Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ00000380 | ||
| Relator: | JOAQUIM DE MATOS | ||
| Descritores: | ADVOGADO HONORÁRIOS JUROS DE MORA | ||
| Nº do Documento: | SJ200206200016312 | ||
| Data do Acordão: | 06/20/2002 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
| Processo no Tribunal Recurso: | 402/01 | ||
| Data: | 05/03/2001 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA. | ||
| Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
| Área Temática: | DIR CIV - DIR CONTRAT. | ||
| Legislação Nacional: | EOADV84 ARTIGO 65 N1. CCIV66 ARTIGO 1158 N2. | ||
| Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO STJ PROC198/00 2SEC DE 2000/03/30. ACÓRDÃO STJ DE 1999/07/07 IN CJSTJ ANO7 T3 PAG19. ACÓRDÃO STJ PROC1095/99 7SEC DE 2000/01/13. | ||
| Sumário : | I- O artigo 65º, nº. 1, do Estatuto da Ordem dos Advogados não estabelece qualquer método para dirimir as divergências acerca do montante dos honorários entre o advogado e o cliente, limitando-se a consagrar critérios referenciais de carácter deontológico a serem observados pelos advogados. II- Tendo a conta de honorários sido recusada pelo cliente, e fixados estes em montante inferior, por decisão judicial, os juros de mora devem contar-se desde a citação e não desde a apresentação da nota de honorários. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - A, id. a fls. 2, intentou contra "B - Sociedade Imobiliária, SA.", antes designada "......"., acção de honorários, com processo ordinário, em que pede a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de 2240250 escudos, com juros de mora às taxas legais, desde 18 de Abril de 1994 quanto à parcela de 1107050 escudos e desde 22 de Janeiro quanto à parcela de 1133200 escudos, até integral pagamento, além dos juros do art. 829º-A, nº 4, do CCivil". Nesse sentido a A. alegou que, no exercício da profissão, assumiu desde Dezembro de 1987 o patrocínio judiciário da R. na acção nº 1436/87 da 13ª Vara Cível de Lisboa e sua reconvenção e que esta, repetidamente instada para o efeito, não lhe pagou os serviços prestados no período de Novembro de 1992 a Abril de 1994, bem como os prestados no período de Maio de 1994 a Janeiro de 1996, no montante global de 2240250 escudos. Citada, a R. contestou, impugnando os factos narrados na petição inicial e concluiu que o trabalho efectuado pelo A., naqueles períodos, não justifica as notas de honorários apresentadas e que estes nunca devem ser fixados em valor superior a 950000 escudos. Proferido o despacho saneador, foram elaborados a especificação e questionário, que foram objecto de reclamação oportunamente desatendida. O Conselho Geral da Ordem dos Advogados emitiu parecer no sentido de que "é de conceder laudo às notas de honorários, no valor de 950000 escudos cada uma, perfazendo 1900000 escudos, apresentadas pelo Senhor Dr. A à sua constituinte «B - Sociedade Imobiliária, SA.», a que acresce o IVA à taxa legal". Teve oportunamente lugar o julgamento e, após o mesmo, o Colectivo respondeu aos quesitos em termos que não suscitaram reclamação. Foi depois proferida a sentença de fls. 150 a 157 que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a R. a pagar ao A., a título de honorários a quantia de 950000 escudos, acrescida de IVA e do montante "que resultar da correcção desta importância pelos índices de preços fornecidos pelo INE., entre o momento da interposição da acção e o trânsito em julgado da decisão". Inconformado com essa decisão o A. dela apelou para a Relação de Lisboa que, por seu Acórdão de fls. 185 a 195, esclarecido a fls. 219 a 225, julgou parcialmente procedente o recurso, "confirmando a sentença recorrida na parte em que fixa o montante devido, a título de honorários, em 950000 escudos, acrescidos de IVA" e da "quantia de 311750 escudos" montantes esses com "juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento". Ainda discordante, o A. interpôs revista do decidido para este Supremo Tribunal de Justiça, dizendo que deve prover-se a revista, revogar-se o Acórdão da Relação de Lisboa, na parte recorrida e condenar-se consequentemente a R. a pagar-lhe, "além do mais: a) a título de honorários a quantia de 1900000 escudos, correspondente a 9477,16 euros, acrescida de IVA à taxa legal; e b) juros de mora contados desde 18 de Abril de 1994 quanto à nota de honorários e despesas de fls. 15, no montante global de 1107050 escudos e desde 22 de Janeiro de 1996 quanto à nota de honorários e despesas de fls. 17, no montante global de 1133200 escudos", alegando para o efeito o contido a fls. 231 a 247, onde conclui que: 1. Os honorários do advogado ora recorrente correspondem aos serviços discriminados nas notas de fls. 15/16 e 21/22 e de fls. 17/20 e 31/32 e foram prestados no patrocínio da R. junto do Tribunal da Relação de Lisboa e do Supremo Tribunal de Justiça; 2. O montante das duas notas de honorários em dívida corresponde ao tempo gasto no patrocínio durante mais de cinco anos, à importância dos serviços efectuados, à dificuldade da questão, ao inteiro ganho de causa obtido para a constituinte e às largas posses desta, que é uma sociedade cujo capital é detido apenas pelo Banco Nacional Ultramarino e que se dedica à especulação imobiliária; 3. Sendo o patrocínio judiciário um contrato oneroso de prestação de serviços profissionais e não havendo a remuneração do advogado sido previamente acordada entre ele e a constituinte, a respectiva fixação faz-se como dispõe o art. 65º, nº 1, do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo DL 84/84, de 16 de Março e o art. 1158º, nº 2, do CCivil; 4. A adequação aos parâmetros legais dos honorários fixados pela aqui recorrente, nas duas notas em dívida, designadamente à praxe do foro do Tribunal da Relação de Lisboa e do Supremo Tribunal de Justiça e ao estilo da comarca de Lisboa (onde o advogado tem suas instalações fixas, naturalmente caras) e sua moderação foram expressamente reconhecidas em laudo da Ordem dos Advogados tirado por unanimidade do Conselho Geral; 5. Os juros de mora que a R. foi condenada a pagar ao A. devem ser contados, por força do disposto no art. 805°, nº 1, do CCivil, desde o momento em que por ele foi interpelada para pagar honorários e despesas, isto é: desde 18/04/94 quanto à primeira nota de honorários e despesas no valor global de 1107050 escudos (doc. de fls. 15/16) e desde 22/01/96 quanto à segunda nota de honorários e despesas, no valor global de 1133200 escudos (doc. de fls. 17/20); 6. Ao fixar os honorários do ora recorrente em metade do montante reconhecido como condigno pelo laudo unânime do Conselho Geral da Ordem dos Advogados e ao considerar como início da mora a data da citação da ora recorrida para a presente acção, o Acórdão recorrido fez desajustada aplicação dos citados preceitos legais. Contra-alegando, a R. diz ser de manter inteiramente o "Acórdão recorrido quanto à fixação do montante dos honorários a pagar pela R. ao A., mas sem juros de mora". II - Após os vistos, cumpre decidir: A - Factos provados: 1. O A. exerce a profissão de Advogado; 2. No exercício da sua actividade profissional, o A. prestou serviços à R. no período compreendido entre Dezembro de 1987 e 1996; 3. Esses serviços consistiram no patrocínio judiciário da R., no processo apenso; 4. Pelos serviços prestados até Setembro de 1988, o A. enviou à R. a nota de honorários e despesas que consta de fls. 9 e 10; 5. Tendo a R. pago tais despesas e honorários; 6. Pelos serviços prestados de Outubro de 1988 a Julho de 1991, o A. enviou à R. a nota de honorários e despesas constantes de fls. 11 e 12; 7. A qual também foi paga pela R.; 8. Pelos serviços prestados no período de Agosto de 1991 a Outubro de 1992, o A. apresentou à R. a nota de honorários e despesas juntas a fls. 13 e 14; 9. Que igualmente foi paga pela R.; 10. Pelos serviços prestados no período de Novembro de 1992 a Abril de 1994, o A. apresentou à R. a nota de honorários e despesas que se encontra junta a fls. 15 e 16; 11. Que não foi paga pela R.; 12. Pelos serviços prestados no período de Maio de 1994 a Janeiro de 1996, o A. enviou à R. a nota de honorários e despesas constantes de fls. 17 a 20; 13. Que também não foi paga pela R.; 14. O A. estudou com cuidado e tratou com zelo a questão que lhe foi confiada pela R.; 15. Obtendo para a R. e reconvinte inteiro ganho de causa ao fim de quase nove anos de luta judiciária; 16. A R. sempre demonstrou agrado e apreço pelos serviços que o A. lhe prestou; 17. O A. instou repetidamente a R. para lhe efectuar o pagamento dos serviços profissionais que lhe prestou no mencionado período de Novembro de 1992 a Janeiro de 1996, bem como as despesas que realizou no mesmo período; 18. Enviando-lhe cartas e faxes cujas cópias se mostram juntas a fls. 21, 22, 24, 26, 28, 29, 30, 31 a 34, 36 a 37, 38, 40 e 41; 19. Por sua vez a R. enviou ao A. as cartas juntas a fls. 23, 25, 27 e 35; 20. O A. renunciou ao mandato conferido pela R. em 15 de Janeiro de 1996, apresentando na 2ª Secção do S.T.J. o requerimento cuja cópia se encontra a fls. 39; 21. A R. propôs pagar ao A. a quantia de 950000 escudos como retribuição por todos os serviços por ele prestados no período considerado nas duas últimas notas de honorários e despesas; 22. O que não foi aceite pelo A.; 23. A R. tem por único accionista o Banco Nacional Ultramarino; 24. Os serviços que o A. prestou à R. ao longo dos últimos quatro anos foram importantes e complexos; 25. Uma parte do trabalho desenvolvido pelo A. nas duas últimas notas de honorários foi essencialmente repetitivo; 26. Por isso tal trabalho foi mais simples e menos moroso que o desenvolvido no período relativo às três primeiras notas de honorários; 27. A actuação do A. no período compreendido nas duas últimas notas de honorários consistiu na apresentação de duas peças de alegação de recurso no STJ.; 28. Para além disto o A. respondeu a um pedido de aclaração do acórdão de fls. 556 a 578 do STJ.; e 29. E já conhecia as decisões do Tribunal de 1ª Instância e do Tribunal da Relação; B - Direito: 1. À luz do estabelecido nos arts. 684º, nº s 2 e 3, e 690º , nº s 1 a 4, ambos do CPCivil, as conclusões do alegado pelo recorrente delimitam o objecto do recurso. O âmbito da revista resulta do art. 26º da LOTJ99 (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais - Lei nº 3/99, de 13/01), onde se diz que "fora dos casos previstos na lei, o Supremo Tribunal de Justiça apenas conhece de matéria de direito" e do art 729º, nº 2, do CPCivil, ao prever que "a decisão da 2ª Instância, quanto à matéria de facto, não pode ser alterada, salvo o caso excepcional do nº 2 do art. 722º", à luz do qual "o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova". 2. Como se vê das conclusões do A. recorrente, são duas as questões a que cabe responder no presente recurso: uma, a 1ª, referente ao quantum de honorários que a R. recorrida deve pagar ao A. e outra, a 2ª, relativa ao momento a partir do qual serão devidos juros de mora correspondentes a tal quantia. Quanto à 1ª questão, diremos que a argumentação desenvolvida pelo A. recorrente na sua alegação parte da ideia de que os serviços por si prestados à R. recorrida, não pagos por esta, não foram somente os mencionados no nºs 10, 12, 27 e 28 dos Factos provados. Ao adoptar essa linha de rumo, o dito A. esquece nesse seu raciocínio, por um lado, que as Instâncias nada deram como provado para além do contido em tais nºs. e, por outro lado, que este Supremo, como se disse em 1., em princípio, "apenas conhece de matéria de direito" e só pode modificar a decisão relativa à matéria de facto nos termos contidos na última parte do "nº 2 do art. 722º do CPCivil", que no caso vertente se não verificam. Os serviços profissionais prestados pelo A. à R. - cujo não pagamento originou a causa em recurso - consistiram na elaboração e apresentação de duas peças de alegações e da resposta a um pedido de aclaração em recurso perante este Supremo e é de notar, dado o conteúdo dos nºs 25, 26 e 29 dos Factos provados que "uma parte do trabalho desenvolvido pelo autor nas duas últimas notas de honorários foi essencialmente repetitivo", "mais simples e menos moroso que o desenvolvido no período relativo às três primeiras notas de honorários" e realizado numa data em que o A. "já conhecia as decisões do Tribunal de 1ª Instância e do Tribunal da Relação". Assim sendo, como na verdade é, temos para nós como seguro - sem embargo da consideração que indubitavelmente nos merece o laudo emitido pelo Conselho Geral da Ordem dos Advogados - que, à luz do estatuído nos arts. 65º, nº 1, do Estatuto da mesma Ordem, aprovado pelo DLei nº 84/84, de 16/03 e 1158º, nº 2, do CCivil, foi criteriosa e fundamentada a linha de rumo adoptada no douto Acórdão ora em apreço. Tendo em conta o estabelecido nessas normas dos quais decorre, respectivamente, que na fixação dos honorários deve o advogado proceder com moderação, atendendo ao tempo gasto, à dificuldade do assunto, à importância do serviço prestado, às posses dos interessados, aos resultados obtidos e à praxe do foro e estilo da comarca e que se o mandato for oneroso, a medida da retribuição, não havendo ajuste entre as partes, é determinada pelas tarifas profissionais; na falta destas, pelos usos; e na falta de umas e outros, por juízos de equidade, entendemos que a douta decisão recorrida é a adequada ao caso vertente e está em sintonia com a jurisprudência deste Supremo Tribunal. Essa orientação jurisprudencial do Supremo vai no sentido de que o citado art. 65º, nº 1, não estabelece, nem pretende estabelecer, qualquer método decisório ou critério legal de dirimência das divergências, discordâncias ou controvérsias acerca dos montantes de honorários entre os sujeitos contratuais envolvidos, antes se limita a consagrar critérios ou parâmetros referenciais de carácter deontológico/estatutário a serem observados pelos advogados na fixação dos respectivos honorários (Cfr. Acórdão de 30/03/00, in Rev. 198/00, 2ª Secção) e de que os dados mais relevantes na fixação dos honorários do Advogado são o tempo gasto e a dificuldade do assunto (Cfr. Acórdão de 7/07/1999, in CJ-STJ, ano VII, 1999, Tomo III, págs.19/21). De todo o modo nunca deverá esquecer-se também que, na fixação dos honorários a um advogado intervém um ineliminável momento de discricionaridade, no sentido civilístico que tem muito a ver coma a boa fé que impregna toda a relação contratual e ainda que em tal fixação de honorários há que ter em conta não só os custos fixos, elevados de um escritório de advogado, mas também os riscos da profissão liberal (Cfr., a propósito, Acórdão de 13/01/2000, in Rev. 1095/99, 7ª Secção). No caso sub judice, à luz da matéria fáctica apurada, donde se vê que apenas estão em causa as peças processuais atrás aludidas, de algum modo bastante mais fáceis do que é habitual por serem em parte repetitivas e mera continuação de outras já elaboradas pelo A. nestes autos, temos como óbvio que o Acórdão recorrido adoptou a linha legal e justa na apreciação da problemática de lide e decidiu em sintonia com os critérios previstos nas já citadas normas dos arts. 65º do Estatuto da Ordem dos Advogados e 1158º, nº 2, do CCivil e num total respeito pelo bem conhecido mérito profissional do A.. Assim, quanto a esta 1ª questão, não pode acolher-se o argumentado pelo A. e vai, assim, manter-se intocado o decidido. No tocante à 2ª questão também falece razão ao A., já que os juros não poderão ser contados a partir da data da interpelação feita pelo A. para a efectivação do pagamento, na medida em que o montante de honorários por ele apresentado à R. não foi aceite por esta e, à luz do que tem vindo a dizer-se no presente Acórdão, fundadamente. Daqui decorre que a contagem dos juros deverá ser feita nos termos definidos no douto Acórdão recorrido. Assim, ainda aqui se não vislumbra algo que obste à confirmação desse Acórdão. III - Face ao exposto, acorda-se em negar a revista, com custas da mesma pelo A.. Lisboa, 20 de Junho de 2002 Joaquim de Matos, Ferreira de Almeida, Abel Freire. |