Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
517/10.9TTLSB.L1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: MÁRIO BELO MORGADO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
ÍNDÍCIOS DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA
CONTRATO DE TRABALHO COM ENTIDADE PÚBLICA
Data do Acordão: 05/21/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO ADMINISTRATIVO - CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / PROVAS - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / CONTRATOS EM ESPECIAL / PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS.
DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
Doutrina:
- Bernardo da Gama Lobo Xavier, Procedimentos laborais na empresa, 2009, pp. 81 e 88.
- Galvão Teles, Contratos Civis, BMJ 83/165.
- Joana Nunes Vicente, A fuga à relação de trabalho (típica): em torno da simulação e da fraude à lei, 116 – 120.
- Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, II, 4ª edição, pp. 25, 36, 39, 40 – 42.
- Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, Almedina, 1994, p. 125.
- Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, Almedina, 16ª edição, pp. 108, 111, 115-116, 123 – 124.
- Pedro Pais de Vasconcelos, Contratos Atípicos, 1995, p. 5 – 6.
- Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, 6ª edição, pp. 272, 302 – 304.
- Rui Assis, O Poder de direção do empregador, p. 44 e 176-177.
- Vaz Serra, RLJ 112/203.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 342.º, N.º1, 1152.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 608.º, N.º 2, 635.º, 639.º, N.º 1, 655.º, 679º.
CÓDIGO DE TRABALHO (CT) / 2003: - ARTIGOS 10.º, 12.º.
LEI N.º 23/2004, DE 22 DE JULHO: - ARTIGOS 5.º, 7.º.
LEI N.º 41/2013, DE 26-6: - ARTIGO 5.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 17/02/1994, PROC. 003820; DE 02-03-2011, PROCESSO N.º 146/08.7TTABT.E1.S1; DE 04-05-2011, PROCESSO N.º 3304/06.5TTLSB.S1; DE 22/9/11, PROCESSO N.º 192/07.8TTLSB.L1.S1; DE 12-09-2012, PROCESSO N.º 247/10.4TTVIS.C1.S1; E DE 05-03-2013, PROCESSO N.º 3247/06.2TTLSB.L1.S1;
-DE 22-09-2011, PROCESSO N.º 192/07.8TTLSB.L1.S1, E DE 14-04-2010, PROCESSO N.º 1348/05.3TTLSB.S1.
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ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:
-DE 12-07-2012, PROCESSO N.º 441/10.5TTLSB.L1 – 4.ª SECÇÃO; DE 9/11/2011, PROCESSO N.º 308/09.0TTPDL.L1-4.
Sumário :
I - O contrato de trabalho reconduz-se a três elementos essenciais: (i) atividade (manual ou intelectual); (ii) retribuição, e (iii) subordinação jurídica, assentando a distinção entre ele e outras figuras próximas, como o contrato de prestação de serviço, em dois elementos essenciais: no objeto do contrato (prestação de atividade remunerada, vs. obtenção de um resultado); e, determinantemente, no tipo de relacionamento entre as partes (subordinação jurídica vs. Autonomia).

II - Nos casos duvidosos, há que lançar mão de uma abordagem indiciária (de cariz tipológico e analógico), baseada em todos os elementos e circunstâncias do caso, tendo em vista: (i) aferir do grau de aproximação do caso concreto do paradigma contratual; (ii) em função de critérios de razoabilidade e adequada exigência, determinar se a proximidade existente é suficiente para reconduzir a imagem global do caso concreto, em toda a sua complexidade, ao tipo normativo.

III - Os índices de qualificação mais significativos e utilizados são: (i) vontade real das partes quanto ao tipo contratual; (ii) objeto do contrato (prevalência da atividade ou do resultado; grau de (in)determinação da prestação; grau de disponibilidade do trabalhador e repartição do risco); (iii) momento organizatório da prestação (pessoalidade da prestação; exclusividade e grau de dependência económica; tipo de remuneração; local de trabalho e titularidade dos instrumentos de trabalho; tempo de trabalho e de férias; grau de inserção na estrutura organizativa da contraparte; (iv) indícios externos (regime fiscal e de segurança social; sindicalização).

IV - A subordinação jurídica encontra a sua génese: (i) na posição de desigualdade/dependência do trabalhador que é inerente à sua inserção numa estrutura organizacional alheia, dotada de regras de funcionamento própria; (ii) na correspondente posição de domínio do empregador, traduzida na titularidade do poder de direção e do poder disciplinar.

V - Nem sempre estando presentes alguns dos seus traços tradicionais e mais característicos, a subordinação deve perspetivar-se enquanto conceito de “geometria variável”, que comporta graus de intensidade diversos, em função, nomeadamente, da natureza da atividade e/ou da confiança que o empregador deposita no trabalhador, assumindo natureza jurídica e não técnica, no sentido em que é compatível com a autonomia técnica e deontológica e se articula com as aptidões profissionais específicas do próprio trabalhador e com a autonomia inerente à especificidade técnica da atividade, sendo, deste modo, consentânea com atividades profissionais altamente especializadas ou que tenham uma forte componente académica ou artística, tal como pode ser meramente potencial, bastando a possibilidade de exercício dos inerentes poderes pelo empregador.

VI - É de qualificar como laboral o vínculo contratual que uniu A. e R., estando demonstrado, nomeadamente, o seguinte: inserção do A. na estrutura administrativa, organizativa e hierárquica da R.; fornecimento pelo R. do equipamento e restante material necessário para o desempenho da atividade do A., que tinha lugar num edifício militar daquele; o A. recebia uma contrapartida pecuniária certa, paga mensalmente; cumpria um horário de trabalho e gozava anualmente férias; exerceu funções para o R. continuada, permanente e duradouramente, durante cerca de três anos e seis meses; nada nos factos provados sugere que a assunção do risco pela eventual inverificação dos objetivos profissionais do A. tivesse regime diferente daquele que se verifica no âmbito das relações existentes entre o Estado e os seus funcionários.
Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

I.

1. AA intentou contra o Estado Português a presente ação de processo comum, pedindo:

- A declaração da existência de um contrato de trabalho entre o A. e o R. e da  ilicitude do seu despedimento por parte deste;

- A condenação do R. no pagamento dos subsídios de férias e de Natal, relativos aos anos de 2006 a 2009;

- A condenação do R. no pagamento de indemnização substitutiva da reintegração, bem como em todas as retribuições que o A. deixou de auferir, desde a data do despedimento e até à data do trânsito em julgado da decisão judicial;

- A condenação do R. no pagamento de juros de mora, vencidos e vincendos,  até à data do trânsito em julgado da decisão.

2. Alega, em síntese, que foi admitido ao serviço do R. em 06.03.2006, mediante a celebração de um acordo escrito intitulado “Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Avença”, posteriormente renovado, para o desempenho de funções de consultadoria e gestão de projetos na Central de Compras da Secretaria-Geral do Ministério da Defesa Nacional, contrato a que o R. pôs termo em 30.09.2009.

3. O R. contestou e, reconvencionalmente, peticionou a condenação do A. a restituir-‑lhe as importâncias recebidas a título de IVA, no montante de € 15.593,96, no caso da ação proceder.

4. O A. respondeu.

5. Julgada parcialmente procedente a ação, foi decidido:

a) - Declarar ter existido um contrato de trabalho nulo entre A. e R., no período compreendido entre 06.03.2006 e 30.09.2009;

b) - Declarar ter o A. sido ilicitamente despedido pelo R. e, em consequência, condenar este a pagar àquele: a quantia global de € 29.150,86; juros de mora, à taxa legal, desde a data do respetivo vencimento e até integral pagamento.

c) – Absolver o R. do mais peticionado;

d) – Absolver o A. do pedido reconvencional.

6. Do assim decidido, apelaram o R. (sustentando, no que ora releva, nunca ter existido uma relação jurídico-laboral entre as partes) e, subordinadamente, o A. (sustentando que a nulidade do contrato, declarada na 1.ª instância, opera a partir da data da notificação da sentença, e não da data da notificação da contestação, e, por outro lado que tem direito às prestações relativas ao subsídio de refeição), tendo o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), decidido:


- Julgar totalmente procedente o recurso interposto pelo Réu, revogando a decisão recorrida;

- Julgar prejudicado o conhecimento do recurso subordinado interposto pelo Autor.

7. Deste acórdão, interpôs recurso de revista o A., sustentando, essencialmente, nas conclusões da sua alegação: (i) que deve reconhecer-se ter sido celebrado um contrato de trabalho entre as partes, mantendo-se, assim, a condenação do R. já sentenciada na 1.ª instância; (ii) para além disso, deverá conhecer-se do recurso subordinado (tido por prejudicado no TLR), acolhendo-se as pretensões do recorrente constantes do mesmo.

8. Contra-alegou a parte contrária, pugnando pela confirmação do julgado.

9. Inexistindo quaisquer outras de que se deva conhecer oficiosamente (art. 608.º, n.º 2, in fine, do CPC[1]), em face das conclusões das alegações de recurso, a única questão a decidir[2] é a de saber se o contrato celebrado entre as partes é um contrato de trabalho (nulo).

Ainda que o recurso do A. proceda quanto a este ponto, está fora do âmbito da competência deste Supremo Tribunal conhecer no presente recurso das questões que o TLR considerou prejudicadas (suscitadas pelo A. no recurso subordinado), uma vez que o art. 679.º, do CPC, exclui do julgamento da revista a “regra da substituição do tribunal recorrido”, consagrada no art. 665.º, do mesmo diploma, relativamente ao julgamento da apelação.

Cumpre decidir.

II.

10. Foi fixada pelas instâncias a seguinte matéria de facto:

1 - O A. foi contratado, em 6 de Março de 2006, pela Secretaria-Geral do Ministério da Defesa Nacional, por intermédio do seu Secretário-Geral, para o desempenho de funções de consultoria e gestão de projetos, em diversas matérias, na Central de Compras do Ministério da Defesa Nacional (CCMDN), com efeitos a partir de 1 de Março de 2006, através de acordo escrito. (1.º da petição inicial)

2 - A CCMDN foi criada pelo Despacho Conjunto n.º 1030/2003, dos Ministérios das Finanças e da Defesa Nacional, publicado na 2.ª série do Diário da República, de 14 de Novembro de 2003, enquanto estrutura de projeto para a prossecução do objectivo fundamental de optimização dos recursos financeiros atribuídos ao Ministério da Defesa Nacional, bem como para a implementação de um novo modelo de aquisição de bens e serviços não militares, que permitisse obter resultados relevantes no decorrer do ano de 2004, em linha com a orientação estratégica para as atividade s de suporte, a qual consistia, essencialmente, na redução de custos sem prejuízo da manutenção da qualidade dos produtos a adquirir. (2.º da petição inicial)

3 - Na dependência do Secretário-Geral do Ministério da Defesa Nacional, foram atribuídas diferentes competências à referida estrutura, destacando-se, nomeadamente:

(i) A promoção da capacidade negocial do Ministério da Defesa Nacional (MDN) junto do mercado, enquanto entidade adquirente ou locadora de bens e serviços militares;

 (ii) A agregação e acompanhamento contínuo das necessidades de consumos militares nos OSC, EMOFA e Ramos das Forças Armadas, projetando o seu planeamento com vista à elaboração das melhores estratégias de aquisição junto do mercado; e

(iii) A determinação do valor do potencial de poupança a obter, através da análise de aquisições e locações de maior relevância em termos de volume e custo. (3.º da petição inicial)

4 - A estrutura seria composta por:

       a) um diretor e um diretor-adjunto;

b) uma equipa com o máximo de sete elementos de perfis   diversificados, integrando, pelo menos, três representantes do ramo das forças armadas. (4.º da petição inicial)

5 - Seria ainda possível, precedendo de demonstração da sua imprescindibilidade, o recurso à celebração de contratos de prestação de serviços, nos termos do Decreto-Lei n.º 41/84, de 03 de Fevereiro. (5.º da petição inicial)

6 - Durante os 24 meses de mandato legalmente previstos no sobredito Despacho, a CCMDN funcionou, cumprindo a globalidade dos objectivos pelos quais foi criada. (6.º da petição inicial)

7 - A CCMDN acabou por ser extinta a 9 de Setembro de 2005, havendo o respetivo Diretor e Subdiretor sido exonerados na mesma data. (7.º da petição inicial)

8 - Na Informação n.º 23.506/05/Dejur (proc. n.º 5/03/DeJur), objeto de Despacho concordante do Secretario de Estado da Defesa Nacional e dos Assuntos do Mar, de 18 de Novembro de 2005, consta que, apesar da “cessação das funções destes dirigentes (...)”, tal não “inviabilizou a prossecução da sua – CCMDN – atuação uma vez que se mantiveram os Gestores de categoria e demais colaboradores, aos quais se encontravam cometidos, desde a sua constituição, o acompanhamento de determinados procedimentos adjudicatórios (...)”.(8.º da petição inicial)

9 - Referindo-se ainda que “(...) os então dirigentes e demais equipa, continuaram, de forma ininterrupta, a desempenhar as funções que lhe estavam cometidas, no âmbito da missão definida”. (9.º da petição inicial)

10 - Foi mantido um grupo de elementos chefiado por um coordenador, com as mesmas competências e missão, por forma a dar continuidade ao processo de centralização da negociação, ao nível da Secretaria-Geral do Ministério da Defesa Nacional, de todas as categorias com dimensão relevante, de bens e serviços não militares. (10.º da petição inicial)

11 - Em 9 de Fevereiro de 2006, o Diretor da CCMDN, através da Informação n.º 3610 (proc. n.º 13/2006) objecto de Despacho concordante do Secretário de Estado da Defesa Nacional e do Ministro da Defesa Nacional, de 10 e 16 de Fevereiro de 2006, respectivamente, considerou essencial proceder à contratação de mais “(...) dois profissionais na área de gestão e de economia, em regime de prestação de serviços, para apoiar a conclusão dos projetos em desenvolvimento e desenvolver novos projetos” (11.º da petição inicial).

12 - Segundo a mesma informação administrativa:

“III. 4. O plano de atividades para a CCMDN proposto para 2006 tinha por objectivo não só continuar a uniformização das aquisições como também gerar poupanças significativas ao nível do Ministério da Defesa Nacional.

5. A Secretaria-Geral, entidade à qual compete, nos termos do n.º 11 do Despacho Conjunto n.º 1030/2003, prestar apoio jurídico, logístico e administrativo ao funcionamento da CC.MDN, não dispõe atualmente de recursos humanos disponíveis com as qualificações necessárias para esta tarefa.

Ainda de acordo com o n.º 9 do mesmo Despacho é possível celebrar contratos de prestação de serviços para colmatar as necessidades em termos de recursos humanos”. (...)

IV. 4) De acordo com a situação exposta, a lacuna atualmente existente verifica-se de forma acentuada ao nível de analistas que apoiam os Gestores de Categoria, quer na recolha e tratamento dos dados, quer no acompanhamento permanente dos bens e serviços contratados e ou protocolos, para todas as UEO.

5) O preenchimento desta lacuna implica um reforço dos meios humanos, o qual deverá obedecer ao princípio da economia de meios, procurando a melhor das adequações possível entre as competências que é necessário preencher e o concreto perfil das pessoas a afectar ao apoio de cada projeto; (...)

V. CONCLUSÃO

1. Após uma análise do âmbito dos trabalhos em curso na Central de Compras, bem como as suas carências em termos de Recursos Humanos, entende-se que é absolutamente fundamental preencher o seguinte leque de competências/funções:

a. Apoiar os Gestores de Categoria no desenvolvimento de novos projetos de modelo de negócio para diferentes categorias de equipamentos, produtos e serviços.

b. Monitorizar o mercado, recolhendo informação e desenvolvendo rede de contactos com fornecedores;

c. Prestar suporte analítico à negociação dos contratos, preparando as análises e recolhendo a informação necessária.

d. Preparar relatórios periódicos de indicadores chave, internos e de mercado.

e. Assistir na preparação de caderno de encargos.” (12.º da petição inicial)

13 - O Secretário-Geral do Ministério da Defesa Nacional solicitou que fosse dado seguimento à contratação de dois analistas, um dos quais o A., em face da necessidade em dotar a CCMDN de Recursos Humanos que executassem o conjunto de competência e/ou funções nela vertida. (13.º da petição inicial)

14 - Dispensando-se qualquer procedimento concursal prévio dado, por um lado, a urgência da contratação dos referidos serviços, e, por outro, a natureza dos serviços intelectuais e financeiros, concluiu-se ainda na mesma informação administrativa que:

 “IV. 6. Após realizadas algumas entrevistas a possíveis candidatos, foram identificados dois licenciados na área de gestão e economia, Dr. AA e Dra. BB, respectivamente, com experiência na área de tratamento de dados, análise de mercado e desenvolvimento de projetos.

7. O Dr. CC possui experiência na área de análise de dados de apoio ao desenvolvimento de projetos, negociação de produtos financeiros e 6 anos de experiência profissional, pelo que se enquadra no perfil adequado para prestar apoio a projetos mais complexos”.

(...)

V.2. e) Aos profissionais entrevistados anteriormente (Dr. CC e Dra. BB) são reconhecidas garantias de idoneidade pessoal para a submissão a uma rigorosa disciplina de sigilo profissional e elevada confidencialidade, bem como um perfil merecedor da confiança e competências adequadas às necessidades e aos objectivos que a CC.MDN pretende atingir a curto prazo”. (14.º da petição inicial)

15 - Por Despacho datado de 16 de Fevereiro de 2006, o Ministro de Estado e da Defesa Nacional, precedendo Parecer favorável, autorizou a celebração do contrato proposto. (15.º da petição inicial)

16 - Sendo celebrado entre o A. e a Secretaria-Geral do Ministério da Defesa Nacional um acordo escrito designado “contrato de avença”, pelo período de um ano a contar da respectiva celebração. (16.º da petição inicial)

17 - Nos termos do referido acordo celebrado entre as partes, foi estabelecido que o A. começaria por auferir, à data, uma retribuição mensal ilíquida de € 1.702,09, acrescida de I.V.A. à taxa legal em vigor. (17.º da petição inicial)

18 - Sendo contratada a “consultoria e gestão de projetos“ como atividade  profissional do A., nos termos da qual este prestaria trabalho “com especial incidência nas (...) matérias (de):


(i) Apoiar os Gestores de Categoria no desenvolvimento de novos projetos de modelo de negócio para diferentes categorias de equipamentos, produtos e serviços;
(ii) Monitorizar o mercado, recolhendo informação e desenvolvendo rede de contactos com fornecedores;
(iii)  Prestar suporte analítico à negociação dos contratos, preparando as análises e recolhendo a informação necessária,
(iv)  Preparar relatórios periódicos de indicadores chave, internos e de mercado;
(v)  Assistir na preparação de caderno de encargos; e
(vi)  Acompanhar a evolução dos contratos durante a respectiva vigência”. (18.º da petição inicial)

19 - Correspondendo as suas funções profissionais à categoria de “Analista”, no âmbito da qual lhe incumbia: (i) prestar suporte analítico à negociação dos contratos, preparando as análises e recolhendo a informação necessária, monitorizar o mercado, recolhendo informação e desenvolvendo rede de contactos, preparar relatórios periódicos de indicadores-chave, internos e de mercado (identificando fornecedores), assistir na preparação de cadernos de encargos, apoiar o analista de sistemas na gestão da recolha e qualidade da informação da ferramenta de software, divulgar práticas de excelência encontradas ou desenvolvidas, cumprir e defender as políticas e códigos definidos de ética e responsabilidade profissional. (19.º da petição inicial)

20 - O A. gozou dias de férias, as quais foram sendo gozados ao longo de um período de mais de três anos (21.º da petição inicial)

21 - O A. exercia a sua atividade num gabinete, sito na Avenida ..., n.º .., … Lisboa, sendo-lhe fornecidos pelo R. todos os meios de trabalho e suporte logístico inerente à função desempenhada por parte da R., nomeadamente: um cartão-de-visita, um cartão de acesso institucional com a identificação de “Analista”; um computador pessoal; um e-mail institucional com o domínio do Ministério da Defesa Nacional (CC@defesa.pt); um telefone com número fixo para comunicações exteriores e extensão militar. (23.º e 24.º da petição inicial)

22 - O A. recebia instruções do Engenheiro DD. (25.º da petição inicial)

23 - Havendo sido tacitamente estabelecido entre as partes, a observância pelo A. de um horário, que compreendia o período temporal entre as 10h e as 19h30m, com intervalo de uma hora para almoço. (26.º da petição inicial)

24 - Quando o A. se ausentava, devia previamente comunicar a sua ausência. (27.º da petição inicial)

25- Foi celebrado, no dia 1 de Março de 2007, um novo acordo escrito, designado de contrato de prestação de serviços em regime de avença entre a Secretaria-Geral do Ministério da Defesa Nacional e o A., pelo prazo de 1 (um) ano. (28.º da petição inicial)

26 - Nos termos da Cláusula 1.ª do referido contrato, pretendia-se, uma vez mais, o fornecimento, pelo A. ao R., “de serviços de consultadoria e gestão de projetos, com especial incidência nas seguintes matérias:

(i) Apoiar os Gestores de Categoria no desenvolvimento de novos projetos de modelo de negócio para diferentes categorias de equipamentos, produtos e serviços;

(ii) Monitorizar o mercado, recolhendo informação e desenvolvendo rede de contactos com fornecedores;

(iii) Prestar suporte analítico à negociação dos contratos, preparando as análises e recolhendo a informação necessária,

(iv) Preparar relatórios periódicos de indicadores chave, internos e de mercado;

(v) Assistir na preparação de caderno de encargos; e ainda, adicionalmente,

(vi) Acompanhar a evolução dos contratos durante a respectiva vigência”. (30.º da petição inicial)

27 - As funções exercidas pelo A. eram, uma vez mais, integradas na categoria “Analista”. (34.º da petição inicial)

28 - Passando o A. a auferir uma remuneração global ilíquida no valor de € 1.757,00, acrescido do valor correspondente ao I.V.A. (35.º da petição inicial)

29 - O A. podia gozar férias anuais, exercia a sua atividade nas instalações do R., e recebia instruções do Engenheiro DD. (36.º da petição inicial)

30 - Sendo-lhe fornecidos todos os meios e suporte logístico inerente à função desempenhada por parte da R., nomeadamente: (i) um cartão-de-visita (ii) um cartão de acesso institucional com a identificação de “Analista” (iii); um computador pessoal; (v) um e-mail institucional com o domínio do Ministério da Defesa Nacional (CC@defesa.pt); (vi) um telefone com número fixo para comunicações exteriores e extensão militar. (37.º da petição inicial)

31 - Havendo sido tacitamente estabelecido entre as partes, a observância pelo A. de um horário, que compreendia o período temporal entre as 10h e as 19h30m, com intervalo de uma hora para almoço. (38.º da petição inicial)

32 - Quando o A. se ausentava, devia previamente comunicar a sua ausência. (39.º da petição inicial)

33 - Em 1 de Março de 2008, foi celebrado um novo acordo escrito, designado de contrato de prestação de serviços em regime de avença, pelo período de seis meses. Quando o A. se ausentava, devia previamente comunicar a sua ausência. (40.º da petição inicial)

34 - Nos termos da Cláusula 1.ª do referido “contrato”, pretendia-se, uma vez mais, o fornecimento, pelo A. ao R., “de serviços de consultadoria e gestão de projetos, com especial incidência nas seguintes matérias:

(i) Apoiar os Gestores de Categoria no desenvolvimento de novos projetos de modelo de negócio para diferentes categorias de equipamentos, produtos e serviços;

(ii) Monitorizar o mercado, recolhendo informação e desenvolvendo rede de contactos;

(iii) Preparar relatórios periódicos de indicadores chave, internos e de mercado (identificando fornecedores);

(iv) Assistir na preparação de caderno de encargos;

(v) Acompanhar a evolução dos contratos durante a respectiva vigência”; e ainda, adicionalmente

(vi) “Divulgar práticas de excelência encontradas e desenvolvidas”. (42.º da petição inicial)

35 - As funções do A. corresponderam, novamente, à categoria “Analista”. (46.º da petição inicial)

36 - Passando o A. a auferir uma remuneração global ilíquida no valor de € 1.793,90. (47.º da petição inicial)

37 - O A. podia gozar férias anuais, exercia a sua atividade nas instalações do R., e recebia instruções do Engenheiro DD. (50.º da petição inicial)

38 - Sendo-lhe fornecidos pelo R. todos os meios e suporte logístico inerente à função desempenhada, nomeadamente: (i) um cartão-de-visita (ii) um cartão de acesso institucional com a identificação de “Analista” (iii); um computador pessoal; (v) um e-mail institucional com o domínio do Ministério da Defesa Nacional (CC@defesa.pt); (vi) um telefone com número fixo para comunicações exteriores e extensão militar. (51.º da petição inicial)

39 - Havendo sido tacitamente estabelecido entre as partes, a observância pelo A. de um horário, que compreendia o período temporal entre as 10h e as 19h30m, com intervalo de uma hora para almoço. (52.º da petição inicial)

40 - Quando o A. se ausentava, devia previamente comunicar a sua ausência. (53.º da petição inicial)

41 - A celebração deste e dos restantes “contratos de avença” com os demais gestores, analistas e juristas da CCMDN mereceu, em 16 de Maio de 2008, a autorização excepcional pelo período de 6 meses do Secretário de Estado da Administração Pública, exarado em despacho sob o capeamento do despacho do Ministro da Defesa Nacional. (57.º da petição inicial)

42 - Em relação aos 4 gestores de projeto, é referido que as suas funções “(...) reclamam, incontornavelmente, conhecimentos técnicos, financeiros e jurídicos que, até à data e, por recurso aos instrumentos de recrutamento e mobilidade de pessoal na Administração Pública, não foi possível encontrar” (58.º da petição inicial)

43 - E ainda que “a não renovação faz incorrer em sério risco o bom e regular funcionamento da Central de Compras/MDN.” (61.º da petição inicial)

44 - No Despacho em questão, refere-se ainda “devendo entretanto o MDN e propor – se necessário for – solução alternativa de enquadramento jurídico das presentes prestações de trabalho”. (64.º da petição inicial)

45 - A 16 de Julho de 2009, foi comunicado ao A. que o contrato anteriormente celebrado foi objecto de renovação, ratificada pelo Secretário de Estado da Administração Pública, entre 31 de Agosto de 2008 e 28 de Fevereiro de 2009, e entre 01 de Março de 2009 e 30 de Setembro de 2009. (70.º da petição inicial)

46 - Por carta registada com aviso de recepção, datada de 02 de Julho de 2009, com o assunto “Contrato de Prestação de Serviços celebrado entre a Secretaria-Geral do Ministério da Defesa Nacional e AA, em 01 de Março de 2008 ”, foi comunicado ao A. que “(...) para os efeitos tidos por convenientes, o contrato celebrado em 01 de Março de 2008, entre a Secretaria-Geral do MDN e V. Exa., cessa a 30 de Setembro de 2009, dando-se, desta forma, cumprimento ao prazo de aviso prévio de 60 (sessenta) dias”.(71.º e 81.º da petição inicial)

47 - Em 1 de Setembro de 2009, a Secretaria-Geral do Ministério da Defesa Nacional veio sugerir ao A. que fosse assinado um designado contrato de prestação de serviços, para o período que correspondia ao lapso temporal entre 31 de Agosto de 2008 e 30 de Setembro de 2009, mas tal foi recusado pelo A. (72.º e 74.º da petição inicial)

48 - Aquando da cessação do seu designado contrato de prestação de serviços pelo R. o A. auferia como remuneração o montante de € 1.793,90. (76.º da petição inicial)

49 - Nunca foram pagos pelo R. ao A., durante todo o período decorrente de 1 de Março de 2006 até ao dia 30 de Setembro de 2009, quaisquer montantes a título de subsídio de Natal, bem como a título de subsídio de férias. (77.º e 78.º da petição inicial)

50 - As instalações da SG/MDN localizam-se num edifício militar, cujas entradas e saídas estão sujeitas às regras de controlo de acesso deste tipo de infraestruturas, o que se aplica não só aos funcionários públicos, mas a todos e a quaisquer utilizadores destes edifícios, incluindo visitantes. (91.º da contestação)

51 - O Eng.º DD encontrava-se enquadrado pelo R. na situação de “prestador de serviços” da SG/MDN, e nunca esteve inserido na estrutura e cadeia hierárquica da SG/MDN. (104.º da contestação)

52 - Pela atividade prestada, o A. emitia notas de honorários e dava quitação dessas notas de honorários, através de recibos verdes que entregava à SG, nos quais, sob a menção de atividade  exercida, fazia constar a palavra de consultor. (118.º e 119.º, da contestação)

III.

11. Vejamos, então, se o contrato celebrado entre as partes é um contrato de trabalho (nulo).


(a)- Considerações preliminares.

12. Segundo a respetiva noção legal[3], o contrato de trabalho reconduz-se a três elementos essenciais: (i) atividade (manual ou intelectual); (ii) retribuição; e (iii) subordinação jurídica.

A distinção entre ele e outras figuras próximas (as diferentes modalidades do contrato de prestação de serviço e toda uma série de contratos atípicos/inominados afins) assenta em dois elementos essenciais: no objeto do contrato (prestação de atividade remunerada, vs. obtenção de um resultado); e, determinantemente, no tipo de relacionamento entre as partes (subordinação jurídica vs. autonomia).

13. Nos casos duvidosos, os factos disponíveis (só por si) não permitem, em regra, confirmar direta e cabalmente todos os essencialia negotii do contrato de trabalho, pelo que – em articulação com o tradicional método conceptual/subsuntivo - há que lançar mão de uma abordagem indiciária (de cariz tipológico e analógico)[4], baseada em todos os elementos e circunstâncias do caso, tendo em vista: (i) aferir do grau de aproximação do caso concreto ao paradigma contratual; (ii) em função de critérios de razoabilidade e adequada exigência, determinar se a proximidade existente é suficiente para reconduzir a imagem global do caso concreto, em toda a sua complexidade, ao tipo normativo.

Dadas as dificuldades sentidas no desenho de um conceito rígido e absoluto de “subordinação jurídica”, é sobretudo na operacionalização deste elemento contratual (maxime no que tange ao seu momento organizatório) que em regra se recorre ao método indiciário, com base numa “grelha” de tópicos ou índices de qualificação (elementos que exprimem pressupostos, consequências ou aspetos colaterais de certo tipo de vínculo contratual[5]), relativamente aos quais há significativo consenso na doutrina e na jurisprudência[6], apesar de o seu elenco não ser rígido e de nenhum deles (isoladamente) assumir relevância decisiva, não sendo assim exigível que todos eles apontem no mesmo sentido.

14. Os mais significativos e utlizados são os seguintes:

(i) - Vontade real das partes quanto ao tipo contratual.

(ii) - Objeto do contrato.
- Prevalência da atividade ou do resultado.
- Grau de (in)determinação da prestação.
- Grau de disponibilidade do trabalhador (lato sensu) relativamente às determinações e necessidades de serviço da contraparte.
- Repartição do risco.


(iii) - Momento organizatório da prestação.

- Pessoalidade da prestação.
- Ocupação em exclusividade (ou não) e grau de dependência económica.
- Tipo de remuneração (para além do mais, releva se o pagamento é feito à tarefa ou por unidade de tempo e se são pagas férias e subsídios de férias/Natal).

- Local de trabalho e titularidade dos instrumentos de trabalho.

- Tempo de trabalho e férias.

- Grau de inserção na estrutura organizativa da contraparte [aferida em função da (não) presença, v.g., dos seguintes fatores: obediência a ordens e instruções diretas do empregador quanto ao modo de cumprimento/execução da prestação; sujeição a normas organizacionais/regulamentares (incluindo regras de conduta); existência de antecedentes em termos de ação disciplinar].

(iv) - Indícios externos:
- Regime fiscal e de segurança social.
- Sindicalização.

15. Quanto ao ónus da prova dos elementos integrantes do contrato de trabalho, refira-se que ele cabe ao trabalhador, nos termos do art. 342.º, n.º 1, do Código Civil, podendo a prova ser efetuada diretamente (nos casos evidentes) ou mediante recurso àquela metodologia indiciária.

16. Para além disso, desde a entrada em vigor do Código de Trabalho de 2003, a “pessoa que presta uma atividade” passou ainda a poder socorrer-se da presunção de laboralidade consagrada no seu art. 12º (sucessivamente alterado pela Lei 9/2006, de 20/3, e pela Lei 7/2009, de 12/2).

Ao caso sub judice é aplicável a versão originária deste artigo, pois, segundo o entendimento jurisprudencial reiteradamente expresso por este Tribunal, estando em causa uma relação jurídica cuja execução perdura ininterruptamente durante certo período, aplica-se a lei laboral vigente à data do seu início, no tocante à sua qualificação.[7]

Os factos provados não permitem afirmar cabalmente a cumulativa verificação de todos os requisitos enunciados na sobredita disposição legal, pelo que não parece que in casu seja possível considerar a presunção de laboralidade.

Posto isto.

* * *


(b)- Considerações genéricas quanto ao objeto do contrato de trabalho (atividade vs. resultado).

17. Ao contrário das relações de trabalho autónomo, nas quais se proporciona um resultado do trabalho, nas de trabalho subordinado [que correspondem a uma (mera) obrigação de meios], uma das partes obriga-se a prestar a outra uma atividade (positiva) e heterodeterminada, cujo conteúdo preciso é (vai sendo) - em maior ou menor medida - unilateralmente fixado pelo empregador; apresentando, à partida, um certo grau de indeterminação, a prestação vai sendo “potestativamente”[8] determinada por este.

Já o Prof. Vaz Serra explicava que, basicamente e a traço grosso, se um dos contraentes promete o próprio trabalho ao outro, que este orientará e dirigirá dentro de certos limites, o contrato é de trabalho; e se um dos contraentes promete ao outro um resultado do seu trabalho, obrigando-se a proporcioná-lo com independência, autonomia, trata-se de um contrato de prestação de serviço.[9]

Deste modo, como se compreende, exige-se uma disponibilidade continuada e real do trabalhador (embora, naturalmente, este traço seja compatível, com situações mais ou menos pontuais de inatividade).

Vale por dizer: no trabalho subordinado, a atividade do trabalhador é organizada e dirigida pela contraparte, tendo em vista um resultado que está “fora” do contrato (razão pela qual o empregador suporta o risco da não obtenção do resultado visado); ao invés, no trabalho autónomo, o resultado é o objeto primário do contrato, pelo que o devedor mantém o controlo da sua atividade, escolhendo e organizando ele próprio os meios para o atingir.[10]   

Todavia, são frequentemente inseparáveis a atividade e o seu resultado, pelo que as fragilidades deste critério – que “fazem com que ele deva ser considerado como um critério de mera prevalência” - apenas permitem afirmar que “no contrato de trabalho a atividade tem um valor prevalente para o empregador, enquanto no contrato de prestação de serviço é o resultado dessa atividade que tem mais relevo para o credor”. [11]

Sobre esta dificuldade, muito expressivamente, assim se pronunciou, há já umas décadas Galvão Teles:[12]

“Mas como se pode verdadeiramente saber se promete o trabalho ou o seu resultado? Todo o trabalho conduz a algum resultado e este não existe sem aquele. O único critério legítimo está em averiguar se a atividade é ou não prestada sob a direção da pessoa a quem ela aproveita, que dela é credora. Em caso afirmativo promete-se o trabalho em si, porque à outra parte competirá, ainda que porventura em termos bastante ténues, dirigi-lo, encaminhando-o para a consecução dos resultados que se propõe. O trabalho integra-se na organização da entidade patronal, é um elemento ao serviço dos seus fins, um fator de produção quando se trate de uma empresa económica. Na outra hipótese promete-se o resultado do trabalho, porque é o prestador que, livre de toda a direção alheia sobre o modo de realização da atividade como meio, a oriente por si, de maneira a alcançar os fins esperados”.

Conexamente, como nota Monteiro Fernandes[13], apesar de a obtenção do resultado não estar, em regra, “dentro do círculo do comportamento devido pelo trabalhador”, “esse resultado ou efeito pode, todavia, constituir elemento referencial necessário ao próprio recorte do comportamento devido”; independentemente de o trabalhador conhecer, ou não, o “escopo global e terminal” visado pelo empregador, “o processo em que a atividade (...) se insere é naturalmente pontuado por uma série de objetivos imediatos, (...) fins técnico-laborais, os quais, ou uma parte dos quais (...), se pode exigir – presumir – sejam nitidamente representados pelo trabalhador”.

Também nem sempre é fácil integrar na dicotomia atividade-resultado algumas situações em que, sendo contratualizado o próprio trabalho (e não o seu resultado), ele se desenvolve com elevado grau de independência e autonomia técnica, embora no âmbito do quadro organizativo do outro contraente, que – com maior ou menor nitidez, ainda que apenas potencialmente – orienta/dirige o seu trabalho.

Paradigmáticas destas dificuldades são as múltiplas situações em que a atividade é suscetível de ser levada a cabo indistintamente, quer num quadro de subordinação, quer em termos autónomos, como é o caso das profissões liberais (médicos, enfermeiros, arquitetos, engenheiros, advogados, etc.), dos jornalistas, de alguns artistas (v.g. os profissionais de espetáculos, como é o caso dos músicos) ou dos professores.

* * *
(c)  - Considerações genéricas quanto à subordinação jurídica.

18. A subordinação jurídica encontra a sua génese: (i) na posição de desigualdade/dependência do trabalhador que é inerente à sua inserção, em maior ou menor grau, numa estrutura organizacional alheia (estrutura que não se reconduz necessariamente a uma empresa, podendo até ser muito rudimentar[14]) , dotada de regras de funcionamento próprias; (ii) na correspondente posição de domínio do empregador, traduzida na titularidade do poder de direção (que implica o dever de obediência às ordens e instruções do empregador, maxime no tocante ao modo de cumprimento/execução da prestação, bem como às regras organizacionais e de conduta estabelecidas) e do poder disciplinar.

Diferentemente da “atividade” e da “retribuição”, categorias presente em vários tipos contratuais, é na “subordinação jurídica” - elemento que no essencial o caracteriza e  demarca de realidades fronteiriças - que reside a especificidade mais típica do contrato de trabalho.

Não obstante, em consonância com a dinâmica imposta pelas novas tecnologias e por exigências organizativas das empresas muito distanciadas do modelo taylorista/fordista, vivemos tempos pautados por toda uma panóplia de manifestações de flexibilidade laboral e fragmentação/ externalização do processo produtivo, que converteram a subordinação, enquanto elemento identificativo do contrato de trabalho, num elemento dotado de grande plasticidade, munido de “novos rostos”, e, nessa medida, num “identificador problemático”[15].

Na verdade, uma vez que “aumentaram, de forma significativamente relevante, por um lado, as margens e expressões de autonomia no campo do trabalho subordinado (...), mas também foi possível verificar, por outro lado, que o próprio domínio do trabalho independente ou autónimo passou a conhecer, de forma crescente, expressões de tutela e enquadramento que são mais próprias do típico trabalho subordinado”, a oposição tradicionalmente existente entre o trabalho subordinado e o trabalho autónomo vai-se esbatendo e diluindo, “através de um processo de metamorfose das formas jurídicas de exercício do poder por parte do empregador”.[16]


Por conseguinte, nem sempre estando presentes alguns dos seus traços tradicionais e mais característicos, a subordinação deve perspetivar-se enquanto conceito de “geometria variável”, que comporta graus de intensidade diversos, em função, nomeadamente, da natureza da atividade e/ou da confiança que o empregador deposita no trabalhador, assumindo natureza jurídica e não técnica, “no sentido em que é compatível com a autonomia técnica e deontológica (...) e se articula com as aptidões profissionais especificas do próprio trabalhador e com a autonomia inerente à especificidade técnica da (...) atividade”, sendo, deste modo, consentânea com atividades profissionais altamente especializadas ou que tenham uma forte componente académica ou artística[17], tal como pode ser meramente potencial, bastando a possibilidade de exercício dos inerentes poderes pelo empregador.

Na verdade, como paradigmaticamente refere sobre esta problemática Monteiro Fernandes:[18]

“A subordinação pode não transparecer em cada instante do desenvolvimento da relação de trabalho. Muitas vezes, a aparência é de autonomia do trabalhador, que não recebe ordens diretas e sistemáticas; mas, a final verifica-se que existe, na verdade (...).

 

[N]ão é necessário que essa dependência se manifeste ou explicite em atos de autoridade e direção efetiva. Isto é tanto mais real quanto mais se avança na sofisticação e diferenciação das qualificações profissionais. Muitos trabalhadores conhecem melhor o trabalho que têm que realizar do que o empregador.

(...)

Neste sentido, observava, já há décadas, Mazzoni: Quanto mais o trabalho se refina e assume carácter intelectual, mais difícil é estabelecer uma nítida diferenciação, porque a subordinação tende a atenuar-se cada vez mais, na relação de trabalho subordinado, e a avizinhar-se daquela genérica supervisão (..) que se encontra também na relação de trabalho autónomo (...).

Para além das situações em que, de facto, não ocorrem comportamentos diretivos do empregador, há que considerar aquelas em que constituem objeto do contrato de trabalho (...) atividades cuja natureza implica a salvaguarda absoluta da autonomia técnica do trabalhador (...). Em tais casos, o trabalhador apenas ficará adstrito à observância das diretrizes mais gerais do empregador em matéria de organização do trabalho (local, horário, normas de procedimento burocrático, regras disciplinares (...).

 (...)

Passa a ser necessário, perante cada situação concreta, saber-se ao certo se o médico, o advogado ou o engenheiro atuam (...) como (...) empregados ou (...) como “profissionais livres”, isto é, trabalhadores autónomos.”

* * *
(d)– Aplicação ao caso dos autos do método indiciário de qualificação.

19. No caso dos autos, os factos disponíveis não permitem comprovar direta e cabalmente os essencialia negotii de qualquer dos tipos contratuais em discussão.

Como vimos, também não se encontram in casu verificados os requisitos da presunção de laboralidade.

Por conseguinte, lançando mão da metodologia indiciária, há que proceder à análise crítica do caso, com base nos índices de qualificação que em concreto assumem maior relevo (embora, como já se referiu, nenhum deles, só por si, com valor decisivo).

Assim:

* * *

20. Elementos neutros (por não permitirem ilações, positivas ou negativas, no tocante a qualquer das teses em confronto):

20.1. O contrato de trabalho é “um produto da autonomia privada, resultando do encontro de uma proposta e uma aceitação”[19], inserindo-se a sua disciplina legal no direito privado, pelo que, à partida, estamos num âmbito em que se toma sobretudo como referência a autonomia privada, com as suas componentes de autonomia da vontade e da autonomia contratual, como expressão do princípio de liberdade[20].

Todavia, estão em causa contratos celebrados entre um cidadão e o Estado, num quadro legal consabidamente marcado por fortes constrangimentos no plano da admissão de pessoal na Administração Pública (cfr. artigos 5.º e 7.º da Lei n.º 2004, de 22 de Julho), pelo que, nem no nomen juris utilizado pelas partes na titulação formal dada aos contratos (“contrato de avença” e “contrato de prestação de serviços em regime de avença”), nem no conteúdo do seu clausulado, é possível descortinar qualquer elemento interpretativo que permita extrair ilações seguras quanto à vontade real das partes.

20.2. A atividade desenvolvida pelo A. (consultoria e gestão de projetos) é suscetível de ser levada a cabo, indistintamente, num quadro de subordinação ou em termos autónomos, pelo que também nenhuma inferência de relevo é possível retirar em função deste elemento.

20.3. Não consta dos factos provados qualquer referência a poderes disciplinares do R. sobre a A., nomeadamente, que o Estado alguma vez tenha agido no plano disciplinar relativamente a este.

Mas não decorre daqui qualquer óbice à qualificação como laboral do vínculo contratual em causa (nem à qualificação contrária), uma vez que, como bem se nota no Ac. da Rel. Lisboa de 12-07-2012 (Apelação n.º 441/10.5TTLSB.L1 – 4.ª Secção), junto a fls. 653 – 692 dos presentes autos, “tal vertente da subordinação jurídica está latente, adormecida, escondida, podendo nunca emergir e vir a ser exercida ao longo da vigência do contrato de trabalho, mesmo com muitos anos de duração, sem que tal implique a sua inexistência e, por consequência, a descaracterização jurídica em termos laborais”.

Na verdade, como lucidamente refere o Ac. de 9/11/2011, da mesma Relação[21], “do não exercício do poder disciplinar – apenas compreensível em situações de crise contratual – não pode, sem mais, retirar-se a sua não titularidade”, uma vez que o “exercício de prerrogativas laborais tem forte valor indiciário positivo no sentido da qualificação da relação como de trabalho”, mas é de lhe “negar firmemente, na hipótese contrária, valor negativo excludente dessa qualificação”.

* * *

21. A favor de uma relação jurídica de carácter autónomo, há a ponderar:

a) Nunca foram pagos pelo R. ao A., durante todo o período decorrente de 1 de Março de 2006 até ao dia 30 de Setembro de 2009, quaisquer montantes a título de subsídio de Natal, bem como a título de subsídio de férias (n.º 49 dos factos provados).

b) Pela atividade prestada, o A. emitia notas de honorários e dava quitação dessas notas de honorários, através de recibos verdes que entregava à SG, nos quais, sob a menção de atividade exercida, fazia constar a palavra de consultor (n.º 52 dos factos provados).

c) As importâncias pelo Estado pagas ao A. incluíam o valor correspondente ao IVA (n.ºs 17, 28 e 36 dos factos provados).

No entanto, não é possível atribuir a estes três elementos relevância decisiva.

Na verdade:

No fundo, o que se encontra subjacente à matéria em discussão nos autos, é a questão de saber se com os documentos que titularam o vínculo contratual em causa se visou, sob a aparência de diverso tipo contratual, ocultar um contrato de trabalho.

Ora, como se compreenderá, a ter sido essa a intenção das partes, não podia o conteúdo de tais documentos deixar de traduzir a aparência de um vínculo jurídico de natureza autónoma (cfr. n.ºs 42 a 44 dos factos provados), através da incorporação das cláusulas que normalmente lhe estão associadas (v.g. pagamento através de “recibos verdes” e faturação de IVA), e, por outro lado, do afastamento dos traços características do contrato de trabalho (v.g. pagamento de subsídios de Natal e de férias e efetivação de ausência de descontos para a Segurança Social e IRS).

* * *

22. Ao invés, no sentido de uma relação juridicamente subordinada, há essencialmente a considerar o seguinte:

                         

a) Desde logo, e com muito relevo, a circunstância de o A. se encontrar claramente inserido na estrutura administrativa, organizativa e hierárquica do R. [cfr., Infra, alíneas b), d) e e), e ainda os n.ºs 22 e 29 dos factos provados]. 

b) Fornecimento pelo R. do equipamento e restante material necessário para o desempenho das funções do A., o que tinha lugar nas instalações daquele, num edifício militar – “O A. exercia a sua atividade num gabinete, sito na Avenida ..., n.º 1, 1400-204 Lisboa, sendo-lhe fornecidos pelo R. todos os meios de trabalho e suporte logístico inerente à função desempenhada por parte do R., nomeadamente: um cartão-de-visita, um cartão de acesso institucional com a identificação de “Analista”; um computador pessoal; um e-mail institucional com o domínio do Ministério da Defesa Nacional (CC@defesa.pt); um telefone com número fixo para comunicações exteriores e extensão militar” (n.ºs 21, 29, 30 e 38 dos factos provados); “As instalações da SG/MDN localizam-se num edifício militar, cujas entradas e saídas estão sujeitas às regras de controlo de acesso deste tipo de infraestruturas, o que se aplica não só aos funcionários públicos, mas a todos e a quaisquer utilizadores destes edifícios, incluindo visitantes” (n.º 50 factos provados).

c) O A. recebia uma contrapartida pecuniária certa, paga mensalmente (n.ºs 17, 28, 36 e 48 dos factos provados).

d) Embora tacitamente, foi estabelecida entre as partes a observância pelo A. de um horário de trabalho, que compreendia o período temporal entre as 10h e as 19h30m, com intervalo de uma hora para almoço, sendo ainda certo que quando o mesmo se ausentava, devia previamente comunicar a sua ausência (n.ºs 23, 24, 31, 32, 39 e 40 dos factos provados).

Deste modo, tendo em conta a carga horária do A. e o constante da alínea c), nenhum elemento é possível extrair em contrário no tocante a dois elementos fortemente indiciadores da “subordinação jurídica”: a exclusividade e a dependência económica.

e) O A. gozava anualmente férias (n.º 37 dos factos provados).

f) O A. exerceu funções para o R. continuada, permanente e duradouramente, durante cerca de três anos e seis meses.

g) Nada nos factos provados sugere que a assunção do risco pela eventual inverificação dos objetivos profissionais do A. tivesse regime diferente do que se verifica no âmbito das relações existente entre o Estado e os seus funcionários.

* * *

23. Tudo ponderado, confrontando o universo dos elementos e circunstâncias do caso concreto com o paradigma legal do contrato de trabalho, deparamo-nos, com uma imagem global que, no essencial, a ele se reconduz claramente.

Procede, pois, a revista.

24. A sentença proferida na 1.ª instância, tendo reconhecido a natureza jurídico-‑laboral do contrato em causa, declarou-o nulo.

Este segmento decisório não foi impugnado por qualquer das partes, tendo, pois, transitado em julgado.

Não obstante, no recurso subordinado de apelação que interpôs, o A. sustentou, para além do mais, que a nulidade do contrato opera a partir da data da notificação da sentença, e não da data da notificação da contestação (como decidiu a sentença).

Consequentemente, o processo terá de baixar ao TRL, para conhecimento das questões suscitadas no dito recurso subordinado, cuja apreciação foi julgada prejudicada na decisão recorrida (como já se referiu, o art. 679.º, do CPC, exclui do julgamento da revista a “regra da substituição do tribunal recorrido”, consagrada no art. 665.º, do mesmo diploma, relativamente ao julgamento da apelação).

IV.

25. Em face do exposto, concedendo a revista, acorda-se em:


a) Revogar o acórdão recorrido;


b) Repristinar a sentença da primeira instância, na parte em que reconhece a natureza jurídico‑laboral do contrato em causa e o declara nulo;

c) Determinar a baixa dos autos à segunda instância, para conhecimento das questões suscitadas pelo A. no subordinado recurso de apelação, cuja apreciação foi considerada prejudicada (cfr. art. 665.º, CPC).

Custas da revista a cargo do recorrido.

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 21 de Maio de 2014

Mário Belo Morgado (Relator)

Pinto Hespanhol

Fernandes da Silva

____________________

[1] É aplicável à revista o regime processual que no CPC foi introduzido pela Lei 41/2013, de 26 de Junho, nos termos do art. 5.º, n.º 1, deste diploma (os autos tiveram início em 08.02.2010 e o acórdão recorrido data de 15.01.2014). Todas as referências ao CPC são reportadas a esta versão do diploma legal.

[2] O tribunal deve conhecer de todas as questões suscitadas nas conclusões das alegações apresentadas pelo recorrente, excetuadas as que venham a ficar prejudicadas pela solução entretanto dada a outra(s) [cfr. arts. 608.º, n.º 2, 635.º e 639.º, n.º 1, e 679º, CPC], questões (a resolver) que, como é sabido,  não se confundem nem compreendem o dever de responder a todos os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, os quais nem sequer vinculam o tribunal, como decorre do disposto no art. 5.º, n.º 5, do mesmo diploma.
[3] Cfr. art. 1152.º do Código Civil e art. 10.º do CT/2003 (em vigor aquando da celebração do contrato em causa).
[4] Cfr. Pedro Pais de Vasconcelos, Contratos Atípicos, 1995,   p. 5 – 6.
[5] Na expressão de Joana Nunes Vicente, A fuga à relação de trabalho (típica): em torno da simulação e da fraude à lei, 116 – 120.
[6] Cfr. Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, II, 4ª edição, p. 40 – 42, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, Almedina, 16ª edição, p. 123 – 124, e Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, 6ª edição, p. 302 - 304, Acs. STJ de 17/02/1994 (Dias Simão), Proc. 003820; de 02-03-2011 (Pinto Hespanhol), P. 146/08.7TTABT.E1.S1; de 04-05-2011 (Fernandes da Silva), P. 3304/06.5TTLSB.S1; de 22/9/11 (Sampaio Gomes), P. 192/07.8TTLSB.L1.S1; de 12-09-2012 (Fernandes da Silva), P. 247/10.4TTVIS.C1.S1; e de 05-03-2013 (Gonçalves Rocha), P. 3247/06.2TTLSB.L1.S1;

[7] V.g. Acs. de 22-09-2011, Proc. n.º 192/07.8TTLSB.L1.S1 (Sampaio Gomes), e de 14-04-2010, Proc. n.º 1348/05.3TTLSB.S1 (Pinto Hespanhol).
[8] Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, Almedina, 1994, p. 125.

[9] RLJ 112/203.
[10] Cfr. Monteiro Fernandes, ob. cit., p. 108.
[11] Maria do Rosário Palma Ramalho, ob. cit., p. 25.
[12] Contratos Civis, BMJ 83/165.
[13] Ob. cit., p. 111.
[14] Cfr. Maria do Rosário Palma Ramalho, ob. cit., p. 39.
[15] Cfr.  Rui Assis, O Poder de direção do empregador, p. 44 e 176.
[16] Rui Assis, ob. cit., p. 176 – 177, invocando Alain Supiot.
[17] Maria do Rosário Palma Ramalho, ob. cit., p. 36.
[18] Ob. cit., p. 115 - 116.
[19] Pedro Romano Martinez, ob. cit., p. 272
[20] Cfr. Bernardo da Gama Lobo Xavier, Procedimentos laborais na empresa, 2009, pp. 81 e 88.
[21] Proc. n.º 308/09.0TTPDL.L1-4.