado; ii) o método do preço de revenda minorado; iii) e o método do custo majorado. Se estes não forem exequíveis ou fiáveis no caso concreto, poderá recorrer-se, a título subsidiário ou complementar, ao método do fraccionamento do lucro, ao método da margem líquida da operação ou a outro que seja apropriado aos factos[12]
«Considera-se como método mais apropriado para cada operação ou série de operações aquele que é susceptível de fornecer a melhor e mais fiável estimativa dos termos e condições que seriam normalmente acordos, aceites ou praticados numa situação de plena concorrência, devendo ser feita a opção pelo método mais apto a proporcionar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações vinculadas e outras não vinculadas e entre as entidades seleccionadas para a comparação, que conte com melhor qualidade e maior quantidade de informação disponível para a sua adequada justificação e aplicação e que implique o menor número de ajustamentos para efeitos de eliminar as diferenças existentes entre os factos e as situações comparáveis. // Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas»[13].
Existem, nesta matéria, deveres de instrução e fundamentação a cargo do contribuinte e a cargo da Administração. O contribuinte deve possuir um dossier de preços de transferência, contendo informação relativa à política adotada nesta matéria. Existem ainda deveres de relato, na declaração anual de informação contabilística e fiscal, relativos à identificação das entidades relacionadas, montante das operações com estas realizadas e informação sobre a manutenção do mencionado dossier de preços de transferência. No que respeita à Administração Fiscal, na situação de preços apurados no quadro de relações especiais entre empresas, o acto de fixação da matéria colectável deve conter, para além dos requisitos genéricos[14]: i) descrição das relações especiais; ii) indicação das obrigações incumpridas pelo sujeito passivo; iii) aplicação dos métodos previstos na lei, podendo a Direcção-Geral dos Impostos utilizar quaisquer elementos de que disponha e considerando-se o seu dever de fundamentação dos elementos de comparação adequadamente observado ainda que de tais elementos sejam expurgados os dados susceptíveis de identificar as entidades a quem dizem respeito; iv) quantificação dos respectivos efeitos[15]. «Considerando que a eficiente aplicação das regras sobre preços de transferência requer um elevado grau de colaboração entre os contribuintes e a administração tributária, é dado particular relevo às obrigações relativas à informação e documentação que o sujeito passivo deve obter, produzir e manter para justificar a política adoptada em matéria de preços de transferência. Todavia, a lista elaborada sobre informação e documentação relevante não é exaustiva, sendo legítima a expectativa, por parte da administração tributária, que o contribuinte possua, e possa fornecer para análise, os elementos que, perante os factos e circunstâncias concretas que caracterizam a sua actividade e num quadro de boas práticas comerciais e financeiras, deveria razoavelmente deter para determinar e comprovar a conduta adoptada na fixação dos preços de transferência, sem que, no entanto, seja obrigado a incorrer em custos de observância desproporcionados»[16].
«Quando os termos e condições de uma operação vinculada em que intervenha um sujeito passivo e uma entidade residente em território português difiram dos que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, a Direcção-Geral dos Impostos pode efectuar as correcções ao lucro tributável que sejam necessárias para que o respectivo montante corresponda ao que teria sido obtido se a operação se tivesse processado numa situação normal de mercado»[17].
«A adopção do método do preço comparável de mercado requer o grau mais elevado de comparabilidade com incidência tanto no objecto e demais termos e condições da operação como na análise funcional das entidades intervenientes. // Este método pode ser utilizado, designadamente, nas seguintes situações: // b) Quando uma entidade independente realiza uma operação da mesma natureza que tenha por objecto um serviço ou um produto idêntico ou similar, em quantidade ou valor análogos, e em termos e condições substancialmente idênticos, no mesmo mercado ou em mercados similares»[18].
No caso em exame, estão em causa contratos de empréstimos outorgados pela impugnante em relação a sociedades suas participantes, em situações de domínio em relação à impugnante.
No que respeita à existência de relações especiais entre as sociedades que beneficiaram dos empréstimos concedidos pela impugnante, no probatório constam os elementos seguintes [RIT, ponto III, ponto 1]:
a) O capital da L........,, SA (sujeito passivo) era detido maioritariamente, na percentagem de 94,72%, pela Construtora do L........ SGPS, SA (NIPC ..........) até 25 de Março de 2008. Nesta data, foi alienada à sociedade L........, SGPS, SA (NIPC ..........) a totalidade da participação detida (Anexo 4 – folhas 1 a 11). // A sociedade L........, SGPS, SA (NIPC ..........) foi constituída em 24 de Março de 2008, e o seu capital é detido na totalidade (100%) pela Construtora do L........ SGPS, SA (NIPC ..........). // Decorrente desta alteração societária, verificou-se também uma alteração relativamente às entidades envolvidas nas operações de financiamento concedido.
b) A partir daquela data passaram a coexistir três empréstimos concedidos por parte do sujeito passivo:
i) Dois contratos designados de “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” estabelecidos com as sociedades Construtora do L........ SGPS, SA (NIPC ..........) (já firmado em 2000) e L........, SGPS, SA (NIPC ..........) (novo em 2008);
ii) Um outro, (já firmado em 2004), designado por “Contrato de suprimentos” formalizado com a sociedade Construtora do L........ SGPS, SA (NIPC ..........).
No que respeita às operações em causa, do probatório resultam os elementos seguintes [RIT, ponto III, 2.]:
«Das operações de financiamento concedido

Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA
A L........,, SA apresentou na conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA o saldo final devedor no ano de 2008 no montante de € 44.753.702,93, cujos movimentos se podem observar no mapa seguinte:
    Conta
    Data
    Descritivo
    Débito
    Crédito
Saldo
    ........
    01.00.2008
    Saldos iniciais
    52.399.183,66
    -
    52.399.183,66
    ........
    03.01.2008
    Emprés timo Obtido C.L........
-
    4.500.000,00
    47.899.183,66
    ........
    07.01.2008
    Emprés timos Concedidos -
    210.459,20
    -
    48.109.642,86
    ........
    25.01.2008
    Emprés timos Concedidos -
    406.272,77
    -
    48.515.915,63
    ........
    07.02.2008
    Saída tesouraria
    98.800,00
    -
    48.614.715,63
    ........
    25.02.2008
    Saída tesouraria
    171.000,00
    -
    48.785.715,63
    ........
    29.02.2008
    Emprés timos Concedidos -
    27.245,00
    -
    48.812.960,63
    ........
    30.08.2008
    Docum ento
-
    2.033.375,00
    46.779.585,63
    ........
    30.08.2008
    Docum ento
-
    2.005.000,00
    44.774.585,63
    ........
    30.08.2008
    Docum ento
-
    11.382,70
    44.763.202,93
    ........
    30.08.2008
    Docum ento
-
    9.500,00
    44.753.702,93
    53.312.960,63
    8.559.257,70
    44.753.702,93

O saldo da conta está titulado por duas operações de financiamento distintas, que foram denominadas de “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” e “contrato de suprimentos”, cujos contratos constam do anexo 5 – (folhas 1 a 4) e do anexo 6 – (folhas 1 a 4), respectivamente.
O sujeito passivo foi notificado no sentido de discriminar os movimentos, identificando igualmente o saldo inicial e o saldo final, relativamente à conta em análise, para cada um dos contratos reconhecidos (anexo 7 – folhas 1 a 8). Em resposta ao pedido efectuado, o mesmo apresentou o seguinte detalhe dos movimentos para cada um dos contratos:
Contrato de mútuo sob a forma d e conta -corrente”

    Conta
    Data
    Descritivo
    Débito
    Crédito
Saldo
    ........
    01.00.2008
    Saldos iniciais
    42.870.986,95
    -
    42.870.986,95
    ........
    03.01.2008
    Empréstimo Obtido
-
    4.500.000,00
    38.370.986,95
    ........
    07.01.2008
    Emprés timos
    210.459,20
    -
    38.581.446,15
    ........
    25.01.2008
    Emprés timos
    406.272,77
    -
    38.987.718,92
    ........
    07.02.2008
    Saída tesouraria
    98.800,00
    -
    39.086.518,92
    ........
    25.02.2008
    Saída tesouraria
    171.000,00
    -
    39.257.518,92
    ........
    29.02.2008
    Emprés timos
    27.245,00
    -
    39.284.763,92
    ........
    30.08.2008
    Documento
-
    2.033.375,00
    37.251.388,92
    ........
    30.08.2008
    Documento
-
    2.005.000,00
    35.246.388,92
    ........
    30.08.2008
    Documento
-
    11.382,70
    35.235.006,22
    ........
    30.08.2008
    Documento
-
    9.500,00
    35.225.506,22
    43.784.763,92
    8.559.257,70
    35.225.506,22

“Contrato de suprimentos”
Relativamente a este contrato não ocorreram movimentos durante o ano de 2008, apresentando o saldo inicial e final o valor de € 9.528.196,71.
Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA
A L........,, SA apresentou na conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA o saldo final devedor, no ano de 2008, no montante de € 11.395.235,88, cujos movimentos se podem observar no Anexo 8 – folhas 1 a 2.
O sujeito passivo foi notificado para apresentar o contrato de suporte à operação de financiamento, referente àquele saldo (anexo 7 – folhas 1 a 8).
Em resposta ao pedido, o sujeito passivo informou que o saldo da conta estava titulado por uma operação de financiamento, subtítulo “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”, tendo apresentado o respectivo contrato (anexo 9 – folhas 1 a 3).
Passamos então a analisar em detalhe cada um dos contratos.
2.1– “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”
2.1.1 - Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA
O contrato, apresentado pelo sujeito passivo, denominado como “contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”, e datado de 20 de Setembro de 2000, foi celebrado entre as sociedades Construtora do L........, SA (anterior designação da L........, SA, mantendo o mesmo número de contribuinte) e a Construtora do L........ SGPS, SA, que conforme é referido na alínea a) do citado contrato, são sociedades que se encontram em relação de domínio, e que tem como objecto, de acordo com o nº 1 da 1ª cláusula que “As Contraentes, no âmbito da Relação de Domínio existente, comprometem-se a manter uma estreita colaboração de forma a optimizar as suas respectivas tesourarias”. É estipulado no acordo, nº 2 da mesma cláusula que “As Contraentes, através das suas respectivas administrações, manterão contactos regulares no sentido de estabelecerem as necessidades/recursos existentes, montantes e respectivas datas de entrega dos empréstimos destinados à cobertura de carência das respectivas tesourarias.”. A 2ª cláusula vem ainda reforçar que: “Os empréstimos serão entregues conforme as necessidades de apoio à tesouraria das respectivas Contraentes.”.
No nº 1 da 4ª cláusula é definido o período temporal do contrato, transcrevendo “Os empréstimos são concedidos pelo prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar das respectivas entregas.”
Neste contrato, é ainda estabelecido a remuneração e carência de pagamento dessa mesma remuneração, dos fundos transferidos. O nº 1 da 3ª cláusula define que “Os juros a pagar por cada uma das partes pelos empréstimos efectuados no âmbito do presente contrato fixam-se à Taxa Lisbor, a seis meses, acrescidas de 1,50%.”. O nº 2 da mesma cláusula define então o período de carência de pagamento dos juros, estabelecendo que “…as partes acordam que o pagamento dos respectivos juros beneficiam de um prazo de carência de dez anos, com início na data da entrega das quantias mutuadas ao abrigo do presente contrato, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento ou ao pagamento de quaisquer juros.”.
Por último, é relevante transcrever um considerando que consta no contrato em apreço, na alínea h) em particular, “As Contraentes, no seu interesse próprio e legítimo, pretendem conjugar esforços no sentido de optimizar as suas respectivas tesourarias evitando o recurso ao crédito a entidades terceiras”.
2.1.2- Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA
O contrato, apresentado pelo sujeito passivo, denominado como “contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente”, e datado de 28 de Março de 2008, foi celebrado entre as sociedades L........, SGPS, SA e L........,, SA, que conforme é referido na alínea a) do citado contrato, são sociedades que se encontram em relação de domínio, e que tem como objecto, de acordo com o nº 1 da 1ª cláusula que “As Contraentes, no âmbito da Relação de Domínio existente, comprometem-se a manter uma estreita colaboração de forma a optimizar as suas respectivas tesourarias”. É estipulado no nº 2 da mesma cláusula que “As Contraentes, através das suas respectivas administrações, manterão contactos regulares no sentido de estabelecerem as necessidades/recursos existentes, montantes e respectivas datas de entrega dos empréstimos destinados à cobertura de carência das respectivas tesourarias.”. A 2ª cláusula vem ainda reforçar que “Os empréstimos serão entregues conforme as necessidades de apoio à tesouraria das respectivas Outorgantes.”.
No nº 1 da 4ª cláusula é definido o período temporal do contrato, transcrevendo “Os empréstimos são concedidos pelo prazo máximo de 364 (trezentos e sessenta e quatro) dias a contar das respectivas entregas.”
Neste contrato, é ainda estabelecido que os fundos transferidos não estão sujeitos a remuneração, conforme se verifica na 3ª cláusula, que determina que “O capital mutuado não vencerá juros na medida que o presente mútuo se insere na Relação de Domínio existente entre as Outorgantes, e no interesse próprio das mesmas em evitar o recurso ao crédito a entidades terceiras.”.
2.2– “Contrato de suprimentos”
O contrato de “suprimentos” foi firmado entre a Construtora do L........, SGPS, SA (identificada no contrato como primeira contratante) e a L........, SA (identificada no contrato como segunda contratante) assinado em 21 de Setembro de 2004, e tem como objecto a transferência de fundos determinada na sua 1ª cláusula, “A Segunda Contratante, na qualidade de accionista na Primeira Contratante, constituiu e realiza na Primeira Contratante, suprimentos sob a forma de dinheiro e nos valores que, nos termos e para os efeitos do presente contrato, lhe sejam previamente solicitados por esta, destinados a apoio da actividade da Primeira Contratante na área das concessões rodoviárias e consoante estas necessidades.”.
Antes de prosseguir a análise detalhada às características e condições definidas no contrato em epígrafe, é fundamental dissecar o conteúdo e a relação societária entre as sociedades enunciadas na cláusula supra citada.
Na data em que o contrato foi firmado entre as duas sociedades Construtora do L........ SGPS, SA e L........, SA a primeira detinha uma participação no capital da segunda que representava 94,72% do mesmo. Nestes termos, a relação enunciada na referida cláusula está incorrecta, ou seja, e ao contrário do que é tipificado, a Construtora do L........ SGPS, SA (identificada no contrato como primeira contratante) é que é accionista da L........,, SA (identificada no contrato como segunda contratante).
No ano de 2008, as alterações societárias que ocorreram no grupo L........, não modificaram as relações especiais que existem entre as sociedades implicadas neste contrato, determinadas nos termos do nº 4 do artigo 58º do CIRC. (…)
Analisadas as questões erráticas enunciadas na 1ª cláusula, no entender da Administração Fiscal, do contrato em título, enunciemos os restantes pontos do mesmo. No nº 1 da 2ª cláusula é definido que “Os suprimentos constituídos e realizados vencerão juros à taxa Euribor a 12 meses acrescidos de 1,50% (um virgula cinco décimas de porcento), sem prejuízo, no entanto, do estipulado no número seguinte da presente cláusula.”, acrescendo o nº 2 que: “Acordam as partes, pelos motivos referidos nos Considerandos, num período de carência de juros até ao início do efectivo retorno do investimento efectuado na concessão rodoviária supra referenciada, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento nem pagamento de quaisquer juros.” // Por fim é estipulado na 3ª cláusula que “O empréstimo é cedido pelo prazo de 120 (cento e vinte) meses, a contar das respectivas entregas, automática e sucessivamente renovável por iguais períodos …”».
A correcção em exame imposta pela AT assenta nos fundamentos seguintes [RIT, ponto III, pontos 3 a 8]:
«3. Da subordinação ao Princípio de Plena Concorrência pela existência de relações especiais entre as entidades intervenientes
O Princípio de Plena Concorrência consagrado no ordenamento jurídico nacional no n.º 1 do artigo 58.º do CIRC
4. Da selecção do método mais apropriado de fixação do preço de transferência
De acordo com o n.º 2 do artigo 58.º do CIRC “O sujeito passivo deve adoptar, para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o método ou métodos susceptíveis de assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efectua e outras substancialmente idênticas, em situações normais de mercado ou de ausência de relações especiais (…)”. // (…)
O Método do Preço Comparável de Mercado assume-se, assim, como o método mais adequado a aplicar, sendo que a sua preferência em relação aos demais métodos advém do facto de constituir a forma mais directa de determinar se as condições acordadas entre entidades relacionadas, são condições de Plena Concorrência. // (…)
Rejeição do Método do Preço de Revenda Minorado
(…)
Rejeição do Método do Custo Majorado
(…)
Rejeição dos métodos não tradicionais
(…)
5. Da pesquisa de uma operação comparável
Em conformidade com a explanação já efectuada, o Método do Preço Comparável de Mercado pode ser utilizado comparando as condições ocorridas numa operação vinculada com as condições praticadas numa operação realizada com uma entidade independente.
De acordo com o n.º 3 do artigo 4.º da Portaria “Duas operações reúnem as condições para serem consideradas comparáveis se são substancialmente idênticas, o que significa que as suas características económicas e financeiras relevantes são análogas ou suficientemente similares, de tal modo que as diferenças existentes entre as operações ou entre as empresas nelas intervenientes não são susceptíveis de afectar de forma significativa os termos e condições que se praticariam numa situação normal de mercado ou, sendo-o, é possível efectuar os necessários ajustamentos que eliminem os efeitos relevantes provocados pelas diferenças verificadas.”
Em conformidade com o parágrafo 199 do Relatório do Comité dos Assuntos Fiscais da OCDE de 1979 “Preços de Transferência e Empresas Multinacionais”, quando se pretende determinar o que se entende por empréstimo comparável ou similar, será necessário atender aos seguintes factores: o montante e a duração do empréstimo, a sua natureza ou o seu objectivo, a divisa em que se encontra especificado, e a situação financeira do mutuário.
Ora, no âmbito da análise efectuada à conformidade das suas operações financeiras vinculadas com o Princípio de Plena Concorrência, podemos identificar para as três operações em análise, nos contratos as seguintes remunerações:
- “Contrato d e mútuo sob a forma d e c o n ta -corrente”
Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA
O nº 1 da 3ª cláusula define que “Os juros a pagar por cada uma das partes pelos empréstimos efectuados no âmbito do presente contrato fixam-se à Taxa Lisbor, a seis meses, acrescidas de 1,5%.”.
Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA
Neste contrato foi ainda estabelecido que os fundos transferidos não estão sujeitos a remuneração, conforme se afere na 3ª cláusula, que define que “O capital mutuado não vencerá juros na medida que o presente mútuo se insere na Relação de Domínio existente entre as Outorgantes, e no interesse próprio das mesmas em evitar o recurso ao crédito a entidades terceiras.”.
No entanto, dado que este contrato tem exactamente as mesmas características que aquele referido na alínea anterior, respeitantes aos fundos transferidos contabilizados na conta ........ - Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA, a remuneração do capital emprestado a considerar é a mesma, ou seja, Taxa Euribor, a seis meses, acrescida de um spread de 1,5%.
- - “Contrato d e suprimentos”
O nº 1 da 2ª cláusula define que “Os suprimentos constituídos e realizados vencerão juros à taxa Euribor a 12 meses acrescidos de 1,5% (um vírgula cinco décimas de porcento),…”
Em face da existência de cláusulas contratuais prevendo a remunerabilidade das operações controvertidas, bem como, as taxas de remuneração aplicáveis, de cujo recebimento a entidade cedente dos fundos abdicou, pretende-se efectuar uma análise de comparabilidade incidente sobre a opção de investimento tomada pelo sujeito passivo (o financiamento da entidade relacionada a título gratuito, em detrimento da opção de a financiar com recurso a um empréstimo remunerado), considerando a expectável opção que entidades independentes tomariam em circunstâncias comparáveis, movidas por critérios de eficiente racionalidade económica.
6. Determinação do preço que seria praticado entre entidades independentes
Atendendo aos fundamentos aduzidos nos parágrafos anteriores, importa analisar se caso as operações de “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” e “Contrato de suprimentos”, realizadas entre a L........,, SA e a Construtora do L........ SGPS, SA, e a operação de “Contrato de mútuo sob a forma de conta- corrente” realizada entre a L........, SA e a L........, SGPS, SA, tivessem sido celebradas entre entidades independentes, teriam sido contratados, aceites e praticados termos similares aos que foram definidos para estas operações. // (…)
Nesta conformidade, e dada a inexistência de evidência de que os fundos concedidos a título de “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” e de “Contrato de suprimentos” pela L........, SA à Construtora do L........ SGPS, SA, e “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” pela L........, SA à L........, SGPS, SA, se possam enquadrar em alguma das três hipóteses de concessão de financiamentos a título gratuito, afigura-se-nos ser de aplicar o princípio geral de que um empréstimo entre entidades relacionadas deverá suportar juros desde que os tivesse suportado entre entidades independentes em circunstâncias análogas.
O sujeito passivo foi notificado (anexo 7 – folhas 1 a 8) nos seguintes termos “Relativamente aos fundos colocados à disposição da L........ SGPS, SA e L........, SGPS, SA, e tendo em atenção que estas empresas estão em situação de relações especiais com a L........, S.A, nos termos do nº 1 do artigo 58º do CIRC, queiram demonstrar que foram praticadas as condições de plena concorrência, nos termos do artigo referido, das seguintes cláusulas contidas nos contratos que suportam esta transferência de fundos:
- “Contrato de suprimentos”
O nº 2 da 2ª cláusula estipula que: “Acordam as partes, pelos motivos referidos nos Considerandos, num período de carência de juros até ao início do efectivo retorno do investimento efectuado na concessão rodoviária supra referenciada, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento nem pagamento de quaisquer juros.”
- “Contrat o d e mútuo sob a form a d e c o n ta -corrente”
Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – Construtora do L........ SGPS, SA
O nº2 da 3ª clausula convenciona que “Devido ao descrito nos considerandos supra, ou seja, a canalização de recursos para novos projectos na área da construção que, directa e indirectamente beneficiam ambas as Contraentes, projectos esses que se encontram em fase de arranque e cuja maturação e retorno será dilatada no tempo, as partes acordam que o pagamento dos respectivos juros beneficiam de um prazo de carência de dez anos, com inicio na data da entrega das quantias mutuadas ao abrigo do presente contrato, período durante o qual não haverá lugar ao vencimento ou ao pagamento de quaisquer juros.”
Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA
Neste contrato foi ainda estabelecido que os fundos transferidos não estão sujeitos a remuneração, conforme se afere na 3ª cláusula, que define que “O capital mutuado não vencerá juros na medida que o presente mútuo se insere na Relação de Domínio existente entre as Outorgantes, e no interesse próprio das mesmas em evitar o recurso ao crédito a entidades terceiras.” // (…)
Concretizando, se na concessão de fundos pela L........, SA, tivessem sido contratados, aceites e praticados os mesmos termos contratados, aceites e praticados, por entidades independentes em operações comparáveis, regidas por critérios de racionalidade económica, esta teria auferido uma remuneração de mercado pelo financiamento concedido, equivalente à taxa Euribor a 6 meses acrescida de um spread de 1,5%, relativamente ao “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente e equivalente à taxa Euribor a 12 meses acrescida de um spread de 1,5%, relativamente ao “Contrato de suprimentos” pelo que se verifica, assim, uma violação do Princípio de Plena Concorrência consagrado no n.º 1 do artigo 58.º do CIRC.
7. Do impacto da violação do Princípio de Plena Concorrência na determinação do lucro tributável
7.1- “Contrato de mútuo sob a forma de conta-corrente” // (…)
Através da aplicação da ante citada metodologia conclui-se que, se a operação tivesse sido realizada entre entidades independentes, o preço praticado, sob a forma de remuneração do financiamento seria de € 2.401.101,25, por aplicação do nº 1 do artigo 58º do CIRC, conforme se pode ver em detalhe no anexo 12 – folha 1.
Conta ........ – Accionistas – empréstimos concedidos – L........, SGPS, SA // (…)
Através da aplicação da ante citada metodologia conclui-se que, se a operação tivesse sido realizada entre entidades independentes, o preço praticado, sob a forma de remuneração do financiamento seria de € 41.634,27, por aplicação do nº 1 do artigo 58º do CIRC, conforme se pode ver em detalhe no anexo 13 – folha 1.
7.2– “Contrato de suprimentos” // (…)
Através da aplicação da ante citada metodologia conclui-se que, se a operação tivesse sido realizada entre entidades independentes, o preço praticado, sob a forma de remuneração do financiamento seria de € 602.141,01, por aplicação do nº 1 do artigo 58º do CIRC, conforme se pode ver em detalhe no anexo 14 – folha 1. // (…)».
Perante os dados coligidos nos autos, verifica-se que os empréstimos em causa correspondem a operações vinculadas efectuados entre sociedades integrantes de um grupo societário, sendo as sociedades mutuárias sociedades dominantes da sociedade mutuante, ora impugnante/recorrente. O cálculo da remuneração do capital emprestado foi efectuado tendo por base a operação comparável naquele sector de actividade, realizada por entidades independentes, atendendo aos elementos disponibilizados pela impugnante, bem assim como os dados do Banco de Portugal. O termo de comparação assenta na racionalidade económica da operação, dado que não existe justificação aparente para o período de carência nos contratos de mútuo em causa ou para a ausência de remuneração do capital mutuado e atendendo a que um operador económico razoável, colocado na posição da impugnante, em situação paralela, mas sem qualquer relação de subordinação, apenas aceitaria conceder os empréstimos referidos, mediante o pagamento da remuneração correspondente, tal como a mesma resulta comprovada para aquele sector do mercado.
Está em causa nos autos uma correcção aritmética ao lucro tributável, em função dos dados disponíveis com relevo na situação concreta. As garantias de defesa da contribuinte foram observadas, dado que no decurso do procedimento inspectivo, a mesma foi notificada, seja para esclarecer os contornos das operações em causa, seja para exercer o direito de audição prévia no âmbito do procedimento inspectivo.
Mesmo que se entenda tratar-se norma especial anti-abuso, sempre se teria de considerar não aplicável ao caso o disposto no preceito do artigo 63.º do CPPT[19].
Por outras palavras, perante a demonstração de que as operações em causa violam, de forma manifesta, o princípio da plena concorrência, através da subfacturação ou subquantificação da matéria colectável da impugnante, cabia a esta última a demonstração da racionalidade económica das operações em referência. Ónus que no caso não foi observado. Não está em causa a requalificação das operações em apreço, dado que a AT não abstrai dos negócios jurídicos outorgados pelas partes, nem os substitui por outros; ao invés, trata-se de apurar o valor fiável da transacção, para aquele sector de actividade[20], atendendo às circunstâncias concretas de uma empresa, como a impugnante, envolvida na actividade económica de construção civil, empenhada no âmbito de agrupamentos complementares de empresas, de âmbito nacional (RIT, ponto II.3.1.4.) e com sucursais no estrangeiro.
Mais se refere que a Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro (artigo 3.º/2), prevê a possibilidade de ajustamento ao lucro tributável, no quadro da correcção dos preços de transferência, sem a aplicação de outro procedimento que não o previsto na mencionada Portaria. De onde resulta que a norma do artigo 63.º do CPPT, gizada para os procedimentos de aplicação de normas antiabuso, não tem aplicação ao caso.
A razão de ser da correcção aritmética em apreço assenta em que a concessão de empréstimos a entidades terceiras, como os que estão em causa nos autos, só pode ser racionalmente aceite pela impugnante, atendendo ao parâmetro do operador razoável para aquele sector de actividade, desde que mediante a contrapartida do pagamento do preço/juro remuneratório do capital mutuado, tal como resulta das páticas do mercado financeiro, para aquela modalidade de empréstimo, documentadas pelos dados do Banco de Portugal. Pelo que a correcção em exame não enferma de erro ou vício, devendo ser mantida na ordem jurídica.
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não enferma de erro, pelo que deve ser confirmada.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.5. A recorrente, Fazenda Pública, imputa à sentença recorrida, nulidade por omissão de pronúncia no que respeita ao pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça. Considera também ser devida a referida dispensa. No mesmo sentido alega a recorrente/impugnante.
Por seu turno, o tribunal recorrido, através do despacho de fls. 1753/verso, considerou que, atendendo à complexidade da causa, dada a junção de prova documental e a tramitação processual, no caso não estão reunidos os requisitos da dispensa do remanescente da taxa de justiça. Pelo que, ao invés do alegado pela recorrente, a alegada nulidade, por omissão de pronúncia, não se confirma nos autos.
Termos em que se julga improcedente a presente imputação.
2.2.6. No que respeita ao alegado erro de julgamento quanto ao indeferimento do pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça.
Ao invés do propugnado pela recorrente, Fazenda Pública, não é de atender ao valor da sucumbência, dado que este não é determinável, porquanto a subtracção de certos custos da matéria tributável pressuposta pela liquidação impugnada não nos permite aferir do montante exacto da mesma que será objecto de rectificação[21].
Nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, «[n]as causas de valor superior a €275000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento». Como decorre da Tabela I do RCP, quando o valor da causa seja superior a €275.000,00, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada €25.000 ou fracção, três unidades de conta, no caso da coluna A, uma e meia unidade de conta no caso da coluna B e quatro e meia unidades de conta no caso da coluna C. «É esse remanescente, ou seja, o valor da taxa de justiça correspondente à diferença entre €275.00,00 e o efectivo superior valor da causa para efeito da determinação daquela taxa, que deve ser considerado na conta final, se o juiz não dispensar o seu pagamento»[22].
«A referência à complexidade da causa significa, em concreto, a sua menor complexidade ou simplicidade e a positiva atitude de cooperação das partes»[23] .
Nos termos do artigo 527.º, n.º 1, do CPC, «[a] decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito». Nos termos do n.º 2 do preceito, «[e]ntende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for».
No caso em exame, o valor da causa corresponde a €2.006.480,47.
Sobre a matéria constitui jurisprudência assente a de que o direito fundamental de acesso aos tribunais (art.º 20.º, n.º 1, da CRP) envolve «a necessidade de os encargos fixados na lei ordinária das custas, pelo serviço prestado, não serem de tal modo exagerados que o tornem incomportável para a capacidade contributiva do cidadão médio. Sob este ponto de vista, pode acontecer que a fixação da taxa de justiça calculada apenas com base no valor da causa (particularmente se em presença estiverem procedimentos adjectivos de muito elevado valor) patenteie a preterição desse direito fundamental, evidenciando um desfasamento irrazoável entre o custo concreto encontrado e o processado em causa». [Ac. do TCAS, de 13.03.2014, P. 07373/14]. A aferição da complexidade da causa deve ter em conta o disposto no artigo 530.º/7, do CPC. Assim, consideram-se de especial complexidade, as acções que: «a) Contenham articulados ou alegações prolixas; b) Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou // c) Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas».
No caso em exame, os autos não preenchem nenhum dos requisitos enunciados com vista a aferir da especial complexidade dos mesmos. Por outras palavras, a especialidade da causa não é de molde a afastar o limiar do valor de €275.00,00, dado que a complexidade ou especificidade não justificam a imposição de encargos dissuasores do acesso à justiça. O mesmo se diga do comportamento processual das partes, em particular da ora requerente, o qual se pautou pelo cumprimento do dever de boa fé processual.
Por outras palavras, atendendo à lisura do comportamento processual das partes e considerando a relativa complexidade do processo, afigura-se ser de deferir o pedido quanto à dispensa do pagamento da taxa de justiça na conta final, em relação a ambas as partes.
Pelo exposto, impõe-se deferir o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º/7, do RCP.
Termos em que se procederá no dispositivo.

Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso interposto pela impugnante, bem como em negar provimento ao recurso interposto pela impugnada, mantendo a sentença recorrida na ordem jurídica.
Condena-se as recorrentes nas custas devidas em razão do respectivo decaimento, com deferimento do pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça em relação a ambas as partes.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês -Relator)


(1ª. Adjunta)



(2ª. Adjunta)


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[1] «Considera-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (…)».
[2] «Não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício: (…) // g) Os encargos não devidamente documentados (…)».
[3] Ana Paula Dourado, Direito Fiscal, cit., p. 224.
[4] António Moura Portugal, A dedutibilidade dos custos na jurisprudência fiscal portuguesa, Coimbra Editora, 2004, p. 189.
[5] Acórdão do TCAS, de 06.04.2017, P. 06844/13.
[6] Acórdão do TCAS, de 15.09.2016, P. 09470/16
[7] Rui Marques, Código do IRC, anotado e comentado, Almedina, 2019, p. 209.
[8] Rui Marques, Código do IRC, anotado e comentado, Almedina, 2019, p. 209.
[9] Rui Marques, Código do IRC, cit., p. 209.
[10] V. ponto 2. do RIT.
[11] Artigo 486.º/1 e 2, do Código das Sociedades Comerciais.
[12] Alexandra Coelho Martins, O regime dos preços de transferência e o IVA, Cadernos IDEFF, n.º 10, 2009, p. 47. Sobre cada um dos métodos em apreço V. artigos 6.º a 10.º da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro.
[13] Artigo 4.º, n.os 2 e 3., Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro.
[14] Artigo 77.º/3, da LGT.
[15] Alexandra Coelho Martins, O regime dos preços de transferência e o IVA, cit., pp. 50/51.
[16] §6 do preâmbulo da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro.
[17] Artigo 3.º, n.º 2, da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro.
[18] Artigo 6.º, n. º 2, da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro.
[19] V., neste sentido, V. Jorge Lopes de Sousa, CPPT, Anotado e comentado, Vol. I., 6.º Ed., p. 584.
[20] Tomás Cantista Tavares, IRC e Contabilidade, Da realização ao justo valor, Almedina, 2011, p. 416.
[21] «Nos recursos, o valor é o da sucumbência quando esta for determinável, devendo o recorrente indicar o respectivo valor no requerimento de interposição do recurso; nos restantes casos, prevalece o valor da acção» [artigo 12.º/12, do Regulamento de Custas Processuais].
[22] Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, anotado, 4.ª ed., p. 236.
[23] Salvador da Costa, Regulamento das Custas…, cit., p. 236.