Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:412/17.0 BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:03/22/2018
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:PROGRAMA ESPECIAL DE REDUÇÃO DO ENDIVIDAMENTO AO ESTADO (PERES)
CORRECÇÃO DO LAPSO DE INSERÇÃO
Sumário:I - Está em causa o Decreto-Lei nº 67/2016, de 3 de Novembro, que aprova o programa especial de redução do endividamento ao Estado, e em cujo preâmbulo se pode ler que «é criado um regime especial de redução do endividamento ao Estado que visa apoiar as famílias e criar condições para a viabilização económica das empresas que se encontrem em situação de incumprimento, prevenindo situações evitáveis de insolvência de empresas com a inerente perda de valor para a economia, designadamente com a destruição de postos de trabalho.»

II - O requerimento apresentado pelo recorrido de correcção do lapso de inserção no Programa Peres tem que ser analisado e decidido tendo em conta a situação tributária existente no momento da sua apresentação e não a actual situação que é fruto da não decisão desse requerimento e da não correcção do lapso, como se impunha, argumentando com o que existe e não deveria existir, apenas porque a Administração Tributária não teve a actuação diligente e legal que se impunha, e, usou essa omissão em desfavor do contribuinte praticando actos e desenvolvendo procedimentos que não poderia ter usado se tivesse procedido à correcção desse lapso.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA, vem recorrer da sentença de fls.104 a 111vº do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou procedente a reclamação judicial intentada, ao abrigo dos artigos 276º e segts do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), pela sociedade comercial «Y………..............................., S.A.» e consequentemente, anulou o despacho do órgão de execução fiscal substanciado no acto do Chefe de Serviço de Finanças de ……..……., datado de 20.07.2017, que lhe indeferira o pedido de retoma do Plano Especial de Redução de Endividamento ao Estado, relativo à adesão nº...........


Nas suas alegações de recurso formula as seguintes conclusões:


«A. Julgou a douta sentença recorrida procedente a reclamação deduzida contra a decisão do Chefe de Finanças de ..............., de 20 de Julho de 2017, que indeferiu o pedido de retoma do plano prestacional relativo a adesão nº.........., e por conseguinte determinou a anulação daquela decisão.

B. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento quanto a matéria de facto e de direito, por errada valoração dos elementos constantes dos autos de execução e por errada aplicação da Lei - Decreto-Lei nº 67/2016.

C. Com efeito, considerou a douta sentença que se mostram-se preenchidos os requisitos exigidos para a produção dos efeitos do PERES, devendo ser retomado o plano prestacional relativo a adesão nº.........., porquanto:
i. Apelando a uma interpretação extensiva do disposto no artº2 do Decreto-Lei n°67/2016, no sentido de facilitar os pagamentos dos devedores para evitar situações de insolvência e beneficiar o inovador pagamento em prestações, consoante a opção do devedor, tendo em vista os benefícios da modalidade do pagamento integral bem como os do pagamento em prestações, respectivamente,
ii. E resultando provado que a Reclamante, em 19 de Dezembro de 2016, efectuou o pagamento de € 84.990,36, relativos a 8% da quantia exequenda nos processos de execução fiscal que, no Termo de Adesão nº.........., optou pela modalidade de pagamento em prestações,
iii. nada obstará a eficácia da adesão nº.......... no que respeita aos Processos de Execução Fiscal referenciados no supra ponto 1.2. do probatório da douta sentença;
iv. E acrescenta que, tendo o OEF tornado conhecimento, dentro do prazo que a Reclamante dispunha para optar, que esta pretendia aderir ao PERES apenas na modalidade do pagamento em prestações, deveria ter interpretado a declaração de adesão de acordo com a vontade real da declarante, pelo que a decisão ora reclamada ao no atender àquela vontade, sofre do vício de violação da lei, por erro nos pressupostos.

D. Todavia, não pode a Fazenda Pública concordar com tal entendimento, porquanto resulta da matéria de facto assente, que somente em 30.01.2017 é que a Reclamante procedeu ao pagamento integral de €24.182,74 relativo ao IRC do exercício de 2015, e como tal, é bom de ver que não foram respeitadas as condições de eficácia consagradas no nº6 do artº2 do Decreto-Lei nº67/2016, ou seja não foram efectuados todos os pagamentos aí previstos, uma vez que o pagamento integral veio a ocorrer já a destempo (após 23.12.2016).

E. Nem se aceita que se possa recorrer a uma interpretação extensiva daquela norma, como pretende a douta sentença, por se considerar a mesma abusiva e contra legem, uma vez que parece decorrer da letra da lei, talqualmente a douta sentença assim o admite, que a lei exige como condição de eficácia a realização de todos os pagamentos au previstos no momento da adesão ao PERES, independentemente da(s) modalidade(s) seleccionada(s), e por conseguinte só está prevista a produção de efeitos de forma global quanto a todas as opções efectuadas pelo devedor, e nunca parcialmente, em relação a algumas delas.

F. Pelo que, não pode ser verificada a condição de eficácia somente no tocante a modalidade de pagamento em prestações, excluindo o cumprimento do pagamento integral a data do termo de adesão, pois que dessa forma estaríamos a beneficiar os devedores que não pretendessem incluir todas as suas dívidas neste regime, já por si favorável aos devedores, não se vislumbrando ter sido o espírito do legislador que fossem pagas umas dívidas em determinada modalidade e outras não.

G. Por outro lado, sendo o pagamento global das modalidades seleccionadas a condição de eficácia da adesão do PERES, e pretendendo a Reclamante beneficiar deste regime, deveria ter salvaguardado essa condição procedendo ao pagamento da dívida respectiva até ao termo do prazo - 23.12.2016, o que como vimos não o fez, uma vez que o mesmo ocorreu em 30.01.2017;

H. ou em alternativa e atendendo a declaração de vontade manifestada pela Reclamante de incluir aquela dívida na modalidade de pagamento em prestações deveria ter procedido coerentemente ao pagamento correspondente a 8% do valor total do plano prestacional até ao termo do prazo, nos termos do artº5, nº1 do diploma supracitado.

I. Deste modo, a douta sentença padece de erro de valoração dos factos que determinou a errada aplicação do direito, entendendo a FP que a presente reclamação deveria ser considerada improcedente, por não ter sido cumprida a condição de eficácia do termo de adesão ao PERES.

J. Assim sendo, e visto que a lei exige, como condição de eficácia de adesão ao PERES o pagamento de todas as dívida, não tendo sido efectuado o pagamento integral daquela dívida nem tampouco o pagamento do valor referente a 8% do valor total das dívidas do plano prestacional, não foi violada a lei.

K. Deste modo, e contrariamente ao decidido na douta sentença, o indeferimento do pedido de retoma do plano prestacional relativo a adesão nº.......... se mostra legal nos termos do Decreto-Lei nº67/2016, pelo que deverá o douto tribunal ad quem determinar a improcedência da reclamação, por estarem cumpridos os requisitos legais impostos pelo artº2, nº6 do Decreto-Lei nº67/2016.

L. Mais se requer, a juncão do duc referente ao pagamento da multa pela entrega do recurso no 1ª dia após o termo do prazo para o efeito.
Termos em que,
deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta
sentença recorrida, com as devidas consequências legais»


*

A Sociedade recorrida, Y........................................, S.A., contra-alegou, concluindo do modo que segue:

«A) Em causa nos presentes autos está a sentença proferida pelo TAF de Loulé que julgou procedente a reclamação deduzida pela Recorrida e determinou a anulação da decisão proferida em 20.07.2017, pelo Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de .........., que indeferiu o pedido de manutenção do plano prestacional, n°.........., relativo a adesão ao Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado e a Segurança Social (adiante apenas “PERES”), aprovado pelo Decreto-Lei n°67/2016, de 3 de Novembro, por vício de violação de lei.

B) Considera a Fazenda Pública que a sentença padece de “(...) erro de julgamento quanto a matéria de facto e de direito, por errada valoração dos elementos constantes dos autos de execução e por errada aplicação da lei - Decreto-Lei n°67/2016”.

C) Contudo, entende a Recorrida que bem andou o Tribunal a quo ao julgar procedente a reclamação apresentada pela Recorrida, não padecendo a sentença sub judice de qualquer vício, pelas razes que infra se enumerará.

D) Em primeiro lugar, no pode a Recorrida deixar de referir que apesar de a Recorrente contestar a matéria de facto dada como provada na sentença ora Recorrida, esta no cumpre o ónus de impugnação imposto pelo nº1 do artigo 640° do Código de Processo Civil,

E) porquanto não especificou quais os factos que a sentença considerou provados e que no deveria ter considerado, e por que razão, nem quais os concretos meios de prova que, no seu entender, impunham uma decisão diversa.

F) não podendo, de acordo com a letra da lei, retirar-se outra consequência senão a imediata rejeição do recurso, o que se alega para todos os efeitos legais.

G) Em segundo lugar, quanto ao alegado erro na aplicação do Direito alegado pela Fazenda Pública, considera a Recorrida que não assiste qualquer razão à Fazenda Pública, porquanto o Tribunal, com vista a análise da (i)legalidade da decisão de indeferimento da manutenção do PERES, procedeu à interpretação do regime do PERES, aprovado pelo Decreto-Lei nº67/2016, de 3 de Novembro,

H) tendo considerado, e bem, que, atenta a contradição do disposto no n°2 do artigo 6° do PERES - segundo a qual é condição de eficácia do PERES o pagamento, ate 23.12.2016, das dívidas relativamente às quais se optou pelo pagamento integral e de 8% das dívidas relativamente às quais se optou pelo pagamento em prestações com o seu preâmbulo -segundo a qual o regime foi criado para facilitar pagamentos, evitar situações de insolvência -, que

I) “(...) face a teleologia do regime (facilitar os pagamentos para evitar situações de insolvência), ao modo como foram previstas as diversas opções disponibilizadas ao devedor, sem esquecer o carácter inovador que o legislador marcadamente pretendeu de privilegiar o pagamento em prestações, há que concluir que o legislador disse menos do que pretendia”.

J) Concluiu, assim, o Tribunal a quo que a norma “(...) há-de ser lida no pretendido sentido de facilitar os pagamentos dos devedores para evitar situações de insolvência e beneficiar o inovador pagamento em prestações (...)“.

K) Considera a Recorrida que a interpretação extensiva da norma efectuada pelo Tribunal, não merece qualquer censura, na medida em que, de facto, decorre expressamente do preâmbulo do diploma a ratio legis que lhe está subjacente,

L) a qual vai em sentido diverso da condição de eficácia prevista no n°6, do artigo 2° do diploma,

M) não fazendo, por este motivo, qualquer sentido que a lei que pretende a viabilidade económica das empresas, trazendo a inovação da modalidade de pagamento em prestações das dívidas pendentes, seja a mesma que preveja a impossibilidade de beneficiar do regime caso não seja efectuado o pagamento da dívida em que se optou pelo pagamento integral, mesmo tendo cumprido com o pagamento de 8% da dívida que se optou pelas prestações,

N) inviabilizando, assim, a situação económica dos sujeitos passivos.

O) A segunda razão pela qual o Tribunal a quo considerou a decisão reclamada ilegal, prende­ se com a conduta revelada pela AT durante o processo,

P) tendo sido considerado que a AT "(...) deveria ter interpretado a declaração de adesão de acordo com a vontade real da declarante", o que não fez, sobretudo tendo a Recorrida manifestado, por diversas vezes, que a sua vontade era diversa da que constava do termo de adesão e,

Q) pelo facto de inexistir no "(...) no Decreto-Lei n.º 67/2016 qualquer norma que faça depender a alteração da declaração de adesão da anulação de um pagamento previamente efectuado, como foi sustentado pela Administração, porventura com base em constrangimentos informáticos, que não legais".

R) No presente caso, considerando todos os factos dados como provados - analisando o conteúdo das informações prestadas pela AT, o tempo e a diligência com que as informações foram prestadas (21.12.2016, data do pedido de inclusão da dívida de IRC no cômputo das dívidas para pagamento em prestações e 21.07.201 7 data da decisão de indeferimento) -,

S) é claro que a AT não adoptou, ao longo do procedimento tributário, um comportamento de colaboração e boa-fé,

T) diferente do comportamento evidenciado pela Recorrida, que foi no exacto sentido da colaboração com a AT e da resolução do problema.

U) Reitere-se, a este respeito, que o princípio da boa-fé, na sua vertente de tutela da confiança, visa salvaguardar os sujeitos jurídicos contra actuações injustificadamente imprevisíveis daqueles com quem se relacionem,

V) sendo que este princípio claramente não foi observado pela AT, na medida em que a decisão proferida foi, em tudo, injustificada, não sendo de acolher, tal como não acolheu o Tribunal a quo.

W) Assim, por não atender à vontade real manifestada pela Recorrida e por ter oferecido uma solução que não tinha qualquer base legal, andou bem a Sentença ao julgar que a decisão reclamada padece de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos, devendo ser removida da ordem jurídica.

Nestes termos e nos mais de Direito, e porque a douta sentença bem decidiu, deve a mesma ser mantida e o recurso apresentado pela Fazenda Pública considerado improcedente.»


*

O Ministério Público, junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso (cfr. fls. 155/161 dos autos).

*

Com dispensa de vistos dado o carácter urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1. De Facto

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:


«1.

Em 30 de Novembro de 2016, Y…………............................, SA, submeteu, através do Portal das Finanças, o Termo de Adesão ao Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado (PERES) que recebeu o nº.......... – cfr. fls. 33-35 dos autos.

2.

Nesse Termo de Adesão, Y........................................, SA:
a) Declarou optar pela modalidade de pagamento em prestações nos Processos de Execução Fiscal nº.....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/010……, .....-2016/010……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01……, .....-2016/01…… e .....-2016/01……;

b) Declarou optar pela modalidade de pagamento integral quanto ao IRC relativo à nota de cobrança nº............................., no valor de € 24.182,74 acrescido de juros compensatórios e moratórios – cfr. fls. 33-34 dos autos.


3.

Em 19 de Dezembro de 2016, Y........................................, SA, efectuou o pagamento de € 84.990,36, relativos a 8% da quantia exequenda nos processos de execução fiscal identificados na alínea a) do ponto anterior – cfr. fls. 36 dos autos e 3 do apenso.

4.

No dia 21 de Dezembro de 2016, Y........................................, SA, enviou ao Chefe do Serviço de Finanças de .......... o email de fls. 37 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
“(…) vem expor e requerer o seguinte:
1– Em 30.11.2016, a Requerente procedeu à adesão ao PERES, pretendendo a modalidade de pagamento prestacional de todas as suas dívidas perante a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT”);
2– Não obstante, por lapso, indicou erradamente que pretendia efectuar o pagamento integral da dívida relativa a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“IRC”), no valor de € 24.182,74, a que corresponde a nota de cobrança identificada com o n.º .....201601……,
3– quando, na verdade, era sua intenção seleccionar o pagamento em prestações, tal como o fez com as restantes dívidas tributárias.
4– Nestes termos, vem a Requerente solicitar a V. Exa. a correcção do lapso, integrando a dívida de IRC no cômputo das restantes dívidas em que optou pelo pagamento em prestações, mediante, naturalmente, o pagamento imediato de 8% desta dívida de IRC, pelo que solicita desde já a emissão da guia respectiva.”

5.

No mesmo dia, o Chefe do Serviço de Finanças de .......... reenviou aquele email para a Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de ..............., “Para apreciação tida por conveniente” cfr. fls. 9 do apenso.

6.

Em 22 de Dezembro de 2016, a Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de ............... informou, por email, o Chefe do Serviço de Finanças de ............... que “Em resposta ao requerido, informa-se que para o [Termo de Adesão] TA.......... – sp ..............., em 2016-12-19, foi efectuado um pagamento de € 84.990,36 no âmbito do PERES. A anulação dos TAs só é possível caso não haja pagamentos associados. Assim, após anulação do pagamento, se for caso disso, deve ser de novo solicitada a anulação do TA em causa.” cfr. fls. 8 do apenso.

7.

No dia 22 de Dezembro de 2016, o Serviço de Finanças de …........... deu conhecimento daquela informação, por via telefónica, a Y........................................, SA – cfr. fls. 30 dos autos e 11 e 33v do apenso.

8.

No dia 17 de Janeiro de 2017, Y........................................, SA, enviou ao Chefe do Serviço de Finanças de …............ o email de fls. 11 do apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
“(…)
10– Nestes termos, vem a Requerente solicitar a V. Exa. que a dívida de IRC seja integrada no cômputo das restantes dívidas em que optou pelo pagamento em prestações, no âmbito deste regime excepcional de regularização, o que poderá ser feito por correcção do valor efectivamente devido na sequência do deferimento parcial da Reclamação Graciosa.
11– Não sendo, de todo, possível atender a tal pedido, desde já se requer a V. Exa. se digne ordenar a emissão do DUC para pagamento da dívida de IRC, de modo a que não seja colocado em causa o plano de pagamento em prestações efectuado no âmbito do PERES, situação que colocaria a empresa numa situação de fraca solvabilidade, o que comprometeria o desenvolvimento da sua actividade e o cumprimento das suas obrigações, designadamente fiscais.”

9.

Em 26 de Janeiro de 2017, Y…………............................, SA, efectuou o pagamento de € 7.082,53, relativos à prestação nº13, a primeira após o pagamento inicial dos 8% iniciais – cfr. fls. 40 e 94 dos autos.


10.

No dia 30 de Janeiro de 2017, Y........................................, SA, efectuou o pagamento de € 24.182,74, relativos ao IRC do exercício de 2015 (acerto de contas n.º 2016................) – cfr. fls. 41 dos autos.

11.

Em 7 de Fevereiro de 2017, a Administração Tributária fez cessar os efeitos do Termo de Adesão ao Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado n.º.......... – cfr. informação a fls. 93v dos autos.

12.

No dia 8 de Fevereiro de 2017, Y........................................, SA, dirigiu ao Chefe do Serviço de Finanças de …............ o requerimento de fls. 33 -34 do apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
“(…)
9– Em face da inviabilidade de tais soluções, na ausência de resposta ao seu requerimento e de forma a regularizar a sua situação, a Requerente procedeu ao pagamento da totalidade da dívida de IRC, no valor de € 24.182,74, em 30.01.2017.
10– Em 26.01.2017, a Requerente procedeu ao pagamento da prestação de Janeiro, no âmbito do PERES, no valor de € 7.082,53.
11– Por consulta ao Portal da AT, em 07.02.2017, a Requerente tomou conhecimento de que os processos de execução fiscal que estavam em pagamento em prestações no âmbito do PERES, e, portanto, suspensos, estariam agora activos,
12– pelo que, não tendo recebido qualquer resposta ao seu requerimento, vem pelo presente, solicitar esclarecimentos quanto ao sucedido, acreditando tratar-se de um lapso.”


13.

Em 27 de Fevereiro de 2017, Y........................................, SA, requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de …............ a emissão e o envio da guia para pagamento da prestação do PERES relativa a Fevereiro de 2017 – cfr. fls. 43 do apenso.

14.

No dia 31 de Março de 2017, Y........................................, SA, requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de …............ a manutenção do pagamento da dívida no âmbito do PERES e indicação relativa a “se deve ser efectuado um pagamento por conta, no montante da prestação estabelecida no plano de regularização, durante o corrente mês” – cfr. fls. 48-49 do apenso.

15.

Em Maio de 2017, Y........................................, SA, voltou a requerer ao Chefe do Serviço de Finanças de ……......... a manutenção do pagamento da dívida no âmbito do PERES e indicação relativa a “se devem ser efectuados pagamentos por conta, no montante da prestação estabelecida no plano de regularização, relativamente aos meses em falta” – cfr. fls. 51-52 do apenso.

16.

No dia 20 de Julho de 2017, o Chefe do Serviço de Finanças de ……......... proferiu o despacho de fls. 64-65 do apenso (acto reclamado), que aqui se dá por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
“(…)
Concluindo:
-A requerente aderiu e registou o respectivo termo de adesão no Portal das Finanças em 30/11/2016;
-No âmbito do mesmo seleccionou os processos de execução fiscal que pretendia pagar em prestações e seleccionou a opção de pagamento integral para a nota de cobrança de IRC em dívida, no montante de € 21.182,74;
-Em 19/12/2016, efectuou o pagamento de € 84.990,35, correspondente a 8% do plano prestacional, conforme termo de adesão;
-Relativamente à dívida proveniente de IRC, não efectuou o pagamento, tendo requerido a sua integração no plano prestacional, que ora se aprecia.
Ora,
1– O plano de adesão é único e a opção exercida não pode ser alterada, excepto, no sentido do pagamento integral, conforme previsto no art.5.º, nº2;
2– Os termos e prazos previstos no referido decreto-lei são peremptórios;
3– O deferimento é automático, não dependendo de despacho de qualquer órgão da AT;
4– A adesão só produz efeitos mediante os pagamentos efectuados no prazo previsto na lei.
Por isso, atendendo a que a Requerente, tendo aderido para pagamento integral, não realizou, no prazo previsto na lei, o pagamento do IRC, no montante de € 21.182,74, incumpriu e tornou ineficaz o plano de pagamentos, conforme previsto no n.º 6 do artigo 2.º do DL 67/2016, que voluntariamente apresentou.
Assim sendo, indefiro o pedido apresentado no sentido de retomar o plano prestacional interrompido. (…)”.»

Consta da mesma sentença a título de «FACTOS NÃO PROVADOS» que «Não se provou que:
A.
Y........................................, SA, não tivesse como concluir a adesão ao Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado (PERES) sem optar, relativamente à dívida de IRC, pela modalidade de pagamento integral, por impedimento do sistema informático da Administração Tributária.»

Evidencia-se ainda na sentença recorrida sob a epígrafe «FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO» que «Os documentos referidos não foram impugnados pelas partes e não há indícios que ponham em causa a sua genuinidade.
O facto A, alegado no artigo 7.º da Petição Inicial, foi dado por não provado por o Tribunal, ao contrário da Reclamante – cfr. o artigo 9.º do seu articulado inicial -, não conseguir extrair tal facto da decisão ora em crise. Com efeito, quando aí se diz que a dívida de IRC “ainda não se encontrava em cobrança coerciva, motivo pelo qual não era possível simular a sua inclusão em regime prestacional antes da instauração do PEF”, nenhuma referência é feita à impossibilidade de optar pelo regime de pagamento em prestações, mas, apenas, quanto à impossibilidade de simular a sua inclusão no regime prestacional e, consequentemente, de aferir do seu impacto no montante das prestações devidas.
Acresce que, no ponto, tal tese só agora, em sede contenciosa, foi suscitada pela Reclamante que, anteriormente, perante a Administração, sempre alegou ter sido por lapso seu – cfr. ponto 4 do probatório - a opção pelo regime de pagamento integral.»
*
II.2. De Direito


Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (art. 639º do C.P.C) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.

De outro modo, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, as questões que cumpre apreciar e decidir são as de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento quanto a matéria de facto e de direito, por errada valoração dos elementos constantes dos autos de execução e por errada aplicação da Lei - Decreto-Lei nº 67/2016.

Vejamos.

Vem a recorrente invocar erro de julgamento da matéria de facto (conclusão B).

No entanto, não especifica quais os factos que a sentença considerou provados e que não deveria ter considerado, e por que razão, nem quais os concretos meios de prova que, no seu entender, impunham uma decisão diversa, não cumprindo, assim, o ónus de impugnação imposto pelo nº1 do artigo 640° do Código de Processo Civil.

Deste modo, quanto a este fundamento, outra consequência não se poderá retirar senão a imediata rejeição do recurso.

Vem, igualmente, a recorrente invocar erro de julgamento da matéria de direito, por errada aplicação da Lei - Decreto-Lei nº 67/2016.

Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida julgou procedente a presente Reclamação, e anulou a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de ……........., de 20 de Julho de 2017, que indeferiu o pedido de retoma do plano prestacional relativo à adesão n.º .........., por ter considerado que a decisão reclamada, que não atendeu à vontade real da declarante, padece do vício de violação de lei, por erro nos pressupostos, pelo que deve ser removida da ordem jurídica.

A recorrente Fazenda Pública não pode concordar com tal entendimento [conclusões D. a K.], porquanto resulta da matéria de facto assente, que somente em 30.01.2017 é que a Reclamante procedeu ao pagamento integral de €24.182,74 relativo ao IRC do exercício de 2015, e como tal, é bom de ver que não foram respeitadas as condições de eficácia consagradas no nº6 do artº2 do Decreto-Lei nº67/2016, ou seja não foram efectuados todos os pagamentos aí previstos, uma vez que o pagamento integral veio a ocorrer já a destempo (após 23.12.2016). Nem se aceita que se possa recorrer a uma interpretação extensiva daquela norma, como pretende a douta sentença, por se considerar a mesma abusiva e contra legem, uma vez que parece decorrer da letra da lei, talqualmente a douta sentença assim o admite, que a lei exige como condição de eficácia a realização de todos os pagamentos au previstos no momento da adesão ao PERES, independentemente da(s) modalidade(s) seleccionada(s), e por conseguinte só está prevista a produção de efeitos de forma global quanto a todas as opções efectuadas pelo devedor, e nunca parcialmente, em relação a algumas delas. Pelo que, não pode ser verificada a condição de eficácia somente no tocante a modalidade de pagamento em prestações, excluindo o cumprimento do pagamento integral a data do termo de adesão, pois que dessa forma estaríamos a beneficiar os devedores que não pretendessem incluir todas as suas dívidas neste regime, já por si favorável aos devedores, não se vislumbrando ter sido o espírito do legislador que fossem pagas umas dívidas em determinada modalidade e outras não. Por outro lado, sendo o pagamento global das modalidades seleccionadas a condição de eficácia da adesão do PERES, e pretendendo a Reclamante beneficiar deste regime, deveria ter salvaguardado essa condição procedendo ao pagamento da dívida respectiva até ao termo do prazo - 23.12.2016, o que como vimos não o fez, uma vez que o mesmo ocorreu em 30.01.2017; ou em alternativa e atendendo a declaração de vontade manifestada pela Reclamante de incluir aquela dívida na modalidade de pagamento em prestações deveria ter procedido coerentemente ao pagamento correspondente a 8% do valor total do plano prestacional até ao termo do prazo, nos termos do artº5, nº1 do diploma supracitado. Deste modo, a douta sentença padece de erro de valoração dos factos que determinou a errada aplicação do direito, entendendo a FP que a presente reclamação deveria ser considerada improcedente, por não ter sido cumprida a condição de eficácia do termo de adesão ao PERES. Assim sendo, e visto que a lei exige, como condição de eficácia de adesão ao PERES o pagamento de todas as dívida, não tendo sido efectuado o pagamento integral daquela dívida nem tampouco o pagamento do valor referente a 8% do valor total das dívidas do plano prestacional, não foi violada a lei. Deste modo, e contrariamente ao decidido na douta sentença, o indeferimento do pedido de retoma do plano prestacional relativo a adesão nº.......... se mostra legal nos termos do Decreto-Lei nº67/2016, pelo que deverá o douto tribunal ad quem determinar a improcedência da reclamação, por estarem cumpridos os requisitos legais impostos pelo artº2, nº6 do Decreto-Lei nº67/2016.


Está em causa o Decreto-Lei nº 67/2016, de 3 de Novembro, que aprova o programa especial de redução do endividamento ao Estado, e em cujo preâmbulo se pode ler que «é criado um regime especial de redução do endividamento ao Estado que visa apoiar as famílias e criar condições para a viabilização económica das empresas que se encontrem em situação de incumprimento, prevenindo situações evitáveis de insolvência de empresas com a inerente perda de valor para a economia, designadamente com a destruição de postos de trabalho.

Este regime distingue-se de forma significativa de outros regimes de regularização extraordinária adotados nos últimos anos, em aspetos fundamentais: por não exigir o pagamento integral imediato das dívidas, está orientado para contribuintes que pretendem regularizar a sua situação, ainda que possam não dispor da capacidade financeira para solver de uma só vez as suas dívidas; por se dirigir apenas às dívidas já conhecidas da AT e da Segurança Social e não ter qualquer diminuição das sanções penais, não permite o branqueamento de situações de fraude ou evasão.

Deste modo, através do presente decreto-lei, o Governo define um novo quadro especial para a regularização das dívidas ao Estado, permitindo o pagamento voluntário de dívidas fiscais e contributivas, de forma integral ou através de um plano prestacional, com dispensa ou redução do pagamento de juros e outros encargos associados à dívida.» (cfr. elemento histórico de interpretação – art. 9º, nº 1, do C.Civil).


Vejamos, pois, se o indeferimento do pedido de retoma do plano prestacional relativo a adesão nº.......... se mostra legal nos termos do Decreto-Lei nº67/2016, por estarem cumpridos os requisitos legais impostos pelo artº2, nº6 do Decreto-Lei nº67/2016.

Entende a Fazenda Pública que resulta da matéria de facto assente, que somente em 30.01.2017 é que a Reclamante procedeu ao pagamento integral de €24.182,74 relativo ao IRC do exercício de 2015, e como tal, é bom de ver que não foram respeitadas as condições de eficácia consagradas no nº6 do artº2 do Decreto-Lei nº67/2016, ou seja não foram efectuados todos os pagamentos aí previstos, uma vez que o pagamento integral veio a ocorrer já a destempo (após 23.12.2016).

Corresponde à verdade (cfr. ponto nº 10 do probatório) que no dia 30 de Janeiro de 2017, Y......................................., SA, efectuou o pagamento de € 24.182,74, relativos ao IRC do exercício de 2015 (acerto de contas n.º 2016................).

Só que esse facto não pode ser visto isoladamente sem se ter em conta os restantes factos provados. Um procedimento é, em princípio, um conjunto sequencial de acções.

O art. 2º do do Decreto-Lei nº67/2016, dispõe o seguinte:
«Artigo 2.º

Procedimentos

1 - A adesão dos contribuintes a este regime é feita por via eletrónica, no portal da Autoridade Tributária e Aduaneira e na Segurança Social Direta, consoante a entidade responsável pela cobrança das dívidas ou em ambos, até ao dia 20 de dezembro de 2016.

2 - No ato de adesão é exercida a opção pelo pagamento integral ou pelo pagamento em prestações em determinado prazo nos seguintes termos:

a) Nas dívidas de natureza fiscal, a opção é exercida separadamente em relação a cada uma das dívidas;

b) Nas dívidas à segurança social, a opção é exercida em relação à totalidade da dívida.

3 - As dívidas em processo de execução fiscal em relação às quais seja exercida a opção pelo pagamento em prestações são cumuladas num mesmo plano prestacional.

4 - A opção pelo pagamento integral ou em prestações pode ser exercida em relação a dívidas previamente liquidadas, mas que ainda não se encontrem em execução fiscal, sendo instaurado o processo executivo respetivo e cumuladas com as restantes dívidas num mesmo plano prestacional, quando aplicável.

5 - Em relação às dívidas que estejam a ser pagas em prestações ao abrigo de outro regime, o contribuinte poderá optar pela sua inclusão neste regime, nos termos dos números anteriores.

6 - Sem prejuízo do disposto no n.º 1, a adesão apenas produz efeitos se verificadas as seguintes condições:

a) Incluírem, de entre as dívidas a que se referem os artigos 3.º e 6.º, todas as dívidas abrangidas pelo mesmo artigo, podendo ser excluídas dívidas cuja execução esteja legalmente suspensa;

b) No caso das dívidas fiscais, serem pontualmente efetuados, até ao dia 20 de dezembro de 2016, todos os pagamentos integrais e todos os pagamentos das prestações iniciais previstos na adesão, independentemente de qualquer regime legal de suspensão da execução das dívidas;

c) No caso das dívidas à segurança social, serem pontualmente efetuados, até ao dia 30 de dezembro de 2016, todos os pagamentos previstos na adesão, independentemente de qualquer regime legal de suspensão da execução das dívidas.»


Feito o enquadramento legal vejamos os factos.


Em 30 de Novembro de 2016, Y........................................, SA, submeteu, através do Portal das Finanças, o Termo de Adesão ao Programa Especial de Redução do Endividamento ao Estado (PERES) que recebeu o nº.......... – cfr. nº 1 do probatório.

Conforme nº 2 do probatório, nesse Termo de Adesão, Y........................................, SA:

a) Declarou optar pela modalidade de pagamento em prestações em determinados Processos de Execução Fiscal

b) Declarou optar pela modalidade de pagamento integral quanto ao IRC relativo à nota de cobrança nº............................., no valor de € 24.182,74 acrescido de juros compensatórios e moratórios – cfr. fls. 33-34 dos autos.

Em 19 de Dezembro de 2016, Y........................................, SA, efectuou o pagamento de € 84.990,36, relativos a 8% da quantia exequenda nos processos de execução fiscal identificados na alínea a) do ponto 2 do probatório, cfr. nº 3 do probatório.

No dia 21 de Dezembro de 2016, Y........................................, SA, enviou ao Chefe do Serviço de Finanças de ……......... o email de fls. 37 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
“(…) vem expor e requerer o seguinte:
1– Em 30.11.2016, a Requerente procedeu à adesão ao PERES, pretendendo a modalidade de pagamento prestacional de todas as suas dívidas perante a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT”);
2– Não obstante, por lapso, indicou erradamente que pretendia efectuar o pagamento integral da dívida relativa a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“IRC”), no valor de € 24.182,74, a que corresponde a nota de cobrança identificada com o n.º .....201601........,
3– quando, na verdade, era sua intenção seleccionar o pagamento em prestações, tal como o fez com as restantes dívidas tributárias.
4– Nestes termos, vem a Requerente solicitar a V. Exa. a correcção do lapso, integrando a dívida de IRC no cômputo das restantes dívidas em que optou pelo pagamento em prestações, mediante, naturalmente, o pagamento imediato de 8% desta dívida de IRC, pelo que solicita desde já a emissão da guia respectiva.”
Aqui chegados, importa referir que o reclamante/recorrido ainda dentro do prazo de adesão ao programa, em 21/12/2016 (o prazo de adesão e pagamentos foi prorrogado até 23/12/2016 por despacho de 20/12/2016 do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais) enviou email ao Chefe de Finanças de ……......... a indicar que seleccionara, por lapso, o pagamento integral da dívida de IRC, supra referida, quando pretendia seleccionar a modalidade de pagamento em prestações como o fizera para as outras dívidas (o que o sistema informático não permitiu) pelo que pedia a correcção do lapso e a emissão da guia respectiva para pagamento imediato de 8% da dívida de IRC.

Sobre este pedido não recaiu qualquer despacho até ao fim do prazo de adesão ao programa – o dia 23/12/2016 – o prazo que vem, agora, a recorrente Fazenda Pública invocar que não foi respeitado por a recorrida só em 30/01/2017 ter efectuado ter efectuado o pagamento de € 24.182,74, relativo ao IRC de 2015, cfr. nº 10 do probatório.

Em 7 de Fevereiro de 2017 a AT faz cessar os efeitos do Termo de Adesão ao PERES (nº 11 do probatório).


No dia seguinte, 8 de Fevereiro de 2017, a recorrida Y........................................, SA, dirigiu ao Chefe do Serviço de Finanças de ……......... o requerimento de fls. 33 -34 do apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor (nº 12 do probatório):
“(…)
9– Em face da inviabilidade de tais soluções, na ausência de resposta ao seu requerimento e de forma a regularizar a sua situação, a Requerente procedeu ao pagamento da totalidade da dívida de IRC, no valor de € 24.182,74, em 30.01.2017.
10– Em 26.01.2017, a Requerente procedeu ao pagamento da prestação de Janeiro, no âmbito do PERES, no valor de € 7.082,53.
11– Por consulta ao Portal da AT, em 07.02.2017, a Requerente tomou conhecimento de que os processos de execução fiscal que estavam em pagamento em prestações no âmbito do PERES, e, portanto, suspensos, estariam agora activos,
12– pelo que, não tendo recebido qualquer resposta ao seu requerimento, vem pelo presente, solicitar esclarecimentos quanto ao sucedido, acreditando tratar-se de um lapso.”

E em 27/02/2017, requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de ……......... a emissão e o envio da guia para pagamento da prestação do PERES relativa a Fevereiro de 2017 – cfr. fls. 43 do apenso.

Após mais dois requerimentos apresentados pela recorrida, cfr. nºs 14 e 15 do probatório, no dia 20 de Julho de 2017, o Chefe do Serviço de Finanças de ……......... proferiu o despacho de fls. 64-65 do apenso (acto reclamado), que aqui se dá por integralmente reproduzido e que, no que ora interessa, tem o seguinte teor:
“(…)
Concluindo:
-A requerente aderiu e registou o respectivo termo de adesão no Portal das Finanças em 30/11/2016;
-No âmbito do mesmo seleccionou os processos de execução fiscal que pretendia pagar em prestações e seleccionou a opção de pagamento integral para a nota de cobrança de IRC em dívida, no montante de € 21.182,74;
-Em 19/12/2016, efectuou o pagamento de € 84.990,35, correspondente a 8% do plano prestacional, conforme termo de adesão;
-Relativamente à dívida proveniente de IRC, não efectuou o pagamento, tendo requerido a sua integração no plano prestacional, que ora se aprecia.
Ora,
1– O plano de adesão é único e a opção exercida não pode ser alterada, excepto, no sentido do pagamento integral, conforme previsto no art.5.º, nº2;
2– Os termos e prazos previstos no referido decreto-lei são peremptórios;
3– O deferimento é automático, não dependendo de despacho de qualquer órgão da AT;
4– A adesão só produz efeitos mediante os pagamentos efectuados no prazo previsto na lei.
Por isso, atendendo a que a Requerente, tendo aderido para pagamento integral, não realizou, no prazo previsto na lei, o pagamento do IRC, no montante de € 21.182,74, incumpriu e tornou ineficaz o plano de pagamentos, conforme previsto no n.º 6 do artigo 2.º do DL 67/2016, que voluntariamente apresentou.
Assim sendo, indefiro o pedido apresentado no sentido de retomar o plano prestacional interrompido. (…)”.», cfr. nº 16 do probatório.

Verifica-se, assim, que o Chefe do Serviço de Finanças de ……......... indeferiu o pedido de retoma do plano prestacional já interrompido alegando que a recorrida “não realizou, no prazo previsto na lei, o pagamento do IRC, no montante de € 21.182,74, incumpriu e tornou ineficaz o plano de pagamentos, conforme previsto no n.º 6 do artigo 2.º do DL 67/2016, que voluntariamente apresentou.”

Ora, o referido Chefe de Finanças bem sabia - pelo menos desde o dia 21 de Dezembro de 2016, e ainda dentro do prazo de adesão ao programa - que a recorrida só por lapso tinha indicado que pretendia efectuar o pagamento integral da dívida relativa a IRC, no montante de € 21.182,74 e que só não tinha alterado essa opção porque constrangimentos informáticos não lho permitiram.
Ora, conforme disposto no artigo 236º, nº 2 do Código Civil:
“Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.”
E nos termos previstos no art. 59º, nº 3, alínea a) do CPPT:
“Em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes estas podem ser substituídas seja qual for a situação da declaração a substituir, se ainda decorrer o prazo legal da respectiva entrega.”

Se a Administração Tributária houvesse diligenciado, como era seu dever legal, art.º 55.º e 56.º da Lei Geral Tributária, pela correcção do lapso – tanto mais que ainda não tinha terminado o prazo de adesão ao programa -, anulando a adesão incorrecta e permitindo que o contribuinte corrigisse a sua adesão, nos termos pretendidos que eram conformes com a lei, toda a discussão subsequente não teria tido lugar.
O requerimento apresentado pelo recorrido de correcção do lapso de inserção no Programa Peres tem que ser analisado e decidido tendo em conta a situação tributária existente no momento da sua apresentação e não a actual situação que é fruto da não decisão desse requerimento e da não correcção do lapso, como se impunha, argumentando com o que existe e não deveria existir, apenas porque a Administração Tributária não teve a actuação diligente e legal que se impunha, e, usou essa omissão em desfavor do contribuinte praticando actos e desenvolvendo procedimentos que não poderia ter usado se tivesse procedido à correcção desse lapso. (1)
E nem se diga que foi o sistema informático que não possibilitou a correcção requerida.
Conforme Sumário do douto Acórdão que temos vindo a seguir - Acórdão do STA de 31/01/2018, 01462/17, disponível em www.dgsi.pt:
«I - Os sistemas informáticos existem para facilitar os procedimentos com o objectivo de pouparem recursos materiais e humanos quer aos contribuintes, quer à Administração Tributária.
II - Nem sempre são dotados da maleabilidade necessária para serem acedidos por contribuintes menos afoitos nas lides informáticas, a quem se presta uma informação cibernética algo diversa de uma verdadeira comunicação na medida em que se mostre incapaz de levar a mensagem ao seu destinatário, sem ruídos e omissões.
III - Os contribuintes não têm o dever legal de terem específica formação informática para cumprirem as suas obrigações fiscais, e, por mais «friendly» utilização que os sistemas informáticos possam facultar haverá sempre necessidade, aqui e ali, da intervenção humana, nos termos da lei, e, para alcançar a justiça do caso concreto, ultrapassando os desvios de comunicação ou utilização que apareçam neste contacto entre os contribuintes e a Administração Tributária.»


Impõe-se, pois, pelas razões expendidas confirmar a decisão recorrida, embora com fundamentação diversa.

Ficam, assim, prejudicados os restantes fundamentos de recurso.

III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida, embora com fundamentação diversa.

Custas pelo Recorrente.

Registe e Notifique.


Lisboa, 22 de Março de 2018


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[Lurdes Toscano]


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[Joaquim Condesso]


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[Catarina Almeida e Sousa]

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(1) Veja-se sobre a mesma matéria o Acórdão do STA de 31/01/2018, 01462/17.