Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2ª SECÇÃO | ||
Relator: | ABRANTES GERALDES | ||
Descritores: | UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA EXPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA RESERVA ECOLÓGICA NACIONAL PDM INDEMNIZAÇÃO JULGAMENTO AMPLIADO | ||
Data do Acordão: | 05/11/2017 | ||
Votação: | MAIORIA COM * DEC VOT E * VOT VENC | ||
Referência de Publicação: | DR, I SÉRIE, 05.07.2017, P. 3373 - 3383 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA E ESTABELECIDA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA | ||
Área Temática: | DIREITO ADMINISTRATIVO - EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA / INDEMNIZAÇÃO DEVIDA PELA EXPROPRIAÇÃO. DIREITO DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO - PLANO MUNICIPAL DE ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO. | ||
Doutrina: | - Alves Correia, na Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 133.º, 53 e 54. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 9.º. CÓDIGO DAS EXPROPRIAÇÕES (CEXP): - ARTIGOS 26.º, N.º 12, 27.º. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 62.º, N.º 2. DEC. REGULAMENTAR N.º 11/09, APROVADO AO ABRIGO DO ART. 72.º DO DEC. LEI N.º 380/99, DE 22 DE SETEMBRO. DEC.-LEI N.º 160/08, DE 22 DE AGOSTO, REGIME DE APROVAÇÃO E DE DELIMITAÇÃO DA REN: - ARTIGOS 8.º, N.º 3, 10.º, 11.º, N.º 3, 11.º, N.º 15. LEI DE BASES DA POLÍTICA DE ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E DE URBANISMO (LEI N.º 48/98, DE 11 DE AGOSTO, ENTRETANTO REVOGADA E SUBSTITUÍDA PELA LEI N.º 31/04, DE 30 DE MAIO) E DO REGIME JURÍDICO DOS INSTRUMENTOS DE GESTÃO TERRITORIAL APROVADO PELO DEC. LEI N.º 380/99, DE 22 DE SETEMBRO, NA VERSÃO VIGENTE À DATA DA DECLARAÇÃO DE UTILIDADE PÚBLICA QUE EMERGIA DO DEC. LEI N.º 181/09, DE 7 DE AGOSTO (ENTRETANTO REVOGADO E SUBSTITUÍDO PELO DEC. LEI N.º 80/15, DE 14 DE MAIO). LEI N.º 166/08, DE 22-8 (ENTRETANTO REVOGADA E SUBSTITUÍDA PELO DEC. LEI N.º 80/15, DE 14-5): - ARTIGOS 1.º, 9.º, 10.º, N.º 1, 11.º, N.º 15, 20.º, 21.º, N.º 1. RESOLUÇÃO DO CONSELHO DE MINISTROS N.° 34/96, DE 6-4, E ALTERADA PELA RESOLUÇÃO DO CONSELHO DE MINISTROS N.º 31/05, DE 21-2, ANTES DA APROVAÇÃO PELA RESOLUÇÃO DO CONSELHO DE MINISTROS N.º 5/97 DE 14-1, DO PDMA. RESOLUÇÃO DO CONSELHO DE MINISTROS N.º 5/97, DE 14-1-97, QUE RATIFICOU O PDMA: - ARTIGO 7.º, AL. K). | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -DE 10-5-2012, DE 29-11-2012, DE 26-3-2015, DE 17-10-13, TODOS EM WWW.DGSI.PT . * AUJ N.º 6/2011, DE 7-4-2011 (D.R., 1.ª SÉRIE, DE 17-5-2011). -*- ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL: -N.ºS 417/2007, 118/2007 E 196/2011, 641/2013 (PLENÁRIO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL) E N.º 93/2014. -N.ºS 247/00, 243/01, 172/02, 346/03 E 642/04. -N.º 155/02. -N.ºS 333/03 E 557/03. -N.ºS 114/05 E 293/07. -N.º 599/2015. -N.º 84/2017. TODOS EM WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT | ||
Sumário : | A indemnização devida pela expropriação de terreno rústico integrado na Reserva Ecológica Nacional e destinado por plano municipal de ordenamento do território a “espaço-canal” para a construção de infra-estrutura rodoviária é fixada de acordo com o critério definido pelo art. 27.º do CExp, destinado a solos para outros fins, e não segundo o critério previsto no art. 26.º, n.º 12. | ||
Decisão Texto Integral: |
Acordam no Pleno das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça:
I - AA, S.A., veio requerer a expropriação por utilidade pública urgente de uma parcela de terreno a destacar de um prédio rústico pertencente à Santa Casa da Misericórdia ... tendo em vista a execução de trabalhos de construção do Lanço ... e respectiva ligação ao .... Tratava-se de uma parcela com a área de 13.404 m2, a destacar do prédio denominado “...”, sito na Quinta ..., descrito na 1.ª CRP de ... sob o nº 2.990 e inscrito na matriz rústica sob o art. 43.º, secção P, da referida freguesia. Declarada a utilidade pública dessa expropriação, com carácter de urgência, a entidade expropriante foi autorizada a tomar a posse administrativa da parcela. Realizada a arbitragem, foi proferido acórdão arbitral que fixou em € 92.879,00 o valor da indemnização devida à expropriada, subdividida entre € 46.279,00 referente à parcela de 1.754 m2, classificada como “solo apto para construção”, e € 46.600,00 para a parcela de 11.650 m2, classificada como “solo para outros fins” e integrada na Reserva Ecológica Nacional (doravante REN). A expropriada interpôs recurso do acórdão arbitral para o Tribunal Judicial que, após diligências de prova, proferiu sentença que fixou a indemnização em € 135,892,68, actualizada, desde a data da declaração de utilidade pública até à decisão final do processo, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação. Este valor resultou do somatório da indemnização de € 58.500,00 relativa à parcela de terreno não inserida na REN (classificada como solo apto para construção), € 63.003,68 para a parcela de terreno inserida na REN (classificada como solo para outros fins) e € 14.639,00 pela depreciação das áreas sobrantes. Da referida sentença interpôs recurso de apelação a expropriada no qual alegou, relativamente à parcela integrada na REN, que a avaliação deveria obedecer ao critério previsto no art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações de 1999, e não ao do art. 27.º para os prédios rústicos, pelo facto de ter sido destinada pelo Plano Director Municipal de ... (doravante PDM...) a “espaço canal” para a construção de uma rodovia. A Relação confirmou a sentença de 1ª instância, mas a expropriada, inconformada mais uma vez com o decidido, interpôs o presente recurso de revista no qual insiste na mesma questão de direito. Fundou a admissibilidade da revista na verificação de uma contradição entre o teor do acórdão recorrido e o do acórdão de 17-12-2015, ambos do Tribunal da Relação de Lisboa, sobre a mesma questão essencial de direito em torno da identificação do critério adequado à avaliação expropriativa de parcelas integradas na REN. O acórdão recorrido, relativamente à parcela de terreno de um prédio rústico incluída na REN e que pelo PDM... era destinada a “espaço canal”, decidiu que a avaliação deveria efectuar-se mediante a aplicação do critério previsto no art. 27.º destinado a “solos para outros fins”. Já no acórdão fundamento, relativamente a uma parcela com características semelhantes e a que foi dada a mesma utilização, defendeu-se a aplicação analógica da norma do art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, por se tratar de “solo classificado para a instalação de infra-estruturas”. Em face da referida contradição jurisprudencial centrada na sujeição ou não da expropriação da aludida parcela ao critério definido pelo art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, foi admitido o recurso de revista, por despacho do ora relator, ao abrigo do art. 629.º, n.º 2, al. d), do CPC, ressalvado pelo art. 66.º, n.º 5, do Cód. das Expropriações. Nele foram suscitadas as suscitadas as seguintes questões essenciais: Foram apresentadas contra-alegações pela expropriante que defendeu a confirmação do acórdão recorrido. A recorrente requereu que se procedesse ao julgamento ampliado da revista, nos termos dos arts. 686.º e 687.º do CPC, pelo que os autos foram apresentados ao Exm.º Presidente deste Supremo Tribunal de Justiça com a justificação concordante do ora relator, sendo deferida aquela pretensão. Seguindo a tramitação legal, os autos foram apresentados à Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta que emitiu parecer ao abrigo do art. 687.º, n.º 1, do CPC, culminando com a seguinte proposta de uniformização: “O art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, aprovado pelo art. 1.º da Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, não pode ser aplicado por analogia aos casos de expropriação de terrenos integrados na Reserva Ecológica Nacional”. Foram colhidos os vistos. Cumpre decidir. III - Matéria de facto apurada pelas instâncias: totalizando a quantia de € 562.136,52. IV – Decidindo: 1. É questionado pela recorrente o critério de avaliação expropriativa que deve ser aplicado a uma parcela de 11.650 m2 de um prédio rústico classificada pelo Plano Director Municipal de ... (PDM...) como área destinada a “espaço canal”, para construção de uma via rodoviária, mas que também integra a Reserva Ecológica Nacional (REN). As instâncias coincidiram na recusa de aplicação a essa parcela do critério de avaliação previsto no art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações. Alega, no entanto, a expropriada que o facto de a mesma estar integrada na REN não exclui a aplicabilidade dessa norma, uma vez que, segundo o PDMA, estava destinada à construção de uma rodovia, uso que efectivamente lhe foi dado pela expropriante. Argumenta ainda que a não aplicação do referido critério de avaliação viola os princípios da justa indemnização e da igualdade, tendo em consideração o valor susceptível de ser atribuído a outros terrenos para os quais se prevê a construção urbana. Assim, o litígio gira em torno da aplicabilidade a tal parcela do critério de avaliação previsto no art. 27.º do Cód. de Expropriações, como sustentaram as instâncias, ou, como advoga a expropriada, do critério intermédio previsto no art. 26.º, n.º 12º, para a avaliação de terrenos que por instrumento municipal de ordenamento do território sejam destinados a finalidades que prosseguem o interesse público. 2. Na apreciação do recurso ter-se-á naturalmente em conta o regime jurídico que estava em vigor na data da declaração de utilidade pública, o que passa não apenas pelo Cód. das Expropriações que foi aprovado pela Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, como ainda pela análise dos diplomas que, na ocasião, regiam matérias conexas com instrumentos de gestão territorial, na medida em que deles resulte alguma utilidade para a compreensão e resolução do caso. Constata-se ainda que este Pleno, através do AUJ n.º 6/2011, de 7-4-11 (D.R., 1.ª Série, de 17-5-2011), já uniformizou a jurisprudência relativamente a uma questão similar centrada na aplicação a terrenos situados em RAN ou em REN do critério de avaliação previsto no art. 25.º do Cód. das Expropriações, como solo apto para construção, em lugar do critério definido pelo art. 27.º para solo destinado a outros fins. Consta da respectiva súmula uniformizadora que: “Os terrenos integrados, seja em Reserva Agrícola Nacional (RAN), seja em Reserva Ecológica Nacional (REN), por força do regime legal a que estão sujeitos, não podem ser classificados como «solo apto para construção», nos termos do art. 25.º, n.ºs 1, al. a), e 2, do Cód. das Expropriações, aprovado pelo art. 1.º da Lei n.º 168/99, de 18-9, ainda que preencham os requisitos previstos naquele n.º 2”. Pese embora a diferenciação de situações, extrai-se deste aresto uniformizador a inadmissibilidade de se proceder à avaliação como solo para construção de terrenos rústicos integrados em zonas de REN e de RAN sem qualquer capacidade edificativa, impedimento que encontrou justificação na natureza desses regimes especiais de ordenamento e de gestão do território. Cumpre, pois, apreciar se o que dispõe o art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, acerca da avaliação de terrenos expropriados, deve ser confinado aos solos que são destinados a “zona verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos” por “plano municipal de ordenamento do território” ou se abarca também aqueles cuja potencialidade edificativa sofra a interferência da sua integração em zona de REN. 3. A norma em causa tem como antecedente o n.º 2 do art. 26.º do Cód. de Expropriações aprovado pelo Dec. Lei nº 438/91, de 9 de Novembro, sob a epígrafe “Cálculo do valor do solo para outros fins”. Para além da sua transição para um artigo que agora tem a epígrafe “Cálculo do valor do solo apto para construção”, foi assumida pelo legislador a equiparação aos solos classificados como “zona verde ou de lazer” dos solos destinados à instalação de “infra-estruturas e equipamentos públicos”. Fixou-se também que o critério de avaliação nele definido apenas se aplica aos solos adquiridos pelo expropriado em data anterior à da entrada em vigor do plano municipal de ordenamento do território. Há quem aponte à solução legal o objectivo de proteger os particulares contra eventuais classificações dolosas de solos ou mesmo contra a manipulação de regras urbanísticas, a pretexto da aprovação de planos municipais de ordenamento do território delineados com o objectivo de deflacionar o valor das indemnizações expropriativas. Faltam-nos elementos que demonstrem a validade deste argumento e mais ainda a legitimidade para a sua generalização a qualquer instrumento de ordenação do território de âmbito municipal ou nacional. Por outro lado, a tarefa de interpretação e de integração normativa deve apoiar-se em critérios objectivos universalmente aceites e não em conjecturas insusceptíveis de confirmação e de validação. Seguro é que, com a salvaguarda legal que agora emerge do art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, o legislador visou tutelar interesses dos proprietários de terrenos que, conquanto não sejam formalmente classificados como terrenos para construção, apresentam, ainda assim, potencialidade construtiva que sai prejudicada pela atribuição de alguma das aludidas classificações por parte de planos municipais de ordenamento do território. 4. Sustentados no que decorre da Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo (Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, entretanto revogada e substituída pela Lei n.º 31/04, de 30 de Maio) e do regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial aprovado pelo Dec. Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro (entretanto revogado e substituído pelo Dec. Lei n.º 80/15, de 14 de Maio), podemos afirmar que os critérios que orientam a elaboração, aprovação e ratificação de instrumentos de gestão territorial de âmbito municipal visam fundamentalmente a resolução de problemas de natureza urbanística, não se confundindo com os que presidem a outros instrumentos, designadamente os que rodeiam a aprovação, delimitação e integração de solos em zonas REN ou em zonas RAN. Relativamente à REN, dispõe o Dec. Lei n.º 160/08, de 22 de Agosto, que, sem embargo da representação dos municípios na definição dos objectivos estratégicos nessa área específica (art. 8.º, n.º 3) e até da sua intervenção na elaboração da proposta de delimitação a nível municipal (art. 10.º), a aprovação final da delimitação da reserva ecológica na área do município é da responsabilidade da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional competente (art. 11.º, n.º 3) e está ainda sujeita a homologação ministerial (art. 11.º, n.º 15). Também os planos municipais de ordenamento do território, em especial os planos directores municipais, estão sujeitos a ratificação ministerial, mas é inegável a diferença relativamente ao regime de aprovação e de delimitação da REN. Com efeito, segundo o art. 69.º do mencionado Dec. Lei n.º 380/99, o plano municipal de ordenamento do território é um instrumento de natureza regulamentar aprovado pelo município; estabelece o regime de uso do solo e define modelos de evolução previsível da ocupação humana e de organização de redes e de sistemas urbanos, tendo como horizonte essencial a área do município. Nesta medida, a eventual classificação como “zona verde, de lazer ou para instalação de infra-estruturas e equipamentos públicos” que incida sobre terrenos que, em princípio, seriam aptos à construção, praticamente aniquila esta possibilidade, sendo a quebra das expectativas dos expropriados tutelada pela sujeição das correspondentes expropriações ao critério de avaliação intermédio previsto no art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, que não descura de todo a potencialidade edificativa dos terrenos. Como refere Alves Correia, este critério deve ser reservado a solos que, não fora a classificação atribuída pelo plano municipal, teriam de ser considerados como solos aptos a construção, atendendo a um conjunto de elementos certos e objectivos, relativos à sua localização, acessibilidades, desenvolvimento urbanístico da zona e existência de infra-estruturas urbanísticas, atestando uma aptidão ou vocação objectiva para a edificabilidade (na Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 133.º, págs. 53 e 54) Já na aprovação e delimitação de solos que integram a REN (ou a RAN), para além de prevalecerem interesses com projecção nacional, emerge a valorização da substância dos terrenos e não necessariamente a sua localização ou a sua maior ou menor aptidão construtiva. Por outro lado, as fortes restrições que emergem dos referidos regimes nem sequer permitem atribuir relevo a qualquer potencialidade edificativa. Especificamente no que concerne à REN regida pelo citado Dec. Lei n.º 166/08, na versão que vigorava na data da declaração de utilidade pública, era definida pelo art. 1.º como “uma estrutura biofísica que integra o conjunto das áreas que, pelo valor e sensibilidade ecológicos ou pela exposição e susceptibilidade perante riscos naturais, são objecto de protecção especial”, constituindo “uma restrição de utilidade pública, à qual se aplica um regime territorial especial que estabelece um conjunto de condicionamentos à ocupação, uso e transformação do solo, identificando os usos e as acções compatíveis com os objectivos desse regime nos vários tipos de áreas”. A mesma prossegue, além de outros, o objectivo de “proteger os recursos naturais água e solo, bem como salvaguardar sistemas e processos biofísicos associados ao litoral e ao ciclo hidrológico terrestre, que asseguram bens e serviços ambientais indispensáveis ao desenvolvimento das actividades humanas.” Como se prescreve no art. 20.º do referido diploma, são, pois, interesses de ordem geral que estão na base do regime fortemente restritivo quanto ao uso dos solos integrados em REN, designadamente no que concerne às operações de loteamento, obras de urbanização, construção e ampliação ou mesmo implantação de vias de comunicação, abrindo-se excepções a tal regime unicamente para acções de relevante interesse público que estão acauteladas no art. 21.º, designadamente quando estejam em causa infra-estruturas públicas rodoviárias, mediante autorização especial das entidades governamentais competentes. Afinal, é a esses mesmos interesses que, de um modo mais genérico, se reporta o Dec. Regulamentar n.º 11/09, aprovado ao abrigo do art. 72.º do Dec. Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, ao estabelecer que “nas áreas abrangidas por restrições e servidões de utilidade pública, os respectivos regimes prevalecem sobre as demais disposições dos regimes de uso do solo das categorias em que se integram”. 5. Confrontados com o preceituado no art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, não passa despercebida a restrição legal, vinda já do Cód. de Expropriações de 1991, no que concerne à identificação do específico instrumento de gestão territorial que serve de referencial à aplicação do critério de avaliação expropriativa. Nele se pressente uma clara distinção que legislador pretendeu estabelecer entre os efeitos ou condicionantes que emergem de planos municipais de ordenamento do território e aqueles que resultam de outros instrumentos de gestão territorial, designadamente do regime da REN (ou da RAN). Afinal, o plano municipal de ordenamento do território é apenas uma das diversas modalidades previstas no regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial aprovado pelo já citado Dec. Lei n.º 380/99, na versão vigente à data da declaração de utilidade pública que emergia do Dec. Lei n.º 181/09, de 7 de Agosto. E embora tal instrumento de gestão territorial deva integrar também a estrutura ecológica municipal (art. 70.º, al. e)) e as classificações que resultem de outros instrumentos de gestão territorial, como as áreas inseridas na REN ou RAN (art. 84.º), tal regime destina-se essencialmente, nesta parte, a assegurar a transposição de classificações e de delimitações de solos feitas ao abrigo desses ou de outros instrumentos de gestão, não sendo legítimo estabelecer uma equiparação entre instrumentos cuja aprovação é da responsabilidade de entidades administrativas de natureza diversa e orientados por princípios e por objectivos diversos. 6. No seu elemento literal, o preceito em causa aponta claramente para uma resposta negativa à questão de direito essencial que está sob apreciação, tal como se decidiu no acórdão recorrido. Porém, a recorrente expropriada pretende que, mediante o recurso à interpretação extensiva do preceito, se estabeleça a equiparação aos solos aí previstos daqueles que, apesar de sujeitos a outros instrumentos de gestão territorial, como ocorre no caso concreto com a REN, têm na sua envolvente construções urbanas. Propugna mesmo, se necessário, o recurso à analogia. Esta questão é debatida nos Tribunais, com resultados contraditórios que assomam precisamente no presente recurso de revista, cuja admissão, como se referiu, foi sustentada na verificação de uma oposição entre dois acórdãos da Relação de Lisboa que incidiram sobre expropriações de parcelas de terreno com as mesmas características essenciais e inseridas nos limites do Concelho de .... Contradição que, embora menos acentuada, também se colhe da jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça que mais interessa para o caso. No Ac. do STJ de 10-5-12 (www.dgsi.pt), foi negada a aplicação analógica do referido preceito a uma parcela de terreno expropriada para a construção de uma rodovia, mas que estava totalmente inserida na RAN, acentuando, para o efeito, a falta de capacidade construtiva e a diferenciação entre a “mera ordenação administrativa de um plano municipal” e “uma intervenção substancial no ordenamento do território”, como é a RAN. Os motivos expostos em tal aresto foram acolhidos pelo Ac. do STJ de 29-11-12 (www.dgsi.pt), com a justificação adicional de que a proibição de construir em solos integrados na REN ou na RAN advém de uma “vinculação situacional da propriedade”, como “manifestação da hipoteca social que onera a propriedade”, legitimando restrições que decorrem da “natureza intrínseca dos terrenos e que se mostram necessárias e funcionalmente adequadas para acautelar uma reserva de terrenos agrícolas que propiciem o desenvolvimento da actividade agrícola, o equilíbrio ecológico e outros fundamentais interesses públicos”. Os mesmos argumentos foram retomados mais recentemente pelo Ac. do STJ de 26-3-15 (www.dgsi.pt), servindo também para que, relativamente a uma parcela situada numa parte em RAN e noutra em REN, se afastasse tanto a interpretação extensiva do preceito como a sua aplicação analógica. Resposta diversa foi dada, porém, pelo Ac. do STJ de 17-10-13 (www.dgsi.pt), que admitiu a aplicação analógica do preceito, no pressuposto de que as razões que levaram o legislador a prever um critério diferenciado para os terrenos nele expressamente enunciados valeriam também para solos classificados como RAN ou REN. Ora, enquanto o acórdão fundamento se apoiou especificamente na tese assumida neste último aresto, já o acórdão recorrido seguiu a linha decisória do Ac. do STJ de 26-3-15. Importa, pois, aferir da legitimidade de uma interpretação extensiva do preceito ou do recurso à analogia que permita estender ou aplicar a solução expressamente prevista no art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, a solos que, embora destinados por plano municipal à implantação de infra-estruturas urbanísticas, estão também submetidos a restrições ou condicionalismos que decorrem de outros instrumentos de gestão e de ordenamento do território, em especial do regime da REN. 7. É vedado aos Tribunais superar a vontade expressa pelo legislador, através da formulação legal adoptada, a não ser que sejam identificadas razões bastantes que permitam extrair das normas um sentido mais amplo do que aquele que delas resulta em termos meramente literais (interpretação extensiva) ou que permitam detectar uma omissão legal que deva ser suprida mediante a transposição da solução normativa (analogia). A interpretação extensiva legitima que se extraia das normas um sentido mais amplo do que aquele foi expresso através do seu elemento literal, mas pressupõe que na letra da lei se encontre um mínimo de correspondência, sendo aquele resultado corroborado por outros elementos de interpretação normativa: histórico, sistemático ou racional (art. 9.º do CC). Já a analogia constitui um mecanismo de integração de lacunas legais que é reservado para situações omissas, isto é, para situações não expressamente reguladas pelo legislador mas relativamente às quais procedam as mesmas razões que subjazem à regulamentação expressamente consagrada. Caso omisso não equivale à mera falta de previsão legal de determinada situação, antes exige que se descubra uma realidade que não encontra consagração na lei, em toda a sua dimensão, mas à qual sejam aplicáveis as mesmas razões que estiveram na base da solução normativa. Não cremos que existam motivos para divergir do entendimento jurisprudencial que é maioritário neste Supremo Tribunal de Justiça acerca do âmbito de aplicação do art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações. O legislador, presumivelmente ciente da diferenciação entre as classificações e as condicionantes de solos que resultam de planos municipais de ordenamento do território em confronto com as que decorrem de outras das variadíssimas restrições ao direito de propriedade, como as que resultam da integração na REN (ou na RAN), reservou para as primeiras a aplicação do critério especial previsto no preceito em causa. Sendo de presumir a percepção da multiplicidade de situações que a realidade reflecte e da diversidade de instrumentos de gestão territorial ou de diplomas que prescrevem vinculações, servidões administrativas ou outras restrições ao direito de propriedade, tanto o elemento literal, como a evolução histórica do preceito ou a sistemática que envolve a regulamentação dos diversos instrumentos de gestão territorial contrariam a possibilidade de se estabelecer a equiparação aos solos cuja classificação decorra unicamente de planos municipais de ordenamento do território dos demais solos cujas classificações, limitações ou restrições resultem de outros instrumentos de gestão territorial, com especial destaque para os que respeitam à REN. Deste modo se afasta o resultado procurado pela recorrente mediante o recurso à interpretação extensiva do preceito. Também não se descortina no caso concreto a verificação de qualquer lacuna legis. Na verdade, a norma reflecte uma opção legislativa orientada no sentido de serem moderados, pela via nela prevista, os efeitos patrimoniais negativos emergentes de classificações de terrenos cuja edificabilidade é afectada por planos municipais de ordenamento do território, sem ir ao ponto de estender tal regime aos terrenos submetidos a restrições ou condicionantes que são projectadas por instrumentos de gestão territorial de outra natureza. Como se refere no citado Ac. do STJ, de 29-11-12, “a proibição de construir que incide sobre os solos integrados na RAN/REN é consequência da vinculação situacional da propriedade, sendo uma manifestação da hipoteca social que onera a propriedade privada, consubstanciada na imposição, por via legal, aos particulares de restrições decorrentes da natureza intrínseca dos terrenos e que se mostram necessárias e funcionalmente adequadas para acautelar uma reserva de terrenos agrícolas que propiciem o desenvolvimento da actividade agrícola, o equilíbrio ecológico e outros fundamentais interesses públicos”. Ora, tal efeito não é idêntico ao que se verifica quando estão em causa zonas verdes ou equiparadas cujo destino é fixado em planos municipais aprovados segundo critérios de oportunidade amplamente discricionários das entidades administrativas e que justificam a sujeição dos solos a um critério de avaliação que não exclua de todo a valorização que é potenciada pela sua localização ou envolvente urbanística. Por isso também não se descortina qualquer lacuna que deva ser integrada pela aplicação analógica do preceito em causa. Tendo em conta a restrição objectiva que emerge da letra do preceito e constatada a inexistência de qualquer lacuna legis, estamos impedidos de estender a sua aplicação ou de transpor a solução normativa para outras situações que envolvem classificações de solos, limitações ou servidões administrativas emergentes de outros instrumentos de gestão territorial, designadamente daqueles que respeitam a solos com outras características ou finalidades, sujeitos a regras diversas que emanam de instrumentos de gestão territorial que prosseguem outros interesses e que são geridos por outras entidades administrativas. 8. É suscitada nas alegações de recurso a violação dos princípios da justa indemnização e da igualdade que resultaria da recusa de submissão da expropriação da parcela situada em REN ao referido critério intermédio. O historial da evolução da jurisprudência a respeito da interpretação e aplicação de ambos os princípios encontra-se descrito e amplamente ilustrado nos acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça de 29-11-12 e de 26-3-15, sendo visível, a partir da análise da multiplicidade de arestos que têm sido proferidos pelo Tribunal Constitucional, uma estabilização na resposta negativa que é dada à violação daqueles princípios em situações, como a presente, em que os resultados da avaliação dos solos ou as diferenças de valores de indemnização são decorrência de uma diferenciação da sua natureza ou da respectiva envolvente jurídica. Sem dúvida alguma que o princípio da justa indemnização tem protecção constitucional directa (art. 62.º, n.º 2, da CRP), cujo respeito deve ser assegurado pelas normas de direito ordinário cooperando no sentido da obtenção de um valor que se aproxime, tanto quanto possível, do valor normal e corrente que seria obtido através do livre funcionamento do mercado. Mas para o efeito são incontornáveis as restrições de ordem legal que emergem designadamente dos instrumentos de gestão territorial. Afinal, quando qualquer proprietário pretende proceder à alienação onerosa de bens, antes de declarada a sua utilidade pública, não deixa de estar sujeito aos efeitos naturais de tais restrições no valor de mercado. Mais concretamente, o facto de uma determinada parcela de terreno integrar ou não a REN e de, por via disso, estar ou não sujeita a limitações quanto ao seu uso normal legitima que esse factor seja ponderado para efeitos de determinação da indemnização devida. A indemnização não deixará de ser “justa”, desde que o valor alcançado corresponda ao valor real e corrente dos bens nas circunstâncias em que os mesmos se encontram. Mas a discussão e a polémica verificam-se também em torno do princípio da igualdade no qual se centram as maiores incertezas quanto à resposta constitucional em situações, como a presente, em que está em causa a avaliação de parcelas de terreno que, segundo o direito ordinário, devam ser classificadas como solo para outros fins, em lugar da sua avaliação segundo o critério previsto no art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações. Com a invocação de tal princípio procuram os expropriados obter uma majoração indemnizatória resultante da equiparação de parcelas que estão sujeitas a restrições específicas, como as que emergem da REN ou da RAN, a outras parcelas que, dentro da mesma zona e com semelhantes características físicas, têm um destino delineado apenas por planos municipais de ordenamento do território. Mas o mesmo princípio já foi invocado e aplicado para obter o resultado inverso ao que agora é procurado pela recorrente, ou seja, para impedir que uma parcela integrada em REN ou em RAN pudesse ser avaliada com ponderação da sua capacidade edificativa. Verificaram-se algumas hesitações em torno da interferência deste princípio tanto em casos em que ocorreu a majoração da indemnização, por aplicação do critério referido no art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, ou mesmo do previsto no art. 25.º, como noutros casos em que, apesar da envolvente urbanística ou do destino final que foi dado a parcelas expropriadas, não foi ponderada qualquer potencialidade construtiva. Relativamente aos primeiros casos, depois de alguns arestos do Trib. Constitucional que apontaram para a violação do princípio da igualdade (Acórdãos n.ºs 417/2007, 118/2007 e 196/2011), o Plenário do Tribunal Constitucional decidiu no Ac. n.º 641/3013, “não declarar inconstitucional a norma constante do n.º 12 do art. 26.º do Cód. das Expropriações … quando interpretada no sentido de ser indemnizável como solo apto para a construção, terreno integrado na Reserva Agrícola Nacional com aptidão edificativa segundo os elementos objectivos definidos no n.º 2 do art. 25.º do mesmo Código”. Esta jurisprudência foi confirmada no Ac. n.º 93/2014. Pelo ângulo que agora nos interessa de alegada violação do princípio da igualdade em situações em que os particulares são prejudicados por restrições edificativas que emergem da REN (ou da RAN), por comparação com outros terrenos situados em área envolvente mas não submetidos a tais restrições, verifica-se actualmente a consolidação de uma resposta negativa. Como se refere no Ac. deste Supremo de 29-11-12, a jurisprudência constitucional vem decidindo que o preceito em causa não viola o princípio da justa indemnização em casos em que a expropriação tenha um objectivo diverso da edificação, como sucede com a implantação de vias de comunicação (Acs. do TC n.ºs 247/00, 243/01, 172/02, 346/03 e 642/04), construção de equipamentos de interesse público, como uma central incineradora (Ac. n.º 155/02) ou construção de uma escola (Acs. n.ºs 333/03 e 557/03). Nos Acs. n.ºs 114/05 e 293/07 foi considerado que a norma não era inconstitucional quando interpretada no sentido de não admitir a interpretação extensiva por forma a equiparar aos solos expressamente referidos no preceito terrenos integrados em RAN. Esta foi a solução adoptada também pelo Ac. n.º 599/2015, que incidiu precisamente sobre o citado Ac. deste Supremo de 29-11-12, tendo sido decidido “não julgar inconstitucional a interpretação efectuada dos arts. 23.º, n.º 1, 25.º, n.º 2 e 26.º, n.º 12, quando se considera não se poder avaliar o terreno expropriado como apto para construção, nem aplicar por analogia o preceituado no art. 26.º, n.º 12 do Cód. das Expropriações, mesmo que tal terreno cumpra os requisitos gerais do seu art. 25.º, n.º 2, quando o mesmo seja integrado em RAN por instrumento de gestão territorial cuja publicação ocorreu em data posterior à sua aquisição pelos expropriados, devendo o mesmo ser avaliado como solo apto para outros fins, nos termos do disposto no art. 27.º do Cód. Expropriações.” Solução que ainda mais recentemente foi reafirmada pelo Ac. n.º 84/2017 (que incidiu sobre o já citado Ac. deste Supremo de 26-3-2015), no qual se decidiu “não julgar inconstitucional a norma contida nos arts. 25.º, n.º 2, 26.º, n.º 12, e 27.º do Cód. das Expropriações, segundo a qual o valor da indemnização devida pela expropriação de terreno integrado na RAN e/ou na REN, com aptidão edificativa segundo os elementos objectivos definidos no n.º 2 do art. 25.º, deve ser calculado de acordo com os critérios definidos no art. 27.º, e não de acordo com o critério previsto no n.º 12 do art. 26.º, todos do referido Código”. 9. Existem, aliás, razões que podem explicar a diversidade de tratamento, as quais também foram arroladas nos Acs. do STJ de 10-5-12 e de 29-11-12. Na data da concreta declaração de utilidade pública, a REN era regulada pelo Lei n.º 166/08, de 22-8 (entretanto revogada e substituída pelo Dec. Lei n.º 80/15, de 14-5), cujo art. 9.º determinava que a delimitação a nível municipal das áreas integradas na REN era obrigatória e que na elaboração da proposta de delimitação da REN deveria ser “ponderada a necessidade de exclusão de áreas com edificações legalmente licenciadas ou autorizadas, bem como das destinadas à satisfação das carências existentes em termos de habitação, actividades económicas, equipamentos e infra-estruturas”. E segundo o art. 10.º, n.º 1, competia à “câmara municipal elaborar a proposta de delimitação da REN a nível municipal, devendo as comissões de coordenação e desenvolvimento regional e as administrações de região hidrográfica fornecer-lhe a informação técnica necessária e competindo às primeiras assegurar o acompanhamento assíduo e continuado da elaboração técnica da proposta de delimitação pelo município.” Prescrevia ainda o art. 11.º, n.º 15, que a “aprovação da delimitação da REN prevista no número anterior produz efeitos após homologação do membro do Governo responsável pelas áreas do ambiente e do ordenamento do território”. Finalmente, o art. 21.º, n.º 1, estipulava que “nas áreas da REN podem ser realizadas as acções de relevante interesse público que sejam reconhecidas como tal por despacho conjunto do membro do Governo responsável pelas áreas do ambiente e do ordenamento do território e do membro do Governo competente em razão da matéria, desde que não se possam realizar de forma adequada em áreas não integradas na REN”. E segundo o n.º 3, “nos casos de infra-estruturas públicas, nomeadamente rodoviárias, ferroviárias, portuárias, aeroportuárias, de abastecimento de água ou de saneamento, sujeitas a avaliação de impacte ambiental, a declaração de impacte ambiental favorável ou condicionalmente favorável equivale ao reconhecimento do interesse público da acção”. Considerando a diversidade de regimes que regem a aprovação dos planos municipais de ordenamento do território ou das zonas REN, não existem argumentos de ordem constitucional que impliquem que se extraia do art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, uma interpretação diversa daquela que ficou expressa, ou seja, que imponham que uma parcela de terreno inserida em REN deva ser avaliada de acordo com o critério definido para solos classificados em planos municipais de ordenamento do território como zona verde, de lazer ou para a instalação de estruturas ou equipamentos públicos. Na verdade, existe uma diferença substancial entre uns e outros solos, a qual encontra justificação nas razões que presidem a cada uma das classificações e que, assim, permitem comprimir, sem o risco de inconstitucionalidade, o critério de avaliação aplicável às parcelas integradas em REN, por comparação com as parcelas a que seja dado aquele destino por planos municipais de ordenamento do território. Aliás, como se refere no Ac. n.º 84/2017, o valor de mercado como critério de avaliação de bens expropriados deve ser aferido em função de uma ficcionada “transacção imediata do bem”, “procurando determinar um equivalente pecuniário que atenda às utilidades que ele proporciona ou está apto a proporcionar no momento da expropriação, com primazia, tratando-se de parcela de terreno, para a potencialidade edificativa”, sendo que a integração em REN e/ou RAN, “não pode ser configurado como um mero obstáculo conjuntural ou contingente, indiferente como factor de determinação do que seria o valor de uma transacção no mercado fundiário”. Conclui-se, pois, pela negação da alegada violação quer do princípio da justa indemnização, quer do princípio da igualdade. 10. É tempo de resolver o caso concreto, antes de assumir, de forma mais generalizada, a resposta uniformizadora àquela questão de direito essencial. Apresenta-se-nos uma parcela de um terreno rústico com destinação agro-pecuária que, conquanto esteja situada numa zona em que existe alguma construção urbana disseminada numa área definida por um raio de 300 metros, estava destinada pelo PDM de ... a “espaço canal” com vista à implantação de uma rodovia, destino que efectivamente foi respeitado depois da DUP. Segundo o art. 7.º, al. k), do PDMA, que foi ratificado por Resolução do Conselho de Ministros n.º 5/97, de 14-1-97, são “espaços-canais” os “espaços destinados à passagem das infra-estruturas principais de interesse concelhio ou nacional, neles se contendo ainda as respectivas faixas de protecção”. A REN do Concelho de ... foi criada pela Resolução do Conselho de Ministros n.° 34/96 de 6-4, e alterada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 31/05, de 21-2, antes da aprovação pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 5/97 de 14-1, do PDMA. Decorre da matéria de facto provada que a expropriada é proprietária do prédio desde data anterior quer à criação da REN do Concelho ... quer à entrada em vigor do PDMA. Se porventura não houvesse qualquer outra limitação ou condicionamento, para além dos que resultam do PDMA, a avaliação da parcela teria de fazer-se por aplicação do critério previsto no art. 26.º, n.º 12, do Cód. das Expropriações, tanto mais que a sua aquisição pela expropriada precedeu a aprovação do aludido instrumento. Ocorre, porém, que a mesma parcela estava integrada na REN, circunstância de ordem objectiva que afasta a sua inclusão na letra do preceito que apenas se reporta a parcelas cujo destino esteja dependente de um instrumento de natureza regulamentar como é o Plano Director Municipal. Ainda que a integração na REN também tenha ocorrido já depois da aquisição do imóvel pela expropriada (mas antes da aprovação do PDMA), a mesma implicou uma importante restrição ao direito de propriedade que não pode deixar de ser ponderada para efeitos de quantificação da justa indemnização. Confrontados com a situação dos autos e com outras idênticas, não se vêem motivos nem para avaliar a parcela como terreno apto a construção, nos termos do art. 26.º do Cód. das Expropriações (o que contrariaria o AUJ deste Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2011), nem para a sujeitar ao critério intermédio previsto no art. 26.º, n.º 12, através da qual o legislador procurou tutelar as potencialidades edificativas anteriores à aprovação de um plano municipal de ordenamento do território. Posto que a parcela seja servida por infra-estruturas rodoviárias, nomeadamente, a R. ...e de, na área correspondente a um raio de 500 metros, existirem alguns estabelecimentos comerciais, cafés, mercados e oficinas de automóveis, ou mesmo que nas proximidades (sem que tenha sido apurada a exacta distância) existam o Pólo Universitário da Universidade ... e o Convento Nacional ... tal não basta para que se atribua à parcela qualquer potencialidade construtiva que, aliás, nem sequer corresponderia ao uso que desde sempre lhe foi dado. Repare-se que estamos a tratar de uma parcela incluída num prédio rústico que sempre teve uma destinação agro-pecuária, como vacaria, não havendo a expectativa de que, não fora a declaração de utilidade pública, pudesse ter como destino a construção urbana. Deste modo, não é legítimo apelar a um factor de valorização, nem como solo destinado a construção, nem como solo cuja avaliação deva ser majorada em função de construções existentes noutros prédios envolventes. O facto de a parcela ter sido destinada à construção de uma via rodoviária também não interfere naquela conclusão, na medida em que para se aferir a capacidade construtiva não basta o confronto com qualquer tipo de construção, mas apenas com aquela que, em circunstâncias normais, poderia determinar para o proprietário a mais-valia decorrente da aplicação de um critério de avaliação mais favorável, o que claramente não ocorre quando a expropriação se destina à construção de uma rodovia. É verdade que a integração na REN não implica uma absoluta inviabilidade de outras utilizações, mas, como se referiu anteriormente, estas são fortemente condicionadas e limitadas às excepções que a lei prevê, sob autorização especial pelas entidades governamentais competentes, designadamente quando esteja em causa a passagem de rodovias consideradas fundamentais. Ademais a aprovação de alguma excepção nesse sentido e com essa justificação não permite que se atribua à área correspondente potencialidade construtiva que efectivamente lhe foi objectivamente retirada aquando da inserção na REN. Deste modo, sendo verdade que a integração da parcela em causa na REN não impediu que viesse a ser destinada a uma infra-estrutura rodoviária, tal destino, para além de ser excepcional e fortemente condicionado pelas regras da REN, não fez sobressair qualquer vocação ou potencialidade edificativa susceptível de determinar a majoração da avaliação. V – Face ao exposto, acordam os Juízes que constituem o Pleno das Secções Cíveis do Supremo Tribunal de Justiça em: a) Negar a revista e confirmar o acórdão recorrido; b) Estabelecer a seguinte uniformização: “A indemnização devida pela expropriação de terreno rústico integrado na Reserva Ecológica Nacional e destinado por plano municipal de ordenamento do território a «espaço-canal» para a construção de infra-estrutura rodoviária é fixada de acordo com o critério definido pelo art. 27.º do Cód. das Expropriações, destinado a solos para outros fins, e não segundo o critério previsto no art. 26.º, n.º 12”. Sem custas, atenta a isenção de que beneficia a recorrente, pessoa colectiva de utilidade pública (doc. fls. 246), nos termos do art. 4.º, n.º 1, al. f), do RCP. Notifique e oportunamente remeta certidão do acórdão para publicação na 1ª Série do Diário da República. Lisboa, 11 de Maio de 2017 |